Variabilidade genética, sistema reprodutivo e estrutura

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IPEF - ESALQ
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
S CIENTIA
F ORESTALIS
ISSN 1413-9324
No 53, Junho, 1998
SCIENTIA FORESTALIS
n. 53, p. 15-30, jun. 1998
Variabilidade genética, sistema reprodutivo
e estrutura genética especial em Genipa americana L.
através de marcadores isoenzimáticos
Genetic variability, mating system and the spatial genetic structure in
Genipa americana L. though isozyme markers
Alexandre Magno Sebbenn; Paulo Yoshio Kageyama;
Roland Vencovsky
RESUMO: O estudo genético de Genipa americana L., a partir da análise de eletroforese de
isoenzimas permitiu a obtenção de 13 alelos distribuídos entre 8 locos, sendo 4 monomórficos
e 4 polimórficos. Os índices de diversidade revelaram um baixo número de alelos por locos (A =
1,63) e uma média porcentagem de locos polimórficos (P = 50%), igualmente para adultos e
$ ) foi alta para adultos e plântulas (0,182;
plântulas. A heterozigosidade média esperada ( H
e
0,149, respectivamente), mostrando a população como potencial para a conservação in situ. O
$
índice de ( f ) baixo e negativo para os adultos (-0,071) e alto e positivo para as plântulas
(0,302), indicando equilíbrio de Hardy-Weinberg para os adultos, desvios de suas expectativas
para as plântulas e seleção para heterozigotos entre a fase juvenil e adulta. A taxa de cruzamento
multilocos ( t$m ) foi de 0,816, a unilocos ( t$s ), de 0,617 e a diferenças t$m - t$s , de 0,199,
revelando que em média, 81,6% das plântulas foram geradas por cruzamentos, sendo 61,7% de
cruzamentos aleatórios e 19,9% de cruzamentos entre aparentados. A presença de acasalamentos
endogâmicos sugere a existência de estruturação genética espacial na população. Contudo, as
análises de autocorrelação espacial não revelaram estruturação estatisticamente significativa
dentro da população. A diferença de t$m -1,0, foi de 18,4%, sugerindo a presença de apomixia,
entretanto, Sebbenn (1997) usando o teste de c² para detectar essa forma de reprodução,
rejeitou tal hipótese.
PALAVRAS-CHAVE: Variabilidade genética; Sistema reprodutivo; Estrutura genética espacial;
Genipa americana.
SUMMARY: The genetic variability, the mating system, apomixy and the spacial genetic structure
of natural population of the tropical forest tree Genipa americana L. was studied using
isoenzymes electrophorethic technics. Thirteen alleles distributed in eight locis were obtained
in the research. Four of these loci were monomorphic and four were polymorphic. The average
alele number per locis was 1,63 and the polimorphic locus percentage was 50% (99% probability)
$ ) was high for adults
for both adults and progenies. The average estimated heterozigosity ( H
e
(0,182) and for progenies (0,149). The Wright allelic fixation index ( f$ ) was negative for adults
(-0,071) and positive for the progenies (0,320), suggesting desviation of heterozygote proportions
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n
Genética de Genipa americana
from Hardy-Weinberg expectation for the progenies, with probable endogamic mating and
selection favoring the heterozygotes between the seedling and adult phase. The multilocos
outcrossing rate ( t$m ) and single locus outcrossing rate ( t$s ), were 0,816 and 0,617, respectively,
indicating that in this mating cicle 61,7% of the "plants progenies" analysed were generated from
the mating of individuals not close related to each other, 19,9% by mating of related individuals
t$m - t$s , and 18,4% probably by apomixy. However, the c² test, designed to detect apomixy in
the population (see Sebbenn, 1997), did not revealed it. The existence of endogamic mating
suggest genetic structuration within population, but the spacial autocorrelation analyses did not
detect statisticaly significant genetic structuration.
KEYWORDS: Genetic variability; Mating system; Spatial genetic structure; Genipa americana.
INTRODUÇÃO
O conhecimento dos níveis de variabilidade
genética, forma de reprodução e de distribuição
espacial dos genótipos dentro das populações são
aspectos fundamentais quando se pretende a conservação in situ de uma espécie. A persistência de
populações viáveis, do ponto de vista evolutivo
das florestas tropicais, é crucial para a preservação dos ecossistemas tropicais e da diversidade
biológica global (Liengsiri et al., 1995).
O sucesso de um programa de conservação
genética depende diretamente dos níveis de variabilidade genética das populações de interesse. A
estimativa da variabilidade genética em populações naturais é de fundamental importância para
resolução de numerosos problemas no campo da
biologia de populações (O'Malley e Bawa, 1987).
O desenvolvimento e a manutenção da estrutura genética ocorrem devido às interações de um
conjunto complexo de fatores evolu-cionários,
como variação no conjunto gênico; organização
desta variação dentro de genótipos; distribuição
espacial dos genótipos; sistema reprodutivo que
controla a união dos gametas para a formação
das progênies; dispersão das progênies; eventos
casuais; e processos de crescimento, mortalidade e reposição dos indivíduos que darão origem
às populações futuras (Clegg, 1980).
A maioria dos estudos com espécies arbóreas tropicais tem mostrado altos níveis de variação isoenzimática dentro das populações, relativamente aos níveis de variação entre populações (Hamrick e Loveless, 1989; Stebbins, 1989;
Hamrick e Godt, 1990). Para espécies arbóreas
tropicais, Hamrick e Godt (1990), observaram que,
em média, 82% da variabilidade genética total se
concentra dentro das populações. Acredita-se que
essa distribuição da variabilidade genética não seja
aleatória, dada a limitada dispersão de pólen e sementes, bem como a seleção para micro habitats
(Loveless e Hamrick, 1984).
Os padrões espaciais da estrutura genética
intra-populacional são componentes fundamentais dos processos evolucionários e ecológicos
em populações naturais de plantas (Brown, 1979).
