O Caso Comitativo1 (Comitative case) Sebastião Expedito Ignácio1, Ana Carolina Sperança2 1 2 Departamento de Linguística – Universidade Estadual Paulista (UNESP – Araraquara) Programa de Pós-Graduação em Linguística e Língua Portuguesa – Universidade Estadual Paulista (UNESP – Araraquara) [email protected] Abstract: Comitative is a semantic case not much studied. Traditional grammar includes it sometimes as Indirect Object, sometimes as Adverbial Adjunct of Company. In this paper, we show that it is a nuclear element, therefore it is a Complement not an Adjunct; in other words, being a deep semantic case, it constitutes an Argument selected by the verb in the sentence organization. Keywords: comitative, semantic case, complement, adjunct. Resumo: O Comitativo é um caso semântico pouco estudado. A gramática tradicional o inclui ora como Objeto Indireto, ora como Adjunto Adverbial de Companhia. Neste artigo defendemos a posição de que se trata de um termo nuclear, portanto um Complemento e não um Adjunto; em outras palavras, sendo um Caso Semântico subjacente, constitui um Argumento selecionado pelo verbo na estruturação da oração. Palavras-chave: comitativo, função semântica, argumento, complemento, adjunto. 1. Considerações preliminares Fazendo-se um percurso pelos manuais que representam os conceitos linguísticos, as descrições gramaticais, os modelos de análise sintática com vistas ao ensino, nota-se uma inadequação na classificação de alguns complementos verbais classificados como adjuntos. Isso se deve ao fato de não se levar em conta a natureza valencial do verbo, ou seja, não se atenta para o valor semântico do núcleo verbal que exige o preenchimento de casas vazias com constituintes chamados nucleares ou complementos, diferentes de termos periféricos, não resultantes da valência do verbo, chamados adjuntos. A tendência a classificar os termos nucleares como adjuntos adverbiais reside no fato de que se leva em conta apenas os traços semânticos próprios dos advérbios como tempo, lugar, companhia, por exemplo, presentes nesses constituintes. Inclui-se nesse rol o Comitativo, termo nuclear, complemento de companhia, normalmente classificado como adjunto. Atualmente, alguns manuais e alguns dicionários, atinando com o problema, já andam incluindo na classe dos verbos transitivos os transitivos circunstanciais, na tentativa de sanar essa lacuna. Apenas dois dicionários, o Dicionário gramatical de verbos do português contemporâneo do Brasil (BORBA, 1991) e o Dicionário de usos do português do Brasil (BORBA, 2002), que segue a mesma orientação do primeiro, classificam aquele constituinte – o Comitativo – como complemento. No entanto, ainda não há uma sistematização abrangente e muitos verbos ora são classificados como transitivos circunstancias ora como intransitivos. No Dicionário Aurélio (1999), encontramos: 1 Gostaria de fazer uma singela homenagem ao prof. Sebastião Expedito Ignácio, por sua dedicação à pesquisa em Linguística no Brasil e, sobretudo, por sua amizade. Este artigo, cuja publicação se deu após seu falecimento, é resultado de sua participação cuidadosa, tanto na pesquisa quanto na redação do texto. 342 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 (01) descer (...) V.t.c. 19. Sair ou vir de lugar elevado: descer do morro. (...) 21. Baixar, pousar, descender: A nave desceu sobre o descampado. Em Houaiss et al. (2001), esse mesmo verbo, nas mesmas condições, é classificado como intransitivo: (02) descer (...) Intransitivo 7. baixar (alguma coisa) relativamente a outra: Ex.: a névoa descia até o nível das casas. Em relação ao Comitativo, os dicionários em geral classificam-no como Objeto Indireto. Essa classificação é indevida uma vez que o Objeto Indireto não exerce a mesma função semântica do Sujeito, como é o caso do Comitativo. Tomamos também do Dicionário Aurélio (1999) estes exemplos: (03) discutir (...) V.t.i. 5. Travar discussão; questionar: Não costuma discutir com o pai. (04) contracenar (...) V.t.i. 