2 - Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões

Propaganda
Cirurgiões
Revista do Colégio Brasileiro de
Órgão Oficial do Colégio Brasileiro de Cirurgiões
EDITOR
JOSÉ EDUARDO FERREIRA MANSO
TCBC - Rio de Janeiro
EDITORES
ASSOCIADOS
JUAN MIGUEL RENTERÍA
TCBC - RJ
CARLOS ALBERTO GUIMARÃES
TCBC - RJ
JÚLIO CÉSAR BEITLER
TCBC - RJ
ASSISTENTE DE PUBLICAÇÕES
MARIA RUTH MONTEIRO
JORNALISTA
RESPONSÁVEL
ARLEY SILVA
Mtb 8.987
(livro 35 fl. 12v em 06/08/1958)
RODRIGO MARTINEZ
TCBC - RJ
CONSELHO DE REVISORES
ABRAO RAPOPORT – ECBC-SP- HOSPHEL- SP-BR
FABIO BISCEGLI JATENE- TCBC-SP- USP-BR
MARCEL C. C. MACHADO – TCBC-SP- USP-BR
ADAMASTOR HUMBERTO PEREIRA- TCBC-RS- UFRS-BR
FRANCISCO SÉRGIO PINHEIRO REGADAS-TCBC-CE-UFCE-BR
MARCEL A. C. MACHADO – TCBC-SP- USP-BR
ADEMAR LOPES – TCBC-SP – UMG-SP-BR
FERNANDO QUINTANILHA RIBEIRO – SP- FCMSC-SP-BR
NELSON ADAMI ANDREOLLO – TCBC-SP - UNICAMP-SP-BR
ALBERTO GOLDENBERG – TCBC-SP- UNIFESP- BR
GASPAR DE JESUS LOPES FILHO –TCBC-SP – UNIFESP
NELSON FONTANA MARGARIDO – TCBC-SP - USP-BR
ALBERTO SCHANAIDER – TCBC-RJ - UFRJ-BR
GUILHERME PINTO BRAVO NETO, TCBC-RJ- UFRJ-BR
MAURO DE SOUZA LEITE PINHO – TCBC-SC - HOSPITAL
ALDO DA CUNHA MEDEIROS- TCBC-RN-UFRN-BR
GUSTAVO PEREIRA FRAGA – TCBC-SP- UNICAMP - BR
ALESSANDRO BERSCH OSVALDT – TCBC-RS- UFRGS-BR
HAMILTON PETRY DE SOUZA – TCBC-RS- PUCRS-BR
ORLANDO JORGE MARTINS TORRES- TCBC-MA- UFMA - BR
ÁLVARO ANTONIO BANDEIRA FERRAZ – TCBC-PE -UFPE-BR
IVAN CECCONELLO – TCBC-SP- USP-BR
OSVALDO MALAFAIA – TCBC-PR- UFPR-BR
ANDY PETROIANU- TCBC-MG - UFMG-BR
JOÃO GILBERTO MAKSOUD- ECBC-SP- USP-BR
OSMAR AVANZI – SP - FCMSC-SP-BR
ANGELITA HABR-GAMA – TCBC-SP- USP-BR
JOÃO GILBERTO MAKSOUD FILHO- USP-BR
PAULO FRANCISCO GUERREIRO CARDOSO – ACBC-RS-
ANTONIO JOSÉ GONÇALVES – TCBC-SP - FCMSCSP-BR
JOAQUIM RIBEIRO FILHO – TCBC-RJ-UFRJ-BR
ANTONIO NOCCHI KALIL – TCBC-RS - UFCSPA-BR
JOSÉ IVAN DE ANDRADE- TCBC-SP- FMRP- SP-BR
PAULO GONÇALVES DE OLIVEIRA – TCBC-DF- UNB-DF-BR
ANTONIO PEDRO FLORES AUGE - SP - FCMSCSP-BR
JOSÉ EDUARDO DE AGUILAR-NASCIMENTO – TCBC –MT- UFMT-BR
PAULO LEITÃO DE VASCONCELOS – CE- UFC- BR
ARTHUR BELARMINO GARRIDO JUNIOR – TCBC-SP - USP-BR
JOSÉ EDUARDO P. MONTEIRO DA CUNHA – ECBC-SP- USP-BR
PAULO ROBERTO SAVASSI ROCHA – TCBC-MG- UFMG-BR
AUGUSTO DIOGO FILHO – TCBC-MG- UFU-BR
JÚLIO CEZAR WIERDERKEHR- TCBC-PR- UFPR-BR
RAUL CUTAIT – TCBC-SP- USP-BR
CARLOS ALBERTO MALHEIROS- TCBC- SP-FCMSC-SP-BR
JÚLIO CEZAR UILI COELHO- TCBC-PR - UFPR-BR
RICHARD RICACHENEVSKY GURSKI – TCBC-RS- UFRGS-BR
CLEBER DARIO KRUEL – TCBC-RS - UFRGS-BR
LISIEUX EYER DE JESUS- TCBC-RJ- UFF-BR
RODRIGO ALTENFELDER SILVA – TCBC-SP- FCMSC-SP-BR
DAN LINETZKY WAITZBERG – TCBC-SP- USP-BR
LUCIANO ALVES FAVORITO- TCBC-RJ- UERJ-BR
RUFFO DE FREITAS JÚNIOR- TCBC-GO- UFGO-BR
DANILO NAGIB SALOMÃO PAULO – TCBC-ES- EMESCAM-BR
LUIS CARLOS FEITOSA TAJRA- TCBC-PI- UFPI-BR
RUY GARCIA MARQUES – TCBC-RJ - UERJ –BR
DIOGO FRANCO – TCBC-RJ- UFRJ-BR
LUIZ CARLOS VON BAHTEN- TCBC-PR- UFPR-BR
RUI HADDAD – TCBC-RJ- UFRJ-BR
DJALMA JOSE FAGUNDES – TCBC-SP- UNIFESP-BR
LUÍS FELIPE DA SILVA, TCBC-RJ - UFRJ - BR
SÉRGIO MIES - TCBC-SP- USP- BR
EDMUND CHADA BARACAT – TCBC – SP- UNIFESP-BR
MANOEL XIMENES NETO- ECBC-DF - UNB-DF-BR
SILVIA CRISTINE SOLDÁ- TCBC-SP- FCMSC-SP-BR
EDNA FRASSON DE SOUZA MONTERO – TCBC-SP- UNIFESP-BR
MANUEL DOMINGOS DA CRUZ GONÇALVES – TCBC-RJ- UFRJ-BR
TALITA ROMERO FRANCO- ECBC-RJ- UFRJ-BR
EDUARDO CREMA – TCBC-MG- UFTM-UBERABA-MG-BR
MARIA DE LOURDES P. BIONDO SIMOES – TCBC-PR – PUCPR-BR
WILLIAM ABRÃO SAAD- ECBC-SP- USP -BR
CONSULTORES
IVO H. J. CAMPOS PITANGUY, TCBC-RJ
MARCOS F. MORAES, ECBC-RJ
SAUL GOLDENBERG, ECBC-SP
KARL H. FUCHS
Markus-Krankenhaus Frankfurter DiakonieKliniken, Wilhelm-Epstein-Straße 4, 60435
Frankfurt am Main
ULRICH ANDREAS DIETZ
Department of Surgery I, University of Würzburg,
Medical School, Würzburg, Germany
PROF. W. WEDER
Klinikdirektor- UniversitätsSpital Zürich,
Switzerland
CLAUDE DESCHAMPS
M.D - The Mayo Clinic, MN,USA
NACIONAIS
ADIB DOMINGOS JATENE – ECBC-SP
ALCINO LÁZARO DA SILVA, ECBC-MG
ALUIZIO SOARES DE SOUZA RODRIGUES, ECBC-RJ
ANTONIO LUIZ DE MEDINA, TCBC-RJ
ANTONIO PELOSI DE MOURA LEITE, ECBC-SP
DARIO BIROLINI, ECBC-SP
FARES RAHAL, ECBC-SP
FERNANDO MANOEL PAES LEME, ECBC-RJ
FERNANDO LUIZ BARROSO, ECBC-RJ
ISAC JORGE FILHO, ECBC-SP
CONSULTORES
ESTRANGEIROS
ARNULF THIEDE
Department of Surgery, University of Würzburg
Hospital, Oberdürrbacher Str. 6, D-97080
Würzburg, Germany
MURRAY BRENNAN
HeCBC Department of Surgery, Memorial SloanKettering Cancer Center, New York NY, USA
MUNICIPAL SÃO JOSÉ- SC-BR
FFFCMPA-BR
EDITORES DA REVISTA DO CBC
1967 - 1969
JÚLIO SANDERSON
1973 - 1979
HUMBERTO BARRETO
1983 - 1985
JOSÉ LUIZ XAVIER PACHECO
1992 - 1999
MERISA GARRIDO
1969 - 1971
JOSÉ HILÁRIO
1980 - 1982
EVANDRO FREIRE
1986 - 1991
MARCOS MORAES
2000 - 2001
JOSÉ ANTÓNIO GOMES
DE
SOUZA
2002 - 2005
GUILHERME PINTO BRAVO NETO
A REVISTA DO COLÉGIO BRASILEIRO DE CIRURGIÕES é indexada no Latindex, Lilacs e Scielo, Scopus, Medline/PubMed, DOAJ,
Free Medical Journals e enviada bimestralmente a todos os membros do CBC, aos seus assinantes, a entidades médicas, bibliotecas,
hospitais, e centros de estudos, publicações com as quais mantém permuta, e aos seus anunciantes.
REDAÇÃO, ASSINATURAS e ADMINISTRAÇÃO
Rua Visconde de Silva, 52 - 3° andar - Botafogo - 22271-092 - Rio de Janeiro - RJ - Brasil
Tel.: + 55 21 2138-0659; Fax: + 55 21 2286-2595; E-mail: [email protected]
http//www.cbc.org.br
Preço da assinatura anual: a vista, R$ 150,00
ou três parcelas de R$ 60,00
Números avulsos e/ou atrasados: R$ 40,00
Preço da assinatura para o exterior: US$ 248,00
Tiragem: 5.000 exemplares
International Standard Serial Number
ISSN 0100-6991
PUBLICIDADE
IMPRESSÃO e ACABAMENTO
Gráfica e Editora Prensa Ltda
Rua João Alvares, 27
Saúde - Rio de Janeiro - RJ
Tel.: (21) 2253-8343
PROJETO GRÁFICO
Tel.: (21) 3116-8300
E-mail: [email protected]
Márcio Alvim de Almeida
PROJETO GRÁFICO - CAPA
Tasso
REVISTA DO COLÉGIO BRASILEIRO DE CIRURGIÕES
Indexada no Latindex, LILACS e SciELO, Medline/PubMed, Scopus, DOAJ e Free Medical Journals
SUMÁRIO / CONTENTS
Rev Col Bras Cir 2013; 40(2)
EDITORIAL
“Hérnias complexas” da parede abdominal
Complex abdominal wall hernias
Renato Miranda de Melo ............................................................................................................................................................................. 090
ARTIGOS ORIGINAIS
Avaliação perioperatória de pacientes em unidade de terapia intensiva
Perioperative assessment of the patients in intensive care unit
Stelma Regina Sodré Pontes; Rosimarie Morais Salazar; Orlando Jorge Martins Torres ............................................................................ 092
Fatores preditores de fístula salivar pós-laringectomia total
Predictors of salivary fistula after total laryngectomy
Alexandre de Andrade Sousa; José Maria Porcaro-Salles; João Marcos Arantes Soares; Gustavo Meyer de Moraes;
Jomar Rezende Carvalho; Guilherme Souza Silva; Paulo Roberto Savassi-Rocha ....................................................................................... 098
Divertículo faringoesofagiano: avaliação dos resultados do tratamento
Pharyngoesophageal diverticulum: evaluation of treatment results
Maria Aparecida Coelho de Arruda Henry; Mauro Masson Lerco; José Vicente Tagliarini; Emanuel Celice Castilho;
Fabiola Trocoli Novaes; Vania Cristina Lamonica .......................................................................................................................................... 104
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à tireoidectomia
BRAF mutation in the elderly submitted to thyroidectomy
Antonio Augusto T. Bertelli; Antonio José Gonçalves; Marcelo B. Menezes; Murilo R. Melo; Stefano Tincani;
Luiz Cláudio Bosco Massarollo ...................................................................................................................................................................... 110
Avaliação espirométrica de doentes com sequela de tuberculose submetidos à lobectomia
Spirometry evaluation in patient with tuberculosis sequelae treated by lobectomy
Elias Amorim; Roberto Saad Junior; Roberto Stirbulov ................................................................................................................................ 117
Valor prognóstico da citologia positiva no lavado peritoneal de pacientes com câncer gástrico ressecável
Prognostic role of positive peritoneal cytology in patients with resectable gastric cancer
Alexandre Menezes Brito; Bruno José de Queiroz Sarmento; Eliane Duarte Mota; Ailton Cabral Fraga Júnior;
Paulo Moacir Campoli; Leonardo Medeiros Milhomem; Orlando Milhomem da Mota ............................................................................... 121
A biópsia de linfonodo sentinela não deve ser recomendada para pacientes portadores de melanoma espesso
Sentinel node biopsy should not be recommended for patients with thick melanoma
Renato Santos de Oliveira Filho; Allisson Monteiro da Silva; Daniel Arcuschin de Oliveira; Gustavo Gianotto Oliveira;
Fabio Xerfan Nahas ...................................................................................................................................................................................... 127
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando veia jugular interna
Stable experimental model of carotid artery saccular aneurysm in swine using the internal jugular vein
Severino Lourenço da Silva Júnior; Guilherme Benjamin Brandão Pitta; Adamastor Humberto Pereira; Aldemar de Araújo Castro;
Maria Helena Tavares de Matos; Fábio Duque Silveira; Leonardo Torres Magalhães; José Adolfo Hurt Almeida de Moraes;
Emmylena Karina Cordeiro Machado; Carlos Wagner de Souza Wanderley; Camila Meirelles de Souza Silva;
Luciana da Paz dos Santos; João Nicolle Tupiná Nogueira ........................................................................................................................... 130
Repercussão hepática da carcinogênese colorretal induzida pelo azoximetano
Hepatic repercussions of azoxymethane-induced colorectal carcinogenesis
Idália Maria Brasil Burlamaqui; Conceição Aparecida Dornelas; Paulo Roberto Carvalho Almeida; Francisco Vagnaldo Fechine Jamacaru;
Daniel Magalhães Coutinho Mota; Francisco José Cabral Mesquita; Lara Albuquerque de Brito; Lara Burlamaqui Veras;
Lusmar Veras Rodrigues ............................................................................................................................................................................... 137
Rev. Col. Bras. Cir.
Rio de Janeiro
Vol 40
Nº 2
p 090 / 171
mar/abr
2013
REVISÃO
Cirurgia para controle de danos: estado atual
Damage control surgery: an update
Rodrigo Camargo Leão Edelmuth; Yuri dos Santos Buscariolli; Marcelo Augusto Fontenelle Ribeiro Junior ............................................... 142
ENSINO
Avaliação de treinamento cirúrgico na graduação de medicina
Evaluation of surgical training in medical school
Kátia Sheylla Malta Purim; Laila Djensa Souza dos Santos; Gabriel Treml Murara; Eliane Mara Cesário Pereira Maluf;
Julio Wilson Fernandes; James Skinovsky ..................................................................................................................................................... 152
NOTA TÉCNICA
Linfadenectomia no câncer gástrico com hook laparotômico
Lymphadenectomy in gastric cancer with laparotomic hook
André Rossetti Portela; Mário Gissoni de Carvalho; José de Alencar Gonçalves de Macedo ...................................................................... 157
Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo de radiofrequência
Laparoscopic hepatectomy with radiofrequency device
Vivian Resende; Cristiano Xavier Lima; Mário Marcos Lusckal; Milton Carlos Aguiar Junior; Emanuele Gammeri;
Nagy Adley Habib; José Renan da Cunha-Melo ........................................................................................................................................... 160
TELEMEDICINA BASEADA EM EVIDÊNCIA (TBE-CITE)
Classificação de gravidade na pancreatite aguda
Classification of severity of acute pancreatitis
Tercio De Campos; José Gustavo Parreira; José Cesar Assef; Sandro Rizoli; Barto Nascimento; Gustavo Pereira Fraga ........................... 164
RELATO DE CASOS
Tumor raro em mediastino: hamartoma
A rare mediastinum tumor: hamartoma
Roberto Saad Júnior; José Donato de Próspero; Roberto Gonçalves; Jorge Henrique Rivaben; Fabiano Alves Squeff .............................. 169
Rev. Col. Bras. Cir.
Rio de Janeiro
Vol 40
Nº 2
p 090 / 171
mar/abr
2013
Silva
O momento do Editorial
Cirurgião Geral
90
“ H é rnias complexas
” da parede abdominal
complexas”
Complex abdominal wall hernias
TCBC–GO RENATO MIRANDA DE MELO
A
s hérnias ventrais, incluindo as epigástricas e umbilicais, as inguinais, as femorais e as incisionais se revestem de grande importância médica, seja por sua
frequência mais elevada ou pelas repercussões clínicas mais
graves que podem acarretar.
Entretanto, permanece imprecisa a classificação
da hérnia incisional, que mesmo passível de ocorrer em
qualquer região do abdome, onde haja uma cicatriz, está
inserida entre as ventrais, cuja localização é especificamente anterolateral, segundo os Descritores em Ciências
da Saúde (DeCS/BIREME) e a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, em sua 10a. revisão (CID-10). Essas mesmas convenções internacionais também não diferenciam as hérnias
primárias das recidivadas nem levam em consideração seu
tamanho ou volume, seja do anel ou do conteúdo herniado,
que podem variar amplamente. Vale ressaltar ainda que,
por definição, toda hérnia recidivada é também uma hérnia incisional, e como tal deverá ser considerada.
Um dos desdobramentos dessa incerteza é que
o Sistema Único de Saúde (SUS), e muitos dos planos e
seguros privados, não reconhecem que hérnias primárias
(epigástricas, umbilicais, inguinais e femorais/crurais) sejam passíveis de grande crescimento, ainda que mais raramente. Assim, reservam para o seu reparo apenas as
próteses (telas) de tamanho pequeno, como se todas elas
tivessem anel herniário e conteúdo pequenos sempre. E
seguem o mesmo critério para o tratamento do que denominam “hérnias recidivantes”. Quanto às incisionais, prevêem a utilização de telas médias, com base na mesma
premissa, não raras vezes, exigindo justificativa para as
próteses grandes e sobretudo para as especiais.
No tocante às hérnias epigástricas e umbilicais,
grande parte das vezes são defeitos pequenos, que dão
passagem apenas à gordura pré-peritonial, e seu tratamento
é obtido por sutura simples do anel, recompondo o estrato
musculoaponeurótico, após a exérese ou a redução do
conteúdo herniado. O mesmo não se aplica àquelas que
atingiram volumes maiores, como ocorre na maioria das
hérnias incisionais e também em algumas inguinais primárias, pois exigem procedimentos mais elaborados e onerosos (grande porte), incluindo a utilização de telas especiais e de tamanho grande, além de demandarem maior
tempo no preparo e na recuperação desses pacientes.
A despeito de o volume do conteúdo herniado
não guardar relação com o tamanho do anel, algumas
podem adquirir grandes proporções, provocando a perda
de domicílio das vísceras e estruturas abdominais, em que
parte considerável desses elementos se aloja no saco
herniário. Este pode atingir 20% ou mais do volume abdominal, constituindo uma “segunda cavidade”, o que provoca alterações graves na dinâmica ventilatória, na postura corporal, no retorno venoso e no linfático, na motilidade
intestinal e na perfusão esplâncnica, especialmente a renal, e também da pele, como as dermatites, as úlceras e o
abdome em avental. Da mesma forma, a redução pura e
simples do conteúdo herniado, sem o devido preparo do
paciente (e da cavidade abdominal primitiva), pode não só
inviabilizar a redução desse conteúdo, mas também gerar
complicações graves, decorrentes do aumento súbito da
pressão intra-abdominal (PIA), como a síndrome de compartimento abdominal, que pode ser letal.
Algumas comorbidades, como hipertensão, diabetes e obesidade, que são comuns nesses casos, aumentam a frequência de complicações, dificultando o manejo
clínico desses pacientes e, muitas vezes, exigem que o seu
tratamento seja realizado em Unidade de Terapia Intensiva. Além disso, a necessidade quase imperativa do uso de
telas grandes e especiais, para reduzir a possibilidade de
recidiva, elevam os custos assistenciais, onerando ainda
mais as fontes pagadoras.
Esses e outros desafios fazem com que os pacientes, nessas condições, sequer sejam admitidos na maioria dos serviços cirúrgicos, sobretudo aqueles que atendem
ao SUS. É um risco proibitivo para os primeiros e um obstáculo às vezes intransponível para os últimos. Isso acaba
por forçar o referenciamento desse contingente para hospitais públicos e universitários, gerando longas filas de espera e o afastamento desnecessário de indivíduos, muitas
em idade produtiva, seja do mercado de trabalho ou do
convívio social. A principal razão que leva esses pacientes
a procurar atendimento, com todas as mazelas da exclusão a que estão subjugados, é a intenção de melhorar a
qualidade de vida, entendida de maneira global.
Mas padecer de uma hérnia complexa não é
prerrogativa das classes menos favorecidas.
Na verdade, as hérnias reúnem muitas afecções
sob uma única denominação, mas trata-se de um grupo
bastante heterogêneo. A etiologia é multifatorial, as repercussões são variadas, assim como as complicações também podem ser múltiplas. Portanto, o tratamento adequado deverá ser particularizado, multimodal e, por vezes,
multiprofissional. O objetivo é devolver o conteúdo herniado
à cavidade abdominal, corrigir o defeito e recuperar a função da parede, com o mínimo de complicações e de
sequelas.
Rev. Col. Bras. Cir. 2012; 40(2): 090-091
Silva
O momento do Cirurgião Geral
91
Não há procedimento considerado padrão-ouro
para corrigi-las. E mais, nas dobras e no domo do saco
herniário, a pele redundante pode apresentar-se macerada
ou mesmo ulcerada e, nos casos de abdome em avental,
ela deverá ser ressecada (dermolipectomia), para facilitar
a abordagem cirúrgica e a higienização, além de ajudar a
reerguer a autoestima dos pacientes.
Por tudo isso, os portadores de hérnias volumosas, associadas a alterações locais e sistêmicas graves, exigem atenção e cuidados redobrados. Não raras vezes, impõem-se medidas preliminares de expansão da cavidade
abdominal, mediante insuflação de ar ambiente ou de gás
carbônico (pneumoperitônio progressivo pré-operatório) e/
ou bloqueio farmacológico da musculatura lateral do abdome, com toxina botulínica do tipo A, na tentativa de
favorecer a redução do conteúdo herniado e de prevenir,
simultaneamente, a síndrome compartimental. O fortalecimento diafragmático e a melhora da expansibilidade
pulmonar, pela fisioterapia respiratória e motora, são fundamentais para que a correção desses defeitos maiores
não prejudique ainda mais a função pulmonar, já comprometida pela própria hérnia. Da mesma forma, deve-se compensar as deficiências nutricionais, por meio de reposição
específica, seja por dieta oral, enteral ou parenteral. Abordagens simplistas, imediatistas ou intempestivas estão sujeitas ao fracasso, que pode variar desde uma recidiva a
mais até o óbito, dado o alto grau de complexidade inerente a esses casos.
Se não bastassem tais desafios, as planilhas de
custo dos planos de saúde, públicos ou privados, não diferenciam o tratamento de quadros mais complexos daqueles mais simples. Todos são nivelados em patamar único e
mínimo, para fins de remuneração. Enquanto o trabalho
médico e os gastos hospitalares, sobretudo com o pessoal
de apoio (enfermeiros, fisioterapeutas e nutricionistas), são
subestimados, os materiais utilizados para esse fim (telas e
grampeadores, por exemplo) são sobrevalorizados, quan-
do não sobretaxados, o que faz seu custo final subir
exponencialmente. De forma paradoxal, paga-se bem mais
por um dispositivo industrializado, fabricado em série, do
que pelo trabalho particularizado, caso a caso, para
implantá-lo com segurança em um organismo já adoecido. É útil lembrar que a responsabilidade do médico, assim
como a do fabricante desses materiais, não se encerra ao
final do procedimento cirúrgico, mas se prolonga por vários anos nos pacientes que receberam qualquer tipo de
prótese.
Atualmente, tanto no âmbito do SUS como no
da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), não
há procedimento específico que contemple o tratamento
dessas lesões mais complexas. Ao corrigir tais defeitos,
muitos deles gigantescos, o médico despende várias horas
de trabalho, em procedimentos laboriosos e de execução
desafiadora, até para aqueles com maior experiência clínica, e por remuneração muito aquém do justo.
Também não há consenso sobre o que seja
uma hérnia complexa, tampouco do seu manejo ideal,
e menos ainda do valor pela contraprestação dos serviços, ao contrário de outras afecções, não menos graves
da parede abdominal, como a onfalocele e a
gastrosquise, que figuram entre as malformações do sistema osteomuscular.
É premente que tais questões sejam
reexaminadas, a fim de inserir as “hérnias complexas da
parede abdominal”, neste rol, com base na elevada gravidade desses casos, e para que o seu tratamento seja realizado em serviços com capacidade instalada adequada (recursos humanos e tecnológicos) e também para que seja
valorizado de forma proporcional à alta complexidade dos
procedimentos.
Assim como fez a Cirurgia Bariátrica e Metabólica, qualquer proposta deverá partir da definição do que se
entenda por “hérnia complexa” e do credenciamento de
serviços preparados para tratá-la adequadamente.
Rev. Col. Bras. Cir. 2012; 40(2): 090-091
Pontes
Avaliação perioperatória de pacientes em unidade
de terapia
intensiva
Artigo
Original
92
Avaliação perioperatória de pacientes em unidade de terapia
intensiva
Perioperative assessment of the patients in intensive care unit
STELMA REGINA SODRÉ PONTES1; ROSIMARIE MORAIS SALAZAR2; ORLANDO JORGE MARTINS TORRES, TCBC-MA3
R E S U M O
Objetivo
Objetivo: Avaliar as condições pré-operatórias e o procedimento cirúrgico relacionando-os à morbidade e mortalidade de pacientes
cirúrgicos em uma unidade de terapia intensiva geral de um hospital universitário. Métodos
Métodos: Foram estudados os prontuários de
pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos de médio e grande porte, admitidos na unidade de terapia intensiva geral. Foram
analisados: dados demográficos, quadro clínico, registros de antecedentes pessoais e exames laboratoriais pré-operatórios e de
admissão na unidade de terapia intensiva, exames de imagem, relato operatório, boletim anestésico e antibioticoprofilaxia. Após a
admissão, as variáveis estudadas foram: tempo de internação, tipo de suporte nutricional, utilização de tromboprofilaxia, necessidade de ventilação mecânica, descrição de complicações e mortalidade. Resultados
Resultados: Foram analisados 130 prontuários. A mortalidade foi 23,8% (31 pacientes); Apache II maior do que 40 foi observado em 57 pacientes submetidos à operação de grande porte
(64%); a classificação ASA e” II foi observada em 16 pacientes que morreram (51,6%); o tempo de permanência na unidade de
terapia intensiva variou de um a nove dias e foi observado em 70 pacientes submetidos à cirurgia de grande porte (78,5%); a
utilização da ventilação mecânica por até cinco dias foi observada em 36 pacientes (27,7%); hipertensão arterial sistêmica foi
observada em 47 pacientes (47,4%); a complicação mais frequente foi a sepse. Conclusão
Conclusão: a correta estratificação do paciente
cirúrgico determina sua alta precoce e menor exposição a riscos aleatórios
Descritores: Morbidade. Mortalidade. Pacientes. Período perioperatório. Unidades de terapia intensiva.
INTRODUÇÃO
A
pesar de toda a evolução científica e tecnológica, as
complicações relacionadas às doenças e aos seus respectivos tratamentos ainda se fazem presentes e proporcionam grandes preocupações1,2.
A avaliação perioperatória é constituída por um
conjunto de procedimentos realizados antes e depois da
operação, com objetivo agregar as diferentes áreas do conhecimento de forma sistemática, para a identificação de
fatores que possam aumentar o risco operatório, planejando estratégias para evitar ou reduzi-los, visando o melhor
curso operatório. Sua realização se justifica pela ocorrência de complicações pós- operatórias que variam entre 17
e 20%1,2. Pacientes cirúrgicos submetidos a grandes procedimentos são constantemente admitidos nas Unidades de
Terapia Intensiva (UTI), o que leva a um maior custo hospitalar3,4.
Diversos fatores influenciam no resultado global do paciente de risco, tais como hipotermia, alterações do sistema cardiovascular e respiratório,
desequilíbrios hidroeletrolítico e acidobásico e perdas
volêmicas, podendo ocasionar várias mudanças na
homeostase orgânica devido ao estresse cirúrgico. Nesse
aspecto, a UTI tem sido estimulada a utilizar mecanismos
de avaliação para estratificar pacientes com real risco de
morte ou morbidade. A determinação do prognóstico e a
efetividade dos tratamentos desse paciente têm influência na prevenção das complicações e manutenção das
condições de recuperação8,9. Nesse aspecto, a UTI tem
sido estimulada a utilizar mecanismos de avaliação para
estratificar pacientes com realNesse aspecto, a UTI tem
sido estimulada a utilizar mecanismos de avaliação para
estratificar pacientes com real risco de morte ou
morbidade. A determinação do prognóstico e a efetividade
dos tratamentos desse paciente têm influência na prevenção das complicações e manutenção das condições
de recuperação5.
Dentro da instituição hospitalar, a avaliação do
risco para determinado grupo de pacientes pode ser utilizada para orientar os recursos financeiros, de pessoal e
das instalações hospitalares. As UTI’s constituem aproximadamente 20% dos custos hospitalares, seu
gerenciamento pode ser uma forma de reduzi-los6-8.
Trabalho realizado na Disciplina de Clínica Cirúrgica III e Unidade de Terapia Intensiva Geral do Hospital Universitário – Universidade Federal do
Maranhão – UFMA.
1. Enfermeira do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (UFMA); 2. Médica da Unidade de Terapia Intensiva Geral do
Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão – UFMA; 3. Professor Livre-Docente do Departamento de Cirurgia da Universidade
Federal do Maranhão (UFMA) – UFMA.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 092-097
Pontes
Avaliação perioperatória de pacientes em unidade de terapia intensiva
A avaliação do risco é realizada através da
anamnese, do exame físico e de exames complementares
baseados nos dados da clínica do paciente. Estudos descrevem que a avaliação pré-operatória influi positivamente no resultado final do ato operatório6,9. A classificação da
American Society of Anaesthesiologists (ASA)2 é um dos
métodos utilizado para avaliar tais riscos. Esse tipo de sistema de avaliação é bastante usado para quantificar os
riscos cirúrgicos. Aproximadamente 50% da mortalidade
cirúrgica pode ser classificada como escore IV ou V, 33% é
III e apenas 17% é I e II10. Pode existir significante variabilidade perioperatória na avaliação ASA, colaborando no
manejo do paciente. Nas UTI’s, o sistema APACHE II (Acute
Physiology and Chronic Health Evaluation) é muito utilizado, colaborando com o planejamento da assistência do
paciente grave11-13.
O diagnóstico inicial é essencial para o ajuste do
risco, portanto, estabelecer critérios comuns e referências
para observação e comparação através do reconhecimento precoce das complicações, a intervenção adequada e
acompanhamento criterioso, são a chave para evitar o
desfecho negativo do ato operatório. O tempo de internação
pode ser visto como um marcador indireto de resultados
adversos e de maior utilização de recursos após a operação12-16.
O objetivo deste estudo foi avaliar as condições
pré-operatórias e o procedimento cirúrgico relacionandoos com a morbidade e mortalidade de pacientes cirúrgicos
em uma unidade de terapia intensiva geral de um hospital
universitário.
MÉTODOS
Foram analisados, de forma retrospectiva e analítica, os dados de prontuários de pacientes submetidos à
operações de médio e grande porte no período de janeiro
a agosto de 2009, encaminhados à UTI do Hospital Universitário Unidade Presidente Dutra, da Universidade Federal
do Maranhão (UFMA). A população constou de 146 prontuários dos quais 16 foram excluídos, permanecendo 130
prontuários analisados. Todos aqueles que tiveram indicação pré, trans e pós-operatória e que foram admitidos imediatamente após o procedimento cirúrgico na UTI, foram
incluídos no estudo. Os critérios de exclusão foram pacientes submetidos a procedimentos cardíacos por terem unidade de terapia intensiva específica, os submetidos à operação em outras unidades hospitalares, os em pós-operatório de procedimentos obstétricos e crianças, bem como,
prontuários incompletos.
Após aprovação do Comitê de Ética, a coleta de
dados foi realizada, junto aos prontuários, através do registro em ficha específica. As variáveis levantadas foram idade, sexo, quadro clínico, registros pré-operatórios, exames
laboratoriais pré-operatórios e de admissão na UTI
(hemograma completo, eletrólitos e marcadores hepáticos,
93
gasometria arterial) e de imagem (ultrassonografia,
tomografia computadorizada, ressonância magnética e
radiografia), relato cirúrgico, boletim anestésico e
antibioticoprofilaxia. Durante o período de internação foram estudados tempo de internação e tipo de nutrição
adotada, uso de anticoagulante, uso de ventilação mecânica e alta ou óbito como desfecho. Foram utilizados como
avaliador do estado físico, o escore ASA no pré-operatório
descrito em ficha de anestesia e APACHE II como indicador de gravidade, aplicado nas primeiras 48 horas de
internação na UTI.
Os procedimentos cirúrgicos foram classificados
em médio (operações com até duas horas de duração) e
grande porte (operações com mais de duas horas de duração), sendo cada operação agrupada por especialidade ficando descriminados por cirurgia abdominal, neurológica,
ortopédica, torácica, urológica e vascular. Cada prontuário
foi lido rigorosamente confrontando-se nome e número de
matrícula e atendendo aos critérios de exclusão. Para que
os dados fossem coletados de forma correta, a ficha protocolo foi anteriormente testada. Houve a participação de
um coletor, que foi treinado para a correta coleta de dados. A releitura de todo prontuário foi realizada para melhor interpretação dos dados observados.
Os fatores associados à mortalidade e às complicações graves no período perioperatório foram determinados através de modelos de regressão logística múltipla. Inicialmente, foram investigadas cada uma das variáveis agrupadas segundo afinidades, problemas clínicos coexistentes,
complexidade da operação e dados referentes ao procedimento cirúrgico. Posteriormente, foi investigada a
colinearidade entre variáveis de cada grupo e entre variáveis de grupos distintos. Foram incluídas no modelo final
apenas as que apresentaram associação mais forte com o
evento.
O banco de dados foi estruturado para a realização das análises descritivas. A entrada dos dados foi realizada mensalmente com análise de consistência paralela e
correção de eventuais erros. Utilizou-se software estatístico para a construção e análise desses modelos preditivos
do risco de mortalidade.
Para a comparação dos dados entre os diferentes grupos foi utilizado o teste de Qui-quadrado, conforme
o tamanho da amostra. O nível de significância adotado
para a hipótese de nulidade foi 5% (p<0,05).
RESULTADOS
No período do estudo foram analisados 146 prontuários, dos quais 16 (10,9%) foram excluídos; dez destes
(6,8%) por serem mulheres submetidas à cesariana que
evoluíram com complicações no pós-parto, quatro (2,7%)
com informações insuficientes para o estudo e dois (1,4%)
por serem crianças. A amostra final foi constituída de 130
prontuários que preenchiam os critérios de inclusão.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 092-097
Pontes
Avaliação perioperatória de pacientes em unidade de terapia intensiva
94
Dos 130 prontuários analisados, a sobrevida foi
76,1% (99 pacientes), havendo predomínio do sexo masculino (59,5%) e a faixa etária destes pacientes foi superior a 40 anos de idade em 63 pacientes (63,6%). Oitenta e
nove pacientes (68,5%) foram submetidos à operação de
grande porte, dentre as quais a operação abdominal foi
realizada em 35 pacientes (35,5%). Através da avaliação
do estado físico, 65 pacientes (65,5%) foram classificados
em ASA II; 38 pacientes (38,3%) apresentavam o índice
de massa corporal (IMC) inferior a 18,7%; e a hipertensão
arterial sistêmica (HAS) foi observada em 47 pacientes
(47,4%), entretanto esse achado não influenciou na alta
hospitalar (Tabela 1).
Quanto à admissão dos pacientes na UTI, 89
pacientes (68,5%) foram submetidos a operações classificadas como de grande porte. Na classificação ASA, o risco
maior ou igual a II foi observado em 70 pacientes (53,8%)
A avaliação de escore de gravidade APACHE II
considerou o risco de 40% de mortalidade para a maioria
dos pacientes na admissão na UTI (81 pacientes – 62,3%);
57 (64,0%) realizaram operação classificada como de grande porte. Os que evoluíram a óbito representaram 38,3%,
sendo 12 pacientes do grupo de médio porte e 19 pacientes do grupo de grande porte (Tabela 2). O tempo de permanência na unidade de terapia intensiva foi de até nove
dias.
Noventa e quatro pacientes (72,3%) não fizeram uso de suporte ventilatório invasivo. Trinta e seis pacientes permaneceram até cinco dias com ventilação mecânica. Não houve diferença significante em relação à complexidade cirúrgica (Tabela 2).
Tabela 1 -
A tromboprofilaxia subcutânea foi realizada em
todos os pacientes, incluindo os 99 que sobreviveram. A
enoxeparina foi o medicamento de escolha. O suporte
nutricional foi utilizado em 41 pacientes (31,5%) distribuídos em relação ao porte da operação: 25 (19,2%) receberam suporte nutricional enteral e 16 (12,3%), parenteral,
(Tabela 2).
A ocorrência de complicações apresentou relação direta com a sobrevida do paciente. Dentre os pacientes que receberam alta hospitalar, 76 pacientes (76,7%)
não apresentaram nenhum tipo de complicação. Dentre
os pacientes que morreram, a presença de sepse não controlada em 17 pacientes (54,8%) foi a complicação mais
observada e que apresentou relação direta com o óbito do
paciente. A hemorragia esteve presente em 11 pacientes
(35,4%). A infecção do sítio cirúrgico, observada nos dois
grupos, não apresentou relação com o óbito do paciente,
apesar de mais frequente nos que morreram (nove pacientes – 29%) (Tabela 3).
O antibiótico, com a finalidade profilática, foi
utilizado em 94 pacientes (72,3%). A cefazolina foi o antibiótico mais frequentemente empregado.
DISCUSSÃO
A população cirúrgica vem crescendo
gradativamente e, com ela, a maior necessidade de se
estabelecerem critérios de avaliação para identificar a gravidade do procedimento cirúrgico proposto. Mais de 40%
dos cuidados intensivos são para pacientes no pós-opera-
Características predominantes segundo aspectos demográficos, porte cirúrgico, tipo de operação, ASA, IMC e doença associada, em pacientes que evoluíram para alta ou óbito.
GS (n=99-76,1%)
Porte cirúrgico
Médio
Grande
Tipos de operação
Abdominal
Neurológica
Torácica
Ortopédica
Urológica
Vascular
Sexo
Masculino
Idade
(> 40 anos)
ASA > II
IMC < 18,7
Doença associada (HAS)
GNS (n=31- 23,9%)
p
29
70
(29,1)
(70,7)
12 (38,7)
19 (61,2)
< 0,05*
35
24
20
15
4
1
(35,3)
(24,1)
(20,2)
(15,1)
(4,1)
(1,2)
16
4
4
4
3
-
(51,6)
(12,9)
(12,9)
(12,9)
(9,7)
NS
NS
NS
NS
NS
NS
59
(59,5)
14 (45,1)
NS
63
65
38
47
(63,6)
(65,6)
(38,3)
(47,4)
25
16
22
4
NS
NS
< 0,01*
< 0,01*
(80,6)
(51,6)
(70,7)
(12,9)
GS – grupo sobrevivente; GNS – grupo não sobrevivente; IMC – índice de massa corpórea; *teste Qui-quadrado
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 092-097
Pontes
Avaliação perioperatória de pacientes em unidade de terapia intensiva
Tabela 2 –
95
Características dos 130 pacientes da UTI segundo admissão, alta, APACHE II, tempo de ventilação mecânica, uso de
anticoagulante, tipo de nutrição e óbito.
Porte da operação
Médio (n/%)
Admissão (pré-op.)
ASA > II (99 pacientes)
APACHE II (40%-81 pacientes)
Tempo de internação (1-9 dias)
Ventilação mecânica
Não utilizaram
Até cinco dias
Tromboprofilaxia (enoxaparina)
Nutrição
Enteral (25 pacientes)
Parenteral (16 pacientes)
Óbito
Grande (n/%)
p
41
29
24
29
(31,5)
(22,3)
(18,5)
(22,3)
89
70
57
70
(68,5)
(53,8)
(43,8)
(53,8)
< 0,05*
NS
NS
NS
25
7
29
(19,2)
(5,4)
(22,3)
69 (53,1)
29 (22,3)
70 (53,8)
NS
NS
< 0,05*
9
4
12
(6,9)
(3,1)
(9,2)
16 (12,3)
12
(9,2)
19 (14,6)
NS
NS
NS
*Teste Qui-quadrado. NS – Não significante
tório e depende do estado físico e do tipo de operação,
principalmente nas de grande porte10.
Grande parte dos pacientes admitidos na UTI foi
submetida à operação de grande porte. Houve percentual
maior do sexo masculino e a idade foi superior a 40 anos
de idade. Essas duas variáveis não foram influentes no prognóstico dos pacientes em relação à alta ou óbito. Satyawan
et al.14 determinaram o bom prognóstico em longo prazo
de pacientes com mais de 80 anos de idade após terem
sido submetidos a procedimento cirúrgico sem que houvesse influência do sexo na avaliação final. Todavia, sabese que a morbidade ocorre com mais frequência naqueles
com mais idade, influenciando na mortalidade15-17. Cerca
de 30% da amostra desenvolveu algum tipo de complicação e consequente mortalidade, mas a idade e o sexo não
foram fatores determinantes. A sepse apresentou relação
com a mortalidade.
A complicação infecciosa continua sendo causa
frequente de mortalidade cirúrgica18,19. A taxa de infecção
foi elevada, em relação a outros estudos20, apesar do acentuado uso do antibiótico profilático, isso comprova que o
Tabela 3 –
antibiótico deve estar associado a um conjunto de medidas que minimizem a ocorrência de infecção. A cefazolina
foi usada em nossa população seguindo as orientações para
a administração desse medicamento19.
Em geral, os pacientes recebem alta da UTI
após 24 ou 48 horas da admissão. Alguns estudos relatam que a alta na hora apropriada reduz o uso excessivo
e desnecessário dos recursos da UTI obedecendo aos critérios de avaliação estabelecidos pela equipe, reduzindo
custos e principalmente promovendo o bem-estar dos
pacientes21,22.
Em observância aos critérios de avaliação, a
maioria dos pacientes teve classificação ASA II no pré-operatório e quando admitidos na UTI, foram pontuados com
escore de mortalidade estabelecido em 40% pelo APACHE
II23, a associação entre estes dados influenciou na mortalidade geral do estudo. Castro Júnior et al. concluíram que
pacientes com escore APACHE II maior que oito e submetidos às operações de grande porte, poderão apresentar
elevado índice de morbimortalidade12, assemelhando-se a
estes dados.
Distribuição de pacientes segundo ocorrência de complicações nos pacientes sobreviventes e não sobreviventes. São
Luis, 2010.
Complicações
Sem complicações
Infecção do sítio cirúrgico
Hemorragia
Pneumonia
Sepse
Outras
Sobreviventes
N=99 (n/%)
76
6
7
4
2
4
(76,7)
(6,0)
(7,0)
(4,0)
(2,0)
(4,0)
*Teste Qui-quadrado
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 092-097
Não sobreviventes
N=31 (n/%)
9
11
7
17
6
(29,0)
(35,4)
(22,5)
(54,8)
(19,3)
P
< 0,001*
< 0,05
< 0,05
< 0,05
< 0,05
Pontes
Avaliação perioperatória de pacientes em unidade de terapia intensiva
96
Esse aspecto se estende ao uso da ventilação
mecânica onde a mortalidade foi maior que 90%. O
processo de retirada da prótese ventilatória no paciente em pós-operatório é mais difícil e ocupa quase 40%
do tempo total de ventilação mecânica, além do que
aumenta o risco de pneumonia, tempo de internação,
custos hospitalares e mortalidade em torno de 20 a
70%24. Dos 39% dos pacientes que permaneceram na
UTI, 10% ficaram por um período maior na ventilação
mecânica.
Apesar disso, grande parte da amostra não utilizou ventilação mecânica. Houve resposta direta no tempo
de internação dos doentes e a prevalência da pneumonia
foi apenas 4% naqueles que tiveram alta. Um estudo realizado por Soares et al.25, comprovou que o menor tempo
de prótese ventilatória e a deambulação precoce contribuem para a menor permanência na UTI.
Contudo, vários fatores são complicadores para
a maior permanência na UTI, dentre eles está a trombose
venosa profunda26. Os pacientes politraumatizados ou os
submetidos à intervenção cirúrgica de longa duração apresentam
risco
aumentado
de
desenvolver
tromboembolismo26-28. No estudo, muito embora não tivesse sido relatado nenhum caso de tromboembolismo, os
pacientes fizeram uso de enoxeparina e, em sua maioria,
o seu emprego esteve associado com o tipo de procedimento cirúrgico.
A heparina de baixo peso molecular está indicada
nas operações potencialmente causadoras de trombose.
Essa indicação depende da avaliação da história clínica e
de exames adequados. As indicações estão bem definidas
na literatura27.
Dentre tantos aspectos a serem vistos em relação ao paciente cirúrgico a avaliação nutricional é também fundamental e tem como objetivos estimar o risco de
mortalidade e morbidade da desnutrição, identificando e
individualizando as suas causas e consequências, com in-
dicação e intervenção mais precisa e a eficácia da terapêutica nutricional17. Como a maioria dos pacientes recebeu alta hospitalar sem complicações, o suporte nutricional
(nutrição enteral e parenteral) foi pouco utilizado e, além
disso, nos que evoluíram a óbito não foi significante a correlação entre as duas dietas, provavelmente devido ao tamanho da amostra.
No que diz respeito à doença associada, a hipertensão arterial foi mais prevalente e, levando-se em consideração que esta doença é muitas vezes de difícil controle, a internação na UTI no pós-operatório é medida de
segurança19,28. Mesmo tendo tido significante número de
hipertensos observados, não foi associado à
morbimortalidade e apenas quatro pacientes nessa condição foram a óbito.
A taxa de mortalidade global foi elevada em
relação a outras encontradas na literatura16,27,28.
Os resultados deste estudo demonstraram que a
indicação da maioria dos pacientes para a UTI foi motivada por características comuns como alta complexidade cirúrgica, maior prevalência de hipertensos, idade e ASA que
estiveram significantemente associadas à mortalidade predita pelo APACHE II. A infecção foi o fator de risco mais
prevalente na UTI, aumentando o tempo de internação e
mortalidade.
Apesar de não estar contemplado no trabalho,
não foi encontrada nenhuma descrição ou conduta referente à dor no pós-operatório. Desta forma, existe a necessidade de se incluir nas condutas da UTI, protocolos para o
manejo da dor no paciente cirúrgico. Considera-se que
apesar das limitações metodológicas do estudo, o fato de
ter sido realizado em apenas uma UTI e ter tido uma
amostragem pequena, os resultados estão de acordo com
a maioria dos dados de UTI’s descritos na literatura e evidenciam que a correta estratificação do paciente cirúrgico
determina sua alta precoce e menor exposição a riscos
aleatórios.
A B S T R A C T
Objective: To evaluate the preoperative condition and the surgical procedure of surgical patients in a general intensive care unit
Objective
Methods: We studied the medical records of patients undergoing
of a university hospital, relating them to morbidity and mortality. Methods
medium and large surgical procedures, admitted to the general intensive care unit. We analyzed: demographic data, clinical
records personal history and laboratory tests, both preoperatively and on admission to the intensive care unit, imaging, operative
reports, anesthetic reports and antibiotic prophylaxis. After admission, the variables studied were: length of stay, type of
Results: We
nutritional support, use of thromboprophylaxis, mechanical ventilation, description of complications and mortality. Results
analyzed 130 medical records. Mortality was 23.8% (31 patients), Apache II greater than 40 was observed in 57 patients
undergoing major surgery (64%), ASA classification e” II was observed in 16 patients who died (51.6 %), the length of stay in the
intensive care unit ranged from one to nine days and was observed in 70 patients undergoing major surgery (78.5%), the use of
mechanical ventilation for up to five days was observed in 36 patients (27.7%), hypertension was observed in 47 patients (47.4%),
Conclusion: the correct stratification of surgical patient determines their early
the most frequent complication was sepsis. Conclusion
discharge and reduced exposure to random risk.
words: Morbidity. Mortality. Patients. Perioperative period. Intensive care units.