O conhecimento da estruturação genética permite determinar a intensidade ideal de amostragem,
dentro das populações, para fins de conservação
genética ou de cruzamentos (Epperson, 1990). A
existência de estrutura genética espacial ou, em
outras palavras, de indivíduos geneticamente
correlacionados (aparentados), localizados próximos, dentro das populações, pode ser indicativo
da existência de acasalamentos endogâmicos.
Evidências indiretas de correlações genéticas entre plantas vizinhas têm sido obtidas de dados de
Sebbenn, Kageyama & Vencovsky
sistema de acasalamento (Dewey e Heywood,
1988). Nesse caso, plantas auto-incompatíveis que
apresentem uma taxa de cruzamento menor do
que 1,0 sugerem a existência de cruzamentos
endogâmicos. É possível que as causas sejam a
dispersão de pólen e sementes próximas à árvore
matriz, resultando em estruturação familiar dentro da população.
Durante a década de 50, poucos foram os
geneticistas que se utilizaram de marcadores genéticos para estudar o sistema de acasalamento em plantas. Atualmente essa metodologia tem crescido dentro da biologia de populações de plantas devido a duas causas: primeiro, a aplicação da eletroforese de isoenzimas tem fornecido numerosos marcadores
genéticos que podem ser usados para medir o
processo de transmissão genética entre plantas; segundo, modelos estatísticos mais elaborados têm sido introduzidos, permitindo uma
descrição detalhada da transmissão genética
entre gerações (Clegg, 1980). No entanto,
poucas são as informações sobre o sistema de
acasalamento de espécies arbóreas tropicais,
sendo que o conhecimento dos métodos reprodutivos é essencial para a compreensão dos
padrões de fluxo gênico e diferenciação genética entre e dentro de populações (Bawa,
1974; Clegg, 1980; O'Malley e Bawa, 1987;
Hamrick, 1989; Kirkpatrick et al., 1990). O
estudo detalhado do sistema reprodutivo das
espécies arbóreas tropicais pode fornecer informações importantes sobre os padrões de
acasalamento, a dinâmica dos processos microevolucionários e as melhores formas para conservação e manejo dessas essências (O'Malley
e Bawa, 1987).
Entre as espécies arbóreas tropicais, cuja estrutura genética é adequada para representar espécies de dispersão hidrocórica, polinização
entomofílica e adaptadas as matas ciliares, destaca-se Genipa americana. Devido às suas características adaptativas ao ambiente ciliar, combi-
n
17
nadas com o rápido crescimento e abundante produção de sementes, G. americana tem sido muito
recomendada e utilizada na recuperação de áreas
degradadas (Durigan e Nogueira, 1990).
Este estudo visa caracterizar geneticamente
uma espécie arbórea tropical típica de matas
ciliares, Genipa americana L., objetivando mais
especificamente:
a)
quantificar a variabilidade genética da
população;
b)
estudar o sistema reprodutivo da
espécie e,
c)
estudar a distribuição espacial dos
genótipos na população.
MATERIAL E MÉTODOS
A espécie Genipa americana L.
Genipa americana L. (Rubiaceae) distribuise naturalmente entre as latitudes 20 oN (México) e 20 0S (Brasil, em São Paulo) (Carvalho, 1994). Apresenta uma altura média de 8
a 14 metros, DAP de 49 a 60 centímetros (Lorenzi, 1992), podendo atingir até 25 metros
de altura e 90 centímetros de DAP (Carvalho, 1994). A planta é heliófita, seletiva, higrófila, característica de florestas pluviais e
semidecíduas situadas em várzeas úmidas e
brejosas (Lorenzi, 1992). A dispersão dos frutos ocorre por gravidade, zoocoria e hidrocoria (Crestana, 1993; Carvalho, 1994). A
espécie é dióica (Crestana, 1993; Bawa et al.,
1985) e a polinização é entomofílica, efetivada por mamangavas Bombus morio e Epicharis
rustica flava (Crestana, 1993). No processo
sucecional a espécie é considerada secundária tardia, com características de clímax (Carvalho, 1994). Sua distribuição é comum nas matas
ciliares, onde suporta longos períodos de imersão,
durante a época de cheia dos rios (Nilsson, 1989;
Durigan e Nogueira, 1990).
18
n
Genética de Genipa americana
Local de Estudo
O estudo foi realizado em uma população
natural de G. americana, localizada em mata ciliar
do Rio Moji Guaçu, pertencente à Estação Experimental de Moji Guaçu, do Instituto Florestal de
São Paulo. A mata situa-se entre as coordenadas
22°16' S. e 47°11' W. G., em altitude média de
600 m. Os solos estão classificados nos tipos
LVa e LE (Crestana, 1993). Esses solos de planície de inundações (hidromórficos) estão sujeitos
a alagamentos periódicos nas épocas de cheias
do rio (Mantovani et al., 1989; Nogueira, 1989).
O clima é do tipo Cwa, caracterizado como úmido e mesotérmico, com variação na temperatura
média mensal de 14,30°C a 24,65°C, segundo
classificação Köppen (1948). A estação seca, segundo Crestana (1993), prolonga-se de maio a
agosto, com 86,18% da precipitação (1314mm
anuais) concentrados nos meses chuvosos (setembro a abril). A mata ocupa cerca de 7,2 ha da
Estação Ecológica de Moji Guaçu, sendo remanescente da Bacia Hidrográfica Mogiana
(Crestana, 1993).
