o ambiental nos livros didáticos de geografia

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O AMBIENTAL NOS LIVROS DIDÁTICOS DE GEOGRAFIA: UMA LEITURA
NOS CONTEÚDOS DE GEOGRAFIA DO BRASIL
Raphaela Desiderio
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC
[email protected]
Introdução
Diante das proporções da problemática ambiental contemporânea veiculada
pelos meios de comunicação de massa e após décadas de debate, construção e
reconhecimento do ambiental como um campo de relações, propõe-se neste texto, uma
investigação sobre o ambiental no ensino de geografia.
Entendido como um saber transversal, ou seja, que permite transitar pelas
diversas áreas do conhecimento, a compreensão do ambiental e sua inserção na
geografia escolar nos permite dialogar sobre as singularidades dessa temática quando
submetida ao texto pedagógico.
Apresenta-se aqui uma leitura do ambiental no livro didático de geografia. A
partir dessa análise, problematizaremos sobre a possibilidade de produção/reprodução
de uma realidade fabricada pelo aparato educativo – livro didático, suas aproximações e
distanciamentos com o que se constitui como campo ambiental.
Essa investigação proporciona um entendimento das dimensões tomadas por
essa temática no campo educativo e nos faz perceber os distanciamentos desta com a
Geografia acadêmica. Os temas analisados mostram a reprodução de discursos e a
produção de realidades meramente informativas que não possibilitam encontros com o
cotidiano. O ambiental no texto pedagógico dissolve as complexidades dos espaços e
reduz-se a uma realidade como destruição, cuja necessidade não é possível reconhecer.
Leituras do ambiental
Desmatamentos na floresta amazônica, mudanças climáticas, ameaça da
biodiversidade, escassez e poluição da água, entre tantos outros, são temas recorrentes
estampados em capas de revistas, manchetes de jornais ou programas de televisão. A
produção e veiculação de uma “natureza espetáculo” (SANTOS, 1992; GUIDO, 2005)
produz uma realidade. Realidade atrelada a uma crise ecológica, a um planeta em
estágio avançado de destruição.
Diante desse diagnóstico, a conservação, preservação e sustentabilidade se
tornam premissas de um mundo melhor, habitável às futuras gerações, ou seja,
produzem uma realidade “ideal”.
Considera-se a realidade como a “questão”, “ou o que está em questão”,
portanto, “o que é problemático e pode ser problematizado”, o “assunto da discussão”,
algo constantemente construído e dissolvido na sociedade contemporânea (LARROSA,
2004).
Nesse sentido, reconhe- se o ambiental como uma questão recorrente, abordada
constantemente nos mais variados âmbitos da sociedade contemporânea, algo que vem
sendo dissolvido e construído permanentemente nas últimas décadas do século XX e
início do XXI.
1
De um lado, a natureza, recurso passível de escassez e deterioração, do outro, a
necessidade do desenvolvimento econômico que abarca muitas dimensões e o homem
como agente de destruição e dilapidação dos recursos naturais.
Desde o início da década de 1970, uma série de conferências
intergovernamentais, reuniões internacionais, realizadas nos mais diferentes países,
resulta em acordos, tratados e um pacote de recomendações que versam sobre a relação
problemática da sociedade para com a natureza.
A partir desse contexto, tudo o que diz respeito a essa relação sociedade versus
natureza, fragmentada pela trajetória da modernidade ocidental, que gera uma notável
queda na qualidade de vida e certa “preocupação” advinda do modelo de crescimento
econômico atrelado ao princípio da escassez, recebe a denominação de “ambiental”.
De fato, anteriormente já se esboçava certa preocupação com estudos referentes
às relações sociedade e natureza e a organização espacial engendrada por essas relações,
haja vista, a própria história do pensamento geográfico que tem como referência central
à relação homem-natureza (MENDONÇA, 2001; BECKER e GOMES, 1993).