Key words
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 092-097
Pontes
Avaliação perioperatória de pacientes em unidade de terapia intensiva
REFERÊNCIAS
1. Pinho C, Grandini PC, Gualandro DM, Calderaro D, Monachini M,
Caramelli B. Multicenter study of perioperative evaluation for
noncardiac surgeries in Brazil (EMAPO). Clinics. 2007;62(1):17-22
2. Saad IAB, Zambom L. Variáveis clínicas de risco pré-operatório.
Rev Assoc Med Bras. 2001;47(2):117-24.
3. Lobo SM, Rezende E, Knibel MF, Silva NB da, Páramo JAM, Nácul
F, et al. Epidemiologia e desfecho de pacientes cirúrgicos não
cardíacos em unidades de terapia intensiva no Brasil. Rev Bras Ter
Int. 2008;20(4):376-84.
4. Abelha FJ, Castro MA, Landeiro NM, Neves AM, Santos CC. Mortalidade e o tempo de internação em uma unidade de terapia
intensiva cirúrgica. Rev bras anestesiolol. 2006;56 (1):34-45.
5. Hartl WH, Wolf H, Schneider CP, Küchenhoff H, Jauch KW. Acute
and long-term survival in chronically critically ill surgical patients: a
restrospective observational study. Crit Care. 2007;11(3):R55.
6. Boyd O, Jakson N. How is risk defined in high-risk surgical patient
management? Crit Care. 2005;9(4):390-6.
7. Solberg BC, Dirksen CD, Nieman FH, van Merode G, Poeze M,
Ramsay G. Changes in hospital costs after introducing an
intermediate care unit: a comparative observational study. Crit
Care. 2008;12(3):R68.
8. de Cássia Mello Guimarães R, Rabelo ER, Moraes MA, Azzolin K.
Severity of postoperative cardiac surgery patients: an evolution
analysis according to TISS-28. Rev Lat Am Enfermagem.
2010;18(1):61-6.
9. Meynaar IA, van der Spoel JI, Rommes JH, van Spreuwel-Verheijen
M, Bosman RJ, Spronk PE. Off hour admission to an intensivist-led
ICU is not associated with increased mortality. Crit Care.
2009;13(3):R84.
10. Goldhill DR. Preventing surgical deaths: critical care and intensive
care outreach services in the postoperative period. Br J Anaesth.
2005;95(1):88-94.
11. Nogueira LS, Santos MR, Mataloun SE, Moock M. Nursing Activities
Score: comparação com o índice APACHE II e a mortalidade em
pacientes admitidos em unidade de terapia intensiva. Rev bras ter
Intensiva. 2007;19(3):327-30.
12. Castro Júnior MAM, Castro MAM, Castro AP, Silva AL. O sistema
Apache II e o prognóstico de pacientes submetidos às operações
de grande e pequeno porte. Rev Col Bras Cir. 2006;33(5):272-8.
13. Ghaferi AA, Birkmeyer JD, Dimick JB. Variation in hospital mortality
associated with inpatient surgery. N Engl J Med.
2009;361(14):1368-75.
14. Bhat SA, Shinde VS, Chaudhari LS. Audit of intensive care unit
admissions from the operative room. Indian J Anaesth.
2006;50(3):193-200.
15. Boumendil A, Maury E, Reinhard I, Luquel L, Offenstadt G, Guidet
B. Prognosis of patients aged 80 years and over admitted in medical
intensive care unit. Intensive Care Med. 2004;30(4):647-54.
16. Machado AN, Sitta Mdo C, Jacob Filho W, Garcez-Leme LE.
Prognostic factors for mortality among patients above the 6th
decade undergoing non-cardiac surgery: cares—clinical assessment
and research in elderly surgical patients. Clinics. 2008;63(2):151-6.
17. Davies SJ, Wilson RT. Preoperative optimization of the righ-risk
surgical patient. Br J Anaesth. 2004;93(1):121-8.
97
18. Afessa B, Gajic O, Morales IJ, Keegan MT, Peters SG, Hubmayr
RD. Association between ICU admission during morning rounds
and mortality. Chest. 2009;136(6):1489-95.
19. Nakano CS, Safatle NF, Moock M. Análise crítica dos pacientes
cirúrgicos internados na unidade de terapia intensiva. Rev bras ter
int. 2007;19(3): 348-53.
20. Lichtenfels E, Lucas ML, Webster R, D’Azevedo PA. Profilaxia
antimicrobiana em cirurgia vascular periférica: cefalosporina ainda é padrão-ouro? J vasc bras. 2007;6(4):378-87.
21. Wilson AP, Gibbons C, Reeves BC, Hodgson B, Liu M, Plummer D,
et al. Surgical wound infection as a performance indicator:
agreement of common definitions of wound infection in 4773
patients. BMJ. 2004;329(7468):720.
22. Hofhuis JG, Spronk PE, van Stel HF, Schrijvers AJ, Bakker J. Quality
of life before intensive care unit admission is a predictor of survival.
Crit Care. 2007;11(4):R78.
23. Aylin P, Bottle A, Majeed A. Use of administrative data or clinical
databases as predictors of risk of death in hospital: comparison of
models. BMJ. 2007;334(7602):1044.
24. Goldwasser R, Farias A, Freitas EE, Saddy F, Amado V. Okamoto
V. Desmame e interrupção da ventilação mecânica. J bras pneumol.
2007;33(supl. 2):128-36.
25. Soares TR, Avena KM, Olivieri FM, Feijó LF, Mendes KMB, Mendes
Filho SA, et al. Retirada do leito após a descontinuação da ventilação mecânica: há repercussão na mortalidade e no tempo de
permanecia na unidade de terapia intensiva? Rev bras ter intensiva. 2010;22(1):27-32.
26. Abelha F, Maia P, Landeiro N, Neves A, Barros H. Determinants of
outcome in patients admitted to a surgical intensive care unit. Arq
Med. 2007;21(5-6):135-43.
27. Diogo-Filho A, Maia CP, Diogo DM, Fedrigo LSP, Diogo PM, Vasconcelos PM. Estudo de vigilância epidemiológica da profilaxia do
tromboembolismo venoso em especialidades cirúrgicas de um hospital universitário de nível terciário. Arq Gastroenterol.
2009;46(1):9-14.
28. Jhanji S, Thomas B, Ely A, Watson D, Hinds CJ, Pearse RM.
Mortality and utilisation of critical care resources amongst highrisk surgical patients in a large NHS trust. Anaesthesia.
2008;63(7):695-700.
Recebido em 25/05/2012
Aceito para publicação em 03/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma.
Como citar este artigo:
Pontes STS, Salazar RM, Torres OJM. Avaliação perioperatória de
pacientes em unidade de terapia intensiva. Rev Col Bras Cir. [periódico
na Internet] 2013;40(2). Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Orlando Jorge Martins Torres
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 092-097
Sousa
Fatores preditores de fístula salivar
pós-laringectomia
total
Artigo
Original
98
Fatores preditores de fístula salivar pós-laringectomia total
Predictors of salivary fistula after total laryngectomy
ALEXANDRE DE ANDRADE SOUSA1; JOSÉ MARIA PORCARO-SALLES, TCBC-MG2; JOÃO MARCOS ARANTES SOARES3; GUSTAVO MEYER DE
MORAES4; JOMAR REZENDE CARVALHO4; GUILHERME SOUZA SILVA4; PAULO ROBERTO SAVASSI-ROCHA, TCBC-MG5
R E S U M O
Objetivo: Avaliar a incidência de fístula faringocutânea após laringectomia total e tentar identificar os fatores preditores.. Métodos: No período de maio de 2005 a abril de 2010, 93 pacientes foram submetidos à laringectomia total. Foram avaliadas as
complicações per e pós-operatórias e comparadas com as seguintes variáveis: sexo, estado nutricional, traqueostomia prévia,
localização do tumor primário, tipo de operação realizada, estadiamento de acordo com o TNM, tratamento prévio com quimioterapia
e/ou radioterapia, utilização de retalhos para reconstrução e margem cirúrgica. Todos os pacientes apresentavam a neoplasia em
estádio avançado segundo o TNM. Resultados: 14 (15,1%) pacientes evoluíram com fístula salivar no pós-operatório. O tempo
médio de aparecimento da fístula salivar foi 3,5 dias, com desvio padrão de 13,7 dias. Comparando a fístula salivar com as variáveis
TNM, tipo de operação e esvaziamento cervical, traqueostomia prévia, utilização de retalho miocutâneo, rádio e quimioterapia préoperatória e margem cirúrgica, não foi observado diferença estatisticamente significativa (p>0,05). Conclusão: A incidência de
fístula salivar foi 15,1% e não foi encontrado fator preditor para sua formação.
Descritores: Fístula do sistema digestório. Fístula das glândulas salivares. Complicações pós-operatórias. Laringectomia. Neoplasias
laríngeas.
INTRODUÇÃO
A
cirurgia de cabeça e pescoço aborda rotineiramente
pacientes oncológicos, idosos, tabagistas, portadores
de doenças vasculares, diabéticos e portadores de outras
doenças que predispõem as diversas complicações pós-operatórias que estão diretamente associadas com aumento
da morbidade, tempo de hospitalização do paciente e custos do tratamento1-5.
As complicações podem ser de ordem geral ou
específica. Dentre as primeiras, temos os hematomas, infecção de ferida cirúrgica e complicações sistêmicas, como
tromboembolismo pulmonar e infarto agudo do miocárdio.
Já as complicações específicas se relacionam ao tipo de
procedimento cirúrgico realizado.
Quando analisamos as complicações relacionadas às laringectomias, a fístula faringocutânea é a mais
comum após laringectomia total, com incidência de 3% a
65%. Dentre os fatores de risco identificados como
preditores de fístula, são citados: a desnutrição, margem
cirúrgica comprometida, radioterapia prévia, esvaziamento cervical, traqueostomia prévia, estádio avançado do tumor e má técnica cirúrgica1-6.
O objetivo desse estudo foi avaliar o perfil dos
pacientes com câncer de laringe, verificar a incidência de
complicações após laringectomia total e tentar identificar os fatores preditores para as complicações pósoperatórias.
MÉTODOS
Foi realizado estudo retrospectivo, com avaliação dos prontuários dos pacientes submetidos à
laringectomia total no período de maio de 2005 a abril de
2010 pela equipe de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do
Instituto Alfa de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas
da UFMG. Os pacientes foram operados no Hospital da
Baleia, no Hospital das Clínicas da UFMG em Belo Horizonte e no Hospital São João de Deus em Divinópolis. O
estudo foi aprovado pelo CEP da UFMG - parecer número
ETIC 0584.1.203.000-09.
Todos os pacientes tiveram diagnóstico de carcinoma espinocelular, tendo como sítio primário a laringe, o
seio piriforme ou valécula. Foram revistas as rotinas de
cuidados pré, per e pós-operatórias para verificar se havia
diferença no tratamento dos pacientes. Foram avaliadas
as complicações per e pós-operatórias e comparadas com
as seguintes variáveis: sexo, estado nutricional,
traqueostomia prévia, localização do tumor primário, tipo
Trabalho realizado no Instituto Alfa de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da UFMG- MG-BR.
1. Professsor Adjunto da Faculdade de Medicina da UFMG- MG-BR; 2. Professor da Faculdade de Medicina da UFMG; 3. Professor Adjunto da
Faculdade de Medicina da UFSJ; 4. Membro do Grupo de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto Alfa de Gastroenterologia; 5. Professor.
Titular da Faculdade de Medicina da UFMG.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 098-103
Sousa
Fatores preditores de fístula salivar pós-laringectomia total
99
de operação realizada (sítio primário e esvaziamento
cervical), estadiamento de acordo com o TNM7, tratamento prévio com quimioterapia e/ou radioterapia, utilização
de retalhos para reconstrução e margem cirúrgica.
A análise estatística foi realizada utilizando nível
de significância de 5% para todos os testes.
RESULTADOS
Foram operados, de maio de 2005 à abril de
2010, 93 pacientes. No Hospital da Baleia (33), no Hospital das Clínicas da UFMG (32) e no Hospital São João de
Deus (28).
O tratamento cirúrgico foi padrão, no que diz
respeito à técnica operatória e cuidados pré, per e pósoperatórios. No pré-operatório imediato, per-operatório e
nas primeiras 24 horas de pós-operatório os pacientes receberam clindamicina na dose de 600mg de 6/6 horas.
Após a laringectomia, o fechamento da faringe
foi realizado primariamente, com fio Vycril® 000, com sutura contínua em forma de “T”.
Nos pacientes em que o remanescente faríngeo
foi considerado insuficiente para o fechamento primário e
nos casos nos quais a quimioirradiação foi utilizada como
tratamento primário, utilizou-se na reconstrução faríngea
o retalho miocutâneo de músculo peitoral maior. Nesses
casos as bordas do remanescente faríngeo foram suturadas
à pele do retalho com Vycril® 000.
Todos os pacientes receberam dieta enteral a
partir do primeiro dia de pós-operatório (DPO) por meio de
cateter nasoentérico. Nos pacientes sem fístula salivar a
dieta oral foi iniciada a partir do sétimo DPO, e sua consistência alterada progressivamente nos dias subsequentes,
iniciando com dieta líquida, depois pastosa e finalmente,
sólida.
Nos casos de infecção de ferida operatória ou
fístula salivar, antibioticoterapia com ceftriaxona e
clindamicina foi iniciada a partir do diagnóstico e mantidos
por dez a 14 dias. Durante esse período os pacientes foram mantidos com dieta enteral exclusiva.
A média de idade dos pacientes foi 58,9 (32 a
86) anos, e 87 (93,5%) eram do sexo masculino e seis
(6,5%) do feminino.
Tabela 2 -
Em relação ao estado nutricional, 35 (64,7%)
pacientes estavam nutridos no pré-operatório imediato. Os
desnutridos, classificados como leve, moderado e grave,
respectivamente, cinco (9,3%), nove (16,7%) e cinco
(9,3%). Em 39 pacientes não havia informações nos prontuários. Sete (20,0%) pacientes nutridos e sete (36,8%)
desnutridos evoluíram com fístula salivar no pós-operatório, sem diferença estatisticamente significativa entre os
dois grupos (p=0,15).
A traqueostomia prévia ao tratamento cirúrgico
definitivo foi realizada em 43 (46,2%) pacientes.
O estadiamento dos pacientes segundo o TNM
encontra-se na tabela 1. Para esse estadiamento, foram
considerados os dados do exame anatomopatológico.
Em relação à localização do tumor, 25,7% situavam-se na supraglote, 22,5% transglóticos, 22,5% na
hipofaringe, 20,3% na glote, 6,5% na valécula e 2,5%
eram localizados na subglote.
Dos 93 pacientes, a ressecção foi a primeira opção terapêutica em 78 (83,9%) e 15 (16,1%) foram submetidos, previamente à operação, à radioterapia e/ou
quimioterapia; sendo que destes, dois foram submetidos à
laringectomia total associada ao esvaziamento cervical
(jugular bilateral em um paciente e jugular + radical em
outro). Os outros 13 (14,0%) pacientes foram submetidos
apenas à laringectomia total de resgate (Tabela 2). Após a
exérese do tumor, verificou-se que em dez pacientes havia
infiltração nas margens cirúrgicas, elas foram ressecadas
(Tabela 3).
Vinte e dois (23,6%) pacientes necessitaram
de reconstrução da faringe com retalho miocutâneo do
Tabela 1 -
Estádio
Estádio T
Estádio N
%
N
T3
T4
N0
N1
N2
N3
23
70
42
20
27
4
24,7
75,3
45,2
21,5
29,0
4,3
Tratamento cirúrgico realizado incluindo os procedimentos realizados no pescoço (n = 93 pacientes).
Procedimento cirúrgico
Tumor primário
Pescoço
Estadiamento dos pacientes de acordo com o
TNM (n = 93 pacientes).
N
Laringectomia total
Faringolaringectomia total
Glossectomia de base + laringectomia total
Sem esvaziamento cervical
Esvaziamento cervical radical bilateral
Esvaziamento cervical radical + jugular
Esvaziamento cervical jugular bilateral
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 098-103
48
37
8
13
15
46
19
%
51,6
39,8
8,6
14,0
16,1
49,5
20,4
Sousa
Fatores preditores de fístula salivar pós-laringectomia total
100
peitoral maior. Nos outros 71 casos, o fechamento foi
primário.
O tempo cirúrgico médio das operações foi 308,9
minutos, com o mínimo de 120 e máximo de 550 minutos.
Os pacientes permaneceram com cateter
nasoentérico de sete a 150 dias para alimentação enteral,
com média de 26,08 dias. A dieta por via oral foi iniciada,
em média, no 17,7o + 14,7 dia de pós-operatório, variando
de sete a 90 dias.
Dentre as complicações cirúrgicas, 14 (15,1%)
dos pacientes apresentaram fístula salivar no pós-operatório, sendo que, o tempo médio de aparecimento foi de
3,5 dias com desvio padrão de 13,7 dias. Treze (14,0%)
dos pacientes tiveram infecção de ferida operatória, três
(3,2%) evoluíram com hematoma cervical com necessidade de intervenção cirúrgica e dois (2,2%) casos com
pneumonia.
Considerando apenas a fístula salivar e comparando-a com as variáveis estudadas, não foi observada diferença estatisticamente significativa (p=0,19) entre a presença de metástase cervical e o estádio do tumor e a presença de fístula salivar (Tabelas 4 e 5). A tabela 6 mostra a
comparação entre as variáveis estudadas e a incidência de
fístula salivar.
Tabela 3 -
Estado das margens cirúrgicas em 93 pacientes.
Margem cirúrgica
Margens livres
Carcinoma invasor
Carcinoma in situ
Exíguas
Sem informação
Tabela 4 -
N
%
76
7
2
1
7
81,7
7,5
2,1
1,2
7,5
DISCUSSÃO
As complicações cirúrgicas estão diretamente
associadas com aumento do tempo de hospitalização, custos do tratamento e retardo no início de radioterapia e,
consequentemente, piores resultados no controle
oncológico1,3.
Vários fatores podem contribuir para aumentar
a incidência das complicações, incluindo radioterapia associada ou não à quimioterapia pré-operatória, desnutrição, tempo operatório e estádio do tumor 2-6,8,9.
Nesse estudo, assim como na maioria encontrada na literatura, a complicação pós laringectomia total mais
frequente foi a fístula faringocutânea. A sua incidência foi
15,1%, o que condiz com a encontrada na literatura 1-4,8,10.
A média de tempo de aparecimento da fístula salivar foi
3,5 dias, o que também foi observado em outros estudos6,11.
A Infecção da ferida operatória está diretamente relacionada à presença da fístula salivar.
Os sinais clínicos do aparecimento da fístula salivar incluem edema e hiperemia da pele cervical, aumento
da drenagem de secreção nos drenos ou na ferida operatória e, algumas vezes, febre4,12. A identificação desses sinais permite o diagnóstico e tratamento precoce da fístula
salivar, reduzindo o risco de infecções mais graves13.
Em relação ao tratamento da fístula salivar, há
um consenso de que, inicialmente, deve ser conservador
(antibioticoterapia e curativo), pois as fístulas se fecham
espontaneamente na maioria dos casos4,14,15. O tratamento
cirúrgico é reservado para os casos de falha do tratamento
clínico14. Nessa casuística, nenhum paciente precisou de
fechamento cirúrgico da fístula salivar.
Os pacientes com tumores na região da cabeça
e pescoço são, na maioria das vezes, desnutridos. Dois
fatores estão associados e contribuem para a desnutrição:
Incidência de fístula salivar conforme o estádio das metástases em 82 pacientes.
Estadio N
Fístula salivar
Grupo com fístula
n (%)
N0
N positivo
Valor de p
Grupo sem fístula
n (%)
10 (25,6%)
4
(9,3%)
29 (74,4%)
39 (90,7%)
0,09
* Em 11 pacientes não havia informações nos prontuários
Tabela 5 -
Incidência de fístula salivar conforme o estadio do tumor em 79 pacientes.
Estadio T
Fístula salivar
Grupo com fístula
n (%)
T3
T4
5 (23,8%)
9 (15,5%)
* Em 14 pacientes não havia informações nos prontuários.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 098-103
Valor de p
Grupo sem fístula
n (%)
16 (76,2%)
49 (84,5%)
0,40
Sousa
Fatores preditores de fístula salivar pós-laringectomia total
Tabela 6 -
101
Incidência da fístula salivar de acordo com suas possíveis causas.
Variável
Fístula salivar
Sim
n (%)
Laringectomia total
Faringolaringectomia total
Glossectomia total + laringectomia total
Sem esvaziamento cervical
Esvaziamento cervical radical bilateral
Esvaziamento cervical radical + jugular
Esvaziamento cervical jugular bilateral
QtRxt pré-operatória
Sim
(85 pacientes)
Não
Retalho miocutâneo
Sim
(84 pacientes)
Não
TQT prévia
Sim
(84 pacientes)
Não
Margem cirúrgica
Livre
(85 pacientes)
Comprometida
6
8
0
4
1
6
3
13
11
4
10
6
8
12
2
Valor de p
Não
n (%)
(12,5%)
(21,6%)
(0,0%)
(30,8%)
(6,7%)
(13,0%)
(15,8%)
(20,0%)
(15,7%)
(20,0%)
(15,6%)
(14,6%)
(18,6%)
(16,0%)
(20,0%)
42 (87,5%)
29 (78,4%)
8 (100,0%)
9 (69,2%)
14 (93,3%)
40 (87,0%)
16 (84,2%)
12 (80,0%)
59 (84,3%)
16 (80,0%)
54 (84,4%)
35 (85,4%)
35 (81,4%)
63 (84,0%)
8 (80,0%)
0,26
0,25
0,46
0,43
0,63
0,51
* O n é menor que 93 em algumas variáveis estudadas devido à ausência de informação nos prontuários.
Legenda: QtRxt – quimiorradioterapia
um deles é a própria neoplasia, que leva ao metabolismo
ineficiente de carboidratos, catabolismo acelerado de proteínas e depleção progressiva de lipídios. O outro é mecânico, pela presença do tumor, que acarreta, em alguns
casos, disfagia, odinofagia e redução da ingestão de alimentos8. O diagnóstico de desnutrição é na verdade uma
combinação de variáveis clínicas e laboratoriais. Do ponto
de vista clínico, a perda de peso superior a 10% do peso
habitual no período pré-operatório classifica o paciente
como desnutrido grave. Essa perda de peso é considerada
como fator preditor maior para complicações pós-operatórias4. Nesse estudo, embora aproximadamente 60% dos
pacientes estivessem desnutridos, esse fator não aumentou a incidência de fístula salivar (p=0,45).
Laboratorialmente, na rotina, podemos lançar
mão da dosagem de proteínas plasmáticas (albumina e
transferrina), e contagem linfocitária. Boscolo-Rizzo et al.3,
em análise multivariada, mostraram que hipoalbuminemia
pré-operatória, está associada a maior incidência de complicações cirúrgicas, incluindo a fístula salivar. Nesse estudo, não encontramos os valores de albumina nos prontuários estudados. A linfocitopenia, que também poderia ser
avaliada, não foi encontrada nos hemogramas pré-operatórios.
O estádio do tumor é um dos fatores preditores
de fístula salivar mais comentado na literatura1,5-7,10,11,16.
Apesar disso, no nosso estudo, não houve aumento de incidência de fístula salivar nos pacientes com tumores mais
avançados.
De acordo com Virtaniemi et al.11, os tumores
de supraglote requerem ressecções mais extensas, incluindo a parede faríngea, o que pode determinar maior tensão
na linha de sutura faríngea e, consequentemente, maior
risco de fístula salivar. Esse achado não foi observado no
estudo atual. Também não foi encontrada diferença estatisticamente significativa entre os sítios dos tumores operados, talvez pela utilização de retalho miocutâneo, usado
de forma rotineira nesses e nos casos de tratamento prévio
com quimiorradiação e naqueles que teriam tensão na linha de sutura.
Pacientes submetidos ao esvaziamento cervical
apresentam incidência maior de fístula salivar do que aqueles tratados apenas com laringectomia total8,13, entretanto,
esse achado não foi observado no presente estudo (p=0,25),
assim como, por outros autores3-5,11,14,16.
A traqueostomia prévia não foi fator preditor para
fístula salivar o que está de acordo com os dados encontrados na literatura consultada5,12,15,17. Em geral, os pacientes
traqueostomizados no pré-operatório apresentavam tumores em estádio mais avançado e, portanto, o fator preditor
de fístula salivar seria o estádio da neoplasia e não a
traqueostomia prévia.
O comprometimento das margens cirúrgicas pela
neoplasia ocorreu em 10,7% dos casos, sendo que esse
dado não influenciou no aparecimento da fístula salivar
(p=0,72), o que está de acordo com Dedivitis et al.6, embora Markou et al.18 tenham observado aumento significativo de incidência de fístula salivar.
A radioterapia e a quimioterapia no pré-operatório não predispuseram ao aparecimento de fístula salivar,
achado também descrito por outros autores1-5,10,11. Entretanto, foi observado6,12,14,17,19 uma maior incidência de fístula
salivar em pacientes assim tratados, além de seu aparecimento mais precoce. Esses autores mostraram que a incidência de fístula salivar estava diretamente relacionada à
dose de radiação aplicada ao paciente, sendo que as doses
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 098-103
Sousa
Fatores preditores de fístula salivar pós-laringectomia total
102
acima de 5000 cGy têm maior risco. Alguns estudos mostram que a incidência de fístula salivar não foi alterada pelo
tratamento radioterápico prévio, entretanto, as que ocorreram eram mais graves e de longa duração 5,19.
A utilização de retalho miocutâneo para reconstrução da faringe não se mostrou fator preditor para o aparecimento de fístula salivar (p=0,66). Talvez a utilização
do retalho tenha proporcionado menor taxa de fístula salivar, considerando que os pacientes que deles necessitaram, a princípio, tinham tumores em estádio mais avançado ou eram operações de resgate após radioterapia e/ou
quimioterapia. Sarra et al.15 sugerem a utilização de retalhos nas reoperações ou nos casos de estenose faríngea,
observada ainda no per operatório. Smith et al.8 utilizam o
retalho miocutâneo sistematicamente em todos os casos
de laringectomia total e mostram redução drástica da incidência de fístula salivar. Sousa et al.1 e Tsou et al.14 tam-
bém sugerem a utilização de retalho para fechamento da
parede faríngea em todos os casos de resgate cirúrgico
após radioterapia e quimioterapia. Isso é a rotina do nosso
Serviço. A colocação de um tecido não irradiado num leito
em que já houve irradiação talvez propicie cicatrização mais
adequada e redução das taxas de fístula.
A ampla variação da incidência de fístula salivar
encontrada na literatura pode ser explicada pela grande
variação na seleção de pacientes e técnica cirúrgica empregada. Nesse estudo, com o objetivo de avaliar o perfil
dos pacientes e a incidência de complicações, foram incluídos todos os pacientes submetidos a laringectomia total,
mesmo de resgate ou com necessidade de utilização de
retalho miocutâneo para reconstrução, seja da faringe ou
da base de língua. Concluímos que não houve fator preditor
de fístula salivar e que a incidência de fístula salivar foi
15,1%, similar à encontrada na literatura mundial.
A B S T R A C T
Objective: To evaluate the incidence of pharyngocutaneous fistula after total laryngectomy and try to identify its predictors.
Objective
Methods: From May 2005 to April 2010, 93 patients underwent total laryngectomy. We evaluated complications during and after
Methods
surgery and compared them with the following variables: gender, nutritional status, previous tracheotomy, tumor location, type of
surgery, TNM staging, prior treatment with chemotherapy and/or radiotherapy, use of flaps for reconstruction and surgical margin.
Results: 14 (15.1%) patients developed postoperative
All patients presented with advanced neoplastic disease according to TNM. Results
salivary fistula. The mean time to onset of salivary fistula was 3.5 days, with a standard deviation of 13.7 days. Comparing salivary
fistula with TNM variables, type of operation and neck dissection, prior tracheotomy, use of flap, preoperative radio and chemotherapy
Conclusion: The incidence of salivary fistula was
and surgical margin, there was no statistically significant difference (p> 0,05). Conclusion
15.1% and no predictive factor for its formation was found.
words: Fistula of the digestive system. Fistula salivary glands. Postoperative complications. Laryngectomy. Laryngeal
Key words
neoplasms.
REFERÊNCIAS
1. Sousa AA, Castro SM, Porcaro-Salles JM, Soares JM, de Moraes
GM, Carvalho JR, et al. The usefulness of a pectoralis major
myocutaneous flap in preventing salivary fistulae after salvage
total laryngectomy. Braz J Otorhinolaryngol. 2012;78(4):103-7.
2. Aswani J, Thandar M, Otiti J, Fagan J. Early oral feeding following
total laryngectomy. J Laryngol Otol. 2009;123(3):333-8.
3. Boscolo-Rizzo P, De Cillis G, Marchiori C, Carpenè S, Da Mosto
MC. Multivariate analysis of risk factors for pharyngocutaneous
fistula after total laryngectomy. Eur Arch Otorhinolaryngol.
2008;265(8):929-36.
4. Mäkitie AA, Niemensivu R, Hero M, Keski-Säntti H, Bäck L, Kajanti
M, et al. Pharyngocutaneous fistula following total laryngectomy:
a single institution’s 10-year experience. Eur Arch Otorhinolaryngol.
2006;263(12):1127-30.
5. Paydarfar JA, Birkmeyer NJ. Complications in head and neck
surgery: a meta-analysis of postlaryngectomy pharyngocutaneous
fístula. Arch Otolaryngol Heah Neck Surg. 2006;132(1):67-72.
6. Dedivitis RA, Ribeiro KC, Castro MA, Nascimento PC.
Pharyngocutaneous fistula following total larygectomy. Acta
Otorhinolaryngologica Ital. 2007;27(1):2-5.
7. Edge SB, Byrd DR, Compton CC, Fritz AG, Greene FL, Trotti A,
editors. AJCC Cancer Staging Manual. 7th ed. New York: Springer;
2009.
8. Smith TJ, Burrage KJ, Ganguly P, Kirby S, Drover C. Prevention of
postlaryngectomy pharyngocutaneos fistula: the Memorial
University experience. J Otolaryngol. 2003;32(4):222-5.
9. Trinidad Ruiz G, Luengo Pérez LM, Marcos García M, Pardo
Romero G, González Palomino A, Pino Rivero V, et al. Value of
nutritional support in patients with pharingocutaneous fistula. Acta
Otorrinolaringol Esp. 2005;56(1):25-30.
10. Cocek A. The history and current status of surgery in the treatment
of laryngeal cancer. Acta Medica. 2008;51(3):157-63.
11. Virtaniemi JA, Kumpulainen EJ, Hirvikoski PP, Johansson RT, Kosma
VM. The incidence and etiology of postlaryngectomy
pharyngocutaneous fistulae. Head Neck. 2001;23(1):29-33.
12. Galli J, De Corso E, Volante M, Almadori G, Paludetti G. Postlaryngectomy
pharyngocutaneous fistula: incidence, predisposing factors, and
therapy. Otolaryngol Head Neck Surg. 2005;133(5):689-94.
13. Assis LAP, Negri SLC, Oliveira EL, Filho LF, Pires ESB. Fístula
faringocutânea após laringectomia total: experiência do Hospital
Mário Penna. Rev Bras Cir Cabeça e Pescoço. 2004;33(2):77-81.
14. Tsou YA, Hua CH, Lin MH, Tseng HC, Tsai MH, Shaha A. Comparison
of pharyngocutaneous fistula between patients followed by primary
laryngopharyngectomy and salvage laryngopharyngectomy for
advanced hypopharyngeal cancer. Head Neck. 2010;32(11):1494500.
15. Sarra LD, Rodríguez JC, García Valea M, Bitar J, Da Silva A.
Fistula following total laryngectomy. Retrospective study and
bibliographical review. Acta Otorrinolaringol Esp. 2009;60(3):186-9.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 098-103
Sousa
Fatores preditores de fístula salivar pós-laringectomia total
103
16. Soylu L, Kiroglu M, Aydogan B, Cetik F, Kiroglu F, Akçali C, et al.
Pharyngocutaneous fistula following laryngectomy. Head Neck.
1998;20(1):22-5.
17. Papazoglou G, Doundoulakis G, Terzakis G, Dokianakis G.
Pharyngocutaneous fistula after total laryngectomy: incidence,
cause, and treatment. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1994;103(10):8015.
18. Markou KD, Vlachtsis KC, Nikolaou AC, Petridis DG, Kouloulas AI,
Daniilidis IC. Eur Arch Otorhinolaryngol. 2004;261(2):61-7.
19. Wakisaka N, Murono S, Kondo S, Furukawa M, Yoshizaki T. Postoperative pharyngocutaneous fistula after laryngectomy. Auris
Nasus Larynx. 2008;35(2):203-8.
Recebido em 05/06/2012
Aceito para publicação em 07/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma
Como citar este artigo:
Sousa AA, Porcaro-Salles JM, Soares JMA, Moraes GM, Carvalho JR,
Silva GS, Savassi-Rocha PR. Fatores preditores de fístula salivar póslaringectomia total. Rev Col Bras Cir. [periódico na Internet] 2013;40(2).
Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Alexandre de Andrade Sousa
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 098-103
Henry
Divertículo faringoesofagiano: avaliação dosArtigo
resultados do
tratamento
Original
104
Divertículo faringoesofagiano: avaliação dos resultados do
tratamento
Pharyngoesophageal diverticulum: evaluation of treatment results
MARIA APARECIDA COELHO DE ARRUDA HENRY, ECBC-SP 1; MAURO MASSON LERCO2; JOSÉ VICENTE TAGLIARINI3; EMANUEL CELICE CASTILHO4;
FABIOLA TROCOLI NOVAES5; VANIA CRISTINA LAMONICA6
R E S U M O
Objetivo: Avaliar a evolução pós-operatória de pacientes com divertículo faringoesofagiano submetidos aos tratamentos
cirúrgico e endoscópico. Métodos: Foram analisados de maneira retrospectiva 36 pacientes com divertículo faringo-esofagiano
atendidos no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP. Os pacientes foram distribuídos em dois
grupos, na dependência do tratamento: grupo 1 (n=24) – diverticulectomia associada á miotomia do cricofaríngeo, através de
Resultados: A mortalidade
cervicotomia esquerda; grupo 2 (n=12) – diverticulostomia endoscópica usando grampeador linear. Resultados
operatória foi nula em ambos os grupos. Complicações precoces: grupo 1 – dois pacientes desenvolveram fistula cervical e outros
dois, rouquidão; grupo 2 – sem complicações. Complicações tardias: grupo 1 – sem complicações: grupo 2: recidiva da disfagia em
quatro pacientes (p=0,01). O seguimento médio foi 33 meses para o grupo 1 e 28 meses para o grupo 2. Conclusão: Os dois
procedimentos foram eficazes na remissão da disfagia. O tratamento cirúrgico apresentou superioridade em relação ao endoscópico,
com resolução da disfagia com um único procedimento. O tratamento endoscópico deve ser reservado para os mais idosos e
portadores de comorbidades.
Descritores: Transtornos de deglutição. Divertículo de Zenker. Terapêutica. Procedimentos cirúrgicos operatórios.
Endoscopia.
INTRODUÇÃO
D
escrito em 1764 por Abrahan Ludlow1, o divertículo
faringoesofagiano (DFE) é o mais comum dos
divertículos esofagianos. Esta afecção recebe também a
denominação de divertículo de Zenker2, patologista alemão que, em associação com Von Ziensen, publicou os
primeiros 27 casos, sendo 5 de sua casuística pessoal.
O DFE é pouco frequente, representando três a
5% das doenças esofagianas, sendo mais freqüente no
sexo masculino3-5. Esta doença raramente ocorre em indivíduos com menos de 40 anos, sendo a década dos 65 aos
75 anos a mais acometida6.
A fisiopatologia do DFE ainda não está completamente elucidada. O mecanismo mais aceito é o que
considera esta doença resultante do aumento da pressão
na luz da faringe, ocasionando herniação da mucosa através de um ponto de fraqueza na musculatura esofagiana
(triângulo de Killian). Este é um espaço entre os músculos
constritor inferior da faringe e crico-faringeo7.
Várias técnicas têm sido propostas para o tratamento do DFE. Dentre as técnicas empregadas, a
divertículopexia proposta por Lerut et al. em 19908 foi substituída pela diverticulectomia associada à miotomia do
músculo circofaríngeo, tendo a cervicotomia esquerda como
via de acesso, com excelentes resultados, representados
por ausência de mortalidade, baixa morbidade e remissão
satisfatória dos sintomas9-15.
O tratamento endoscópico proposto inicialmente por Mosher em 191716 foi revivido por Dolhman
e Mattsson em 196017, consistia na secção completa
do septo entre o esôfago e o divertículo promovendo
comunicação entre as duas estruturas18-20. Os autores
referem que este procedimento tem vantagens em relação ao tratamento cirúrgico, tais como ausência de
incisão na pele, menor tempo operatório e de
hospitalização.
Collard et al., em 199321, propuseram um refinamento da técnica endoscópica: o septo deveria ser
seccionado com aparelho de sutura mecânica, reduzindo
Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP.
1. Professora Titular do Departamento de Cirurgia e Ortopedia, Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP-SP-BR; 2. Professor Assistente do
Departamento de Cirurgia e Ortopedia, Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP; 3. Professor Assistente do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP; 4. Médico do Departamento de
Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP; 5. Ex – Residente do
Departamento de Cirurgia e Ortopedia Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP; 6. Aluna do Programa de Pós-Graduação em Bases Gerais
da Cirurgia, Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 104-109
Henry
Divertículo faringoesofagiano: avaliação dos resultados do tratamento
a possibilidade de complicações graves como hemorragia
e fístula.
O presente trabalho objetivou avaliar a evolução
pós-operatória de pacientes com divertículo
faringoesofágico submetidos aos tratamentos cirúrgico e
endoscópico utilizando o grampeador linear.
MÉTODOS
O projeto do presente estudo foi aprovado pelo
Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina
de Botucatu – UNESP (ofício nº3767-2011).
Participaram desta pesquisa 36 indivíduos portadores de divertículo faringoesofágico, sendo 20 homens e
16 mulheres, com idades variando entre 37 e 97 anos (média: 65,02 ± 12,90 anos).
A queixa referida pelos pacientes era disfagia,
associada a outros sintomas em alguns deles (Tabela 1). A
confirmação diagnóstica foi realizada por esofagograma.
Os 36 pacientes foram distribuídos em dois grupos, na dependência da conduta adotada: Grupo 1 (n =
24): diverticulectomia associada à miotomia do músculo
cricofaríngeo; Grupo 2 (n = 12): diverticulostomia realizada com grampeador linear.
Os pacientes do grupo 1 foram submetidos à
diverticulectomia sob anestesia geral. A abordagem adotada foi a cervicotomia longitudinal esquerda, na borda
interna do músculo esternocleidomastoideo, com boa exposição do campo operatório. Após a dissecção das estruturas cervicais realizou-se a secção do músculo omo-hioideo
na maioria dos casos. A introdução prévia de sonda
nasogástrica facilitou a palpação do esôfago e isolamento
completo do divertículo e do seu óstio (Figura 1). A secção
do saco diverticular foi seguida de sutura contínua da parede esofágica em dois planos, um mucoso e outro muscular, com fio de ácido poliglicólico 3-0. A antibioticoterapia
profilática foi realizada durante a indução anestésica
(cefalosporina EV, 2g, em dose única).
A miotomia do músculo cricofaríngeo foi realizada em todos os casos. A drenagem laminar do leito
periesofágico foi realizada durante 24 horas. Nos dois primeiros dias de pós-operatório, a alimentação foi oferecida
pela sonda nasogástrica que foi retirada no terceiro dia. A
partir de então e na ausência de sinais de fístula, a alimentação oral foi restabelecida. A alta hospitalar ocorreu em
torno do quinto dia de pós-operatório.
O tratamento endoscópico foi realizado nos pacientes do grupo 2, sob anestesia geral. O laringoscópio de
Weerda (Karl Storz, Tuttinger, Germany) permitiu a identificação da hipofaringe e do divertículo. A seguir foi aspirado o conteúdo do divertículo e introduzido o grampeador
(Ethicon, Inc., Somerville NJ, USA) de 45mm. Os ramos do
grampeador foram posicionados na luz esofágica e no
divertículo, respectivamente. Ao se efetuar o disparo do
grampeador, o septo entre o esôfago e o divertículo é
105
Tabela 1 -
Sintomas apresentados pelos pacientes com DFE.
Sintoma
Disfagia
Disfagia + regurgitação
Disfagia + emagrecimento
Disfagia + rouquidão
Disfagia + globus
Disfagia + abaulamento cervical
Disfagia + pneumonias de repetição
Disfagia + dor de garganta
Total
Figura 1 -
Grupo 1
Grupo 2
13
02
02
0
02
03
01
01
24
06
03
02
01
0
0
0
0
12
Cervicotomia esquerda evidenciando divertículo
faringoesofageano.
seccionado e grampeado, transformando o esôfago e o
divertículo em luz única.
A antibioticoterapia profilática foi realizada de
maneira semelhante a adotada nos pacientes do grupo 1
(cefalosporina, 2g, EV, dose única). A dieta líquida foi
introduzida no segundo dia do pós-operatório, com alta
hospitalar após 48 horas do procedimento.
Para a comparação dos procedimentos, foram
avaliados os sintomas, a duração das queixas, o tamanho
dos divertículos e as complicações: precoces e tardias.
Para a análise estatística foram utilizados os testes do qui-quadrado para as variáveis qualitativas e o de
Student para as variáveis quantitativas. O nível de
significância de 5% foi adotado para a análise estatística
(p<0,05).
RESULTADOS
Dos 24 pacientes do grupo 1, 14 eram homens e
10 mulheres. No grupo 2, cinco pacientes pertenciam ao
sexo masculino e sete ao feminino. Não foi observada di-
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 104-109
Henry
Divertículo faringoesofagiano: avaliação dos resultados do tratamento
106
ferença na distribuição quanto aos sexos nos dois grupos
(p=0,3, tabela 2). Os pacientes do grupo 2 eram mais idosos que os do grupo 1 (72,96 ± 11,30 versus 61,2 ± 12,14
– p=0,011 – Tabela 2).
A duração das queixas (Tabela 2) dos pacientes
do grupo 1 (33,8 ± 37,9 meses) não diferiu das observadas
no grupo 2 (23,7 ± 16,5 meses – p=0,38).
Nos pacientes do grupo 2, os divertículos eram
maiores (5,3 ± 1,5cm) do que os do grupo 1 (4,1 ± 1,5cm;
p=0,031).
A mortalidade operatória foi nula em ambos os
grupos. Também não ocorreram complicações
intraoperatórias.
No pós-operatório imediato, dois pacientes do
grupo 1 apresentaram fístula de pequeno débito, com resolução espontânea, dois pacientes referiram rouquidão,
que aos poucos foi regredindo, até a resolução total. A
remissão total ou melhora da disfagia foi observada em
todos os pacientes do grupo 1.
Nos pacientes do grupo 2, não foram observadas complicações no pós-operatório imediato, todavia,
no seguimento tardio, quatro pacientes (33,3%) queixaram-se de recidiva da disfagia, havendo necessidade
de novo procedimento endoscópico, com melhora do
sintoma.
DISCUSSÃO
Neste trabalho retrospectivo foram estudados de
maneira comparativa os aspectos clínicos e terapêuticos
de portadores de DFE submetidos a dois tipos de tratamento, cirúrgico e endoscópico.
Sendo o DFE afecção própria da senilidade, a
realização de pesquisa randomizada esbarra em problema ético. Isto porque a alocação de um idoso portador de comorbidades em braço cirúrgico constitui infração ética. Talvez seja este o motivo pelo qual Silveira
et al. 22 referiram falta de trabalho randomizado sobre
este assunto.
A fisiopatologia do DFE constitui motivo de controvérsia, e vários mecanismos têm sido descritos, todos
Tabela 2 -
eles relacionados à anormalidades apresentadas pelo músculo cricofaríngeo, tais como espasmo, hipertrofia, fibrose23.
Estudos manométricos têm demonstrado que a contração
pós-abertura do esfíncter superior do esôfago acontece prematuramente, coincidindo com o pico máximo de contração da faringe14. Como resultado desse aumento pressórico
ocorre herniação da mucosa e submucosa da faringe em
área de fraqueza da parede, com formação do divertículo.
Tais divertículos são denominados pseudodivertículos, pois
eles não contêm todas as camadas da parede esofágica.
Corroborando esta teoria é o achado de redução do tônus
pressórico do esfíncter superior do esôfago no pós-operatório de portadores de DFE14,19,21,24.
Além do fator dismotilidade, outro aspecto tem
sido avaliado na fisiopatologia do DFE. Estudos histológicos
do músculo cricofaríngeo de portadores de DFE demonstram redução acentuada de fibras musculares e de colágeno
quando comparada aos controles4.
Muitos autores referem maior incidência do DFE
em indivíduos do sexo masculino3,10,12-15,18,25. Em nossa amostra a incidência foi semelhante nos dois sexos.
A média de idade dos pacientes desta série submetidos ao tratamento endoscópico (grupo 2) foi mais elevada do que a observada nos do grupo 1 (tratamento cirúrgico) e semelhante à referida por alguns autores26-28. A
discrepância de idade entre os dois grupos prende-se ao
fato de que foi reservado o tratamento endoscópico para
pacientes portadores de comorbidades e sem condições
de suportar o tratamento cirúrgico, conforme já preconizado19,29.
Na análise da tabela 1, observamos que vários
pacientes de ambos os grupos apresentam sintomas de
regurgitação, globus, rouquidão, dor de garganta e pneumonias de repetição durante a deglutição. Esta é a característica da disfagia orofaríngea ou de transferência, onde
a dificuldade reside na passagem do bolo alimentar da
boca para a faringe e sua penetração pelo esfíncter superior do esôfago30.
Outra controvérsia com relação ao DFE diz respeito ao tratamento. Até a Década de 60, o único tratamento preconizado era o cirúrgico, pois o tratamento
endoscópico idealizado por Mosher16 foi por ele abando-
DFE: Aspectos demográficos, clínicos e complicações.
Grupo 1
Homens
Mulheres
Idade média
Duração das queixas
Tamanho do divertículo
Fístula cervical
Recidiva
Rouquidão
14
10
61,2 ± 12,14
33,8 ± 37,9
4,1 ± 1,5
2
(8,3%)
0
(0%)
2
(8,3%)
*p<0,05
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 104-109
Grupo 2
5
7
72,06 ± 11,30
23,7 ± 16,5
5,3 ± 1,5
0
(0%)
4
(33,3%)
0
(0%)
Valor de p
0,34
0,011*
0,38
0,031*
0,01*
Henry
Divertículo faringoesofagiano: avaliação dos resultados do tratamento
nado, pois os pacientes faleciam, em decorrência de
mediastinite20.
O tratamento cirúrgico, realizado por
cervicotomia esquerda, consiste em diverticulectomia ou
diverticulopexia, sendo o último indicado para os divertículos
menores. Os dois procedimentos são, em geral, associados
à miotomia do músculo cricofaríngeo.
Os pacientes do grupo 1 foram submetidos à
diverticulectomia associada à miotomia do músculo
cricofaríngeo, com mortalidade nula. A extensão do saco
diverticular foi, em média, de 4,1 ± 1,5cm e o exame
anatomopatológico dos divertículos demonstrou processo
inflamatório crônico.
Na avaliação pós-operatória precoce observamos
que dois pacientes desenvolveram fístula. Considerando a
experiência acumulada com o emprego da esofagectomia
transhiatal31, o manejo das fístulas cervicais não ofereceu
dificuldade, muito menos risco para o paciente. A incidência desta complicação, de 8,3%, não difere da publicada3,911,14,19,23
.
Outra complicação observada no pós-operatório
precoce foi a rouquidão referida por dois pacientes. Este
sintoma teve duração efêmera, desaparecendo totalmente após duas semanas.
O seguimento tardio dos pacientes do grupo 1
variou entre três e 180 meses (média: 33 meses). Os pacientes mostravam-se satisfeitos com o resultado da operação, com remissão da disfagia, voltando a deglutir qualquer tipo de alimento sem dificuldades.
