ID: 56937239 01-12-2014 Tiragem: 3000 Pág: 23 País: Portugal Cores: Cor Period.: Mensal Área: 26,50 x 17,57 cm² Âmbito: Regional Corte: 1 de 1 Rubrica de pATRIMÓNIO Tradições de Natal no Baixo Guadiana: as searinhas, o cepo de natal e as filhoses A tradicional reunião da família durante o Natal continua a constituir o centro das festividades que marcam esta época, porém, perderam-se algumas tradições que, há apenas algumas décadas, distinguiam a data no Baixo Guadiana e que hoje resistem na memória dos “antigos”, como as “searinhas” e o “cepo de natal”. Outras, porém, como as filhoses, mantêm-se vivas. A partir do dia 4 de Dezembro, dia de Santa Bárbara, algumas famílias do Baixo Guadiana semeavam o trigo em tigelas com água, a que chamavam o “trigo de Santa Bárbara”. Outras semeavam no dia 8, dia de Nossa Senhora da Conceição. Podiam ainda semear diferentes cerais ou leguminosas, como agrião ou len- decorada com colchas, lençóis e tilhas. As sementes germinadas flores de papel. Era aí que as famíserviam para preparar as searinhas lias se reuniam para cantarem o que adornavam o presépio ou o altar do Menino “Meninos dos homens, Jesus, com maior tradição na zona serrana. Havia Em berço doirado, quem, através dessa gerE o Filho de Deus, minação, previsse as futuras colheitas do ano. Na Em palhas deitado. véspera de Natal, as searinhas eram colocadas no Em palhas deitado, altar com o Menino Jesus, dentro das tigelas ou sobre Em palh’estendido, toalhas húmidas. Com Filho d’uma rosa, as searinhas faziam-se D’um cravo nascido.” também pórticos e outras figuras que decoravam a composição, juntamente com laranjas e folhas de Ó Avé-Maria, Altura, Castro Marim, laranjeira. As searinhas José João Costa eram também colocadas no centro das mesas da ceia de Natal, ou nos presépios, juntamente com uma vela. terço e as loas ao Menino Jesus, Em frente do altar ou do presépio, rezarem a novena e mais alguma faziam um arco em cana, enfeitado “oraçanita” que conhecessem. com ramos de laranjas ou murta. Mas nem todas as casas No litoral, algumas famílias mais tinham por costume fazer o preendinheiradas armavam o presépio sépio ou armar o altar do Menino numa cómoda da “casa de fora”, Jesus. Algumas famílias assina- lavam a data com uma candeia acesa durante a noite de Natal, ou um grande madeiro, a que chamavam o “cepo do Natal” e que devia arder até ao Dia de Reis, para proteger a casa contra o “mau-olhado”. Alguns guardavam o tição para queimar em ocasiões especiais. Antes da missa do galo, na noite da consoada, a família juntava-se em redor do cepo ou da braseira, onde passavam o serão. Comiam linguiça assada ou frita com ovos, do “sovão” que matavam propositadamente a partir do Dia de Todos os Santos, para que os enchidos estivessem prontos para comer pelo Natal. Na doçaria dominavam os fritos, como as filhoses de joelho, de canudo ou de rosa, bolinhóis e as empanadilhas recheadas com batatadoce ou doce de grão, feitos pelas mulheres nas vésperas. Faziam-se também nogado, estrelas de figo e amêndoa e bolos de figo. Depois de festejarem a “meia-noite”, acorriam à missa do galo, onde apenas as crianças que chegavam com a cabeça ao pano da chaminé podiam assistir. A igreja, devido à importância da data, era enfeitada e perfumada com ervas da ribeira e verdura do campo. No regresso a casa, comiam a tradicional ceia de Natal. Na alvorada do dia de Natal, as crianças acorriam à chaminé, onde na noite anterior tinham deixado o sapatinho, na esperança que o Menino Jesus os presenteasse com um chocolate ou um par de peúgas. Nesse dia, as pessoas estreavam roupa nova e iam à missa das onze. Em Cacela, realizava-se no fim do dia um baile que encerrava as celebrações e a que também acorriam as gentes das redondezas. Pedro Pires Técnico de Património Cultural | Membro do CEPAC/UAlg (Centro de Estudos de Património, Ambiente e Construção da Universidade do Algarve)