CARACTERIZAÇÃO MOLECULAR DO PAPILLOMAVÍRUS HUMANO E SUA PERSISTÊNCIA ENTRE MULHERES GESTANTES HIV+ NO RIO DE JANEIRO, BRASIL 1 2 2 1,2 1,2 2 1 Siqueira Juliana D(ME) , Meyrelles ARI , Almeida GL , Seuanez HN , Soares MA , Machado ES , Soares Esmeralda A 1-Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Rio de Janeiro, Brasil; 2-Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil INTRODUÇÃO RESULTADOS Tabela 1. Fatores de risco para HPV e câncer das pacientes do estudo A infecção por HIV é um fator de risco para a persistência do HPV e o desenvolvimento de câncer de colo de útero. Este câncer é o terceiro tipo mais incidente em mulheres no Brasil, e o segundo no mundo, sendo responsável pelo óbito de aproximadamente 230 mil mulheres por ano. Ao mesmo tempo, é um câncer com grande potencial de prevenção e cura quando diagnosticado precocemente. O câncer do colo do útero se desenvolve a partir de lesões cervicais préinvasivas, que atualmente são divididas em diferentes categorias citológicas: lesão intraepitelial escamosa de baixo grau (LSIL), lesão intraepitelial escamosa de alto grau (HSIL) e câncer invasivo (Figura 1). Total de pacientes Média de idade (anos) Número de parceiro sexuais na vida 1a3 4 ou mais Profissionais do sexo Sem informação Tabagismo Fuma ou já fumou Nunca fumou Número de gestações 1 ou 2 3 ou 4 5 ou mais Uso de anticoncepcional Sim Idade da primeira relação sexual < 16 DSTs Herpes Sífilis 119 27 (14-44) 30% 68% 1% 1% 42% 58% 36% 41% 23% 50% 75% 5% 18% Citologia 14 Normal 1 Ascus 1 Lsil (sugestivo de HPV) 16 PCR HPV Negativo 119 Pacientes do estudo 1a Coleta (2º trimestre da gestação) 12 Analise não finalizada 103 PCR HPV Positivo 16 Multiploinfectados Citologia 65 Normal 6 Ascus 27 Lsil (sugestivo de HPV) 4 Hsil (sugestivo de HPV) 1 Sem informação 91 Seqüenciados e/ou clonados 75 Monoinfectados Figura 2. Prevalência do HPV e citologia na 1a Coleta (2º trimestre da gestação). # Polimorfismo do codon 72 - p53 Pro/Pro Pro/Arg Arg/Arg HPV16(6), HPV18(1), HPV16(4), HPV33(2), HPV16(7), HPV18(1), Alto risco (30) HPV33(1), HPV35(1), HPV56(1), HPV73(1) HPV45(1), HPV58(2) HPV58(2) Normal(47) Baixo risco(4) 0 HPV61(1), HPV70(1) HPV81(2) Risco indeterminado HPV53(1), HPV62(1), HPV53(2), HPV62(2), HPV62(1), HPV66(1), (13) HPV69(1), HPV85(1) HPV83(1) HPV83(2) Alto risco (2) 0 HPV82(1) HPV31(1) Baixo risco 0 0 0 Ascus (5) Risco indeterminado HPV53(1), HPV83(1), 0 0 (3) HPV32(1) HPV16(3), HPV45(1), Alto risco (9) HPV35(1) HPV16(2), HPV58(1) HPV58(1) Lsil (17) Baixo risco (4) 0 HPV11(1), HPV81(1) HPV6(1), HPV81(1) Risco indeterminado 0 HPV66(1), HPV69(1) HPV53(1), HPV84(1) (4) Alto risco (4) HPV73(1) HPV16 (1) HPV16 (1) HPV35 (1) Hsil (4) Baixo risco 0 0 0 Risco indeterminado 0 0 0 Total 14 29 30 Citologia Figura 1. Progressão de uma lesão benigna do colo do útero para o câncer cervical invasivo. A evolução é o resultado dos efeitos combinados de genes do HPV, particularmente aqueles que codificam as proteínas E6 e E7, que são as duas oncoproteínas virais; a integração do DNA viral no DNA do hospedeiro; e uma série de mudanças genéticas e epigenéticas nos genes celulares. HSIL, lesão