Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas Ana Cláudia Niedhardt Capella Universidade Estadual Paulista (Unesp) Felipe Gonçalves Brasil Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Na literatura recente, o conceito de subsistema de políticas tem ocupado espaço central em diversos modelos teóricos, sendo considerado unidade de análise privilegiada em abordagens sobre o processo de políticas públicas. O presente estudo tem como objetivo discutir a construção teórica em torno da ideia de subsistemas, comunidades e redes de políticas públicas, bem como evidenciar a incorporação e desenvolvimento desses conceitos em três modelos teóricos de análise de políticas: o modelo de múltiplos fluxos (multiple streams), o modelo de equilíbrio pontuado (punctuated equilibrium) e o modelo das coalizões de defesa (advocacy coalition framework) que, de formas distintas, operacionalizam suas análises por meio desses conceitos. O debate teórico-conceitual acerca dos subsistemas, comunidades e redes de políticas públicas visa contribuir com os estudos sobre processos de mudança em políticas públicas, sobretudo em perspectivas que consideram o papel dos atores por meio de suas ideias, conhecimentos e interesses. Palavras-chave: administração pública, políticas públicas, grupo de trabalho Subsistemas, comunidades y redes: articulando ideas e intereses en la formulación de políticas públicas En la literatura reciente, el concepto de subsistema de política ha ocupado un lugar central en varios modelos teóricos, que se considera la unidad principal de análisis en los enfoques de proceso de las políticas públicas. Este estudio tiene como objetivo discutir la construcción teórica en torno a la idea de los subsistemas, las comunidades y las redes de [Artigo recebido em janeiro de 2014. Versão final em fevereiro de 2015.] Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 449 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas políticas públicas, así como pone de manifiesto la incorporación y el desarrollo de estos conceptos en tres modelos teóricos de análisis de políticas: el modelo de múltiples corrientes (multiple stream model), el modelo de equilibrio puntuado (puncutuated equilibrium framework) y el modelo de coaliciones de defensa (advocacy coalition framework). El debate teórico y conceptual sobre los subsistemas, las comunidades y las redes de políticas públicas tiene como objetivo contribuir a los estudios sobre los procesos de cambio en las políticas públicas, especialmente en las perspectivas que tienen en cuenta el papel de los actores a través de sus ideas, conocimientos e intereses. Palabras clave: administración pública, políticas públicas, grupo de trabajo Subsystems, communities and networks: articulating ideas and interests in the formulation of public policies In the recent literature, the concept of policy subsystem has played a central role in several theoretical models, being considered the prime unit of analysis in approaches of the public policy process. This paper aims to discuss the theoretical construction around the idea of policy subsystems, policy communities and policy networks, as well as to evidence the incorporation and development of these concepts in three theoretical models of policy analysis: the multiple streams model; the punctuated equilibrium framework and the advocacy coalition framework. The theoretical and conceptual debate about the subsystems, communities and policy networks aims to contribute to studies in public policy change processes, especially in perspectives that consider the role of the actors through their ideas, knowledge and interests. Keywords: public administration, public policies, work group 450 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil Introdução Na literatura recente de políticas públicas, o conceito de subsistema de políticas (policy subsystem) tem ocupado espaço central em diversos modelos teóricos, tendo sido considerado uma unidade de análise privilegiada em algumas abordagens sobre o processo de políticas públicas. O conceito de subsistema de políticas é objeto de intensa discussão teórica principalmente quando justaposto a conceitos relacionados, como o de comunidades de políticas (policy communities), redes de políticas públicas (policy networks), redes temáticas (issue networks). Tais conceitos podem contribuir significativamente para análises sobre os processos de mudança em políticas públicas, sobretudo em perspectivas que consideram o papel dos atores por meio de suas ideias, conhecimentos e interesses. O presente estudo tem como objetivo discutir a construção teórica em torno da ideia de subsistemas, comunidades e redes e, principalmente, apresentar e analisar a incorporação e desenvolvimento desses conceitos em modelos teóricos recentes no campo de políticas públicas. Em especial, analisaremos como três abordagens teóricas fundamentam suas explicações sobre o processo de mudança considerando a dimensão dos subsistemas. O modelo de John Kingdon (2003) apoia-se no conceito de comunidade de políticas para descrever padrões de relacionamento entre atores envolvidos com uma área de política, sobretudo em processos de definição de alternativas. Já o modelo proposto por Baumgartner e Jones (1993) aprofunda a análise dos subsistemas, destacando algumas características específicas de sua estrutura sintetizadas no conceito proposto pelos autores de “monopólio de política”. O modelo das coalizões de defesa (Sabatier; Jenkins-Smith, 1993; Sabatier; Weible, 2007) analisa a produção de políticas públicas com base em atores e suas crenças reunidos em coalizões que integram subsistemas específicos. Assim, as três abordagens incorporam os conceitos de subsistemas, comunidades e redes para produzir explicações sobre o complexo processo de produção de políticas públicas. Ampliar a compreensão sobre essas categorias pode proporcionar ao pesquisador de políticas públicas uma unidade de análise capaz de captar o dinamismo e a complexidade do processo de produção de políticas, seus múltiplos atores, ideias e interesses. Para tanto, na primeira seção, apresentaremos e discutiremos os conceitos de subsistemas, comunidades e redes, categorias mais recentemente utilizadas para a análise de políticas e que promovem avanços significativos em relação aos enfoques tradicionais. As três seções seguintes são dedicadas à análise da apropriação desses conceitos pelos três modelos apontados: o modelo de múltiplos fluxos (multiple streams), o modelo de equilíbrio pontuado (punctuated equilibrium) e o modelo das coalizões de defesa (advocacy coalition framework). Na sequência, discutiremos Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 451 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas similaridades e diferenças na articulação dessas categorias pelos modelos analisados. Por fim, serão apresentadas as principais conclusões sobre o estudo. Subsistemas, redes e comunidades de políticas públicas O estudo do processo de produção de políticas públicas tem revelado que, para a análise de uma política, não basta observar a organização pública encarregada formalmente por sua formulação, implementação ou avaliação. Seja uma secretaria, ministério ou agência, as estruturas organizacionais fornecem elementos importantes para a compreensão de uma política, porém pouco revelam sobre o complexo processo de produção de políticas públicas. A investigação sobre uma política também apresenta resultados incompletos quando limitada ao estudo do comportamento de atores no Poder Executivo, ou no Legislativo. Para o estudo e compreensão de uma política, a literatura desenvolvida no campo de políticas públicas tem privilegiado a análise de subunidades do sistema político, espaços político-administrativos que têm recebido