As próprias concepções de meio como sinônimo de natureza estavam atreladas a
uma concepção ecológica, organicista. Para Canali (2002) a, expressão ambiental tem
suas raízes no próprio conceito de ecologia, introduzido por Haeckel, biólogo alemão,
em 1866. Temos, então, no final do século XX, uma ressignificação do ambiental, que
permeia tanto as relações ecológicas, como as que dizem respeito às relações sociedade
e natureza. Essas relações, no entanto, perpassam pelo discurso da escassez dos recursos
naturais, da destruição do planeta, dos problemas que a organização espacial histórica
da humanidade vem acarretando. Esses problemas são denominados de ambientais.
Assim, a partir da decisão das Nações Unidas de promover uma série de
conferências mundiais, parece estarmos diante da invenção do ambiental. Diante disso,
é necessário alimentar discussões e criar recomendações sobre novas formas de lidar
com o planeta.
Passa a ser um consenso entre os organismos e governos internacionais, além
dos mais diversos setores da sociedade que os tais “problemas ambientais” são
resultados do modelo de crescimento econômico baseado na utilização de recursos
naturais sem limites.
Não se nega aqui a questão ambiental, ao contrário, entende-se que é necessário
um aprofundamento na compreensão das múltiplas e complexas relações que existem
entre os processos sociais e naturais.
Distinguir a produção de um discurso ambientalista atrelado à realidade como
destruição, de uma série de formas conflituosas de lidar com o planeta e as
conseqüências desses processos na organização espacial em suas diferentes escalas,
permite-nos uma análise das diversas facetas do ambiental.
Entende-se que o ambiental está inscrito num campo de permanente tensão entre
os diversos atores e práticas que o constituem. Essa noção de campo (BOURDIEU,
2001), como um conjunto de relações em permanente tensão entre as posições sociais e
o poder que cada uma detêm, traduz-se no ambiental através do espaço que se cria por
essas relações e o conjunto de atores e práticas de diferentes âmbitos da sociedade que o
legitimam como tal.
Ao reconhecer os diversos sentidos que cabem nesse campo, Carvalho (2002)
distingue categorias como: conservacionismo/ conservacionista, ecologismo/ ecologista
e ambientalismo/ambientalista. O termo conservacionismo é historicamente reconhecido
nesse campo enquanto, o [...] ecologismo e ambientalismo são distinções cujas
fronteiras contam com margens menos precisas, ora recobrindo-se, ora diferenciandose.” (Id.Ibid, p.16)
2
Os termos ambientalismo/ambiental se referem, portanto, a um conjunto mais
amplo de atores e práticas quando comparados ao ecologismo/ ecologista. Nesse sentido
[...] o termo ecologismo é aplicado ao movimento ecológico
propriamente dito, sendo associado a questionamentos e propostas de
mudanças radicais quanto ao modelo de desenvolvimento e ao estilo
de vida. Por outro lado, os termos ambientalismo e ambientalistas
denominam um conjunto mais amplo de movimentos e atores que, na
esfera de difusão do ecologismo, aderem a um ideário de preservação
e gestão sustentável do meio ambiente, incluindo, portanto, uma
variação ideológica que envolve ideários e propostas de mudanças
menos radicais quanto ao modelo de desenvolvimento.
(CARVALHO, 2002, p. 16)
A questão ambiental teria então eclodido justamente na época em que as Nações
Unidas realizaram em Estocolmo, Suécia, 1972, a Conferência das Nações Unidas sobre
o meio ambiente? Parece haver, entre alguns autores, um consenso sobre esta ser
considerada um marco histórico e político no que diz respeito à internacionalização da
questão ambiental. (MONTEIRO, 1980; CARVALHO, 2002; DIAS, 1994).
O questionamento do modelo de desenvolvimento e as denúncias de um
ambiente em crise geraram uma série de recomendações, cujos objetivos eram alertar e
orientar a humanidade para a preservação e melhoria na qualidade de vida. Já que
estamos diante do marco das preocupações ambientais, é necessário agregar a expressão
ambiental á educação1.
A educação ambiental passa a ser assunto de diversas conferências e
documentos, assim, como materiais didáticos que pretendem “sensibilizar”,
“conscientizar” ou informar os sujeitos sobre maneiras ecológica ou ambientalmente
corretas de agir, consumir e pensar o ambiental.