Eletroforese de Isoenzimas
A análise de eletroforese de isoenzimas utilizou tecidos folhares de 42 plantas adultas (27
femininas e 15 masculinas) e de 300 plântulas, originadas de 15 matrizes (20 plântulas
por matriz). As 15 matrizes que deram origem às plântulas estão incluídas nas 27 plantas femininas genotipadas. A eletroforese de
isoenzimas foi horizontal, conduzida em meio
suporte de gel de amido de milho (penetrose
30) a 13%. As "corridas" foram realizadas em
geladeira, com temperatura de 5°, segundo
metodologia proposta Harris e Hopkinson (1976),
Cheliak e Pitel (1981) e Alfenas et al. (1991). A
extração das enzimas utilizou aproximadamente
20mg de tecido de limbo foliar, 10mg de areia
lavada, 7mg de Polyvinyl Pirrolidone (PVP 40),
7mg de Polyvinyl Pirrolidone (PVP-360) e 200
microlitros de solução de extração número 1 de
Alfenas et.al. (1991, p.41) modificada pela ausência de 2 Mercaptoetanol. A solução, extraída
foi absorvida em pedaços de papel de filtro
(Whatman n° 3) e, posteriormente, submetida ao
processo de eletroforese. Cada gel acondicionou
amostras de 20 indivíduos. As receitas e os procedimentos de revelação das enzimas podem ser
encontradas em Sebbenn (1997). Os sistemas
enzimáticos utilizados foram: Xiquinato
desidrogenase (SKDH), Fosfatase ácida (ACP),
Fosfoglucose
(PGM),6-fosfogluconato
desidrogenase (6PGDH), Fosfoglucose isomerase
(PGI), Malato desidrogenase (MDH), b-esterase
(b-EST) e Peroxidase (PRX). O tampão de cuba
e gel foi o Tris-citrato pH 7,5, descrito em Alfenas
et al. (1991).
ANÁLISE ESTATÍSTICA
Variabilidade Genética
As freqüências alélicas e os índices de diversidade genética como heterozigosidade média
observada (HO), heterozigosidade média esperada ( H$ e ) segundo expectativas do equilíbrio de
Hardy-Weinberg, número médio de alelos por loco
(A), porcentagem de locos polimórficos (P) e
índices de fixação de Wright ( f$ ), foram estimados para plantas adultas e plântulas de G. americana pelo programa BIOSYS-1, desenvolvido
por Swofford e Selander (1989). A
h e t e r o z i g o s i d a d e
média observada foi calculda pela expressão:
H o=1- åP i i , onde:P ii = freqüência dos genótipos homozigotos. A heterozigosidade média esperada foi obtida pela espressão H$ e = 1- åpi2,
sendo: pi = freqüência alélica estimada do iésimo
alelo, segundo expectativas de equilíbrio de
Hardy-Weinberg (Nei, 1987). P foi obtido pela
média aritmética do número de alelos por locos,
considerando-se como polimórfico o loco em
Sebbenn, Kageyama & Vencovsky
que a freqüência do alelo mais comum não ultrapassasse 99%. A foi obtido pela divisão do
número total de alelos pelo número total de
locos. O Índice de Fixação de Wright ( f$ ) foi
estimado ao nível de locos e média entre locos,
segundo Vencovsky (1994). A significância estatística de foi dada ao nível de loco, pelo teste
de c²=N f$ 2 (k-1), com GL=[k(1-k)]/2, onde:
N = tamanho total da amostra e k = número de
alelos (Li e Horvitz, 1953). Para a significância
da média entre os locos, usou-se o teste z=( f$ 0)/ σ$ x , onde: f$ = média de f$ entre os locos,
σ$ x = desvio ou erro padrão da média
( σˆ fˆ / n , sendo no número de observações),
de acordo com Loiselle et al. (1995). Se z ³ 1,96
ou 2,58, a média será diferente de zero, a um
intervalo de confiança de 95 ou 99% de probabilidade, respectivamente.
Sistema Reprodutivo
O sistema reprodutivo foi estudado pela taxa
de cruzamentos unilocos ( t$ s ) e multilocos ( t$m ),
através do programa MLT ("Multilocos") de
Ritland (1990), baseado no modelo de
acasalamento misto de Ritland e Jain (1981). O
modelo assume que as plântulas resultam de uma
mistura de cruzamentos aleatórios e
autofecundação, cujas pressuposições básicas
são: (1) que o conjunto de pólen é homogêneo
para o cruzamento com todos os genótipos
maternos; (2) que os alelos de diferentes locos
segregam independentemente; (3) que os locos
não são afetados pela seleção ou mutação, entre
o tempo de aca-salamento e a análise, e (4) que
os locos estão em equilíbrio de Hardy-Weinberg
(Clegg, 1980; Ritland e Jain, 1981; Ritland, 1990;
Murawski et al., 1994). A estimativa do erro padrão da taxa de cruzamento multilocos, para a população, foram realizadas através
de "boostrap", sendo a unidade de re-amostragem,
as plantas dentro das famílias. Utilizou-se 1000
reamostragens dentro das famílias, conforme
n
19
Murawski et al (1994). Diferenças positivas entre t$m e t$ s ( t$m - t$ s ), decorrem de acasalamentos
entre aparentados (Shaw e Allard, 1982; Ritland e
El-Kassaby, 1985; Ritland, 1990). A diferença entre t$m e 1,0 fornece a proporção de autofecundação
( s$ ) (Ritland, 1990). O teste de adequação dos
dados ao modelo multilocos foi realizado a partir
da estimativa de divergência entre populações,
F$ST de Wright (1965), comparando-se as freqüências alélicas dos óvulos e do pólen, óvulos e
indivíduos adultos femininos e entre as famílias.
A significância de, para cada loco, foi dada pelo
c²
teste
de
=
2N
(k-1),
F$ST
GL = (k-1)(s-1), onde: N = tamanho médio da
amostra, K = número de alelos e s = número de
populações (Workman e Niswander, 1970).
Estrutura Genética Espacial
O estudo da estrutura genética espacial na
população, foi realizado pela análise de
autocorrelação espacial, conforme Sokal e Oden
(1978a, b) e Dewey e Heywood (1988), utilizando-se o programa "Autocorr", confeccionado por
Jonh S. Heywood. Como a população em estudo
encontrou-se dividida em duas subpopulações, a
análise de auto-correlação foi feita separadamente, para cada uma das unidades, através dos locos
polimórficos detectados nos indivíduos adultos.
A análise de autocorrelação considera cada alelo
(pi) como uma variável; assim, cada genótipo
homozigoto recebe o valor de pi=1,0, o heterozigoto pi = 0,5, e quando o alelo está ausente pi=0,0.