diferenciados tratamentos teóricos ao longo das últimas décadas, sendo de forma geral denominados como subsistemas (policy subsystems) (Baumgartner; Jones, 1993; Sabatier; Jenkins-Smith, 1993; Howlett; Ramesh, 2003). Em tais subsistemas, as políticas são produzidas em um ambiente composto por diversas instituições e atores, geralmente reunidos em grupos mais ou menos coesos, que acabam se especializando e direcionando seus esforços para alguns aspectos específicos de uma política. Tal entendimento tem permitido o desenvolvimento de uma extensa bibliografia em torno desses subsistemas, suas características, composição e impacto na produção de políticas públicas. Para explicar o papel dos subsistemas na análise das políticas públicas, Thurber (1996) mostra que a literatura da ciência política estadunidense tem adotado uma perspectiva sistêmica, destacando três dimensões essenciais. A primeira dimensão é chamada de macrossistema (macro policy systems), na qual são tomadas decisões que afetam uma política pública ou a estrutura de poder em torno dela. São decisões que geram impactos consideráveis sobre a sociedade e o sistema político porque afetam muitos indivíduos e grupos, envolvem interesses amplos e lidam com questões frequentemente controversas, despertando a atenção da mídia e da opinião pública. Os microssistemas (micro policy systems), no outro extremo, envolvem decisões que geralmente não despertam a atenção do público. Nos microssistemas, são tomadas decisões baseadas em alta complexidade técnica, envolvendo um número bastante reduzido de tomadores de decisão que procuram restringir o acesso de outros participantes. Entre o macrossistema e o microssistema, situam-se os subsistemas. Como resultado da divisão do trabalho e da especialização da burocracia, as áreas 452 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil funcionais, como educação, saúde, transporte, meio ambiente, entre outras, são compostas por arranjos institucionais e atores que tendem a se aglutinar em torno de programas ou interesses específicos (policy domain). Policy domain é um conceito que pode ser definido como “a área substantiva da política pública sobre a qual os participantes competem e fazem acordos e concessões na elaboração de políticas, como nas áreas específicas da política ambiental ou da política de saúde” (Birkland, 2005, p. 97)1. Os subsistemas, conceito originalmente desenvolvido por John Freeman (1955), representam padrões de interações estabelecidos entre atores envolvidos em uma área específica de uma política pública. Nos subsistemas, esse grupo de atores – que podem ser servidores públicos, grupos de interesse, pesquisadores acadêmicos, membros do Legislativo, representantes de governos locais, entre outros – estabelece redes de relacionamento e utiliza estratégias de persuasão e barganha de forma a privilegiar seus interesses. Thurber (1996) esclarece que o sistema político dos Estados Unidos é organizado em torno de centenas de subsistemas, que podem estabelecer relações de conflito ou cooperação. Na análise do processo de produção de políticas, as questões movem-se por essas três dimensões do sistema político. No entanto, a maior parte delas reside nos subsistemas, caracterizados pela participação de um número reduzido de participantes reunidos em torno de questões que não despertam a atenção do público e que se processam de forma rotineira, em relação a uma determinada área de política. A Tabela 1 esclarece as diferenças entre os sistemas de produção de políticas públicas. Tabela 1: Dimensões do sistema de produção de políticas Visibilidade da decisão Escopo do conflito Quantidade de participantes Macrossistema alta alto muitos Subsistema baixa baixo poucos Microssistema invisível baixo e personalizado poucos Fonte: Thurber (1996, p. 77) Tradução nossa. 1 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 453 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas Diversos autores procuraram analisar a dinâmica dos subsistemas e o padrão de relacionamento dos participantes nessa dimensão do processo decisório. Uma das primeiras análises a respeito do que hoje denominamos como subsistema pode ser encontrada no trabalho de Ernest Griffith (1939), sobre os policy whirlpools, ou centros de atividades focalizados em questões específicas. Mais tarde, a noção de subgoverno (subgovernment), definido como “pequenos grupos compostos por atores políticos, tanto governamentais como não governamentais, que se especializam em áreas temáticas específicas” (Ripley; Franklin, 1984, p. 7, tradução nossa), aponta para a existência de grupos de atores envolvidos em processos rotineiros de tomada de decisão em uma determinada área de política e que podem permanecer ativos durante longos períodos de tempo. A análise dos subsistemas também levou à noção dos “triângulos de ferro”, abordagem que rompe com a perspectiva pluralista sobre a produção de políticas públicas dominante nos anos 1950 e 1960, nos Estados Unidos. Diversos estudos mostraram “que as políticas industriais americanas eram o resultado de relações estreitas, estáveis e, sobretudo, informais entre os grupos de pressão dos industriais, os representantes dos ministérios e os membros do Congresso” (Saravia; Ferrarezi, 2006, p. 07). Pautados em relações baseadas no intercâmbio de favores de mútuo interesse, esses três atores – grupos de interesses, parlamentares e burocratas – controlariam o processo de produção de políticas, excluindo a possibilidade de participação de outros atores. Nesse sentido, há uma significativa mudança na concepção sobre os principais atores e resultados do processo de produção de políticas. A abordagem do triângulo de ferro, ao evidenciar a troca de favores e de interesses privados mútuos como propulsor da policymaking, desconsidera a existência da luta de grupos de interesses difusos, potencializando, assim, o papel de legisladores, burocratas, agências regulatórias e grupos de interesse, tornando-os atores capazes de influenciar a agenda do governo a seu favor (Lowi,1969; Peters, 1986). Uma das críticas mais incisivas à ideia de triângulos de ferro foi elaborada por Heclo, no final dos anos 1970. Para o autor, o conceito seria incapaz de explicar as conexões entre administração e política: [...] o conceito de triângulo de ferro não é totalmente errado, ainda que seja desastrosamente incompleto [...]. Preocupado em tentar encontrar os poucos atores verdadeiramente poderosos, os observadores tendem a ignorar o poder e a influência que surgem por fora dessas configurações, por intermédio das quais decisores políticos se movem e fazem acordos entre si. Olhando para os triângulos de forma fechada, tendemos a perder as redes bastante abertas de pessoas que cada vez mais estão relacionadas com o governo (Heclo, 1978, p. 88, tradução nossa). 