O tratamento endoscópico foi revivido por
Dohlman e Mattson17, os quais preconizavam a realização
do procedimento sob anestesia geral, usando endoscópio
rígido e secção do septo entre o esôfago e o divertículo
realizado com eletrocautério. Com esta técnica, abolia-se
a incisão cervical, além de abreviar o tempo do procedimento, a internação hospitalar, a introdução da dieta e o
número de complicações6. Após empregar o método em
mais de 100 pacientes, os autores não observaram complicações graves e relataram recidiva em apenas 5% dos
casos.
Outras técnicas têm sido propostas para efetuar
a secção do septo entre o esôfago e o divertículo, sendo o
laser de CO2, o papiloscópio e o aparelho de sutura mecânica os mais utilizados. Destas, o laser de CO2 foi a que
ocasionou maior número de complicações, sendo a hemorragia a mais grave, exigindo necessidade de conversão para o tratamento cirúrgico20. Na presente série não
foi observada hemorragia.
O tratamento endoscópico pode ser realizado
com aparelho rígido ou flexível. O rígido exige que o paciente assuma a posição de hiperextensão do pescoço, nem
sempre factível no idoso, em decorrência da artrose cervical.
Assim, o endoscópio flexível tem sido o mais recomendado para o procedimento19,23. No presente trabalho, foi utili-
107
zado o endoscópio rígido, porém nenhuma complicação
foi observada.
A técnica descrita por Collard et al. 21 foi realizada nos pacientes do grupo 2, com ausência de mortalidade e de complicações pós-operatórias imediatas. Wirth et
al.32 referem mortalidade de 5% com este procedimento.
O seguimento tardio médio de 28 meses revelou
que quatro pacientes (33,3%) referiam recidiva da disfagia.
Os pacientes foram submetidos a novo procedimento com
melhora acentuada do sintoma. Assim o número médio de
procedimento foi 1,3, semelhante ao observado por Saeti
et al. 33. A falta de resolutividade com um único procedimento nos causou estranheza, uma vez que com o tratamento cirúrgico um único tempo foi suficiente.
Todavia a análise da literatura nos mostra que o
tratamento endoscópico nas suas diversas modalidades,
inclusive com o uso de grampeador, necessita de uma ou
várias complementações25,28,29,33.
Saeti et al.33 referem que em 37% de seus pacientes houve necessidade de uma segunda carga do
grampeador, fato que torna o procedimento mais oneroso
que o cirúrgico.
O índice de recidiva de 33% observado na presente casuística é superior ao relatado por Lang et al. 25.
Deve ser salientado que o grampeador utilizado por estes
autores foi modificado, possuindo 35mm de extensão e
contendo grampos de sutura até a sua ponta, o que proporciona a secção completa do septo, minimizando o risco
de recidiva.
Outro aspecto que deve ser considerado é que o
procedimento endoscópico é mais recente, estando os autores da presente pesquisa em curva de aprendizado, encontrando ainda dificuldades em adequar o tipo de
grampeador com o tratamento do divertículo.
Outro fator que pode ter contribuído para os
resultados precários do tratamento endoscópico foi o tamanho dos divertículos. Neste grupo, a extensão média
dos divertículos era de 5,3 ± 1,5cm, maior do que no
grupo 1 (p<0,05). Assim, a extensão do septo superava a
do grampeador, deixando um resquício de divertículo que
com o tempo poderia se dilatar, sendo esta a causa da
recidiva.
Assim, a análise dos resultados da presente
casuística nos leva a concluir que os dois procedimentos
são eficazes no tratamento da DFE, porém a superioridade
da abordagem cirúrgica pode ser aventada pelo menor
número de complicações e pela sua eficiência em único
procedimento, ficando o tratamento endoscópico reservado para os pacientes idosos, sem condições de suportar o
tratamento cirúrgico.
Vale ressaltar, todavia, que os pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico apresentavam idade inferior
ao do grupo endoscópico e os seus divertículos eram menores.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 104-109
Henry
Divertículo faringoesofagiano: avaliação dos resultados do tratamento
108
A B S T R A C T
Objective: To evaluate the postoperative outcome of patients with pharyngoesophageal diverticulum submitted to surgical and
Objective
Methods: We retrospectively analyzed 36 patients with pharyngo-esophageal diverticulum treated at the
endoscopic treatments. Methods
Hospital of the Medical School of Botucatu – UNESP. Patients were divided into two groups, depending on the treatment: group 1
(n = 24): diverticulectomy associated myotomy through a left cervicotomy; group 2 (n = 12): endoscopic diverticulostomy with linear
Results: Operative mortality was zero in both groups. Early complications: group 1– two patients developed cervical fistula
stapler. Results
and two, hoarseness; group 2 – none. Late complications: group 1 – none; group 2: recurrence of dysphagia in four patients (p = .01).
Conclusion: Both procedures were effective in remission
Mean follow-up was 33 months for group 1 and 28 months for group 2. Conclusion
of dysphagia. Surgical treatment showed superiority to endoscopy, with resolution of dysphagia with a single procedure. Endoscopic
treatment should be reserved for the elderly and those with comorbidities.
words: Disorders of swallowing. Zenker’s diverticulum. Therapy. Operative surgical procedures. Endoscopy.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Ludlow A. A case obstructed deglution from a preternatural
dilatation of and bag formed in the pharynx. Med Observ Inq.
1769;3:85-101.
2. Zenker FA, Von Ziemssen H. Krankheiten des Oesophagus. In:
Von Ziemssen H, editor. Hankbuch der Speciellen Pathologie und
Therapie. Leipzi: FCW Vogel; 1877. p.1-87.
3. Sugahara M, Ceballos H, Gama AH, Goffi FS. Divertículo faringoesofagiano. Análise do quadro clínico, da conduta cirúrgica e dos
resultados de tratamento. Rev Paul Med. 1973;82(3):117-22.
4. Zaninotto G, Constantini M, Boccú C, Anselmin M, Parenti A,
Guidolin D, et al. Functional and morphological study of the
cricopharyngeal muscle in patients with Zenker’s diverticulum. Br
J Surg. 1996;83(9):1263-7.
5. Flamenbaum M, Becaud P, Genes J, Cassan P. Endoscopic
treatment of Zenker’s diverticulum using CO2 laser. Gastroenterol
Clin Biol. 1997;21(12):950-4.
6. Veenker E, Cohen JI. Current trends in management of Zenker
diverticulum. Curr Opin Otolaryngol Head Neck Surg.
2003;11(3):160-5.
7. Ferreira LE, Simmons DT, Baron TH. Zenker’s diverticula:
pathophysiology, clinical presentation, and flexible endoscopic
management. Dis Esophagus. 2008;21(1):1-8.
8. Lerut T, Van Raemdonck D, Guelincskx P, Van Clooster P, Gruwez
JA, Dom R, et al. Pharyngo-oesophageal diverticulum (Zenker’s).
Clinical, therapeutic and morphological aspects. Acta Gastroenterol
Belg. 1990;53(3):330-7.
9. Malafaia O, Brenner S, Marchesini JB, Souza FJ, Ribas Filho JM,
Oda CT, et al. Divertículo esofagiano. Rev Col Bras Cir.
1983;10(6):179-82.
10. Okano N, Vargas EC, Moriya T, Carneiro JJ, Elias Junior AM.
Divertículo do esôfago: análise de 24 pacientes portadores do
divertículo de Zenker. Acta cir bras. 2000;15(supl. 2):60-2.
11. Andreis EL, Guerra EE, Lemos RR. Divertículo de Zenker. Rev Col
Bras Cir. 2001;28(4):296-8.
12. Ruiz-Tovar J, Pérez de Oteyza J, Collado MV, Rojo R, García
Villanueva A. 20 years experience in the management of Zenker’s
diverticulum in a third-level hospital. Rev Esp Enferm Dig.
2006;98(6):429-35. Erratum in: Rev Esp Enferm Dig. 2006;98(8):634.
13. Feeley MA, Righi PD, Weisberger EC, Hamaker RC, Spahn TJ,
Radpour S, et al. Zenker’s diverticulum: analysis of surgical
complications from diverticulectomy and cricopharyngeal myotomy.
Laringoscope. 1999;109(6):858-61.
14. Andreollo NA, Soares Júnior C, Coelho Neto JS, Lopes LR, Brandalise
NA, Leonardi LS. Tratamento cirúrgico do divertículo de Zenker.
Rev Col Bras Cir. 1998;25(1):9-14.
15. Chiquillo Barber MT, Ruiz del Castillo J, Bernal Sprekelsen JC,
Mendoza Aroca A, Esclapez Valero JP, Martinez Agulló A, Borti
Martí J, et al. Surgical treatment od Zenker’s diverticulum. Apropos
of 14 cases. Rev Esp Enferm Dig. 1990;77(4):251-3.
16. Mosher HP. Webs and pouches of the esophagus, their diagnosis
and treatment. Surg Gynecol Obstet. 1917;25:175-87.
17. Dohlman G, Mattsson O. The endoscopic operation for
hypopharyngeal diverticula: a roentgencinematographic study.
AMA Arch Otolaryngol. 1960;71:744-52.
18. Peracchia A, Bonavina L, Narne S, Segalin A, Antoniazzi L, Marotta
G. Minimally invasive surgery for Zenker diverticulum: analysis of
results of 95 consecutive patients. Arch Surg. 1998;133(7):695700.
19. Ishioka S, Sakai P, Maluf Filho F, Melo JM. Endoscopic incision of
Zenker’s diverticula. Endoscopy. 1995;27(6):433-7.
20. Mattinger C, Hörmann K. Endoscopic diverticulotomy of Zenker’s
diverticulum: management and complications. Dysphagia.
2002;17(1):34-9.
21. Collard JM, Otte JB, Kestens PJ. Endoscopic stapling technique of
esophagodiverticulostomy for Zenker’s diverticulum. Ann Thorac
Surg. 1993;56(3):573-6.
22. Silveira ML, Vilhordo DW, Kruel CDP. Divertículo de Zenker: tratamento endoscópico versus cirúrgico. Rev Col Bras Cir.
2011;38(5):343-8.
23. Hashiba K, de Paula AL, da Silva JG, Cappellanes CA, Moribe D,
Castillo CF, et al. Endoscopic treatment of Zenker’s diverticulum.
Gastrointest Endosc. 1999;49(1):93-7.
24. Felix V, Cecconello I, Pollara W, Ziberstein B, Pinotti HW. The role
of the upper esophageal sphincter in Zenker diverticulum. Dig Dis
Sci. 1986;31(supl 1):4575.
25. Lang RA, Spelsberg FW, Winter H, Jauch KW, Hüttl TP. Transoral
diverticulostomy with a modified Endo-Gia stapler: results after 4
years of experience. Surg Endosc. 2007;21(4):532-6. Erratum in:
Surg Endosc. 2008;22(5):1408.
26. Smith SR, Genden EM, Urken ML. Endoscopic stapling technique
for the treatment of Zenker diverticulum vs standard open-neck
technique: a direct comparison and charge analysis. Arch Otolarygol
Head Neck Surg. 2002;128(2):141-4.
27. Case DJ, Baron TH. Flexible endoscopic management of Zenker
diverticulum: the Mayo Clinic experience. Mayo Clin Proc.
2010;85(8):719-22.
28. Wasserzug O, Zikk D, Raziel A, Cavel O, Fleece D, Szold A.
Endoscopically stapled diverticulostomy for Zenker’s diverticulum:
results of a multidisciplinary team approach. Surg Endosc.
2010;24(3):637-41.
29. Raut VV, Primrose WJ. Long-term results of endoscopic stapling
diverticulectomy for pharyngeal pouches. Otolaryngol Head Neck
Surg. 2002;127(3):225-9.
30. Domingues G, Lemme EMO. Diagnóstico diferencial dos distúrbios
motores esofagianos pelas características da disfagia. Arq
gastroenterol. 2001;38(1):14-8.
31. Pinotti HW. Esofagectomia subtotal por túnel transmediastinal
sem toracotomia. AMB Rev Assoc Med Bras. 1977;23(11):395-8.
32. Wirth D, Kern B, Guenin MO, Montali I, Piterli R, Ackermann C, et
al. Outcome and quality of life after open surgery versus endoscopic
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 104-109
Henry
Divertículo faringoesofagiano: avaliação dos resultados do tratamento
109
stapler-assisted esophagodiverticulostomy for Zenker’s
diverticulum. Dis Esophagus. 2006;19(4):294-8.
33. Saetti R, Silvestrini M, Peracchia A, Narne S. Endoscopic staplerassisted Zenker’s diverticulostomy: which is the best operative
facility? Head Neck. 2006;28(12):1084-9.
Como citar este artigo:
Henry MACA, Lerco MM, Tagliarini JV, Castilho EC, Novaes FT,
Lamonica VC. Divertículo faringoesofageano: avaliação dos resultados do tratamento. Rev Col Bras Cir. [periódico na Internet] 2013;40(2).
Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Recebido em 08/06/2012
Aceito para publicação em 09/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma.
Endereço para correspondência:
Maria Aparecida Coelho de Arruda Henry
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 104-109
Bertelli
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos
Artigoà tireoidectomia
Original
110
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à tireoidectomia
BRAF mutation in the elderly submitted to thyroidectomy
ANTONIO AUGUSTO T. BERTELLI,ACBC-SP1; ANTONIO JOSÉ GONÇALVES, ACBC-SP2; MARCELO B. MENEZES3; MURILO R. MELO4; STEFANO
TINCANI5; LUIZ CLÁUDIO BOSCO MASSAROLLO, TCBC-SP6
R E S U M O
Objetivo: Avaliar a frequência da mutação V600E do gene BRAF em pacientes com mais de 65 anos de idade submetidos à
tireoidectomia, correlacionando sua presença ou ausência com as diferentes lesões histológicas, com as variantes e com fatores
prognósticos do carcinoma papilífero. Métodos: Foram avaliados 85 pacientes com mais de 65 anos de idade submetidos à
tireoidectomia, analisando a mutação BRAF V600E através de reação de PCR-RT realizada após a extração do DNA dos blocos de
parafina. Resultados: Detectou-se ausência ou presença da mutação BRAF V600E em 47 pacientes (55,3%). Entre os 17 carcinomas papilíferos estudados, sete apresentavam a mutação (41,2%). Demonstrou-se associação estatística entre a presença desta
mutação e a variante clássica do carcinoma papilífero, além de tendência de associação com o extravasamento tireoideano.
Conclusão: A mutação BRAF nos pacientes idosos também é exclusiva do carcinoma papilífero e tem frequência expressiva. Além
disso, está relacionada à variante clássica e, possivelmente, ao extravasamento tireoideano.
Descritores: Glândula tireoide. Neoplasias da glândula tireoide. Tireoidectomia. Proteínas proto-oncogênicas B-raf. Mutação.
INTRODUÇÃO
D
esde a sua descoberta, as mutações BRAF têm sido
relatadas em vários tipos de tumores, com frequências
variáveis, sendo as mais prevalentes em melanomas e em
nevus1. Um importante estudo demonstrou mutações BRAF
no câncer da glândula tireóide, com prevalência apenas
inferior à do melanoma2. As mutações BRAF (o gene da
RAF quinase do tipo B) representam as alterações genéticas mais comuns do câncer de tireóide e esta foi a descoberta mais notável neste campo de pesquisa, nos últimos
anos3. O descobrimento destas alterações criou inclusive a
oportunidade do desenvolvimento de novas estratégias de
tratamento para o câncer da tireóide4,5. Elas estão presentes entre 23 e 83% dos carcinomas papilíferos e são altamente específicas para este tipo histológico2,6-8. Kimura et
al., em um estudo pioneiro publicado em 2003, demonstraram que a mutação BRAF ocorre em 32,8% dos carcinomas papilíferos, não ocorre em lesões benignas ou
foliculares e, quando presente, não se sobrepõe com outras mutações de RAS ou de rearranjo do RET/PTC. Estes
fatos apontam a via da MAP quinase como a principal
responsável pela gênese do carcinoma papilífero2.
Este tumor possui algumas variantes histológicas
que também foram estudadas quanto à presença da mutação BRAF. A variante clássica e a variante de células
altas (relacionada com maior agressividade) parecem apresentar maior incidência da mutação BRAF. Já a variante
folicular apresenta tal mutação mais raramente. Os
microcarcinomas (tumores menores que 1,0cm) podem
também apresentá-la, o que confirma a hipótese de que
ela ocorre no início da gênese tumoral do carcinoma
papilífero9.
Quanto ao prognóstico, esta mutação pode aparecer precocemente em carcinomas papilíferos pequenos,
mas acredita-se que aqueles com mutações BRAF possuem fatores de pior prognóstico como variantes mais agressivas (ex: células altas), extravasamento da tireóide, estádio clínico mais avançado, metástases à distância e ainda
podem estar relacionadas com o carcinoma anaplásico.
Estes dados indicam que tumores com este genótipo possuem prognóstico pior6,7,9-11.
Foi demonstrada correlação entre a idade avançada e a presença da mutação BRAF em carcinomas
papilíferos9,12 e baixa frequência em crianças10,13. Atualmente, nenhuma outra associação inequívoca foi estabelecida
Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação em Cirurgia Geral da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de Misericórdia de São
Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
1. Médico Assistente da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa
Casa de São Paulo-SP-BR; 2. Professor Adjunto, Chefe da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Departamento de Cirurgia da Faculdade
de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo-SP-BR; 3.Professor Assistente da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Departamento
de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo-SP-BR; 4.Professor Adjunto do Laboratório de Medicina Molecular do
Departamento de Ciências Fisiológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo-SP-BR; 5. Acadêmico do Curso de Medicina
da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo-SP-BR; 6. Médico responsável pelos Serviços de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do
Hospital Carlos Chagas e Instituto de Oncologia de Guarulhos-SP-BR.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 110-116
Bertelli
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à tireoidectomia
entre o genótipo e alterações clinicopatológicas do carcinoma papilífero8. Alguns estudos demonstraram correlação entre a mutação BRAF e o estadiamento avançado,
metástases linfonodais, metástases à distância e recorrência
do tumor5,6,9,11,14.
Xing et al. demonstraram que a mutação BRAF
é um fator preditivo independente de recorrência tumoral,
mesmo em pacientes com estádio I e II14. Ademais, as
mutações BRAF também têm sido relacionadas com a baixa captação de iodo-131 no pós-operatório e falha do tratamento na doença recidivada15. Entretanto, Trovisco et
al.12, entre outros8,16,17, não demonstraram associação da
mutação BRAF com pior prognóstico. Fugazzola et al.8,
estudando 260 carcinomas papilíferos, demonstraram associação com significância estatística entre a mutação BRAF
e idade avançada ao diagnóstico, sem correlação com pior
prognóstico ou pior evolução, em seguimento de 72 meses
de acompanhamento. Ito et al., em 2009, estudaram 631
pacientes com carcinoma papilífero e seguimento médio
de 83 meses, e também falharam em demonstrar pior prognóstico associado com a mutação BRAF17.
Assim, essa mutação representa importante descoberta para a pesquisa do câncer da tireoide e é a mais
frequente no carcinoma papilífero. Como não existem estudos com análise multivariada, casuística expressiva e tempo de seguimento suficientes, não está claro se a mutação
do BRAF está relacionada ao pior prognóstico, ou apenas
ocorre em indivíduos idosos nos quais outros fatores são
responsáveis por ele13,18,19. Também não existe na literatura mundial estudo da mutação BRAF específico em idosos.
O objetivo deste estudo foi avaliar a frequência
da mutação V600E do gene BRAF em pacientes com mais
de 65 anos de idade submetidos à tireoidectomia,
correlacionando sua presença ou ausência com as diferentes lesões histológicas, com as variantes e com fatores prognósticos do carcinoma papilífero.
111
de DNA, sendo então excluídos. Assim, os prontuários de
85 pacientes foram revistos levantando informações do
quadro clínico, procedimento cirúrgico realizado, tipo de
lesão histopatológica e fatores prognósticos. Os dados foram transcritos para protocolo criado para este fim.
Entre os 85 pacientes, havia 78 do sexo feminino. A idade variou entre 65 e 89 anos de idade, com mediana de 70 anos. A tireoidectomia total foi realizada em
74% dos pacientes. A reação de PCR-RT realizada após a
extração do DNA dos blocos de parafina conseguiu detectar a ausência ou presença da mutação BRAF V600E em
47 pacientes (55,3%). A mutação BRAF foi considerada
não analisável em 38 pacientes (44,7%).
Nos 47 casos em que a mutação foi analisável,
as doenças encontradas estão descritas na figura 1. Nos 22
casos de carcinoma papilífero, 17 foram analisáveis, ou
seja, 77% da amostra.
Foram realizados cortes histológicos a partir dos
blocos de parafina das peças das tireoidectomias para confirmar o diagnóstico e ver se o bloco possuía a lesão a ser
estudada. Foram tomados cuidados para evitar contaminação de DNA utilizando-se luvas, navalhas descartáveis e
manipulação dos cortes de tecido com pinça apropriada
para este fim.
Foi realizada a extração de DNA, após a
desparafinização utilizando xylol e etanol. O sucesso da
extração foi confirmado através de espectrofotometria.
Sucedeu-se, então, a realização da PCR-ARMS
(Amplification Refractory Mutation System) em tempo-real
para identificação da mutação do gene BRAF no DNA extraído, utilizando controle positivo (amostra sequenciada,
demonstrando a presença da mutação no gene) e negativo (sangue humano de indivíduo saudável), bem como, de
reação sem a presença de DNA para garantir a ausência
de amplificação inespecífica em cada placa de reação.
MÉTODOS
Foi realizado um estudo retrospectivo entre 1994
e 2009 selecionando todos os pacientes com mais de 65
anos de idade submetidos a qualquer tipo de operação
sobre a glândula tireóide pela Disciplina de Cirurgia de
Cabeça e Pescoço do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa desta instituição sob o número 116/07.
Foram identificados 104 pacientes com mais de
65 anos de idade e que haviam sido submetidos a algum
tipo de operação sobre a glândula tireoide. Destes, quatro
foram excluídos por apresentarem tumores primários de
outras regiões, como paratireoide, orofaringe e laringe, com
invasão de glândula tireoide. Dos 100 restantes, 15 apresentaram dados incompletos em prontuário ou inexistência
de tecido suficiente em blocos de parafina para a extração
Figura 1 -
Distribuição dos casos segundo o tipo histológico e
resultado da PCR-RT.
*a coluna resultado representa os casos em que a reação foi analisável.
** n/a: não analisável - Cec: carcinoma epidermóide; ca folicular:
carcinoma folicular; ca indif: carcinoma indiferenciado ou anaplásico;
ca medular: carcinoma medular; ca papilífero: carcinoma papilífero.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 110-116
Bertelli
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à tireoidectomia
112
A utilização de equipamento de PCR em temporeal (Applied Biosystems, ABI 7500) permite a detecção junto com a amplificação, em tubo fechado, eliminando-se a
etapa pós-PCR. Com isso diminuem-se os riscos de contaminação decorrentes da manipulação de produtos amplificados. Adicionalmente, devido a que a detecção baseia-se na
capacidade de um agente intercalador (SYBR Green) emitir
fluorescência na presença de dupla-fita amplificada, consegue-se maior sensibilidade analítica quando se trata de produtos de PCR de tamanho inferior a 150bp.
No preparo das reações de PCR-RT, utilizou-se
“solução-mãe” para cada condição estudada (normal ou
mutado) (Figura 2). As temperaturas utilizadas para a PCR
foram: 95oC por 10 minutos (ativação da Taq-polimerase),
seguida de 40 ciclos a 66oC por um minuto (anelamento
dos primers) e 72oC por um minuto. Para garantir a
especificidade da reação e a detecção de um único produto específico na PCR em tempo-real (PCR-RT), adicionouse um ciclo de dissociação (desnaturação lenta) para determinação da temperatura de dissociação de cada produto da PCR (Figura 3).
Os primers utilizados foram20:
Figura 2 -
Componentes da “solução-mãe” utilizada na reação
de PCR.
Figura 3 -
Curva de amplificação do DNA durante PCR-RT de
amostra de carcinoma papilífero.
BRAFwt_s: AGGTGATTTTGGTCTAGCTACAGT;
BRAFmt_s: AGGTGATTTTGGTCTAGCTACAGA; e
BRAF_ASc: TAGTAACTCAGCAGCATCTCAGGGC
Toda reação foi avaliada inicialmente quanto à
curva de amplificação (Figura 3) e, nos casos onde ela ocorreu, foi ainda verificada a curva de dissociação para garantir que a temperatura de dissociação (Tm) fosse semelhante entre os casos, com pico único de amplificação.
Nos casos cujo resultado da PCR-RT não foi
analisável, optou-se por repetir todo o método para a mesma amostra, buscando resultados positivos. Nos casos de
carcinoma papilífero e anaplásico, repetiu-se a extração
de DNA e a PCR-RT até três vezes.
Por fim, a presença ou ausência da mutação
BRAF nos casos com resultado analisável foi correlacionada
com as diferentes variantes histológicas presentes (variante clássica, variante folicular e variante de células altas),
assim como, com os diferentes fatores prognósticos do carcinoma papilífero (idade, presença de metástase linfonodal,
presença de metástases distantes, presença de tumor
multifocal, presença de extravasamento de cápsula
tireoideana com invasão de estruturas adjacentes, presença de invasão vascular sanguínea ou linfática e ocorrência
de recidiva local ou regional).
A análise estatística incluiu medidas de tendência central e dispersão para as variáveis quantitativas e
frequências absolutas e relativas para as variáveis categóricas. Para verificar a associação entre estas variáveis, foi
utilizado o teste exato de Fisher. Para a avaliação da diferença entre as médias das variáveis quantitativas (idade e
tamanho do tumor), segundo o status da mutação, foi usado o teste de Mann-Whitney. Os resultados foram considerados significativos quando p <0,05 (testes bicaudais).
RESULTADOS
Nos 47 casos com resultado analisável, dentre
as diversas lesões histológicas benignas e malignas estudadas, não se encontrou um caso sequer da mutação BRAF
em lesões diferentes do carcinoma papilífero (Figura 4).
A frequência da mutação BRAF encontrada, considerando-se apenas os carcinomas papilíferos, foi 41,2%
(sete casos BRAFm entre 17 com resultado analisável). Entre
estes 17 pacientes, a mediana da idade foi 71 anos (média: 72,5; desvio-padrão: 6,18) e havia apenas um paciente do sexo masculino. Quanto às variantes histológicas do
carcinoma papilífero, 12 (70,6%) eram da variante clássica, quatro da folicular (23,5%) e um caso de células altas
(5,9%).
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 110-116
Bertelli
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à tireoidectomia
Figura 4 -
Distribuição dos casos com resultado analisável, segundo o tipo histológico e resultado da PCR-RT quanto à presença ou ausência da mutação BRAF.
*BRAF-: ausência da mutação BRAF; BRAFm: presença da mutação
BRAF.
Cec: carcinoma epidermóide; ca folicular: carcinoma folicular; ca indif:
carcinoma indiferenciado ou anaplásico; ca medular: carcinoma medular; ca papilífero: carcinoma papilífero.
A mediana calculada sobre o tamanho do tumor
foi 3,0cm, com média de 3,1cm e desvio-padrão de 2,32.
Quanto aos demais fatores prognósticos, encontrou-se
multicentricidade em oito casos, metástases linfonodais em
seis, metástases distantes em um, extravasamento de cápsula em sete, invasão vascular em dez e recidiva local ou
regional em dois casos.
A correlação entre a mutação BRAF e o sexo
não foi significante, pelo teste exato de Fisher (p=0,412),
assim como, a correlação entre a mutação BRAF e a presença de invasão vascular (p=1,0), recidiva (p=0,154),
multicentricidade (p=1,0), e extravasamento da cápsula
tireoideana (p=0,058). Neste último fator prognóstico, observou-se significância estatística próxima ao limite de 5%,
com diferença na porcentagem de extravasamento, segundo
o status da mutação BRAF (71,4% nos casos BRAFm e
28,6% nos casos BRAF-) (Tabela1).
Tabela 1 -
113
Analisando o grupo de carcinomas papilíferos,
observou-se associação com significância entre a variante
clássica e o status da mutação BRAF (p=0,044) em comparação com as demais variantes histológicas agrupadas (Tabela1).
As variantes tamanho do tumor e idade foram
analisadas pelo teste de Mann-Whitney não sendo encontrada associação com significância estatística, com níveis
de significância estatística de 0,8066 e 0,1052, respectivamente.
Entretanto, a média e a mediana da idade do
grupo de pacientes com a mutação BRAF foi 75,3 e 74
anos, respectivamente. Já no grupo de pacientes com carcinoma papilífero e ausência da mutação estudada, a média
foi 70,6 e a mediana de 70 anos.
Em suma, estudando apenas indivíduos idosos, encontrou-se a presença da mutação BRAF V600E
apenas em casos de carcinomas papilíferos. Entre 17
pacientes com esta lesão, sete apresentaram a mutação (41,2%). Entre 47 pacientes em que se obteve resultado analisável -17 carcinomas papilíferos, quatro
outros tipos de tumores malignos e 26 lesões
histológicas benignas-, nenhum outro tipo de lesão
histológica apresentou a mutação. Analisando os fatores prognósticos do carcinoma papilífero, encontrou-se
tendência estatística de associação entre o
extravasamento e a presença da mutação BRAF, além
de demonstrar associação com significância estatística
entre a variante clássica do carcinoma papilífero e a
presença da mutação BRAF.
DISCUSSÃO
A mutação pontual do BRAF tem sido bastante
estudada mundialmente, com papel fundamental na gênese tumoral do câncer colorretal, melanoma e carcinoma
papilífero de tireóide4. Embora muitos autores tenham demonstrado técnicas de extração de DNA a partir de tecido
parafinizado, na instituição dos autores outras tentativas já
haviam sido feitas com este fim, sem sucesso. Tal dificul-
Distribuição dos fatores prognósticos avaliados de acordo com a presença ou ausência da mutação BRAF.
Fatores prognósticos
BRAFm
%
BRAF-
14,3
85,7
57,1
28,6
42,9
71,4
100,0
0
10
6
0
5
2
5
n=7
Gênero
Invasão vascular
Recidiva
Multicentricidade
Extravasamento
Variante clássica
masc
fem
1
6
4
2
3
5
7
%
P
n=10
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 110-116
0,0
100,0
60,0
0,0
50,0
20,0
50,0
0,412
1,0
0,154
1,0
0,058
0,044
Bertelli
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à tireoidectomia
114
dade era atribuída a formolização da peça e provável dano
ao DNA. Finalmente, utilizando um protocolo simples de
desparafinização e extração de DNA, conseguiu-se estabelecer rotina para o desenvolvimento deste estudo. Desta
forma, abriu-se grande campo de pesquisa, minimizando
a dependência de tecido fresco e bancos de tumores.
Houve dificuldades na extração de DNA de algumas amostras, sem qualquer correlação com a idade
delas ou de seu lote. Alguns casos apresentaram PCR não
analisável, sendo impossível dizer se a mutação em questão estava ou não presente, reduzindo a casuística e causando maior gasto de material, uma vez que todo o processo metodológico foi repetido.
Inicialmente este estudo foi desenvolvido para
verificar a presença da mutação do BRAF em indivíduos
idosos submetidos à tireoidectomia por lesões benignas e
malignas. Estes resultados iniciais demonstraram a ausência desta mutação em lesões benignas e em lesões malignas diferentes do carcinoma papilífero, mesmo em indivíduos idosos, o que é corroborado pela literatura2,6-8. Xu et
al., em 2003, também descreveram a presença da mutação BRAF em carcinomas papilíferos e sua ausência em
bócios e lesões foliculares21.
Optou-se em pesquisar somente os casos de interesse, ou seja, carcinomas papilíferos e carcinomas
anaplásicos que poderiam ter sua origem em carcinomas
papilíferos. Isso explica o maior número de casos em que
se teve resultado dentre os carcinomas papilíferos, quando
comparados ao grupo de bócios.
A mutação BRAF está ausente em lesões benignas -bócio coloide e tireoidite de Hashimoto-, assim como
em lesões malignas diferentes do carcinoma papilífero carcinoma folicular-, em idosos. Aqueles carcinomas
anaplásicos oriundos de carcinomas papilíferos podem conter a mutação22, embora neste estudo, analisou-se apenas
um caso de carcinoma anaplásico que não a apresentava.
Oler e Cerutti estudaram 120 casos de carcinoma papilífero, dos quais 48% apresentaram a mutação
BRAF23. Fugazzola et al., na introdução de seu estudo, cita
que a prevalência mundial da mutação BRAF em carcinomas papilíferos gira em torno dos 40% (858 de 2174 casos
estudados)8. Os mesmos autores, em estudo multicêntrico
italiano, estudaram 260 carcinomas papilíferos e encontraram a mutação BRAF em 38% deles8. Araújo et al., em
2009, demonstraram incidência de 28,1% em carcinomas
papilíferos24. Este estudo demonstra frequência um pouco
acima do relatado (41,2%), o que é facilmente justificável, tendo em vista a população estudada.
A mutação BRAF também está associada à carcinomas papilíferos localmente invasivos, assim como, aos
carcinomas papilíferos que apresentam extravasamento de
cápsula19,25, ou mesmo à lesões não encapsuladas. Nesta
casuística, encontrou-se tendência de associação com
significância entre o extravasamento e a mutação BRAF
(p=0,058), o que pode conferir à mutação BRAF significado prognóstico.
Lupi et al.11 estudaram 500 pacientes com carcinomas papilíferos de tireoide (230 microcarcinomas, 82
variantes clássicas, 114 variantes foliculares, 40 variantes
de células altas e 34 de demais variantes). A frequência da
mutação BRAF foi 43,8%, sendo mais alta na variante de
células altas (80%) e na variante clássica (68,3%), e mais
baixa na variante folicular (18,8%). Entre o grupo de
microcarcinomas, a frequência foi 39,4%. Neste estudo,
também demonstrou-se alta frequência da mutação BRAF
nos carcinomas papilíferos da variante clássica (58,3%),
com associação estatística entre elas. Ainda nesta série,
não houve relação com significância estatística entre a idade, o sexo e a presença da mutação na análise univariada,
mas houve associação estatística da mutação com invasão
extratireoideana, multicentricidade, metástases linfáticas,
estádio III versus estádio I e II, e ausência de cápsula tumoral.
Já na análise multivariada, apenas a presença de cápsula
tumoral estava associada à ausência da mutação BRAF,
que, neste aspecto, sugere melhor prognóstico. Apesar da
pequena casuística deste estudo, conseguiu-se demonstrar
tendência de associação entre o extravasamento tireoideano
e a presença da mutação BRAF, o que pode traduzir pior
prognóstico.
Embora a mutação BRAF seja a anormalidade
genética mais comum no carcinoma papilífero de tireoide,
o seu significado prognóstico em longo prazo ainda não
está bem estabelecido. Estudos contraditórios têm sido
publicados, provavelmente pela heterogeneidade do carcinoma papilífero ao redor do mundo e diferentes fenótipos
que se sobrepõem devido à alterações genéticas diferentes18,26.
A associação entre a variante clássica do carcinoma papilífero e a mutação BRAF já havia sido demonstrada9,12,27,28. Neste estudo, encontrou-se associação com
significância entre a presença da mutação BRAF e a variante clássica do carcinoma papilífero. Mas, devido ao pequeno número de casos analisados, não se encontrou associação estatística entre os demais fatores prognósticos e
o status da mutação BRAF. A associação entre a variante
clássica do carcinoma papilífero e a mutação BRAF, com
um fenótipo mais agressivo devido à menor expressão de
genes metabolizadores de iodo, sugere a detecção da
mutação BRAF como fator prognóstico, e auxiliar na escolha terapêutica em pacientes com carcinoma papilífero23.
Acredita-se que os carcinomas papilíferos com a
mutação BRAF podem apresentar menor captação de iodo
no pós-operatório, o que traduz fenótipo mais agressivo e
maior chance de recorrência15,29,30, apontando que, nesses
casos, ao menos o seguimento clínico deve ser rigoroso.
Elisei et al., publicaram a primeira série de casos
com seguimento consistente para sugerir que a mutação
BRAF está associada a pior prognóstico e parece ser fator
independente da idade25. Em 102 pacientes com carcinoma papilífero e seguimento médio de 15 anos, a frequência
da mutação foi 37,3%, mas se apresentou maior nos pacientes com mais de 60 anos de idade, o que corrobora os
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 110-116
Bertelli
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à tireoidectomia
dados encontrados neste estudo. Demonstraram ainda,
associação da mutação com estádios mais avançados, invasão vascular, e prognóstico pior25. Apesar de ter-se estudado apenas indivíduos com mais de 65 anos de idade,
sabe-se que, quanto maior a idade, pior o prognóstico do
carcinoma papilífero, o que motivou estudar a associação
da idade com a mutação BRAF que os pacientes BRAFm
possuíam com idade mais avançada.
Assim, pode se dizer que, mesmo em indivíduos
idosos, a mutação BRAF foi encontrada apenas em carcinomas papilíferos, com frequência de 41,2%31. Demonstrou-se ainda a associação entre a variante clássica do carcinoma papilífero e a presença da mutação BRAF, mesmo
em uma pequena casuística de pacientes idosos. Encontrou-se ainda, tendência estatística de associação entre o
extravasamento tireoideano e a presença da mutação BRAF,
além de maior mediana de idade neste grupo, sem
significância estatística.
Entretanto, estes resultados não permitem concluir que a presença da mutação BRAF está associada com
115
pior prognóstico, tendo em vista a pequena casuística estudada, e, mesmo porque, não interessou neste estudo o
tempo de seguimento e a sobrevida destes pacientes.
Talvez, estes sejam objetivos para a continuidade deste estudo com aumento da casuística, envolvimento
de outras instituições e seguimento clínico prolongado, tentando-se definir o valor prognóstico da mutação BRAF no
carcinoma papilífero de tireoide.
Em conclusão, a mutação BRAF nos pacientes
idosos também é exclusiva do carcinoma papilífero e tem
frequência expressiva. Além disso, está relacionada à variante clássica e, possivelmente, ao extravasamento
tireoideano.
Agradecimentos
À CAPES, Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior, pelo apoio financeiro prestado
em parte deste estudo e à Prof. Dra. Edna T. Kimura, pela
gentileza de auxiliar na metodologia cedendo o controle
positivo da mutação.
A B S T R A C T
Objective: To evaluate the frequency of the BRAF V600E mutation in patients over 65 years of age undergoing thyroidectomy,
Objective
correlating its presence or absence with the different histologic lesions, their variants and with prognostic factors of papillary
Methods: We evaluated 85 patients over 65 years of age who underwent thyroidectomy, analyzing the BRAF V600E
carcinoma. Methods
Results: The study detected the presence or
mutation by RT-PCR performed after DNA extraction from the paraffin blocks. Results
absence of BRAF V600E mutation in 47 patients (55.3%). Among the 17 papillary carcinomas studied, seven had the mutation
(41.2%). There was a statistical association between the presence of this mutation and the classic variant of papillary carcinoma, and
Conclusion: BRAF mutation in the elderly is also exclusive of papillary carcinoma
a trend of association with thyroid extravasation. Conclusion
and is often significant. Furthermore, it is related to the classic variant and possibly to thyroid extravasation.
words: Thyroid gland. Thyroidectomy. Neoplasms of the thyroid gland. Proteins Proto-oncogene B-raf. Mutation. Elderly.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Chiloeches A, Marais R. Is BRAF the Achilles’ Heel of thyroid cancer?
Clin Cancer Res. 2006;12(6):1661-4.
2. Kimura ET, Nikiforova MN, Zhu Z, Knauf JA, Nikiforov TE, Fagin
JA. High prevalence of BRAF mutations in thyroid cancer: genetic
evidence for constitutive activation of the RET/PTC-RAS-BRAF
signaling pathway in papillary thyroid carcinoma. Cancer Res.
2003;63(7):1454-7.
3. Kumagai A, Namba H, Takakura S, Inamasu E, Saenko VA, Ohtsuru
A, et al. No evidence of ARAF, CRAF and MET mutations in
BRAFT1799A negative human papillary thyroid carcinoma. Endocr
J. 2006;53(5):615-20.
4. Fagin JA. How thyroid tumors start and why it matters: kinase
mutants as targets for solid cancer pharmacotherapy. J Endocrinol.
2004;183(2):249-56.
5. Xing M. BRAF mutation in thyroid cancer. Endocr Relat Cancer.
2005;12(2):245-62.
6. Fagin JA. Challenging dogma in thyroid cancer molecular genetics—
role of RET/PTC and BRAF in tumor initiation. J Clin Endocrinol
Metab. 2004;89(9):4264-6.
7. Knauf JA, Ma X, Smith EP, Zhang L, MitsutakeN, Liao XH, et al.
Targeted expression of BRAFV600E in thyroid cells of transgenic
mice results in papillary thyroid cancers that undergo
dedifferentiation. Cancer Res. 2005;65(10):4238-45.
8. Fugazzola L, Puxeddu E, Avenia N, Romei C, Cirello V, Cavaliere A,
et al. Correlation between B-RAFV600E mutation and clinicopathologic parameters in papillary thyroid carcinoma: data from a
multicentric Italian study and review of the literature. Endocr Relat
Cancer. 2006;13(2):455-64.
9. Nikiforova MN, Kimura ET, Gandhi M, Biddinger PW, Knauf JA,
Basolo F, et al. BRAF mutations in thyroid tumors are restricted to
papillary carcinomas and anaplastic or poorly differentiated carcinomas arising from papillary carcinomas. J Clin Endocrinol Metab.
2003;88(11):5399-404.
10. Kumagai A, Namba H, Saenko VA, Ashizawa K, Ohtsuru A, Ito M,
et al. Low frequency of BRAFT1796A mutations in childhood thyroid
carcinomas. J Clin Endocrinol Metab. 2004;89(9):4280-4.
11. Lupi C, Giannini R, Ugolini C, Proietti A, Berti P, Minuto M, et al.
Association of BRAF V600E mutation with poor clinicopathological
outcomes in 500 consecutive cases of papillary thyroid carcinoma.
J Clin Endocrinol Metab. 2007;92(11):4085-90.
12. Trovisco V, Soares P, Preto A, de Castro IV, Lima J, Castro P, et al.
Type and prevalence of BRAF mutations are closely associated
with papillary thyroid carcinoma histotype and patients’ age but
not with tumour aggressiveness. Virchows Arch. 2005;446(6):58995.
13. Lima J, Trovisco V, Soares P, Máximo V, Magalhães J, Salvatore G,
et al. BRAF mutations are not a major event in post-Chernobyl
childhood thyroid carcinomas. J Clin Endocrinol Metab.
2004;89(9):4267-71.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 110-116
Bertelli
Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à tireoidectomia
116
14. Xing M, Westra WH, Tufano RP, Cohen Y, Rosenbaum E, Rhoden
KJ, et al. BRAF mutation predicts a poorer clinical prognosis for
papillary thyroid cancer. J Clin Endocrinol Metab. 2005;90(12):63739.
15. Riesco-Eizaguirre G, Gutiérrez-Martinez P, García-Cabezas MA,
Nistal M, Santisteban P. The oncogene BRAF V600E is associated
with a high risk of recurrence and less differentiated papillary
thyroid carcinoma due to the impairment of Na+/I- targeting to
the membrane. Endocr Relat Cancer. 2006;13(1):257-69.
16. Fugazzola L, Mannavola D, Cirello V, Vannucchi G, Muzza M,
Vicentini L, et al. BRAF mutations in an Italian cohort of thyroid
cancers. Clin Endocrinol. 2004;61(2):239-43.
17. Ito Y, Yoshida H, Maruo R, Morita S, Takano T, Hirokawa M, et al.
BRAF mutation in papillary thyroid carcinoma in a Japanese
population: its lack of correlation with high-risk clinicopathological
features and disease-free survival of patients. Endocr J.
2009;56(1):89-97.
18. Jarzab B, Handkiewicz-Junak D. Differentiated thyroid cancer in
children and adults: same or distinct disease ? Hormones.
2007;6(3):200-9.
19. Jo YS, Li S, Song JH, Kwon KH, Lee JC, Rha SY, et al. Influence of
the BRAF V600E mutation on expression of vascular endothelial
growth factor in papillary thyroid cancer. J Clin Endocrinol Metab.
2006;91(9):3667-70.
20. Zaravinos A, Bizakis J, Spandidos DA. RKIP and BRAF aberrations in
human nasal polyps and the adjacent turbinate mucosae. Cancer
Lett. 2008;264(2):288-98.
21. Xu X, Quiros RM, Gattuso P, Ain KB, Prinz RA. High prevalence of
BRAF gene mutation in papillary thyroid carcinomas and thyroid
tumor cell lines. Cancer Res. 2003;63(15):4561-7.
22. Begum S, Rosenbaum E, Henrique R, Cohen Y, Sidransky D, Westra
WH. BRAF mutations in anaplastic thyroid carcinoma: implications
for tumor origin, diagnosis and treatment. Mod Pathol.
2004;17(11):1359-63.
23. Oler G, Cerutti JM. High prevalence of BRAF mutation in a Brazilian
cohort of patients with sporadic papillary thyroid carcinomas:
correlation with more aggressive phenotype and decreased
expression of iodide-metabolizing genes. Cancer. 2009;115(5):97280.
24. Araújo PPC. Análise da expressão do gene BRAF e suas possíveis
implicações diagnósticas e prognósticas para portadores de carcinoma papilífero da tiróide [dissertação]. São Paulo: Universidade
Estadual de Campinal, Faculdade de Ciências Médicas; 2009.
25. Elisei R, Ugolini C, Viola D, Lupi C, Biagini A, Giannini R, et al.
BRAF(V600E) mutation and outcome of patients with papillary
thyroid carcinoma: a 15-year median follow-up study. J Clin
Endocrinol Metab. 2008;93(10):3943-9.
26. Puxeddu E, Moretti S. Clinical prognosis in BRAF-mutated PTC.
Arq Bras Endocrinol Metabol. 2007;51(5):736-47.
27. Kebebew E, Weng J, Bauer J, Ranvier G, Clark OH, Duh QY, et al.
The prevalence and prognostic value of BRAF mutation in thyroid
cancer. Ann Surg. 2007;246(3):466-70; discussion 470-1.
28. Trovisco V, Vieira de Castro I, Soares P, Máximo V, Silva P, Magalhães J, et al. BRAF mutations are associated with some histological
types of papillary thyroid carcinoma. J Pathol. 2004;202(2):24751.
29. Oler G, Nakabashi CD, Biscolla RP, Cerutti JM. Seven-year followup of a juvenile female with papillary thyroid carcinoma with poor
outcome, BRAF mutation and loss of expression of iodinemetabolizing genes. Arq Bras Endocrinol Metabol.
2008;52(8):1313-6.
30. Ricarte-Filho JC, Ryder M, Chitale DA, Rivera M, Heguy A, Ladanyi
M, et al. Mutational profile of advanced primary and metastatic
radioactive iodine-refractory thyroid cancers reveals distinct
pathogenetic roles for BRAF, PIK3CA, and AKT1. Cancer Res.
2009;69(11):4885-93.
31. Bertelli AAT, Melo MR, Suehara AB, Massarollo LCB, Derito CP,
Gonçalves AJ, Menezes MB. Mutação BRAF em pacientes idosos
com carcinoma papilífero. Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço. 2011;
40(4): 191-96.
Recebido em 29/05/2012
Aceito para publicação em 03/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior.
Como citar este artigo:
Bertelli AAT, Gonçalves AJ, Menezes MB, Melo MR, Tincani S,
Massarollo LCB. Mutação BRAF em pacientes idosos submetidos à
tireoidectomia. Rev Col Bras Cir. [periódico na Internet] 2013; 40(2).
Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Antonio Augusto T. Bertelli
Email: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 110-116
Amorim
Avaliação espirométrica de doentes com sequela de tuberculose submetidos à lobectomia
117
Artigo Original
Avaliação espirométrica de doentes com sequela de tuberculose
submetidos à lobectomia
Spirometry evaluation in patient with tuberculosis sequelae treated by
lobectomy
ELIAS AMORIM1; ROBERTO SAAD JUNIOR, TCBC-SP2; ROBERTO STIRBULOV3
R E S U M O
Objetivo: Avaliar a espirometria no pré e pós-operatório de doentes com sequela de tuberculose, submetidos à lobectomia.