Assim como em todas as outras conferências e reuniões, a Rio-92 produziu mais
um pacote de recomendações que pretendiam indicar as soluções para a “crise
planetária”, por meio de uma série de normas e atitudes consideradas “corretas”. Dentre
essas recomendações destaca-se a necessidade do enfoque interdisciplinar na educação,
a reorientação da mesma para o desenvolvimento sustentável e a promoção da
conscientização popular através de informações sobre o meio ambiente (DIAS, 1994).
A leitura desses referenciais nos encaminha para a reflexão sobre a produção de
um discurso e de um pacote político institucional e pedagógico que prescreve regras e
normas de comportamentos e atitudes.
1
Na Declaração da ONU sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo, 1972 in. DIAS, 1994, p. 270),
dentre os princípios está o seguinte: 19- “É indispensável um trabalho de educação em questões
ambientais, visando tanto as gerações jovens como os adultos, dispensando a devida atenção ao setor das
populações menos privilegiadas, para assentar as bases de uma opinião pública bem-informada e de uma
conduta responsável dos indivíduos, das empresas e das comunidades, inspirada no sentido de sua
responsabilidade, relativamente à proteção e melhoramento do meio ambiente, em toda a sua dimensão
humana”. Após essa Conferência, uma série de outras (Encontro de Belgrado, Iugoslávia 1975;
Conferência de Tbilissi, Geórgia, 1977; Conferência Intergovernamental sobre Educação ambiental,
Moscou, 1987) seguidas por encontros regionais criaram uma série de recomendações e documentos
sobre a educação ambiental.
Foi a partir de uma recomendação da “Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano”
- Estocolmo, 1972, que em 1975, a UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência
e Cultura e o PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, criaram o PIEA - Programa
Internacional de Educação Ambiental.
3
A realidade como destruição aliada à idéia de uma pretensa “conscientização” ou
“sensibilização” para a preservação da natureza surge como um alerta urgente sobre os
cuidados do individuo para com o planeta. Um discurso preocupado com o
desenvolvimento, mas também com as futuras gerações, com os limites dos recursos
naturais, com a escassez da água, com a poluição generalizada, com as mudanças
climáticas, com o desmatamento da Amazônia, com a extinção da biodiversidade, com a
reciclagem, enfim, com uma realidade problemática.
Sobre a produção de um “discurso global” aliado a formação de um cidadão
planetário, aponta Oliveira Jr
[...] tal “discurso global”, que já há algumas décadas vem ganhando
corpo e tornando-se hegemônico, está a nos convencer de que
habitamos um mesmo lugar, o planeta Terra. É dessa perspectiva que
qualquer local existente no planeta nos diria respeito. Penso nesse
“discurso global” como constituído por dois apoios fortes e muitos
outros dispersos. Os dois fortes seriam o discurso da globalização
econômica e o discurso ecológico-ambiental, este último produtor do
lema: agir localmente e pensar globalmente. (Grifos do autor OLIVEIRA JR, 2007, p. 172).
A partir dessas considerações pretende-se um diálogo entre o ambiental e a
geografia que se ensina através do livro didático. Nesse sentido, apresentamos alguns
apontamentos sobre o ensino de geografia e a institucionalização da educação
ambiental, tomando como referência a geografia que emerge dos PCN’s, documento no
qual o meio ambiente é considerado um tema transversal.
Apontamentos sobre a Geografia dos PCNs e o ambiental como tema transversal
Assim como, a década de 1990 é apontada por Gonçalves (2006), como a década
em que a questão ambiental tomou grandes proporções no cenário internacional
constituindo-se como tema obrigatório na esfera política. É também neste contexto que
o ambiental é incorporado ao currículo escolar, como tema transversal.
Toma-se como referência a geografia produzida pelos Parâmetros Curriculares
Nacionais e os desdobramentos desse documento na geografia apresentada pelos livros
didáticos.
Os PCNs configuram-se como uma proposta curricular comum a todo o
território nacional. Teoricamente apresentam as diretrizes para o Ensino Fundamental.
Cabe ressaltar que, a inserção dos temas transversais nos currículos escolares
brasileiros, segue o modelo da proposta de renovação pedagógica espanhola, adotada
pelo governo brasileiro na reforma educacional da década de 1990. (PONTUSCHKA,
2007).