454 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil Heclo propõe um olhar mais atento sobre os diferentes interesses em jogo, numa visão mais pluralista da relação entre diferentes grupos sociais do que a visão elitista, presente na ideia do triângulo de ferro. O autor propõe, alternativamente, o enfoque em redes de temáticas, ou issue networks. Olhando para os “poucos” que são poderosos, tendemos a ignorar os “muitos” cujas redes de influência induzem e orientam o exercício do poder. Essas redes, ou o que eu chamarei de “redes temáticas”, são particularmente relevantes para a compreensão de políticas altamente complexas, como as políticas de bem-estar que foram realizadas nos últimos anos (Heclo, 1978, p. 102, tradução nossa). Enquanto o conceito de triângulos de ferro parte do pressuposto da existência de um grupo pequeno de participantes autônomos e relativamente estáveis, reunidos de forma a exercer estrito controle sobre programas públicos que afetassem seus interesses econômicos, as redes temáticas envolveriam uma quantidade maior de participantes, que se relacionariam em diversos níveis de comprometimento e dependência. Nessas redes, a permanência dos grupos seria mais fluída e menos estável, uma vez que seu ingresso e saída se dariam de forma constante. Além disso, o interesse material seria secundário: o principal interesse dos participantes dessas redes seria o comprometimento intelectual ou emocional. Assim, o elemento que os manteria unidos na rede seria o compartilhamento de uma base comum de informação e uma compreensão compartilhada sobre uma política e seus problemas. Para o autor, “uma issue network é um grupo de conhecimento compartilhado que tem a ver com algum aspecto (ou, como definido pela rede, algum problema) de política pública” (Heclo, 1978, p. 103, tradução nossa). O conceito de rede, desenvolvido por Heclo, foi aprofundado por diversos autores durante as décadas seguintes (de 1980 em diante), destacando a fragmentação e a ausência de um grupo (ou poucos grupos) dominante na produção de políticas públicas. Uma das perspectivas mais influentes é a proposta por Rhodes (1988), que desenvolveu a ideia de policy networks. Para Rhodes (2008), as origens da ideia de rede de políticas públicas (policy network) residem na perspectiva pluralista desenvolvida pelos estadunidenses e na literatura sobre os subgovernos. O autor destaca a influência dos estudos desenvolvidos por pesquisadores nos Estados Unidos sobre os grupos de interesse, sobretudo os estudos que analisaram tais grupos sob a ótica dos subsistemas, subgovernos e redes temáticas, como contribuições fundamentais à elaboração do conceito de redes. Tal perspectiva, calcada no pluralismo estadunidense, permitiu o Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 455 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas desenvolvimento de explicações não apenas sobre o relacionamento entre o Estado e os diferentes grupos que buscam influenciar a produção de políticas públicas, mas também o interesse do próprio Estado em obter apoio desses grupos. Tais relações de interesse são recíprocas, ou seja, tanto o Estado quanto os diversos grupos buscam trocar experiências, conhecimentos e influência. Tais padrões de relacionamento, aponta o autor, se institucionalizam e se tornam parte do dia a dia das organizações públicas. [...] eles [os grupos] são consultados antes de os documentos serem enviados para consulta. Eles não fazem lobby. Eles almoçam juntos. Esses padrões rotineiros de interação entre governo e interesses se transformam em redes de políticas públicas. (Rhodes, 2008, p. 427, tradução nossa). Assim, as redes representam uma abordagem que, de certa forma, rompe com a dicotomia Estado-sociedade, ao entender que atores pertencentes aos quadros governamentais são também atores sociais e mantêm relações constantes com outros atores numa ampla rede de relacionamentos. Outro conceito, bastante relacionado à ideia de redes, é o de comunidades de políticas (policy communities), que se desenvolve entre os anos 1970 e 1980, sobretudo no contexto do Reino Unido. Embora ainda não haja consenso na literatura a respeito de uma definição precisa sobre o termo, grande parte dos pesquisadores associa a ideia de comunidades de políticas ao modelo de Rhodes, que as define em termos das seguintes características principais: participação limitada, alta integração entre os membros, consistência ao longo do tempo, controle de recursos e distribuição balanceada de poder: A comunidade de políticas tem as seguintes características: um número limitado de participantes com alguns grupos conscientemente excluídos; interação frequente e de alta qualidade entre todos os membros da comunidade em todos os assuntos relacionados com as questões das políticas; consistência em valores, a fidelidade e os resultados das políticas que persistem ao longo do tempo; consenso com a ideologia, valores e preferências políticas gerais compartilhadas por todos os participantes; e relações de troca com base em todos os membros da comunidade política controlando alguns recursos. (Rhodes, 2008, p. 427, tradução nossa). As comunidades configurariam um extremo da rede de políticas públicas, sendo o outro extremo caracterizado pelas redes temáticas. Segundo Rhodes, as redes temáticas têm participação ampla, baixa integração entre os membros, ausência de consenso, conflito e relações assimétricas de poder entre os integrantes. 456 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil As redes temáticas são caracterizadas por: existência de muitos participantes; interações flutuantes e acesso de vários membros; pela ausência de consenso e pela presença de conflitos; interação com base em consultas em vez de negociação ou de barganha; uma relação desigual de poder e que muitos participantes podem ter poucos recursos, pouco acesso e nenhuma alternativa. (Rhodes, 2008, p. 428, tradução nossa). Assim, as comunidades representam, para Rhodes, uma modalidade específica de rede, caracterizada por alta integração e padrões densos de relacionamento entre os atores. Rhodes alerta para o fato de que a comunidade de políticas, tal como descrita por ele, consiste em um tipo ideal, sem necessária correspondência com a realidade empírica. No entanto, apesar da diferenciação proposta pelo autor, a literatura especializada ainda não registra consenso em relação aos conceitos de redes e comunidades (Miller; Demir, 2007). Howlett e Ramesh (2003) mostram que os dois termos figuraram como sinônimos durante alguns anos e só mais recentemente a ideia de comunidade tem sido diferenciada da noção de rede. Para os autores, as comunidades e as redes de políticas formam a estrutura dos subsistemas. No entanto, ambos os termos estão ligados a dinâmicas distintas de relacionamento entre os atores na produção de políticas públicas. As comunidades representam o conjunto de atores que detêm algum tipo de conhecimento sobre uma política e que constroem de forma coletiva um discurso sobre ela. Dentro dessas comunidades, formam-se outros grupos de atores que se relacionam de forma regular e sistemática, em função de seus interesses. Assim, a diferença básica entre comunidades e redes de políticas públicas reside nas motivações que orientam os relacionamentos entre os atores: o compartilhamento de ideias, no caso das comunidades, e a defesa de interesses, no caso das redes. A principal vantagem de se distinguir redes de políticas de comunidades de políticas está na maneira em que se integra a análise de dois diferentes conjuntos de motivações que orientam as ações de todos os envolvidos na formulação de políticas: o conhecimento (ou a expertise) e o interesse (...). Ao associar uma comunidade de políticas com uma base de conhecimentos específicos e uma rede de políticas com atores que interagem na busca de seus interesses, dois aspectos diferentes da atividade do subsistema são colocados em destaque. (Howlett; Ramesh, 1998, p. 469, tradução nossa). Dessa forma, segundo a interpretação dos autores, enquanto as comunidades estão relacionadas às ideias, as redes estão relacionadas aos interesses e, dessa forma, a literatura de subsistema tem contribuído para a chamada “guinada póspositivista”, operacionalizando a análise de políticas pública sob essa perspectiva (Howlett; Ramesh, 1998). Ao considerar o duplo padrão de relacionamento entre Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 457 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas os atores, a literatura baseada nos subsistemas tem contribuído para análises que compreendem os atores para além da perspectiva positivista que opõe ação e estrutura. Além disso, tal literatura também tem superado a visão dicotômica entre Estado e