Métodos: Foram selecionados 20 doentes, com idade entre 15 e 56 anos, de ambos os sexos, com história pregressa de
tratamento de tuberculose, apresentando infecção de repetição ou hemoptises. Foram submetidos à lobectomia pulmonar. O
tempo de tratamento da tuberculose foi seis meses e o aparecimento dos sintomas entre um e 32 anos. Foram avaliadas a
capacidade vital (CV), a capacidade vital forçada (CVF), o volume expiratório forçado (VEF1), o VEF1/CVF, o fluxo expiratório forçado
(FEF) e o pico de fluxo expiratório (PFE) após o primeiro, terceiro e sexto meses em relação ao pré-operatório. O nível de significância
(á) aplicado em todos os testes foi 5%, ou seja, considerou-se significativo quando p<0,05. Resultados: As Médias encontradas
foram as seguintes: Capacidade Vital (CV) Pré-operatória-2,83 ; 1º PO 2,12; 3º PO 2,31; 6º PO 2,43. Capacidade Vital Forçada (CVF)
Pré-operatória- 2,97; 1º PO 2,21; 3º PO 2,35; 6º PO 2,53. Volume Expiratório no 1º Segundo (VEF1) Pré-operatório 2,23; 1º PO 1,75;
3º PO 1,81; 6º PO 1,97. Houve diminuição acentuada das funções respiratórias no primeiro mês de pós-operatório, porém houve
Conclusão: Não
melhora dos parâmetros a partir do terceiro mês, com progressivo aumento até o sexto mês de pós-operatório.Conclusão:
houve recuperação dos parâmetros espirométricos, comparados aos do pré operatório, após seis meses de pós-operatório nos
pacientes com sequela de tuberculose submetidos à lobectomia.
Descritores: Pneumonectomia. Tuberculose. Espirometria. Cuidados pré-operatórios. Cuidados pós-operatórios.
INTRODUÇÃO
A
tuberculose causada pelo Mycobacterium tuberculosis
ou bacilo de Koch é ainda frequente em países como
o Brasil1. Chega ao Século XXI como problema de Saúde
Pública não solucionado e se mantém com importante
morbimortalidade2. É a doença infecciosa mais comum da
espécie humana3, matando cerca de três milhões de pessoas por ano no mundo4. Talvez seja a mais antiga doença
conhecida pela humanidade, com registros de lesões encontradas em vértebras de múmias egípcias datadas de
cerca de quatro mil anos1,5-10.
A moderna quimioterapia promoveu notável redução da tuberculose. O tratamento específico, iniciado
em 1944 com a descoberta da estreptomicina, seguiu-se
com a isoniazida em 195211,12.
As sequelas mais frequentes são: pulmão
destruído, bronquiectasias, bola fúngica, estenose de
traqueia e outras menos comuns13-15.
A prova de função pulmonar, ventilatória ou
espirometria é muito importante para indicações do trata-
mento operatório. É utilizada para avaliar as condições
anestésicas e a morbimortalidade dos procedimentos.
Existem poucas referências na literatura em relação às alterações da função pulmonar após ressecção do
parênquima na tuberculose.
A Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa
de São Paulo (FCMSCSP), dentre as suas linhas de pesquisas, está desenvolvendo estudos sobre a avaliação da função pulmonar tanto no período pré-operatório quanto no
pós-operatório. Muitos desses trabalhos já foram concluídos16-19.
O objetivo deste estudo foi avaliar os resultados
da espirometria em doentes submetidos à lobectomia por
toracotomia como tratamento de sequela de tuberculose.
MÉTODOS
Este trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário, Unidade Presidente Dutra da Universidade Federal do Maranhão.
Trabalho realizado no Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão, Unidade Presidente Dutra.
1. Médico do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão; 2. Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica do Departamento
de Cirurgia da Faculdade de Ciência Medicas da Santa Casa de São Paulo; 3. Professor Adjunto da Disciplina de Pneumologia do Departamento
de Clinica Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 117-120
Amorim
Avaliação espirométrica de doentes com sequela de tuberculose submetidos à lobectomia
118
Foram selecionados 20 doentes, dez homens e
dez mulheres, com história pregressa de tratamento de
tuberculose que apresentavam sequelas sintomáticas, ou
seja, infecção de repetição ou hemoptises que procuraram
o Ambulatório de Cirurgia Torácica do Hospital Universitário Presidente Dutra da Universidade Federal do Maranhão,
no período de setembro de 2007 a fevereiro de 2010
A idade dos doentes variou entre 15 e 56 anos,
o tempo de tratamento da tuberculose foi seis meses e o
aparecimento dos sintomas entre um e 32 anos após o
tratamento.
Após entrevista médica, com o relato de
hemoptises recidivantes e história pregressa de tuberculose tratada, foram solicitadas radiografias simples e
tomográficas computadorizada de tórax.
Com o diagnóstico radiológico de sequela, foram solicitados os seguintes exames pré-operatórios:
cintilografia de perfusão e ventilação pulmonar, pesquisa
de bacilo álcool- acido resistente (BAAR) no escarro,
hematimetria, avaliação cardiológica e prova de função
pulmonar.
A curva volume-tempo obtida pela espirometria
forçada foi realizada cumprindo os critérios preconizados
pela American Thoracic Society20, tendo sido escolhida a
melhor de três curvas aceitáveis. A partir dela, foram obtidos os valores de capacidade vital forçada (CVF), volume
expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1), relação
VEF1/CVF, fluxo expiratório forçado entre 25% e 75% da
CVF (FEF 25-75%), pico de fluxo expiratório forçado (PFE).
Os valores de referência de normalidade utilizados para
todas as curvas, foram os propostos por Pereira et al.21.
A avaliação do efeito da lobectomia nas variáveis (CV, CVF, VEF1, VEF1/CVF,FEF e PFE) após o primeiro,
terceiro e sexto meses em relação ao pré-operatório foi
feita através do teste t pareado. O nível de significância (á)
aplicado em todos os testes foi 5%, ou seja, considerou-se
significativo quando p<0,05.
pré e terceiro mês, pré e sexto mês) houve diferença significativa (p<0,05) entre as médias dos dois momentos.
A figura 2 apresenta as médias dos valores da
CVF dos quatro momentos: pré e três pós-operatórios. Houve
diferença estatisticamente significativa quando comparados os quatro momentos (p<0,05).
Não houve diferença estatisticamente significativa (p>0,05) entre o pré e sexto mês de pós-operatório,
mas em relação às outras comparações (pré e primeiro
mês e pré e terceiro mês) houve diferença significativa
(p<0,050) com progressiva recuperação dos valores (Figura 3).
Na figura 4 encontramos as médias dos valores
de PFE dos quatro momentos: pré e três pós-operatórios.
Houve diferença estatisticamente significativa (p<0,05)
entre todas as comparações com o PFE inicial, indicando
que até o sexto mês não houve recuperação total da
variável PFE.
DISCUSSÃO
A espirometria consiste na realização de medidas de fluxos e volumes pulmonares que são obtidos du-
Figura 1 -
Médias da CV nos três momentos estudados (p <0,05).
Figura 2 -
Médias de CVF nos quatro momentos estudados (p
<0,05).
RESULTADOS
Os exames de imagens (radiografia simples e
tomografia do tórax) confirmaram o diagnóstico de bola
fúngica e bronquiectasias dos segmentos a serem operados.
A cintilografia de ventilação e perfusão pulmonar apresentaram déficit de perfusão nos segmentos doentes, as pesquisas de BAAR foram todas negativas, haja
vista, que eram critérios de exclusão, a avaliação
cardiológica, o hemograma e as provas de função pulmonar foram todas compatíveis com a realização do ato operatório.
Encontra-se na figura 1 as médias dos valores da
CV com os desvios-padrão e valores calculados de p para
comparação entre os momentos pré e pós-operatórios.
Observa-se que nas três comparações (pré e primeiro mês,
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 117-120
Amorim
Avaliação espirométrica de doentes com sequela de tuberculose submetidos à lobectomia
Figura 3 -
Medidas de VEF1 nos quatro momentos estudados.
Figura 4 -
Médias de PFE no pré o pós-operatório em todos os
momentos.
rante os movimentos de inspiração e expiração forçadas;
interpretadas pelo aparelho, transformam-se em números
e gráficos. Ela é imprescindível em doentes a serem submetidos à ressecções cirúrgicas, principalmente nas operações pulmonares porque podem ajudar a prever o risco de
complicações no pós-operatório.
Neste trabalho, escolheu-se a espirometria por
ser o método mais usado na prática cirúrgica por ser disponível no hospital, e pela dificuldade de obter-se outros
métodos. A doença é ainda de elevada incidência no estado do Maranhão, com grande número de sequelas sintomáticas.
A CVF é considerada a medida mais importante
da espirometria porque representa o limite máximo do fluxo de ar expirado após inspiração máxima, realizado no
intervalo mais curto possível de tempo. Qualquer processo
que altere a dinâmica pulmonar também altera o fluxo
máximo, sendo a medida mais sensível às variações. Nos
119
distúrbios ventilatórios restritivos a CVF encontra-se com
valores inferiores aos valores de referência.
O VEF1 corresponde ao volume expiratório obtido no primeiro segundo da CVF; resulta na medida
espirométrica mais representativa das alterações clínicas e
nos distúrbios ventilatórios restritivos; ela pode ser normal
ou reduzida.
No estudo de Perin19, comparando a avaliação
espirométrica de indivíduos submetidos à dermolipectomia
abdominal nos períodos pré-operatório imediato e pós-operatório de 19 a 36 meses, não mostrou diferença significativa com a correção dos músculos retos do abdome.
Este trabalho apresentou diminuição acentuada das funções respiratórias no primeiro mês de pós-operatório, atribuída à grande dificuldade do doente executar as manobras em decorrência do trauma da musculatura da parede torácica e da dor associada ao esforço
respiratório.
Helene Júnior18 avaliando a função respiratória
em indivíduos submetidos à abdominoplastia no pré e quarto dia de pós-operatório, observou diminuição da função
respiratória no quarto dia de pós-operatório com normalização até o 30º dia.
Segundo Tercan et al.22 a CV apresenta melhora
pós-operatória significativa até o 30º dia nas
abdominoplastias, todavia, sem atingir os valores pré-operatórios.
Neste estudo, a melhora da função respiratória
foi observada a partir do terceiro mês de pós-operatório em
decorrência da ausência da dor e com melhora da complacência pulmonar, com progressiva recuperação dos
parâmetros no sexto mês.
O presente estudo procurou avaliar se, no período de 180 dias de pós-operatório de lobectomias, ocorreria recuperação total dos parâmetros espirométricos. Os
resultados obtidos não mostraram recuperação significativa dos parâmetros, atingindo a média do pré-operatório. Este fato ocorreu unicamente nas medidas de VEF1/
CVF e FEF.
O presente estudo é o primeiro a investigar o
perfil dos doentes com sequela de tuberculose avaliando a
espirometria no pré e pós-operatórios de lobectomias. Novas pesquisas devem ser realizadas em período mais longo, de um ano ou mais, para verificar se o motivo dessa
alteração é em decorrência do segmento pulmonar operado.
Assim, concluímos que após seis meses de pósoperatório de doentes com sequela de tuberculose submetidos à lobectomia não ocorreu recuperação dos parâmetros
espirométricos quando comparados ao pré-operatório.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 117-120
Amorim
Avaliação espirométrica de doentes com sequela de tuberculose submetidos à lobectomia
120
A B S T R A C T
Methods:
Objective: To evaluate pre and post-operative spirometry in patients with tuberculosis sequelae undergoing lobectomy. Methods
Objective
We selected 20 patients, aged between 15 and 56 years, of both genders, with a history of tuberculosis treatment, with repeated
infections or hemoptysis and indication of pulmonary lobectomy. The tuberculosis treatment time was six months, and onset of
symptoms, between one and 32. We evaluated and compared vital capacity (VC), forced vital capacity (FVC), forced expiratory
volume (FEV1), the FEV1/FVC, forced expiratory flow (FEF) and peak expiratory flow (PEF) preoperatively and after the first, third
and sixth postoperative months (POM). The significance level (á) used in all tests was 5%, ie, it was considered significant when p
Results: The averages found were: Vital Capacity (VC) – Preoperative: 2.83; 1st POM: 2.12; 3rd POM: 2.31; 6th POM: 2.43.
<0.05. Results
Forced Vital Capacity (FVC) – Preoperative: 2.97; 1st POM: 2.21; 3rd POM: 2.35; 6th POM: 2.53. Expiratory Volume in 1 second
(FEV1) – Preoperative: 2.23; 1st POM: 1.75; 3rd POM: 1.81; 6th POM 1.97. There was marked decrease in lung function in the first
month after surgery, but there was an improvement of the parameters from the third month, with gradual increase up to the sixth
Conclusion: There was no recovery of preoperative spirometric parameters at six months postoperatively in patients with
month. Conclusion
sequelae of tuberculosis submitted to lobectomy.
words: pneumonectomy. Tuberculosis. Spirometry. Preoperative care. Postoperative care.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Campos CA, Marchiori E, Rodrigues R. Tuberculose pulmonar: achados na tomografia computadorizada de alta resolução do tórax
em pacientes com doença em atividade comprovada bacteriologicamente. J Pneumologia. 2002;28(1):23-9.
2. Muniz JN, Ruffino-Netto A, Villa TCS, Yamamura M, Arcencio R,
Cardozo-Gonzales RI. Aspectos epidemiológicos da co-infecção
tuberculose e vírus da imunodeficiência humana em Ribeirão Preto (SP), de 1998 a 2003. J bras pneumol. 2006;32(6):529-34.
3. Bombarda S, Figueiredo CM, Funari MBG, Soares Junior J, Seiscento
M, Terra Filho M. Imagem em tuberculose pulmonar. J Pneumologia.
2001;27(6):329-40.
4. Ribeiro SA. Tratamento compulsório da tuberculose: avanço ou
retrocesso? J Pneumologia. 2003;29(1):50-2. (Cartas)
5. Silveira MPT, Adorno RFR, Fontana T. Perfil dos pacientes com
tuberculose e avaliação do Programa Nacional de Controle da
Tuberculose em Bagé (RS). J bras pneumol. 2007;33(2):199-205.
6. Ruffino-Netto A. Tuberculose: a calamidade negligenciada. Rev
Soc Bras Med Trop. 2002;35(1):51-8.
7. Cavalcanti ZR, Albuquerque MFPM, Campello ARL, Ximenes R,
Montarroyos U, Verçosa MKA. Característica da tuberculose em
idosos no Recife (PE): contribuição para o programa de controle. J
bras pneumol. 2006;32(6):535-43.
8. Brasil. Ministério da Saúde. Tuberculose no Brasil: avanços e perspectivas. Programa Nacional de Controle da Tuberculose. [online].
In: Seminário de Manejo Clínico da Tuberculose, São Paulo, 02 e
03 de setembro de 2010. [cited 2010 out 23] Available from:
http://www.sam.pmrp.com.br/ssaude/programas/tuberculose/
tuberculose_no_brasil.pdf
9. Castelo Filho A, Kritski AL, Barreto AW, Lemos ACM, RuffinoNetto A, Guimarães CA, et al. II Consenso Brasileiro de Tuberculose. Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004. J bras pneumol.
2004;30(supl. 1):S2-56.
10. Fernandes TM. Sol e trevas: histórias sociais da tuberculose brasileira. Hist cienc saude-Manguinhos. 2004;11(3):767-71.
11. Murray JF. A century of tuberculosis. Am J Respir Crit Care Med.
2004;169(11):1181-6.
12. Gazetta CE, Vendramini SHF, Ruffino-Netto A, Oliveira MRC, Villa
TCS. Estudo descritivo sobre a implantação da estratégia de tratamento de curta duração diretamente observado no controle da
tuberculose em São José do Rio Preto e seus impactos (19982003). J bras pneumol. 2007;33(2):192-8.
13. Gomes Neto A, Medeiros ML, Gifoni JMM. Bronquiectasia localizada e multissegmentar: perfil clínico-epidemiológico e resultado do
tratamento cirúrgico de 67 casos. J Pneumologia. 2001;27(1):1-6.
14. Guerra MS, Miranda JA, Leal F, Vouga L. Tratamento cirúrgico
das bronquiectasias. Rev Port Pneumol. 2007;13(5):691-701.
15. Balkanli K, Genç O, Dakak M, Gürkök S, Gözübüyük A, Caylak H,
et al. Surgical management of bronchiectasis: analysis and shortterm results in 238 patients. Eur J Cardiothorac Surg.
2003;24(5):699-702.
16. Saad Júnior R, Garrido T, Stirbulov R, Rafal F. Avaliação da função
respiratória de doentes submetidos à operação abdominal alta.
Rev Col Bras Cir. 1994;21(6):329-32.
17. Pinto AMR. Estudo comparativo da função pulmonar em pacientes pós-revascularizados do miocárdio, com CEC e sem CEC, com
uso de derivação intraluminal [tese]. São Paulo: Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo, Faculdade de Ciências Médicas; 1999.
18. Helene Júnior A. Avaliação da função respiratória em indivíduos
submetidos à abdominoplastia. [tese]. São Paulo: Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo, Faculdade de Ciências Médicas; 2005.
19. Perin LF. Avaliação espirométrica de indivíduos submetidos à
dermolipectomia abdominal. [dissertação]. São Paulo: Santa Casa
de Misericórdia de São Paulo, Faculdade de Ciências Médicas;
2007.
20. Standardization of Spirometry, 1994 Update. American Thoracic
Society. Am J Respir Crit Care Med. 1995;152(3):1107-36.
21. Pereira CAC. Testes de função pulmonar. Projeto Diretrizes. Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina. [on line].
Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Elaboração final: 16 de abril de 2001. 12p. [citado em: 2010 out 20]. Disponível
em: http://www.projetodiretrizes.org.br/projeto_diretrizes/
090.pdf
22. Tercan M, Bekerecioglu M, Dikensoy O, Kocoglu H, Atik B, Isik D,
et al. Effects of abdominoplasty on respiratory functions: a
prospective study. Ann Plast Surg. 2002;49(6):617-20.
Recebido em 20/06/2012
Aceito para publicação em 07/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma
Como citar este artigo:
Amorim E, Saad Júnior R, Stirbulov R. Avaliação espirométrica de doentes com sequela de tuberculose submetidos à lobectomia. Rev Col
Bras Cir. [periódico na Internet] 2013;40(2). Disponível em URL: http:/
/www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Elias Amorim
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 117-120
Brito
Valor prognóstico da citologia positiva no lavado peritonial de pacientes com câncer gástrico ressecável
121
Artigo Original
Valor prognóstico da citologia positiva no lavado peritoneal de
pacientes com câncer gástrico ressecável
Prognostic role of positive peritoneal cytology in patients with resectable
gastric cancer
ALEXANDRE MENEZES BRITO1; BRUNO JOSÉ DE QUEIROZ SARMENTO2; ELIANE DUARTE MOTA3; AILTON CABRAL FRAGA JÚNIOR3;
PAULO MOACIR CAMPOLI1; LEONARDO MEDEIROS MILHOMEM1; ORLANDO MILHOMEM DA MOTA, TCBC-GO1
R E S U M O
Objetivo: Avaliar o valor prognóstico do lavado peritoneal positivo em pacientes com câncer gástrico sem sinais de disseminação
peritoneal ou hematogênica. Métodos: Foram avaliados os pacientes com adenocarcinoma gástrico tratados com operação de
intenção curativa. O lavado peritoneal foi classificado como positivo ou negativo para células neoplásicas. Foram obtidos dados
demográficos, performance status, histológicos e tipo de operação realizada. Os resultados foram estatisticamente comparados e
considerados significantes para valores de p<0,05. Resultados: Foram incluídos 72 portadores de adenocarcinoma gástrico.
Durante seguimento médio de 26 meses (um a 39 meses) foram observadas 20 recidivas locais ou à distância e 21 mortes. Apenas
a presença de metástases linfonodais e a necessidade de ressecção de órgãos adjacentes foram associados à redução significativa
da sobrevida livre de recidiva. Houve redução significativa da sobrevida global entre os pacientes com invasão angiolinfática,
metástase linfonodal, com necessidade de ressecção de múltiplos órgãos, necessidade de gastrectomia total e maior invasão da
parede gástrica. A presença de células tumorais na cavidade peritoneal foi associada a pior sobrevida global, porém sem significância
estatística. Conclusão: Não foi demonstrada associação significativa entre o lavado peritoneal positivo e a sobrevida livre de
recidiva ou de sobrevida global entre pacientes com câncer gástrico ressecável.
Descritores: Gastrectomia. Neoplasias gástricas. Neoplasias peritoneais. Lavagem peritoneal. Taxa de sobrevida.
INTRODUÇÃO
T
em sido bastante estudado o valor prognóstico da presença de células tumorais livres na cavidade peritoneal
em pacientes portadores de câncer gástrico1-4. Na segunda edição da Classificação Japonesa do Carcinoma Gástrico, publicada pela Associação Japonesa de Câncer
Gástrico, em 1998, a presença de células tumorais no
lavado peritonial já era classificada como estadio IV5. A
sétima edição da Classificação de Tumores Malignos –
TNM, de 2009, também passou a classificar esta condição como metástase à distância6. A presença de células
malignas no lavado peritoneal tem sido utilizada para
determinar mudanças na abordagem terapêutica. Alguns
estudos sugerem que estes pacientes não se beneficiam
com operações extensas7, ou que as gastrectomias radicais só beneficiam os pacientes sem metástases
linfonodais8. Além disso, diversos autores propõem que
os pacientes com lavado peritoneal positivo deveriam receber tratamento complementar, seja adjuvante8,9 ou
neoadjuvante10,11.
Existe apenas um estudo sobre este tema publicado no Brasil2, de forma que é pouco conhecido o
perfil de disseminação de células livres no peritônio nos
nossos pacientes com carcinoma gástrico. Neste estudo,
citologia positiva foi encontrada em 6,8% dos pacientes
incluídos e, em todos eles, a invasão parietal atingia a
serosa. Além disso, a presença de células malignas no
lavado peritoneal esteve associada com menor sobrevida
média. O adequado conhecimento do padrão da disseminação peritoneal é uma importante etapa para que novas estratégias terapêuticas, adequadas à nossa realidade, sejam delineadas.
O objetivo deste estudo foi avaliar o valor prognóstico do lavado positivo em portadores de câncer gástrico sem sinais de disseminação peritoneal ou hematogênica.
MÉTODOS
Foram avaliados pacientes portadores de
adenocarcinoma gástrico submetidos ao tratamento cirúr-
Estudo realizado no Departamento de Oncologia Gastrointestinal, Hospital Araújo Jorge, Goiânia, GO, Brasil.
1. Cirurgião Oncológico do Setor de Aparelho Digestivo, Hospital Araújo Jorge, Goiânia, GO; 2. Cirurgião Oncológico do Serviço de Cirurgia Geral,
Hospital Regional de Taguatinga, Brasília, DF; 3. Patologista do Setor de Anatomia Patológica, Hospital Araújo Jorge, Goiânia, GO.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 121-126
Brito
Valor prognóstico da citologia positiva no lavado peritonial de pacientes com câncer gástrico ressecável
122
gico com intenção curativa no período de maio de 2007 a
agosto de 2008. Foram incluídos: os que não receberam
quimioterapia neoadjuvante; com tumores ressecáveis; sem
sinais de disseminação peritoneal e sem metástases à distância. O estudo foi submetido ao Comitê de Ética Em
Pesquisa do Hospital Araújo Jorge sendo aprovado sob o
número 13/2007.
Nos pacientes que preenchiam os critérios de
inclusão, o fundo de saco pélvico foi lavado com 200ml de
solução salina. A análise citológica foi realizada com 20ml
do líquido do lavado peritoneal fixado em 5ml de álcool a
92%. Após centrifugação a 2000rpm durante cinco minutos, o sedimento foi corado pelos métodos de HematoxilinaEosina e Papanicolaou. A avaliação imunocitoquímica do
sedimento foi realizada pelo método da estreptoavidinabiotina-imunoperoxidase e a imunodetecção feita com
anticorpos específicos (Berp 4, p53,CK 20 e CK 7). A avaliação das células neoplásicas foi realizada por um patologista experiente e o resultado era conhecido uma semana
após o procedimento cirúrgico.
Foram obtidos os dados demográficos,
performance status (PS)12, tipo histológico e operação realizada. A avaliação histológica da peça ressecada foi feita
de acordo com as regras da segunda edição da Classificação Japonesa do Carcinoma Gástrico5 e o estadiamento foi
feito de acordo com a sexta edição da Classificação dos
Tumores Malignos – TNM13. Os pacientes com estadiamento
patológico (UICC-TNM) II, III ou IV foram encaminhados
para quimioterapia adjuvante. O seguimento ambulatorial
foi realizado a cada três meses no primeiro ano e a cada
seis, a partir do segundo ano. A pesquisa de recidiva foi
feita através de história clínica, exame físico e exames complementares de acordo com a indicação clínica (radiografia do tórax, endoscopia digetiva alta, ultrassonografia e
tomografia computadorizada do abdome e/ou tórax).
Variáveis contínuas foram expressas como
média±DP e as categóricas como números absolutos e
porcentagens. As proporções foram comparadas utilizando o teste qui-quadrado ou o teste exato de Fisher. As
variáveis contínuas foram analisadas com o teste t de
Student. As sobrevidas foram estimadas pelo método de
Kaplan-Meier14 e comparadas pelo log-rank test.B
RESULTADOS
Foram incluídos 72 pacientes com diagnóstico
histológico de adenocarcinoma gástrico com idades variando de 27 a 87 anos (mediana de 61,5 anos); 46 deles
eram homens (64%). A quase totalidade (97%) tinha PS
d” 2. 0Todos eram portadores de tumores ressecáveis e
não apresentavam sinais de metástases à distância na avaliação pré e transoperatória. A gastrectomia parcial foi executada em 42 pacientes, sendo que em dois também foi
necessária a realização de colectomia segmentar. Os demais 30 pacientes foram submetidos à gastrectomia total,
e em 15 deles também foi ressecado pelo menos um órgão adjacente. Neste último grupo, o órgão mais frequentemente ressecado foi o baço (12), seguido pelo esôfago
distal (4), fígado (3), cólon (2) e pâncreas (2). Em 62 pacientes foi realizada linfadenectomia D2. A linfadenectomia
D1 foi realizada nos demais pacientes. O número médio
de linfonodos retirados foi de 35,2 (DP=18,9). Margens
cirúrgicas comprometidas ao exame microscópico foram
observadas em cinco pacientes (6,9%). A quimioterapia
adjuvante foi realizada em 40 (55,5%). A citologia do lavado peritoneal resultou positiva em oito pacientes (11,1%).
As características clínicas e histopatológicas estão apresentadas na tabela 1 e estão igualmente distribuídas entre os
dois grupos analisados. A morbidade operatória foi 12,5%
e a mortalidade de 5,5%.
No seguimento pós-operatório de 26 meses (variação de 1 a 39), foram observadas 20 recidivas locais ou
à distância e ocorreram 21 óbitos. A análise da sobrevida
livre de recidiva para as diversas variáveis estão listadas na
tabela 2. Somente foi observada associação estatisticamente significativa para as variáveis metástase nodal e
ressecção de órgãos adjacentes. Não foi observada associação entre a presença de células tumorais no lavado
peritoneal e a sobrevida livre de recidiva (Figura 1).
A tabela 3 mostra a associação entre a sobrevida
global em três anos e as diversas variáveis listadas. Foi
observada redução significativa da sobrevida global entre
os pacientes que necessitaram de gastrectomia total, naqueles em que foi preciso realizar ressecção de órgãos
adjacentes, e entre aqueles que tinham maior invasão na
parede gástrica, metástases linfonodais ou invasão
angiolinfática na peça ressecada. As curvas de Kaplan-Meier
mostram associação significativa da sobrevida global com
a invasão na parede gástrica (Figura 2) e a presença de
metástase nodal (Figura 3). A presença de células malignas no lavado peritoneal esteve associada à redução não
significativa da sobrevida global (Tabela 3 e Figura 4).
DISCUSSÃO
A adoção de novos métodos de imagem no préoperatório tem melhorado muito o estadiamento
locorregional do câncer gástrico15-17, no entanto, a avaliação pré-operatória da disseminação peritoneal ainda permanece ruim. Uma metanálise recente revelou sensibilidades muito baixas, inferiores a 34%, para detecção de
metástases peritoneais por métodos radiológicos (ultrassom
convencional, ultrassom endoscópico, tomografia
computadorizada e tomografia por emissão de pósitrons)18.
O melhor método diagnóstico de disseminação
peritoneal ainda é minucioso inventário da cavidade durante a laparotomia ou laparoscopia. Mesmo que não existam sinais macroscópicos de acometimento do peritônio, a
presença de células malignas no lavado peritoneal tem sido
reportada por vários autores, com índices que variam de
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 121-126
Brito
Valor prognóstico da citologia positiva no lavado peritonial de pacientes com câncer gástrico ressecável
Tabela 1 -
123
Características clínicas e patológicas dos pacientes.
Variável
Característica
Sexo
Idade
PS
Gastrectomia
Ressecção de órgãos adjacentes
Linfadenectomia
Invasão na parede gástrica
Metástase nodal
Classificação de Lauren
Invasão angiolinfática
M
F
Média
DP
0-1
2-3
Parcial
Total
Não
Sim
D1
D2
T1-2
T3-4
TX
N0
N+
Intestinal
Difuso
Não relatado
Ausente
Presente
Total
(n=72)
Citologianegativa
(n=64)
46
26
60,4
13,3
64
8
42
30
55
17
10
62
31
40
1
25
47
41
29
2
19
53
p
Citologiapositiva
(n=8)
43
21
60,8
13,3
59
5
36
28
48
16
7
57
26
37
1
22
42
36
26
2
16
48
3
5
57,5
13,5
5
3
6
2
7
1
3
5
5
3
0
3
5
5
3
0
3
5
0,21
0,52
0,08
0,54
0,78
0,15
0,44
0,99
0,99
0,71
DP, desvio-padrão; PS, performance status; D1, dissecção nodal da estação 1; D2, dissecção nodal das estações 1 e 2; T1-2, invasão até a subserosa;
T3-4, invasão da serosa ou de órgãos adjacentes; Tx, invasão não avaliada; N0, ausência de metástase nodal; N+, presença de metástase nodal.
Tabela 2 -
Associação entre a sobrevida livre de recidiva e as características cirúrgicas e patológicas.
Variável
Gastrectomia
Ressecção de órgãos adjacentes
Linfadenectomia
Invasão na parede gástrica
Metástase nodal
Classificação de Lauren
Invasão angiolinfática
Citologia do lavado peritoneal
Característica
Parcial
Total
Não
Sim
D1
D2
T1-2
T3-4
N0
N+
Intestinal
Difuso
Ausente
Presente
Negativa
Positiva
SLR 3a (%)
52,9
56,1
58,6
43,6
71,4
52,8
78,5
29,9
88,1
29,9
62,0
47,4
54,6
47,7
53,3
72,9
HR
1
1,98
1
3,91
1
1,14
1
2,21
1
4,06
1
0,77
1
2,90
1
1,48
IC 95%
p
0,78 - 5,01
0,15
1,27 -12,07
0,02*
0,28 - 4,63
0,85
0,92 - 5,35
0,08
1,67 - 9,90
0,002*
0,31 - 1,88
0,56
0,94 - 8,93
0,06
0,27 - 8,09
0,65
SLR 3a, taxa de sobrevida livre de recidiva em três anos; HR, hazard ratio; D1, dissecção nodal da estação 1; D2, dissecção nodal das estações 1
e 2; T1-2, invasão até a subserosa; T3-4, invasão da serosa ou de órgãos adjacentes; N0, ausência de metástase nodal; N+, presença de metástase
nodal.*Diferença estatisticamente significativa.
6,8 a 23%2-4,10,11. O presente estudo revelou que 11,1%
dos pacientes com diagnóstico pré e transoperatório de
doença localizada já eram portadores de células malignas
livres no peritônio, apontando no sentido de terem doença
de comportamento mais agressivo. A invasão além da camada muscular, a metástase linfonodal e a invasão
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 121-126
Brito
Valor prognóstico da citologia positiva no lavado peritonial de pacientes com câncer gástrico ressecável
124
Tabela 3 -
Associação entre a sobrevida global e as características cirúrgicas e patológicas.
Variável
Característica
Gastrectomia
Ressecção de órgãos adjacentes
Linfadenectomia
Invasão na parede gástrica
Metástase nodal
Classificação de Lauren
Invasão angiolinfática
Citologia do lavado peritoneal
Parcial
Total
Não
Sim
D1
D2
T1-2
T3-4
N0
N+
Intestinal
Difuso
Ausente
Presente
Negativa
Positiva
SG 3a (%)
79,2
45,7
77,9
35,7
68,6
67,1
79,7
58,2
91,5
53,6
67,2
70,6
75,9
38,9
68,7
48,6
HR
1
3,04
1
4,58
1
0,87
1
2,60
1
3,50
1
1,06
1
5,37
1
1,88
IC 95%
p
1,23 - 7,51
0,01*
1,61 -13,03
0,004*
0,24 - 3,20
0,83
1,07 - 6,33
0,03*
1,43 - 8,56
0,006*
0,42 - 2,68
0,89
1,84 -15,72
0,002*
0,41 - 8,48
0,41
SG 3a, taxa de sobrevida global em três anos; HR, hazard ratio; D1, dissecção nodal da estação 1; D2, dissecção nodal das estações 1 e 2; T1-2,
invasão até a subserosa; T3-4, invasão da serosa ou de órgãos adjacentes; N0, ausência de metástase nodal; N+, presença de metástase
nodal.*Diferença estatisticamente significativa.
Figura 1 -
Curvas de Kaplan-Meier da sobrevida livre de recidiva
e peritoneal de acordo com a presença de células
tumorais no lavado peritonial.
Figura 3 -
Curvas de Kaplan-Meier da sobrevida global de acordo com apresença de metástase nodal.
Figura 2 -
Curvas de Kaplan-Meier da sobrevida global de acordo com a invasão tumoral na parede gástrica.
Figura 4 -
Curvas de Kaplan-Meier da sobrevida global de acordo com a presença de células tumorais livre.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 121-126
Brito
Valor prognóstico da citologia positiva no lavado peritonial de pacientes com câncer gástrico ressecável
angiolinfática, têm sido relacionados à presença de células
no lavado peritoneal3,4,19, o que não foi observado na presente série.
Nesta série, somente a presença de metástases
para linfonodos e a necessidade de ressecção de órgãos
adjacentes foram relacionados à redução da sobrevida livre de recidiva. A falha em demonstrar associação desta
sobrevida com invasão na parede gástrica e presença de
células no lavado peritoneal, certamente se deve à amostra de pequeno tamanho, uma vez que são fatores prognósticos bem conhecidos e universalmente aceitos20.
A redução da sobrevida global tem sido associada à profundidade de infiltração na parede gástrica, à presença de doença linfonodal e diversos estudos também
mostraram sua associação com lavado peritoneal positivo24,19,21
. No presente estudo, significativa redução da sobrevida
global em três anos foi observada nos pacientes com
125
maior invasão tumoral na parede gástrica, com metástases
linfonodais, com a presença de invasão angiolinfática e
também com a necessidade de gastrectomia total. É notável o fato de que a sobrevida global em três anos foi menor entre os pacientes que tiveram lavado peritoneal positivo, porém sem significância estatística. O baixo número
deste evento na presente amostra é a causa da falha em
demonstrar o valor deste importante fator prognóstico na
sobrevida global.
Em conclusão, este estudo não demonstrou associação significativa entre o lavado peritoneal positivo e
sobrevida global ou sobrevida livre de recidiva em pacientes com câncer gástrico ressecável. No entanto, estes resultados confirmam a invasão angiolinfática, metástase
linfonodal, profundidade de invasão na parede gástrica,
necessidade de gastrectomia total e ressecção de órgãos
adjacentes como importantes fatores prognósticos.
A B S T R A C T
Objective: To evaluate the prognostic value of positive peritoneal lavage in patients with gastric cancer without signs of
Objective
Methods: We evaluated patients with gastric adenocarcinoma treated with curative
peritoneal or hematogenous spread. Methods
intent operation. The peritoneal lavage was classified as positive or negative for neoplastic cells. We obtained demographics,
performance status, histology and type of surgery. The results were statistically compared and were considered significant for
Results: We included 72 patients with gastric adenocarcinoma. During a mean follow up of 26 months (one
values of p <0.05. Results
to 39 months) we observed 20 local or distant recurrences and 21 deaths. Only the presence of lymph node metastases and the
need for resection of adjacent organs were associated with a significant reduction in relapse-free survival. There was a significant
reduction in overall survival in patients with angio-lymphatic invasion, lymph node metastasis, requiring resection of multiple
organs, need for total gastrectomy and greater invasion of the gastric wall. The presence of tumor cells in the peritoneal cavity
Conclusion: There was no statistically significant
was associated with worse overall survival, but without statistical significance. Conclusion
associations between positive peritoneal citology and recurrence-free survival or overall survival among patients with resectable
gastric cancer.
words: Gastrectomy. Gastric neoplasms. Peritoneal malignancies. Peritoneal lavage. Survival rate.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Boku T, Nakane Y, Minoura T, Takada H, Yamamura M, Hioki K,
et al. Prognostic significance of serosal invasion and free
intraperitoneal cancer cells in gastric cancer. Br J Surg.
1990;77(4):436-9.
2. Ribeiro U Jr, Safatle-Ribeiro AV, Zilberstein B, Mucerino D, Yagi
OK, Bresciani CC, et al. Does the intraoperative peritoneal lavage
cytology add prognostic information in patients with potentially
curative gastric resection? J Gastrointest Surg. 2006;10(2):170-6,
discussion 176-7.
3. Rosenberg R, Nekarda H, Bauer P, Schenck U, Hoefler H, Siewert
JR. Free peritoneal tumour cells are an independent prognostic
factor in curatively resected stage IB gastric carcinoma. Br J Surg.
2006;93(3):325-31.
4. Euanorasetr C, Lertsithichai P. Prognostic significance of peritoneal
washing cytology in Thai patients with gastric adenocarcinoma
undergoing curative D2 gastrectomy. Gastric Cancer.
2007;10(1):18-23.
5. Japanese Gastric Cancer Association. Japanese Classification of
Gastric Carcinoma - 2nd English Edition -. Gastric Cancer.
1998;1(1):10-24.
6. International Union Against Cancer (UICC). TNM Classification of
Malignant Tumours. 7th ed. Chichester, UK: Wiley; 2009.
7. Nakagohri T, Yoneyama Y, Kinoshita T, Konishi M, Inoue K,
Takahashi S. Prognostic significance of peritoneal washing cytology
in patients with potentially resectable gastric cancer.
Hepatogastroenterology. 2008;55(86-87):1913-5.
8. Saito H, Kihara K, Kuroda H, Matsunaga T, Tatebe S, Ikeguchi M.
Surgical outcomes for gastric cancer patients with intraperitoneal
free cancer cell, but no macroscopic peritoneal metastasis. J Surg
Oncol. 2011;104(5):534-7.
9. Ako E, Ohira M, Yamashita Y, Kubo N, Muguruma K, Yashiro M,
et al. Efficacy of S-1 for gastric cancer patients with positive
peritoneal lavage cytology. Hepatogastroenterology. 2008;55(8687):1939-42.
10. Badgwell B, Cormier JN, Krishnan S, Yao J, Staerkel GA, Lupo PJ,
et al. Does neoadjuvant treatment for gastric cancer patients
with positive peritoneal cytology at staging laparoscopy improve
survival? Ann Surg Oncol. 2008;15(10):2684-91.
11. Mezhir JJ, Shah MA, Jacks LM, Brennan MF, Coit DG, Strong VE.
Positive peritoneal cytology in patients with gastric cancer: natural history and outcome of 291 patients. Ann Surg Oncol.
2010;17(12):3173-80.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 121-126
126
Brito
Valor prognóstico da citologia positiva no lavado peritonial de pacientes com câncer gástrico ressecável
12. Oken MM, Creech RH, Tormey DC, Horton J, Davis TE, McFadden
ET, et al. Toxicity and response criteria of the Eastern Cooperative
Oncology Group. Am J Clin Oncol. 1982;5(6):649-55.
13. International Union Against Cancer (UICC). TNM Classification of
Malignant Tumours. 6th ed. New York, USA: Wiley; 2002.
14. Kaplan E, Meier P. Nonparametric estimation from incomplete
observations. J Am Stat Assoc. 1958;53(282):457-81.
15. Hwang SW, Lee DH, Lee SH, Park YS, Hwang JH, Kim JW, et al.
Preoperative staging of gastric cancer by endoscopic
ultrasonography and multidetector-row computed tomography.
J Gastroenterol Hepatol. 2010;25(3):512-8.
16. Kwee RM, Kwee TC. Imaging in local staging of gastric cancer: a
systematic review. J Clin Oncol. 2007;25(15):2107-16.
17. Kwee RM, Kwee TC. Imaging in assessing lymph node status in
gastric cancer. Gastric Cancer. 2009;12(1):6-22.
18. Wang Z, Chen JQ. Imaging in assessing hepatic and peritoneal
metastases of gastric cancer: a systematic review. BMC
Gastroenterol. 2011;11:19.
19. de Manzoni G, Verlato G, Di Leo A, Tomezzoli A, Pedrazzani C,
Pasini F, et al. Peritoneal cytology does not increase the prognostic
information provided by TNM in gastric cancer. World J Surg.
2006;30(4):579-84.
20. Chuwa EW, Khin LW, Chan WH, Ong HS, Wong WK. Prognostic
significance of peritoneal lavage cytology in gastric cancer in
Singapore. Gastric Cancer. 2005;8(4):228-37.
21. Yamamoto M, Matsuyama A, Kameyama T, Okamoto M, Okazaki
J, Utsunomiya T, et al. Prognostic re-evaluation of peritoneal lavage
cytology in Japanese patients with gastric carcinoma.
Hepatogastroenterology. 2009;56(89):261-5.
Recebido em 10/06/2012
Aceito para publicação em 10/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma
Como citar este artigo:
Brito AM, Sarmento BJQ, Mota ED, Fraga Júnior AC, Campoli PM,
Milhomem LM, Mota OM. Valor prognóstico da citologia positiva no
lavado peritoneal de pacientes com câncer gástrico ressecável. Rev
Col Bras Cir. [periódico na Internet] 2013;40(2). Disponível em URL:
http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Alexandre Menezes Brito
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 121-126
Oliveira Filho
A biópsia de linfonodo sentinela não deve ser recomendada para pacientes portadores de melanoma espesso (>4mm)
127
Artigo Original
A biópsia de linfonodo sentinela não deve ser recomendada para
pacientes portadores de melanoma espesso
Sentinel node biopsy should not be recommended for patients with thick
melanoma
RENATO SANTOS DE OLIVEIRA FILHO, TCBC-SP 1; ALLISSON MONTEIRO DA SILVA 2; DANIEL ARCUSCHIN DE OLIVEIRA 3;
GUSTAVO GIANOTTO OLIVEIRA 3; FABIO XERFAN NAHAS, TCBC-SP 4
R E S U M O
Objetivo: verificar se há alguma relação entre o estado histopatológico do linfonodo sentinela, a recorrência e a mortalidade
decorrente do melanoma espesso em pacientes submetidos à BLS ao longo de um seguimento significante. Métodos
Métodos: Oitenta e seis
pacientes portadores de melanoma espesso submetidos à BLS foram selecionados de um banco de dados prospectivo. A linfocintilografia,
o mapeamento linfático e a detecção gama intraoperatória foram realizados em todos pacientes. O linfonodo sentinela (LS) foi
analisado por HE e por imunoistoquímica. Linfadenectomia total foi indicada para os pacientes com LS positivo. O estado histopatológico
do LS foi relacionado à taxa de recorrência e de mortalidade por melanoma. Resultados
Resultados: Cento e sessenta e seis LS foram retirados
dos 86 pacientes. As idades variaram de 18 a 73 anos. Havia 47 mulheres e 39 homens. Micrometástases foram encontradas em 44
pacientes. Quarenta e dois pacientes foram submetidos à linfadenectomia total. Sete pacientes tiveram outro linfonodo positivo. Entre
os 44 pacientes com LS positivo houve 20 recorrências e 15 mortes. Houve 18 recidivas e 12 mortes no grupo de LS negativo. A
espessura de Breslow não apresentou correlação com o estado histopatológico do LS. O estado histopatológico do LS não interferiu nas
taxas de recorrência e de mortalidade (teste de Fisher, p=1.00). A mediana de seguimento foi 69 meses. Conclusão
Conclusão: Considerando a
falta de evidência de benefício, a BLS não deve ser indicada para pacientes com melanoma espesso fora de estudos clínicos.
Descritores: Melanoma. Micrometástase de neoplasia. Recidiva. Mortalidade. Biópsia de linfonodo sentinela.
INTRODUÇÃO
A
incidência mundial de melanoma cutâneo tem
aumentado e a sua alta letalidade é notória. A biópsia
de linfonodo sentinela (BLS) é um procedimento necessário para estabelecer o microestágio dos estágios clínicos I e
II do melanoma cutâneo, segundo as diretrizes do AJCC20091. A presença ou ausência de metástases no linfonodo
é o prognóstico mais importante para sobrevivência e
recorrência em pacientes com melanoma cutâneo.
O procedimento de BLS em melanomas espessos tem sido questionado devido à percepção de mau prognóstico nesse subgrupo de pacientes, que tem um risco
elevado de apresentar doença sistêmica. Atualmente, todos os pacientes com linfonodo sentinela positivo devem
ser submetidos à linfadenectomia total. O benefício para
os pacientes portadores de melanoma que apresentaram
linfonodo sentinela positivo após uma retirada do linfonodo
pode estar limitado aos pacientes cujas lesões apresentam
grau intermediário na espessura de Breslow (1 a 4mm)2.
Estudos randomizados de triagem não demonstraram benefícios para pacientes com melanoma espesso (> 4mm)
submetidos à BLS.
Este estudo teve por objetivo verificar se há alguma relação entre o estado histopatológico do linfonodo
sentinela, a recorrência e a mortalidade decorrente do
melanoma espesso em pacientes submetidos à BLS ao longo de um seguimento significante.
MÉTODOS
Dados de pacientes portadores de melanoma
espesso (Breslow > 4mm) submetidos à BLS entre agosto
de 1994 e julho de 2010 foram revisados.
A linfocintilografia pré-operatória foi realizada em
todos os pacientescom emprego de Tc99 acrescido de
Dextran 500 ou Fitato de sódio.
Com o objetivo de realizar a BLS, o mapeamento
linfático com azul patente V e a detecção gama
intraoperatória com o Neoprobe 1500 foram realizados para
encontrar o linfonodo sentinela.
A BLS foi realizada de duas a 24 horas após a
linfocintilografia. Os linfonodos foram analisados em busca
de micrometástases pelo exame histológico convencional
(Hematoxilina e eosina) e exame de coloração
Trabalho realizado no Centro de Prevenção de Câncer “ “Clínica Prof.Dr.Renato Santos - São Paulo” – SP-BR.
1. Cirurgião Oncológico, Doutor em Medicina pela FMUSP; 2. Cirurgiã de Cabeça e Pescoço, Mestre em Medicina pela UNIFESP; 3. Acadêmico
de Medicina – Faculdade de Medicina Anhenbi-Morumbi, São Paulo – SP; 4. Cirurgião Plástico, Prof.Livre-Docente pela UNIFESP.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 127-129
Oliveira Filho
A biópsia de linfonodo sentinela não deve ser recomendada para pacientes portadores de melanoma espesso (>4mm)
128
imunoistoquímica para os marcadores HMB45, proteína S100 e Melan-A.
A linfadenectomia foi indicada para os pacientes com linfonodo sentinela positivo (com micrometástase).
Os pacientes com linfonodos sentinela negativos não foram submetidos à linfadenectomia.
O seguimento foi feito para todos os pacientes a
cada três meses nos três primeiros anos, a cada seis meses
no quarto e no quinto ano após a BLS e anualmente a
partir do sexto ano.
A mesma equipe cirúrgica operou e acompanhou
todos os pacientes.
A espessura de Breslow na lesão primária foi utilizada para verificar se havia alguma relação entre as
micrometástases e o linfonodo sentinela.
As taxas de recorrência e mortalidade de
melanoma foram analisadas de modo a verificar o impacto de um linfonodo sentinela positivo.
As análises estatísticas foram feitas por meio do
risco relativo, razão de chances e teste de Fisher, considerando a significância para p<0.05.
RESULTADOS
Foram revisados os prontuários de 86 pacientes
com melanoma espesso e contabilizados 166 linfonodos
sentinela retirados. Eram 47 mulheres e 39 homens com
idades variando de 18 a 73 anos, mediana de 58 anos.
O Índice de espessura de Breslow variou de 4,1
a 9,9mm (mediana = 5,4mm).
