Entrevista Do bem Radioterapia

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co&
On
ano
4
setembro/outubro 2013
Ano 4 • n º 19
Oncologia para todas as especialidades
Entrevista
O valor da
evidência científica
Do bem
Prevenção se
aprende na escola
Radioterapia
Riscos e benefícios
no câncer de próstata
Capa
Labirinto regulatório
prejudica o paciente de câncer?
oncogenética | imagem | cirurgia | curtas
sumário
entrevista
8
capa
16
Indústria, sociedades médicas e organizações de pacientes acusam a falta
de critérios claros no registro e na incorporação de medicamentos oncológicos.
Classes terapêuticas importantes continuam sendo negadas para pacientes
de câncer
imagem
24
O papel da radiologia intervencionista no diagnóstico e tratamento do câncer
Charles Edouard Zurstrassen
radioterapia
28
Radioterapia no tratamento do câncer de próstata avançado
Robson Ferrigno
ginecologia
34
Câncer do endométrio: como diagnosticar e definir o estadiamento?
Etelvino de Souza Trindade
oncogenética
38
Hereditariedade e câncer de mama
Edenir Inêz Palmero
cirurgia
42
Evolução do tratamento oncológico cirúrgico do aparelho digestivo
Ulysses Ribeiro Jr
do bem
46
Programas levam educação e prevenção de câncer às salas de aula de
crianças e adolescentes
curtas
50
Notícias da indústria, iniciativas, parcerias: um giro pelo mundo
da oncologia
calendário
58
Programe-se: eventos e congressos
para anotar na agenda
Especialista em metodologia científica, Otávio Clark critica o financiamento
e a gestão da saúde no Brasil e diz que a produção médico-científica
brasileira ainda não está preparada para o modelo de evidências
Conselho
editorial
Editor clínico:
Sergio D. Simon
I –Cancerologia clínica
II – Cancerologia cirúrgica
IV – Patologia
Oncologia clínica:
Abdômen:
André Moraes (SP)
Anelise Coutinho (BA)
Artur Katz (SP)
Auro Del Giglio (SP)
Carlos Sampaio (BA)
Clarissa Mathias (BA)
Claudio Petrilli (SP)
Daniel Herchenhorn (RJ)
Fernando Maluf (SP)
Fernando Medina (SP)
Igor Morbeck (DF)
Jacques Tabacof (SP)
João Nunes (SP)
José Bines (RJ)
Karla Emerenciano (RN)
Marcelo Aisen (SP)
Marcelo Collaço Paulo (SC)
Maria de Fátima Dias Gaui (RJ)
Mario Luiz Silva Barbosa (SP)
Nise Yamaguchi (SP)
Oren Smaletz (SP)
Paulo Marcelo Gehm Hoff (SP)
Roberto Gil (RJ)
Sebastião Cabral Filho (MG)
Sérgio Azevedo (RS)
Sergio Lago (RS)
Ademar Lopes (SP)
José Jukemura (SP)
Laercio Gomes Lourenço (SP)
Marcos Moraes (RJ)
Paulo Herman (SP)
Carlos Bacchi (SP)
Felipe Geyer (SP)
Fernando Soares (SP)
Onco-hematologia:
Carlos Chiattone (SP)
Carmino de Souza (SP)
Daniel Tabak (RJ)
Jane Dobbin (RJ)
Nelson Spector (RJ)
Vânia Hungria (SP)
Transplante de medula:
Jairo Sobrinho (SP)
Luis Fernando Bouzas (RJ)
Nelson Hamerschlak (SP)
Yana Novis (SP)
Ginecologia:
Jorge Saad Souen (SP)
Sérgio Mancini Nicolau (SP)
Sophie Derchain (SP)
Tecido osteoconjuntivo:
Olavo Pires de Camargo (SP)
Reynaldo J. Garcia Filho (SP)
Mama:
Alfredo Barros (SP)
Antonio Frasson (SP)
Carlos Alberto Ruiz (SP)
Maira Caleffi (RS)
Ruffo de Freitas (GO)
V – Cuidados paliativos e dor
Ana Claudia Arantes (SP)
Fabíola Minson (SP)
João Marcos Rizzo (RS)
Ricardo Caponero (SP)
VI – Pesquisa
Carlos Barrios (RS)
Conceição Accetturi (SP)
Everardo D. Saad (SP)
Greyce Lousana (SP)
Gustavo Werutzky (RS)
VII – Radiologia e
diagnóstico por imagem
Jairo Wagner (SP)
VIII – Radioterapia
Manoel Jacobsen Teixeira (SP)
Marcos Stavale (SP)
Cabeça e pescoço:
Luis Paulo Kowalski (SP)
Vergilius Araújo (SP)
João Victor Salvajoli (SP)
Ludmila Siqueira (MG)
Paulo Novaes (SP)
Robson Ferrigno (SP)
Rodrigo Hanriot (SP)
Wladimir Nadalin (SP)
Tórax:
IX – Especialidades médicas
Angelo Fernandez (SP)
Riad Naim Younes (SP)
Cardiologia:
Urologia:
Clinica Médica:
Antônio Carlos L. Pompeu (SP)
Miguel Srougi (SP)
Mario Luiz Silva Barbosa (SP)
III – Biologia molecular
Carlos de Barros Mott (SP)
Ada Alves (RJ)
André Vettore (SP)
Carlos Gil (RJ)
Helenice Gobbi (MG)
José Cláudio Casali (RJ)
Luísa Lina Villa (SP)
Maria Isabel Achatz (SP)
Geriatria:
Neurologia:
Roberto Kalil Filho (SP)
Gastroenterologia:
Wilson Jacob Filho (SP)
Ginecologia:
Jurandyr Moreira de Andrade (SP)
Pneumologia:
Carlos Roberto de Carvalho (SP)
Ano 4 • número 19
setembro/outubro 2013
Publisher Simone Simon
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Editorial Valéria Hartt
[email protected]
Reportagem Sergio Azman
[email protected]
Impressão: Ipsis Gráfica
Tiragem: 10.500 mil exemplares
ISSN: 2179-0930
Jornalista responsável: Valéria Hartt (MTb 24.849)
Colaboraram nesta edição: Charles Edouard Zurstrassen,
Edenir Inêz Palmero, Etelvino de Souza Trindade, Robson
Ferrigno, Sophia Pimenta, Ulysses Ribeiro Jr
A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades, uma publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica, traz
informações sobre oncologia a profissionais de todas as especialidades médicas. De circulação bimestral, tem distribuição nacional
e gratuita por todo o território nacional. A reprodução do conteúdo
da revista é permitida desde que citada a fonte. A opinião dos
colaboradores não reflete necessariamente a posição da revista.