sociedade, possibilitando a análise conjunta de atores estatais e sociais. A ênfase nos subsistemas permite integrar ideias e interesses, elementos fundamentais das abordagens centradas nas ideias, sejam elas nomeadas como pós-positivistas, construtivistas, pós-modernas ou pertencentes à chamada guinada argumentativa (Fischer; Forester, 1993; Majone, 1989; Yanow, 1996; Stone, 2002; Fischer, 2007; Béland; Cox, 2011). Essa literatura, que se expandiu sobretudo a partir dos anos 1990, tem demonstrado que a disputa sobre as interpretações, representações simbólicas e a construção dos discursos está no centro do processo de produção de políticas públicas. Apesar desse relativo consenso sobre a importância das ideias, os autores diferem quanto às possíveis definições do termo, considerando as ideias como crenças, valores, visões de mundo ou entendimentos compartilhados. Há divergências também quanto à influência das ideias sobre o processo de produção de políticas, dado que, para alguns autores, as ideias seriam a principal chave explicativa desses processos, enquanto para outros as ideias seriam tão importantes quanto outros elementos, como as instituições políticas, grupos, regras, estruturas sociais, entre outros fatores. A relação entre ideias e interesses é outro tema frequente, porém pouco aprofundado nessa literatura sobre políticas públicas. Para alguns autores, interesses nada mais são do que formas específicas de ideias, constituídas social, política e historicamente. Por outro lado, por vezes a literatura ainda faz menção a interesses desvinculados da percepção dos atores. Mais do que tentar definir se interesses são subordinados às ideias ou vice-versa, cabe discutir como ideias e interesses se manifestam na produção de políticas públicas. Analisar as interações entre atores nos subsistemas nos permite identificar o processo complexo e dinâmico de construção de interesses, ao invés de tomar interesses materiais como elementos estáticos, derivados do contexto no qual os atores se situam (Hay, 2011). Do ponto de vista metodológico, tomar os subsistemas como unidade de análise pode não apenas mostrar que as “ideias importam”, mas fundamentalmente explicar “como as ideias importam” (Metha, 2011). Apesar das imprecisões conceituais, a perspectiva de redes e comunidades de políticas, bem como as distintas noções sobre ideias e interesses têm se expandido na literatura de políticas públicas a partir dos anos 1990. Em tais abordagens, os diferentes tipos de relacionamento estabelecidos entre os diversos atores (estatais e não estatais), desenvolvidos num contexto institucional específico, explicam as formas pelas quais o sistema político produz as políticas públicas. Explicar como os relacionamentos que se estabelecem nas comunidades e redes são formados e como são alterados ao longo do tempo, gerando mudanças nas políticas públicas, 458 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil é o desafio dos principais modelos de análise em políticas públicas na atualidade. Nas próximas seções, buscaremos apontar como três modelos que se apoiam nessa perspectiva têm lidado com essa questão. O modelo de múltiplos fluxos (multiple streams): comunidades de políticas na geração de alternativas e soluções A abordagem proposta por John Kingdon (2003), para explicar mudanças na agenda governamental (agenda-setting), contribuiu para ampliar a compreensão sobre o processo de produção de políticas públicas não só em relação ao momento da formulação, mas auxiliou no entendimento de aspectos mais amplos do processo político, como a natureza “anárquica” da tomada de decisão em organizações burocráticas e a dimensão das ideias como elemento essencial para a análise política2. As comunidades de políticas são centrais ao modelo de Kingdon, que as caracteriza como um conjunto de especialistas que atuam numa área específica (saúde, educação, habitação, transporte etc.). Tais especialistas podem fazer parte do governo, como assessores parlamentares, servidores do Poder Executivo ligados a atividades de planejamento, orçamento ou às áreas funcionais em questão. Da mesma forma, os especialistas podem integrar consultorias, grupos de interesse ou instituições de pesquisa em organizações não estatais. Em comum, os especialistas compartilham preocupações com relação a uma determinada área de política. Em algumas comunidades, as interações se processam de forma coesa e integrada, como relata Kingdon em suas experiências de entrevistas junto a membros de comunidades. As pessoas na comunidade da saúde conhecem as ideias, propostas e pesquisa uns dos outros, e muitas vezes se conhecem muito bem pessoalmente. Como um sutil indicador dessas interações, eu pedi aos entrevistados para citarem outros com quem eu deveria falar. Os mesmos nomes rapidamente vieram à tona conforme eu ia de uma pessoa para a outra, o que sugere que o círculo de especialistas era relativamente pequeno e bastante íntimo. Mais de uma vez, a entrevista foi interrompida por um telefonema de alguém que também estava na minha lista de entrevistados. (Kingdon, 2003, p. 117, tradução nossa). O processo de formação de agenda, tal como desenvolvido por Kingdon, tem suas raízes no “modelo da lata do lixo”, proposto por Cohen, March e Olsen (1972). Esse modelo foi desenvolvido para a análise de organizações que se configuram como “anarquias organizadas”, operando em condições de grande incerteza e ambiguidade (como universidades e governos nacionais), nas quais estão presentes três características principais: participação fluida, preferências problemáticas e tecnologia pouco clara. Tais características organizacionais foram adaptadas por Kingdon como base de seu modelo teórico. 2 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 459 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas Os estudos do autor revelaram que comunidades em torno dos temas da área de saúde são, geralmente, bastante coesas. Embora os participantes tenham vínculos profissionais distintos, as interações são frequentes e seguem o padrão descrito na citação acima. Já na área de transportes, a observação resultou em uma percepção bastante distinta, apontando para uma comunidade altamente fragmentada e que tendia a se aglutinar em torno de subáreas ainda mais especializadas, como transporte aéreo, ferroviário, rodoviário, urbano, entre outras. Em suas investigações, Kingdon notou que dificilmente um participante encontrava-se inserido em mais de uma dessas áreas, que concentram diferentes tecnologias, grupos de interesse e funcionam sob jurisdição de órgãos públicos distintos. Kingdon mostra que esses diferentes padrões de interação, presentes nas comunidades, têm influência sobre a forma como as políticas são produzidas em cada área. Em áreas de políticas nas quais comunidades são mais coesas (como no caso da saúde), os integrantes compartilham perspectivas, orientações e referenciais mais gerais sobre os temas que os unem. Dessa forma, os entendimentos são compartilhados e a comunidade se torna cada vez mais integrada. Por outro lado, em comunidades fragmentadas (como no exemplo dos transportes), a ausência de um entendimento comum torna as próprias comunidades também mais instáveis. Como resultado, a formulação das políticas de saúde tende a se apresentar de forma mais estruturada, o que facilita seu ingresso na agenda, ao contrário das questões oriundas de comunidades mais fragmentadas, como no exemplo da área de transportes. As comunidades são consideradas pelo autor como espaços fundamentais para a geração de ideias relativas a soluções e alternativas que podem ser desenvolvidas e adotadas como políticas públicas pelos tomadores de decisão. Quando os participantes de uma comunidade apresentam propostas sobre uma determinada questão, algumas delas