Micrometástases foram encontradas em
linfonodos sentinela de 44 pacientes (51%). Foram submetidos à linfadenectomia total, 42 pacientes. Um paciente recusou a ressecção e o outro, à radioterapia
adjuvante. Sete pacientes que fizeram a
linfadenectomia tinham micrometástases em outros
linfonodos. Os 42 pacientes tinham linfonodo sentinela
negativo e não realizaram linfadenectomia complementar.
Entre os 44 pacientes com linfonodo sentinela
positivo houve 20 recorrências e 15 mortes. Naqueles com
linfonodo sentinela negativo houve 18 recorrências e 12
mortes.
A chance de um paciente com melanoma espesso e linfonodo sentinela positivo ter recorrência é apenas 1,17 maior do que um paciente com melanoma espesso e linfonodo sentinela negativo (OR = 1,17).
A chance de um paciente com melanoma espesso e linfonodo sentinela positivo morrer é apenas 1,39
maior que aquele com melanoma espesso e linfonodo sentinela negativo (OR = 1,39).
O estado histopatológico do linfonodo sentinela
não influenciou nas taxas de recorrência e mortalidade
desses pacientes (Fisher, p = 1,00). O acompanhamento
médio foi 69 meses (oito a 158 meses).
DISCUSSÃO
Antes do procedimento de BLS, os pacientes
portadores de melanoma com espessura de Breslow maior
do que 4mm foram mais observados. Era esperado encontrar nesses pacientes um risco maior para metástases à
distância e mortes por doença sistêmica3. Portanto, a
linfadenectomia eletiva não se aplica a eles. Com o avanço da BLS, diferentes resultados de taxas de sobrevida e
recorrência foram publicados, porém a utilidade da BLS
em pacientes portadores de melanoma espesso ainda está
indefinida.
Cherpelis et al. estudaram 201 pacientes com
melanoma mais espesso que 3,0mm, e 180 estavam vivos, em um seguimento médio de 51 meses. Destes, 166
estavam vivos sem doença. Seus resultados indicaram que
o status do linfonodo sentinela é preditivo de sobrevida
livre de doença para os pacientes portadores de melanoma
espesso4.
Estudando 131 pacientes com melanoma T4,
Gershenwald et al. observaram que os pacientes com
linfonodo sentinela negativo e ausência de ulcerações tinham uma taxa de sobrevida global de três anos de 86%,
enquanto os pacientes portadores de melanoma T4 com
linfonodo sentinela positivo e presença de ulcerações tinham uma taxa de sobrevida global de três anos de 57%
(P<0.03)5.
Revisando 126 pacientes portadores de
melanoma espesso, Ferrone et al. desenvolveram um modelo prognóstico baseado na idade 60 anos, profundidade do melanoma >5,5mm, ulcerações e estado
histopatológico do linfonodo sentinela. Eles observaram
que o risco relativo de recorrência variou de um em pacientes sem a presença de fatores adversos, para 29,4 em
pacientes com os quatros fatores de risco presentes. Concluíram que o estado histopatológico do linfonodo sentinela foi o mais forte preditor independente dos resultados6.
Carlson et al. relataram taxas de sobrevida de
cinco anos de 47 a 62%, mostrando que taxas de sobrevida
em longo prazo para pacientes portadores de melanoma
espesso não eram raras. Concluíram que o estado
histopatológico do linfonodo sentinela é um fator prognóstico independente de sobrevida importante em pacientes
com melanoma espesso7.
Diversos autores recomendam a BLS para pacientes portadores de melanoma T4 com linfonodos clinicamente negativos (N0), independente de qual for a espessura de Breslow5-9. Nesses estudos, o estado histopatológico
do linfonodo sentinela foi, de forma independente, o fator
mais forte para a sobrevida dos pacientes com melanoma
espesso.
Caraco et al. reviram 359 pacientes com espessura de Breslow superior a 4mm. As curvas de sobrevida
não mostraram diferenças significativas entre os pacientes
com linfonodo sentinela positivo e negativo10.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 127-129
Oliveira Filho
A biópsia de linfonodo sentinela não deve ser recomendada para pacientes portadores de melanoma espesso (>4mm)
De acordo com nossos resultados,
micrometástases foram encontradas em 42 dos 86 pacientes portadores de melanoma espesso (Breslow > 4mm). As
taxas de recorrência e mortalidade nos pacientes com
linfonodo sentinela positivo e negativo, não evidenciaram
diferença estatística significante.
Muitos autores consideram o estado
histopatológico do linfonodo sentinela um fator preditor de
sobrevida livre de doença em pacientes com melanoma
espesso, mas sem evidência de benefícios à sobrevida glo-
129
bal. Nossos resultados mostraram que as taxas de
recorrência e de mortalidade não foram influenciadas pelo
comprometimento histopatológico do linfonodo sentinela,
quando o seguimento é longo (mediana de 69 meses). O
“Multicenter Selective Lymphadenectomy Trial” mostrou
dados semelhantes11,12.
Considerando a ausência de evidência de benefício, conclui-se que a biópsia de linfonodo sentinela deve
ser evitada em pacientes portadores de melanoma espesso fora de estudo clínico.
A B S T R A C T
Objective: To ascertain whether there is any relationship between the state of the sentinel lymph node histopathology,
Objective
Methods: Eighty-six patients
recurrence and mortality from thick melanoma in patients undergoing SLNB over a long follow-up. Methods
with thick melanoma undergoing SLNB were selected from a prospective database. Lymphoscintigraphy, lymphatic mapping and
intraoperative gamma probe detection were performed in all patients. The sentinel lymph node (SLN) was analyzed by HE and
immunohistochemistry. Complete lymphadenectomy was indicated for patients with positive sentinel node. The histopathological
Results: One hundred and sixty-six SLNs were
SLN status was related to the rate of recurrence and mortality from melanoma. Results
taken from the 86 patients. Ages ranged from 18 to 73 years. There were 47 women and 39 men. Micrometastases were found
in 44 patients. Forty-two patients underwent complete lymphadenectomy. Seven other patients had positive lymph node. Among
the 44 patients with positive sentinel node, there were 20 recurrences and 15 deaths. There were 18 recurrences and 12 deaths
in the group with negative SLN. The Breslow thickness was not correlated with the histopathological SLN status. The histopathological
SLN status did not affect the rates of recurrence and mortality (Fisher test, p = 1.00). The median follow-up was 69 months.
Conclusion: Considering the lack of evidence of benefit, SLNB should not be indicated for patients with thick melanoma outside
Conclusion
of clinical studies.
words: Melanoma. Micrometastasis of cancer. Recurrence. Mortality. Sentinel lymph node biopsy.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Balch CM, Gershenwald JE, Soong SJ, Thompson JF, Atkins MB,
Byrd DR, et al. Final version of 2009 AJCC melanoma staging and
classification. J Clin Oncol. 2009;27(36):6199-206.
2. Nowecki ZI, Rutkowski P, Michej W. The survival benefit to patients
with positive sentinel node melanoma after completion lymph
node dissection may be limited to the subgroup with a primary
lesion Breslow thickness greater than 1.0 and less than or equal to
4mm (pT2–pT3). Ann Surg Oncol. 2008;15:2223-34.
3. Balch CM, Soong SJ, Milton GW, Shaw HM, McGovern VJ, Murad
TM, et al. A comparison of prognostic factors and surgical results
in 1,786 patients with localized (stage I) melanoma treated in
Alabama, USA, and New South Wales, Australia. Ann Surg.
1982;196(6):677-84.
4. Cherpelis BS, Haddad F, Messina J, Cantor AB, Fitzmorris
K, Reintgen DS, et al. Sentinel lymph node micrometastases and
other histologic factors that predict outcome in patients with thicker
melanomas. J Am Acad Dermatol. 2001;44(5):762-6.
5. Gershenwald JE, Mansfield PF, Lee JE, Ross MI. Role for lymphatic
mapping and sentinel lymph node biopsy in patients with thick (>
or = 4mm) primary melanoma. Ann Surg Oncol. 2000;7(2):160-5.
6. Ferrone CR, Panageas KS, Busam K, Brady MS, Coit DG.
Multivariate prognostic model for patients with thick cutaneous
melanoma: importance .of sentinel lymph node status. Ann Surg
Oncol. 2002;9(7):637-45.
7. Carlson GW, Murray DR, Hestley A, Staley CA, Lyles RH, Cohen C.
Sentinel lymph node mapping for thick (>or=4-mm) melanoma:
should we be doing it? Ann Surg Oncol. 2003;10(4):408-15.
8. Gajdos C, Griffith KA, Wong SL, Johnson TM, Chang AE, Cimmino
VM, et al. Is there a benefit to sentinel lymph node biopsy in
patients with T4 melanoma? Cancer. 2009;115(24):5752-60.
9. Gutzmer R, Satzger I, Thoms KM, Völker B, Mitteldorf C, Kapp A,
et al. Sentinel lymph node status is the most important prognostic
factor for thick (> or = 4mm) melanomas. J Dtsch Dermatol
Ges. 2008;6(3):198-203.
10. Caracò C, Celentano F, Lastoria S, Botti G, Ascierto PA, Mozzillo N.
Sentinel lymph node biopsy does not change melanoma-specific
survival among patients with Breslow thickness greater than four
millimeters. Ann Surg Oncol. 2004;11:198S-202S.
11. Morton DL, Cochran AJ, Thompson JF, Elashoff R, Essner R, Glass
EC, et al. Sentinel node biopsy for early-stage melanoma: accuracy
and morbidity in MSLT-I, an international multicenter trial. Ann
Surg. 2005;242(3):302-11; discussion 311-3.
12. Ross MI, Gershenwald JE. How should we view the results of the
Multicenter Selective Lymphadenectomy Trial-1 (MSLT-1)? Ann
Surg Oncol. 2008;15(3):670-3.
Recebido em 08/06/2012
Aceito para publicação em 11/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma
Como citar este artigo:
Oliveira Filho RS, Silva AM, Oliveira DA, Oliveira GG, Nahas FX. A
biópsia de linfonodo sentinela não deve ser recomendada para pacientes portadores de melanoma espesso (>4mm). Rev Col Bras Cir.
[periódico na Internet] 2013;40(2). Disponível em URL: http://
www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Renato Santos de Oliveira Filho
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 127-129
Silva Júnior
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando
veia jugular
interna
Artigo
Original
130
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria
carótida de suínos utilizando veia jugular interna
Stable experimental model of carotid artery saccular aneurysm in swine using
the internal jugular vein
SEVERINO LOURENÇO DA SILVA JÚNIOR1; GUILHERME BENJAMIN BRANDÃO PITTA2; ADAMASTOR HUMBERTO PEREIRA3; ALDEMAR DE ARAÚJO CASTRO4;
MARIA HELENA TAVARES DE MATOS5; FÁBIO DUQUE SILVEIRA7; LEONARDO TORRES MAGALHÃES7; JOSÉ ADOLFO HURT ALMEIDA DE MORAES7;
EMMYLENA KARINA CORDEIRO MACHADO8; CARLOS WAGNER DE SOUZA WANDERLEY8; CAMILA MEIRELLES DE SOUZA SILVA8; LUCIANA DA PAZ DOS
SANTOS8; JOÃO NICOLLE TUPINÁ NOGUEIRA6
R E S U M O
Objetivo: Desenvolver um modelo experimental estável de aneurisma sacular em carótida de suínos utilizando veia jugular interna.
Métodos: Em 12 suínos sadios, com peso variando entre 25 e 50kg, cinco machos e sete fêmeas, foi confeccionado aneurisma na
artéria carótida comum direita. Após arteriotomia elíptica, foi realizada anastomose terminolateral com coto distal de veia jugular
interna. O volume do aneurisma era calculado de maneira que o valor não excedesse em 27 vezes o valor da área da arteriotomia.
Após seis dias, era realizada angiografia e análise microscópica do aneurisma para avaliar perviedade e trombose parcial ou total.
Resultados: Houve ganho de peso significante dos suínos no intervalo de tempo entre a confecção do aneurisma e a angiografia
(p = 0,04). Foi observada perviedade aneurismática em dez suínos (83%). Ocorreram infecções de feridas operatórias em dois
animais (16,6%), ambas com início de aparecimento em três dias após a confecção do aneurisma. Análise histológica dos aneurismas
mostrou trombos ocluindo parcialmente a luz em nove suínos (75%). Nesses animais, observou-se que, em média, 9% da luz
aneurismática estava preenchida por trombos. Conclusão: Pôde ser desenvolvido um modelo experimental estável de aneurisma
sacular em carótida de suínos utilizando veia jugular interna.
Descritores: Aneurisma. Veias jugulares. Artérias carótidas. Experimentação animal. Suínos.
INTRODUÇÃO
O
s dois fatores mais importantes para o surgimento de
aneurisma nos vasos cerebrais são a vulnerabilidade
da parede arterial e o aumento do estresse hemodinâmico
sobre ela. Estudos histopatológicos, utilizando hematoxilina
e eosina, mostram que a falta da lâmina elástica interna
com as camadas íntima, média e adventícia normais, associada à presença de polimorfonucleares, células
plasmáticas e linfócitos, estão presentes nestes aneurismas.
Apesar dos avanços no conhecimento dessa doença, o processo fisiopatológico envolvido na sua formação, atualmente, permanece desconhecido e controverso1,2. O aneurisma
do tipo sacular é o mais frequente, estando presente em
aproximadamente 80 a 90% dos casos2,3.
Estima-se que 0,5% a 6% da população seja
portadora de um aneurisma cerebral e, destes, cerca de
15 a 31% apresentam múltiplas lesões4,5. Em famílias com
dois ou mais indivíduos afetados, a prevalência chega a
10%3. A ruptura de aneurisma sacular é a maior causa de
hemorragia subaracnoidea atraumática, sendo responsável por aproximadamente 85% dos casos6,7. Ela, por sua
vez, possui taxa de mortalidade entre 32 e 67% e leva à
sequelas físicas por longo prazo entre 10 e 20% dos sobreviventes4. A hemorragia cerebral é fatal em 10 a 15% dos
pacientes antes que recebam qualquer atenção médica no
ambiente hospitalar, e, aqueles que sobrevivem, frequentemente ficam com algum comprometimento neurológico
ou cognitivo8. Se não tratados, esses aneurismas apresentam média de 3,5% de ressangramento a cada ano na
Trabalho realizado no Centro de Cirurgia Experimental e Biotério da Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas (UNCISAL), Maceió – AL-BR,
e no Laboratório de Cirurgia Experimental da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), Petrolina – PE-BR.
Parte da Dissertação de conclusão do curso de Pós-Graduação em Ciências Cirúrgicas, nível Mestrado, da Faculdade de Medicina da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
1. Professor Auxiliar de Clínica Cirúrgica da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF),Petrolina - PE-BR; 2. Professor Adjunto de
Clínica Cirúrgica da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (UNCISAL), Maceió - AL-BR; 3. Professor Adjunto de Clínica Cirúrgica
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre - RS-BR; 4. Professor Assistente de Metodologia Científica da UNCISAL,
Maceió - AL-BR; 5. Professora Adjunta de Histologia, Curso de Medicina Veterinária da UNIVASF, Petrolina - PE-BR; 6. Médico Residente de
Patologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador - BA-BR; 7. Acadêmicos de Medicina da UNIVASF, Petrolina - PE-BR; 8. Acadêmicos
de Medicina Veterinária da UNIVASF, Petrolina - PE-BR.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 130-136
Silva Júnior
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando veia jugular interna
primeira década, com mortalidade por ressangramento
tardio de 67%9,10.
O aneurisma cerebral roto acomete mais frequentemente pacientes entre 55 e 60 anos de idade, sendo
raro na infância; quando ocorre nessa faixa etária, geralmente está presente em maiores de dez anos11.
Os sintomas mais comuns do aneurisma cerebral são os decorrentes da hemorragia cerebral
subaracnoideia causada por sua ruptura. O quadro apresenta-se de maneira súbita, com forte cefaleia, náuseas,
vômitos, rigidez de nuca e diminuição do nível de consciência8.
Há grande dificuldade em estudar essa enfermidade no que se refere à etiologia, fisiopatologia e tratamento, devido, em parte, à sua extrema raridade em animais,
que potencialmente serviriam como modelos experimentais
naturais12. Assim, maiores conhecimentos sobre seu comportamento e tratamento dependem da disponibilidade de
modelos experimentais de pesquisa que se assemelhem à
sua morfologia e fisiologia13,14. Atualmente, os resultados
em longo prazo da embolização por via endovascular com
molas apresentam graus variados de recanalização pós-tratamento. Dessa forma, o desenvolvimento de novas molas
com maior potencial trombótico depende, também, da existência de modelos experimentais15.
O objetivo deste estudo foi produzir um modelo
experimental estável de aneurisma sacular em artéria
carótida comum de suínos utilizando veia jugular interna,
com características que possibilitem seu uso no desenvolvimento de dispositivos endovasculares e no treinamento de
novos cirurgiões.
MÉTODOS
Esta pesquisa foi um estudo descritivo para o
desenvolvimento de um modelo experimental em animais
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (UNCISAL),
Maceió (AL), sob o protocolo no 62-A, e pelo Comitê de
Ética em Estudos Humanos e Animais da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), sob protocolo
no 03031103.
A pesquisa foi feita com 12 suínos da raça
Landrace, com idade entre oito e dez semanas, e foi dividida em duas fases. A primeira, consistiu na confecção de
um aneurisma na artéria carótida comum direita e foi realizada, inicialmente, no Centro de Cirurgia Experimental e
Biotério da UNCISAL, sendo concluída no Laboratório de
Cirurgia Experimental da UNIVASF. A segunda fase ocorreu após seis dias no Centro de Cirurgia Experimental e
Biotério da UNCISAL para os animais operados inicialmente nessa instituição e, no Hospital Veterinário da UNIVASF,
para os animais restantes. Essa segunda fase consistiu na
realização de angiografia do aneurisma e sua ressecção
para estudo histológico.
131
Em ambas as fases, os animais foram submetidos à anestesia geral antes dos procedimentos cirúrgicos.
Aplicou-se medicação pré-anestésica com administração
de atropina 0,04mg/kg por via subcutânea e, após dez
minutos, ketamina 15mg/kg e midazolam 0,2mg/kg por
via intramuscular. Em seguida, a veia marginal da orelha
era puncionada com um abocath nº 20 para infusão de
solução salina( 0,9%) a 20ml/kg/hora para ser iniciada a
indução anestésica. A indução foi feita com thiopental
sódico na dose de 12,5mg/kg até a perda do reflexo
laringotraqueal. Após a indução, o suíno era entubado com
sonda endotraqueal e ventilado com volume corrente de
15ml/kg, com frequência de 12 a 15 incursões respiratórias por minuto. A anestesia inalatória era mantida com
isoflurano e ventilação a 100% de O2. Durante o procedimento anestésico, eram avaliados os seguintes parâmetros
por monitorização não invasiva: frequência cardíaca,
frequência respiratória e pressão arterial sistólica e diastólica.
Na primeira fase, o animal foi posicionado em
decúbito dorsal e submetido à injeção de 1g de cefalotina
por via endovenosa. Em seguida, procedia-se à incisão
mediana em face anterior do pescoço, estendendo-se 5cm
abaixo da mandíbula até o início do esterno. Após dissecção dos planos musculares, abordava-se a artéria carótida
comum e veia jugular interna à direita. Administrou-se
heparina não-fracionada 100U/kg por via endovenosa. Procedeu-se à incisão elíptica longitudinal em artéria carótida
comum com diâmetro longitudinal igual a 7mm e diâmetro
transversal igual a 2mm. A área da abertura arterial foi calculada com base na fórmula de uma elipse: A = p . 3,5 . 1
(A = área; p = 3,14159265; 3,5 = metade do valor do
diâmetro longitudinal; 1 = metade do valor do diâmetro
transversal), onde o valor foi anotado em mm2 (Figura 1).
Em relação à veia jugular interna, fez-se secção
transversal com ligadura do coto proximal utilizando fio
algodão 3-0. A seguir, foi feita anastomose terminolateral
entre coto distal e artéria carótida comum, confeccionando, assim, uma fístula arteriovenosa utilizando fio
Figura 1 -
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 130-136
Cálculo da área da arteriotomia e do volume da bolsa
venosa. A = área; p = 3,14159265; 3,5 = metade do
valor do diâmetro longitudinal; 1 = metade do valor
do diâmetro transversal. V = volume; p = 3,14159265;
r = raio; H = altura.
132
Silva Júnior
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando veia jugular interna
polipropileno 6-0. A seguir, procedeu-se à ligadura da fístula
a uma distância tal da anastomose que o valor do volume
do aneurisma formado fosse 27 vezes maior que o valor da
área da arteriotomia elíptica. O volume do aneurisma foi
calculado em mm3, baseado no volume de um cilindro de
acordo com a fórmula V = p . r2 . H (V = volume; p =
3,14159265; r = raio; H = altura) (Figura 1). Após este
momento, observou-se o preenchimento do aneurisma por
sangue, e a cervicotomia foi fechada por planos. A anestesia
inalatória foi suspensa, e o suíno foi acordado da anestesia.
A variável primária definida foi a frequência de
perviedade aneurismática. As variáveis secundárias analisadas foram diâmetro da artéria carótida comum, diâmetro da veia jugular interna, tempo de clampeamento da
artéria carótida comum, comprimento da bolsa venosa,
volume do saco aneurismático, frequência de hemorragia,
de hematoma, de ruptura, de pseudoaneurisma, de infecção, tempo de aparecimento da infecção, frequência de
deiscência de sutura da pele, de distúrbio neurológico, de
trombose à análise histológica e percentagem da luz
aneurismática preenchida por trombos.
Para avaliar a frequência de perviedade
aneurismática, os suínos foram submetidos à angiografia
de controle seis dias após confecção do aneurisma
carotídeo. Foi realizada incisão mediana em face anterior
do pescoço estendendo-se 5cm abaixo da mandíbula até o
início do esterno. Após dissecção dos planos musculares,
abordava-se a artéria carótida comum proximalmente, colocava-se um cateter vesical no 6 no lúmen arterial, injetava-se 20ml de contraste iodado, e era feita a angiografia
utilizando aparelho simples de radiografia. Após, retiravase a peça em bloco contendo artéria carótida comum e
aneurisma para avaliar a frequência de trombose à análise
histológica e a percentagem da luz aneurismática preenchida por trombos. A seguir, o suíno era submetido à eutanásia com dose tóxica de thiopental sódicoR a 2,5% em
4mg/kg e pela infusão de um relaxante muscular de longa
duração (pancurônio).
Os aneurismas eram encaminhados para imersão
em parafina e laminação com micrótomo; os cortes eram
feitos transversalmente obtendo-se três lâminas de cada
aneurisma, uma da porção proximal, outra da porção média e, por último, da porção distal. O corante para execução das lâminas era a hematoxilina-eosina. A análise de
cada peça era feita em microscopia óptica pelo mesmo
patologista que verificava a existência de trombo e as características histológicas do mesmo. A seguir, era calculada a percentagem da luz aneurismática ocupada pelo
trombo. Cada uma das três lâminas de cada aneurisma
era fotografada no microscópio (Figura 2). Através da fotografia, utilizando-se o programa ImageJ 1.44, media-se a
área da luz aneurismática e a ocupada por trombo na luz
aneurismática. Fazendo regra de três, calculava-se a percentagem da área da luz aneurismática preenchida por
trombos em cada lâmina. A seguir, somava-se essa percentagem da luz aneurismática ocupada por trombos de
Figura 2 -
Característica da lâmina histológica do aneurisma.
cada uma das três lâminas e obtinha-se um valor que estimou a percentagem da luz aneurismática total preenchida
por trombos. Considerou-se que a luz do aneurisma em
cada uma das três lâminas representava 33,33% da luz
total do aneurisma.
Foi utilizado um intervalo de confiança de 95%.
Para as variáveis numéricas, foi utilizado o teste t de
Student. Para o estudo de correlação entre as variáveis
categóricas, foi utilizado o teste de Fisher. O valor de p
considerado estatisticamente significativo foi p < 0,05.
RESULTADOS
Os 12 animais submetidos à confecção do
aneurisma sobreviveram ao experimento. Foram utilizados
sete fêmeas (58,3%) e cinco machos (41,6%).
O peso médio dos animais durante a confecção
do aneurisma foi 38,8 ± 5,4kg, e durante a angiografia, 40
± 6,3kg. Houve um significante ganho de peso no intervalo de tempo entre a confecção do aneurisma e a
angiografia (p = 0,04).
Não foram observadas complicações maiores,
como hemorragia, hematoma, pseudoaneurisma ou distúrbio neurológico. Foram observadas infecções de feridas
operatórias em dois animais (16,6%), ambas com início de
aparecimento três dias após a operação.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 130-136
Silva Júnior
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando veia jugular interna
O tempo médio de confecção do aneurisma foi
130,7 ± sete minutos, e o médio de clampeamento foi 33,8
± 1,3 minutos (Tabela 1). Foram avaliados o diâmetro da
artéria carótida comum e da veia jugular interna, bem como,
o comprimento e volume da bolsa venosa (Tabela 1).
Em relação à variável primária, foi observado que
dez (83%) aneurismas encontravam-se pérvios à angiografia
(Figura 3). Trombose aneurismática à angiografia foi evidenciada em dois animais (16,6%), sendo que um deles
demonstrava trombos preenchendo parcialmente a luz, e
o outro, trombose total. Esses dois animais eram fêmeas.
Após análise histológica dos aneurismas, foram
detectados trombos ocluindo parcialmente a luz em nove
animais (75%). Observou-se que, em média, 9% da luz
aneurismática total estava preenchida por trombos; 55,5%
dos casos de trombose, nessa análise, ocorreu nas fêmeas,
e 44,4%, nos machos.
Nos dois animais com trombose à angiografia
(100%), a análise histológica evidenciou trombose. Dos
nove animais que a possuíam, dois (22,2%) apresentavam
trombose na angiografia; eles não apresentaram os maiores percentuais de luz aneurismática com trombose na
análise histológica (Tabela 2).
Nos nove animais com trombose aneurismática,
após análise histológica, os trombos exibiam características de formação recente com aglomerado de hemácias
Tabela 1 -
133
sendo permeado por infiltrado mononuclear, configurando
trombos recentes. Não foram vistos áreas de organização
ou depósito de fibrina (Figura 4).
DISCUSSÃO
Os modelos experimentais animais têm sido utilizados há décadas, tanto no estudo da história natural dos
aneurismas arteriais quanto na avaliação do resultado do
tratamento dos mesmos16.
Esses modelos tentam reproduzir as características histológicas, geométricas, hemodinâmicas e
fisiopatológicas dos aneurismas cerebrais de humanos17.
Eles devem ser adequados para estudos hemodinâmicos,
estudos patológicos e para avaliar a eficácia de procedimentos terapêuticos18,19. Cinco tipos de animais têm sido
usados para construção cirúrgica desses modelos de
aneurisma: coelho, rato, ovelha, cachorro e suínos10,12,20-23.
Os animais pequenos apresentam desvantagens,
como a necessidade, muitas vezes, de microscópio para
seu manuseio. Além disso, o local de acesso arterial geralmente é sacrificado ao final de cada angiografia, e a luz
estreita dos vasos dificulta o curso dos dispositivos
endovasculares que são representados pelo uso simultâneo de múltiplos microcateteres24,25.
Média das variáveis secundárias numéricas.
Variáveis
Média
Intervalo de confiança de 95%
Limite inferior
Tempo de confecção do aneurisma (min)
Tempo de clampeamento (min)
Diâmetro da artéria carótida comum (mm)
Diâmetro da veia jugular interna (mm)
Comprimento da bolsa venosa (mm)
Volume da bolsa venosa (mm3)
Tabela 2 -
Distribuição das tromboses.
Suíno
Trombose à angiografia
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
130,75
33,83
5,33
6,00
12,10
337,5
115,33
30,77
4,83
5,61
10,88
306,04
Limite superior
146,16
36,89
5,82
6,38
13,31
368,95
Luz aneurismática com trombose na análise histológica (%)
Total
13,7
19,66
6,23
15,16
3,33
7,93
20,52
20,89
0,67
Parcial
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 130-136
134
Silva Júnior
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando veia jugular interna
Figura 3 -
Angiografia mostrando aneurisma pérvio.
Figura 4 -
Aspecto histológico do trombo recente.
Nos caninos, o sistema fibrinolítico do sangue é
muito ativo quando comparado ao do ser humano. Experimentos têm mostrado que coágulos ocluindo artérias de
cães recanalizam em cerca de 12 horas, o que pode ser a
explicação para a alta incidência de perviedade desses
aneurismas em modelos experimentais. No entanto, essa
característica natural torna-se uma desvantagem para o
estudo da eficácia de dispositivos endovasculares e torna
difícil extrapolar os resultados dos estudos em modelo canino para o tratamento de aneurismas humanos. Isso é
particularmente importante em procedimentos que necessitam da trombose sanguínea ao redor de microbalões e
molas para oclusão de sacos aneurismáticos.
Optou-se por suínos porque possuem sistema
fibrinolítico e de coagulação similares aos do ser humano12. Além disso, são fáceis de lidar em laboratório, os
vasos do pescoço são maiores, facilitando o manuseio cirúrgico e teste de dispositivos endovasculares, e são eticamente aceitáveis2,13,21.
Estudos comparativos demonstraram que os sistemas fibrinolítico e de coagulação de primatas não humanos têm mais similaridade com os de humanos quando
comparado com os de cães e suínos. No entanto, a utiliza-
ção de primatas em experimentação tem se tornado difícil
em função de entraves éticos16.
Neste trabalho, não houve superioridade ou diferenças importantes relacionadas ao sexo, havendo concordância com a literatura, que também não relata tais
diferenças13.
Observou-se ganho significante de peso (p = 0,04)
dos suínos no intervalo entre a confecção do aneurisma e
a angiografia de controle, fato que pode ser um limitador
técnico para pesquisas que necessitem de seguimento em
longo prazo. Os animais geneticamente modificados, com
crescimento retardado, permitiriam esse seguimento. O
baixo custo e o fácil manejo são aspectos importantes na
escolha do modelo experimental. No entanto, como se
utilizou animais com peso médio de 38,8kg e com seguimento curto, não foram observadas dificuldades importantes nesse aspecto.
Neste trabalho, não foi observada nenhuma complicação maior após a confecção do aneurisma, diferente
de alguns autores, que mostram índices de até 14,2% de
hemorragia13,25. O índice de infecção em ferida operatória
(16,6%) foi semelhante aos encontrados em trabalhos que
utilizaram cães (11,1%), e considerou-se bom resultado,
tendo em vista que os suínos, pela observação do comportamento nas baias, parecem ter menos higiene que os
cães26.
O diâmetro médio da artéria carótida comum foi
5,3mm, sendo, portanto, compatível com os dispositivos
diagnósticos e para embolização utilizados em seres humanos.
Encontrou-se 83,4% de perviedade do
aneurisma. Ela por tempo prolongado é característica importante na escolha do modelo experimental. Quanto mais
tempo o aneurisma experimental se mantém pérvio, possivelmente maior será sua semelhança macro e microscópica com os aneurismas crônicos presentes em humanos.
Além disso, há a possibilidade de estudar sua velocidade
de crescimento e tempo para ruptura. Outro aspecto importante é a possibilidade de programar-se adequadamente nesse intervalo de tempo, para realizações de
embolizações visando ao teste de novas molas e ao treinamento de novos cirurgiões.
As técnicas descritas usadas para criação de
aneurismas experimentais são variadas27. A maioria dos
trabalhos com suínos, que utiliza técnica de anastomose
semelhante à esta, usa a veia jugular externa para confecção do aneurisma13,28,29. Em alguns, houve trombose espontânea do aneurisma imediatamente após sua confecção, o que motivou a mudança imediata da técnica para
continuação do trabalho28. Em outros, houve índices de
até 50% de trombose após 14 dias de seguimento13. Em
parte desses trabalhos, o aneurisma foi confeccionado e
prontamente embolizado, não havendo estudo em curto
ou médio prazo29. Byrne, em 2004, confeccionou fístula
entre veia jugular externa e artéria carótida comum de
suínos e, após 14 dias, ocluiu-a por via endovascular, for-
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 130-136
Silva Júnior
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando veia jugular interna
mando uma bolsa venosa. Nesse experimento, ele observou perviedade do aneurisma em apenas um suíno estudado após 14 dias21.
Alguns trabalhos utilizaram técnica de
anastomose semelhante a deste estudo, com veia jugular
externa em cães, associada à administração diária de ácido acetilsalicílico no pós-operatório, e não observaram trombose após 14 dias de seguimento26. Há relatos utilizando
artéria carótida externa e veia jugular externa em associação a ácido acetilsalicílico no pós-operatório com apenas
8% de trombose após quatro semanas25.
Parte dos trabalhos na literatura não mostra uma
padronização em relação à técnica cirúrgica empregada,
tamanho dos aneurismas e tempo de seguimento desses
aneurismas, dificultando a análise23,30.
Em nossa pesquisa, a análise histológica não
demonstrou a trombose total e a quase total vistas em dois
aneurismas avaliados pela angiografia. Nesses dois suínos,
os trombos eram pequenos após a avaliação histológica.
Como esses trombos tinham características histológicas de
formação recente, caracterizando-se por aglomerado de
hemácias permeado por infiltrado mononuclear, é possível
que tenham sido desfeitos facilmente durante os cortes
histológicos. Em relação ao aspecto recente dos trombos,
houve concordância com a literatura, que mostra organi-
135
zação do trombo somente após cerca de dez a 14 dias
após formados15.
A avaliação histológica detectou trombos numa
quantidade maior de aneurismas que as angiografias, demonstrando maior sensibilidade daquele método em relação ao último.
O modelo experimental em suíno utilizado neste
estudo demonstrou semelhança anatômica com os
aneurismas da circulação cerebral humana. Houve baixo
índice de trombose espontânea em até seis dias de seguimento, permitindo seu uso para teste de novos dispositivos
terapêuticos endovasculares, bem como, para o treinamento
de cirurgiões nesse intervalo de tempo. No entanto, são
necessários trabalhos com seguimento por tempo mais prolongado, permitindo, assim, uma avaliação mais precisa
da perviedade desses aneurismas.
Apesar de a maioria dos trabalhos utilizarem veia
jugular externa, nosso modelo mostrou índices de trombose e
complicações semelhantes ou até menores que em algumas
séries. Acreditamos que, como a via de acesso é a mesma
para artéria carótida comum e veia jugular interna, o trauma
cirúrgico seja menor, diminuindo o índice de complicações.
Concluindo, pôde ser desenvolvido um modelo
experimental estável de aneurisma sacular em carótida de
suínos utilizando-se veia jugular interna.
A B S T R A C T
Objective: To develop an experimental model of stable saccular aneurysm in carotid of pigs using the internal jugular vein.
Objective
Methods: In 12 healthy pigs, weighing between 25 and 50kg, five males and seven females, we made a right common carotid
Methods
artery aneurysm. After elliptical arteriotomy, we carried out a terminolateral anastomosis with the distal stump of the internal
jugular vein. Aneurysm volume was calculated so that the value did not exceed 27 times the area of the arteriotomy. After six days
angiography and microscopic examination were performed to assess patency of the aneurysm and the presence of total or partial
Results: There was a significant weight gain of pigs in the time interval between the manufacture of the aneurysm and
thrombosis. Results
angiography (p = 0.04). Aneurysmal patency was observed in ten pigs (83%). Operative wound infections occurred in two animals
(16.6%), both with early onset, three days after the making of the aneurysm. Histological analysis showed aneurysm thrombus
partially occluding the light in nine pigs (75%). In these animals, it was observed that on average 9% of the aneurysmal diameter was
Conclusion: It was possible to develop a stable experimental model of saccular aneurysms in pig carotid artery
filled with thrombi. Conclusion
by use of the internal jugular vein.
words: Aneurysm. Jugular veins. Carotid arteries. Animal experimentation. Pigs.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Wang Z, Kolega J, Hoi Y, Gao L, Swartz DD, Levy EI, et al. Molecular
alterations associated with aneurysmal remodeling are localized
in the high hemodynamic stress region of a created carotid
bifurcation. Neurosurgery. 2009;65(1):169-77; discussion 177-8.
2. Hoh BL, Velat GJ, Wilmer EN, Hosaka K, Fisher RC, Scott EW. A
novel murine elastase saccular aneurysm model for studying bone
marrow progenitor-derived cell-mediated processes in aneurysm
formation. Neurosurgery. 2010;66(3):544-50; discussion 550.
3. Frösen J, Tulamo R, Paetau A, Laaksamo E, Korja M, Laakso A, et
al. Saccular intracranial aneurysm: pathology and mechanisms.
Acta Neuropathol. 2012;123(6):773-86.
4. Linfante I, Wakhloo AK. Brain aneurysms and arteriovenous
malformations: advancements and emerging treatments in
endovascular embolization. Stroke. 2007;38(4):1411-7.
5. Lynch JC, Andrade RA. Aneurismas intracranianos múltiplos. Arq
Neuro-Psiquiat. 1992;50(1):16-23.
6. Diringer MN. Management of aneurysmal subarachnoid
hemorrhage. Crit Care Med. 2009;37(2):432-40.
7. Torii R, Oshima M, Kobayashi T, Takagi K, Tezduyar TE. Fluidstructure interaction modeling of blood flow and cerebral aneurysm:
significance of artery and aneurysm shapes. Comput Methods
Appl Mech Eng. 2009;198(45-46):3613-21.
8. Bhat AR, Afzalwani M, Kirmani AR. Subarachnoid hemorrhage in
Kashmir: causes, risk factors, and outcome. Asian J Neurosurg.
2011;6(2):57-71.
9. Winn HR, Richardson AE, Jane JA. The long-term prognosis in
untreated cerebral aneurysms: I. The incidence of late hemorrhage
in cerebral aneurysm: a 10-year evaluation of 364 patients. Ann
Neurol. 1977;1(4):358-70.
10. Eldawoody H, Shimizu H, Kimura N, Saito A, Nakayama T,
Takahashi A, et al. Simplified experimental cerebral aneurysm
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 130-136
136
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
Silva Júnior
Modelo experimental estável de aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando veia jugular interna
model in rats: comprehensive evaluation of induced aneurysms
and arterial changes in the circle of Willis. Brain Res. 2009;1300:15968.
Biller J, Toffol GJ, Kassell NF, Adams HP Jr, Beck DW, Boarini DJ.
Spontaneous subarachnoid hemorrhage in young adults.
Neurosurgery. 1987;21(5):664-7.
Massoud TF, Guglielmi G, Ji C, Viñuela F, Duckwiler GR. Experimental saccular aneurysms. I. Review of surgically-constructed
models and their laboratory applications. Neuroradiology.
1994;36(7):537-46. Erratum in: Neuroradiology. 1995;37(2):176.
Guglielmi G, Ji C, Massoud TF, Kurata A, Lownie SP, Viñuela F, et
al. Experimental saccular aneurysms. II. A new model in swine.
Neuroradiology. 1994;36(7):547-50.
Massoud TF, Ji C, Guglielmi G, Viñuela F, Robert J. Experimental
models of bifurcation and terminal aneurysms: construction
techniques in swine. AJNR Am J Neuroradiol. 1994;15(5):938-44.
Ebara M, Yuki I, Murayama Y, Saguchi T, Nien YL, Vinters HV, et
al. A rabbit model for efficacy evaluation of endovascular coil
materials. Surg Neurol. 2009;72(6):620-7; discussion 627.
Argenta R, Pereira AH. Modelos animais de aneurisma de aorta. J
vasc bras. 2009;8(2):148-53.
de Oliveira IA, Mendes Pereira Caldas JG, Araujo Oliveira H, de
Abreu Costa Brito E. Development of a new experimental model
of saccular aneurysm by intra-arterial incubation of papain in
rabbits. Neuroradiology. 2011;53(11):875-81.
Darsaut TE, Bing F, Salazkin I, Gevry G, Raymond J. Testing flow
diverters in giant fusiform aneurysms: a new experimental model
can show leaks responsible for failures. AJNR Am J Neuroradiol.
2011;32(11):2175-9.
Fukui K, Negoro M, Keino H, Yoshida J. Experimental creation of
fusiform carotid artery aneurysms using vein grafts in rats.
Neurosurgery. 1998;43(6):1419-24; discussion 1424-6.
Nishikawa M, Smith RD, Yonekawa Y. Experimental intracranial
aneurysms. Surg Neurol. 1977;7(4):241-4.
Byrne JV, Hubbard N. A novel two-stage technique for construction
of experimental aneurysms. AJNR Am J Neuroradiol.
2004;25(2):319-21.
Dai D, Ding YH, Kadirvel R, Lewis DA, Kallmes DF. Experience with
microaneurysm formation at the basilar terminus in the rabbit
elastase aneurysm model. AJNR Am J Neuroradiol. 2010;31(2):3003.
23. Stehbens WE. Histological changes in chronic experimental
aneurysms surgically fashioned in sheep. Pathology.
1997;29(4):374-9.
24. van Alphen HA, Gao YZ, Kamphorst W. An acute experimental
model of saccular aneurysms in the rat. Neurol Res. 1990;12(4):2569.
25. Boulos AS, Deshaies EM, Fessler RD, Aketa S, Standard S, Miskolczi
L, et al. A triple bifurcation aneurysm model for evaluating complex
endovascular therapies in dogs. J Neurosurg. 2005;103(4):739-44.
26. Yapor W, Jafar J, Crowell RM. One-stage construction of giant
experimental aneurysms in dogs. Surg Neurol. 1991;36(6):426-30.
27. Mücke T, Hölzle F, Wolff KD, Harders A, Scholz M. Microsurgically
induced pure arterial aneurysm model in rats. Cent Eur Neurosurg.
2011;72(1):38-41.
28. Siqueira MG, Rojas RAG, Sturion DJ. Aneurismas experimentais:
proposição de nova técnica. Arq Neuro-psiquiatr. 1980;38(1):1823.
29. Arends J, Perkins KD, Zhang J, Polyakov I, Lee E. A new technique
for the surgical creation of aneurysms in an in vivo tortuous vessel
model to test neurovascular devices. J Invest Surg. 2008;21(1):3945.
30. German WJ, Black SP. Experimental production of carotid
aneurysms. N Engl J Med. 1954;250(3):104-6.
Recebido em 01/07/2012
Aceito para publicação em 05/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma.
Como citar este artigo:
Silva Júnior SL, Pitta GBB, Pereira AH, Castro AA, Matos MHT, Silveira
FD, Magalhães LT, Moraes JAHA, Machado EKC, Wanderley CWS,
Silva CMS, Santos LP, Nogueira JNT. Modelo experimental estável de
aneurisma sacular em artéria carótida de suínos utilizando veia jugular
interna. Rev Col Bras Cir. [periódico na Internet] 2013;40(2). Disponível
em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Severino Lourenço da Silva Júnior
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 130-136
Burlamaqui
Repercussão hepática da carcinogênese colorretal induzida pelo azoximetano
137
Artigo Original
Repercussão hepática da carcinogênese colorretal induzida
pelo azoximetano
Hepatic repercussions of azoxymethane-induced colorectal carcinogenesis
IDÁLIA MARIA BRASIL BURLAMAQUI, UFC-CE*,1; CONCEIÇÃO APARECIDA DORNELAS2; PAULO ROBERTO CARVALHO ALMEIDA2; FRANCISCO
VAGNALDO FECHINE JAMACARU3; DANIEL MAGALHÃES COUTINHO MOTA4; FRANCISCO JOSÉ CABRAL MESQUITA4; LARA ALBUQUERQUE DE BRITO5;
LARA BURLAMAQUI VERAS6; LUSMAR VERAS RODRIGUES7
R E S U M O
Objetivo
Objetivo: Avaliar as repercussões hepáticas da carcinogênese colônica induzida por diferentes doses e tempos de exposição ao azoximetano em ratos Wistar. Métodos
Métodos: Quarenta e quatro ratos foram distribuídos em quatro grupos. Os animais
tinham oito semanas no início do experimento. No grupo 1, receberam 1.0mL de solução salina intraperitonealmente uma
vez por semana por duas semanas. No grupo 2, receberam 15 mg/kg de azoximetano intraperitonealmente uma vez por
semana por duas semanas. Esses animais foram mortos na 15ª semana do experimento. Os animais do grupo 3 receberam
solução salina intraperitonealmente uma vez por semana por duas semanas. Os animais do grupo 4 receberam 20mg/kg de
azoximetano intraperitonealmente uma vez por semana por duas semanas. Esses animais foram mortos na 26ª semana do
experimento. Os fragmentos de tecido hepático foram corados pela hematoxilina e eosina e avaliadas microscopicamente.
Resultados
Resultados: Grupo 1 e grupo 2 diferiram significantemente em relação a esteatose, mas não houve diferença entre o
grupo 3 e o grupo 4. No entanto, no grupo 4 foram observadas lesões pré-neoplásicas (focos de células alteradas, claras,
vacuoladas, basofílicas, anfofílicas, tigróides, oncocíticas, pequenas ou acidófilas, espongioses e pelioses) e lesões neoplásicas
(colangiomas e adenomas) contendo hepatócitos atípicos de permeio, não identificados no grupo 3. Conclusão: No modelo
de carcinogênese colorretal, lesões hepáticas pré-neoplásicas e neoplásicas aparecem e evoluem na proporção do tempo e
dose de exposição ao azoximetano.
Descritores: Neoplasias do colo. Neoplasias colorretais. Marcadores biológicos de tumor. Azoximetano. Fígado gorduroso.
INTRODUÇÃO
O
câncer colorretal (CCR) está entre os tipos mais frequentes de neoplasias malignas. É a terceira causa
mais comum de câncer no mundo, em ambos os sexos, o
quarto tipo mais frequente no sexo masculino e o terceiro
entre mulheres1. Representa a quarta neoplasia mais
diagnosticada nos Estados Unidos, com 178.000 casos novos ao ano e mortalidade em torno de 47 para cada 100.000
habitantes2.
A causa é resultado de uma complexa interação
de variáveis externas, como agentes ambientais, dietéticos
e fatores internos de natureza somática ou hereditária3.
Quando detectado em estágios mais precoces, ele apresenta maiores chances de cura e sobrevida4.
Considerando a relevância da doença neoplásica,
além da necessidade de entender a fisiopatologia do
surgimento das lesões precoces, utilizam-se diversos modelos de carcinogênese colorretal5,6. O modelo de Bird promove a carcinogênese por 1,2 dimetilhidrazina (DMH) ou
azoximetano (AOM) e avalia a formação de criptas
aberrantes em mucosa cólica de roedores, sendo amplamente utilizado em pesquisas experimentais. As lesões
induzidas por AOM, mutações K-ras, APC e p53, são de
modo semelhante ao CCR em humanos e também podem
ser encontradas em outros órgãos, como fígado, intestino
delgado e peritônio7-9.
São poucos os trabalhos sobre lesões hepáticas
causadas pelo AOM10,11 durante a carcinogênese colorretal
provocada no modelo de Bird12-16.
Este Trabalho foi realizado no Laboratório de Cirurgia Experimental (LABCEX) do Programa de Pós-Graduação em Cirurgia da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal do Ceará, Brasil.
1. Aluna do Curso de Doutorado do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Ceará - Fortaleza -CE-BR; 2. Professor Adjunto do
Departamento de Patologia e Medicina Legal da Universidade Federal do Ceará – Fortaleza -CE-BR; 3. Professor Visitante do Departamento de
Farmacologia da Universidade Federal do Ceará – Fortaleza -CE-BR; 4. Residente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará
– Fortaleza -CE-BR; 5. Aluno da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará – Fortaleza -CE-BR; 6. Aluno da Faculdade de Medicina
de Juazeiro- Juazeiro do Norte- CE- BR; 7. Professor Associado do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal do Ceará – Fortaleza -CEBR.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 137-141
Burlamaqui
Repercussão hepática da carcinogênese colorretal induzida pelo azoximetano
138
O objetivo desse estudo é avaliar a relação entre
a dose e o tempo de exposição do azoximetano sobre as
repercussões hepáticas durante a carcinogênese cólica em
ratos.
MÉTODOS
A pesquisa foi realizada após aprovação pelo
Comitê de Ética em Pesquisas Animais da Universidade
Federal do Ceará (CEPA/UFC) sob número de protocolo 09
do dia 03/02/2009 e de acordo com as Normas Internacionais para Pesquisa Biomédica em Animais.
Foram utilizados 44 ratos (Rattus norvegicus
albinus, Rodentia mammalia, Muridae) da linhagem Wistar,
machos, provenientes do Biotério Central da Universidade
Federal do Ceará, com oito semanas de vida e peso médio
de 180g. Os animais foram mantidos em gaiolas individuais de polipropileno com tampa de arame galvanizado com
zinco, forradas com maravalhas no laboratório de Cirurgia
Experimental do Departamento de Cirurgia da Faculdade
de Medicina da Universidade Federal do Ceará. Permaneceram alojados em condições adequadas, umidade relativa do ar em torno de 50%, e temperatura média de 25ºC,
ciclo claro e escuro de 12/12 horas e ventilação adequadas. Receberam água e ração ad libitum.