A geografia que emerge dos PCNs, traz como referência o estudo do espaço
geográfico com enfoque nas escalas local/global. Dentre os objetivos para o terceiro
ciclo estão à capacidade de reconhecimento das leis e princípios próprios da sociedade e
da natureza, de cuja interação histórica resulta o espaço geográfico e a compreensão do
espaço vivido relacionado às escalas local/global.
Além disso, os sujeitos devem ser capazes de perceber-se integrante, dependente
e agente transformador do ambiente, identificando seus elementos e as interações entre
eles, contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente (BRASIL, 1998).
4
Segundo os PCN’s (5ª à 8ª séries), a geografia a partir de seu objeto de estudo,
“às interações entre a sociedade e a natureza”, poderia trabalhar com “[...] quase todos
os conteúdos previsto no rol do documento de Meio Ambiente”. Ainda de acordo com o
documento, os temas sociedade e meio ambiente são os que permitem maior
aproximação, “[...], pois, ao tratar da formação socioespacial, das novas territorialidades
e temporalidades do mundo, aborda-se de forma ampla os processos que geram uma
determinada ocupação do solo, as demandas por recursos naturais, o crescimento
populacional e a urbanização, entre outros”. (Id. Ibid, p. 46)
As grandes questões do Meio Ambiente apresentadas pelos PCNs de geografia
são: poluição, desmatamento, limites para o uso dos recursos naturais, sustentabilidade
e desperdício.
A leitura da geografia produzida pelos PCNs traz constantemente à tona a
questão das escalas local/global. Segundo esse documento o “espaço vivido” e a
“paisagem local”, são referências para a organização do trabalho do professor que dessa
forma estaria “introduzindo os alunos nos espaços mundializados”, ou seja, a formação
de um sujeito planetário.
Em 1990, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA,
publicou como contribuição ao PIEA2, Conceitos Básicos de Educação Ambiental
(Basic Concepts of Environmental Education). Neste, “o dever de reconhecer as
similaridades globais, enquanto se interagem efetivamente com as especificidades
locais, é resumido no seguinte lema da EA: “Pense globalmente, aja localmente” (Think
globally, act locally)”. (Grifos do autor. Id. Ibid, p. 139).
É possível reconhecer esse “lema” tanto nas diretrizes do ensino de geografia
quanto nas recomendações prescritas nos documentos que versam sobre a educação
ambiental. O “pensar globalmente, agir localmente” se constitui como a “máxima do
pensamento ambientalista” (GUIDO, 2005).
Entender de que forma(s) o ambiental aparece nos livros didáticos de geografia
do 7º ano do Ensino Fundamental, permite-nos uma reflexão sobre até que ponto esse
material, após dez anos do surgimento dos PCNs, incorporou indicações advindas
desses documentos de referência e qual o papel do ensino de geografia do Brasil diante
de uma geografia que deve se pautar na formação de um sujeito planetário, de uma
leitura de mundo a partir do local/global.
Quanto ao livro didático, é histórica sua importância no ensino brasileiro,
principalmente a partir da década de 70 (SPOSITO, 2006). Para Azambuja (2008), o
livro didático, se torna com a geografia advinda dos PCN’s, “[...] um poderoso aliado na
sua implantação”, haja vista ser uma política pública concretizada através do Programa
Nacional do Livro Didático do Ministério da Educação – MEC.
O livro didático é entendido aqui como um aparato educacional que reproduz um
tipo de saber, representando um modo de ensinar uma seqüência de conteúdos bem
distribuídos e ilustrados. Estes são, segundo Larrosa (2004, p.153) “[...] determinantes
para a produção, a reprodução e também para a dissolução disso que chamamos
realidade”, é uma possibilidade de ensinar geografia.
Na área de Geografia, o livro além de “[...] preparar o aluno para atuar no mundo
complexo, localizar-se nele, decodificá-lo, compreender seu sentido e significado”, deve
ser capaz de desenvolver o senso crítico, permitindo ao sujeito problematizar a
realidade, propondo soluções e reconhecendo sua complexidade. (HESPANHOL, 2006
p. 77).