O número de alelos analisados por loco
corresponde a n-1, onde n é o número de alelos,
portanto, em um loco com dois alelos, apenas
um foi avaliado, já que o outro tem freqüência
dependente deste. O método de autocorrelação
utilizado foi o de comparações dentro de classes
de distâncias preesta-belecidas. Preestabeleceramse 4 classes de distâncias na subpopulação 1, e 7
classes na subpopulação 2, objetivando um número de conexões mínimas em torno de 30.
20
n
Genética de Genipa americana
RESULTADOS
A análise dos sistemas de coloração in vitro
permitiu a interpretação dos sistemas isoenzimáticos 6PGDH, PGI, PGM, MDH e PRX.
A interpretação dos zimogramas foi coerente
com os padrões encontrados em trabalhos similares, sendo que as cinco enzimas interpretadas apresentaram os seguintes padrões: 1.
Fosfoglucomutose (PGM): revelou uma região com atividade enzimática, formada por
um loco monomórfico, com um alelo fixado; 2. 6-fosfogluconato: Desidrogena-se
(6PGDH): apresentou duas zonas de atividade, sendo a mais catódica, variável e inconstante, por isso, desprezada da interpretação,
e a mais anódica formada por um loco po-limórfico
e
multialélico
(3
alelos),
constituída por uma enzima monomérica; 3.
Fosfoglucose Isomerase (PGI): revelou duas
zonas distintas de atividades (locos), sendo a mais
catódica interpretada como um loco monomórfico
com apenas um alelo (fixado) e a mais anódica,
por um loco polimórfico contendo duas
subunidades (dímera); 4. Malato Desidrogenase
(MDH): revelou três zonas de atividades, sendo a
mais catódica e a intermediária interpretadas como
dois locos polimórficos formados por enzimas
monôme-ras, contendo 2 alelos, e a mais anódica
interpretada como um loco monomórfico, apresentando apenas um alelo, fixado; 5. Pero-xidase
(PRX): revelou três zonas de atividade, duas positivas e uma negativa, porém, devido à
inconstância da revelação, só foi possível considerar uma zona de atividade, a mais catódica sendo interpretada como um loco monomórfico.
Assim, obtiveram-se 13 alelos distribuídos em 8
locos, sendo 4 polimórficos e 4 monomórficos
(Tabela 1). As freqüências alélicas variaram de
uma completa fixação, como no caso do alelo 1,
dos locos Pgm-1, Pgi-1, Mdh-3 e Prx-2, igualmente nos adultos e nas plântulas, até freqüências muito baixas, como no caso dos alelos 3, no
loco 6Pgdh-1 (0,061), 2 nos locos Mdh-1 e Mdh2 (0,023 e 0,042, respectivamente) nas plântulas.
Os índices de diversidade (Tabela 2), mostram
um número médio de alelos por locos (A), baixo
para ambos, adultos e plântulas (1,63±0,26) quando se consideraram todos os locos (monomórficos
e polimórficos). A proporção de locos polimórficos
(P) foi de 50%, tanto para adultos como para
plântulas. A heterozigosidade média observada (Ho)
foi alta para os adultos (0,195) e relativamente baixa para as plântulas (0,105). A heterozigosidade
Tabela 1
Freqüências alélicas e tamanho da amostra (n) em população de adultos e plântulas de G. americana, para 8
locos isoenzimáticos.
Allele frequency and sample size in population of adult and seedlings of G. americana, in 8 loci isozime.
Alelos
Pgm-1
6Pgdh-1
Pgi-1
Pgi-2
Mdh-1
Mdh-2
Mdh-3
Prx-2
1
2
3
n
1,000
0,000
0,000
42
0,329
0,524
0,146
42
1,000
0,000
0,000
42
0,464
0,536
0,000
42
0,905
0,095
0,000
42
0,893
0,107
0,000
42
1,000
0,000
0,000
42
1,000
0,000
0,000
42
1
Plântulas 2
3
n
1,000
0,000
0,000
294
0,441
0,489
0,061
255
1,000
0,000
0,000
280
0,507
0,493
0,000
298
0,973
0,023
0,000
275
0,958
0,042
0,000
289
1,000
0,000
0,000
256
1,000
0,000
0,000
273
Adultos
Sebbenn, Kageyama & Vencovsky
n
21
Tabela 2
Tabela 3
Índices de diversidade intrapopulacionais em adultos
e plântulas de G. americana.
Índices de fixação de Wright em adultos e plântulas
de G.americana.
Intrapopulation diversity index in adult and seedlings of
G.americana.
Wright fixation index in adult and seedlings of G.
americana.
A
P (0,99)
N
Ho
H$ e
Adultos
Plântulas
1,63 (0,26)
50,0 %
41,8 (0,2)
0,195 (0,068)
1,63 (0,26)
50,0%
277,5 (5,7)
0,105(0,055)
0,182 (0,054)
0,149 (0,083)
média esperada ( H$ e ) foi alta para ambos os adultos (0,182) e as plântulas (0,149).
Os índices de fixação de Wright ( f$ ), obtido
para adultos (Tabela 3), foram médios e não diferentes de zero para todos os locos, com valores
negativos para os locos Pgi-2, Mdh-1, Mdh-2 e
para a média. Para as plân-tulas, os índices de
fixação foram altos, positivos e significativamente diferentes de zero ara os locos 6Pgdh-1, Pgi-
f$
6Pgdh-1
Pgi-2
Mdh-1
Mdh-2
Média
Adultos
Plântulas
0,139 ns
-0,292 ns
-0,105 ns
-0,120 ns
-0,071 (0,077) ns
0,447 **
0,208 **
-0,028 ns
-0,043 ns
0,302 (0,092) **
* P £ 0,05; ** P £ 0,01. O f$ , ao nível de loco, foi testado
a partir de Li e Horvitz (1953), e a média pelo teste Z.
