Linguagem, imagem e o performativo: Um tour d´horizon na Nova Geografia Cultural. Wolf-Dietrich Sahr Faculdades Guarapuava, Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFPR, prof. convidado A geografia é um campo de conceituações em permanente movimentação. Em cada região e cada época configura-se e/ou transforma-se a geografia como ciência/vivência em forma específica. Pretende-se, nesta palestra, fazer uma triangulação da atual geografia cultural visando pelo menos três horizontes importantes. Nos anos 1970 difundiu-se a virada lingüística nas ciências sociais. Deixou também um rastro na geografia, nas suas vertentes da geografia humanística e crítica, principalmente no ambiente discursivo da língua inglesa. Descobriu-se, nessa nova abordagem, que o “sentido” do espaço, a sua função comunicativa como signo, foi mais importante do que se imaginava nas abordagens positivistas dos períodos anteriores. Em conseqüência, o “espaço” perdeu a sua função epistemológica hettneriana de coerência, a qual ainda representou na geografia positivista e neopositivista, e tornou-se uma ferramenta epistemológica duplicada, dividido entre espaços de significantes e espaços de significados. Abriu-se, assim, um “materialismo dialético” apontando tanto o palco do corporal como o cenário das representações, formando um horizonte de linguagens, de complexos de sentidos, que – magmático na sua pluralidade e variabilidade – guiou a discussão para uma semiótica espacial do dizível, uma poética. Esta privilegia o significado, o sentido em baixo das superfícies. Neste contexto, os adeptos da geografia humanística referiam-se, na sua poética romântica, à pluralidade das explicações do mundo (senso comum, religiões, ideologias), enquanto a geografia crítica interpretou o mundo, na sua poética idealista, como paisagem de valores (de uso e de troca). Os anos 1990 vivenciam, sob influência da expansão informática, a “invasão” do mundo vivido por computadores pessoais, celulares com câmeras, novas formas de televisão e comunicação televisiva. Conseqüentemente, o meio imagético tomou conta de muitos comportamentos e relacionamentos sociais. Observamos, desde então, uma reorganização profunda do conceito do espaço pelas imagens. Nesta virada pictórica aparecem novas formas de comunicação, formas do visível, do não-verbal, o que implica uma nova construção “reticular” dos sentidos, beneficiando-se da polissemia típica dos efeitos da imagem. Trata-se de uma geografia da comunicação persuasiva que substitui as racionalidades da geografia dos significados. Falamos, neste contexto, de uma nova linguagem, esta vez pouco “alfabetizada”, de uma estética. Na geografia, a virada pictórica é, por enquanto, apenas observável na área instrumental onde mapas, sistemas de informação geográfica (SIG), bancos de dados de imagens e coleções de fotografias são instrumentos de tradução entre o visível e o dizível. Contudo, uma reflexão mais profunda sobre o espaço imagético se espera ainda. Por isso, deveríamos debruçar-nos sobre o rico acervo das teorias estéticas abordando questões da arte e privilegiar o campo das superfícies, do significante. Ironicamente, isto nos remete às épocas e culturas da comunicação imagética predominantes na Idade Média européia (Catedrais, ícones) ou a história cultural da China e do Japão (na arquitetura, caligrafia e pintura, como nos espaços Zen). Enquanto a virada pictórica ainda nem se expandiu muito no campo epistemológico, já se avisa outra virada. Esta busca superar a separação entre significante e significado. Trata-se de teorias não-representativas que privilegiam o corpo, esta matéria fática tão desconhecida no mundo do dizível e do visível. O corpo baseia-se principalmente no tato e no fato, ele se forma em positividade plena, mas desconsidera a diferença entre significante e significado. Por isso, é pouco destacado pela ciência a qual está ainda confinada na racionalidade do significado. Todavia, observando o nosso ambiente, percebemos um boom corporal como nunca houve. Assistimos uma permanente (re)construção material, não só de edifícios, cidades e parques de lazer, mas também de paisagens agrícolas, de florestas organizadas, até de space-labs. Hoje, nem a academia se propaga mais como lugar científico de pensadores, más se articula através de personal trainers máquinas corporais que transpiram o cheiro do suado. Este boom corporal, o qual acompanha “dialéticamente” a virada imagética, necessita de respostas epistemológicas através de uma geografia não-moderna que supera as velhas dicotomias entre natureza e cultura, entre corpo e idéia (veja LATOUR, SERRES). Tal geografia só pode funcionar quando privilegiamos o elemento performativo, a ação. Este é o meio principal da expressão dos corpos. Trata-se, agora, de uma semiótica espacial sóciobiológica, uma ótica específica na qual predomina o comportamento, uma ética no sentido pleno. Abordando, desta maneira, as questões da linguagem, da imagem e do performativo, finalizamos o nosso tour d´horizon com perspectivas epistemológicas que poderiam resultar numa OUTRA geografia cultural. Trata-se de uma geografia das espacialidades que desafia epistemologicamente as grandes narrativas geográficas ainda vigentes que, no meu ver, ficam muito confinados em antigos idealismos e positivismos, todos de certa forma reducionistas como, por exemplo, a geografia funcionalista e sistêmica e a geografia crítica estruturalista. Por isso: Aos navios, meus queridos conterrâneos da Terra Científica e da Ciência de Terra! Já avistamos os horizontes, mas ainda não conhecemos as paisagens epistemológicas embutidos neles. Precisamos embarcar nesta direção com novas geografias dos significados, das imagens e da ação.