2
Programa Internacional de Educação Ambiental.
5
Diante disso, interessa nos saber com que significação o ambiental aparece nos
livros didáticos de geografia? Aparece articulado a que questões? Permite que o sujeito
em formação seja capaz de reconhecer as dinâmicas naturais e sociais e a integração
entre as mesmas além de identificar elementos e agentes de transformação do ambiente
de uma forma crítica? A geografia do livro didático de 7º ano do Ensino Fundamental,
cujo conteúdo é geografia do Brasil, não estaria contribuindo para a formação de um
sujeito planetário, já que trata diretamente de outras escalas, que não a local/global? É
possível dizer que o ambiental que aparece nos livros didáticos de geografia reproduz o
discurso ambientalista?
Procedimentos metodológicos
Neste texto, apresentamos parte de uma análise em construção3. A leitura e
interpretação do ambiental nos livros didáticos de geografia de 7º ano do Ensino
Fundamental têm, conforme dito anteriormente, como base a geografia que emerge dos
PCN’s.
Os livros didáticos analisados na pesquisa são recomendados e avaliados pelo
4
MEC através do PNLD 20085. O Ministério da Educação – MEC junto ao FNDE –
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação realizam periodicamente uma
avaliação de livros didáticos, que posteriormente, são distribuídos em escolas públicas
em âmbito nacional. O PNLD é, segundo o MEC, um dos mais antigos programas de
distribuição de livros didáticos destinados a estudantes da rede pública de ensino
brasileira e, desde 1929, vem passando por aperfeiçoamentos e diferentes formas de
execução.
Num rol de 19 coleções avaliadas e recomendadas, destacamos os três livros de
geografia de 7º ano do Ensino Fundamental que tiveram maior aceitação pelos
professores da Rede Estadual e Municipal de Ensino de Santa Catarina. Juntos eles
representam 70% das escolhas realizadas pelos professores das escolas estaduais e
municipais. Segundo o FNDE/MEC, foram distribuídos 107.623 livros didáticos para as
escolas6. Das 19 coleções recomendadas, 14 delas aparecem nas escolhas dos
professores do Estado.
Tabela 01 - Livros Didáticos distribuídos no Estado de Santa Catarina.
Código
00102COL05
00071COL05
00099COL05
0027COL05
00026COL05
00058COL05
Título
Construindo Consciências
Construindo a Geografia
Trilhas da Geografia
Geografia Crítica
Construindo o Espaço
Geografias do Mundo
Editora
Scipione
Moderna
Scipione
Ática
Ática
FTD
Quantidade
de
livros
distribuídos %
4726
4,4
1122
1,0
2240
2,1
9467
8,8
12558
11,7
1389
1,3
3
Dissertação de mestrado (em andamento), vinculada ao curso de Pós-Graduação em Geografia da
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, orientada pela Profª Drª Rosemy da Silva Nascimento.
4
Ministério da Educação.
5
Plano Nacional do Livro didático.
6
Número relativo aos livros enviados para o início do ano letivo de 2008, através da escolha PNLD/2008.
6
00073COL05
00150COL05
00123COL05
00126COL05
00087COL05
Projeto Araribá
Geografia - Homem & Espaço
Geografia (Elos)
Geovida - Olhar Geográfico
Geografia do Século XXI
Geografia - Sociedade e
00011COL05 Cotidiano
00139COL05 Geografia (Séries)
00072COL05 Geografia (Temas)
Moderna
Saraiva
IBEP
IBEP
Positivo
Escala
Educacional
Quinteto
Editorial
Moderna
TOTAL
51727
9609
161
113
2024
48,1
8,9
0,1
0,1
1,9
749
0,7
3624
8114
107623
3,4
7,5
100,0
Fonte: Guia Nacional do Livro Didático/MEC.
Livros didáticos com maior aceitação em Santa Catarina PNLD/MEC 2008
Geografia - Homem & Espaço
1
Projeto Araribá
Construindo o Espaço
0
10
20
30
40
50
60
Gráfico 01 – Livros didáticos com maior aceitação no Estado de Santa Catarina/PNLD 2008.