4. Representar, atuar, interpretar: Bibi Ferreira contracenou com Paulo Autran na peça O Homem de La Mancha. Essa situação despertou-nos o interesse pelo estudo desse caso semântico negligenciado até então. Partimos de um levantamento feito nos dois dicionários citados acima, Dicionário de usos do português do Brasil (BORBA, 2002), e Dicionário gramatical de verbos do português contemporâneo do Brasil (BORBA, 1991), onde se descreve a predicação verbal com base na gramática de valência. Embora não se mencione ali o termo Comitativo, este é sempre classificado como Complemento. Ex.: (05) DISCUTIR [Ação] [Suj Ag] (...) [Compl com+nome humano] 1 promover discussão; debater; altercar: Discutir com tio Inácio era impossível. (BS) (06) SAIR [Ação] [Suj Ag] (...) [Compl com+nome humano] (...) 10 ir em passeio; passear: Não saio mais com você. (PL); Naquela tarde saí com Germana. (LM) 2. Base teórica e conceitos operacionais básicos Não há trabalhos representativos sobre o caso Comitativo. A base teórica que sustenta esta discussão se insere no âmbito da gramática de valências (TESNIÈRE, 1961; CHAFE, 1979 [1970]; VILELA, 1984; BORBA, 1996) e na gramática de casos (FILLMORE, 1968, 1969; FILLMORE, LANGENDON, 1971; 1977a; 1977b) A primeira estuda os valores semânticos, a natureza morfossintática e o número dos elementos nominais obrigatórios (Argumentos) exigidos pelo verbo ou pelo nome. A segunda estuda as funções ou papéis temáticos ou casos, estruturas semânticas que se representam pelas funções sintáticas, ou seja, Agente para a função de Sujeito, Paciente, Instrumental para a função de Sujeito e Objeto, etc. Assim, o Comitativo é uma função 343 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 semântica que recobre o Complemento de Companhia, indevidamente classificado como Adjunto. Sobre a gramática de valência e gramática de casos, assim se pronuncia Borba (1996): Uma gramática de valência procura detectar relações de dependência entre categorias (básicas) que (co)ocorrem num contexto. (...) uma gramática de valências toma como nuclear um elemento oracional (o verbo) e demonstra como os demais se dispõem em torno dele através de relações de dependência. (...) A gramática de casos se preocupa com as funções semânticas subjacentes na organização da frase, devendo determinar as relações sintático-semânticas ou temáticas (funções ou papéis temáticos) que fazem parte da estrutura conceitual dos itens léxicos. (p. 16-17) 3. Valência, Regência e Transitividade Verbais O conceito de valência verbal se aproxima dos conceitos de regência e transitividade verbais, com a diferença de que o termo valência é mais abrangente e permite uma rediscussão da nomenclatura tradicional dos elementos que “completam” o sentido do verbo. Por regência se entende, tradicionalmente, a propriedade que têm os verbos de exigirem complementos, preposicionados ou não, classificados como Objetos (Indiretos ou Diretos). Daí serem considerados transitivos apenas os verbos que admitem esses complementos. Um verbo que exija um complemento de lugar ou de tempo, por exemplo, classifica-se, segundo a NGB, como intransitivo,2 como é o caso dos verbos que pressupõem um complemento de lugar (“ir”, “vir”, “chegar”, etc.), dos verbos que pressupõem complemento de tempo (“durar”, etc.) e, às vezes, de tempo e lugar concomitantemente (“ficar”, etc.). Em construções como: (07) Fomos a Brasília. (08) Chegamos a São Paulo. (09) A guerra durou dez anos. (10) Paulo ficou duas horas no ponto do ônibus. fica evidente a impropriedade em dizer-se que tais verbos sejam intransitivos. Note-se que o verbo “ficar”, no exemplo (10), exige dois complementos: um de tempo e outro de lugar. Por valência se entende a relação entre o verbo e os constituintes obrigatórios na organização da oração. Dessa forma, além dos complementos tradicionais (Objetos), incluem-se os chamados complementos circunstanciais (de tempo, lugar, etc.) e o próprio Sujeito. Por outro lado, enquanto a regência e a transitividade se restringem ao nível das relações sintáticas, a valência abrange também o nível semântico. Daí 2 Antes da simplificação feita pela Nomenclatura Gramatical Brasileira, alguns autores, percebendo a obrigatoriedade desses complementos chegaram a classificar os verbos em questão como transitivos adverbiais. 