escamosa intraepitelial de alto grau; LSIL, lesão escamosa intraepitelial de baixo grau (modificado de Lowy & Schiller, 2006). Os papillomavírus podem infectar diferentes vertebrados, e apresentam uma classificação filogenética bastante complexa. Em humanos são descritos 5 gêneros (alfa, beta, gama, mu e nu). Os gêneros são subdivididos em espécies, totalizando 28. As espécies por sua vez são classificadas em 132 tipos diferentes até o presente. Os tipos são divididos em alto risco e baixo risco para câncer e alguns com risco indeterminado. A maioria das infecções pelo HPV pode ser resolvida pelo sistema imune competente, e a persistência é determinada pela detecção do vírus por pelo menos um ano. Fatores virológicos e do hospedeiro que estão envolvidos na persistência ainda não estão elucidados. O HPV possui duas oncoproteías (E6 e E7) que são capazes de interagir com proteínas que regulam o ciclo celular e que atuam como supressoras de tumores, como a p53 e pRb. Essa interação provoca a degradação e inativação das proteínas celulares, o que levaria à transformação e imortalização celular, e posteriormente à formação de neoplasias. O polimorfismo no códon 72 da p53 pode codificar uma arginina ou uma prolina; quando codifica uma arginina a proteína apresenta uma velocidade de degradação maior em presença da proteína E6 do HPV 16 ou 18, e tem sido demonstrado que também confere maior risco na formação de tumores cervicais do que a p53 que possui uma prolina. Estudos sugerem que a freqüência de co-infecção e da persistência do HPV aumentam ainda mais durante a gravidez, mas são escassos dados moleculares detalhados sobre as variantes de HPV envolvidas, especialmente nos países em desenvolvimento como o Brasil. OBJETIVOS Caracterizar a prevalência da infecção pelo HPV, os tipos infectantes, a ocorrência de múltiplas infecções, a persistência da infecção e a prevalência dos diferentes polimorfismos da p53 em uma coorte de gestantes HIV+ com diversos perfis citológicos. METODOLOGIA Cento e dezenove gestantes HIV+ acompanhadas na clínica pré-natal da UFRJ, que não sabiam se eram HPV+ por testes moleculares, tiveram uma amostra cervical coletada no 2º trimestre de gravidez e outra seis meses após o parto. O DNA viral foi extraído e usado para determinar a seqüência de nucleotídeos parcial do gene codificante do capsídeo viral (L1), usando iniciadores degenerados, gerando um fragmento de 450 pb. O códon 72 da p53 foi amplificado e seqüenciado com iniciadores específicos para o éxon 4, gerando um fragmento de 450 pb. Os vírus foram classificados por filogenia utilizando referências dos tipos encontrados selecionadas do banco de dados do PAVE (http://pave.niaid.nih.gov/index.html). As análises foram feitas no programa MEGA5, usando neighbor-joining e Kimura 2-parâmetros. Vírus com eletroferogramas apresentando ambigüidade de bases foram clonados. Um questionário detalhado com histórico clínico e laboratorial foi preenchido para cada paciente. Potencial oncogênico * Duas amostras não possuem dados de p53 ou citologia, mas possuem HPV16 # Pro/ Pro - homozigoto prolina; Arg/Arg - Homozigoto para arginina; Pro/Arg - heterozigoto Prolina/Arginina Tabela 3. Prevalência dos genótipos de HPV e a associação com a citologia cervical e o polimorfismo do códon 72 da p53 dentre as amostras multiploinfectadas Amostra RJ08-001 RJ08-004 RJ09-011 RJ08-018 RJ09-030 RJ09-040 RJ10-057 RJ09-069 RJ10-071 RJ10-080 RJ10-087 RJ10-088 RJ10-089 RJ10-093 RJ10-098 RJ10-114 Tipos de HPV* HPV31, HPV56 HPV58, HPV61, HPV62 HPV82, HPV84 HPV53, HPV83 HPV6, HPV83 HPV16, HPV35, HPV55, HPV58 HPV16, HPV53, HPV81 HPV45, HPV58, HPV81 HPV32, HPV62 HPV16, HPV35, HPV44, HPV58 HPV55, HPV56 HPV42, HPV52, HPV68 HPV53, HPV55, HPV58 HPV16, HPV35 HPV16, HPV52 HPV11, HPV16, HPV66 Citologia LSIL Normal LSIL Normal Normal Normal Normal Normal Normal Normal LSIL LSIL LSIL LSIL LSIL LSIL *Em vermelho os tipos de HPV de alto risco # P/P - homozigoto prolina; A/A- Homozigoto para arginina; P/A - heterozigoto Prolina/Arginina P53# A/A A/P P/P A/A A/P A/P A/P P/P A/A A/P P/P P/P A/A A/A A/P A/P Prevalência dos tipos do HPV em monoinfectados HPV6 1% HPV69 3% HPV66 3% HPV32 1% HPV70 1% HPV61 HPV11 1% 1% HPV84 HPV85 1% 1% HPV83 6% HPV16 35% HPV81 6% HPV62 6% HPV53 7% HPV31 1% HPV56 1%HPV82 1% HPV58 8% HPV73 3% HPV45 HPV18 HPV35 3% 4% 3% HPV33 4% * Tipos em vermelho são de alto risco Figura 3. Gráfico da prevalência dos tipos de HPV em monoinfectados. Prevalência dos tipos do HPV em multiploinfectados HPV66 HPV84 HPV61 2% 2% HPV42 2% HPV44 2% 2% HPV32 2% HPV11 2% HPV6 2% HPV16 15% HPV58 12% HPV83 5% HPV81 5% HPV35 8% HPV62 5% HPV55 8% HPV53 8% HPV52 5% HPV56 5% HPV31 HPV82 HPV68 HPV45 2% 2% 2% 2% * Tipos em vermelho são de alto risco Figura 4. Gráfico de prevalência dos tipos de HPV em multiplos infectados. Dentre as 91 amostras analisadas, os tipos de HPV encontrados são do gênero alfa e estão divididos entre as espécies 1, 3, 5, 6, 7, 9, 10, 11. O genótipo homozigoto para arginina foi encontrado em 44% dos pacientes, o homozigoto para prolina em 22% e o heterozigoto prolina/arginina em 34%. A citologia da amostra pós-parto de 52% dos pacientes foi coletada até o momento, e 3 pacientes progrediram para lesão intraepitelial escamosa de alto grau, todos com HPV de alto risco. No entanto os resultados moleculares para persistência ainda estão em andamento. CONCLUSÃO Uma alta diversidade genética do HPV foi encontrada em gestantes HIV+, destacando o papel da imunossupressão causada pela infecção pelo HIV e pela gravidez na infecção pelo HPV. O HPV tipo 18 foi apenas o oitavo tipo mais prevalente, uma descoberta importante com implicações para o uso da vacina disponível atualmente. A ocorrência de infecção por múltiplos tipos de HPV também é primordial nesta coorte. Foi observado que mulheres infectadas pelo HIV e HPV podem ser portadoras de subtipos oncogênicos, mesmo quando os esfregaços citológicos mostram normalidade citológica. Mais estudos são necessários para avaliar os resultados clínicos das infecções por HPV neste cenário. Projeto Gráfico: Serviço de Edição e Informação Técnico-Científica / CEDC / INCA Tabela 2. Prevalência dos genótipos de HPV e a associação com a citologia cervical e o polimorfismo do códon 72 da p53 dentre as 73 pacientes monoinfectadas*