Fonte: Guia Nacional do Livro Didático/ MEC.
Através do gráfico, é possível observar que o livro intitulado Projeto Araribá da
Editora Moderna é bastante representativo entre as escolhas. Construindo o Espaço da
Editora Ática e Geografia: Homem & Espaço, Editora Saraiva são os dois outros livros
com maior aceitação pelos professores das redes estaduais e municipais de Santa
Catarina.
Neste artigo apresenta-se uma análise do tema 4: Problemas sociais e ambientais
nas cidades, inserido na Unidade 3 – Industrialização e Urbanização do Brasil do livro
Projeto Araribá, o capítulo 3 – A Paisagem natural brasileira e a ação humana do livro
Geografia: Homem & Espaço e a seção De bem com a natureza que fecha o capitulo 6 –
A diferenciação regional no Brasil do livro Construindo o Espaço, com foco na temática
ambiental.
7
Estes temas, capítulos ou seções, conforme nomeados em cada livro fazem
referência direta ao ambiental e estão distribuídos em seqüências anteriores à
abordagem do conteúdo de geografia do Brasil dividido por regiões. A leitura do
ambiental nos livros didáticos segue os apontamentos realizados anteriormente, nesse
sentido, dialogaremos em torno das questões expostas no texto, construindo uma
reflexão sobre essa temática e sua abordagem na geografia escolar.
O ambiental no ensino de geografia do Brasil: uma análise de livros didáticos
O ensino de geografia do Brasil deve segundo a Proposta Curricular de Santa
Catarina (1998) ser trabalhada na 6ª série ou 7º ano do Ensino Fundamental. Segundo
este documento “estudar o espaço brasileiro supõe partir da realidade que se vive, isto é,
a realidade do Estado de Santa Catarina, e considerar o conjunto do território brasileiro
fazendo a análise globalizada e regionalizada” (PCSC, 1998, p.186).
Dialogaremos com Larrosa (2004), no sentido de pensar que contornos toma a
temática ambiental no ensino de geografia do Brasil e quando submetida “[...] ás regras
didáticas e ideológicas do discurso oficial e dominante”. Citando Basil Bernstein, o
autor coloca
o texto pedagógico [...] configura-se mediante a apropriação de
outros textos que foram selecionados, descontextualizados,
transformados e recontextualizados: a literatura escolar não é a
Literatura, do mesmo modo que a física escolar não é a Física e a
história escolar não é a História. Quando um texto passa a fazer parte
do discurso pedagógico, esse texto fica como que submetido a outras
regras, como que incorporando a outra gramática. (LARROSA, 2004,
p.117).
Entende-se por discurso oficial e dominante no campo educativo aquele que diz
respeito aos processos de organização, seleção, classificação dos saberes trabalhados a
partir de documentos curriculares dos mais diversos, subordinados a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional LDB/1996. Diante dessas considerações partimos para a
reflexão dos livros.
O tema 4 - Problemas sociais e ambientais nas cidades (páginas; 76 e 77), da
unidade 3 - Industrialização e Urbanização do Brasil é o último tema da unidade do
livro Projeto Araribá. Os três primeiros temas são: 1- A industrialização brasileira; 2- A
urbanização brasileira e 3- Rede e hierarquia urbanas.
Supõe-se então que o tema 4 da mesma unidade, estaria relacionado aos assuntos
apresentados nas unidades anteriores. Inicia-se o tema com a abordagem dos problemas
sociais urbanos. Os problemas sociais urbanos estão segundo este livro, relacionados à
“pobreza urbana” e “moradias precárias”, haja vista que a maioria “ [...] da população
considerada pobre vive em cidades, principalmente em regiões metropolitanas” (p.76).
Ao mencionar o problema da pobreza urbana e moradias precárias, apresenta-se como
exemplo ilustrativo, o seguinte quadro (p.76)
8
Figura 01 – Quadro ilustrativo relacionado à pobreza urbana e moradias precárias.