Os animais foram identificados, pesados e distribuídos aleatoriamente em quatro grupos. Após o desmame, foram alimentados com dieta padrão da Biobase Biotec
Ratos e Camundongos composta de 59% de carboidratos
(CHO), 29% de proteínas (PTN) e 12% de lipídios (LIP)
(Figura 1).
Os grupos foram assim compostos: Grupo 1 –
(G1) grupo controle com ratos não expostos ao AOM (n=9):
os animais receberam injeção de 1.0 ml de solução salina
0,9% estéril, intraperitoneal, uma vez por semana por duas
semanas e foram mortos na 15ª semana após injeção de
solução salina; Grupo 2 – (G2) grupo estudo com ratos
expostos ao AOM 15 mg/kg (n=9): os animais receberam
injeção de AOM 15 mg/kg, intraperitoneal uma vez por
semana por duas semanas e foram mortos na 15ª semana
após injeção de AOM; Grupo 3 – (G3) grupo controle com
ratos não expostos ao AOM (n=14): os animais receberam
injeção de 1.0 ml de solução salina 0,9% estéril,
intraperitoneal uma vez por semana por duas semanas e
foram mortos na 26ª semana após injeção de solução salina; Grupo 4 – (G4) grupo estudo com ratos expostos ao
AOM 20 mg/kg (n=12): os animais receberam injeção de
AOM 20 mg/kg, intraperitoneal uma vez por semana por
duas semanas e foram mortos na 26ª semana após injeção
de AOM.
Na 15ª semana (grupos 1 e 2) e na 26ª semana
(grupos 3 e 4) após as primeiras injeções, os animais foram
anestesiados com 80 mg/Kg ketamina e 8 mg/Kg xylazina
intraperitoneal e posicionados em decúbito dorsal para início do ato operatório. Foram submetidos à laparotomia por
incisão mediana xifopubiana com exposição da cavidade
peritoneal para protocolectomia e hepatectomia total. Estes órgãos foram medidos, pesados e avaliados quanto à
presença de lesões macroscópicas. Amostras de lóbulos de
fígado foram clivadas e encaminhadas para estudo
histopatológico de rotina. O colo foi aberto na borda antimesocólica, lavado com solução salina e estendido em
papel tipo kraft, dobrado em seu eixo de forma concêntrica e imerso em solução de formalina a 10% para fixação e
estudos posteriores. Em seguida, os animais foram mortos
por choque hipovolêmico, após secção da aorta abdominal.
Todos os órgãos foram clivados sendo retirados
dois fragmentos de fígado (lobo lateral direito e esquerdo)
bem como as lesões observadas na macroscopia. Os tecidos foram fixados em formol 10% tamponado, por 24 horas e a seguir levado para processamento histotécnico. Após
emblocamento em parafina foram feitos cortes com 5µm
de espessura e corados pela hematoxilina e eosina (H/E).
As variáveis do estudo são nominais. Utilizou-se
o teste de qui-quadrado para comparação de amostras nãopareadas em tabelas de contigência 2 x 2, comparando-se
os grupos 1 e 2 e os grupos 3 e 4 quanto à presença de
esteatose hepática. O nível de significância foi de 5%, sendo
estatisticamente significante o valor de ñ < 0.05.
RESULTADOS
O exame histopatológico do fígado evidenciou
esteatose leve em todos os grupos. Ela foi menos incidente
no grupo 1, no qual os animais eram mais jovens e não
receberam AOM.
Os grupos 1 e 2 diferiram significantemente (x2
= 7.54, r = 0.011) com relação à esteatose hepática na
eutanásia (15 semanas após a injeção de solução salina e
AOM 15 mg/kg, respectivamente) (Tabelas 1 e 2). Os grupos 3 e 4 não diferiram (x2 = 2.08, r = 0.216) com relação
à esteatose hepática na eutanásia (26 semanas após a
injeção de solução salina e AOM 20 mg/kg, respectivamente) (Tabelas 1 e 3).
As lesões prémalignas e neoplásicas, entretanto
foram observadas apenas nos ratos do grupo 4 que receberam maior dose de AOM (20 mg/kg). Das lesões
prémalignas, a de maior incidência foram as células
anfofílicas vistas em seis animais do grupo 4 (Figuras 1 e
2). As lesões neoplásicas mais frequentes foram os
colangiomas e adenomas. Foi observado um caso de carcinoma in situ e um de hepatocarcinoma. A espongiose e
peliose também foram frequentes neste grupo.
DISCUSSÃO
O foco de cripta aberrante, lesão pré-neoplásica
da mucosa cólica, foi inicialmente descrito por Bird7. Apre-
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 137-141
Burlamaqui
Repercussão hepática da carcinogênese colorretal induzida pelo azoximetano
Tabela 1 -
139
Lesões hepáticas por azoximetano.
Lesões Grupos
G1
Esteatose
Lesões pré- malignas
Leve
Moderada
Severa
Clara
Vacuolada
Basofílica
Intermediária
Anfofílica
Tigróide
Oncocítica
4
G2 G3 G4
8
2
7
1
9
1
1
2
2
1
1
Espongiose
Peliose
Colangioma
Adenoma
Carcinoma in situ
Hepatocarcinoma
6
1
2
7
5
6
3
1
1
senta como característica ser induzido por agente
carcinogênico específico de modo dose-dependente e é
visto na mucosa cólica precocemente, de duas a quatro
semanas após a dose de iniciação. O tamanho e
multiplicidade das criptas aumentam com o tempo e características como proliferação e displasia predizem o desfecho tumoral6-9.
O AOM é um metabólito da DMH, cujo mecanismo de indução de lesões pré-neoplásicas é atribuído ao
aumento da expressão do gene c-fos e à diminuição do
gene c-myc, assim como à mutação do gene K-ras, alterações similares àquelas observadas na carcinogênese espontânea em humanos17,18. Este é geralmente preferido
Tabela 2 -
Figura 1 -
Espongiose – HE 10x.
Figura 2 -
Colangioma cístico - HE 10x.
em relação ao DMH por ser mais potente e requerer poucas reações para sua ativação. É ativado no fígado por
N-oxidação, gerando compostos reativos essenciais para a
Esteatose hepática nos grupos 1 e 2.
Lesões hepáticas
Grupos
Sem esteatose (%)
Com esteatose (%)
Total (%)
5 (55,6)
0 (0)
5 (26,3)
4 (44,4)
10 (100)
14 (73,7)
9 (100)
10 (100)
19 (100)
Com esteatose (%)
Total (%)
Grupo 1
Grupo 2
Total
X2 = 7.54, r = 0.011 - corrigido pelo teste de Fisher.
Tabela 3 - Esteatose hepática nos grupos 3 e 4.
Lesões hepáticas
Sem esteatose (%)
Grupos
Grupo 3
Grupo 4
Total
6 (42,9)
2 (16,7)
8 (30,8)
X2 = 2.08, r = 0.216 - corrigido pelo teste de Fisher.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 137-141
8
10
18
(57,1)
(83,3)
(69,2)
14 (100)
12 (100)
26 (100)
Burlamaqui
Repercussão hepática da carcinogênese colorretal induzida pelo azoximetano
140
carcinogênese química (metilazoximetanol e íon metil
diazóxido) sendo levados ao colo pela corrente sanguínea
ou via biliar como glucoronídeo conjugado. Após ativação,
o DNA é metilado principalmente nas posições N7- guanina
e O6 - guanina19.
No presente estudo, as lesões pré-neoplásicas
aparecem no fígado e evoluem proporcionalmente à dose
e ao tempo de exposição do carcinógeno.
O AOM causa proliferação de hepatócitos. Estes
são considerados ainda pré-neoplásicos, pois não parecem
ter nenhum grau de crescimento autônomo, designado por
focos e nódulos de hepatócitos alterados. Três linhagens
hepatocíticas podem ser identificadas durante a evolução
dos testes para tumores hepáticos em roedores:
glicogenólica-basofílica, anfofílica-basofílica e xenomórficabasofílica20,21.
As lesões pré-neoplásicas (focos de células
alteradas, claras, vacuoladas, basofílicas, anfofílicas,
tigróides, oncocíticas, pequenas e acidófilas, espongiose e
peliose) e neoplásicas (colangioma e adenoma) podem ser
distintas do tecido não-transformado ao seu redor por alterações na expressão de várias enzimas, incluindo a
adenosina trifosfatase (ATPase), glicose-6-fosfatase,
g-glutamiltranspeptidase (gGT) e glutationa S-transferase
forma placentária (GST-P), estas são comumente utilizadas como marcadores da doença maligna22-24.
Esteatose foi vista mais frequentemente no grupo 2 do que no grupo 1. No entanto, a diferença entre o
grupo 3 e 4 não foi significante. Por outro lado, animais do
grupo 4 apresentaram lesões pré-neolásicas e neoplásicas,
possivelmente devido ao maior tempo de exposição ao AOM
(11 semanas a mais). Estudos morfométricos mostraram
que focos de células vacuoladas (células de gordura) podem se desenvolver de células de glicogênio e progressivamente evoluir para células mistas e neoplasia maligna hepática22.
Comparando os grupos 1 (15 semanas) e 3 (26
semanas), a esteatose foi mais evidente no último, onde a
única variável foi o tempo (11 semanas). O fígado de animais senis pode apresentar degeneração, com áreas de
esteatose, células mais claras, vacuolizadas e abalonadas,
núcleos mais volumosos e de forma irregular25.
Neste estudo, o AOM causou lesões hepáticas
pré-neoplásicas e neoplásicas proporcionalmente de acordo com a dose e o tempo de exposição, semelhante aos
achados de Bird na carcinogênese colorretal. No entanto,
tornam-se necessários mais estudos para fortalecer esses
achados.
Em conclusão, no modelo de carcinogênese
colorretal envolvendo ratos, as lesões pré-neoplásicas e
neoplásicas hepáticas aparecem e evoluem proporcionalmente ao tempo de exposição e à dose utilizada do AOM.
A B S T R A C T
Objective: To evaluate the hepatic effects of colonic carcinogenesis induced by azoxymethane at different doses and times of
Objective
Methods: Forty-four Wistar rats were divided into four groups. The animals were eight weeks at the beginning
exposure in rats. Methods
of the experiment. group 1 received 1.0ml of saline intraperitoneally once a week for two weeks. Group 2 received 15 mg/kg of
azoxymethane intraperitoneally once a week for two weeks. These animals were killed at the 15th week of the experiment. The
animals of group 3 received saline intraperitoneally once a week for two weeks. Group 4 animals received 20mg/kg of azoxymethane
intraperitoneally once a week for two weeks. These animals were killed at the 26th week of the experiment. The fragments of liver
Results: Groups 1 and 2 differed significantly in
tissue were stained with hematoxylin and eosin and evaluated microscopically. Results
relation to steatosis, no difference having been found between group 3 and group 4. However, in group 4 we observed preneoplastic lesions (foci of altered, clear, vacuolated, basophilic, amphophilic tigroid, oncocytic, small or acidophilus cells, spongiosis and
peliosis) and neoplastic lesions (adenomas and colangiomas) containing atypical hepatocytes in between, not identified in group 3.
Conclusion
Conclusion: In the model of colorectal carcinogenesis, preneoplastic and neoplastic hepatic lesions appear and evolve in proportion
to the time of exposure and dose of azoxymethane.
words: Cervical neoplasms. Colorectal neoplasms. Biological markers of tumor. Azoxymethane. Fatty liver.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer (INCa).
Estimativa 2010: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de
Janeiro: INCa, 2009. [citado 20 ago 2012]. 98p. Disponível em:
http://www.inca.gov.br/estimativa/2010/estimativa20091201.pdf
2. Horner MJ, Ries LAG, Krapcho M, Neymar N, Aminou R, Howlader
N, et al. Cancer statistics review 1975-2009 (Vintage 2009
population) [Internet]. Bethesda (MD): National Cancer Institute;
2009 [Update 2012 Aug 20]. Disponível em: hppt://seer.cancer.gov/
scr/1975_2006/
3. Santos Jr JCM. Câncer ano-reto-cólico: aspectos atuais II - câncer
colorretal – fatores de riscos e prevenção. Rev Bras Coloproctol.
2007;27(4):459-73.
4. Castro LS, Corrêa JHS, editores. Tratamento Cirúrgico do câncer
gastrointestinal. Rio de Janeiro: Leonaldson dos Santos Castro;
2005.
5. Fearon ER, Vogelstein B. A genetic model for colorectal
tumorigenesis. Cell. 1990;61(5):759-67.
6. Bird RP. Role of aberrant crypt foci in understanding the
pathogenesis of colon cancer. Cancer Lett. 1995;93(1):55-71.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 137-141
Burlamaqui
Repercussão hepática da carcinogênese colorretal induzida pelo azoximetano
7. Bird RP. Observation and quantification of aberrant crypts in the
murine colon treated with a colon carcinogen: preliminary findings.
Cancer Lett. 1987;37(2):147-51.
8. Roncucci L, Pedroni M, Vaccina F, Benatti P, Marzona L, De Pol A.
Aberrant crypt foci in colorectal carcinogenesis. Cell and crypt
dynamics. Cell Prolif. 2000;33(1):1-18.
9. Bird RP, Good CK. The significance of aberrant crypt foci in
understanding the pathogenesis of colon cancer. Toxicol Lett.
2000;112-113:395-402.
10. Matsuda Y, Toda M, Kato T, Kuribayashi K, Kakimi K. Fulminant
liver failure triggered by therapeutic antibody treatment in a mouse
model. Int J Oncol. 2006;29(5):1119-25.
11. Bémeur C, Desjardins P, Butterworth RF. Antioxidant and antiinflammatory effects of mild hypothermia in the attenuation of
liver injury due to azoxymethane toxicity in the mouse. Metab
Brain Dis. 2010;25(1):23-9.
12. Bannasch P, Enzmann H, Klimek F, Weber E, Zerban H. Significance
of sequential cellular changes inside and outside foci of altered
hepatocytes during hepatocarcinogenesis. Toxicol Pathol.
1989;17(4 Pt 1):617-28.
13. Bannasch P, Zerban H. Predictive value of hepatic preneoplastic
lesions as indicators of carcinogenic response. IARC Sci Publ.
1992;(116):389-427.
14. Bannasch P. Hormonal and hormone-like effects eliciting
hepatocarcinogenesis. Folia Histochem Cytobiol. 2001;39 Suppl
2:28-9.
15. Nozaki T, Fujihara H, Watanabe M, Tsutsumi M, Nakamoto K,
Kusuoka O, et al. Parp-1 deficiency implicated in colon and liver
tumorigenesis induced by azoxymethane. Cancer Sci.
2003;94(6):497-500.
16. Nishihara T, Baba M, Matsuda M, Inoue M, Nishizawa Y, Fukuhara
A, et al. Adiponectin deficiency enhances colorectal carcinogenesis
and liver tumor formation induced by azoxymethane in mice. World
J Gastroenterol. 2008;14(42):6473-80.
17. Stopera SA, Davie JR, Bird RP. Colonic aberrant crypt foci are
associated with increased expression of c-fos: the possible role of
modified c-fos expression in preneoplastic lesions in colon cancer.
Carcinogenesis. 1992;13(4):573-8.
18. Caderni G, Femia AP, Giannini A, Favuzza A, Luceri C, Salvadori M,
et al. Identification of mucin-depleted foci in the unsectioned colon
of azoxymethane-treated rats: correlation with carcinogenesis.
Cancer Res. 2003;63(10):2388-92.
141
19. Fiala ES. Investigations into the metabolism and mode of action of
the colon carcinogens 1,2-dimethylhydrazine and azoxymethane.
Cancer. 1977;40(5 Suppl):2436-45.
20. Bannasch P, Nehrbass D, Kopp-Schneider A. Significance of hepatic
preneoplasia for cancer chemoprevention. IARC Sci Publ.
2001;154:223-40.
21. Bannasch P, Haertel T, Su Q. Significance of hepatic preneoplasia
in risk identification and early detection of neoplasia. Toxicol Pathol.
2003;31(1):134-9.
22. Bannasch P, Zerban H. Tumor of the liver. In: Turosov VS, Mohr U,
editors. Pathology of tumor in laboratory animals. Lyons: IARC;
1990. p. 199-240.
23. Dragan YP, Campbell HA, Xu XH, Pitot HC. Quantitative
stereological studies of a ‘selection’ protocol of
hepatocarcinogenesis following initiation in neonatal male and
female rats. Carcinogenesis. 1997;18(1):149-58.
24. Ito N, Imaida K, Asamoto M, Shirai T. Early detection of carcinogenic
substances and modifiers in rats. Mutat Res. 2000;462(2-3):20917.
25. Gaglianone MC, Silva Netto CR, Sala MA, Lopes RA, Campos GM,
Petenusci SO. Estudo morfológico do fígado de ratos durante o
envelhecimento. Rev Esc Farm Odontol Alfenas. 1991;(13):91-100.
Recebido em 15/06/2012
Aceito para publicação em 12/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); Cirurgia Programa de pós-graduação
da Universidade Federal do Ceará e do Laboratório de Cirurgia Experimental (LABCEX), Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Medicina.
Como citar este artigo:
Burlamaqui IMB, Dornelas CA, Almeida PRC, Jamacaru FVF, Mota
DMC, Mesquita FJC, Brito LA, Veras LB, Rodrigues LV. Repercussão
hepática do azoximetano no modelo de carcinogênese colorretal. Rev
Col Bras Cir. [periódico na Internet] 2013;40(2). Disponível em URL:
http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Idália Maria Brasil Burlamaqui
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 137-141
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos:Revisão
estado atual
142
Cirurgia para controle de danos: estado atual
Damage control surgery: an update
RODRIGO CAMARGO LEÃO EDELMUTH1; YURI DOS SANTOS BUSCARIOLLI2; MARCELO AUGUSTO FONTENELLE RIBEIRO JUNIOR, TCBC-SP3
R E S U M O
A cirurgia de controle de danos é um conceito amplamente aceito atualmente entre os especialistas em trauma abdominal quando
se trata de doentes gravemente traumatizados. Nestes pacientes a morte decorre, na maioria das vezes, da instalação da tríade
letal (hipotermia, coagulopatia e acidose) e não da incapacidade de reparar as graves lesões presentes. Nesta revisão, os autores
abordam a tríade letal, em suas três fases, e enfatizam as medidas adotadas para preveni-las. Além de discutirem a indicação e o
emprego da cirurgia para o controle de danos em seus vários estágios. A restauração dos padrões fisiológicos do doente na UTI, para
que o mesmo possa ser submetido à operação definitiva e ao fechamento da cavidade abdominal, outro desafio no paciente
traumatizado grave, também é discutida.
Descritores: Pacientes. Ferimentos e lesões. Terapêutica. Procedimentos cirúrgicos operatórios. Controle.
INTRODUÇÃO
O
termo “controle de danos” tem origem na marinha
norte-americana e se refere à capacidade dos navios
militares de absorverem impacto e manterem sua integridade ao longo da missão. A utilização desse termo na
medicina é voltada para a estratégia cirúrgica na qual reduz-se o tempo de cirurgia e sacrifica-se o reparo imediato
de todas as lesões a fim de restaurar os parâmetros fisiológicos e não anatômicos no paciente instável. As técnicas
utilizadas visam, prioritariamente, a controlar hemorragias, infecções e/ou vazamentos intestinais, biliares ou
vesicais. Esse método consiste, portanto, em controlar de
maneira não definitiva as lesões do doente e também é
conhecido como laparotomia abreviada1-3.
Inicialmente essa abordagem foi utilizada em
pacientes moribundos e vítimas de trauma, em especial
nos traumas abdominais. Entretanto, esse método já é
utilizado atualmente no tratamento de lesões torácicas,
ortopédicas e vasculares de extremidades. Além disso,
vem ganhando espaço em cenários não traumáticos, no
qual o doente se encontra com acentuada instabilidade
clínica e parâmetros fisiológicos bastante alterados, a
ponto de impedir que a operação seja realizada até o
fim3-7.
A ideia de controlar os danos de maneira temporária tem início no começo do Século 20, quando Pringle
propôs a utilização de compressas na cavidade abdominal
para tamponamento de hemorragias hepáticas. Em 1913,
Halsted utilizou faixas de borracha juntamente com compressas, e essa técnica foi utilizada durante a Segunda
Guerra Mundial.
No Brasil, há relatos do uso de “mechas de gaze
asséptica” para hemostasia de lesão hepática grave em
19065. Entretanto, foi somente no final do século que essa
abordagem ganhou força. Em 1983, Stone et al.8 demonstraram que a taxa de mortalidade em pacientes
exsanguinantes com coagulopatias caíra de 98% para 35%
com o emprego da laparotomia abreviada. Isso foi observado com o seguinte modelo de abordagem: laparotomia
inicial com colocação de compressas intra-abdominais para
conter hemorragia, ligadura de vasos e ressecção intestinal rápida sem anastomose ou formação de estomas. A
operação era prontamente interrompida, uma vez que o
paciente apresentasse coagulopatia. O reparo cirúrgico
definitivo era realizado em um segundo momento, com o
paciente estável e com sua coagulopatia corrigida. Dez
anos após, em 1993, Rotondo et al.9 introduziram o termo
“controle de danos”.
MÉTODOS
Foi realizada uma revisão da literatura no do
banco de dados da MEDLINE. Foram encontrados 179 artigos com os seguintes limites de busca no PUBMED: termo
1. Médico pesquisador do serviço de Cirurgia Geral do Hospital do Servidor Público Estadual – IAMSPE; 2. Médico pesquisador do grupo de
Transplante e Cirurgia do Fígado do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – HC-FMUSP; 3. Professor
Titular, chefe da Disciplina de Cirurgia Geral e do Núcleo de Clínica Cirúrgica e Coordenador do Curso de Medicina da Universidade de Santo
Amaro – UNISA.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
143
damage control no título, artigos publicados nos últimos
dez anos, em inglês ou português, e somente em humanos. Além disso, buscamos nas referências dos artigos selecionados, outros trabalhos relevantes para essa revisão,
assim como sugestão de especialistas na área. Através de
nossos critérios de inclusão selecionamos um total de 42
artigos, que foram utilizados como base para a realização
desta revisão.
Tríade letal
Burch et al.10 descreveram esse ciclo vicioso no
qual há um desarranjo metabólico importante que leva à
exaustão fisiológica. A taxa de hemorragia secundária, a
coagulopatia, cresce para 40% quando associada à
hipotensão, para 50% quando há hipotermia e para 60%
na presença de acidose. Podendo chegar à exorbitante taxa
de 98% na presença de toda a tríade letal11.
Hipotermia
É comum nos pacientes vítimas de trauma, em
conseqüência de acentuada perda sanguínea, exposição
do doente, reanimação com fluidos não aquecidos ou perda da capacidade de termorregulação em pacientes intoxicados ou com danos neurológicos. Esses fatos acarretam
a hipoperfusão tecidual resultante da vasoconstrição periférica, que tem início a partir de uma intensa descarga
simpática. A redução na oferta de oxigênio e a conversão
do metabolismo aeróbico em anaeróbico culminam em
acidose metabólica.
A hipotermia torna-se, clinicamente, importante quando a temperatura corpórea está abaixo de 36oC
por mais de quatro horas, e uma temperatura abaixo de
35oC está relacionada com um pior prognóstico. Há relatos evidenciando mortalidade de 100% em pacientes
com temperatura abaixo de 32oC1,2,12. A hipotermia pode
causar arritmias ventriculares, diminuição da pós-carga,
maior resistência vascular periférica e desvio da curva
de dissociação de oxigênio para a esquerda. Há também correlações de hipotermia com supressão do sistema imune.
Acidose metabólica
A acidose é um preditor importante da gravidade de lesão abdominal e de prognóstico do paciente. Um
pH baixo por tempo prolongado é sinal de prognóstico ruim
e pH < 7,2 está relacionado com alta mortalidade1.
A acidose metabólica agrava o quadro de
coagulopatia pela inativação de fatores de coagulação pHdependentes2. Além disso, a acidose pode sobrecarregar o
sistema respiratório na tentativa de realizar uma alcalose
respiratória compensatória. Essa alteração também pode
levar à diminuição da contratilidade miocárdica e reduzir a
pós-carga.
Múltiplas transfusões sanguíneas, clampeamento
da aorta e função miocárdica reduzida também contribuem para a piora da acidose.
Coagulopatia
A maioria dos pacientes politraumatizados encontra-se em um estado de hipercoagulabilidade ou com
parâmetros de coagulação pouco alterados. Entretanto, os
10% restantes, são doentes com hipocoagulabilidade e com
pior prognóstico.
Anormalidades de coagulação após o trauma são
fatores independentes de alta mortalidade. Um tempo de
protrombina (TP) anormal inicial aumenta o risco de morte
em 35%, enquanto um tempo anormal de tromboplastina
parcial ativada (TTPa) aumenta esse risco em 326%1,13.
Moore et al.14 descreveram que coagulopatia grave (TP >
duas vezes seu valor normal e TTPa > duas vezes seu valor
normal) é um importante preditor de morte.
A hipotermia é um importante fator no desenvolvimento do distúrbio de coagulação, porque: inibe a
interação do fator de von Willebrand com as glicoproteínas
plaquetárias, ocasionando disfunção plaquetária; inativa os
fatores de coagulação temperatura-dependentes; induz
alterações no sistema fibrinolítico e gera anormalidades
endoteliais. Em temperaturas menores que 35oC, os fatores de coagulação entram em um estado de
hipometabolismo agravando o quadro clínico1,2.
A administração excessiva de fluidos, na tentativa de reposição volêmica no paciente instável, é uma importante causa de coagulopatia devido à hemodiluição que
decorre tanto da infusão acentuada de cristaloides quanto
das transfusões sanguíneas1,2,15.
A hemodiluição e a hipotermia são os fatores
evitáveis mais frequentes e, portanto, o médico deve estar
sempre atento em manter o paciente aquecido com mantas térmicas, fluídos aquecidos e evitar a desnecessária infusão fluídos1.
Estágios da cirurgia para controle de danos
A cirurgia de controle de danos pode ser dividida em cinco estágios: seleção do paciente, operação abreviada, correção dos parâmetros fisiológicos na UTI,
reoperação programada e fechamento da parede abdominal. Entretanto alguns autores, como Parreira5 e Rotondo16,
não consideram a seleção de paciente e o fechamento da
parede abdominal como estágios isolados e, portanto, dividem a cirurgia de controle de danos em três momentos.
Seleção do paciente
Não há consenso absoluto quanto aos critérios
que devem ser utilizados para a realização da cirurgia de
controle de danos. Entretanto, não há dúvida de que essa
escolha deve ser tomada precocemente. Além disso, é
imprescindível que haja disponibilidade de vagas em UTI,
equipe técnica qualificada e centros cirúrgicos
especializados, ou que pelo menos tenham supervisão cirúrgica contínua5. O cirurgião deve ficar atento aos sinais e
sintomas do paciente e evitar alterações fisiológicas
limítrofes, pois essas podem representar a perda do momento ideal para a realização da cirurgia de controle de
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
144
Sabe-se que a tomada de decisão no momento
adequado e para os pacientes que têm indicação não só é
fundamental, como também decisiva para o sucesso dessa
abordagem. Um estudo retrospectivo com 532 pacientes
demonstrou uma correlação direta entre a diminuição de
laparotomias abreviadas em um período de dois anos, de
36,3% para 8,8% e uma queda significativa na mortalidade e redução da utilização de recursos e custos hospitalares. Esse resultado corrobora a ideia da necessidade de
critérios rígidos para a indicação da operação20.
Em suma, não há critérios bem estabelecidos para
indicação da cirurgia de controle de danos e, portanto, o
cirurgião deve avaliar o cenário completo, tendo em mente todos os dados fisiológicos do doente, a gravidades de
suas lesões e o mecanismo de trauma. Pelas experiências
ruins, muitos cirurgiões experientes aprenderam que é
melhor recuar do que presenciar o paciente atingir seu limite fisiológico17. Muitas vezes essa decisão é tomada antes mesmo de o paciente entrar no centro cirúrgico. Os
principais critérios podem ser vistos na tabela 21,15,16,19, 21-25.
danos. A instabilidade hemodinâmica manifestada pela
hipotensão, taquicardia, taquipneia e alteração do estado
de consciência devem alertar o médico para a potencial
necessidade de realizar a laparotomia abreviada. Doentes
que apresentem coagulopatia e/ou hipotermia são prováveis candidatos a essa abordagem. Alguns autores também propõem que essa decisão seja baseada na magnitude das lesões e no mecanismo do trauma. Vitimas de lesões vasculares abdominais importantes, lesões múltiplas
de órgãos e com hemorragias multifocais em diferentes
cavidades também devem ser considerados para esse tipo
de abordagem16-18.
Em 2002, Parreira et al.19 descreveram um sistema de indicação baseado na probabilidade de hemorragia
letal e se utilizam dessas informações para interromper a
operação no doente grave, fornecendo assim dados objetivos para a indicação da laparotomia abreviada (Tabela 1).
Kairinos et al.12 propuseram critérios matemáticos que visam a estimar a mortalidade do doente e, assim,
auxiliar o raciocínio clínico do cirurgião. A equação proposta, X= [(0,012).idade] – [(0,707).pH] – [(0,032) temperatura] + 6,002, demonstrou uma mortalidade inevitável naqueles pacientes com X > 0,5 (sensibilidade de 25% e
valor preditivo positivo de 100%). As três variáveis dessa
fórmula são os principais fatores pré-operatórios preditivos
de mortalidade, sendo a idade o principal deles. Esse mesmo grupo demonstrou uma mortalidade de 100% em pacientes submetidos a laparotomia abreviada com mais de
58 anos de idade.
Além dessas variáveis, Asensio et al.18 demonstraram por meio de um estudo retrospectivo que alguns
sinais clínicos também predizem mortalidade em pacientes com hemorragia importante: pupilas não reagentes,
ausência de ventilação espontânea, pulso carotídeo não
palpável, ausência de movimento de extremidades e ausência de ritmo sinusal.
Tabela 1 -
Controle da hemorragia
Após uma laparotomia mediana xifopúbica a
hemostasia deve ser realizada, e pode ser feita com a colocação de compressas nos quatro quadrantes, ligadura ou
clampeamento de vasos e/ou utilização de balões para
tamponamento. As compressas podem ser trocadas durante a operação e, eventualmente, podem ser deixadas
na cavidade abdominal e retiradas somente na reoperação
programada. Os reparos vasculares complexos não devem
ser realizados nesse momento1-3.
Probabilidade de hemorragia letal, em %, calculada com base na pressão arterial sistólica aferida no início da
operação e o volume de concentrado de hemácias infundidas durante a operação (Parreira et al. 2002).
CH / PA 9 0 0
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
110
Operação abreviada
Esse procedimento tem por objetivo controlar
rapidamente os focos de hemorragia e infecção e diminuir
as contaminações no menor tempo possível.
67
58
48
38
29
22
16
11
8
5
4
2
1200
1500
1800
2100
2400
2700
3000
3300
3600
3900
4200
72
64
54
44
35
26
19
14
10
7
5
3
77
69
60
50
40
31
23
17
12
8
6
4
81
74
66
56
46
36
28
21
15
10
7
5
84
78
71
62
52
42
33
25
18
13
9
6
87
82
75
67
58
48
38
29
22
16
11
8
90
85
80
72
64
54
44
35
26
19
14
10
92
88
83
77
69
60
50
40
31
23
17
12
93
90
86
81
74
66
56
46
37
28
21
15
95
92
89
84
78
71
62
52
42
33
25
18
96
94
91
87
82
75
67
58
48
38
30
22
97
95
93
90
85
80
72
64
54
44
35
26
CH - volume de concentrado de hemácias transfundido, em mililitros.
PA – Pressão arterial sistólica aferida no início da operação, em mmHg.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Principais critérios para a seleção de pacientes.
Autor
Ano
Garrison
et al. 2 3
1996
Cushmann
et al. 2 2
1997
Cosgriff
et al. 2 1
1997
Rotondo
et al. 1 6
1997
Krishna
et al. 2 4
1998
Asensio
et al. 1 8
2001
Parreira
et al. 1 9
2002
Stalhschmidt
et al. 2 5
2006
Germanos
et al. 1
2008
Matsumoto
et al. 1 5
2010
Tipo de estudo e
número de pacientes
Prospectivo
(n=70)
Retrospectivo
(n=53)
Prospectivo
(n=58)
Revisão
Retrospectivo
(n=40)
Retrospectivo
(n=548)
Prospectivo
(n=74)
Revisão
Revisão
Retrospectivo
(n=34)
—-
—-
Pacientes com traumas grave de bacia e
abdomen
hemodinamicamente
instáveis após
ressuscitação com
fluidos.
< 34 oC
< 34 oC
—< 7,2
< 35,5 oC
< -7,5 mmol/L
—-
Base dos critérios
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Temperatura
Base excess
pH
Pressão
Utilização de
Indicadores de
Avaliação de
compressas para morte em vítima de fatores preditivos
ferimentos pene- de coagulopatia
hemostasia e
análise de diversas trantes de vasos
ilíacos
variáveis entre
pacientes sobreviventes e não
sobreviventes
——< 7,2
arterial
Alterações
Hipotensão prolongada
(>70 min)
sanguíneas
> 15 bolsas
de CH
< 35 oC
< -6 mEq/L
< 7,3
< 34 oC
—< 7,1
< 35 oC
—< 7,3
—-
PAS < 70 mmHg
—-
—-
TTPa
> 60s
—-
TP
> 19s
—-
>35
—-
—-
ISS
Outros
—-
Paciente com
Perda sanguínea Vítimas de ferimentos
> 2L durante a penetrantes de tronco
trauma de múltiplas vísceras.ISS > cirurgia; Transfu- com PAS < 90mmHg,
hemorragia e que
35 eGlasgow > 9 são concentrado
de hemácias e” sobreviveram até o
1,5L durante
tratamento defnitivo
ressuscitação ;
pctes com diagnóstico de
exsanguinação **
< 33 oC
< -12 mEq/L
Acidose metabólica
grave
< 80 (60-90) mmHg*
< 34 oC
—< 7,2
—< - 10 mEq/L
< 7,25
< 7,2
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
Tabela 2 -
PAS < 110 mmHg no
PAS < 70 mmHg
PAS < 90mmHg
início da cirurgia
Choque persistente Incapacidade de
Instabilidade
—Coagulopatia >10 bolsas de CH Perda sanguínea Perda sanguínea
(> 4L de perda
> 4 L (2,5-6)*
estimada > 5L
Transfusão de
hemostasia devido
hemodinâmica
sanguínea)
INR > 2,2
ou > 15 mL/min
CH > 1200 ml
ao desenvolvimento
(Taquicardia,
Coagulopatia
(1,6-3,2)*
Reposição volêmica
de coagulopatia e
arritmias, pulsos
total > 12L
inacessibilidade
carotídeos fracos)
>10 bolsas
Transfusão > 4L CH
aos vasos;
Coagulopatia
de CH
Duas vezes maior
—————> 19s
—seu valor padrão
Duas vezes maior
—————> 19s
—seu valor padrão
> 25
—> 51 (41-61)*
< 20 ***
—> 35
———Tempo de
Combinação de Ventilação espontânea;
—Choque
Tempo de operação O cirurgião pode
hipovolêmico
> 90 min
optar pela
operação
T = 33,5 oC Transfusão de CH > 4L;
> 90 min
– 35,5 oC e
ausência de
por mais que
CCD com a
BE < -5 – 12 mEq/L toracotomia de
70 min
presença de
emergência; ausência
1 ou 2 dos critérios
de lesão vascular
abdominal***
* p > 0,005
**perda sanguínea inicial > 40% e hemorragia ativa que, se não controlada cirurgicamente, será a causa de óbito do paciente
***fatores de risco independentes diretamente relacionados a sobrevivência do doentes
TP: tempo de protrombina; TTPa: tempo de trombloplastina parcial ativada; CCD: cirurgia de controle de danos; ISS: “injury severity score”; PAS: pressão arterial sistólica; CH: concentrado de hemácias
145
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
146
to, vale ressaltar que os autores contraindicam o uso após
três horas, devido a uma maior mortalidade secundária ao
sangramento (4,4% vs. 3,1%; RR 1,44, IC 1,12-1,84;
p=0.004)30. Autores, como Murthi et al., questionam esse
ensaio clínico como sendo controverso. Apesar disso, dados provenientes da experiência do exército britânico corroboram para o uso do ácido tranexâmico11.
Figura 1 -
Colocação de compressas para tamponamento hepático.
Os sangramentos hepáticos podem ser controlados por meio da digitoclasia, ligadura direta dos vasos e/ou
tamponamento com compressas. Essas devem ser postas
de maneira a criar vetores de força e não devem ser “empurradas” desordenadamente (Figura 1)17,26-28. Além disso,
são ineficazes para hemorragias provenientes de grandes
vasos. Nesses casos a sutura do parênquima deve ser realizada. Os balões hepáticos, confeccionados a partir de
sondas nasogástricas, drenos de Penrose, balão de
Sengstaken Blakemore ou até mesmo a sonda de Foley,
podem ser insuflados dentro do parênquima hepático em
casos de hemorragias mais vultuosas, que não cessam com
a digitoclasia.
Ressecções regradas e mais complexas devem
ser evitadas, e os sangramentos esplênicos e/ou renais também podem ser tratados com sutura do parênquima. Se
houver necessidade de um procedimento mais complexo,
a ressecção do órgão está indicada29.
Através de manobras de rotação visceral são
avaliadas as estruturas retroperitoneais à procura de possíveis hematomas perirrenais, retro-hepáticos e pélvicos, pois
estes não devem ser explorados, e sim tamponados e encaminhados para embolização angiográfica15.
A hemorragia causada pelas lesões de grandes
vasos possui muitas variáveis que devem ser observadas
para que o tratamento adequado ao paciente grave possa
ser feito: as lesões passíveis de correção com sutura simples devem ser prontamente tratadas; nas lesões complexas, um shunt ou uma ligadura estão indicados. Vale ressaltar que a ligadura da aorta, da artéria mesentérica superior e da ilíaca externa têm graves consequências e,
portanto, estão contraindicadas. Com exceção da veia cava
inferior cranial às artérias renais, todas as outras veias da
cavidade abdominal podem ser ligadas27,28.
Um estudo multicêntrico, randomizado e controlado, (CRASH-II), demonstrou resultados satisfatórios
relacionados ao ácido tranexâmico, um agente
antifibrinolítico. O uso precoce (d” uma hora pós trauma)
reduziu a taxa de mortalidade por exsanguinação (5,3%
vs. 7,7%; RR 0,68, 95% IC: 0,57–0,82; p<0,0001), assim
como, o uso entre a primeira e a terceira hora pós trauma
(4,8% vs. 6,1%; RR 0,79, IC 0,64-0,97; p=0.03). Entretan-
Controle de contaminação
A segunda meta é controlar os possíveis focos
de contaminação. O cirurgião deve inspecionar toda a extensão das alças intestinais, do ângulo de Treitz ao reto. A
correção das lesões deve ser feita com suturas simples, se
possível. Quando as lesões forem mais extensas, a
ressecção do segmento intestinal traumatizado pode ser
feita, e os cotos, distal e proximal, ligados. Pinças não traumáticas para alças ou fitas cardíacas também podem ser
utilizadas para ocluir as alças. Quando há múltiplas lesões
em um seguimento menor que 50% de todo o comprimento do intestino uma única ressecção pode ser realizada. As anastomoses ou estomas não devem ser feitos nesse instante1,2,5. As lesões ureterais também podem ser tratadas com shunts temporários1. Antes do término da operação, deve-se irrigar as cavidades abdominal e pélvica
com solução salina aquecida.
Como existe indicação absoluta de uma segunda operação, o fechamento da parede abdominal deve ser
feito de maneira temporária. Para isso diferentes técnicas
estão disponíveis: síntese com pinças de Backhaus, “Bolsa
de Bogotá”, campos plásticos estéreis adesivos ou curativos com aspiração por vácuo contínuo (Figura 2).
Recuperação na UTI
O objetivo dessa etapa é restaurar os parâmetros
fisiológicos do paciente dentro da unidade de terapia intensiva. A reposição volêmica, a correção da acidose, da
hipotermia e da coagulopatia são essenciais para a reani-
Figura 2 -
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Colocação do curativo à vácuo.
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
147
mação do doente grave para que possa ser submetido a
nova operação. Esse período pode levar de 24 a 48 horas.
Entretanto, não existe consenso absoluto quanto aos
parâmetros a serem atingidos. A tabela 3 mostra alguns
valores que podem servir como metas a serem atingidas.
Correção da acidose
A acidose desses pacientes resulta, na maioria
dos casos, da má perfusão tecidual sistêmica que interfere
diretamente no metabolismo aeróbico. Por sua vez, a
hipóxia é resultado de dois importantes fatores: a hipotermia
e a acentuada perda sanguínea. Portanto, a acidose irá se
autocorrigir a partir do momento que a oferta de oxigênio
for suficiente para a demanda e a temperatura adequada
for atingida2,5. O médico deve visar melhorar parâmetros
como concentração de hemoglobina, saturação de O2, pressão parcial de O2 e débito cardíaco. Isso deve ser feito
mediante uma reposição volêmica adequada juntamente
com o controle da hipotermia. O uso de bicarbonato nesses casos passa, então, para o segundo plano. Estudos preliminares têm mostrado resultados interessantes com o uso
tris(hidroximetil)aminometano, um aminoálcool capaz de
captar íons de hidrogênio e corrigir, em teoria, a acidose5,31.
O quadro clínico do paciente é muito importante
para avaliar as metas a serem atingidas. Entretanto, essa
avaliação fica prejudicada no doente grave pela resposta
neuroendócrina após o trauma, pois leva à retenção hídrica,
oligúria e taquicardia.
Hipotermia
O médico deve sempre tentar prevenir a
hipotermia, pois sua prevenção é mais fácil que sua correção. Para isso algumas medidas podem ser tomadas,
como rápida finalização da laparotomia, retirada de roupas úmidas, diminuição da exposição do paciente, aque-
Tabela 3 -
Metas a serem atingidas na UTI.
Pressão sistólica
Lactato sérico
Base excess
Hemoglobina
Hematócrito
Temperatura
Tempo de protombina
TTPa*
Plaquetas
Fibrinogênio
Cálcio sérico
Índice cardíaco
Saturação O2
FIO2"
Dosagem de inotrópicos
90mmHg
< 2,5mmol/l
> -4mmol/L
> 10 g/dL
> 30%
> 35°C
< 15s
< 35s
> 50.000/mm3
> 100mg/dL
>0,9mmol/L
> 3L/min/m2
> 95%
< 50%
Baixa
*Tempo de tromboplastina parcialmente ativada.
“ Frações inspiradas de oxigênio.
cimento do ambiente e de todos os fluídos antes da administração.
Uma vez instalada, a hipotermia deve ser prontamente corrigida, pois sua correção é um fator de extrema importância para o controle das demais alterações fisiológicas. Na tentativa de revertê-la, devem ser adotadas,
além das medidas já descritas, o emprego de: colchões
térmicos, sistemas de aquecimento pela circulação de ar
aquecido, irrigação de sondas gástricas e vesicais com solução salina aquecida a 39-40oC e/ou irrigação das cavidades torácica ou abdominal através de drenos de tórax ou
cateteres de diálise peritonial2,4,28.
Jaunoo et al. recomendam que a temperatura
do paciente deve ser maior que 37oC após quatro horas
de entrada na UTI2. Caso não haja resposta a estas medidas e a temperatura mantenha-se abaixo de 35oC,
deve-se pensar no uso de diversos drenos de tórax com
solução aquecida. O aquecimento arteriovenoso contínuo pode ser utilizado em temperaturas menores que
33oC.
Coagulopatia e reposição volêmica – “O
conceito da Damage Control Ressuscitation e da Hipotensão
Permissiva”
A correção da coagulopatia é um ponto central
para um melhor prognóstico desses pacientes graves. Por
sua vez, o ponto mais importante para a correção da
coagulopatia é o tratamento da hipotermia.
O médico deve ter em mente que o uso de
cristaloides nos pacientes em estado de hipocoagulabilidade
é extremamente limitado, pois uso de solução salina a 0,9%
e de Ringer Lactato aumenta a lesão por reperfusão, induz
adesão leucocitária e acarreta a hemodiluição13. A reposição de fatores de coagulação e plaquetas é, portanto, fundamental nesses cenários. Para a correção da coagulopatia
podem ser utilizados plasma fresco, concentrado de
plaquetas, fator recombinante VIIa, crioprecipitados, ácido
tranexâmico e/ou reposição de cálcio30,31.
Diferentemente de estratégias convencionais de
reposição volêmica, esses pacientes necessitam de volumosas transfusões, conhecidas como “protocolos de transfusão maciça” / “damage control ressuscitation”. Alguns
autores sugerem a administração na proporção 1:1:1 (concentrado de hemácias, plasma fresco e plaquetas) e a
regra dos 10 (dez unidades de cada em 24 horas)2,13. Os
protocolos de transfusão volumosa ganharam muita força
na última década, após as experiências militares no Iraque
e Afeganistão em 2004/200511. Um estudo retrospectivo
demonstrou queda de 47% na mortalidade em vítimas
de conflitos militares que receberam concentrado de
hemácias e plasma fresco na proporção 1:1 quando comparado com aqueles cuja reposição foi feita na proporção
de 1:831.
Há quem discorde desta conduta e recomende
que o uso de plaquetas deva ser restringido à utilização de
uma bolsa para cada quatro a seis concentrados de
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
148
hemácias, argumentando que a proporção 1:1:1 é muito
similar à administração de sangue total32. É importante também salientar que o uso de derivados de sangue pode ter
consequências desastrosas, devido as suas propriedades
inflamatórias e imunomodulatórias. A lesão pulmonar aguda
(TRALI- transfusion related acute lung injury) é a principal e
mais temida consequência33,34.
Além disso, todos os estudos recentes são retrospectivos e possuem vieses sobre a mortalidade. Cabe,
portanto, ao cirurgião do trauma, uma avaliação criterioso
sobre o tema, enquanto estudos prospectivos são realizados11.
No entanto, não restam dúvidas quanto à importância da ressuscitação no controle de danos (damage
control resuscitation), tendo como meta a euvolemia ou
até mesmo um certo grau de hipotensão, desde que associada à boa oxigenação periférica. O conceito de hipotensão
permissiva pode e deve ser utilizado, evitando-se o uso de
fluidos desnecessários e suas consequências, como a
hemodiluição e hipotermia. O cirurgião do trauma deve ter
em mente que o uso de derivados de sangue, associado à
noção da hipotensão permissiva é, provavelmente um
divisor de águas na cirurgia do trauma. No entanto, mais
estudos ainda são necessários para concluir qual a melhor
relação quantitativa entre concentrados de hemácias, plasmas frescos congelados e bolsas de plaquetas. Certamente, o antigo conceito de ressuscitação volêmica agressiva
com altos volumes de cristaloide, visando a parâmetros
suprafisiológicos, deve ser evitado35.
Devido ao alto custo do fator recombinante VIIa,
sua utilização ainda é questionada e estudos que avaliem
seu custo-benefício ainda são necessários. Os autores favoráveis à administração do fator recombinante VIIa recomendam o seu emprego em conjunto com as primeiras
bolsas de sangue e ao longo do tratamento conforme necessário13,32.
Outros procedimentos
Durante esse período é indicado a
antibioticoterapia profilática, a sedação para melhorar o
padrão respiratório e o controle da pressão intra-abdominal, trazendo mais conforto para o paciente. A fim de evitar a síndrome compartimental abdominal, deve-se aferir
a pressão da cavidade através da sonda vesical ou gástrica5. O diagnóstico é feito quando a pressão excede
20mmHg com evidências de disfunção orgânica3.
A arteriografia também pode ser considerada
para tratar focos hemorrágicos, que foram temporariamente
tamponados na operação inicial com compressas, nos casos de lesões hepáticas graves e/ou trauma de bacia36.
Outras medidas importantes de terapia intensiva
mantêm uma relação direta com menores taxas de
morbimortalidade e estão indicadas. A ventilação mecânica protetora com baixo volume corrente e um controle
glicêmico não muito restrito (< 180mg/dL) são clássicos
exemplos recentes disso37,38.
Reoperação Programada
Não há período mínimo ou máximo para o retorno do paciente ao centro cirúrgico. Alguns afirmam que
isso ocorre 36-48h após a admissão do paciente no hospital. Muito mais do que o tempo, são as condições fisiológicas que vão determinar se o paciente está apto para ser
submetido a uma nova operação.