Direção de arte/Prepress Ione Franco
[email protected]
Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva
Projeto Gráfico Luciana Cury
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setembro/outubro 2013 Onco&
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Perguntas e reflexões
A
LGUNS TEMAS SÃO POLÊMICOS POR NATUREZA, E
O ACESSO À INOVAÇÃO EM SAÚDE NO BRASIL ESTÁ
CERTAMENTE ENTRE ELES, AINDA MAIS QUANDO
se tem em perspectiva o tratamento do câncer. Na
edição que carrega o selo de mais um aniversário,
quando a Onco& reforça seu Conselho Editorial
com um time de elite, trazemos também um debate
de peso no mundo da oncologia. É hora de compreender os critérios para o registro e incorporação
de antineoplásicos, assim como é tempo de diminuir as disparidades na saúde público-privada e
avançar em um modelo mais comprometido com
os sentidos de equidade.
Em período recente, o país assistiu a uma explosão da chamada judicialização da saúde, que trafega
entre a visão de direito ou desvio, mas certamente
chama atenção o número de pedidos que chegam à
Justiça por medicamentos oncológicos, desafiando
o princípio da universalidade e da integralidade.
É nesse caldeirão de ideias que a revista Onco&
abre espaço à discussão de políticas públicas em
saúde, hoje uma das grandes questões nacionais,
assim como quer entender o lugar da melhor evi-
dência científica na prática médica brasileira, em
uma entrevista com Otávio Clark, da consultoria Evidências.
Para reforçar o compromisso de fazer a diferença
no dia a dia do consultório, a edição de aniversário
traz temas bem próximos da realidade da clínica cotidiana. É o caso das dúvidas sobre o papel da hereditariedade no câncer de mama, assunto que se
destacou na agenda depois que uma celebridade
com BRAC mutado anunciou a mastectomia preventiva. Também chega da clínica ginecológica a
proposta de entender o câncer do endométrio,
como diagnosticar e definir o estadiamento.
Quando a perspectiva é a saúde do homem, o
papel da radioterapia no câncer de próstata ganha
importância, em uma área ainda repleta de controvérsias. E, para se manter em dia com as novidades
da oncologia, vale conferir as modernas técnicas na
cirurgia do aparelho digestivo e o papel da radiologia intervencionista, que cresce no diagnóstico e
tratamento do câncer.
Boa leitura!
Valéria Hartt
* Jornalista especializada na
cobertura de saúde, é editora
da Onco& – Oncologia para
todas as especialidades
Contato: [email protected]
Onco&
Onco& setembro/outubro
setembro/outubro 2012
2013
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entrevista
O valor da evidência
Ele é um dos mais renomados especialistas em metodologia científica.
É com essa bagagem que Otávio Clark fala de conflito de interesses,
critica o financiamento e a gestão da saúde no Brasil, lamenta a
agonia da nossa pesquisa clínica e diz que a produção médico-científica brasileira ainda não está preparada para o modelo de evidências
Por Valéria Hartt
O
NOME É ESTRANGEIRO, HERANÇA DO AVÔ IN-
Divulgação
GLÊS, MAS
Otávio Clark
* Oncologista clínico, diretor da
Evidências Consultoria.
Contato:
[email protected]
8
setembro/outubro 2013 Onco&
OTÁVIO CLARK É MESMO UM NORDESTINO ARRETADO, DE CORURIPE, NO SUL DAS
Alagoas, terra de belas paisagens, banhada por
praias e lagoas dessas de encher os olhos.
Da tradição nordestina, ele não dispensa o sabor
do autêntico queijo de coalho e de uma boa carne
de sol. E, não fosse a cultura impregnada nos hábitos, o sotaque bastaria para denunciar a origem, persistente e bem pronunciado apesar do longo tempo
fora de casa.
Ele deixou Coruripe quando se mudou para
o Sudeste, disposto a fazer carreira na medicina.
Graduado pela Universidade Federal de Uberlândia, fez doutorado em ciências médicas pela
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e
cursou o fellowship em oncologia baseada em evidências e metodologia científica no H Lee Moffit
Cancer Center. Foi lá que aprendeu lições preciosas
com o bósnio Benjamin Djubelgovic, “provavelmente a melhor pessoa do mundo nesta área”, autor
de mais de 180 artigos peer reviewed, 140 abstracts
e dois livros publicados sobre processos de decisão
apoiados em evidência.
Clark voltou dos Estados Unidos com um agudo
senso crítico em políticas de saúde, resultado de um
aprendizado com ênfase em farmacoeconomia, metanálise, avaliação de tecnologias de saúde e auditoria de alto custo, em especial na esfera da oncologia.
Não por acaso é hoje um consultor disputado
pelo setor público e privado, que declara abertamente seus conflitos de interesse e publica críticas
contundentes nas redes sociais, onde ironiza o Brasil como um país que INGANA, praticando “impostos da Inglaterra com serviços públicos de Gana”.
Na tarde mais fria do ano em São Paulo, quando
a temperatura foi a mais baixa dos últimos 52 anos,
ele nos recebeu para um bate-papo bem-humorado
em seu escritório.
Onco& – Ter conflito de interesses é um problema ou é a solução para trafegar com mais
liberdade na fronteira do público e privado?