Porque as áreas de encostas de morros ou margens de rios e córregos são
consideradas áreas de risco? A ocupação irregular é causada apenas pela população de
baixa renda? A ocupação irregular em áreas risco, além de um problema social, não é
também ambiental? Essas questões nos permitem uma reflexão acerca da simplificação
e reprodução de informações que não auxiliam o sujeito no processo de construção do
conhecimento. Informações sem as devidas explicações e relações, que não permitem
um entendimento das dinâmicas que envolvem determinada ocupação e uso do solo
urbano.
Na página seguinte, encontra-se a apresentação sobre os problemas ambientais:
os problemas ambientais urbanos não são encontrados apenas nas
grandes cidades, mas nelas, são agravados pela intensa
concentração de pessoas e de produção econômica. Os problemas
ambientais urbanos mais comuns são a poluição atmosférica e das
águas, a visual e a sonora. (PROJETO ARARIBÁ, 2007, p.77)
Logo, abaixo desta, vem á explicação de cada um dos tipos de poluição acima
mencionados, as causas desses problemas e suas possíveis conseqüências. A partir da
leitura desse tema é possível observar o ambiental atrelado ao conceito de problemas.
Vejamos: “os principais causadores da poluição atmosférica nas cidades são as
indústrias e os veículos que queimam combustíveis fósseis”, “outro problema ambiental
urbano é a poluição das águas, causada por rejeitos lançados nos rios pelas indústrias
e residências” (p.77).
Esse enquadramento da temática ambiental que nomeia os causadores de tais
problemas não provoca certo distanciamento com o cotidiano das pessoas? Será que as
crianças conseguem materializar essas questões no seu cotidiano? Quais os atores que
trabalham nessas indústrias, que dirigem esses veículos que queimam combustíveis
fósseis, que lançam seus rejeitos nos rios? Os problemas ambientais só estão presentes
nas cidades? Sejam elas pequenas, médias ou grandes? Existem e quais são as possíveis
soluções para os problemas citados?
Na leitura dos PCNs, citado anteriormente no texto, encontrávamos a seguinte
passagem, “[...] os temas sociedade e meio ambiente são os que permitem maior
aproximação, “[...], pois, ao tratar da formação socioespacial, das novas territorialidades
9
e temporalidades do mundo, aborda-se de forma ampla os processos que geram uma
determinada ocupação do solo, as demandas por recursos naturais, o crescimento
populacional e a urbanização, entre outros”. (PCNs, 1998, p. 46)
As excessivas generalizações que são construídas em torno do ambiental no livro
didático e a fragmentação apresentada neste tema, que trata dos problemas sociais e
ambientais nas cidades, sem aproximá-los, mostram-nos uma lacuna na abordagem
dessa questão no ensino de geografia. Percebe-se então um texto meramente
informativo e fragmentado que se não for complementado por outras
atividades/cotidianos/realidades, restringi-se ao campo da transmissão de conteúdo, da
objetividade, da reprodução e do reconhecimento de um saber, como verdade e
realidade.
No capítulo 3 – A Paisagem natural brasileira e a ação humana, do livro Homem
& Espaço, a temática ambiental é apresentada de forma bastante diferente. Já no início
do capítulo aparece um mapa dos principais problemas ambientais do Brasil. Esses
problemas dizem respeito á contaminação do solo e da água por atividades de garimpo,
mineração, agrotóxicos, esgoto doméstico e atividade industrial, poluição do ar, chuva
ácida e áreas com ocorrência de desertificação.
No texto apresentado ao leitor intitulado: “Uma paisagem natural em exploração
e em transformação”, pode-se identificar a explicação do viés histórico de ocupação do
território brasileiro e a conseqüente transformação das relações sociedade-natureza pela
determinação “[...] do sistema socioeconômico capitalista” (p.49). O livro ressalta que
“a ampliação de capacidade de produção de bens tem sido feita à custa de uma forte
intervenção na natureza” (p.49). Segue que a preocupação do poder político e
econômico em relação à natureza, é sempre em detrimento do que a mesma pode
oferecer como recurso, ampliação de produção e não em como a sociedade pode
melhorar a qualidade de vida “[...] aproveitando o que a natureza nos oferece sem
degradá-la, conservando-a para as gerações futuras”. (p.49)
Antes da apresentação de uma lista de fatores referentes à degradação ambiental,
está a seguinte frase “dentre as variadas formas de atuação dos agentes privados e
públicos que contribuíram para a transformação dos espaços naturais e a degradação
do ambiente, [...] (p.49). Quer dizer, o que se transforma são os espaços naturais, mas a
degradação é do ambiente. Ou será que não há aí uma confusão, já que ao falarmos de
atividades que provocam uma transformação dos espaços naturais, não estaríamos
falando da própria dimensão ambiental?