344 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 dizermos que um determinado verbo exige tantos complementos (valência quantitativa) com tais valores semânticos (valência qualitativa). Assim, o verbo “matar”, por exemplo, será bivalente (valência quantitativa), por exigir um Sujeito e um Objeto (Fulano matou Sicrano), como também seleciona um Sujeito [Agente] e um complemento [Paciente] e [+animado] (valência qualitativa). Borba (1996) fala em valência quantitativa, valência sintática e valência semântica: (i) valência quantitativa: como vimos, refere-se ao número de Argumentos necessários a preencherem as “casas vazias” do verbo – esse número vai de zero a quatro em português (q.v. os exemplos anteriormente citados); (ii) valência sintática: refere-se à natureza morfossintática dos elementos que constituem os Argumentos. Assim, por exemplo, o verbo “persuadir” prevê, além do SN1 que funciona como sujeito, um SN2 que funciona como Objeto Direto e um SOprep (Sintagma Oracional preposicionado, na forma infinitiva) que funciona como Objeto Indireto. Ex.: João persuadiu a esposa a ir com ele ao teatro. (iii) valência semântica: das propriedades semânticas dos verbos decorrem os papéis semânticos e traços que caracterizam os Argumentos. Um verbo como “galgar” seleciona um Sujeito Agente (+animado, ±humano) e um Complemento de Lugar: O alpinista galgou a montanha em poucas horas. OBSERVAÇÃO: Valência, Regência e Transitividade são propriedades que se detectam no funcionamento do verbo, isto é, na sua realização no discurso. Por isso não se pode dizer que um mesmo verbo tenha sempre as mesmas propriedades. Assim, um verbo primitivamente bivalente, transitivo, etc. pode, em determinadas circunstâncias, passar a funcionar como monovalente, intransitivo, etc. Seja, por exemplo, o verbo “comprar”, bivalente e transitivo direto numa oração como Minha mulher comprou um carro. Esse mesmo verbo será monovalente e intransitivo numa oração em que o complemento esteja “apagado”: Minha mulher não passa um dia sem comprar. Do mesmo modo, um verbo primitivamente monovalente e intransitivo pode funcionar como bivalente e transitivo. É o caso, por exemplo, do verbo “andar” nestes dois exemplos: (a) Esta criança ainda não anda. [monovalente; intransitivo] e (b) Andei toda a cidade a pé. [bivalente; transitivo circunstancial/lugar]; também, com o verbo “viajar” em: (c) Pedro viajou. [monovalente, intransitivo] e (d) Pedro viajou com a família apenas. [bivalente, transitivo], sendo o complemento pressuposto um Comitativo. O que não se pode confundir, todavia, é “apagamento” com “elipse”. Neste último caso, o complemento estará implícito, facilmente recuperável pelo contexto. Ex.: Todos viram o cometa passar, só Margarida não viu. Neste caso, o verbo “ver”, da segunda oração, continua apresentando as mesmas características que apresenta na primeira. 4. Características do Comitativo O Comitativo se caracteriza por participar da estrutura oracional na posição de complemento, porém com função idêntica à do sujeito da oração. Assim sendo, pode-se dizer que ele recobre as funções de Agente e/ou Paciente segundo o verbo seja de ação ou de processo. Pode ainda recobrir a função de Objetivo (FILLMORE, 1968, 1969) ou Paciente (CHAFE, 1979) com verbos estativos. Do ponto de vista da estrutura sintática (ou sintagmática), vem normalmente introduzido pela preposição com, mas pode também, comutativamente, ser introduzido pela locução junto com. Ex.: (11) O patrão discutia com o empregado. [Verbo de ação: Sujeito e Comitativo são Agentes] 345 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 (12) O filho sofria junto com a mãe a perda do