2 e média e, baixos, negativos e não diferentes
de zero para os locos Mdh-1 e Mdh-2.
O teste de aderência dos locos ao modelo
multilocos (Tabela 4), revelou diferenças significativas entre as freqüências alélicas dos óvulos e
do pólen, para os locos 6Pgdh-1, Pgi-2 e Mdh-2,
indicando que 75% dos locos não se adequaram
ao modelo de acasalamento misto de Ritland e
Jain (1981).
Tabela 4
Estimativas de máxima verossimilhança das freqüências alélicas do conjunto de óvulos e pólen e teste de c² para
aderência dos locos ao modelo multilocos.
Maximum likelihood estimates of gene frequencies in the pollen and ovule pools and chi-squares tests for fit to the multilocus.
Loco
N
Alelo
6Pgdh-1
187
Pgi-2
231
Mdh-1
197
1
2
3
1
2
1
2
Mdh-2
215
1
2
GL
Pólen
Óvulos
1
0,378
0,513
0.109
0,434
0,566
0,988
0,012
0,455
0,500
0,045
0,545
0,455
1,000
0,000
1
0,925
0,075
0,955
0,045
9
1
c² (multilocos)
61,10 **
8,50 **
0,00 ns
17,23 **
22
Genética de Genipa americana
n
Tabela 5
F$ST
e c² para diferenças nas freqüências alélicas entre pólen e óvulos, sexos, óvulos das plântulas e plantas adultas
femininas e heterogeneidade do pólen nos cruzamentos em G. americana.
F$ST and c² for allele frequence divergence among pollen and ovule pools, sexs, seedlings ovule and feminine adult plants
and pollen heterogeneidade in outcrossing in G. americana.
Pólen x Óvulos
Locos
6Pgdh-1
Pgi-2
Mdh-1
Mdh-2
Média
Masculinos x
Femininos
c²
0,004
0,012
0,006
0,004
0,007
2,99 ns
5,44 **
2,36 ns
1,72 ns
(0,002) **
Óvulo x femininas
c²
0,028
0,003
0,013
0,026
0,018
Heterogeneidade do
pólen
c²
2,30 ns
0,13 ns
0,55 ns
1,09 ns
(0,006) **
0,005
0,010
0,037
0,003
0,009
c²
2,19 ns
2,14 ns
8,61 **
0,75 ns
(0,007) ns
0,240
0,134
0,023
0,014
0,180
188,16 **
58,69 **
9,75 **
6,048 *
(0,053) **
** P £ 0,01; a: teste de c² (Workman e Niswander, 1970); b: teste Z.
Tabela 6
De acordo com o teste de divergência entre
freqüências alélicas ( F$ST ), estes desvios foram
causados pela heterogeneidade nas freqüências
alélicas dos óvulos e do pólen (Tabela 5), com
valores baixos e estatisticamente diferente de zero
todos os locos, indicando que o conjunto de pólen que contribuiu para os acasalamentos não foi
aleatório.
A taxa de cruzamento mutilocos ( t$m ) estimada por família (Tabela 6) variou de 0,10 a 1,68
e a taxa de cruzamento média da população foi de
0,816 (0,051). A taxa de cruzamento unilocos ( t$s )
variou, entre locos, de 0,181 (Mhd-1) a 1,047 (Pgi2), com média de 0,617. Essa grande variação entre
locos está refletida na magnitude do desvio padrão
da média de (0,166). A diferença entre t$m e t$s foi
de 0,199 e a diferença entre t$m e ( s$ ) 1,0 foi de
0,184.
As análises de autocorrelação espacial, mostradas nas Figuras 1 e 2, pela média de todos
Estimativas da taxa de cruzamento multilocos ( t$m ),
unilocos ( t$s ), aparente ( t$a ) e possível apomixia ( s$ ) em
famílias e população de G. americana.
Outcrossing rate multilocus ( t$m ), single ( t$s ), apparent
( t$a ) estimative and possible apomixy ( s$ ) in family end
popula-tion of G. americana.
Taxa de cruzamento
famílias
Taxa de cruzamento
unilocos
População
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
6Pgdh-1
Pgi-2
Mdh-1
Mdh-2
( t$m )
( t$s )
( t$m - t$s )
( s$ )
1: erro padrão da taxa de cruzamento.
1,66
1,68
1,02
1,33
1,09
0,60
0,10
1,18
1,51
1,59
0,18
0,800(0,080) 1
1,047(0,094)
0,181(0,166)
0,439(0,119)
0,816(0,051)
0,617(0,166)
0,199
0,184
Sebbenn, Kageyama & Vencovsky
alelos dentro das subpopulações, mostraram que
os valores do índice I de Moran, por classe de
distância, nas duas sub-populações, oscilaram de
positivos a negativos, flutuando sempre em torno
do valor zero, sugerindo aleatoriedade na distribuição dos genótipos dentro da população.
Figura 1
Correlograma para a média dos locos, em quatro
classes de distâncias, na subpopulação 1 de G.
americana.
Correlograms of mean loci in four class of distance in
subpopulation 1 the G. americana.
0,5
0,4
Média
0,3
I = MORAN
0,2
0,1
0
1
2
3
4
-0,1
-0,2
-0,3
-0,4
-0,5
Classes de distâncias
Figura 2
Correlograma para a média dos locos, em sete classes
de distâncias, na subpopulação 2 de G. americana.
Correlograms of mean loci in seven class of distance in
subpopulation 2 the G. americana.
0,5
0,4
Média
0,3
I = MORAN
0,2
0,1
0
1
2
3
-0,1
-0,2
-0,3
-0,4
-0,5
Classes de distâncias
4
n
23
DISCUSSÃO
Variabilidade Genética
A análise das freqüências alélicas da população de G. americana não mostrou ausência de
alelos entre plântulas e indivíduos adultos. As diferenças observadas entre adultos e plântulas, nos
locos 6Pgdh-1, Pgi-2, Mdh-1 e Mdh2, provavelmente decorram do fato de que as freqüências
nas plantas adultas não estão diretamente relacionadas às plântulas, devido à amostragem realizada nos adultos incluir 27 indivíduos a mais do que
as 15 matrizes que deram origem às plântulas (matrizes). Por outro lado, tais diferenças podem estar associadas a outros fatores, como seleção entre a fase de plântula e a fase adulta e/ou deriva
genética advinda da amostragem não representativa do evento reprodutivo que deu origem às
plântulas.