Otávio Clark – Se alguém tem conflito de interesses neste mundo sou eu, porque trabalhamos para
todas as áreas. Trabalhamos para as fontes pagadoras, o que significa que atuamos com o governo e
com os planos de saúde; trabalhamos para quem
vende, que é a indústria farmacêutica e a indústria
de devices, e na outra ponta também trabalhamos
com o usuário, que é o paciente, além de ter clientes entre os prestadores de serviço, que são médicos, clínicas, hospitais. Então, no nosso caso, isso
serve como um balizador, porque você não pode
dar um passo fora da linha. É muito difícil lidar
com isso, mas o que nos propusemos a fazer foi dar
uma resposta única, independentemente de quem
tenha perguntado. Faz 15 anos que estamos no
mercado e faz 15 anos que fazemos assim. Procuro
me balizar pela ciência, e não importa quem tenha
perguntado, a resposta vai ser a mesma. Às vezes,
uma fonte pagadora, como um plano de saúde ou
o próprio governo, pede uma análise que envolve
um item muito, muito caro. Se a análise mostrar
que funciona, é isso o que vamos dizer, se tem eficácia ou não, mas se não tem dinheiro para pagar a
questão é outra, já não é uma questão associada ou
não à evidência. Por outro lado, também tem gente
que nos procura e preciso ser bem claro e dizer:
“Lamento, mas o seu medicamento não funciona,
não tem evidência que suporte”. E isso, evidentemente, traz problemas sérios, porque as pessoas se
apaixonam muito por suas causas. Todo cliente
sempre espera contratar um serviço que esteja a
favor dele. Quando não estamos a favor da opinião
ou do interesse do cliente, a coisa é delicada. Por
isso sempre digo que chegamos até aqui sendo profundamente antipáticos e desagradando muita
gente, porque nosso papel é seguir a evidência, que
nem sempre corresponde ao interesse do cliente.
Onco& – Como é perseguir a evidência em um
ambiente ávido por novidades e novas promessas, como a oncologia? É um desafio a mais?
Otávio Clark – É muito difícil. Veja por exemplo
o lado do paciente, que é o mais fraco da história e
está sempre em busca de uma esperança. Ele quer
saber como pode melhorar a sua qualidade de vida,
como pode aumentar a sua sobrevida, e é muito difícil você dizer que isso não é possível, que não existem mais chances. Vamos pegar um caso concreto,
como o câncer de pulmão. Quando você entra no
estadio IV, que é um estadio avançado, em média o
tratamento vai aumentar a sobrevida em três meses,
se muito. Imagine confrontar a pessoa com essa realidade. No nosso caso, nos sentimos confortáveis
para fazer isso porque acreditamos que as melhores
decisões são as decisões informadas, doa a quem
doer – mas não é uma coisa fácil de ser feita. A literatura está cheia de exemplos que mostram que,
quando você informa adequadamente um paciente
de câncer avançado, falando para ele de todos os
riscos, dos benefícios, do que realmente vai acontecer, em 50% das vezes o paciente resolve não se
submeter a certos tratamentos de quimioterapia,
por exemplo, porque avalia que o benefício é muito
pequeno diante dos efeitos adversos, e aí ele prefere
partir para um tratamento paliativo. Mas isso não é
bem recebido, e essa informação clara, muitas vezes,
nem chega ao paciente. O paciente não gosta, o médico não gosta e, além disso, tem todo o interesse
dentro do próprio sistema de saúde, com conflitos
de interesses financeiros até, porque os produtores
de devices e a indústria farmacêutica estão sempre
tentando passar essa ideia de esperança, para que
as pessoas consumam novidades e façam girar mais
dinheiro. É o que querem os hospitais, as clínicas,
os médicos, mas nem sempre isso é o melhor para
o paciente, porque nem sempre isso é verdade. No
entanto, sabemos que a esperança vende. A primeira capa da revista Veja que anunciou que a cura
do câncer estava próxima é de 1972. De lá para cá,
todo ano temos várias reportagens como essa e a
verdade é que andamos pouco na cura do câncer
nesses 40 anos. Então, o que procuramos fazer é
alinhar um pouco as expectativas em cima de evidências. É função nossa, assim como também é
nossa função dizer a uma fonte pagadora, como o
governo ou um plano de saúde, que existem coisas
que deveriam estar sendo oferecidas no sistema de
saúde e que não estão, e que isso está sendo extremamente prejudicial para os pacientes. São em
geral medicamentos de alto custo, mas que melhoram muito a vida dos pacientes. O melhor exemplo
disso é o Glivec, para leucemia mieloide crônica
(LMC) e tumor estromal gastrointestinal (GIST),
porque é um medicamento que mudou a história
da oncologia e é um verdadeiro absurdo que não se
tenha isso disponível no mercado privado até hoje.
É uma distorção gritante.
“A literatura está
cheia de exemplos
que mostram que
quando você informa
adequadamente um
paciente de câncer
avançado de todos
os riscos, em 50%
das vezes ele resolve
não se submeter a
certos tratamentos
de quimioterapia”
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Onco& – Que caminhos você aponta para equilibrar essas duas
frentes – a demanda por inovação e o freio da custo-efetividade
na gestão da saúde?
Otávio Clark – Na saúde pública você não tem como inibir esse freio,
porque o Brasil investe muito pouco em saúde. O discurso do governo
diz que a saúde aqui é muito cara, mas isso não resiste a uma análise
apoiada em números. Os dados do Banco Mundial mostram que o Brasil investe muito pouco em saúde. Até mesmo quando você compara
os gastos de vizinhos que são até mais pobres, como Bolívia, Colômbia
e Argentina, constata que o percentual do PIB que o governo brasileiro
destina para a saúde é muito pequeno. O gasto total de saúde no Brasil
é em torno de 8% do PIB – só que, desses 8%, é bom lembrar que 5%
correspondem ao mercado privado, para atender 25% da população.
Significa que apenas entre 3% e 3,5% do PIB é que ficam na saúde
pública para atender os outros 150 milhões de pessoas, o que é um
absurdo! Então, na esfera pública, o primeiro passo para equilibrar demanda e inovação é ter investimento. Sem dinheiro não se faz saúde
pública. O governo quer mostrar que o problema está na falta de gerenciamento, que o dinheiro se perde pela corrupção e por falhas na
gestão. Não é verdade, porque na saúde pública brasileira o problema
principal é a falta de investimento. No mercado privado é que falta gerenciamento, porque o dinheiro existe mas o gargalo da má gestão provoca distorções. O médico de um plano de saúde ganha mal. Um
oncologista hoje, por exemplo, tem honorários muito baixos e recebe
cerca de 50, 60 reais para cuidar de um paciente de câncer por um
mês, o que é muito pouco. Mas disso advém a tentação de compensar
o baixo rendimento com os lucros da venda de medicamentos. É antiético, mas muita clínica privada de oncologia se vale dessa prática. A
realidade dos devices hoje é um escândalo. Virou uma bola de neve e
o cenário é realmente alarmante, com situações que beiram o limite
da ilegalidade.