pai. [Verbo de processo: Sujeito e Comitativo são Pacientes]. (13) O passado coabita com o presente. [Verbo de estado: Sujeito e Comitativo são Objetivos/Pacientes] Numa transposição, a que chamamos “estrutura derivada” (IGNÁCIO, 1994), o Sujeito e o Comitativo se associam, num processo de coordenação, formando um Sujeito Composto, ou podem condensar-se numa forma de plural. Esse fato comprova a identidade dos papéis semânticos desses dois constituintes. Ex.: (11a) O patrão e o empregado discutiam. > Eles discutiam. (12a) O filho e a mãe sofriam com a perda do pai. > Eles sofriam. É necessário distinguir o Comitativo do Destinatário em estrutura sintáticas semelhantes, isto é, em que o complemento é introduzido por com. No caso do Destinatário, tradicionalmente classificado como Objeto Indireto, não há identidade de funções semânticas entre Sujeito e Complemento, a preposição pode ser substituída por a ou para e o complemento pode comutar-se com o pronome lhe. Ex.: (14) Vou falar com o diretor sobre esse assunto. [= Vou falar ao diretor. Vou falar-lhe.] 5. Como os manuais de gramática tradicional, bem como os mais modernos, têm tratado o assunto 5.1 Indicando tão-somente como Adjunto Adverbial de Companhia: ABREU (2003) – Saiu com duas amigas. (p.103) ROCHA LIMA (1973) – Saiu com amigos. (p. 228) CELSO CUNHA (1970) – Lanchas, ide com Deus! Ide e voltai com ele... (p. 107) GAMA KURY (1985) – Sairei contigo. (p. 56) FARACO e MOURA (1999) – Só saía com os pais. (p.460) 5.2 Tecendo comentários interessantes sobre esse caso: MACAMBIRA (1987) – Esse autor inclui entre os Adjuntos Adverbiais preposicionados o de Companhia, dizendo o seguinte: A preposição com, por ser polissêmica, não se presta por si só para identificar o adjunto adverbial de companhia, donde apelar-se para a locução junto com, praticamente monossêmica; toda vez que a preposição com for substituível por junto com, temos então a circunstância de companhia: trabalhei com você – trabalhei junto com você. (p. 331) BECHARA (1999) – Esse autor, embora considere também o termo como Adjunto, chega a fazer uma distinção que diz respeito à diferença entre Complemento e Adjunto, quando fala em “adjuntos participativos” e “não participativos”; todavia, não chega a admitir a condição de termo argumental. Vejamos: 346 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 Enquanto no âmbito dos termos argumentais só pode existir no domínio da relação predicativa um só complemento direto ou indireto (salvo aqui os chamados dativos livres), predicativo ou complemento relativo – excluindo o caso de termos coordenados -, os adjuntos adverbiais não conhecem esta restrição, podendo aparecer quantos forem necessários à experiência comunicada: De noite, o jovem trabalhava em casa em companhia dos irmãos. Também ao contrário dos termos argumentais, se for elidido, o adjunto adverbial não exige preenchimento da casa vazia: O jovem trabalhava em casa, em companhia dos irmãos. O jovem trabalhava em companhia dos irmãos. O jovem trabalhava. (p. 439) (...) Os adjuntos adverbiais de companhia repartem-se em dois grupos: os associativos, ou participativos e os que não o são. Os primeiros participam ou ajudam, ao lado do sujeito, ou, no caso de complemento verbal, são afetados pelo estado de coisas designado no predicado, como nos exemplos: O capitão com seus soldados desbaratou o inimigo. O professor com seus colegas dirigiu a exposição. A diretora expulsou da sala o aluno com seus colegas de arruaça. Como exemplos de não-participativos temos: O colega trouxe consigo o livro pedido. Minha irmã foi ao baile com vestido novo. O pai gostava dos filhos com os avós. (p. 445) (...) Com a presença do adjunto de companhia participativo pode o verbo da oração ir ao plural, como se se tratasse de um sujeito composto: O capitão com seus soldados desbaratou o inimigo. O capitão com seus soldados desbarataram o inimigo. Em tais condições, a estrutura sujeito+adjunto adverbial pode alternar com a estrutura de