A variabilidade dentro de locos, medida pelo
número de alelos por locos (A), revelou uma
baixa riqueza alélica. Deve-se considerar que esta
estatística foi estimada a partir de todos os locos
(monomórficos e poli-mórficos). Segundo Nei
(1987), esta estatística é muito influenciada pelo
tamanho da amostragem genética (número de
locos), por isso não é uma boa medida de variabilidade genética para comparação entre amostras
de tamanhos diferentes. Já a variação entre locos,
medida pela proporção de locos polimórficos (P),
revelou um polimorfismo relativamente alto para
a população, quando comparado com outros estudos. Hamrick et al. (1979), encontraram um P
médio de 36,8% para espécies vegetais. Hamrick
e Godt (1990) encontraram um P de 50%, também para espécies vegetais. Hamrick e Loveless
(1986), encontraram um P de 89,3% para Alseis
blackiana e 49,5% para Psychotria horizontalis
(ambas, espécies da família Rubiaceae). Contrastando-se A e P, pode-se considerar que o polimorfismo em G. americana é maior entre locos
(P) do que dentro de locos (A), ou seja, temse uma maior variabilidade genética por iso-
24
n
Genética de Genipa americana
enzimas entre locos (maior número de locos
polimórficos) do que dentro de locos (número de alelos).
Os níveis de heterozigosidade observada (Ho
= 0,195; Ho = 0,105) e esperada ( H$ e = 0,182;
H$ e = 0,149) para adultos e progênies, respectivamente, foram altos. Estes valores também se
acham na média dos estudos com espécies
arbóreas tropicais. Hamrick et al., (1979), encontraram um H$ e de 0,141 para a média de espécies vegetais. Hamrick e Godt (1990) obtiveram
valores de H$ e de 0,149 para a média de espécies
arbóreas e 0,109 para arbóreas tropicais. Hamrick
e Lovelless (1989), estimara H$ e para espécies
arbóreas tropicais, da família Rubiaceae, de alta
densidade de 0,374 para Alseis blachiana, 0,152
para Psychotria horizontalis e de 0,211 para a
média de 16 espécies comuns. Moraes (1993),
estudando plântulas de Miracrodrum urundeuva
(espécie dióica), em duas populações, obteve Ho
de 0,140 e 0,160, respectivamente. Fica claro que
as heterozigosidades aqui encontradas, comparativamente a estes estudos, indicam que a variabilidade genética de G. americana encontra-se dentro dos padrões médios de outras espécies vegetais tropicais com algumas características semelhantes.
Os
níveis
de
heterozigosidade detectados para a espécie são altamente relevantes para a conservação in situ,
visto o grande número de novas recombinações genotípicas possíveis de ocorrer, mantendo assim o potencial evolutivo da espécie, às
adaptações às prováveis mudanças ambientais
e à colonização de novas áreas. Este resultado também mostra que a população apresenta potencial para a exploração em futuros programas
de melhoramento e para a coleta de sementes com
fins de recuperação de áreas degradadas.
Contrastando-se as heterozigosidades entre
adultos e plântulas, observa-se que Ho foi superior nos adultos relativamente a H$ e , e inferior nas
plântulas, revelando um excesso de heterozigotos
para
os
adultos
e
de
homozigotos para as plântulas, indicando a presença de
endogamia nas plântulas, e a possível existência
de seleção em favor dos hetero-zigotos, entre a
fase de plântula e a fase adulta. Em concordância, o índice de fixação( f$ ), médio entre locos,
para os adultos mostrou um pequeno excesso de
heterozigotos, porém, não estatisticamente diferentes de zero, sugerindo que a população encontra-se em equilíbrio de Hardy-Weinberg (EHW).
Caso a população se mantenha em EHW, teoricamente não ocorrerão perdas de variabilidade genética e o padrão de variabilidade será o mesmo
por infinitas gerações. Atente-se para o fato de
que este é um conceito teórico, em que a população não sofre evolução, porém, dificilmente essa
situação acontece na natureza, devido aos fortes
fatores evolucionários e ambientais a que estão
sujeitos os organismos. Para as plântulas o f$
mostrou um excesso significativo de
homozigotos, indicando que as freqüências
gênicas observadas se desviam das esperadas,
segundo os pressupostos do EHW. Desvios do
EHW implicam que a população está subdividida
reprodutivamente em grupos com um certo grau
de parentesco (Futuyma, 1992). Possivelmente a
subdivisão esteja associada à existência de
estruturação familiar dentro da população, ou a
acasalamentos preferenciais.
Os altos níveis de fixação alélica nas plântulas comparados com os baixos e até negativos índices nos adultos, confirmam a hipótese de seleção em favor dos heterozigotos, observada pelas heterozigosidades. Concordantemente, Murawski (1995), comparando
f$ entre adultos e plântulas em várias espécies
arbóreas tropicais, observou, igualmente
como aqui, seleção para heterozigotos entre
a fase de plântula e a adulta. A seleção dá a entender que os acasalamentos, na população de G. americana, geram uma grande quantidade de sementes endogâmicas a cada ciclo reprodutivo, mesmo
se considerando que as plantas adultas contenham
alta heterozigo-sidade e estejam em EHW. A seleção natural elimina as sementes endogâmicas, favorecendo o desenvolvimento dos heterozigotos.