Onco& – O debate sobre “medicalização” chega à oncologia com
a crítica de que muitos agentes modernos oferecem sobrevida
marginal ou carecem de mais evidências. Existe mesmo essa lógica da medicalização?
Otávio Clark – Na verdade, acho que essa história da medicalização
é no fundo uma grande bobagem. O que falta é as pessoas saberem
usar a ciência mesmo. Isso surge como aquela ideia da bala mágica,
que vem como a panaceia para resolver todos os problemas. Isso evidentemente não existe. A medicina é uma ciência probabilística, que
trabalha essencialmente com probabilidades. Se você está com dor de
garganta por causa de uma infecção, vai tomar antibiótico e todo
mundo acha que vai se curar em função do antibiótico, o que não é
verdade, porque a probabilidade é de 25%. De quatro pessoas que
tomam antibiótico, você trata uma, porque três iam se resolver sem o
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setembro/outubro 2013 Onco&
medicamento. Isso é probabilidade, mas as pessoas não aceitam. Só
que, quando o antibiótico mata por efeito colateral – e o risco é de um
caso em 1 milhão –, aí as pessoas aceitam que era probabilidade.
Então, a medicina só aceita a ideia quando é conveniente para ela, entendeu? Mas a palavra medicalização também vem da visão de que
você dá muito medicamento para condições que não precisam. Eu,
pessoalmente, não gosto desse termo, porque na saúde mental, por
exemplo, muitas pessoas são hipotratadas em razão desse discurso.
Ah, é medicalização! Não é. Doente mental, numa comparação grosseira, é como doente do pâncreas por falta de insulina. Falta alguma
coisa nesse paciente e ele merece ser tratado. O que ocorre é um discurso político-ideológico engajado que leva adiante as críticas com
essa palavra “medicalização”, e eu não gosto disso nem um pouco. Do
que precisamos? Precisamos usar a evidência científica e discriminar
uma intervenção que funciona, quando bem indicada, de uma que não
funciona. O que existe é um hiperuso de medicamentos, para qualquer
área, mas também é verdade que existe um hipoúso de medicamentos
em determinadas áreas que são estigmatizadas. Então, o nome medicalização não me soa simpático, porque traduz muito mais uma ideologia do que o compromisso com a ciência.
Onco& – Por falar em construção científica, você acha que o
médico brasileiro tem uma prática comprometida com o modelo
baseado em evidências?
Otávio Clark – Tem nada. O Brasil ainda tem um ranço autoritário,
e isso resvala para a ciência. Fulano falou é lei, porque muito pouca
gente se dispõe realmente a sentar e a estudar a evidência. Anos atrás,
o Conselho Federal de Medicina e a Associação Médica Brasileira estabeleceram as prioridades do modelo baseado em evidências e montaram aquele projeto “Diretrizes”, com cento e tantas diretrizes
publicadas. Mas o projeto inteiro foi por água abaixo, porque as pessoas foram mais para o lado da autoridade que para o lado da evidência
científica. Tem um monte de diretriz ruim, desatualizada, mas elas não
são expurgadas do trabalho simplesmente porque foi fulano que fez,
da sociedade tal, e ninguém se atreve a mexer. Fica intocado. Então, a
produção médico-científica no Brasil ainda não está preparada para o
modelo de evidências. Claro que algumas áreas caminharam um pouco
mais, e a oncologia está entre elas, mas a imensa maioria não tem esse
olhar e não valoriza a evidência. Existem conceitos básicos, como o de
risco absoluto e risco relativo. Então, se eu pergunto qual foi o país do
mundo que mais cresceu em PIB no ano passado, todo mundo vai
dizer que foi a China – mas foi Angola, onde o PIB cresceu 13%. E
por que é que ninguém fala de Angola? Porque o PIB de Angola é nada,
porque a base é muito baixa. Então veja que 13% é o crescimento relativo. Já nos Estados Unidos, o crescimento foi de apenas 1% e todo
mundo fala dos Estados Unidos, porque a base é muito alta. Esse é o
risco absoluto. Essa mesma lógica vale para a medicina. Eu tenho 30% de chance a mais de melhorar. O que eu estou dizendo? Estou dizendo que,
se eu tomar um remédio, eu tenho 30% a mais de
chance do que o outro que não tomar. Mas isso
também não diz muita coisa. O que eu preciso
saber é que, se eu não tomar o remédio, tenho 2%
de chance, e se tomar, tenho 5%. É essa diferença
que importa, são esses 3% que fazem a diferença, e
isso o médico não sabe interpretar, uma diferença
básica entre risco relativo e risco absoluto.
“Ninguém espera
que o governo
incorpore tudo, mas
o que não se admite
é que evidências
consagradas sejam
desconsideradas, e
é isso que está
acontecendo. É uma
deturpação do
método, por desvio
ideológico”
12
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Onco& – Mas é sempre possível exigir que a medicina cumpra esse rigor com a obtenção de
dados duros?
Otávio Clark – Não, de jeito nenhum. No começo
se pecou muito, e os teóricos da medicina baseada
em evidências achavam que era preciso fazer estudo
randomizado para tudo, mas hoje avançamos bastante. O que não se admite é que você aplique a exceção à regra. Na maior parte das situações é
possível buscar evidências robustas, principalmente
para as patologias mais prevalentes, como diabetes,
as cardiopatias ou os casos de câncer mais comuns.