sujeito composto: O capitão e os seus soldados desbarataram o inimigo. (p. 445) Como se vê, os autores não consideram o Comitativo como um Complemento do mesmo nível sintático do Objeto Indireto, optando por classificá-lo como Adjunto Adverbial de Companhia.3 A seguir, arrolamos os exemplos do Dicionário de usos do português do Brasil (BORBA, 2002), que têm a função de Comitativo.4 (15) ABOCAR comunicar-se; entender-se: Consegui abeirar-me de uma das avenidas e abocar-me com um agente de tráfego. (AM-O) 3 Na gramática portuguesa de Mateus et al. (1983), o caso comitativo é considerado uma função sintática oblíqua, por não possuir o estatuto das funções sintáticas centrais (sujeito, objeto direto, objeto indireto, predicativo). No entanto, tem valor argumental (diferentemente dos advérbios), ainda que seja opcional em alguns casos. Além do comitativo, também as funções semânticas de instrumental, tempo/duração/frequência e locativo situacional ou direcional assumem, de acordo com as autoras, a função de complemento oblíquo. 4 Selecionamos os exemplos prototípicos, grifando os complementos Comitativos. As siglas no final de cada exemplo representam a abreviatura dos nomes convencionais das obras de onde foram extraídos, segundo critério do Dicionário de usos do português do Brasil (BORBA, 2002). Ao final deste texto encontram-se em anexo as obras referentes às siglas. 347 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 (16) AJUNTAR amancebar-se; amasiar-se: Casado sou, mas separado estou. Você podia se ajuntar comigo. (S) (17) AMANCEBAR-SE viver maritalmente; amasiar-se: Esteve por aqui, amancebou-se com Osvaldo. (OS); Padres que se amancebavam com mestiças. (RET) (18) AMANDRINHAR unir-se a; ligar-se a: Bento não resistiu, se amadrinhou com eles. (SA) (19) AMASIAR estabelecer relação não oficial de casamento: Acaso lhe disse que desejava me amasiar contigo? (NOD) (20) ANDAR conviver: Com que espécie de gente você anda? (DE) (21) ARRANCHAR-SE juntar-se; amasiar-se: Raimunda arrancha-se com o turco. (Q) (22) ARTICULAR-SE entrar em entendimento: Procura o PTB articulando-se com o PSD para escolha de candidato comum à Prefeitura. (ESP) (23) ASSENTAR-SE fazer companhia: Seu marido é estimado entre os juízes quando se assenta com os anciãos da terra. (LE-O) (24) ATRACAR-SE entrar em luta corporal; engalfinhar-se: A moça se atraca com o bilheteiro. (UC) (25) ATRITAR-SE indispor-se; brigar: Não quer atritar-se ainda mais com o presidente. (VEJ) (26) AVISTAR-SE entrar em contato; encontrar-se: Não sei se o senhor já teve oportunidade de se avistar com minha mulher. (CCA); (27) BOQUEJAR discutir: Um dia, de cabeça quente, boquejei com Laércio. (DM) (28) CHOCAR-SE 1 encostar, como decorrência de um movimento brusco; ir de encontro a: O prato se chocou com a travessa de arroz. (TPR); O trem se chocou com o ônibus. (FSP); 2 encontrarse; juntar-se: Chocou-se o ar noturno com o corpo quente. (MC) (29) COABITAR estar instalado em comum; estar junto; coexistir: O passado coabita com o presente. (FN); Há a crença de que à noite a lua vem coabitar com as mulheres menstruadas. (IA) (30) COLIGAR-SE juntar-se; unir-se: O candidato e o seu partido, o PSDB, foram duramente criticados por se coligarem com políticos que participaram dos governos militares. (GAZ) (31) COMBINAR 1 ajustar; acertar; acordar: Combinei certos detalhes com os assessores. (OL); 2. conviver; dar-se bem: Ela parecia combinar bem com o marido. (SA); 3. reagir quimicamente: O gás carbônico combina-se com H2O produzindo ácido carbônico. (FIA); O cianeto de potássio combina com o ácido clorídrico do suco gástrico. (TC) (32) COMERCIAR exercer transações comerciais: Os Estados Unidos ficaram proibidos de comerciar com Cuba. (OL) (33) CONCHAVAR (Deprec) fazer acordo ou ajuste; maquinar; tramar: O Delfim Neto vai conchavar com Laudo Natel. (SC) (34) CONFABULAR trocar idéias; conversar: Jerônimo confabulava com os filhos do morto. (ML); O homem amarelo confabulava com o soldado