Na seção “Aprendendo um pouco mais”, há um texto sobre Desenvolvimento
Sustentável. Ao informar ao leitor que é necessário encontrar novas formas de se
intervir na natureza, para que os ambientes naturais que ainda existem possam ser
preservados garantindo assim a sobrevivência de nossa e das futuras gerações,
apresenta-se uma lista de práticas necessárias a essa tal outra forma de intervir na
natureza. Essas práticas necessitam de atuações conjuntas de governos, empresas,
ONGs e indivíduos.
Mesmo, diante de uma percepção de natureza e ambiente como duas situações
que não se conectam, o capítulo traz questões importantes como uso do transporte
coletivo, a implantação da rede de esgoto, a modificação dos padrões de consumo
atrelado à produção de lixo, além de trazer no texto a seguinte reflexão
alterar o quadro atual, de modo que a degradação ambiental seja
reduzida ou evitada, exige uma mudança na maneira como os
cidadãos dos diversos países entendem a relação sociedade-
10
natureza. Será que as pessoas estão dispostas a alterar seus hábitos
de consumo e suas formas de locomoção para garantir a
sobrevivência das gerações futuras e a permanência dos ambientes
naturais que ainda restam na Terra? (Homem & Espaço, p. 51)
A questão acima colocada permite maior problematização da dimensão
ambiental no ensino e pode provocar uma série de debates sobre a maneira com que as
sociedades entendem a relação sociedade-natureza na atualidade. Pensa-se que essas
colocações são fundamentais para o desenvolvimento do pensamento crítico. O
questionamento, a provocação permite um encontro com as idéias, com o debate, com o
processo de construção do conhecimento citado nos PCNs.
Na análise desses fragmentos pode-se perceber um ambiental atrelado ao
conceito de impactos e problemas e outro com um viés mais histórico, que insere mais
possibilidades de leituras sobre a questão.
Considerações Finais
A leitura do ambiental no livro didático de geografia oportuniza a discussão da
temática vinculada e muitas vezes reduzida às noções de problema e destruição,
materializada por espaços mais ou menos impactados ou alterados, reforçando a
reprodução de uma realidade construída pelos meios de comunicação. Ao contrário do
que versam os documentos pedagógicos, a atual abordagem do ambiental no livro
didático, pode não permitir o reconhecimento da complexidade das diversas formas de
lidar com o planeta.
Após dez anos de publicação dos PCNs, percebe-se que os livros pouco seguem
as indicações trazidas pelo documento para a abordagem da questão, não proporcionam
um exercício de problematização da realidade, um encontro com o cotidiano dos
estudantes, mas apenas repassam informações acerca de uma realidade produzida e
moldada pelo texto pedagógico.
Há diferenças significativas entre as passagens dos livros analisadas. Em uma
delas o ambiental está atrelado aos impactos e problemas nas cidades e em outra adquire
um caráter histórico-social, atrelado a questão do modo de produção e transformação da
paisagem. O livro Homem & Espaço pode possibilitar um debate mais amplo sobre a
questão, porém em ambos há uma ausência de articulação com os outros conteúdos.
O ambiental no texto pedagógico reproduz uma realidade construída nos meios
de comunicação, ora reduzido a problemas ora divulgando o discurso da preservação e
conservação dos recursos para as futuras gerações, marcando a ausência de uma
discussão em que os sujeitos possam entender a dinâmica e identificar os elementos que
compõe essa dimensão.
O ensino de geografia do livro didático pouco permite um exercício de
construção do conhecimento em que o sujeito seja capaz de identificar uma série de
relações conflituosas de lidar com o planeta e como esses processos estão organizados
espacialmente em diferentes escalas.
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