E para uma doença rara, como fazer um estudo
grande e randomizado? Não tem como! Muitas
vezes essa ênfase na melhor evidência também serve
como argumento para frear despesas na saúde. O
governo fez muito isso, não sei se por falta de preparo ou por preparo político demais. Muitas das publicações do governo que dizem não ter evidências
de longo prazo na realidade usam isso como uma
desculpa para não incorporar a tecnologia, o que é
comum. Os últimos dossiês da Conitec têm se utilizado muito desse expediente. O doutor Chiattone,
da Sociedade Brasileira de Hematologia, deu uma
entrevista para um grande veículo e falou sobre o
Mabthera para linfoma do manto. E ele dizia exatamente isso, que ninguém espera que o governo
incorpore tudo, mas que o que não se pode admitir
é que evidências consagradas sejam desconsideradas
porque o governo diz que não funcionam. É exatamente isso o que está acontecendo, uma deturpação
do método, por desvio ideológico. No caso de incorporação de novas tecnologias pelo governo, é
muito claro que eles estão pesando a mão demais
nessa metodologia. Tem aquela história que Tom
Jobim dizia, que tudo o que tem no Brasil que não é
jabuticaba não presta. Como você explica que medicamentos que funcionam no mundo inteiro, reconhecidos pelas agências de avaliação do mundo
inteiro, não funcionem aqui, porque os órgãos reguladores brasileiros simplesmente dizem que não funcionam? E certos planos de saúde fazem a mesma
coisa, pegam um estudo que foi patrocinado pela indústria e dizem que não vale nada porque tem conflito de interesses. Já vi muita avaliação assim, e isso
não tem rigor, é uma clara deturpação do método.
Onco& – Realmente uma questão bem presente
no tratamento do câncer é como entender que
medicamentos aprovados por órgãos reguladores
de mais de 70 países tenham sido negados pela
Anvisa sob argumento da falta de evidência.
Otávio Clark – Pura ideologia. Nós não temos
acesso à avaliação inteira da Anvisa, porque o processo é sigiloso. A indústria submete um dossiê de
registro e a Anvisa retorna com a resposta, mas não
se sabe o que aconteceu no meio do caminho, não
temos acesso a esses dossiês. O que sabemos é que
medicamentos largamente usados lá fora tiveram o
registro negado no Brasil e sai só uma notinha no
Diário Oficial dizendo “em não conformidade com
a legislação”. O que podemos afirmar é que vários
medicamentos aprovados em muitos países para
determinada indicação não estão disponíveis no
Brasil porque a Anvisa rejeitou. O que nos parece,
fazendo esse paralelo, é que existe alguma trava
dentro da Anvisa para aprovar esses medicamentos.
Onco& – É a custo-efetividade?
Otávio Clark – Não, porque a Anvisa não faz avaliação de custo-efetividade, faz avaliação de eficácia.
A Anvisa faz avaliação de eficácia. O processo de
incorporação de tecnologia no Brasil tem duas etapas e meia. A primeira é regulatória, que é a avaliação de segurança e eficácia da Anvisa. A segunda
etapa é a briga de preços no CMED, o que é natural
numa negociação, e finalmente temos a submissão
à Conitec, porque depois que passou pela aprovação regulatória e pela avaliação de preço, o governo
vai decidir se vai ou não pagar a conta e colocar na
cesta do SUS. O que acontece é que muita coisa não tem entrado porque a Anvisa fecha a porta. Vários medicamentos que já estão aprovados em países do mundo inteiro foram negados pela Anvisa para o
paciente brasileiro. Causa estranheza, mas não sabemos os detalhes
desses processos. O que não se consegue entender é a bagunça regulatória, porque é realmente uma bagunça o que acontece no Brasil!
Existem medicamentos que a Anvisa aprovou para uma indicação, reconheceu que era inovador e mais adiante a Conitec disse que não
funcionava. O Geftinibe é um exemplo: a Anvisa aprovou para uma
indicação, deu um preço diferenciado para esse medicamento porque
achou que a indicação merecia e a Conitec voltou dizendo que ele não
funcionava. Como pode? Falta transparência. Você sabe que informações o seu dossiê tem que conter, mas você não sabe como esse dossiê
vai ser julgado, porque os critérios não são claros. Nos Estados Unidos
existem manuais regulatórios que definem, por exemplo, qual o endpoint válido; na Inglaterra há manuais sobre custo-efetividade e tudo
isso é muito transparente, com um processo aberto. Aqui no Brasil, ao
contrário, não sabemos como as coisas são julgadas. Ninguém espera
que o governo incorpore tudo, mas deturpar a informação e dizer que
não tem evidência, aí não dá. Se ele dissesse “olha, o efeito é pequeno
e não temos dinheiro para pagar porque temos outras prioridades de
investimento”, eu estaria aqui fazendo um elogio às políticas do governo. O que não pode acontecer é ignorar a ciência, que é o que eles
estão fazendo. E por quê? Porque, se o governo admitir que não pode
assumir esse custo, vai ter que abrir uma discussão sobre financiamento da saúde no Brasil, debater a relação público-privada na saúde.
e parece que essa discussão não pode ser aberta. Faltam transparência
e participação, porque, por outro lado, a sociedade não participa, não
é costume do brasileiro fazer o seu exercício de cidadania.
Onco& – A pesquisa clínica brasileira também tem sido criticada,
e a Conep, que veio como a solução do CNS para botar ordem na
casa, acabou funcionando às avessas, tido hoje com um entrave a
mais. É um viés ideológico ou a nossa velha burocracia?
Otávio Clark – É um pouco de tudo e também uma visão de mundo
das pessoas que estão lá. É uma visão antiga, paternalista, de quem
acha que pode comandar as massas. Eu sou de uma ideologia e de uma
geração que acredita na autonomia. Eu acho que, se o paciente quer
participar de uma pesquisa clínica, bem informado e esclarecido, ele
tem todo o direito. Mas a Conep acha que tem uma capacidade supe-
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rior de julgar e, como é paternalista, acha que os pacientes são os coitadinhos que vão ser explorados, assim como teme a indústria global.
E não é isso, o mundo mudou, século 21, globalização, não dá para
ter esse ranço, o país precisa se modernizar. O resultado é que o Brasil
fica para trás, e já se fala na agonia da pesquisa clínica brasileira. As
pessoas querem fazer, mas o governo impõe um sistema que não funciona e não tem a coragem de reconhecer que errou. Ao contrário,
ainda fica insistindo no erro. Isso traria riqueza, desenvolvimento para
o país, qualificação de pessoal, qualificação de centros... realmente não
sei o que se pode perder com isso. É uma visão política de mundo, e
com ela a pesquisa brasileira dá um passo atrás.
Onco& – E sobre a questão dos genéricos, que também desperta
polêmica, qual a sua visão? É um olhar sustentável a longo prazo?
