Saúde Sexual da Mulher e do Homem: Contributos para um Modelo de Compreensão Biopsicossocial Estado da Arte As contribuições teóricas e os estudos empíricos mais recentes têm demonstrado que, para se compreender a sexualidade quer masculina quer feminina, além dos aspetos biológicos, importa considerar fatores psicológicos, nomeadamente cognitivos e emocionais (e.g., crenças e pensamentos, autoestima sexual, afeto, etc.), bem como fatores de natureza relacional, nomeadamente a qualidade do relacionamento (e.g., Basson, 2001, 2005; Bancroft, 2002; Dennerstein & Lehert, 2004; Dove & Wiederman, 2000; Graziottin & Leiblum, 2005; Leiblum, 2001; Sugrue & Whipple, 2001). Apesar destas contribuições e de algumas tentativas de conceptualização alternativas ao modelo clássico da resposta sexual (Masters & Johnson, 1966), poucos estudos empíricos têm considerado simultaneamente e de forma interrelacionada as referidas variáveis de modo a compreender o seu contributo relativo, de acordo com uma perspetiva ampla e integrativa. Por outro lado, a grande maioria dos estudos laboratoriais conduzidos, tem desvalorizado a possibilidade de inclusão de estímulos eróticos e de natureza relacional para melhor conhecer a resposta sexual, sendo usados, quase exclusivamente, contextos de estimulação baseados em material sexualmente explícito (quer para homens, quer para mulheres). Deste modo, tem sido difícil aprofundar o conhecimento acerca do papel dos fatores relacionais e da interação entre estes e os aspetos cognitivos e afetivos, tão intimamente ligados à sexualidade. Objetivos Este estudo, de cariz experimental, tem como principal objetivo melhorar o conhecimento acerca das experiências sexuais das mulheres e dos homens, segundo uma perspetiva biopsicossocial. Pretende-se, assim, testar o papel mediador das crenças sexuais, relacionamento, autoestima sexual e aspetos disposicionais (e.g., sociossexualidade, inibição/ excitação sexual) na resposta sexual fisiológica e subjetiva a diferentes estímulos (estímulos eróticos e relacionais versus material sexualmente explícito) e instruções sexuais (imaginar companheiro versus imaginar estranho). Resultados Comparação entre Filmes Sexualmente Explícitos e Filmes Relacionais/Eróticos Os resultados indicaram que os filmes sexualmente explícitos provocaram respostas sexuais fisiológicas (ereção e vasocongestão vaginal) mais elevadas comparativamente aos filmes de cariz relacional. Este efeito não ocorreu no entanto ao nível da resposta sexual subjetiva (sensações de excitação e prazer sexual). Comparação entre Instrução Parceiro e Instrução Estranho As instruções para fantasiar com o parceiro provocaram maior resposta sexual subjetiva (sensações de excitação e prazer sexual) e maior afeto positivo (emoções positivas) comparativamente às instruções para fantasiar com estranho (este resultado foi mais notório nas mulheres). Este efeito não ocorreu no entanto ao nível da resposta sexual fisiológica. Comparação Homem vs Mulher Os resultados indicaram que as mulheres apresentaram uma resposta sexual subjetiva face aos diferentes estímulos sexuais (sensações de excitação e prazer sexual) em média superior aos homens. Esta diferença não foi no entanto significativa relativamente à resposta sexual fisiológica (ereção e vasocongestão vaginal). Preditores da Resposta Sexual O estudo indicou que o afeto positivo (emoções positivas no decorrer da visualização dos filmes) e os pensamentos de cariz sexual foram os melhores preditores da resposta sexual subjetiva (sensações de excitação e prazer sexual). No entanto, a resposta sexual fisiológica (ereção e vasocongestão vaginal) mostrou ser relativamente independente das variáveis relacionais e psicológicas avaliadas. Discrepância entre Resposta Sexual Fisiológica e Resposta Sexual Subjetiva Os nossos resultados mostraram uma baixa correlação entre a resposta sexual fisiológica (ereção e vasocongestão vaginal) e a resposta sexual subjetiva (sensações de excitação e prazer sexual) tanto no homem como na mulher. A análise dos fatores que podem explicar essa discrepância indicou que quanto mais elevadas as emoções positivas e os pensamentos sexuais no decorrer da visualização dos filmes, maior a diferença entre a resposta sexual subjetiva (sensações de excitação e prazer sexual) relativamente às resposta sexual fisiológica (ereção e vasocongestão vaginal). Conclusões e Implicações Globalmente o estudo mostrou que existe uma discrepância entre a resposta sexual subjetiva e a resposta sexual fisiológica tanto em mulheres como em homens e que enquanto que a resposta subjetiva é em grande parte determinada pelos pensamentos e emoções concomitantes, a resposta fisiológica é relativamente independente de fatores psicológicos. Estes dados podem ter implicações ao nível da promoção da saúde sexual e do tratamento das disfunções sexuais. Por um lado os resultados mostram a importância dos pensamentos sexuais e emoções positivas na resposta e funcionamento sexual encorajando a adoção de atitudes positivas face à sexualidade com vista à promoção da saúde e satisfação sexual. Os dados suportam ainda a importância das psicoterapias cognitivas no tratamento das disfunções sexuais, visando sobretudo a modificação das emoções e pensamentos negativos associados à atividade sexual que são típicos dos homens e mulheres com estas dificuldades. Por outro os dados parecem também indicar que é possível aumentar as sensações subjetivas de prazer e satisfação sexual independentemente da resposta fisiológica. Este dado ganha relevância se pensarmos nos casos de homens e mulheres com problemas sexuais causados por fatores orgânicos (biomédicos) e na possibilidade de utilização de técnicas psicoterapêuticas orientadas para o aumento das emoções positivas e pensamentos sexuais no decorrer da atividade sexual. Financiamento aprovado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia - Avaliação Excelente; € 160.000