serão consideradas, enquanto outras serão descartadas pelo próprio grupo, no processo que Kingdon assemelha à seleção natural. Propostas viáveis tecnicamente e adequadas aos valores do grupo e do mundo político acabam alcançando consenso dentro de uma comunidade. Tal consenso se difunde por meio do processo denominado pelo autor como policy bandwagon, mecanismo pelo qual uma ideia vai progressivamente se expandindo e se difundindo para o grupo como um todo, até se constituir como uma questão trivial. As comunidades são, portanto, espaços de experimentação de ideias, de debate e difusão. É importante destacar que as comunidades seguem uma lógica própria, distante da dinâmica política, ou seja, as comunidades funcionam de forma independente do calendário eleitoral e das mudanças nos postos de comando da alta burocracia, e também não são diretamente afetadas pelas pressões da opinião pública sobre 460 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil a ação governamental. Por outro lado, as ideias geradas nas comunidades não estão necessariamente ligadas a problemas a serem resolvidos. O modelo, baseado em três processos (ou fluxos) que afetam a formação da agenda governamental – problemas, soluções ou alternativas e contexto político –, pressupõe uma certa independência entre esses três elementos. Assim, o modelo assegura às comunidades papel fundamental no desenvolvimento das ideias que podem ser adotadas pelos formuladores de políticas. A atividade das comunidades, entretanto, não constitui condição suficiente para explicar o ingresso de uma questão na agenda governamental, uma vez que o modelo destaca a importância da confluência entre as propostas (geradas pelas comunidades no fluxo de soluções), a percepção de problemas (no fluxo de problemas) e um contexto político favorável (fluxo político). Ou seja, as comunidades e as ideias que circulam nesses espaços são importantes, mas não explicam, por si sós, mudanças em políticas públicas. É importante considerar, ainda, o papel exercido pelos empreendedores de políticas públicas – indivíduos ou grupos de indivíduos considerados fundamentais para a mudança na agenda governamental no modelo de múltiplos fluxos. Uma das tarefas principais dos empreendedores consiste na defesa de ideias a respeito de problemas e soluções relacionados a uma política e grande parte dessa atividade se desenvolve junto às comunidades. Os empreendedores atuam na estruturação do debate interno das comunidades a respeito de possíveis mudanças a serem introduzidas numa política, defendendo relações causais entre problemas e soluções, destacando aspectos de propostas que sejam adequados aos seus membros. Além disso, o empreendedor atua nas conexões entre uma comunidade e outros grupos, por meio do estabelecimento de contato com diferentes audiências, da difusão e experimentação de ideias. O modelo do equilíbrio pontuado (punctuated equilibrium): ênfase nos monopólios de políticas O modelo do equilíbrio pontuado foi proposto por Baumgartner e Jones (1993) para analisar longos períodos de estabilidade na produção das políticas públicas, nos quais as elites dominam uma área de política, e também rápidos períodos de mudança, nos quais não se verifica a preponderância dessas elites. Os autores partem da perspectiva de que o sistema político é estruturado em torno de arranjos que proporcionam benefícios contínuos para alguns grupos privilegiados, estudados na literatura da ciência política como subsistemas, redes temáticas ou triângulos de ferro, entre outras denominações. Tais arranjos (e os autores se referem especificamente à ideia de subsistemas) se formam devido ao processamento paralelo de decisões nas organizações públicas: algumas estruturas decisórias Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 461 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas conseguem lidar com diversas questões simultaneamente (processamento paralelo), enquanto outras lidam com uma questão por vez (processamento serial). Os sistemas políticos, como os seres humanos, não podem considerar todos os problemas que enfrentam de forma simultânea. Assim, a existência de alguma forma de subsistema da política pode ser vista como um mecanismo que permite que o sistema político se desenvolva em processamento paralelo. Milhares de questões podem ser consideradas simultaneamente em paralelo dentro de suas respectivas comunidades de especialistas. (...) O processamento paralelo funcionaria contra mudanças políticas maiores, porque tende a ser isolado dos holofotes da publicidade associada com a agenda da alta política (macro system agenda) (True; Jones; Baumgartner, 1999, p. 100, tradução nossa). Os subsistemas, para os autores, constituem-se como comunidades de especialistas caracterizadas por participação limitada e mudanças lentas e incrementais. Há, no entanto, momentos em que algumas questões escapam ao processamento insulado nos subsistemas e acessam a high-agenda politics, ou o macrossistema, que processa as questões de forma serial (uma a uma) e isso geralmente ocorre quando outros participantes tornam-se interessados nelas. “As questões não podem ser consideradas para sempre dentro dos limites de um subsistema, ocasionalmente forças macropolíticas intervêm” (True, Jones; Baumgartner, 1999, p. 100, tradução nossa). O acesso de uma questão ao macrossistema é o momento em que as maiores mudanças numa política tendem a ocorrer, podendo gerar, como consequência, mudanças nos próprios subsistemas. Assim, subsistemas são continuamente criados ou destruídos e, segundo os autores, a literatura tem falhado em analisar não apenas os períodos de estabilidade, característicos dos subsistemas, mas também os períodos de mudanças. O modelo do equilíbrio pontuado busca permitir a análise tanto da produção de políticas em subsistemas, caracterizados sobretudo pela estabilidade e participação limitada, quanto das rupturas desses subsistemas, processo marcado por rápidas mudanças e acesso de novos participantes. Central ao modelo é o conceito de monopólios de políticas (policy monopolies). Tais monopólios são caracterizados por dois aspectos. Em primeiro lugar, um entendimento compartilhado – uma imagem (policy image) – a respeito da política de interesse. Quando um entendimento específico se torna dominante, os atores ganham a habilidade de controlar a interpretação sobre um problema e a forma como esse é percebido e discutido. As imagens são desenvolvidas com base em informações empíricas e em apelos emotivos (enquadramentos positivos 462 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil ou negativos a respeito de uma questão, por exemplo). Tal imagem geralmente está associada a valores políticos e pode ser comunicada de forma simples e direta ao público, reforçando o controle do monopólio sobre a questão. Em segundo lugar, os monopólios são reforçados por arranjos institucionais que mantêm o processo decisório limitado a um grupo pequeno de atores, restringindo o acesso dos demais. Esses monopólios são responsáveis pela manutenção da estabilidade na produção de políticas públicas e pela restrição de novas questões à agenda governamental. Enquanto uma visão compartilhada sobre símbolos, problemas, soluções e relações causais prevalecer a respeito de uma determinada política, restringese o acesso ao processo decisório daqueles atores que não concordam com essa imagem. Tem-se, então, a prevalência de mudanças lentas, graduais e incrementais, configurando uma situação de equilíbrio na produção das políticas públicas. No entanto, em alguns momentos, novos atores conseguem acesso aos monopólios, criando instabilidade e a oportunidade de mudança na agenda. Isso acontece, segundo os autores, por causa de mudanças na forma como uma questão é compreendida, ou seja, por