gordo. (R) (35) CONFERENCIAR discutir ou tratar em conferência; conversar; palestrar: Benjamim Vargas conferenciava logo a seguir com o Sr. Getúlio Vargas. (OG); Breta proibiu a Adélia de confidenciar-se até com as irmãs. (REP) 348 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 (36) CONSORCIAR-SE unir-se em matrimônio: Humantina consorciou-se com Nestor. (VN); 2 unir-se em consórcio: Os grupos empresariais que se consorciaram com empresas estrangeiras para disputar o mercado de serviços de telecomunicação não desistiram de lutar pela quebra do monopólio estatal. (FSP) (37) CONTRACENAR participar de uma cena juntamente com outra pessoa: Manguari que continua sentado cantando e ao mesmo tempo contracenando com Lorde. (RC); Sabe que ela já contracenou com Tônia Carrero? (CHU) (38) CONVERSAR 1 falar; palestrar: O delegado conversa com Lourenço. (CBC); O negrinho veio conversar com José. (ZH); 2 discorrer; expor; discutir: Conversei com ele sobre as nossas dificuldades. (DM); (39) CONVIAJAR locomover-se junto: Toras flutuantes e corpos conviajando com a babugem e com pedaços de vegetais. (SA) (40) CONVIVER 1 viver em comum; viver em intimidade: Eu conheço isso porque convivo com os homens. (AC); A capivara convive com bois, cavalos ou mesmo jacarés. (GL); 2 estar em contato permanente: Não posso conviver com este problema. (OL); Betinho convive com o risco permanente de ver sua agonia ter início a qualquer momento. (VEJ) (41) CONVOLAR desposar; casar: A Leopoldina (...) convolara com o Sebastião de Rezende. (BAL) (42) CORRESPONDER estabelecer comunicação por meio de correspondência: Este é o amigo com quem me correspondia. (MEC) (43) DANÇAR executar passos e outros movimentos com o corpo ao som de uma música; bailar: Fogareiro dançava agora com uma mulher forte. (RIR) (44) DESPACHAR praticar atos decisórios, como autoridade: O presidente Jânio [...] despachava com o ministro João Agripino. (CRU) (45) DUELAR bater-se em duelo; lutar: É certo que morrerá se duelar contigo. (RET) (46) ENCONTRAR-SE ir ao encontro de: Lá fui eu me encontrar com Paulo. (FI); Branca de Neve continua a encontrar-se com o Príncipe. (BN) (47) ENTREVISTAR-SE encontrar-se para conversar: Quero me entrevistar com ele na quartafeira. (CB); Marcondes Pompeu deverá entrevistar-se pessoalmente com Pio XII. (NB) (48) ENTURMAR-SE (Coloq) entrosar-se com: Arlete já se enturmou com o grupo. (TGG) (49) ESTAR 1 ter a companhia de: Mariozinho de Oliveira estava comigo. (RO); Ontem ele estava com Jandira (Q); 2 apoiar; concordar: Aliás, os anarquistas estavam com Dreifus porque o processo desprestigiara a Autoridade e a Reação. (FL-O); Estou com papai em tudo e por tudo. (MO) (50) FALAR conversar: Eu bem que falei com ele. (TP) (51) GRUDAR-SE atracar-se; engalfinhar-se: Dedé deu um grito de onça e grudou-se com o outro. (CA) (52) INTERAGIR exercer interação; atuar em conjunto: A forma como os pais interagem com os filhos, dando carinho, amor, aconchego e proteção é que vai ser importante para uma boa estrutura psicológica e de sexualidade. (OD) (53) IR 1 seguir com; acompanhar: Santana teria recrutado quatro amigos e foi com o grupo até a rua onde Menezes morava. (FSP); Há pouco tempo, fui com Daniela Mercury minerar algumas 349 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 raridades da MPB, na Baratos Afins, no centro de São Paulo. (FSP); 2 copular: Se Jandira concordou em ir com você é porque quer. (Q) (54) MACOMUNAR-SE conluiar-se; aliar-se: Se Bernardo não se mancomunou com os cobras pra levar umas, deve ser mais ou menos isso. (FP); Infelizes que tinham se mancomunado com os sem-máculas. (LC) (55) MATRIMONIAR casar: Carrazedo Cruz, que matrimoniou com a cintura de Anabela em 1922, apelou para o álbum de família de modo a ver que lavoura sem jeito o tempo havia plantado nos vales e curvas da dita Anabela. (NI) (56) MORAR 1 viver junto; coabitar: A tia velha foi morar com vocês no Leme? (L) 2 viver maritalmente: Maria Rita estava morando com o espanhol. (SA); estou