Sebbenn, Kageyama & Vencovsky
n
25
Provavelmente, trata-se de uma estratégia adaptativa da espécie favorecendo indivíduos mais
variáveis, garantindo assim a manutenção dos
níveis de heterozigosidade da população. No
entanto, atente-se para o fato de que LepschCunha (1996), estudando Cou-ratari multiflora,
na Amazônia, e Murawski et al. (1994), estudando Shorea congestiflora, no Siri Lanka, encontraram valores de f$ maiores na fase adulta, relativamente à fase de plântula, mostrando que existem
desvios dessa tendência (seleção em favor de
heterozigotos) e indicando a necessidade de mais
estudos sobre esse processo evolucionário.
len diferenciado nos cruzamentos, resultando em
acasa-lamentos preferenciais na população. Consideram-se cruzamentos preferenciais aqueles
entre plantas com características fenotípicas semelhantes. Esta distribuição não aleatória do conjunto de pólen vai de encontro a um dos pressupostos básicos do modelo de Ritland e Jain (1981),
podendo contribuir para desvios na estimativa da
t$m . Os acasalamentos preferenciais podem estar
associados à visita do polinizador às árvores próximas, ao assincro-nismo no florescimento de
plantas masculinas e femininas (Crestana, 1993),
ou ainda à existência de estruturação espacial na
população, gerando endogamia.
Sistema Reprodutivo
A análise do sistema reprodutivo de G. americana pela estimativa da taxa de cruzamento
multilocos (Tabela 6), mostrou que a espécie se
reproduz preferencialmente por cruzamento, o que
era esperado, dado que a espécie é dióica. A taxa
de cruzamento para as famílias revelou endogamia
e/ou apomixia em alguns cruzamentos (apomixia
porque a espécie é dióica, portanto, não pode
autofe-cundar-se). Esta discrepância nas taxas de
cruzamentos com algumas famílias, com valores
iguais ou acima de 1,0, e outras com valores próximos a 0,20, provavelmente também está associada ao assincronismo na floração masculina e
feminina. É de se supor que as matrizes de número 6, 7 e 11, que apresentaram menores valores para t$m , floresceram no início ou no fim do
pico da florada masculina da população, fase em
que havia menos pólen disponível para os
acasalamentos, o que reduziu a produção de sementes por cruzamentos, assim possibilitando a
ocorrência de reprodução apomítica. Infelizmente, esta suposição não pode ser confirmada aqui
neste estudo, dado que não houve um acompanhamento fenológico durante a florada que deu
origem às plântulas. Ainda, como nenhuma das
três matrizes anteriormente mencionadas estava
isolada, descarta-se a possibilidade de que as baixas taxas de cruzamentos sejam devido ao isolamento espacial.
A análise de adequação dos dados ao modelo
de acasalamento misto (Ritland e Jain, 1981) revelou desvio do modelo. Segundo Ritland e ElKassaby (1985), esses desvios não prejudicam
as estimativas da taxa de cruzamento multilocos
( t$m ) e unilocos ( t$s ) , mas indicam a existência
de outros fatores atuando no processo, como por
exemplo, cruzamentos preferenciais e/ou entre
aparentados. Murawski et al. (1990) estimaram
t$m e t$s para Cavanillesia platanifolia e
Quararibea asterolepis, a partir de locos com desvios significativos do modelo multilocos.
Murawski et al. (1994) estimaram t$m para Shorea
congestiflora a partir de 6 locos isoenzimáticos e
para S. trapezifolia, através de 2 locos,
desconsiderando seus desvios do modelo. Um dos
fatores mais comuns que leva a esses desvios é a
heterogeneidade nas freqüências alélicas dos óvulos e do pólen (Reis, 1996). Aqui neste estudo,
conforme os resultados apresentados (Tabela 5),
os desvios foram causados pela heterogeneidade
do pólen nos cruzamentos, ou seja, o pólen que
contribuiu para a formação das plântulas não era
decorrente de uma amostra representativa do pólen da população, mas sim, advindo sistematicamente das mesmas plantas. A heterogeneidade do
pólen implica em que as famílias receberam pó-
26
n
Genética de Genipa americana
A análise do evento reprodutivo da população
de G. americana mostrou que 81,6% das plântulas
foram geradas por cruzamentos, sendo: 61,7%
aleatórios, 19,9% entre aparentados e 18,4% por
prováveis apomíticos. Levanta-se aqui a hipótese
de apomixia, devido à espécie ser dióica, portanto, como foi dito anteriormente, é impossível
ocorrer auto-fecundação. A presença de
acasalamentos endo-gâmicos ou entre relativos
confirma os níveis de endogamia sugeridos pelos
índices de fixação de Wright e desvios do equilíbrio de endogamia de Wright (EEW) para as progênies. A endogamia originada de cruzamento
entre aparentados, cria efeitos menos drás-ticos
em uma geração de acasalamentos do que a
autofecundação em uma planta mo-nóica, porém, os mesmos efeitos em algumas gerações
de cruzamentos entre aparentados (Allard, 1971).
Segundo Crestana (1993), em meados do mês de
novembro já existe uma pequena quantidade de
flores estaminadas (masculinas) abertas, sendo
que o pico da florada ocorre em meados de janeiro. Por sua vez, a antese das flores pistiladas (femininas) inicia-se em meados do mês de novembro, atingindo seu pico no início de dezembro.
Como essas flores permanecem presas aos ramos, depois de abertas, evidencia-se um mês de
sobreposição entre a florada masculina e a feminina. Contudo, possibilita acasalamentos preferenciais entre os poucos indivíduos masculinos
floridos, no início e pico da florada feminina, dado
que nem todos os indivíduos estão na mesma fase
fenológica ou têm a possibilidade de ser visitados
por polinizadores ao mesmo tempo. Quanto à hipótese de apomixia, em concordância, Crestana
(1993) observou tal forma de reprodução na população. A autora também notou que todas as flores pistiladas formam frutos e que a proporção
do número de flores femininas para o número de
frutos é de 1:1. Esta alta proporção de frutos para
flores, combinada com um certo assincronismo
na florada masculina e feminina, insinua a possibilidade das flores não polinizadas gerarem se-
mentes apo-míticas. Porém, Sebbenn (1997) submeteu os dados aqui em estudo, a um teste específico, visando detectar tal forma de reprodução,
contudo, os resultados rejeitaram a possibilidade
de que os 18,4% da diferença entre a 1,0 sejam
devido à apomixia e indicaram um excesso de
homozigotos, o que por sua vez, indica a atuação
de outros fatores não ligados ao sistema
reprodutivo, como seleção. Este resultado também pode estar relacionado aos problemas de
amostragem, como baixo número de locos
polimórficos ou locos inadequados (baixo
polimorfismo), utilizados para a estimativa da taxa
de cruzamento.
