CARLOS MIOTO (Univ. Federal de Santa Catarina) ABSTRACI: This

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CARLOS MIOTO
(Univ. Federal de Santa Catarina)
This paper is concemed with the effects of application of inaccusative
hypothesis on the traditional classification of verbs. It is argued that the inaccusative
hypothesis simplifies the traditional classification while reducting the classes of verbs to
three: transitive, intransitive and inaccusative.
KEY WORDS: verb os, argumentos, inacusativos, caso.
ABSTRACI:
Este trabalho objetiva mostrar os efeitos que a ado~ao da hip6tese inacusativa
teria sobre a classifica~ao tradicional dos verbos. Um dos efeitos principais seria a
divisao dos intransitivos em duas classes autemomas. Outro seria a elimina~ao da classe
dos verbos de liga~ao e dos auxiliares. 0 resultado interessante da especuIa~iio 6 que se
evita 0 incOmodo de ter, como no modelo tradicional, de enquadrar 0 mesmo verbo em
mais de uma classe.
A tradi~ilo gramatical classifica, por um lado, os verbos como auxiliares ou
principais. Esta classifica~ao tem em vista 0 papel que os verbos desempenham nas
chlUlladas locu~oes verbais. Auxiliares silo verbos que nunea aparecem em Ultimo lugar
na Iocu~ao. Se 0 tempo da 10~iio6 finito, entilo 6 0 auxiliar que assume a forma fmita.
Principais, por sua vez, sao os verbos que aparecem necessariamente em Ultimo Iugar
nas IocUl,;oesverbais e que assumem uma das formas nominais.
Por outro lado, os verbos (prineipais) silo classifieados de aeordo com sua
esttutura argumental. Os que apresentam apenas um argumento (externo) siio ehamados
de intransitivos. Os que apresentam mais de um argumento siio os transitivos. A forma
eategorial que 0 argumento interno assume 6 responsAvei peia sub-ciassificaciio dos
transitivos: direto, se 0 argumento interno 6 um sintagma nominal; indireto se 0
argumento 6 um sintagma preposieional; e direto e indireto, se silo selecionados os dois
tipos de sintagma. Por fun, Ma classe dos verb os de ~iga~iio que se constroem com um
sujeito (argumento externo?) e urn predicativo.
(1) Classifica~io Tradicional
1. Auxiliar
2.2. Transitivo
2. Principal
3. De Iiga~o
2.1. Intransitivo
A hip6tese inaeusativa consiste em admitir que hA verbos que selecionam
apenas urn argumento interoo; e que estes verbos, ao contrm-io da maioria dos verbos
que selecionam complementos, slio incapazes de atribuir caso acusativo a seu rtnico
argumento. A falta de argumento externo possibilita que 0 sintagma nominal que 6
argumento interno ou que faz parte deste argumento venha a ser 0 sujeito da senten~a.
Em termos gerativos, aquele sintagma torna-se 0 sujeito para conseguir seu caso.
Para apresentar a id6ia, considere a senten~a (2.a) e sua representa~lio na
Estrutura P (2.b):
/1\
IF""
V"
I
/v""
V
N"
chegLendo (2.b): 6 uma senten~a encabe~ada por flexlio (F) que seleciona como
complemento urn constituinte verbal (V"). As propriedades lexicais do mlcleo chegar
encontram-se descritas sob V", em especial, 0 fato de ele selecionar apenas urn
argumento interoo nominal (Nil). Espec 6 uma posi~llo marcada por algumas
propriedades gramaticais, como caso nominativo,
aberta para receber sintagmas
nominais que nllo slio marc ados por caso.
Altm do movimento do verba para F, onde vai se incorporar ao afixo -OU, a
0 Espec de F' onde recebe caso nominativo. Esta
possibilidade esta aberta porque 0 verbo chegar t incapaz de atribuir caso acusativo ao
N" que t seu complemento.
Como, no fun das contas, 0 complemento vai terminar sendo 0 sujeito, a
seguinte pergunta se p15e:Por que nio se simplificam as coisas concebendo, como
tradicionalmente, que a encomenda seja argumento externo de chegar? Em outros
termos: Qual a vantagem de excluir verbos como chegar da c1assedos
intransitivos? Mantido 0 verba como intransitivo, a anAlise enquadra 0 fen6meno nos
processos usuais de "subjetiva\!ao", ou seja, 0 que eo argumento extemo de urn verba
termina sendo 0 seu ~mjeito. Alem disso, parece cUstoso, para uma teoria, criar exce\!ao
para uma classe de verbos que permitem a subjetiva\!ao de seu complemento.