meio de alterações na imagem de uma política. Mudanças na percepção das questões, acontecimentos que focalizem atenção do governo, alterações na opinião pública, por exemplo, podem contribuir para a alteração na imagem de uma política, permitindo o acesso de diferentes grupos ao processo decisório e, dessa forma, favorecendo o acesso de questão à agenda governamental. Quando uma questão ascende ao macrossistema, o monopólio deixa de existir e o sistema torna-se propenso à mudança, já que a atenção dos líderes governamentais e do público pode levar à introdução de novas ideias e de novos atores. As novas ideias e instituições tendem a permanecer ao longo do tempo (policy legacy), criando um novo estado de equilíbrio no sistema político que, após um período, tende a voltar à estabilidade. Assim, o modelo de equilíbrio pontuado toma como unidade básica de análise os monopólios de políticas, destacando a dimensão das ideias na estruturação desses espaços de atuação. A abordagem desenvolvida por Baumgartner e Jones (1993) também pressupõe a atividade dos empreendedores junto aos monopólios de políticas. Nesse aspecto, os empreendedores exercem influência na construção da imagem de uma política, elemento importante para mobilizar a atenção e apoio a determinadas proposições. O modelo representa, assim, um desenvolvimento importante na literatura sobre os subsistemas, considerando não apenas a estabilidade característica desses, mas os mecanismos de mudanças que impactam a produção de políticas numa determinada área, e o papel das ideias nesse processo de mudança. Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 463 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas O modelo das coalizões de defesa (advocacy coalition framework): subsistemas, crenças, valores e ideias Inicialmente apresentado por Sabatier e Jenkins-Smith (1993), o modelo das coalizões de defesa se propõe a analisar mudanças nas políticas públicas, destacando o papel da informação técnica no processo de disputas que envolvem múltiplos atores em distintas esferas e níveis de governo (Sabatier; Weible, 2007). Os autores refutam a ideia de ciclo de políticas e tentam explicar o complexo processo de produção de políticas públicas em sua integralidade. De acordo com Sabatier e Jenkins-Smith (1993), as políticas públicas são estruturadas em subsistemas, os quais são constituídos pelo conjunto de diversos atores, sejam eles individuais, coletivos, organizações públicas ou privadas, que lidam com uma determinada área ou problema de ordem pública. O modelo fornece critérios para explicar a mudança na política pública em longos períodos de tempo, bem como mudanças nas convicções dos atores. Também proporciona mecanismos claros para distinguir mudanças de maior e de menor porte em uma política. As alterações de maior porte ocorrem no núcleo político (policy core) e são menos frequentes, em geral são causadas por fatores exógenos ao subsistema, como questões macroeconômicas ou mudanças governamentais. Já as alterações de menor porte ocorrem nos aspectos instrumentais e são mais associadas a fatores cognitivos, isto é, estão relacionadas à concretização do aprendizado orientado a políticas públicas. Outro ponto forte desse modelo, de acordo com os autores, é a questão do aprendizado orientado a políticas públicas, que trata da capacidade, ou não, de os principais atores modificarem objetivos, estratégias e posturas a partir das experiências obtidas na dinâmica interna do próprio subsistema ou a partir de novas informações técnicas e percepções oriundas da dinâmica externa. Dentro de cada subsistema, existem entre duas a cinco coalizões de defesa, que podem ser entendidas como pessoas de várias posições políticas (funcionários públicos, representantes eleitos, empresários, pesquisadores, intelectuais, sociedade civil, entre outros) que mantêm um grau coordenado de ações políticas ao longo do tempo e que compartilham crenças, valores, ideias e objetivos políticos semelhantes. O que mantém cada coalizão unida é o compartilhamento dessas crenças entre os membros sobre assuntos políticos entendidos como fundamentais. Ao adotar o termo coalizão, os autores indicam que os atores estão inseridos em um subsistema político, entendido como o locus onde ocorrem discussões e debates de múltiplos atores motivados pela defesa de suas crenças. Atores de diferentes origens e níveis de governo compartilham sistemas de crenças específicos e atuam coordenadamente com o objetivo de tornar os seus posicionamentos predominantes nos programas e políticas de governo. 464 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil [...] o ACF (advocacy coalition framework) sugere que o mais útil nível e unidade de análise são os grupos, por exemplo, as coligações em um subsistema de política definidas como um conjunto de agentes envolvidos com o mesmo problema. O que importa é entender como as coalizões são formadas, como adquirem recursos e desenvolvem crenças políticas, e como elas tentam influenciar as decisões das autoridades soberanas” (Zahariadis, 1998, p. 437, tradução nossa). Na perspectiva do modelo, as coalizões são geradas a partir de convicções, opiniões, ideias e objetivos dos atores envolvidos no processo do fazer política pública. Esse conjunto de ideais e convicções unido aos recursos políticos formata as coalizões e concretiza os objetivos e os interesses dos atores. São, portanto, as coalizões de defesa, dependendo de sua extensão e da natureza da política em causa, que determinam quais atores participam no sistema político, em uma abordagem de subsistemas que permite alocar uma multiplicidade de atores (Sabatier; Weible, 2007). Nesse processo que busca influenciar a produção de políticas correspondentes às crenças dos grupos inseridos nos subsistemas, o modelo destaca o papel dos especialistas, entendido como atores que podem orientar os processos de aprendizado dentro e entre coalizões de defesas. O aprendizado é beneficiado pela análise dos resultados e impactos das políticas, realimentando assim o subsistema por meio da modificação de crenças, convicções e recursos. Subsistemas interagem com outros sistemas mais amplos (social, econômico, legal e institucional) na atualização de informações e produção de novos conhecimentos. Isso significa dizer que, no nível macro, ainda que a maior parte dos processos de políticas ocorra entre especialistas dentro de um subsistema de política pública, seus comportamentos são afetados por fatores mais amplos presentes no sistema político e socioeconômico, e suas decisões, em contrapartida, também afetam o macrossistema, não se limitando ao subsistema ao qual estão inseridos (Sabatier; Weible, 2007). Dessa forma, o conceito de coalizões parece se aproximar do significado de comunidades políticas, ao assumir que a especialização é tida como condição necessária para o indivíduo/grupo influir no processo de formulação de políticas. [...] o ACF (advocacy coalition framework) assume que a informação científica e técnica desempenha um papel importante ao modificar as crenças dos participantes da política, o que, correspondentemente, assume que pesquisas (cientistas universitários, analistas políticos, consultores, etc.) são os atores centrais no processo político (Sabatier; Weible, 2007, p. 192, tradução nossa). Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 465 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas É, portanto, a forte relação entre os membros, o compartilhamento e a coesão de valores, ideias e crenças, somado aos domínios técnicos e legais sobre políticas específicas que legitima a participação dos atores e a formação de coalizões de defesa (Sabatier; Weible, 2007). Subsistemas, comunidades, monopólios e coalizões na mudança de políticas públicas Os três modelos aqui apresentados – múltiplos fluxos, equilíbrio pontuado e coalizões de defesa – tomam os conceitos de subsistemas, comunidades e redes como base, embora analisem de forma distinta suas influências no processo político. Três elementos são importantes para delinear similaridades e diferenças entre as categorias empregadas pelos autores analisados: quem são os participantes das comunidades e subsistemas, quais são os elementos que permitem a integração desses participantes nesses arranjos e qual o papel desses conceitos na explicação dos processos de mudança, considerando a lógica interna de cada uma das abordagens teóricas. No modelo de Kingdon (2003), o conceito de comunidade de política recebe especial ênfase especialmente em processos de definição de alternativas. É importante lembrar que o processo de definição de alternativas é diretamente influenciado pelos “participantes invisíveis” (acadêmicos, burocratas de carreira, funcionários do Congresso, grupos de interesse, nomeados políticos no Executivo que ocupam níveis hierárquicos mais baixos). De forma distinta, o processo de definição da agenda é influenciado pelos “participantes visíveis” (o Presidente e seus indicados nas primeiras linhas de comando da burocracia pública, a mídia, atores relacionados às eleições), que recebem atenção da imprensa e do público. Na lógica do modelo de múltiplos fluxos, quando os participantes visíveis procuram afetar a agenda, buscam alternativas junto aos participantes menos visíveis nas comunidades de políticas (Kingdon, 2003, p. 70). Portanto, as comunidades de políticas para Kingdon são formadas por especialistas, ou seja, uma fração dos atores envolvidos no processo como um todo. No modelo de Baumgartner e Jones (1993), os subsistemas também são compostos por especialistas que operam fora dos holofotes da macropolítica. Nos subsistemas, esses especialistas mantêm interações frequentes e conhecem as propostas dos demais, da mesma forma como apontado por Kingdon com relação às comunidades. Alguns subsistemas são mais abertos à participação de novos atores, enquanto outros propiciam o surgimento dos monopólios, restringindo acesso de novos participantes. No modelo de Sabatier e Jenkins-Smith (1993), os subsistemas consistem no espaço em que diferentes coalizões de defesa competem para garantir políticas consistentes com suas crenças. 466 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil Assim, para os autores, subsistemas envolvem atores relacionados a uma política, enquanto as coalizões de defesa são arranjos em que os atores (governamentais ou não) que compartilham de um sistema de crenças agem de forma coordenada ao longo do tempo em busca da realização de seus objetivos (Sabatier, 1988). Em termos da integração entre os membros, as comunidades de políticas no modelo de Kingdon são apresentadas tanto como grupos coesos, como grupos mais fragmentados, dependendo da área em questão. A coesão entre os membros de uma comunidade está relacionada ao emprego de uma linguagem comum, ou ao compartilhamento de um paradigma em comum, como Kingdon aponta em seus achados baseados nas entrevistas com profissionais da área de saúde (comunidade bastante coesa segundo o autor). Grupos coesos são fundamentais ao modelo de Baumgartner e Jones, uma vez que essa é uma das características dos monopólios de políticas. A definição de uma imagem em uma política, ou seja, o compartilhamento de um entendimento específico mantém os participantes de um monopólio unidos porque requer a aderência a determinadas percepções de problemas e alternativas, além de excluir a participação de outros participantes portadores de outros entendimentos. A coesão também figura como característica central das coalizões de defesa. Nesse modelo, as coalizões são estruturadas em torno de um sistema de crenças entendidos como “valores básicos, pressuposições causais e percepção de problemas” (Sabatier, 1988, p. 139). Como vimos, há três níveis distintos de crenças: crenças básicas e mais resistentes (valores e crenças individuais e pessoais); crenças relativas à política e que podem gerar consideráveis mudanças em relação a uma política (percepções comuns sobre o subsistema e os valores compartilhados sobre a política de interesse desse subsistema); crenças específicas que representam mudanças menores (relacionadas à visão do problema e à importância dos fatores causais desses problemas, bem como o desenho das instituições, avaliação do desempenho dos atores e alocações orçamentárias). Com relação à mudança em políticas públicas, os conceitos adotados pelas três abordagens desempenham papel central, mas são considerados de forma distinta. No modelo de Kingdon, uma característica das comunidades de políticas em específico – sua coesão – configura-se como um elemento importante para explicar a mudança na agenda: quanto mais integrada a comunidade, mais facilmente desenvolve-se uma linguagem comum, orientações e visões de mundo, resultando em maior estabilidade na agenda. A aceitação de novas ideias e valores numa comunidade integrada depende de um amplo processo de convencimento (softening up) entre os especialistas. Por outro lado, quanto menos integrada a comunidade, menor a capacidade de coordenação interna e mais frequentemente novas ideias se inserem entre os membros, levando à instabilidade na agenda. Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 467 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas Apesar disso, a mudança na agenda, no modelo de Kingdon, não resulta apenas das características das comunidades, uma vez que essas contribuem mais diretamente para um dos três processos por meio dos quais a agenda é alterada. Já no modelo de Baumgartner e Jones, as características presentes nos monopólios são centrais para explicar mudanças na agenda. Como os monopólios produzem estabilidade, ao limitar o acesso de novos participantes e ao se organizarem em torno de um entendimento fortemente compartilhado, a mudança se processa apenas com o rompimento desse arranjo. Assim, as características específicas de um subsistema consistem na chave para o entendimento das mudanças e continuidades em políticas públicas no modelo do equilíbrio pontuado. A explicação da mudança em políticas públicas também está ancorada na ideia de subsistemas no modelo das coalizões de defesa (Sabatier; Jenkins-Smith, 1993; Sabatier; Weible, 2007). A estabilidade de uma política está relacionada ao domínio de subsistema por uma coalizão, com base na manutenção das crenças em seu núcleo político (policy core), processo que pode permanecer inalterado por longos períodos de tempo. A mudança, por outro lado, pode se processar de duas formas: pequenas mudanças decorrem do processo de aprendizado dos atores nas coalizões e mudanças mais profundas têm origem em choques externos que obrigam as coalizões a questionarem suas crenças mais profundas. Assim, a mudança numa política pode ser influenciada pela interação entre coalizões em competição, dentro de um subsistema, ou por mudanças externas ao subsistema que provocam alterações nas coalizões. Ao privilegiarem a perspectiva dos subsistemas, os três modelos teóricos contribuem para destacar diferentes aspectos da relação entre as ideias e mudanças em políticas públicas. As ideias estão no centro das explicações sobre a dinâmica de funcionamento das comunidades na geração de alternativas e soluções (Kingdon, 2003). As ideias também auxiliam na compreensão de períodos de mudança e de estabilidade em políticas, por meio de imagens que, juntamente com instituições, estruturam os monopólios de políticas e promovem tanto situações de equilíbrio quanto de ruptura em políticas públicas (Baumgartner; Jones, 1993). Ideias também mantêm indivíduos unidos em coalizões que, em disputa, produzirão mudanças em políticas públicas (Sabatier; Jenkins-Smith, 1999). Cada modelo, com suas opções metodológicas, oferece alternativas de operacionalização de análises de políticas públicas centradas nos conceitos de subsistemas, comunidade e redes, incorporando a dimensão das ideias, muito embora parta de um entendimento distinto sobre o que elas representam de forma precisa, além de apontar para diferentes entendimentos de sua relação com a construção social dos interesses (Hay, 2011). 