Otávio Clark – O genérico precisa existir e ponto. Eu tenho uma série
de restrições à forma como os genéricos são tratados no Brasil, mas
pensando globalmente eles precisam existir. Se você não tiver perda
de patente, não há estímulo à inovação. Ninguém pode viver eternamente em razão de uma descoberta, e perder a proteção em um
determinado ponto é saudável para que outra inovação venha. O
genérico veio exatamente com essa ideia de estímulo à inovação. A cenoura pode vir na frente ou atrás do cavalo e essa é a cenoura atrás do
cavalo. Um dia ele tem que perder aquela patente. O que se discute é
o tempo, quanto tempo ele fica com aquela patente, mas em algum
momento essa perda da proteção tem que acontecer. E ao mesmo
tempo, quando você segue essa lógica, consegue baratear o preço do
tratamento, porque as drogas já cumpriram seu ciclo de inovação e
ganham uma versão genérica. O que não pode é produção de genérico
matar a inovação da matriz. Tudo precisa ser dosado para que essa política seja estimulante, mas nunca repressora da inovação. O problema
é que aqui no Brasil você não tem estímulo nenhum à inovação, o que
o governo tenta é estimular a inovação em cima do desenvolvimento
de genéricos e dos biossimilares, mas nem isso temos conseguido fazer.
E por quê? Simplesmente porque o estímulo que o Brasil está dando
à produção de genéricos está matando a nossa capacidade inovadora.
Quem tem potencial para investir na inovação e nas pesquisas de
novas moléculas vai se dispor a passar por essa burocracia toda de
Conep, Anvisa, Conitec? Que nada! Vai é partir para produzir genérico,
e é isso o que está acontecendo no Brasil, um estímulo ao genérico e
a agonia da inovação.
capa
Racionar ou racionalizar
Indústria, sociedades médicas e organizações de pacientes se
queixam da falta de critérios claros no registro e na incorporação
de medicamentos oncológicos
Por Valéria Hartt
D
ECRETO ASSINADO PELA PRESIDENTE DILMA
ROUSSEFF E PUBLICADO NO ÚLTIMO DIA 15 DE
AGOSTO CONFERE NOVAS ATRIBUIÇÕES À AGÊNcia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em
nota à imprensa, a Anvisa considera que o documento “aprimora o processo regulatório e otimiza os
procedimentos para o licenciamento de vacinas, medicamentos, insumos farmacêuticos, cosméticos e
outros produtos sujeitos à vigilância sanitária”. A novidade, no entanto, não conseguiu aplacar as críticas
de que a regulação no Brasil não tem critérios claros
para o registro dos medicamentos oncológicos e que
classes terapêuticas importantes para a sobrevida de
pacientes de câncer estão sendo negadas pela Anvisa.
Um dia depois do anúncio oficial, um workshop em Brasília colocou em xeque os critérios da
agência reguladora e mostrou que nos últimos 12
meses pelo menos cinco solicitações de novas drogas oncológicas foram negadas no país – quatro
delas já aprovadas nos Estados Unidos e em vários
países da Europa, Ásia e América Latina para tratamento de câncer de cólon, pulmão e rim. O encontro, promovido pela Interfarma, reuniu especialistas
em políticas públicas e autoridades sanitárias brasileiras e revigorou o debate em torno do acesso à
inovação no tratamento oncológico. Além da Anvisa, também a Comissão Nacional de Incorporação
de Novas Tecnologias no SUS (Conitec) e seus critérios de incorporação estão em pauta, assim como
16
setembro/outubro 2013 Onco&
a Agência Nacional de Saúde (ANS), que regula a
saúde suplementar. Afinal, as perspectivas para
2014 são mesmo mais animadoras? O que esperar
do acesso aos novos medicamentos para o tratamento do câncer?
Não existem respostas simples, mas um breve
panorama da regulação brasileira pode ajudar a
compreender o cenário.
A Anvisa surpreendeu com a criação de um
comitê científico para auxiliar nas decisões técnicas
de novos registros, além de instituir regras para o
acesso a medicamentos inovadores ainda não
disponíveis no mercado. Ficam aprovados os programas de acesso expandido, assim como o uso
compassivo e o fornecimento de medicamento pósestudo clínico de fase III.
A ANS cobrou a conta do setor privado e, a partir de janeiro de 2014, os planos de saúde são obrigados a assumir a cobertura de medicamentos de
uso oral. A lista encaminhada para consulta pública
(CP nº 53) continha 36 medicamentos para mais
de 50 tipos de câncer, incluindo tumores de mama,
próstata, pulmão e rim.
Na esfera pública, é a Conitec quem decide o
que entra e o que sai da lista do SUS, o que vale
para novos medicamentos, produtos e procedimentos, alteração de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas.
Mas não é decisão fácil atualizar a oferta de op-
ções terapêuticas na atenção oncológica. A cada
ano, inúmeros medicamentos são lançados pela indústria farmacêutica e a oncologia responde por
uma demanda importante. Afinal, o complexo produtivo e industrial da saúde é uma das áreas de negócio que mais crescem no mundo, com um apetite
voraz por inovação. O que trazer para o SUS e o
que deixar de fora? Que contrapartida a saúde suplementar deve assumir?
Inovação no SUS
Criada por força de lei (Lei 12401/ 28 de abril
2011 e Decreto 7646/ 21 dezembro de 2011), a Conitec foi a opção definida pelo MS para substituir a
Comissão de Incorporação de Tecnologias (Citec),
que teve uma atuação tímida. Instituída em 2006,
a Citec recebeu 260 pedidos para aprovação de medicamentos e aceitou 61 (23%) durante sua vigência, com média de 7,2 incorporações por ano.
Nesse período, a oncologia respondeu por 31 demandas e obteve oito aprovações (25%), segundo
dados da Interfarma.
A Conitec mostra em números uma produtividade maior, com a média de 29,6 incorporações por
ano. Até julho de 2013, a Comissão analisou 175 pedidos de medicamentos, 96 deles da indústria, além
de outras 34 solicitações do próprio Ministério.