As motiva\!15esmaiores para a hip6tese inacusativa sao encontradas em verhos
que ensejam uma estrutura\!ao sintatica urn tanto diferente daquela de chegar.
Entretanto, existem motiva\!5es para sustentar a hip6tese inacusativa rnesmo para
verbos deste tipo.
Uma delas diz respeito hs restri\!15es selecionais que permitem separar os
verbos mono-argumentais em duas classes. A primeira engloba os verbos que
selecionam urn argumento necessariamente (+animado), exclufdas as interpret~15es
metaf6rieas:
encomenda move-se para
(3) a. A secretana telefonou
b. *A pedra telefonou
e. 0 gato miou
d. *A pedra miou
A segunda classe engloba os verbos cujo tinieo argumento nao e neeessariamente
(+animado), como chegar em (2).
Outra motiva\!ao e que os sujeitos pospostos se adaptam muito mais faeilmente
aos verbos da segunda classe. Veja 0 contraste entre (4) e (5):
(4) a. #Miou 0 gate
b. #Telefonou 0 J oao
(5) a. Aumentaram osimpostos
b. Chegaram as encomendas
(=
Os impostos aumentaram)
1 A expressio sujeito posposto quer se aplicar apenas 80S casos em que a senten~ niio manifesta
algum efeito do tipo inversio de sujeito pesado, de sujeito indefmido on de constru~io de retomada
(Kato,1987). 0 problema com que lidam os estudiosos e expliear como 0 caso nominativo pode ser alribufdo
a urn N" em posi~ p6s-verbal, forma de atribui~ pouco usual no portuguSs do Brasil. Uma solu~, que
nio temos esp~ para discutir, sena adotar a alribui~o de caso por cadeia de Burzio(1986).
Mas, as motiv~oes de maior peso SaD buscadas em verbos cujo complemento
nao ~ de natureza nominal. 0 verbo parecer vai ser tornado como prot6tipo desses
verbos.
o verbo parecer
pode figurar em constru(;oes sintaticas que sofrem vlh"ios
arranjos:
(6) a. Parece que Maria ~ feliz
b. Maria parece ser feliz
c. Maria parece feliz
Em cada senten(;a de (6) parecer, em vista da classific~ao tradicional, seria
classificado de urn modo diferente: em (6.a) seria urn verba intransitivo; em (6.b) seria
urn verba auxiliar e em (6.c) seria urn verbo de liga(;ao.
Adotando a hip6tese inacusativa, parecer seria 0 mesmo verba
em
todas as senten(;as de (6). As diferentes estrutura~oes em que ele aparece derivam da
2
natureza do complemento. Observe que foi assumido que os verbos inacusativos nlio
selecionam argumento externo e que 0 fato de Maria ser 0 sujeito em (6.b) e (6.c) nlio
pode resultar de ser 0 argumento externo de parecer. Assim, os complementos
seledonados slio representados, respectivamente, em (7):
(7) a. Parece [C" que Maria e feliz]
b. Parece [V' Maria ser feliz]
c. Parece [SC Maria feliz]
Um complemento poderia ser a senten(;a encaixada (=C") que Maria e feliz ou 0
constituinte cujo micleo ~ 0 verba ser (=V") Maria ser feliz ou a smaU clause (=SC)
Maria feliz. Em todos os casos fica assegurado que 0 papel tematico de Maria the e
atribufdo em suarela~o local com (ser ) feliz. Para interpretar semanticamente (6.b) e
(6.c), a localidade e recuperada por meio de urna cadeia i representada respectivamente
em (8:<1)e(8.b):
(8) a. Mariai parece Vi ser feliz
b. Mariai parece Vi feliz
A explica(;ao para as diferentes estrutura(;oes de (7) e encontrada na teoria do
caso, que assegura que todo sintagma nominal pronunciado precis a ter caso. Em (7.a), a
2 Por falta de e~.
0 fato de parecer nio selecionar argumento externo foi dado por assun~.
mas isto pode ser demoDstrado. Ver Koopman & Sportiche (1991)'para demonstr~.
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exigencia de caso e satisfeita dentro do complemento ja que a flexao, presente na forma
atribui nominativo para Maria. Porem, nao existe urn atribuidor dentro do
complemento em (7.b) e (7.c): por urn lado, nao existe tlexao no complemento; por
outro, 0 verbo pareeer e incapaz de atribuir acusativo. Entao, Maria deve se mover para
uma posi~ao previamente marcada pOI caso.