Quanto à endogamia detectada na população,
esta sugere a existência de estrutura familiar dentro da população. O'Malley et al. (1988), atribuíram à endogamia observada em progênies de
Bertholletia excelsa Humb. & Bonpl. a presença
de estruturação genética espacial, devido à sua
característica de ocorrer em reboleiras. G. americana é uma espécie que também ocorre agrupada, em forma de reboleiras (Sebbenn, 1997),
permitindo a ocorrência de estruturação.
Estrutura Genética Espacial
A estruturação genética pode ter efeitos drásticos sobre a distribuição da variabilidade genética, visto que acasalamentos entre aparentados
geram endogamia. Contudo, a análise de
autocorrelação espacial rejeitou a pressuposição
de estruturação espacial, mostrando que os
genótipos estão aleatoriamente distribuídos na
população de G. americana. É importante ressaltar que a inexistência de estruturação familiar não
significa que não existam indivíduos aparentados
na população; provavelmente esses até existam,
porém, não se encontram agrupados. A não
detecção de estruturação pode, contudo, estar ligada à amostragem deficiente dos indivíduos masculinos fornecedores de pólen que deram origem
Sebbenn, Kageyama & Vencovsky
às plântulas. Como a espécie é dióica, os
acasalamentos só podem ocorrer entre indivíduos de sexos diferentes e a estruturação pode estar
associada aos indivíduos masculinos localizados
próximos às matrizes, que, porém, não foram
avaliados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Finalmente, os altos valores de H$ e , a aderência das freqüências genotípicas ao EHW, para os
adultos, e as evidências de seleção em favor de
heterozigotos, mostram a população de G. americana como potencialmente apta à conservação in
situ. Caso realmente exista apomixia na espécie,
essa não será prejudi-cial à variabilidade genética,
dado que a apomixia reproduz o genótipo materno, mantendo assim, os atuais níveis de
heterozigo-sidade detectados, e aumentando a proporção de plantas femininas na população, hoje
menor que a masculina (segundo Crestana (1993),
existem nessa população 50 plantas femininas e
75 plantas masculinas), que por sua vez, ampliará a probabilidade de cruzamentos dentro da população.
O potencial evolutivo da população, mostrado pela heterozigosidade, possivelmente permitirá a adaptação dos genótipos às futuras mudanças ambientais, que porventura poderão advir, em
circunstância do grande número de novas
recombinações genotípicas que poderão ser gerados.
Finalmente, considerando-se a grande dificuldade atual para a obtenção de sementes de espécies arbóreas tropicais com níveis adequados de variabilidade genética, para a recuperação de áreas
degradadas, em especial das matas ciliares e, dado
os resultados aqui observados, como alta
heterozigosidade e reprodução por cruzamentos, é
possível afirmar que esta população de G. americana pode ser utilizada como "área para a coleta de
sementes". Para contornar os altos níveis de
n
27
endogamia detectados nas plântulas, recomendase que as sementes sejam colhidas do maior número possível de matrizes e em quantidades iguais
por árvores, visando à maior representatividade genética da população e o controle gamético materno,
práticas que levam a uma otimização do tamanho
efetivo das sementes coletadas, para fins de reflorestamento.
CONCLUSÕES
O estudo genético de G. americana, a partir
de dados de isoenzimas, possibilitou concluir que:
Os níveis de heterozigosidade esperados foram altos para a população de adultos se comparados à média de outras espécies arbó-reas tropicais estudadas. A alta heterozigosida-de é de valor
relevante, visto que permite novas recombinações
genotípicas e, por tais razões, a plasticidade
adaptativa da espécie às futuras mudanças
ambientais e à colonização de novas áreas.
As plântulas mostraram baixa heterozigosidade, evidenciando a existência de acasalamentos endogâmicos refletidos pelos altos índices de fixação e pelas diferenças nas taxas de
cruzamento multilocos e unilocos.
Os altos níveis de heterozigosidade nos
adultos, combinado com a aderência ao equilíbrio de Hardy-Weinberg, gerando plântulas
fora do equilíbrio e com altos níveis de
endogamia, sugerem a existência de seleção em
favor dos heterozigotos da fase de plântula para a
fase adulta.
O estudo do sistema reprodutivo revela a espécie como de acasalamento misto, gerando descendentes através de cruzamentos alogâmicos e
endogâmicos.
A análise da distribuição espacial dos genótipos não revelou estruturação genética, dando a
entender que os indivíduos se encontram distribuídos aleatoriamente na população.
28
n
Genética de Genipa americana
AUTORES E AGRADECIMENTOS
ALEXANDRE MAGNO SEBBENN é doutorando no Curso de Pós Graduação em Genética
na ESALQ/USP.
PAULO YOSHIO KAGEYAMA é Professor
Titular do Departamento de Ciências Florestais da ESALQ/USP. Av. Pádua Dias, 11 13418-900 - Piracicaba, SP
ROLAND VENCOVSKY é Professor Aposentado do Departamento de Genética da ESALQ/
USP. Av. Pádua Dias, 11 - 13418-900 - Piracicaba,
SP
Os autores agradecem à Dra. Cybele de Souza Machado Crestana, Dra. Ana Cristina Machado Siqueira, MSc. Marco Antonio de Oliveira Garrido,
aos
Técnicos
em
Agropecuária Gelson Dias Fernandes e José
Amarildo da Fonseca, pessoas que de alguma
forma auxiliaram na realização deste trabalho e à
CAPES, pela concessão da bolsa.
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