A correção definitiva das lesões deverá ser realizada nesse momento. Após a umidificação com solução
salina aquecida, as compressas serão cuidadosamente retiradas para que não haja novos sangramentos. Os reparos
vasculares necessários devem ser realizados, as coleções,
retiradas, e, também, o desbridamento de tecidos
necrosados deve ser feito.
O trânsito intestinal deve, nesse instante, ser restaurado com as anastomoses necessárias. Houve, por algum tempo, um certo consenso sobre a realização de
anastomoses tardias após lesões extensas de cólon. Isso
evitava a criação de estomas em pacientes cuja anastomose
primária não era possível e, ao mesmo tempo, não aumentava o número de complicações39. A anastomose tardia dentro da reoperação programada era considerada
factível, caso não houvesse acidose grave, edema de parede intestinal e/ou infecção intra-abdominal40. Entretanto, um estudo retrospectivo trouxe novamente à tona essa
discussão. Weinberg et al. observaram um aumento significativo da incidência de complicações pós-operatórias nos
pacientes submetidos à ressecção e anastomose tardia em
relação aos pacientes submetidos à ressecção e colostomia
terminal tardia (12% vs. 3%, p< 0,05)41. Isso levanta, mais
uma vez, a dúvida e nos leva a pensar que a realização de
estomas pode ser a alternativa mais segura, apesar de ter
suas próprias complicações.
Fechamento da parede abdominal
O fechamento definitivo do abdome pode muitas vezes ser um grande desafio para os cirurgiões, especialmente se o intervalo entre os dois procedimentos for maior
que cinco dias. Durante esse período os músculos e suas
fáscias contraem lateralmente deixando um grande defeito na linha mediana, o que impossibilita o fechamento
convencional da parede abdominal. A sutura da aponeurose
sob tensão não deve ser realizada, pois, além de ineficaz,
pode predispor o paciente à síndrome compartimental abdominal3,5.
Se há uma dificuldade na síntese, algumas técnicas podem ser empregadas, como a utilização de telas
(absorvíveis ou não absorvíveis). Deve-se evitar ao máximo
o contato desses materiais (marlex, prolene) com as alças
intestinais, pois o risco de formação de fístulas
enterocutâneas pode chegar a 25%3.
Para evitar o aparecimento de grandes hérnias
ventrais e o risco de fístulas, algumas novas técnicas vêm
sendo utilizadas, como o curativo com aspiração contínua
por vácuo e o dispositivo Wittmann Patch®, citados por
Kushimoto et al.3. Apesar de facilitarem a aproximação
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
149
das bordas, esses são equipamentos caros e ainda pouco
utilizados (Figuras 2 e 3)42. Outra opção é a secção da bainha anterior dos músculos reto abdominais com a rotação
de um retalho medialmente, protegendo, assim, as alças
intestinais3 (Figura 4).
Novas perspectivas
O conceito de cirurgia abreviada vem se estendendo fora do cenário de trauma abdominal. Uma revisão
publicada em 2006, discute as possibilidades do emprego
do controle de danos em traumas torácicos. Essa abordagem segue o mesmo princípio de corrigir de maneira temporária as lesões e também busca técnicas mais simples e
rápidas para repará-las6. Um relato de série de casos demonstrou que a toracotomia abreviada em pacientes gravemente traumatizados pode reduzir a mortalidade43.
Já se discute se a cirurgia para controle de danos
pode melhorar a sobrevida de pacientes cirúrgicos gravemente enfermos com instabilidade hemodinâmica decorrente de sepse grave, de hemorragia volumosa, de isquemia
mesentérica aguda ou de infecções necrotizantes. Esses
possíveis fatores em conjunto com a necessidade de irrigações peritoneais repetidas, a fim de erradicar focos infecciosos, e a necessidade de reavaliar suturas e anastomoses
podem ser eventuais indicações para a cirurgia de controle
de danos em casos de emergência não decorrente de trauma4.
Um estudo retrospectivo baseado nos scores
APACHE II e POSSUM, com 16 pacientes, demonstrou uma
queda na mortalidade de pacientes com hemorragia
intraoperatória, isquemia mesentérica, sepse e pancreatite
necrotizante que foram submetidos a laparotomia abreviada7.
Figura 3 -
Representação esquemática do curativo a vácuo com
tela para fechamento da parede abdominal. (2. Curativo a vácuo com esponja de poliuretano colocada
entre a fáscia e o tecido subcutâneo. 3. Tela sintética
com formação de tecido de granulação) – Imagem
original em Dietz UA et al. 201242.
Figura 4 -
Fechamento da parede abdominal com a rotação
medial da bainha anterior dos músculos reto abdominal (Modificado de Kushimoto et al.3).
Considerações Finais
A aplicação da cirurgia de controle de danos já
é rotina no manejo do abdome de pacientes gravemente
traumatizados. Apesar de não existirem estudos
multicêntricos prospectivos randomizados controlados, essa
abordagem é aceita e reconhecida por cirurgiões especialistas na área. A experiência clínica, até o presente momento, já demonstrou que quando feita de maneira correta e, mais importante, quando bem indicada, reduz a mortalidade em pacientes com traumas1,5. Por ser uma área
dentro da cirurgia relativamente nova e pouco explorada,
é muito provável que novas técnicas e abordagens apareçam nos próximos anos e aumentem a sobrevida desses
pacientes.
Agradecimentos
À Gabriel Berta, pela confecção das ilustrações
inseridas nesse trabalho.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
150
A B S T R A C T
The damage control surgery is a widely accepted concept today among abdominal trauma specialists when it comes to the severely
traumatized. In these patients, the death is due, in most cases, to the installation of the lethal triad (hypothermia, coagulopathy and
acidosis) and not the inability to repair the serious initial damage. In this review, the authors address the lethal triad in its three phases
and emphasize the measures taken to prevent them, as well as discussing the indication and employment of damage control surgery
in its various stages. Restoring the physiological status of the patient in the ICU, so that he/she can be submitted to final operation and
closure of the abdominal cavity, another challenge in severe trauma patients, is also discussed.
Key words: Patients. Wounds and injuries. Therapy. Operative surgical procedures. Control.
REFERÊNCIAS
1. Germanos S, Gourgiotis S, Villias C, Bertucci M, Dimopoulos N,
Salemis N. Damage control surgery in the abdomen: an approach
for the management of severe injured patients. Int J Surg.
2008;6(3):246-52.
2. Jaunoo SS, Harji DP. Damage control surgery. Int J Surg.
2009;7(2):110-3.
3. Kushimoto S, Miyauchi M, Yokota H, Kawai M. Damage control
surgery and open abdominal management: recent advances and
our approach. J Nippon Med Sch. 2009;76(6):280-90.
4. Jansen JO, Loudon MA. Damage control surgery in a non-trauma
setting. Br J Surg. 2007;94(7):789-90.
5. Parreira JG, Soldá S, Rasslan S. Controle de danos: uma opção
tática no tratamento dos traumatizados com hemorragia grave.
Arq gastroenterol. 2002;39(3):188-97.
6. Phelan HA, Patterson SG, Hassan MO, Gonzalez RP, Rodning CB.
Thoracic damage-control operation: principles, techniques, and
definitive repair. J Am Coll Surg. 2006;203(6):933-41.
7. Stawicki SP, Brooks A, Bilski T, Scaff D, Gupta R, Schwab CW, et
al. The concept of damage control: extending the paradigm to
emergency general surgery. Injury. 2008;39(1):93-101.
8. Stone HH, Strom PR, Mullins RJ. Management of the major
coagulopathy with onset during laparotomy. Ann Surg.
1983;197(5):532-5.
9. Rotondo MF, Schwab CW, McGonigal MD, Phillips GR 3rd,
Fruchterman TM, Kauder DR, et al. ‘Damage control’: an approach
for improved survival in exsanguinating penetrating abdominal
injury. J Trauma. 1993;35(3):375-82; discussion 382-3.
10. Burch JM, Ortiz VB, Richardson RJ, Martin RR, Mattox KL, Jordan
GL Jr. Abbreviated laparotomy and planned reoperation for
critically injured patients. Ann Surg. 1992;215(5):476-83; discussion
483-4.
11. Murthi SB, Stansbury LG, Dutton RP, Edelman BB, Scalea TM,
Hess JR. Transfusion medicine in trauma patients: an update. Expert
Rev Hematol. 2011;4(5):527-37.
12. Kairinos N, Hayes PM, Nicol AJ, Kahn D. Avoiding futile damage
control laparotomy. Injury. 2010;41(1):64-8.
13. Holcomb JB. Damage control resuscitation. J Trauma.
2007;62(6Suppl):S36-7.
14. Moore EE, Burch JM, Franciose RJ, Offner PJ, Biffl WL. Staged
physiologic restoration and damage control surgery. World J Surg.
1998;22(12):1184-90; discussion 1190-1.
15. Matsumoto H, Mashiko K, Sakamoto Y, Kutsukata N, Hara Y,
Yokota H. A new look at criteria for damage control surgery. J
Nippon Med Sch. 2010;77(1):13-20.
16. Rotondo MF, Zonies DH. The damage control sequence and
underlying logic. Surg Clin North Am. 1997;77(4):761-77.
17. Lima RAC, Rocco PRM. Cirurgia para controle do dano. Rev Col
Bras Cir. 2007;34(4):257-63.
18. Asensio JA, McDuffie L, Petrone P, Roldán G, Forno W, Gambaro
E, et al. Reliable variables in the exsanguinated patient which
indicate damage control and predict outcome. Am J Surg.
2001;182(6):743-51.
19. Parreira JG, Soldá SC, Rasslan S. Análise dos indicadores de hemorragia letal em vítimas de trauma penetrante de tronco admitidas em choque: um método objetivo para selecionar os candidatos ao controle de danos. Rev Col Bras Cir. 2002;29(5):256-66.
20. Higa G, Friese R, O’Keeffe T, Wynne J, Bowlby P, Ziemba M, et al.
Damage control laparotomy: a vital tool once overused. J Trauma.
2010;69(1):53-9.
21. Cosgriff N, Moore EE, Sauaia A, Kenny-Moynihan M, Burch JM,
Galloway B. Predicting life-threatening coagulopathy in the
massively transfused trauma patient: hypothermia and acidoses
revisited. J Trauma. 1997;42(5):857-61; discussion 861-2.
22. Cushman JG, Feliciano DV, Renz BM, Ingram WL, Ansley JD, Clark
WS, et al. Iliac vessel injury: operative physiology related to
outcome. J Trauma. 1997;42(6):1033-40.
23. Garrison JR, Richardson JD, Hilakos AS, Spain DA, Wilson MA,
Miller FB, et al. Predicting the need to pack early for severe intraabdominal hemorrhage. J Trauma. 1996;40(6):923-7; discussion
927-9.
24. Krishna G, Sleigh JW, Rahman H. Physiological predictors of death
in exsanguinating trauma patients undergoing conventional trauma surgery. Aust N Z J Surg. 1998;68(12):826-9.
25. Stalhschmidt CMM, Formighieri B, Lubachevski FL. Controle de
danos no trauma abdominal e lesões associadas: experiência de
cinco anos em um serviço de emergência. Rev Col Bras Cir.
2002;33(4):215-9.
26. Fávero SS, Corsi PR, Coimbra RS, Rasslan S. Treatment of
transfixing hepatic lesions with a hidrostatic balloon. Sao Paulo
Med J. 1994;112(4):629-34.
27. Feliciano D, Moore EE, Mattox KL. Trauma. 3 a ed. Stanford:
Appleton Lange; 1996. Damage control and alternative wound
closures in abdominal trauma; p.717-31.
28. Feliciano D, Moore EE, Mattox KL. Trauma. 4 a ed. New York:
McGraw-Hill; 2000. Damage control and alternative wound
closures in abdominal trauma; p.907-32.
29. Pachter HL, Spencer FC, Hofstetter SR, Liang HG, Coppa GF.
Significant trends in the treatment of hepatic trauma. Experience
with 411 injuries. Ann Surg. 1992;215(5):492-500; discussion 5002.
30. CRASH-2 collaborators, Roberts I, Shakur H, Afolabi A, Brohi K,
Coats T, et al. The importance of early treatment with tranexamic
acid in bleeding trauma patients: an exploratory analysis of the
CRASH-2
randomised
controlled
trial.
Lancet.
2011;377(9771):1096–101.e1-2.
31. Borgman MA, Spinella PC, Perkins JG, Grathwohl KW, Repine T,
Beekley AC, et al. The ratio of blood products transfused affects
mortality in patients receiving massive transfusions at a combat
support hospital. J Trauma. 2007;63(4):805-13.
32. Jansen JO, Thomas R, Loudon MA, Brooks A. Damage control
resuscitation for patients with major trauma. BMJ. 2009;338:b1778.
33. Fabron Júnior A, Lopes LB, Bordin JO. Lesão pulmonar aguda associada à transfusão. J bras pneumol. 2007;33(2):206-12.
34. Hannon T. Trauma blood management: avoiding the collateral
damage of trauma resuscitation protocols. Hematology Am Soc
Hematol Educ Program. 2010;2010:463-4.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Edelmuth
Cirurgia para controle de danos: estado atual
151
35. Waibel BH, Rotondo MF. Damage control surgery: it’s evolution
over the last 20 years. Rev Col Bras Cir. 2012;39(4):314-21.
36. Asensio JA, Demetriades D, Chahwan S, Gomez H, Hanpeter D,
Velmahos G, et al. Approach to the complex hepatic injuries. J
Trauma. 2000;48(1):66-9.
37. NICE-SUGAR Study Investigators, Finfer S, Chittock DR, Su SY,
Blair D, Foster D, et al. Intensive versus conventional glucose control
in critically ill patients. N Engl J Med. 2009;360(13):1283-97.
38. Ventilation with lower tidal volumes as compared with traditional
tidal volumes for acute lung injury and the acute respiratory distress
syndrome. The Acute Respiratory Distress Syndrome Network. N
Engl J Med. 2000;342(18):1301-8.
39. Miller PR, Chang MC, Hoth JJ, Holmes JH 4th, Meredith JW. Colonic
resection in the setting of damage control laparotomy: is delayed
anastomosis safe? Am Surg. 2007;73(6):606-9; discussion 609-10.
40. Ordoñez CA, Pino LF, Badiel M, Sánchez AI, Loaiza J, Ballestas L, et
al. Safety of performing a delayed anastomosis during
damage control laparotomy in patients with destructive colon
injuries. J Trauma. 2011;71(6):1512-7; discussion 1517-8.
41. Weinberg JA, Griffin RL, Vandromme MJ, Melton SM, George RL,
Reiff DA, et al. Management of colon wounds in the setting of
damage control laparotomy: a cautionary tale. J Trauma.
2009;67(5):929-35.
42. Dietz UA, Wichelmann C, Wunder C, kauczok J, Spor L, Strauâ A,
et al. Early repair of open abdomen with a tailored two-component
mesh and conditioning vacuum packing: a safe alternative to the
planned giant ventral hernia. Hernia. 2012;16(4):451-60.
43. Vargo DJ, Battistella FD. Abbreviated thoracotomy and temporary
chest closure: an application of damage control after thoracic
trauma. Arch Surg. 2001;136(1):21-4.
Recebido em 08/03/2012
Aceito para publicação em 15/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma
Como citar este artigo:
Edelmuth RCL, Buscariolli YS, Ribeiro Júnior MAF. Cirurgia para controle de danos: estado atual. Rev Col Bras Cir. [periódico na Internet]
2013;40(2). Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Rodrigo Camargo Leão Edelmuth
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 142-151
Purim
Avaliação de treinamento cirúrgico na graduação de
medicina
Ensino
152
Avaliação de treinamento cirúrgico na graduação de medicina
Evaluation of surgical training in medical school
KÁTIA SHEYLLA MALTA PURIM1; LAILA DJENSA SOUZA DOS SANTOS2; GABRIEL TREML MURARA3; ELIANE MARA CESÁRIO PEREIRA MALUF4;
JULIO WILSON FERNANDES5; JAMES SKINOVSKY, TCBC-PR6
R E S U M O
Objetivo: Avaliar a efetividade de um treinamento de técnicas cirúrgicas em pata de porco durante a graduação em medicina.
Métodos: Estudo transversal com 87 acadêmicos de medicina voluntários, provenientes de diferentes períodos da graduação, que
participaram de uma oficina básica para realização de incisões, suturas, biópsias, retalhos, enxertos, sob supervisão direta. Foram
utilizados questionários autoaplicáveis pré e pós-treinamento. Resultados: O ensino de suturas, biópsias e correção de orelha
mostrou-se efetivo para o aprendizado de habilidades mínimas exigidas para as técnicas propostas (p<0,005), bem como, das
excisões e retalhos exercitados, à exceção do enxerto (p>0,97). Conclusão: A abordagem metodológica e o monitoramento de
reprodução das técnicas mostraram-se adequados. O treinamento oferecido complementou as habilidades cirúrgicas cutâneas dos
graduandos de medicina.
Descritores: Medicina. Ensino. Educação médica. Educação de graduação em medicina. Procedimentos cirúrgicos ambulatoriais.
INTRODUÇÃO
O
processo de ensino na medicina, principalmente nas
áreas cirúrgicas, ocorre pela observação do ato cirúrgico e pela participação direta do estudante, realizado,
entre outros métodos, através de tentativa e erro1,2. O interesse demonstrado pelo aluno pode abrir oportunidades de
aprendizado mais aprofundado, quando acompanha cirurgias e realiza atividades extracurriculares, aliado aos
ensinamentos tradicionais ministrados pelos cursos de Medicina. A qualidade destas experiências no campo da cirurgia pode influenciar a aquisição de habilidades técnicas3,4.
Desta forma, é fundamental a avaliação objetiva das técnicas operatórias visando detectar deficiências
que possam ser corrigidas e preparar o acadêmico para a
realização adequada dos procedimentos cirúrgicos básicos
requeridos na vida profissional5,6. Muitas estratégias pedagógicas têm sido desenvolvidas para suprir as necessidades do ensino da técnica operatória durante a graduação13
. O modelo com patas de porco é um dos mais utilizado
nos programas de residência médica em dermatologia nos
EUA para ensino prático das operações sobre a pele e anexos2. Eticamente aceito e reprodutível, este modelo simula
a pele humana com custo reduzido, e o estudante pode
ser avaliado quanto as suas habilidades ao final do treinamento1.
Diante do exposto, elaborou-se um estudo com
o objetivo de avaliar o treinamento cirúrgico em patas de
porco em um grupo heterogêneo de estudantes de Medicina.
MÉTODOS
O enfoque metodológico adotado foi transversal
com abordagem quantitativa. O trabalho de campo se
constituiu de uma oficina de cirurgia cutânea montada como
projeto de extensão e desenvolvida em patas de porcos
refrigeradas. O projeto foi submetido e aprovado pelo
Comitê de Ética da instituição (protocolo CEP –UP 165/
2009).
O público-alvo foi composto por estudantes maiores de 18 anos, regularmente matriculados no Curso de
Medicina, voluntários para este estudo. Ocorreram duas
oficinas cada uma delas formada com metade do grupo,
com divisão por afinidade, para melhor locação dos participantes e condições didáticas.
Como parte das estratégias de avaliação, utilizou-se de um instrumento de coleta de dados elaborado
em forma de questionário autoaplicável, respondido antes
e depois do treinamento, com roteiro estruturado composto por perguntas fechadas, para atender os principais pon-
Trabalho realizado no Curso de Medicina da Universidade Positivo.
1. Professora das Disciplinas de Dermatologia e Cirurgia Ambulatorial do Curso de Medicina da Universidade Positivo- Curitiba – PR-BR; 2.
Acadêmica 5º ano do Curso de Medicina da Universidade Positivo; 3. Acadêmico 6º ano do Curso de Medicina da Universidade Positivo; 4.
Professora da Disciplina de Saúde da Família do Curso de Medicina da Universidade Positivo- Curitiba – PR-BR; 5. Professor das Disciplinas de
Cirurgia Ambulatorial e Clínica Cirúrgica; 6. Professor das Disciplinas de Cirurgia Ambulatorial e Clínica Cirúrgica.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 152-156
Purim
Avaliação de treinamento cirúrgico na graduação de medicina
153
tos de interesse do treinamento. Os métodos utilizados em
cada oficina foram os mesmos: questionário, as mesmas
técnicas, professores, monitores, disponibilidade de material e roteiro de exercícios.
Os alunos foram previamente orientados
quanto ao aspecto operacional da oficina e preenchimento dos questionários, recebendo kits cirúrgicos individualizados contendo tesoura, pinça anatômica, pinça dente de rato, porta agulhas, cabo e lâminas de
bisturi, fios agulhados, luvas de procedimento e punch
(instrumento cirúrgico tipo saca-bocado constituído por
cabo e borda circular cortante). O roteiro dos exercícios práticos incluía biópsias, incisões, excisões, movimentos dos tecidos, retalhos, noções de enxertos, suturas e técnica de correção das chamadas “dog ears”
nas extremidades das excisões com inadequada relação largura/comprimento. No centro cirúrgico experimental os estudantes foram distribuídos em dez mesas cirúrgicas, formando pequenos grupos para realização das atividades. Cada exercício foi precedido de
explicação detalhada, bem como demonstração em
multimídia.
Todos os alunos foram diretamente supervisionados na execução de cada técnica e estimulados a esclarecer dúvidas com os monitores e professores. A proporção
de professores foi de um para cada 12 alunos e de monitores
foi de um para cada grupo de quatro ou cinco estudantes
que constituíram uma equipe fixa por mesa cirúrgica. Todos os instrutores conheciam o conteúdo e a metodologia
proposta, possuindo domínio sobre o programa de exercícios cirúrgicos aplicados. Ao final do treinamento ocorreu
nova avaliação.
Os dados obtidos foram codificados e as variáveis categóricas, apresentadas em percentuais foram analisadas pelo teste do qui quadrado. Considerou-se como
nível de significância estatística p < 0,05.
Tabela 1 -
RESULTADOS
Dos 87 estudantes de medicina que participaram do treinamento, 48 (55,2%) eram do sexo masculino
e 39 (44,8%) eram do sexo feminino. Destes acadêmicos,
53 (60,5%) apresentavam idade entre 20 e 23 anos, 66
(75,8%) estavam entre o 6º e o 9º período do curso de
medicina e 70 (80,5%) tinham interesse em área cirúrgica. As características dos participantes são mostradas na
tabela 1.
O treinamento das suturas propostas, exceto o
ponto de Donati contínuo e sutura intradérmica, foi efetivo para o aprendizado das técnicas ensinadas (p<0,005),
bem como a biópsia por punch (Figura 1), e a técnica de
correção das chamadas dog ears.
As excisões e retalhos também demonstraram
uma significativa apropriação da técnica básica apesar das
variações no gestual cirúrgico (Figura 2).
O ensino de enxertos não foi estatisticamente
significante para o aprendizado da técnica (p>0,97). Na
tabela 2 são exibidos os resultados referentes ao aprendizado deste treinamento.
DISCUSSÃO
Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais do
Curso de Graduação em Medicina do Ministério da Educação (MEC), o estudante deve saber realizar procedimentos
clínicos e cirúrgicos necessários para o atendimento
ambulatorial e de urgências e emergências. O curso de
graduação precisa utilizar metodologias que privilegiem a
coparticipação do aluno no processo educacional, inserindo-o precocemente em atividades práticas relevantes para
a vida médica7,8. Segundo estes preceitos, o modelo experimental de cirurgia cutânea em patas de porco pode ser
Características dos participantes do treinamento cirúrgico em pata de porco.
Características da amostra
Sexo
Idade ao realizar o curso
Período do curso de medicina
Interesse em área cirúrgica
Feminino
Masculino
Não respondeu
19 anos
20 aos 23 anos
24 aos 27 anos
> 28 anos
3o ao 5o
6o ao 9o
10o ao 12o
Não respondeu
Sim
Não
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 152-156
n
%
39
48
4
5
53
20
5
18
66
3
4
70
13
44,8
55,2
4,6
5,7
60,5
22,9
5,6
20,6
75,8
3,4
4,6
80,5
14,9
Purim
Avaliação de treinamento cirúrgico na graduação de medicina
154
Figura 1 -
Grupo de alunos treinando biópsia por punch.
utilizado pelas instituições de ensino, pois permite a avaliação do aluno de forma mais objetiva e o ajuda nas bases e
aquisição de habilidades3.
Neste trabalho, a metodologia teve uma ótima
receptividade por parte dos alunos e docentes por fornecer
uma boa noção dos procedimentos, e não contrariar as leis
vigentes que proíbem a utilização de animais para experimentos ou apresente riscos para os participantes. O planejamento didático manteve o desafio com a apropriação
e reconstrução do conhecimento de forma significativa e
consistente, e o compromisso com sua avaliação.
Tabela 2 -
Figura 2 -
Aluna canhota usando bisturi para realizar retalho
em pata de porco durante o treinamento cirúrgico.
Aprendizado das técnicas básicas ensinadas durante a oficina de cirurgia experimental.
Técnica cirúrgica
Habilidade prévia ao treinamento
Sim
Suturas
Suturas geral
Simples
Donati contínuo
Intradérmica
Retalhos
Geral
Avanço
V-Y
Rotação
Transposição
À distância
Excisão
Geral
Enxerto†
Geral
“DOG EARS” ‡
Geral
Habilidade pós-treinamento
Não
P
Não
Sim
n
%
n
%
n
%
n
%
72
72
15
48
82,8
82,5
17,2
55,2
15
15
72
39
17,2
17,2
82,8
44,8
87
86
16
56
100
98,9
18,4
64,4
0
1
71
31
0
1,1
81,6
35,6
< 0,001
< 0,001
0,84
0,22
23
10
18
7
4
1
26,5
11,5
20,7
8,0
4,6
1,1
64
77
69
80
83
86
73,5
88,5
79,3
92,0
95,4
98,9
86
83
75
82
79
12
98,9
95,4
86,2
94,3
90,8
13,8
1
4
12
5
8
75
1,4
4,6
13,8
5,7
9,2
86,2
<
<
<
<
<
25
28,7
62
71,3
78
88,5
9
11,5
< 0,001
2
2,5
79
97,5
4
5,0
77
95,0
0,97
14
16,3
72
83,7
80
93,2
6
6,8
< 0,001
† Foram excluídos os indivíduos que não responderam o pós-teste (seis perdas).
‡ Foram excluídos os indivíduos que não responderam o pós-teste (uma perda).
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 152-156
0,001
0,001
0,001
0,001
0,001
0,004
Purim
Avaliação de treinamento cirúrgico na graduação de medicina
155
A reprodução dos exercícios cirúrgicos durante o
treinamento foi acompanhada passo a passo permitindo
que a maioria das técnicas operatórias ministradas tivesse
aproveitamento considerável por parte dos estudantes, sendo estatisticamente embasados.
O fato de se trabalhar com alunos motivados em
um ambiente adequado ao ensino proporcionou um espaço de efetiva troca de experiências e aprendizagem. A
supervisão direta por professores e monitores facilitou a
qualidade das vivências cirúrgicas possibilitando correção
individualizada de técnicas erroneamente incorporadas e
aquisição de novas habilidades.
Procedimentos básicos como excisão em fuso,
biópsia por punch, sutura simples e correção de orelhas
foram corretamente assimilados, resultando em benefício
imediato ao estudante, conforme observado na tabela 2.
Alguns tipos suturas e de movimentação de tecidos careciam de conteúdos que ainda precisavam ser devidamente trabalhados durante a graduação. As técnicas que
não foram completamente dominadas por este grupo podem ser justificadas pelos seguintes fatores: 1) a amostra
era muito heterogênea 2) um quinto dos alunos situava-se
entre o 3º e o 5º período, motivo pelo qual ainda não
haviam cursado a disciplina de Técnica Operatória ou estivessem iniciando-a; 3) havia grande diferença entre os estudantes no manejo do material e na agilidade para execução e repetição dos exercícios; 4) a falta de uniformidade no tempo concedido aos acadêmicos e o grau de
interação com os instrutores; 5) as técnicas mais complexas, como retalhos e enxertos, requeriam maior visão espacial e conhecimento anatômico prévio. As dificuldades
encontradas apontaram para a necessidade de ajustes nos
programas das oficinas visando seu aperfeiçoamento.
A documentação fotográfica permitiu registrar
peculiaridades no manuseio do instrumental cirúrgico, especialmente pelos estudantes canhotos (Figura 2), como
também, daqueles provenientes dos períodos iniciais da
graduação. E serviu de base para repensar opções que
contribuam para uma melhor utilização deste treinamento, possibilitando rever desde aspectos da instrumentação
básica até avanços no processo de ensino-aprendizagemavaliação em cirurgia8. A filmagem da execução dos exercícios poderia, por exemplo, auxiliar na análise do gestual
cirúrgico, visando corrigir erros, estimular mudanças e aprimorar o desempenho principalmente para os que pretendem seguir a ciência e arte cirúrgica.
O delineamento de pesquisa adotado permitia a
intervenção do investigador na característica estudada, ou
seja, no treinamento, porém não permitia a alocação aleatória dos participantes, o que constituiu uma limitação
deste estudo. Isto pode ser modificado pelo redirecionamento
da amostra.
Esta oficina não é uma proposta pronta e acabada, mas aberta à medida que contribui de forma inovadora como um recurso pedagógico auxiliando professores e
alunos a articular a teoria com a prática. Diante das rápidas transformações tecnológicas, requer complementação
contínua dos conhecimentos, habilidades e atitudes com
alternativas que reproduzam inteiramente os aspectos e as
condições encontradas no ato cirúrgico realizado no ser
humano.
Embora restrito3, este treinamento experimental
reverte em ganhos diretos para o aluno, a universidade e a
população. Tem custo reduzido e respeito aos princípios
éticos, é seguro e de fácil reprodução. Pode ser enriquecido e diversificado com a integração de outros modelos e
ferramentas de ensino-aprendizagem em cirurgia, adaptados as necessidades especificas da graduação e até da
pós-graduação.
Não existem, atualmente, trabalhos na literatura que possibilitem uma comparação com o presente estudo. Porém, os resultados obtidos nos permitem inferir que
oficinas de técnica operatória cutânea, como a realizada,
tem um papel fundamental no treinamento prático, e merece mais atenção na formação do graduando de medicina e na avaliação das habilidades cirúrgicas.
A B S T R A C T
Methods: We
Objective: To evaluate the effectiveness of training in surgical techniques in pig feet during medical school. Methods
Objective
conducted a cross-sectional study with 87 volunteer medical students from different graduation semesters, who attended a basic
workshop for incisions, sutures, biopsies, flaps, grafts, under direct supervision. Pre and post-training self-administered questionnaires
Results: The teaching of sutures, biopsies and ear correction was effective for learning of the minimal skills required for
were used. Results
Conclusion: The methodological
the proposed techniques (p <0.005), as well as excisions and flaps, except grafting (p> 0 97). Conclusion
approach and monitoring of techniques’ reproduction were adequate. The training offered complemented cutaneous surgical skills
of undergraduate medicine students.
words: Medicine. Education. Medical education. Undergraduate medical education. Outpatient surgical procedures.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Puentes M, Fabián F. Docencia quirúrgica: ¿como enseñas es como
te ves? Arch Med. 2008;8(2):149-54.
2. Reichel JL, Peirson RP, Berg D. Teaching and evaluation of surgical
skills in dermatology results of a survey. Arch Dermatol.
2004;140(11):1365-9.
3. Purim KS. Oficina de cirurgia cutânea. Rev Col Bras Cir.
2010;37(4):303-5.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 152-156
Purim
Avaliação de treinamento cirúrgico na graduação de medicina
156
4. Wang TS, Schwartz JL, Karimipour DJ, Orringer JS, Hamilton T,
Jonhson TM. An education theory-based method to teach a
procedural skill. Arch Dermatol. 2004;140(11):1357-61.
5. Porte MC, Xeroulis G, Reznick RK, Dubrowski A. Verbal feedback
from an expert is more effective than self-accessed feedback
about motion efficiency in learning new surgical skills. Am J Surg.
2007;193(1):105-10.
6. Moorthy K, Munz Y, Sarker SK, Darzi A. Objective assessment of
technical skills in surgery. BMJ. 2003;327(7422):1032-7.
7. Brasil. Ministério da Educação. Resolução CNE/CES no 4, de 2001.
Brasília, 2001. Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina.
8. Peres CM, Andrade AS, Garcia SB. Atividades extracurriculares:
multiplicidade e diferenciação necessárias ao currículo. Rev Bras
educ med. 2007;31(3):203-11.
Recebido em 06/07/2012
Aceito para publicação em 10/08/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma.
Como citar este artigo:
Purim KSM, Santos LDS, Murara GT, Maluf EMCP, Fernandes JW,
Skinovsky J. Avaliação de treinamento cirúrgico na graduação de
medicina. Rev Col Bras Cir. [periódico na Internet] 2013;40(2). Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Kátia Sheylla Malta Purim
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 152-156
Portela
Linfadenectomia no câncer gástrico com hook laparotômico
157
Nota Técnica
Linfadenectomia no câncer gástrico com hook laparotômico
Lymphadenectomy in gastric cancer with laparotomic hook
ANDRÉ ROSSETTI PORTELA, ACBC-MG1; MÁRIO GISSONI DE CARVALHO2; JOSÉ DE ALENCAR GONÇALVES DE MACEDO3
R E S U M O
O câncer gástrico é uma neoplasia frequente e de tratamento cirúrgico. Gastrectomia com linfadenectomia D2 é o procedimento
padrão com intuito curativo. Os autores relatam o uso do hook laparotômico como alternativa técnica para linfadenectomia.
Descritores: Neoplasias. Neoplasias gástricas. Terapêutica. Procedimentos cirúrgicos operatórios. Excisão de linfonodo.
INTRODUÇÃO
A
pesar dos registros de redução da incidência do câncer gástrico (CG), este continua sendo o quarto tumor
mais frequente e a segunda causa de morte no mundo.
Nos últimos anos, cirurgiões japoneses realizaram grandes
esforços para melhorar os resultados do tratamento cirúrgico do CG e introduziram a idéia da linfadenectomia sistematizada por estações, o que resultou em melhor
estadiamento, melhora do prognóstico e sobrevida, embora estes resultados muitas vezes não sejam reproduzidos
no ocidente1-3. A dificuldade técnica, a falta de adestramento e a indisponibilidade de instrumental adequado são
as possíveis causas de insucesso da linfadenectomia do CG.
O escopo do trabalho é descrever uma alternativa técnica, para a execução da linfadenectomia, executada com sucesso em 18 pacientes com câncer gástrico na
Santa Casa de Belo Horizonte e Instituto Mário Penna/Hospital Luxemburgo – Belo Horizonte, MG, Brasil.
Aspectos Técnicos
O hook laparotômico (HL) é constituído de uma
haste metálica com ponta em L, sem superfície cortante,
recoberto por material isolante na haste. O calibre do HL
deve ser adaptado à caneta de cautério usada na instituição. Uma alternativa é a confecção de uma caneta de
cautério de uso permanente, autoclavável com um HL na
extremidade. O comprimento do HL deve variar com o tamanho e compleição física do paciente, devendo o cirurgião possuir, segundo opinião dos autores, um hook com
cinco, e outro com dez centímetros. (Figura 1)
A dissecção da cadeia D2 pode ser feita após a
ressecção do estômago, omento maior, lâmina intercólon
epiplóica e pancreática. No entanto é de preferência dos
autores a exérese em bloco, facilitado pela tração feita
pelo auxiliar dos elementos acima descritos. O cautério
monopolar deve estar no modo de coagulação, na intensidade de 20, para se evitar lesão das estruturas adjacentes.
A ressecção linfonodal deve seguir o modelo do uso do
hook na laparoscopia, “dissecar-coagular”, identificando
rigorosamente as estruturas vasculares. Os autores recomendam que seja feita a ligadura mecânica dos linfáticos
hepáticos, geralmente posicionados a esquerda da veia
porta. (Figuras 2 e 3).
Figura 1 –
A partir do cabo de bisturi: as duas primeiras hastes
são as pontas acopláveis ao cautério de cinco e dez
centímetros. As duas últimas são canetas com o HL já
acoplados.
Trabalho realizado no Instituto Mário Penna/Hospital Luxemburgo – Belo Horizonte/MG. Santa Casa de Belo Horizonte – MG.
1. Cirurgião do Instituto Mário Penna/Hospital Luxemburgo. Assistente da IIa Clínica Cirúrgica da Santa Casa de Belo Horizonte/MG; 2. Cirurgião
do Instituto Mário Penna/Hospital Luxemburgo – Belo Horizonte/MG; 3. Cirurgião Geral e do Aparelho Digestivo. Assistente da IIa Clínica Cirúrgica
da Santa Casa de Belo Horizonte/MG.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 157-159
Portela
Linfadenectomia no câncer gástrico com hook laparotômico
158
Figura 3 –
Figura 2 –
Dissecção com o hook laparotômico dos linfonodos da
artéria hepática (seta preta).
DISCUSSÃO
O tratamento cirúrgico o único recurso isolado
que pode levar à cura ou a uma maior sobrevida, por isso,
cabe ao cirurgião realizar com esmero este procedimento.
O prognóstico inicialmente está relacionado à penetração
da serosa e ao envolvimento linfonodal, porém será de
fundamental importância a ressecção completa do tumor
macro e microscopicamente (R0). O CG apresenta
envolvimento linfonodal relevante mesmo nos tumores precoces, sendo 3% a 5% nos restritos a mucosa e 16% a
25% nos limitados a submucosa. Diante de tal comportamento, nas últimas três décadas, a escola japonesa vem
realizando sistematicamente a linfadenectomia D2 como
procedimento padrão (linfonodos das artérias gástrica esquerda, hepática comum, esplênica, hepática própria, hilo
esplênico e tronco celíaco mais linfonodos das estações 1
a 6) por acreditar que ocorre um aumento na sobrevida,
além de melhor estadiamento e avaliação prognóstica1-3.
Coto duodenal fechado (seta preta grossa), pedículo
hepático dissecado (seta branca grossa) e tronco celíaco
com artéria gástrica esquerda ligada (seta preta fina).
A linfadenectomia D2 no CG não é isenta de
complicações. No entanto, a ausência de pinças
coaguladoras e selantes de vasos não pode impedir a realização da linfadenectomia adequada. A sugestão do uso
pelos autores do HL se deve ao baixo custo do instrumento, que pode ser fabricado por profissionais que fazem a
manutenção do instrumental cirúrgico, além de ser
autoclavável e poder ser usado diversas vezes. O adestramento prévio pela grande maioria dos cirurgiões com o
hook nas operações laparoscópicas facilita a realização da
linfadenectomia. Parece haver diminuição do tempo operatório em relação aos pacientes operados com instrumental convencional. A ligadura mecânica dos linfáticos mais
calibrosos, especialmente dos linfáticos à esquerda da veia
porta é estimulada pelos autores no intuito de se evitar a
ascite linfática, mesmo se tratando de evento raro4.
Nossa experiência permite concluir que o hook
laparoscópico pode ser empregado para realizar a
linfadenectomia D2 com segurança.
A B S T R A C T
Gastric cancer is a common malignancy of surgical treatment. D2 lymphadenectomy is the standard procedure with curative intent.
The authors report the use of laparotomic hook as an alternative technique for lymphadenectomy.
words: Neoplasms. Gastric neoplasms. Therapy. Operative surgical procedures. Lymph node excision.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Wang Z, Chen JQ, Cao YF. Systematic review of D2
lymphadenectomy versus D2 with para-aortic nodal dissection for
advanced gastric cancer. World J Gastroenterol 2010 March 7;
16(9): 1138-1149.
2. Iilias EJ, Malheiros CA, Kassab P, Castro OAP. Linfadenectomia no
adenocarcinoma gástrico. Rev Assoc Med Bras 2006; 52(4): 2704.
3. Dicken BJ, Bigam DL, Cass C, et.al. Gastric Adenocarcinoma. Review
and Considerations for Future Directions. Ann Surg 2005;241: 27–
39.
4. Tanaka K, Ohmori Y, Mohri Y, et al. Successful treatment of
refractory hepatic lymphorrhea after gastrectomy for early gastric
cancer, using surgical ligation and subsequent OK-432 (Picibanil)
sclerotherapy. Gastric Cancer 2004; 7: 117-121.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 157-159
Portela
Linfadenectomia no câncer gástrico com hook laparotômico
159
Endereço para correspondência:
André Rossetti Portela
E-mail: [email protected]
Recebido em 10/02/2012
Aceito para publicação em 15/03/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma
Como citar este artigo:
Portela AR, Carvalho MG, Macedo JAG. Linfadenectomia no câncer
gástrico com hook laparotômico. Rev Col Bras Cir. [periódico na Internet]
2013;40(2). Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 157-159
Resende
Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo
de radiofrequência
Nota
Técnica
160
Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo de
radiofrequência
Laparoscopic hepatectomy with radiofrequency device
VIVIAN RESENDE, TCBC-MG1; CRISTIANO XAVIER LIMA2; MÁRIO MARCOS LUSCKAL3; MILTON CARLOS AGUIAR JUNIOR4; EMANUELE GAMMERI5;
NAGY ADLEY HABIB6; JOSÉ RENAN DA CUNHA-MELO7
R E S U M O
As ressecções hepáticas laparoscópicas vêm ganhando adeptos entre cirurgiões pois evidenciam recuperação rápida, menor
permanência hospitalar e melhor resultado estético. A utilização do dispositivo laparoscópico de radiofreqüência foi pela primeira vez
utilizada, com sucesso, no Brasil, para a ressecção de carcinoma hepatocelular no segmento VI, em dois pacientes cirróticos. Apesar
do sangramento intraoperatório continuar sendo um grande desafio para o cirurgião durante ressecções hepáticas laparoscópicas,
em ambos os casos, a exclusão vascular hepática foi dispensável e não houve necessidade de hemotransfusão. Os pacientes
receberam alta hospitalar no quarto dia pós-operatório.
Descritores: Cirrose hepática. Carcinoma hepatocelular. Hepatectomia. Cirurgia videoassistida. Dispositivo de identificação por
radiofrequência.
INTRODUÇÃO
O
DESCRIÇÃO TÉCNICA
sangramento intraoperatório durante ressecções
hepáticas continua a ser grande desafio para o cirurgião. Aparelhos, como dissector ultrassônico (CUSA), bisturi harmônico, pinça bipolar e radiofreqüência, são atualmente disponíveis para ajudar na secção do parênquima
hepático. A manobra de Pringle é algumas vezes utilizada
como medida para diminuir o sangramento.
As ressecções hepáticas laparoscópicas vem ganhando adeptos entre cirurgiões pois evidenciam uma rápida recuperação pós operatória, menor permanência
hospitalar, além de melhor resultado estético1,2. O controle
intraoperatório do sangramento durante procedimento
laparoscópico pode ser muito difícil e algumas vezes resulta em conversão para cirurgia aberta. Desde a descrição
inicial de ressecção hepática laparoscópica utilizando
radiofreqüência um novo dispositivo para uso laparoscópico
tem sido desenvolvido e utilizado 1,3,4.
O objetivo da presente nota é descrever a técnica para ressecção hepática laparoscópica utilizando-se, pela
primeira vez no Brasil, o dispositivo de radiofreqüência, em
pacientes cirróticos portadores de carcinoma hepatocelular.
Foram dois pacientes admitidos no Grupo de Fígado do Instituto Alfa de Gastroenterologia da Universidade Federal de Minas Gerais. O Primeiro deles do sexo feminino, 69 anos, portadora de cirrose pós viral C e
colecistolitíase. O segundo, masculino, 63 anos, com cirrose pós-viral B. Ambos eram Child Pugh A, sem sinais de
hipertensão porta significativos e sem critérios para o transplante hepático. Apresentavam lesão no segmento VI do
fígado que media 7cmx5cm e 5cmx4cm, respectivamente. Em ambos, a tomografia de abdome com contraste
endovenoso e a ressonância nuclear magnética foram compatíveis com carcinoma hepatocelular (Figuras 1a e 1b). A
dosagem sérica de alfafetoproteina estava normal. Um
deles tinha comorbidade (bócio mergulhante que atingia a
bifurcação da traquéia).
Realizou-se ressecção laparoscópica utilizandose o dispositivo laparoscópico, que é formado por um arranjo de quatro agulhas dispostas de forma retangular e
que utilizam a energia de radiofreqüência 1,3. Após anestesia
geral o paciente foi colocado em decúbito lateral esquerdo. Realizou-se punção e pneumoperitônio que foi manti-
Trabalho realizado no Instituto Alfa de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais-MG-BR.
1. Professora Adjunta do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); 2. Professor Adjunto do Departamento
de Cirurgia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); 3.: Médico Residente (R4) em Cirurgia do Aparelho Digestivo do Instituto Alfa de
Gastroenterologia (IAG) do Hospital das Clínicas da UFMG; 4. Médico Residente (R4) em Cirurgia do Aparelho Digestivo do Instituto Alfa de
Gastroenterologia (IAG) do Hospital das Clínicas da UFMG; 5. Médico Residente da Universidade de Messina (Sicília); 6. Chefe do Serviço de
Cirurgia Hepatobiliopancreática do Hospital Hammersmith, Imperial College of London; 7. Professor. Titular do Departamento de Cirurgia da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 160-163
Resende
Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo de radiofrequência
Figura 1 -
161
Imagens de carcinoma hepatocelular no segmento VI do fígado (setas), em dois pacientes submetidos à ressecção laparoscópica.
1a: ressonância magnética do abdome (corte frontal); 1b: angiotomografia de abdome (corte transversal).
do com CO2 numa pressão de 12mmHg. Foram colocados
três portais de 10mm e dois de 5mm.
Após secção do ligamento hepatorrenal, demarcou-se com o eletrocautério, uma linha na superfície superior e inferior do fígado delimitando-se a área do segmento
VI a ser ressecada (Figura 2a). Aplicou-se o dispositivo, perpendicularmente, ao longo desta linha em ambas as superfícies marcadas (Figuras 2a e 2b). Realizou-se uma segunda linha de ablação no parênquima, correspondente
ao lado da lesão, que levou à completa isquemia do segmento VI. Em seguida, o dispositivo foi, sucessivamente,
aplicado paralelamente às linhas de ablação perpendicular (Figura 2c), à medida que o parênquima isquêmico foi
seccionado com tesoura laparoscópica (Figura 2d). Ao término do procedimento, a área de secção do parênquima
ficou completamente regular, sem extravazamento de bile
ou sangue (Figura 2e). Colocou-se dreno tubular pelo orifício de um dos portais laterais (Figura 2f).
Durante todo o procedimento, não houve necessidade de exclusão vascular hepática. Colecistectomia
foi realizada em um dos pacientes. A peça cirúrgica foi
colocada em bolsa plástica e retirada através do portal
umbilical, que teve a sua incisão ampliada.
A duração do procedimento cirúrgico foi em
média 120 minutos. A perda sanguínea média foi de 50 ml
nos dois pacientes. Nenhum deles necessitou de
hemotransfusão.
Ambos evoluíram sem complicações e receberam alta hospitalar no quarto dia pós-operatório. O exame
anatomopatológico mostrou carcinoma hepatocelular bem
diferenciado, com invasão vascular e margens cirúrgicas
livres.
DISCUSSÃO
Recomenda-se uma cuidadosa seleção dos pacientes candidatos à ressecção laparoscópica do fígado.
Apesar de resseções maiores já terem sido descritas por
laparoscopia5, esta técnica é idealmente considerada para
ressecção de tumores menores localizados perifericamente em segmentos inferiores ou laterais do fígado. Tumores
grandes localizados profundamente ou próximos à bifurcação porta ou, ainda, nos segmentos posteriores não são
usualmente selecionados para ressecção laparoscópica 1,2,4.
O dispositivo laparoscópico “Habib Sealer 4X” (
LHS, Angiodynamics, Queensbury, NY), mede 45cm de
comprimento com uma parte isolada que permite a aplicação de radiofreqüência numa extensão de 5cm. Um botão
de controle no cabo permite ao cirurgião escolher a profundidade da ablação. O aparelho pode ser introduzido
através de portal de 10mm 1,3.
Algumas vantagens da ressecção laparoscópica
incluem menor dor pós-operatória, mobilização precoce e
menor permanência hospitalar 1-5. No presente relato os
dois pacientes receberam alta hospitalar no quarto dia pósoperatório.