Para Clarice Alegre Petramale, diretora da Conitec, o Brasil deixou para trás a fase em que buscava ter acesso às tecnologias de ponta em saúde,
só existentes em centros no exterior. A fase atual,
segundo ela, é marcada pela hiperoferta de produtos, de marcas, tipos e modelos diferentes. “Isso aumenta a complexidade da análise que o sistema de
saúde tem que desenvolver para se modernizar com
racionalidade”, argumenta. “O mais importante é a
avaliação ser transparente, baseada em evidências,
portanto inteligível em qualquer lugar do mundo,
e ter um prazo de análise, porque o objetivo final é
permitir que o paciente tenha acesso a essas novas
tecnologias. São essencialmente esses três critérios
que diferenciam a Conitec da Citec”, explica ela.
A webpage da Comissão registra que na base da
decisão de incorporar ou não um novo agente no
Sistema Único de Saúde estão as análises de custobenefício, custo-efetividade e custo-minimização.
Mesmo com os números em ascensão e tantos
critérios, a atuação da Conitec desperta críticas.
A indústria se queixa de que a Conitec praticamente só incorpora o que é pedido pelo governo.
Uma análise realizada pela Interfarma mostra que,
das 34 submissões que geraram incorporação até
julho deste ano, apenas três têm indicação para oncologia – dois pedidos para o trastuzumabe, além
do interferon alfa, usado no tratamento de alguns
tipos de leucemia, linfomas e melanoma.
Ao detalhar o perfil dessas 34 aprovações, só
21% (7) não são pedidos do próprio governo; outros 41% (14) são tecnologias antigas que o Ministério quer incorporar; e 38% (13) são transferência
de tecnologia, as chamadas Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) (Figura 1).
Quando o demandante não é o governo, nenhum dos medicamentos aprovados tem indicação
para o tratamento do câncer. “É o Ministério quem
pede e o Ministério quem concede”, resume Antonio
Britto, presidente executivo da Interfarma, para
quem a Conitec avançou em termos de prazos mas
ainda não conseguiu resolver a essência do problema. “Hoje, quando abre um processo para análise
de incorporação, já abre querendo negar, na regra
do não vi e não gostei. Enquanto não se resolver
uma equação de acesso, órgãos como a Anvisa e a
Conitec estarão a serviço da restrição”, completa.
A crítica encontra ressonância na voz da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), para
quem muitos dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos não são absorvidos pelo sistema público
com a rapidez necessária.
“São milhões de pacientes que deixam de se beneficiar de novas drogas”, diz o oncologista Anderson Silvestrini, presidente da SBOC.
As organizações de defesa dos pacientes reforçam o coro e pedem agilidade. “O fornecimento do
trastuzumabe, por exemplo, chegou com dez anos
de atraso para as mulheres do sistema público com
HER2+. Estamos falando de um câncer agressivo, e
a doença não espera”, diz a médica Maira Caleffi,
presidente da Federação Brasileira de Instituições
Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama).
“Não é de hoje que temos lutado também pelos quimioterápicos de referência via oral, e a palavra referência é importante, porque estamos brigando pelo
acesso, mas o acesso com qualidade”, distingue.
A Conitec argumenta que a gestão do SUS tem
se concentrado em qualificar o processo de incorporação de tecnologias em saúde e direcionar os recursos existentes para aquelas que realmente fazem
a diferença no cuidado ao paciente. Em relação à
aprovação visivelmente maior dos pedidos internos,
acha “perfeitamente aceitável” e explica:
“Quando um pedido de incorporação do Minis-
“Quando abre um
processo para análise
de incorporação, já
abre querendo negar,
na regra do não vi e
não gostei. Enquanto
não se resolver uma
equação de acesso,
órgãos como a
Anvisa e a Conitec
estarão a serviço
da restrição”
Onco& setembro/outubro 2013
17
tério vem para a Conitec, já cumpriu todo um estudo e tem orçamento
para bancar essa nova tecnologia. Significa que já fizemos um trabalho
de bastidores para analisar evidência, eficácia e segurança, além do
plano logístico de incorporação, que é muito importante na negativa
hoje. Portanto, é natural que as demandas internas sejam mais facilmente aprovadas, porque já foram aperfeiçoadas”.
Figura 1
A mesma lógica, segundo ela, foi aplicada a pelo menos dois dos
itens incorporados à atenção oncológica. “No caso do trastuzumabe
e do rituximabe, também houve um aperfeiçoamento da proposta
pelo Ministério.”
Queda de braço
A Agência Nacional de Saúde (ANS) nasceu pela Lei nº 9.961, de
28 de janeiro de 2000, para regular a saúde suplementar. Desde então,
trava-se uma verdadeira queda de braço em relação aos critérios de
cobertura, mais ainda no tratamento oncológico. A ANS endureceu e
desde maio de 2012 exige que qualquer negativa de atendimento ao
paciente seja feita por escrito. Os planos de saúde têm até 48 horas
para explicar as recusas no atendimento, em linguagem clara e simples.
Simples? Nem tanto. Apesar da exigência da ANS, o direito muitas
vezes não é atendido.
E a polêmica já começou em torno do novo rol de medicamentos
para câncer, que deve ser ofertado a partir do próximo ano pelos planos de saúde.
Atualmente, cerca de 40% dos tratamentos oncológicos são feitos
em ambiente domiciliar, em um modelo bem diferente do praticado
uma década atrás, quando a quimioterapia era realizada em regime de
internação hospitalar ou ambulatorial.
“Foi uma mudança enorme, e com ela tínhamos um problema legal
para ser vencido, que é o artigo 10 da Lei 9656, que diz que as operadoras não são obrigadas a oferecer medicação domiciliar”, diz Martha
Oliveira, gerente-geral de regulação assistencial da ANS.
O primeiro passo foi dado em outubro de 2012 com a Resolução
Normativa Nº 310 publicada pela ANS, que estabeleceu princípios
18
setembro/outubro 2013 Onco&
para a oferta de medicação de uso domiciliar para portadores de patologias crônicas, inclusive com incentivos para as operadoras. Agora,
não se trata mais de deixar a assistência farmacêutica na esfera da oncologia à livre escolha dos planos de saúde. “Depois de um amplo debate técnico e jurídico, temos finalmente um embasamento para
propor a inclusão de um novo rol de medicamentos na saúde suplementar”, explica Martha.
