O jusnaturalismo de raiz estóica “É da Lei que se deve partir para falar do Direito. A Lei é a força da natureza, o espírito, o princípio director do homem que vive correctamente, a regra do justo e do injusto. Como todos os nossos discursos tratam das regras da vida do povo é por vezes necessário falar a linguagem do povo e chamar lei à regra escrita à qual as autoridades dão um carácter imperativo. Mas para estabelecer o Direito deve partir-se dessa lei suprema que, sendo anterior a todos os tempos, precedeu toda a lei escrita e a constituição de qualquer cidade” Cícero, De Legibus, Liv. II, $6. “Existe uma lei verdadeira, que é a recta razão, conforme à natureza, difundida por todos os seres, sempre de acordo consigo mesma, não sujeita a desaparecer, que nos chama imperiosamente a cumprir a nossa função, nos proíbe a mentira e dela nos desvia. O homem honesto jamais é surdo aos seus mandamentos; e eles não têm efeitos sobre os perversos. A esta lei nenhuma correcção é permitida, ela não pode ser derrogada nem em parte nem na totalidade. Nem o Senado nem o Povo nos pode dispensar da obediência a tal lei e não é necessário procurar nenhum Sextus Aelius para explicá-la ou interpretá-la. Esta lei não é diferente em Atenas, em Roma, hoje ou amanhã, é uma e a mesma lei, eterna e imutável, que rege todas as Nações em todos os tempos. Existe, para a ensinar a prescrever a todos um Deus único: a concepção, a deliberação e a execução da lei pertence-lhe igualmente. Quem não obedecer a esta lei ignora-se a si mesmo e, porque desconhecerá a natureza humana, sofrerá por isso mesmo o maior dos castigos, ainda que escape a outros sacrifícios” Cícero, De Republica, III, $3. “A verdadeira lei representa-se, pois, na recta razão, que está em harmonia com a natureza, que é comum a todos os homens, que tem uma existência estável e duradoura, que chama ao dever através do mandamento, que se intimida do mal pela proibição (…). Restringir o alcance desta lei viola o direito divino. Também não é permitido revogá-la parcialmente, nem é possível aboli-la completamente. Porém, também não nos podemos libertar da vinculação a esta lei através do Senado ou do povo… Não será diferente em Roma, diferente em Atenas, diferente hoje ou amanhã; todos os povos, em todos os tempos, compreenderão esta lei única como eterna e imutável, e um só será como que o mestre e senhor comum sobre tudo. Deus… Quem não obedecer a esta lei estará a fugir de si mesmo e, por estar a negar a natureza humana, sofrerá o castigo mais pesado…”. Cícero, De Republica, 22 33) COMENTÁRIO DO TEXTO Problema do primeiro texto: a dualidade direito natural/direito positivo; a relação entre a lei não escrita e a lei escrita, entre a lei natural e a lei positiva ou entre a justiça transcendente e o direito positivo. Problema do segundo texto: a origem da lei natural (a razão); a hipótese de um direito positivo injusto.