Recomenda-se a realização de ultrassom
laparoscópico intra-operatório para a demarcação da margem cirúrgica1,4, porém, este aparelho ainda é indisponível
em nossa Instituição. Entretanto, a identificação
macroscópica do tumor na superfície do segmento VI permitiu a delimitação da linha de secção com segurança. O
exame anatomopatológico da peça cirúrgica confirmou a
inexistência de neoplasia no tecido hepático adjacente à
linha de coagulação (margem cirúrgica de 2cm). Uma van-
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 160-163
Resende
Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo de radiofrequência
162
Figura 2 -
2a: demarcação da linha de
Imagens de hepatectomia laparoscópica do segmento VI para tratamento de carcinoma hepatocelular. 2a
2b: segunda linha de ablação vista pela face visceral do
ressecção e aplicação perpendicular do dispositivo (primeira linha de ablação); 2b
2d: secção do parênquima hepático
2c: ablação paralela à linha de secção, observar a coloração isquêmica do segmento VI. 2d
fígado. 2c
2f: posição dos trocartes e dreno (seta).
2e: aspecto final da superfície de ressecção; 2f
com tesoura laparoscópica; 2e
tagem da ressecção hepática laparoscópica por meio de
radiofreqüência é que, além da margem alcançada na
peça cirúrgica, esta se estende à superfície de ressecção
que sofre ablação 1,3,4.
Dificuldades técnicas ou sangramento intra-operatório são motivos frequentes de conversão para cirurgia aberta 2-4. Com o dispositivo laparoscópico por radiofreqüência a
perda sanguínea intra-operatória foi mínima o que tornou a
cirurgia facilmente exequível e rápida. O procedimento, entretanto, deve ser realizado por equipe com experiência em
cirurgia hepatobiliopancreática e videolaparoscópica, para
dimimuir morbidade e mortalidade 6.
A seleção apropriada dos pacientes e técnica
cirúrgica refinada foram primordiais para o sucesso da
ressecção hepática laparoscópica, utilizando-se o dispositivo de radiofrequência.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 160-163
Resende
Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo de radiofrequência
163
A B S T R A C T
Laparoscopic liver resections are gaining adherents among surgeons, as they show rapid recovery, shorter hospital stay and better
cosmetic results. The use of a laparoscopic radiofrequency device was first carried out successfully in Brazil for resection of
hepatocellular carcinoma of the segment VI in two cirrhotic patients. Although intraoperative bleeding remains a major challenge for
the surgeon during laparoscopic liver resections, in both cases the hepatic vascular exclusion was expendable and there was no need
for blood transfusion. Patients were discharged on the fourth postoperative day.
words: Cirrhosis. Hepatocellular carcinoma. Hepatectomy. Video-assisted surgery. Radio frequency identification device.
Key words
REFERÊNCIAS
1. Jiao LR, Ayav A, Navarra G, Sommerville C, Pai M, Damrah O, et al.
Laparoscopic liver resection assisted by the laparoscopic Habib
sealer. Surgery. 2008;144(5):770-4.
2. Bryant R, Laurent A, Tayar C, Cherqui D. Laparoscopic liver
resection-understanding its role in current practice: the Henri
Mondor Hospital experience. Ann Surg. 2009;250(1):103-11.
3. Pai M, Navarra G Ayav A, Sommerville C, Khorsandi SK, Damrah
O, et al. Laparoscopic Habib 4X: a bipolar radiofrequency device
for bloodless laparoscopic liver resection. HPB. 2008;10(4):261-4.
4. Bachellier P, Ayav A, Pai M, Weber JC, Rosso E, Jaeck D, et al.
Laparascopic liver resection assisted with radiofrequency. Am J
Surg. 2007;193(4):427-30.
5. Machado MAC, Makdissi FF, Surjan RCT, Oliveira AC, Pilla VF,
Teixeira AR. Trisegmentectomia hepática direita por
videolaparoscopia. Rev Col Bras Cir. 2008;35(5):338-41.
6. Resende V, Rezende-Neto JB, Fernandes JS, Cunha-Melo JR. Avaliação da morbidade e da mortalidade após ressecções hepáticas.
Rev Col Bras Cir. 2011;38(5):323-6.
Recebido em 15/03/2012
Aceito para publicação em 10/04/2012
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma.
Como citar este artigo:
Resende V, Lima CX, Lusckal MM, Aguiar Júnior MC, Gammeri E,
Habib NA, Cunha-Melo JR. Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo de radiofrequência. Rev Col Bras Cir. [periódico na Internet]
2013;40(2). Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Vivian Resende
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 160-163
Campos
Classificação de gravidade na pancreatite
T B E - Caguda
ITE
164
Classificação de gravidade na pancreatite aguda
Classification of severity of acute pancreatitis
TERCIO DE CAMPOS, TCBC-SP1; JOSÉ GUSTAVO PARREIRA, TCBC-SP2; JOSÉ CESAR ASSEF, TCBC-SP3; SANDRO RIZOLI4;
BARTO NASCIMENTO5; GUSTAVO PEREIRA FRAGA, TCBC-SP6
R E S U M O
De acordo com a Classificação de Atlanta a pancreatite aguda pode ser dividida, baseado em sua severidade, em uma forma leve
ou grave. Uma série de aspectos têm sido discutidos nos últimos anos, tais como, quantas categorias de gravidade devem ser
consideradas; se o doente com falência orgânica é igual ao doente com necrose infectada; qual o papel da falência orgânica
transitória; e como avaliar a falência orgânica. A reunião de revista “Telemedicina Baseada em Evidência - Cirurgia do Trauma e
Emergência” (TBE-CiTE) realizou uma avaliação crítica de artigos relacionados a este tema, considerando três artigos recentes que
delinearam duas grandes revisões publicadas nos últimos meses. Estes artigos sugerem a classificação de gravidade em três ou quatro
categorias, ao invés de pancreatite aguda leve ou grave, além de discutir qual o melhor escore para avaliar a falência orgânica. As
seguintes recomendações foram propostas: (1) A pancreatite aguda deve ser classificada em quatro categorias: leve, moderada,
grave e crítica, o que permite uma melhor determinação das características dos doentes; (2) Avaliação de falência orgânica com um
escore de gravidade, preferencialmente algum que avalie diretamente cada falência orgânica, tais como o SOFA e o MODS
(Marshall). O SOFA parece ter maior acurácia, mas o MODS tem melhor aplicabilidade devido à facilidade de uso.
Descritores: Pancreatite. Pancreatite/classificação. Pancreatite necrosante aguda. Doença aguda. Índice de gravidade de
doença.
INTRODUÇÃO
S
egundo a Classificação de Atlanta que está completando
20 anos de sua publicação, a pancreatite aguda pode
ser classificada em leve ou grave1. Entretanto, uma série
de aspectos têm sido discutidos nos últimos anos, tais como:
quantas categorias de gravidade devem ser consideradas;
se toda pancreatite grave segundo Atlanta é igualmente
severa; se o doente com falência orgânica é igual ao doente com necrose infectada; qual o papel da falência orgânica transitória; e como avaliar a falência orgânica. Recentemente, dois artigos de impacto foram publicados a
respeito das categorias de gravidade, sendo um deles a
proposta da revisão da classificação de Atlanta2,3.
O Clube de Revista “Telemedicina Baseada em
Evidência - Cirurgia do Trauma e Emergência” (TBE-CiTE)
realizou uma revisão de artigos de relevância a respeito da
gravidade na pancreatite aguda e a respeito da revisão da
classificação de Atlanta. Três artigos foram selecionados
com o objetivo de responder duas perguntas: quantas categorias de gravidade devem ser utilizadas e como avaliar
a falência orgânica4-6.
O primeiro artigo discute a necessidade de inclusão do termo pancreatite aguda moderadamente grave4.
O segundo artigo discute a necessidadde de incluir quatro
categorias de gravidade, incluindo o termo pancreatite
aguda crítica5. O terceiro artigo discute maneiras de avaliar adequadamente a falência orgânica6. A partir dessas
recentes publicações foi possível gerar recomendações a
respeito do tema baseadas nessas evidências.
ESTUDO 1
“Baixa mortalidade e alta morbidade na
pancreatite aguda grave sem falência orgânica: um ponto
Reunião de Revista TBE - CiTE em 5 de março de 2013, com a participação dos serviços: Serviço de Emergência da Irmandade da Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil; Programa de Trauma do Departamento de Cirurgia do Hospital Sunnybrook Health Sciences
Centre da Universidade de Toronto, Toronto, Canadá; Disciplina de Cirurgia do Trauma do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências
Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, SP, Brasil; Disciplina de Cirurgia de Urgência e Trauma do Departamento
de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil.
1. FACS. Professor Adjunto da Santa Casa de São Paulo e Médico do LIM 62 da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), São
Paulo, SP, Brasil; 2. Médico Assistente do Serviço de Emergência da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil;
3. Professor Doutor Coordenador do Serviço de Emergência da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil; 4.
Sandro Rizoli, FRCSC, FACS. Professor Titular de Cirurgia Geral e Terapia Intensiva dos Departamentos de Cirurgia e Terapia Intensiva da
Universidade de Toronto, Toronto, Canadá; 5. Professor Mestre Assistente de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da Universidade de
Toronto, Toronto, Canadá; 6. FACS. Professor Doutor Coordenador da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Departamento de Cirurgia da
Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, SP, Brasil.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 164-168
Campos
Classificação de gravidade na pancreatite aguda
165
para ser revisto na Classificação de Atlanta e incluir o termo “Pancreatite aguda moderadamente grave”4.
Justificativa
Quando se analisam os doentes com pancreatite
aguda grave (PAG) sem falência orgânica (FO), nota-se
que, apesar da morbidade ser considerável, a mortalidade
é baixa. Contudo, nos doentes com PAG e FO a mortalidade é alta. Não há informações se o tipo de falência orgânica tem relação com maior ou menor mortalidade nos doentes com PAG, mas sabe-se que os doentes com FO transitória, ou seja, que revertem após 48 horas do início da
doença, têm melhor prognóstico. Desta forma, a FO reversível tem sido denominada “transitória”, enquanto FO que
não reverte em 48 horas, “persistente”.
Desta forma, surge a dúvida sobre a classificação dos doentes com complicações locais, mas que não
têm FO persistente. A hipótese dos autores foi que esses
doentes deveriam ser classificados como um novo subtipo:
pancreatite aguda moderadamente grave.
Pergunta
Qual a evolução clínica dos doentes com PAG,
comparando a mesma entre os doentes sem FO (SFO), com
FO única (FOU) e naqueles com FO múltipla (FOM), além
de determinar qual o papel de cada FO na mortalidade?
Achados principais
Na comparação entre os grupos, observou-se
diferença significativa (p<0,05) no que diz respeito ao tempo
de internação (SFO=28+3 dias; FOU=36+5 dias; FOM=55+4
dias), necessidade de terapia intensiva (SFO=50%;
FOU=65%; FOM=90%), média de internação em terapia
intensiva (SFO=5 dias; FOU=9 dias; FOM=34 dias) e mortalidade hospitalar (SFO=2%; FOU=18%; FOM=46%).
Analisando as diversas falências orgânicas individualmente, notou-se que a chance de óbito foi maior nos doentes
que desenvolveram falência renal (Odds ratio, OR = 56),
seguida de falência cardiovascular (OR=22), falência respiratória (OR=12) e falência gastrointestinal (OR=10). Na
análise multivariada, o risco de óbito intra-hospitalar foi
maior para os doentes com FOU e FOM. Não houve aumento da mortalidade para presença de necrose pancreáTabela 1 -
tica, de coleções líquidas peripancreáticas ou de infecção
sistêmica. A conclusão do estudo sugere a necessidade de
revisão da classificação de Atlanta para a inclusão do termo “Pancreatite aguda moderadamente grave”, que inclui os doentes com PAG mas sem falências orgânicas (Tabela 1).
Pontos fortes
* Estudo retrospectivo que incluiu uma analise
ajustada para os fatores provãveis de confusão.
* O estudo resulta de dúvidas na prática diária e
suas respostas são importantes para quem cuida destes
doentes com frequência.
* A hipótese e os objetivos são claros e o método permite as conclusões tomadas.
* Foram incluídos 207 casos de PAG, uma
casuística significativa.
* Os grupos (SFO, FOU, FOM) são aparentemente comparáveis e, quando analisadas as variáveis de interesse (por exemplo, mortalidade intra-hospitalar), a diferença entre eles foi significativa.
Limitações
* Apesar da caracterização de PAG ser clara pelos
critérios de Atlanta, não foram expostos os detalhes que
motivaram os doentes serem classificados como portadores de PAG. Por exemplo, um doente idoso com icterícia
(pela doença biliar e não por falência orgânica) e HAS tem
APACHE II maior que 8, mesmo sem maiores problemas
relacionados ao pâncreas.
* Não houve comparação entre os grupos no
que diz respeito a presença e porcentagem de necrose
pancreática, bem como quanto a porcentagem de infecção da necrose.
* Não houve comparação entre os grupos a respeito dos procedimentos operatórios realizados e sua evolução.
* O estudo foi desenvolvido em 9 anos, tempo
suficiente para mudanças do protocolo de tratamento e
acompanhamento da pancreatite aguda e das falências
orgânicas.
* Não houve comparação dos escores de gravidade como SOFA, MARSHAL e APACHE II entre os gru-
Categorias de gravidade segundo a Revisão da Classificação de Atlanta3.
Gravidade da pancreatite aguda
Falência orgânica e complicações locais ou sistêmicas
Pancreatite aguda leve
- Sem falência orgânica
- Sem complicações locais ou sistêmicas
Pancreatite aguda moderadamente grave
- Falência orgânica transitória (resolve em 48 horas)
Complicações locais ou sistêmicas sem persistência de falência orgânica
Pancreatite aguda grave
- Falência orgânica persistente (única ou múltipla)
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 164-168
Campos
Classificação de gravidade na pancreatite aguda
166
pos. Estes escores estão diretamente ligados a mortalidade e poderiam dar ao leitor uma melhor avaliação da gravidade de cada grupo.
ESTUDO 2
“Falência orgânica e infecção da necrose pancreática como determinantes de mortalidade nos doentes
com pancreatite aguda”5.
Justificativa
Na Classificação de Atlanta as complicações locais e a falência orgânica extra-pancreática são
determinantes de gravidade na pancreatite aguda. Recentemente, existe o conceito de que a falência orgânica é o
fator chave para determinar gravidade, independente das
complicações locais. Estudos que avaliam a necrose
infectada e mortalidade não são unânimes em suas conclusões, devido à população heterogênea de doentes com
e sem falência orgânica, além do pequeno número de
doentes nos estudos.
Pergunta
Determinar através de uma metanálise de estudos clínicos publicados qual a influência da falência orgânica e da necrose pancreática infectada, isoladamente ou
em conjunto, na mortalidade dos doentes com pancreatite
aguda.
Achados principais
Foram selecionados 14 estudos publicados entre
1997 e 2009, sendo sete estudos da Europa, três da América do Norte, dois da Ásia e dois da América Latina. Onze
estudos foram redigidos na língua inglesa, um em russo,
um em turco e um em espanhol. Nesses 14 estudos foram
considerados 1478 doentes com pancreatite aguda, sendo
876 com necrose confirmada. Do total de doentes, 600
(40%) apresentavam falência orgânica e 314 (21%) tiveram necrose infectada. A mortalidade foi de 13% (191
doentes), dos quais 30% (179 de 600) eram doentes com
falência orgânica independente de necrose infectada ou
não, e 32% (102 de 314 doentes) eram doentes com
necrose infectada, independente da presença de falência
orgânica ou não. Entretanto, a mortalidade foi de 43% (92
Tabela 2 -
de 213) nos doentes com falência orgânica e necrose
infectada confirmada, contra 22% (87 de 387) naqueles
com falência orgânica sem necrose infectada. A presença
de necrose infectada esteve associada com um aumento
significativo do risco de morte nos doentes com falência
orgânica (RR=1,94; p=0,0007).
A necrose infectada quando comparada com a
estéril esteve associada com um risco significantemente
maior de morte (RR=1,84 p<0.0001). A mortalidade foi de
11% (10 de 93) nos doentes com necrose infectada, mas
sem falência orgânica.
Pontos fortes
* Primeira metanálise sobre determinantes de
mortalidade na pancreatite aguda.
* Considera artigos de todo o mundo independente do idioma ou local.
* Critérios rígidos de avaliação dos artigos.
* Número significativo de doentes suficiente para
uma conclusão.
* Proposta de uma nova categoria de gravidade, a “pancreatite crítica”, fundamentada nos dados obtidos (Tabela 2).
Limitações
* Considera estudos retrospectivos e prospectivos.
* Dificuldade de estudos sobre pancreatite aguda grave, devido ao número limitado de casos em cada
instituição.
* Definição de falência orgânica variável entre
os artigos.
* Conduta variável entre os serviços.
ESTUDO 3
“A performance dos escores de disfunção orgânica para a predição precoce e manuseio de gravidade na
pancreatite aguda”6.
Justificativa
A Classificação de Atlanta define duas categorias de gravidade: leve e grave. A pancreatite aguda grave
é definida pela presença de falência orgânica e/ou complicações locais. Entretanto, duas limitações maiores estão
Categorias de gravidade segundo determinantes de gravidade2.
Determinantes de gravidade
Necrose pancreática ou peri-pancreática
Falência orgânica
Classificação de gravidade na pancreatite aguda
Leve
Moderada
Grave
Crítica
Não
Estéril
Infectada
Infectada
E
E/OU
OU
E
Não
Transitória
Persistente
Persistente
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 164-168
Campos
Classificação de gravidade na pancreatite aguda
167
presentes na classificação de Atlanta: essa classificação
não considera o termo falência orgânica transitória, tratando estes doentes, que têm melhor prognóstico, como doentes graves; além de promover uma classificação pósepisódio, sem objetivo de promover informações relacionadas ao prognóstico no momento da admissão. Porém, é
necessário diferenciar doentes com alto risco daqueles com
baixo risco de mortalidade e de complicações. Este teste
deve ser sensível e preditivo. Os testes preditivos são usados para a identificação de doentes para estudos.
A identificação precoce de doentes com a forma grave da pancreatite aguda é difícil, apesar de um
grande número de fatores prognósticos descritos. Os escores de falência orgânica utilizados em UTI ganham relevância frente à importância da falência orgânica na PA
(LODS/Marshall), mas são pouco avaliados na pancreatite
aguda. Os escores de disfunção orgânica têm vários atrativos: o escore é calculado com um relevante e compreensivo conjunto de dados biológicos; indicam doentes com
necessidade de terapia intensiva; e indicam doentes com
maior risco de eventos adversos.
Pergunta
Qual o melhor escore de disfunção orgânica para
predizer gravidade na pancreatite aguda?
Achados principais
Foram analisados 181 doentes, sendo 29 (16%)
classificados como graves. A principal etiologia foi a biliar
(53%), seguido da alcoólica (23%), idiopática (15%), pósCPRE (6%), e outras (3%). Quatro doentes morreram no
grupo de doentes graves. O tempo entre o início do surto
até a admissão foi de 18,7 + 17 horas. Os doentes com
APACHE II > 11 na admissão classificados como PA leve
não necessitaram de UTI e nem de suporte de falência
orgânica, e foram liberados em até 10 dias. A área sob a
curva (AUC) para o APACHE II na admissão foi de 0,78.
Utilizando-se um valor de APACHE II de 7, a sensibilidade
foi de 74%, a especificidade de 67%, o que não é adequado para predizer necessidade de UTI. Considerando-se
este valor, 26% dos casos graves foram perdidos. O valor
preditivo positivo de 32% significa que 1 em 3 doentes
selecionados para UTI seriam classificados
subsequentemente como graves.
Considerando-se a necessidade de um teste com
alta especificidade (>90%), então o MODS, APACHE II e
o SOFA foram semelhantes na avaliação de 24 horas. O
balanço entre a sensibilidade e a especificidade foram
melhor conseguidas pelo LODS. A AUC foi similar para os
quatro testes. O LODS escore com um corte de 1 conseguiu 90% de sensibilidade e 69% de especificidade,
correspondendo a um valor preditivo de 38%.
O LODS, MODS e SOFA parecem ser melhor
que o APACHE II e que a Proteína C Reativa no período
de 48 horas. A AUC foi similar para os cinco testes. O
SOFA escore com um corte de 1 obteve 80% de sensibi-
lidade e 84% de especificidade, correspondendo a um
valor preditivo de 50%. Na identificação de doentes graves, a sensibilidade de um teste tem um papel importante, e o valor preditivo positivo se torna uma medida de
seleção de homogeneidade (proporção de casos selecionados que se tornam graves). Com o LODS escore igual
ou maior que 1, 90% dos casos graves serão incluídos,
mas apenas 38% de todos os recrutados serão considerados graves.
O SOFA escore de 3 ou mais irá identificar metade dos casos graves, e a seleção irá abordar quase 3/4 dos
casos graves. Isto pode ser considerado uma performance
adequada.
Esta abordagem pode ser considerada também
para os casos leves, onde a especificidade se torna importante e o valor preditivo negativo tem uma acurácia de
seleção. Com o APACHE II de 10, selecionando escores
menores ou iguais a 9, obteve-se homogeneidade de 90%
com eficiência de recrutamento de 92%. Do mesmo modo,
na admissão, APACHE II é inadequado para predizer casos
graves. Entretanto, ele detecta muito bem os casos leves.
Com um escore de 9 (selecionando escores menores ou
iguais a 8) obtém-se homogeneidade de 91% e eficiência
de 79%.
Em 24 horas, o APACHE II, LODS, MODS e SOFA
foram todos moderadamente ou altamente correlatos. Um
padrão similar ocorre em 48 horas (APACHE II, PCR, LODS,
MODS e SOFA). Consequentemente, com estes testes, as
combinações provavelmente não irão ajudar na identificação de doentes leves e graves.
Os testes tiveram performance semelhantes, ou
seja, pode-se escolher um deles. Devido à alta correlação
entre eles, não parece haver vantagens na combinação
deles. O SOFA escore de 3 avaliado em 24 horas tem
acurácia de 70% para identificar casos graves (o que poderia ser identificado também com parâmetros clínicos). O
APACHE II menor que 9 classifica 91% dos doentes como
pancreatite aguda leve.
Pontos fortes
* Número significativo de doentes incluídos em
um único centro.
* A análise considerou os principais escores normalmente usados em UTI, desta vez na pancreatite aguda.
* Conclusões práticas para selecionar e para
excluir gravidade.
Limitações
* Diagnóstico de pancreatite utilizado não é o
mais utilizado (dois entre três fatores: quadro clínico típico,
elevação de amilase/lipase 3 vezes superior ao valor normal e TC com aumento do pâncreas).
* O cálculo dos escores não foram repetidos após
48 horas (exceto o APACHE II) o que impedia o cálculo de
falência orgânica transitória.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 164-168
Campos
Classificação de gravidade na pancreatite aguda
168
* Os testes não foram avaliados em conjunto.
* O encaminhamento dos doentes para a UTI
pode ter sido influenciado pela disponibilidade de leitos.
* O estudo desencoraja a combinação de escores, mas sugere que o APACHE II é bom para excluir PA
grave e que o SOFA tem boa acurácia para selecionar doentes graves.
Conclusões da TBE - CITE
As conclusões apresentadas se baseiam nas discussões recentes sobre o tema, demonstrado por estes artigos que culminaram nas duas recentes revisões publicadas
sobre o assunto.
1. A Classificação de Atlanta necessita ser atualizada, especialmente na definição mais adequada do grupo de doentes graves.
2. Mais categorias devem ser descritas para gravidade da pancreatite aguda, e não apenas leve ou grave.
Um número maior de categorias poderia determinar melhor as características de cada doente.
3. A avaliação da falência orgânica tem um papel fundamental na estratificação dos doentes, e no manuseio inicial, incluindo as indicações de terapia intensiva.
Vários escores de gravidade estão disponíveis e podem ser
utilizados.
Recomendações da TBE-CiTE sobre “Classificação de gravidade na pancreatite aguda”:
1. Classificação da pancreatite aguda em quatro categorias: leve, moderada, grave e crítica, o que permite uma melhor determinação das características dos
doentes, como proposto no Quadro 2.
2. Avaliação da presença de falência orgânica
em todos os doentes através da utilização de um escore de
gravidade, preferencialmente algum que avalie diretamente
cada falência orgânica, tais como o LODS, o SOFA e o
MODS (Marshall). O SOFA parece ter maior acurácia, mas
o MODS tem melhor aplicabilidade devido à facilidade de
uso. O APACHE II tem um papel na exclusão de gravidade.
A B S T R A C T
Based on the Atlanta Classification, acute pancreatitis is classified according to its severity in either mild or severe acute pancreatitis.
In recent years, several issues regarding acute pancreatitis have been discussed in the literature. These issues include how many
categories of severity should be considered; whether or not a patient with organ failure holds similar holds severity of disease and
prognosis of a patient with infected necrosis; the role of transient organ failure; and how to evaluate organ failure. The “Evidencebased Telemedicine - Trauma and Acute Care Surgery” (EBT-TACS) conducted a review of the recent literature on the topic, and
critically appraised its most relevant pieces of evidence.. The articles discussed suggested classifying the severity of acute pancreatitis
in three or four categories, rather than mild or severe only, and addressed which is the best score to assess organ failure. The
following recommendations were proposed: (1) Acute pancreatitis should be classified into four categories: mild, moderate, severe
and critical, which allows a better determination of the characteristics of patients, (2) Evaluation of organ failure with a severity score
that preferably evaluate directly each organ failure, such as the SOFA and MODS (Marshall). The SOFA seems to have greater
accuracy, but the MODS has better applicability due to its ease of use.
Key words: Pancreatitis. Pancreatitis/classification. Pancreatitis, acutre necrotizing. Acute disease. Severity of illness index.
REFERÊNCIAS
1. Bradley EL 3rd. A clinically based classification system for acute
pancreatitis. Summary of the International Symposium on Acute
Pancreatitis, Atlanta, Ga, September 11 through 13, 1992. Arch
Surg. 1993;128(5):586-90.
2. Dellinger EP, Forsmark CE, Layer P, Lévy P, Maraví-Poma E, Petrov
MS, e al. Determinant-based classification of acute pancreatitis
severity: an international multidisciplinary consultation. Ann Surg.
2012;256(6):875-80.
3. Banks PA, Bollen TL, Dervenis C, Gooszen HG, Johnson CD, Sarr
MG, et al. Classification of acute pancreatitis—2012: revision of
the Atlanta classification and definitions by international consensus.
Gut. 2013;62(1):102-11.
4. Vege SS, Gardner TB, Chari ST, Munukuti P, Pearson RK, Clain JE,
et al. Low mortality and high morbidity in severe acute pancreatitis
without organ failure: a case for revising the Atlanta classification
to include “moderately severe acute pancreatitis”. Am J
Gastroenterol. 2009;104(3):710-5.
5. Petrov MS, Shanbhag S, Chakraborty M, Phillips AR, Windsor JA.
Organ failure and infection of pancreatic necrosis as determinants
of mortality in patients with acute pancreatitis. Gastroenterology.
2010;139(3):813-20.
6. Mason JM, Babu BI, Bagul A, Siriwardena AK. The performance of
organ dysfunction scores for the early prediction and management
of severity in acute pancreatitis: an exploratory phase diagnostic
study. Pancreas. 2010;39(7):1104-8.
Recebido em 10/03/2013
Aceito para publicação em 15/03/2013
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma
Declaração: As recomendações e conclusões deste artigo representam a opinião dos participantes da reunião de revista TBE-CiTE e não
necessariamente a opinião das instituições a que eles pertencem.
Como citar este artigo:
De Campos T, Parreira JG, Assef JC, Rizoli S, Nascimento B, Fraga GP.
Classificação de gravidade na pancreatite aguda. Rev Col Bras Cir.
[periódico na Internet] 2013;40(2). Disponível em URL: http://
www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Tércio De Campos
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 164-168
Saad Júnior
Tumor raro em mediastino: hamartoma
169
Relato de Caso
Tumor raro em mediastino: hamartoma
A rare mediastinum tumor: hamartoma
ROBERTO SAAD JÚNIOR, TCBC-SP1; JOSÉ DONATO DE PRÓSPERO2; ROBERTO GONÇALVES, TCBC-SP3; JORGE HENRIQUE RIVABEN, ACBC-SP4;
FABIANO ALVES SQUEFF, TCBC-GO4
INTRODUÇÃO
H
amartomas (do grego hamarto = “mistura”) são
formações tumorais constituídas por tecidos desorganizados, mais comumente vasos, cartilagens, tecido linfoide,
gorduroso e outros. Diferem-se dos teratomas (do grego terato
= “monstro”) por não apresentarem arranjo organizado. O
aspecto macroscópico varia de acordo com as estruturas que
constituem o “tumor”. Quando presente na cavidade
torácica, são mais encontrados no parênquima pulmonar1,2.
Ao exame microscópico, verificou-se neoplasia
com estruturas mesenquimais, com predominância de capilares sanguíneos dispostos de modo irregular, revestidos
por células endoteliais tumefeitas, formando aglomerados
entremeados por tecido conjuntivo com diversos acúmulos
linfoides de tamanhos variados concluindo-se como diagnóstico de hamartoma vascular e linfoide (Figura 3).
RELATO DO CASO
Paciente sexo feminino, 51 anos, hipertensa e
diabética, admitida no pronto socorro com queixa de mal
estar súbito e de dor torácica atípica, sem repercussões
respiratórias ou hemodinâmicas. Refere história prévia de
trauma torácico fechado grave, sem sequelas há 30 anos.
Observou-se na radiografia de tórax um tumor mediastinal
para-aórtico, sendo aventada hipótese diagnóstica de
aneurisma de aorta torácica, afastado pela aortografia, que
apresentava apenas desvio ântero-medial da aorta em sua
porção descendente.
Prosseguiu-se a investigação com tomografia
computadorizada e ressonância nuclear magnética de tórax que evidenciaram um tumor localizado no mediastino
posterior bem delimitado, justaposto à aorta descendente
e ao corpo vertebral, com áreas de hipercaptação de contraste sem sinais de invasão de estruturas locais (Figura1).
Pelo fato de a paciente apresentar crises hipertensivas esporádicas, pensou-se em feocromocitoma no mediastino
(Paraganglioma). As catecolaminas urinárias se mostraram
normais, afastando-se então esta hipótese diagnóstica.
A paciente foi submetida à toracotomia axilar
esquerda, proporcionando bom acesso à cavidade torácica
com propósito de se ressecar o tumor. No intraoperatório,
identificou-se tumor de cor amarelada com áreas
hemorrágicas de permeio, nutrido por vários pedículos pequenos, revestido por uma superfície fibrosa, lisa e brilhante, cujas dimensões eram 6,0x4,0x5,0 cm (Figura 2).
Figura 1 -
Ressonância Magnética do Tórax evidenciando
tumoração localizada no mediastino posterior bem
delimitada, justaposta a aorta descendente e ao corpo vertebral.
Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Torácica da Santa Casa de São Paulo.
1. Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo – FCMSCSP; 2. Professor –
Livre Docente do Departamento de Patologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo – FCMSCSP; 3. Pós Graduando do
Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo – FCMSCSP; 4. Ex-residentes da Disciplina de Cirurgia
Torácica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo – FCMSCSP.
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 169-171
Saad Júnior
Tumor raro em mediastino: hamartoma
170
Figura 2 -
Figura 3 -
Achado Intra-operatório.
A paciente recebeu alta no terceiro dia de pósoperatório, sem intercorrências. Fez acompanhamento
ambulatorial durante dez meses apresentando boa evolução clínica.
DISCUSSÃO
Os tumores de mediastino são classicamente divididos de acordo com a divisão anatômica preconizada
por Shields, em mediastino anterior, médio e posterior.
Dentre os tumores de mediastino posterior, os mais frequentes são os de origem neural, porém há relatos de
lipomas, hemangiopericitomas, linfagiomas e
hemangiomas 3. Aproximadamente 6% dos tumores
mediastinais são de origem mesenquimal, sendo mais comum no mediastino anterior. O hamartoma linfoide é encontrado no tórax (71%), ao longo da árvore
traqueobrônquica, no hilo pulmonar e no mediastino.
O hamartoma consiste de um tumor de forma
variável, limites e coloração definidos, de acordo com os
elementos estruturais predominantes, constituído por uma
variedade de tecidos maduros: cartilaginoso, adiposo,
vascular, conjuntivo, epitelial e elementos glandulares. No
hamartoma condroide de mediastino, formam-se criptas,
Aspecto microscópico do hamartoma vascular e
linfoide.
o crescimento é lento e o diâmetro, em geral, é em torno
de quatro centímetros. O hamartoma linfoide é composto
por folículos linfoides em meio a estruturas vasculares. Os
folículos linfoides apresentam-se como estruturas em arranjo concêntrico, não existente em nosso caso. Já neste
doente, tratava-se de formação tumoral composta predominantemente por capilares sanguíneos em meio a folículos
linfoides disseminados. Por esses motivos, achamos apropriado a denominação de hamartoma vásculo-linfoide2,4.
O hamartoma é frequentemente encontrado na
terceira e quarta décadas, e não há predominância de sexo
ou raça. Os sintomas variam com a localização, sendo a
tosse e a dor torácica os mais frequentes (10%). Usualmente é encontrado incidentalmente na radiografia de tórax2,4.
Ao exame radiográfico, o hamartoma apresenta-se como um tumor solitário, ovalar, levemente lobulado
de limites bem definidos, com calcificações típicas – em
“pipoca”, centrais, finas ou difusas (15% dos casos). Fatores radiológicos atípicos incluem a presença de broncograma
aéreo, cavitação ou formação multinodular septada por
espaços aéreos1.
Quando no parênquima pulmonar, o tratamento
consiste na exérese do tumor, sendo as lobectomias ou
pneumonectomias tratamentos de exceção e se aplicam a
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 169-171
Saad Júnior
Tumor raro em mediastino: hamartoma
171
alguns casos de tumores de localização endobrônquica.
No mediastino posterior, a excisão é tanto diagnóstica quanto curativa5.
O diagnóstico do caso exposto foi realizado através de exames de imagem, sendo a tomografia
computadorizada (TC) o exame de escolha nos tumores
de mediastino. A ressonância nuclear magnética apresenta custo elevado, sendo importante para avaliar extensão
tumoral no forame intervertebral e a relação com vasos
mediastinais3.
Para tumores localizados no mediastino posterior, pode-se lançar mão da arteriografia e do esofagograma
para afastar aneurisma e pseudoaneurisma de aorta
torácica, doença diverticular e hérnia diafragmática (diagnósticos diferenciais)3.
A ressecção dos tumores de mediastino posterior pode ser feita através da toracotomia convencional,
toracotomia com preservação muscular e
videotoracoscopia5. No caso apresentado, foi realizada
toracotomia axilar esquerda com preservação muscular,
obtendo-se amplo acesso à cavidade torácica, o que possibilitou dissecção segura do tumor da aorta torácica, com
mínima quantidade de sangramento. A paciente obteve
recuperação satisfatória no pós-operatório com ótimo resultado estético.
A videotoracoscopia está indicada nos tumores
menores que seis centímetros, não localizados no ápice e
no recesso costodiafragmático posterior e na ausência de
invasão de coluna vertebral. Análise de 143 pacientes operados por videotoracoscopia mostrou que a remoção
endoscópica não aumentou o risco de recorrência local em
um seguimento de 29 meses5. Há relatos de importantes
sangramentos quando realizado dissecção de hamartoma
por este acesso, devido ao componente vascular abundante. Pelo fato de ser um tumor vascularizado, recomendase a realização de toracotomia para a sua ressecção segura4.
Diante do achado anátomo-patológico de
hamartoma vásculo-linfoide no mediastino posterior, iniciou-se uma investigação a respeito desta anormalidade.
Foram realizados levantamentos baseados em dados do
Medline, Scielo, Lilacs e Pubmed. Com esta nomenclatura
(hamartoma vásculo-linfoide no mediastino posterior), não
encontramos nenhum artigo na literatura pesquisada. Por
estes motivos, esta anormalidade poderia corresponder a
uma descrição inédita na literatura mundial. Cogitamos
que poderia ser uma variante anátomo-patológica da doença de Castleman, doença ainda não muito bem elucidada
do ponto de vista anátomo-patológico, localizada no
mediastino posterior e em demais regiões4. A estrutura
histológica dos folículos linfáticos, entretanto, não apresentava os caracteres observados naquela entidade. A doença de Castleman, também conhecida como hamartoma
linfoide, é formada por um conglomerado de folículos linfáticos circundados por capilares sanguíneos presentes na
cavidade torácica, na região cervical e em demais locais.
O hamartoma vásculo-linfoide, como é o nosso caso, é
constituído predominantemente por aglomerados de capilares sanguíneos em meio aos quais existem folículos
linfoides delimitados ou não1,2.
Tumores de origem mesenquimal no mediastino
posterior são raros, de difícil diagnóstico e de tratamento
geralmente cirúrgico. O caso relatado tratou-se de um
Hamartoma vásculo-linfoide que acreditamos ser uma apresentação anátomo-patológica inédita, no mediastino posterior.
A B S T R A C T
In the present paper we report a case of mediastinal tumor which we believe has never been reported. Since surgical treatment,
the patient presented good evolution. We discuss the presentation, differential diagnosis and therapy. Finally, we stress the
importance of the pathologic findings.
Key words :Mediastinal neoplasm, Hamartoma, Castleman‘s disease, surgery.
right choice? Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2004;14(1):202.
REFERÊNCIAS
1. Shinkai M, Kobayashi H, Kanoh S, Ozeki Y, Aida S, Motoyoshi K.
Pulmonary hamartoma: unusual radiologic appearance. J Thorac
Imaging. 2004;19(1):38-40.
2. Ozkan H, Tolunay S, Gözü O, Ozer ZG. Giant lymphoid hamartoma
of mediastinum
(Castleman’s disease). Thorac Cardiovasc Surg.
1990;38(5):321-3.
3. Ximenes M, Barbosa JR. Tumores do mediastino. In: Saad Jr R,
Ximenes Netto M, editores. Cirurgia torácica. São Paulo: Atheneu;
1997. p. 155-72.
4. Erdogan A, Eser I, Ozbilim G. Posterior mediastinal localization of
Castleman’s disease: report of a Case. Surg Today. 2004;34(9):772-3.
5. Venissac N, Leo F, Hofman P, Paquis P, Mouroux J. Mediastinal
neurogenic tumors and video-assisted thoracoscopy: always the
Recebido em 15/05/2007
Aceito para publicação em 10/06/2007
Conflito de interesse: nenhum
Fonte de financiamento: nenhuma
Como citar este artigo:
Saad Júnior R, Próspero JD, Gonçalves R, Ribaven JH, Squeff FA. Tumor raro em mediastino: hamartoma. Rev Col Bras Cir. [periódico na
Internet] 2013;40(2). Disponível em URL: http://www.scielo.br/rcbc
Endereço para correspondência:
Fabiano Alves Squeff
E-mail: [email protected]
Rev. Col. Bras. Cir. 2013; 40(2): 169-171
INSTRUÇÕES AOS AUTORES
A Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, órgão oficial do CBC, é publicada
bimestralmente em um único volume anual, e se propõe à divulgação de artigos
de todas as especialidades cirúrgicas, que contribuam para o seu ensino, desenvolvimento e integração nacional.
Os artigos publicados na Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões seguem
os requisitos uniformes recomendados pelo Comitê Internacional de Editores de
Revistas Médicas (www.icmje.org), e são submetidos à avaliação por pares (peer
review). A Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões apoia as políticas para
registro de ensaios clínicos da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do
International Committee of Medical Journal Editor (ICMJE), reconhecendo a importância dessas iniciativas para o registro e divulgação internacional de informação sobre estudos clínicos, em acesso aberto. Sendo assim, somente serão
aceitos para publicação os artigos de pesquisas clínicas que tenham recebido um
número de identificação em um dos registros de ensaios clínicos validados pelos
critérios estabelecidos pela OMS e ICMJE. O número de identificação deverá ser
registrado ao final do resumo.
O Conselho de Revisores (encarregado do peer-review) recebe os textos de
forma anônima e decidem por sua publicação. No caso de ocorrência de conflito
de pareceres, o Diretor de Publicações avalia a necessidade de um novo parecer.
Artigos recusados são devolvidos aos autores. Somente serão submetidos à
avaliação os trabalhos que estiverem dentro das normas para publicação na
Revista. Os artigos aprovados poderão sofrer alterações de ordem editorial,
desde que não alterem o mérito do trabalho.
INFORMAÇÕES
GERAIS
A Revista do CBC avalia artigos para publicação em português, inglês ou
espanhol que sigam as Normas para Manuscritos Submetidos às Revistas
Biomédicas, elaborados e publicadas pelo International Committe of Medical
Journal Editors (ICMJE www.icmje.org) traduzidas como Conselho Internacional
de Editores de Revistas Médicas (CIERM Rev Col Bras Cir. 2008;35(6):425-41) ou
de artigo no site da Revista do CBC (www.revistadocbc.org.br) com as seguintes
características:
Editorial: É o artigo inicial de um periódico, geralmente a respeito de
assunto atual solicitado a autor de reconhecida capacidade técnica e científica.
Artigo Original: É o relato completo de investigação clínica ou experimental com resultados positivos ou negativos. Deve ser constituído de Resumo,
Introdução, Método, Resultados, Discussão, Abstract e Referências, limitadas ao
máximo de 30 procurando incluir sempre que possível artigos de autores nacionais
e periódicos nacionais
O título deve ser redigido em português, em inglês ou espanhol (quando o
trabalho for enviado nesta língua). Deve conter o máximo de informações, o
mínimo de palavras e não deve conter abreviatura. Deve ser acompanhado do(s)
nome(s) completo(s) do(s) autor(es) seguido do(s) nome(s) da(s) instituição(ões)
onde o trabalho foi realizado. Se for multicêntrico, informar em números arábicos
a procedência de cada um dos autores em relação às instituições referidas. Os
autores deverão enviar junto ao seu nome somente um título e aquele que melhor
represente sua atividade acadêmica.
O resumo deve ter no máximo 250 palavras e estruturado da seguinte
maneira: objetivo, método, resultados, conclusões e descritores na forma referida
pelo DeCS (http://decs.bvs.br). Podem ser citados até cinco descritores. O abstract
também deve conter até 250 palavras e ser estruturado da seguinte maneira:
objective, methods, results, conclusion e keywords (http://decs.bvs.br).
Artigo de Revisão: O Conselho Editorial incentiva a publicação de matéria de grande interesse para as especialidades cirúrgicas contendo análise sintética e crítica relevante e não meramente uma descrição cronológica da literatura.
Deve ter uma introdução com descrição dos motivos que levaram à redação do
artigo, os critérios de busca, seguido de texto ordenado em títulos e subtítulos de
acordo com complexidade do assunto, resumo e abstract não estruturados.
Quando couber, ao final poderão existir conclusões, opiniões dos autores
sumarizando o referido no texto da revisão. Deve conter no máximo 15 páginas e
45 referências.
Nota Prévia: Constitui observação clínica original, ou descrição de inovações técnicas, apresentada de maneira concisa, de preferência não excedendo a
500 palavras, cinco referências, duas ilustrações e abstract não estruturado.
Permite-se três autores.
Relato de Caso: Descrição de casos clínicos de interesse geral seja pela
raridade na literatura médica ou pela forma de apresentação não usual do
mesmo. Não deve exceder a 600 palavras e não necessita resumo, apenas
abstract não estruturado, cinco referências e duas ilustrações. Número de autores até cinco.
Cartas ao Editor: Comentários científicos ou controvérsias com relação
aos artigos publicados na Revista do CBC. Em geral tais cartas são enviadas ao
autor principal do artigo em pauta para resposta e ambas as cartas são publicadas
no mesmo número da Revista, não sendo permitido réplica.
Comunicação Científica: Conteúdo que aborde a forma da apresentação da comunicação científica, investigando os problemas existentes
e propondo soluções. Por suas características, essa Seção poderá ser
multiprofissional e multidisciplinar, recebendo contribuições de médicos,
cirurgiões e não-cirurgiões e de outros profissionais das mais variadas
áreas.
Nota Técnica: Informação sobre determinada operação ou procedimento
de importância na prática cirúrgica. O original não deve ultrapassar seis páginas
incluídas as fotos e referências se necessário. É artigo com formato livre, com
resumo e abstract.
Ensino: Conteúdo que aborde o ensino da cirurgia na graduação e na pósgraduação com formato livre. Resumo e abstract não estruturados.
Bioética na cirurgia: discussão dos aspectos bioéticos na cirurgia. O
conteúdo deverá abordar os dilemas bioéticos existentes no desempenho da
atividade cirúrgica. Formato livre. Resumo e abstract não estruturados.
FORMA E ESTILO
Texto: A forma textual dos manuscritos apresentados para publicação
devem ser inéditos e enviados na forma digital (Word Doc), espaço duplo e corpo
de letra arial, tamanho 12. As imagens deverão ser encaminhadas separadas no
formato JPG, GIF, TIF e referido no texto o local de inserção. Os artigos devem ser
concisos e redigidos em português, inglês ou espanhol. As abreviaturas devem
ser em menor número possível e limitadas aos termos mencionados repetitivamente,
desde que não alterem o entendimento do texto, e devem ser definidas a partir
da sua primeira utilização.
Referências: Devem ser predominantemente de trabalhos publicados nos cinco
últimos anos não esquecendo de incluir autores e revistas nacionais, restringindo-se
aos referidos no texto, em ordem de citação, numeradas consecutivamente e apresentadas conforme as normas de Vancouver (Normas para Manuscritos Submetidos às
Revistas Biomédicas - ICMJE www.icmje.org - CIERM Rev Col Bras Cir. 2008;35(6):
425-41 - www.revistadocbc.org.br). Não serão aceitas como referências anais de
congressos, comunicações pessoais. Citações de livros e teses devem ser desestimuladas.
Os autores do artigo são responsáveis pela veracidade das referências.
Agradecimentos: Devem ser feitos às pessoas que contribuíram de forma
importante para a sua realização.
TABELAS E FIGURAS (Máximo permitido 6 no total)
Devem ser numeradas com algarismos arábicos, encabeçadas por suas legendas com uma ou duas sentenças, explicações dos símbolos no rodapé. Cite as
tabelas no texto em ordem numérica incluindo apenas dados necessários à
compreensão de pontos importantes do texto. Os dados apresentados não devem
ser repetidos em gráficos. A montagem das tabelas deve seguir as normas
supracitadas de Vancouver.
São consideradas figuras todos as fotografias, gráficos, quadros e desenhos.
Todas as figuras devem ser referidas no texto, sendo numeradas consecutivamente
por algarismos arábicos e devem ser acompanhadas de legendas descritivas.
Os autores que desejarem publicar figuras coloridas em seus artigos poderão fazêlo a um custo de R$ 650,00 para uma figura por página. Figuras adicionais na mesma
página sairão por R$ 150,00 cada. O pagamento será efetuado através de boleto
bancário, enviado ao autor principal quando da aprovação do artigo para publicação.
CONDIÇÕES OBRIGATÓRIAS (LEIA COM ATENÇÃO)
Fica expresso que, com a remessa eletrônica, o(s) autor(es) concorda(m)
com as seguintes premissas: 1) que no artigo não há conflito de interesse,
cumprindo o que diz a Resolução do CFM nº.1595/2000 que impede a publicação de trabalhos e matérias com fins promocionais de produtos e/ou equipamentos médicos; 2) citar a fonte financiadora, se houver; 3) que o trabalho
foi submetido a CEP que o aprovou colocando no texto o número com que foi
aprovado; 4) que todos os autores concedem os direitos autorais e autorizam
o artigo em alterações no texto enviado para que ele seja padronizado no
formato linguístico da Revista do CBC, podendo remover redundâncias, retirar
tabelas e/ou figuras que forem consideradas não necessárias ao bom entendimento do texto, desde que não altere seu sentido. Caso haja discordâncias
dos autores quanto às estas premissas, deverão eles escrever carta deixando
explícito o ponto em que discordam e a Revista do CBC terá então necessidade de analisar se o artigo pode ser encaminhado para publicação ou devolvido
aos autores. Caso haja conflito de interesse ele deve ser citado com o texto:
“O(s) autores (s) (nominá-los) receberam suporte financeiro da empresa
privada (mencionar o nome) para a realização deste estudo”. Quando houver
fonte financiadora de fomento a pesquisa ela deverá ser citada.
A responsabilidade de conceitos ou asserções emitidos em trabalhos e
anúncios publicados na Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões cabe inteiramente ao(s) autor (es) e aos anunciantes. Não serão aceitos trabalhos já
publicados ou simultaneamente enviados para avaliação em outros periódicos.
Endereço para contato:
Rua Visconde de Silva, 52 - 3° andar
Botafogo - 22271-090 Rio de Janeiro - RJ - Brasil
Tel.: (21) 2138-0659 (Dna. Ruth)
Site: http://www.revistadocbc.org.br/
Endereço para envio dos manuscritos:
E-mail: [email protected]
Download