468 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil Uma síntese sobre a incorporação dos conceitos de subsistemas, comunidade e redes pelos três modelos é apresentada a seguir: Tabela 2: Comunidades, monopólios e coalizões nos modelos de análise de políticas Múltiplos fluxos Equilíbrio pontuado Coalizões de defesa Conceito empregado Comunidades de políticas Monopólios de políticas Coalizões de defesa Participantes Internos/externos ao governo. Internos/externos ao governo. Internos/externos ao governo. Especialistas ­(participantes ­invisíveis) ligados a uma área temática. Especialistas que processam ­questões insulados nos subsistemas. Especialistas reunidos em coalizões que integram subsistemas. Integração Papel na mudança em políticas públicas Alta nos Baseada em ­linguagem/paradigma ­monopólios de políticas, comum. ­organizados em torno de ­imagens Comunidades compartilhadas ­apresentam níveis distintos de coesão. sobre p ­ roblemas e soluções. Coalizões são ­estruturadas em ­torno de um sistema de crenças, valores, ideias e ­objetivos políticos ­compartilhados. Necessário, mas não suficiente. A competição entre coalizões em um subsistema produz mudanças nas políticas. Mudança também pode originar-se fora do ­subsistema, ­afetando as ­coalizões. Comunidades ­geram alternativas e a ­mudança depende de mais dois processos: problemas e política. Central: ­monopólios ­produzem ­estabilidade. ­Mudanças são ­produzidas por meio do colapso dos monopólios. Fonte: Elaboração própria. Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 469 Subsistemas, comunidades e redes: articulando ideias e interesses na formulação de políticas públicas Considerações finais O conceito de subsistemas vem sendo desenvolvido na literatura especializada como mecanismo explicativo das interações entre atores envolvidos numa determinada política pública. As concepções mais antigas sobre o funcionamento dos subsistemas – como as noções de subgoverno ou dos triângulos de ferro – caracterizavam a produção de políticas como um processo limitado a um número pequeno de participantes capazes de capturar o processo político-administrativo e direcioná-lo em função de seus próprios interesses. O conceito de redes de políticas públicas, desenvolvido a partir da década de 1970, permitiu uma visão mais flexível de subsistema ao reconhecer a influência de diversos grupos sociais na produção de políticas e ao estimular a análise de diferentes padrões de relacionamento entre Estado e sociedade. O aprofundamento da investigação sobre o relacionamento entre atores nessa nova perspectiva sobre os subsistemas originou, além da noção de redes, o desenvolvimento do conceito de comunidades de políticas públicas. As principais diferenças na literatura com relação a esses conceitos residem em entendimentos distintos sobre o número de participantes e atores envolvidos, o grau de especialização, a forma de ingresso e permanência nesses espaços, coesão e integração dos membros. Ainda que não exista um consenso a respeito dos conceitos de redes e comunidades, é possível compreender a partir deles a dinâmica de funcionamento dos subsistemas e seus impactos na produção de políticas públicas. Assim, a ênfase nos subsistemas e sua análise contemporânea, operacionalizada por meio dos conceitos de rede ou de comunidades, proporciona ao pesquisador de políticas públicas uma unidade de análise capaz de captar o dinamismo e a complexidade do processo de produção de políticas, seus múltiplos atores, ideias e interesses. Esse avanço teórico foi incorporado pelos três modelos teóricos mais promissores em políticas públicas hoje: múltiplos fluxos, equilíbrio pontuado e coalizões de defesa (John, 2003; 2012). Esses modelos podem ser entendidos como abordagens sintéticas (John, 2012) e procuram oferecer elementos para o estudo das políticas públicas considerando sua complexidade, ou seja, os múltiplos aspectos que exercem influência sobre uma política, sintetizando o conhecimento produzido, sobretudo na ciência política sobre instituições, redes, processos socioeconômicos e o papel das ideias. No que diz respeito à investigação dos subsistemas, redes e comunidades, o modelo de coalizões de defesa fornece “lentes teóricas” mais ajustadas aos fenômenos de políticas públicas ao considerar as coalizões como conjuntos de indivíduos portadores das mesmas crenças e interesses, capazes de estabelecer disputas com outras coalizões na mesma área de política. Assim, o modelo de coalizões de defesa permite investigar a dinâmica que se processa no interior dos 470 Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 Ana Cláudia Niedhardt Capella e Felipe Gonçalves Brasil subsistemas, explicando como os participantes disseminam ideias e defendem seus interesses, estabelecendo processos de barganha e formando alianças. O modelo de Kingdon avança nas explicações sobre processos de mudança, considerando que as comunidades são elementos fundamentais na produção de ideias sobre políticas. Já o modelo do equilíbrio pontuado lança luzes sobre a relação entre ideias e interesses no interior dos subsistemas, focalizando processos de criação e rupturas de monopólios. Tais abordagens vêm produzindo, ao longo das últimas três décadas, estudos setoriais relevantes nos Estados e Europa. Exemplos da aplicação empírica desses modelos podem ser encontrados em diversos tipos de políticas, como a de distribuição de recursos naturais e a produção de energia (Sabatier, 1988); a mudança na agenda após desastres naturais (Birkland, 1997); a formação da política nuclear norte-americana (Baumgartner; Jones, 1993) ou mesmo políticas setoriais mais gerais, como as de saúde e transporte (Kingdon, 2003), entre outras. Assim, já amadurecidas e frequentemente aplicadas para entender a produção de políticas nos contextos estadunidenses e europeus, é necessário que se empenhem esforços em testar essas ideias no Brasil. É preciso, portanto, verificar o caráter explicativo de seus modelos e a consequente formação e influência das comunidades e redes no sistema político brasileiro. Referências bibliográficas Baumgartner, Frank R; Jones, Bryan D. Agendas and Instability in American Politics. Chicago: University of Chicago Press, 1993. Béland, Daniel; COX, Robert H. Ideas and politics in Social Science research. New York, Oxford University Press, 2011. Birkland, Thomas A. An introduction to the policy process: theories, concepts, and models of public policy making. 2nd Ed. New York, ME Sharpe: 2005. . After disaster: agenda setting, public policy, and focusing events. Washington, DC: Georgetown University Press, 1997. Cohen, Michael D.; March, James G.; Olsen, Johan P. A garbage can model of organizational choice”. Administrative Science Quartely, nº 17, p. 1-25, 1972. Dye, Thomas. Understanding public policy. 11ª ed. Upper Saddle River,NJ: Prentice Hall, 2008. Dye, Thomas; Zeigler, Harmon. 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Felipe Gonçalves Brasil Doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). É bolsista FAPESP modalidade Doutorado. Foi Intern Student na North Carolina State University junto a School of Public and International Affairs (SPIA/NCState). Contato: [email protected] Revista do Serviço Público Brasília 66 (3) 449-474 jul/set 2015 473