Como pareeer em (6.a) san analisados eonstar, obstar, eumprir, urgir e alguns
outros, quando selecionam apenas urn argumento sentencial. Na classifica~ao
tradicional eram considerados intransitivos com urn sujeito (argumento externo?)
sentencial. Adotando a bip6tese inacusativa, passam a ser inacusativos que selecionam
urn complemento sentencial.
o fato de as senten~as encaixadas s6 antecederem 0 verba em constro~oes
estilfsticamente marcadas (topicalizadas, clivadas) pode ser explicado: nao e preciso
que caso seja atribufdo a constituintes sentenciais. Conceber a senten~a encaixada como
argumento externo criaria dificuldades para explicar seu posicionamento ap6s 0 verb03•
A analise de pareeer em (6.b) pode ser estendida aos verb os, tradicionalmente
conbecidos como "auxiliares" que selecionam urn infmitivo (impessoal), ir, poder,
dever. A "locu~ao verbal" seria resultado da subida do argumento do verbo encaixado
para receber caso. De modo paralelo, san analisados os "auxiliares" estar, continuar,
fiear, que selecionam urn verbo no gen1ndio e ter, que seleciona urn verba no particfpio.
Como pareeer em (6.c) sao concebidos os ''verb os de liga~ao". A caracterfstica
comum e que selecionam uma small clause como complemento. 0 sintagma nominal
da small clause que nao e marc ado por caso deve subir para Espec de F', da mesma
forma-que acontece em (6.b).
e,
A hip6tese inacusativa altera a classifica~ao tradicional dos verbos da forma
que esta representada em (9):
3 Entretanto, a hip6tese inacusativa enfrentaria problemas para explicar a posi~
senten,.as encaixadas como as de
p6s-vemal de
(i) a. Aborrece Joio que Maria dance
b. Perturba-o que Maria dance
onde 6 claro que 0 verbo matriz atribui acusativo ao complemento e, ainda assim, a sentenla encaixada
aparece naturalmente ap6s 0 verbo. De qualquer fonna, nio e a senten~a complemento de parecer que
demanda expli~o
por estar em posi'rio p6s-vemal.
.
Classifica~o Tradicional
1. Auxiliar
2. Principal
2.1. Transitivo
2.2. Intransitivo
2.3. De Iiga~io
1. Transitivo
2. Intransitivo
3. Inacusativo
A llnica classe inalterada e ados verbos transitivos. A classe dos intransitivos,
que selecionam apenas um argumento nominal, perde parte de seus membros, retendo
apenas aqueles cujo argurnento e necessariamente (+animado). Os exclufdos da classe
dos intransitivos, em conjunto com os "auxiliares" e os "de ligacilo", vilo constituir a
nova classe dos inacusativos.
o interesse destas consideracoes provem de vlkios pontos. 0 primeiro e que a
hip6tese inacusativa possibilita que urn verbo como pareeer seja concebido e
classificado, em certo nivel, sempre da mesma maneira: como urn verba que seleciona
urn argumento interno. Se as estruturacoes resuitantes SaD diferentes, isto esta
condicionado a fatores extrinsecos as propriedades do verbo, tais como a natureza do
argumento selecionado e os prindpios e par~tros
que estao em jogo. Desta forma,
nao sera preciso recorrer a considera~oes do tipo "enfraquecimento semAntico do
verbo", 0 que se postula para os verbos que ora SaDintransitivos, ora SaDde liga~ao,
para proceder a analise.
Dutro ponto a favor destas considera~oes e a explica~ao para a posicao p6sverbal do sujeito, fen()meno que, presumivelmfnte, e mais frequente com inacusativos
do que com intransitivos propriamente ditos. Um com~o de explica~ao e que a
posicao p6s-verbal desses sujeitos e compativel com a do argumento intemo.
o exercicio realizado e, de certo modo, perverso se temos em conta 0 principio
de Feyerabend(1978) segundo 0 qual as teorias saD incomensuraveis. Na realidade, a
classifica~ao tradicional nao dispoe da regra do movimento e de urna teoria de caso.
Entretanto, lancamos mao da comparacao de teorias no intuito de chamar a aten~ao das
pessoas que estudam e ensinam gramatica e nao se preocupam com os avancos produzidos pela lingilistica.
4 Alem do fato, idiossincflltico e verdade, de que os existenciais, como existir, e verbos como
acontecer tem sistematicamente sujeito posposto (Belletti,1988).
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FEYERABEND,
P. (1978)"COIlSOlladooespecia1ista".
In: LAKATOS, L &1. Musgrave (org.) A Crltica e 0
tkHmlOlvi1M1llo do con1leci1MfttO. Sio Paulo, CiJltrl~.
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M. & F. TARAlLo (t987)
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K.OOPMAN, H. & D. SPORTICHE (1991) "The position of subject". lingua 85, NClrth-Holland
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