morando de amigado com uma mulherzinha do Timbó. (SA) (57) OMBREAR-SE competir; rivalizar: Agora ombreia-se com os elementos da classe inimiga. (PRO) (58) PAPEAR falar muito; tagarelar; conversar: Na sexta-feira passada parei para papear com um deles na rua (FSP) (59) PORFIAR debater; contender; altercar: Não adiantava encalcar, com ele porfiar (COB) (60) PRIVAR conviver intimamente: Contou-nos advogado que privou com ele que o mesmo contraíra mal venéreo, na mocidade, tornando-se incapaz para a vida regular. (FI) (61) PROMISCUIR-SE unir-se de modo desordenado; misturar-se; juntar-se: Um reduto em que batedores de carteira, rufiões, jogadores e o geral da malandragem se promiscuía com tiras e negociantes de virações graúdas e miúdas. (MPB) (62) RECOMPOR-SE reconciliar-se: Eleodegário se recompusera com o governador. (SA) (63) REGOZIJAR-SE divertir-se: E nunca me deste um cabrito para eu regozijar-me com meus amigos. (VES) (64) RUFIAR (Coloq) ter relações sexuais com: Padim Ciço um santo que conversa com Deus e não rufia com mulher nenhuma. (OSD) (65) RUSGAR discutir; desentender-se: Os próprios esquadrões já iam rusgando uns com os outros. (CG) (66) SAIR ir em passeio ou namoro com; passear: Não saio mais com você. (PL) (67) TRATAR falar; conversar: Pedro resolveu constituir advogado para tratar com a família Soares. (A) (68) VIVER ter vida em comum; coabitar: Fazer isso comigo como se tivesse vivido com você só uma semana? (E) 6. Considerações finais É necessário que se faça uma revisão nos manuais didáticos e dicionários a fim de que se considere o Comitativo como Complemento Verbal e não como Adjunto Adverbial. A classificação como Objeto Indireto, adotada por alguns dicionários, também deve ser revista, uma vez que se trata de constituinte com características (funções) semânticas diversas. Enquanto o primeiro participa do evento (estado de coisas) nas mesmas condições do sujeito, podendo, por isso mesmo, com ele coordenar-se ou condensar-se numa forma de 350 ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 39 (1): p. 342-353, abr-mai 2010 plural, o segundo se caracteriza como Destinatário, Beneficiário, etc., não podendo associar-se ao sujeito sintaticamente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABREU, A. S. Gramática mínima. Para o domínio da língua padrão. Cotia: Ateliê Editorial, 2003. BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. 37. ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: 1999. BORBA, F.S. et al. Dicionário de usos do português do Brasil. São Paulo: Ática, 2002. ______. Uma gramática de valências para o português. São Paulo: Ática, 1996. ______. Dicionário gramatical de verbos do português contemporâneo do Brasil. 2. ed. São Paulo: Editora Unesp, 1991. CHAFE, W. Significado e estrutura linguística. Tradução de M. H. M. Neves et al. São Paulo: Livros Técnicos e Científicos, 1979 [1970]. 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Rio de Janeiro: José Olympio, AM-O BAL BN CA CBC CCA CG CHU COB CRU DE DM E ESP FI FIA FL-O FN FP FSP GAZ GL IA L LC LE-O MC MEC MO MPB NB Auto da Compadecida. SUASSUNA, A. Rio de Janeiro: José Olympio, 1963. Discursos de Gilberto Amado. Balão Cativo. NAVA, P. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. Branca de Neve. MONIZ, E. Rio de Janeiro: José Olympio, 1954. Cangaceiros. REGO, J. L. 5. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1961. O conto brasileiro contemporâneo. BOSI, A. São Paulo: Cultrix, 1977. Crônica da casa assassina. CARDOSO, L. Rio de Janeiro: Editorial Bruguera, 1959. Contos gauchescos. NETO, S. L. 5. ed. São Paulo: Globo, 1957. Chuvas de verão. DIEGUES, C. Rio de Janeiro: Civ. Brasileira, 1977. (Roteiro de filme) Corpo de baile. ROSA, G. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006 [1956]. O Cruzeiro. Jan.1955, Ago.1959, Set. 1959. Os 18 melhores contos do Brasil. TREVISAN, D. Rio de Janeiro: Block, 1968. Os dez mandamentos. Vários autores. 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