Os critérios definidos para a revisão do rol partiram do Grupo Técnico de Assistência Farmacêutica, composto por servidores da ANS e
representantes de operadoras, sociedades médicas e associações da indústria. A Conitec pautou os debates, mas a análise foi além. “Ficaríamos com uma lista bastante reduzida tendo por base apenas as
tecnologias já analisadas pela Conitec. Então, tomamos a decisão de
discutir desfecho em oncologia, o que é sempre muito difícil.”
A gerente-geral de regulação assistencial da ANS prossegue, enumerando as etapas e os critérios que embasaram a decisão. O Grupo
Técnico partiu da listagem fornecida pela Anvisa de todos os medicamentos de uso oral registrados para a oncologia e expurgou os agentes
off-lable, “que não são regulamentados como de uso obrigatório para
nenhum tipo de tratamento, inclusive para o câncer”. A etapa seguinte
compreendeu a análise dos medicamentos com registros em bula. “Relacionamos aqueles que na avaliação de efetividade mostraram os desfechos mais positivos. Alguns medicamentos ficaram de fora, sim, e
algumas indicações ficaram de fora, sim, mas foi uma decisão de consenso”, garantiu.
O chamado Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde é obrigatório para todos os planos de saúde contratados a partir da entrada
em vigor da Lei nº 9.656/98, os chamados planos novos, ou aqueles
que foram adaptados à lei. Para as operadoras que não cumprirem, as
multas são de até R$ 80 mil.
Agora, a ANS se debruça sobre as contribuições da consulta pública, encerrada no último dia 6 de agosto. Resta saber como se dará
o cumprimento da cobertura dos quimioterápicos no ano que vem,
mas a saúde suplementar já deixou claro que a medida vai refletir no
bolso do segurado.
“É um cálculo atuarial. As exigências da ANS vão certamente encarecer o serviço“, diz o presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (ABRAMGE), o médico Arlindo de Almeida. “As pessoas
evidentemente vão perder o direito de ter um convênio médico, porque não terão condição de pagar. A população e os planos coletivos,
mantidos por empresas, não vão absorver esses custos”, alerta ele, que
discute a própria sustentabilidade da proposta da ANS.
“Toda incorporação de tecnologia leva certamente a um impacto
econômico-financeiro, que é diferenciado e vai variar para cada operadora, de acordo com o maior ou menor grau de cobertura”, diz a gerente-geral de regulação da ANS. “A partir do momento que o rol é
publicado, ele passa a ter seu impacto monitorado e no intervalo de um
ano sabemos o dado real. Portanto, o que vai valer a partir de 2 de janeiro de 2014 terá seu impacto apontado em janeiro de 2015”, esclarece.
Não é preciso ter bola de cristal para prever que muitas das 1.121
operadoras e seguradoras que integram a saúde suplementar terão de-
safios pela frente. O último Mapa Assistencial, um relatório publicado
pela ANS em abril deste ano, já sinalizava a necessidade de qualificar
a gestão da assistência na saúde suplementar. Basta dizer que os planos
de saúde no Brasil pedem o dobro das ressonâncias magnéticas se
comparados aos países da OCDE, diz o estudo da ANS.
Anvisa muda regras de acesso
A Anvisa incorporou novas regras para o acesso a medicamentos
inovadores ainda não disponíveis no mercado. A medida beneficia pacientes portadores de doenças debilitantes e graves para as quais não
existe medicamento ou cujo tratamento disponível é insuficiente.
Ficam aprovados os programas de acesso expandido, assim como o
uso compassivo e o fornecimento de medicamento pós-estudo clínico
de fase III.
O Programa de Uso Compassivo é uma autorização para que a indústria execute determinado programa assistencial no Brasil, fornecendo medicamento novo, promissor e ainda sem registro aqui. O
programa também permite a importação de medicamentos que tratam
doenças raras e graves não registrados no país.
A segunda forma de participação é o Acesso Expandido, também
um programa que abre a possibilidade de acesso a medicamento novo,
promissor, ainda sem registro na Anvisa ou não disponível comercialmente no país. A diferença, neste caso, é que o medicamento deve
estar em estudo clínico de fase III, em desenvolvimento ou concluído.
Público X privado na saúde brasileira
Uma das grandes dicotomias é a relação público x privado na
saúde brasileira. Quando aprovou a criação do SUS, nos anos 80,
o país optou por uma estrutura híbrida, na qual convivem gestão
pública e privada, em um modelo que prevê a hierarquização e a
regionalização do atendimento.
Hoje o país tem 49,2 milhões de usuários na saúde privada, o
equivalente a 25,9% da população, segundo dados da PNAD 2008,
o que significa que mais de 140 milhões de brasileiros dependem
exclusivamente da esfera pública. Mas, enquanto o setor privado
gasta 5% do PIB para manter sua base, o Estado desembolsa outros
3,6% para dar conta de todo o resto da população brasileira. A
conta não fecha.
O sistema padece de subfinanciamento. O cálculo foi feito pela
Organização Mundial de Saúde (OMS, 2012), que comparou o
gasto per capita com saúde pública no Brasil ao de outros países do
mundo, em moeda pareada segundo o poder de compra. E concluiu
que o gasto público total per capita com saúde no Brasil representa
menos da metade (47%) do gasto total, que inclui o gasto privado
das famílias (53%). Ficamos atrás de outros países da América Latina, como Argentina, Chile, Colômbia e México.
O desembolso direto, apontado pela OMS como a forma mais
20
setembro/outubro 2013 Onco&
A última modalidade é o Programa de Fornecimento de Medicamento Pós-Estudo. Significa que pacientes que participaram de
pesquisa clínica e se beneficiaram de medicamentos durante o desenvolvimento têm garantido o acesso. De acordo com a resolução, cabe
à indústria prover a oferta gratuita de medicamentos aos voluntários
que participaram da pesquisa e que se beneficiaram do medicamento
durante o desenvolvimento clínico.
Critérios
É basicamente a Lei 6360/76 que dispõe sobre as atividades da
Anvisa, agência cuja competência considera não apenas a regulação
sanitária, como também a regulação econômica do mercado. Com tamanho poder de alcance, a agência atrai críticas sobre os critérios de
análise e os tempos regulatórios.
Estudo realizado pela consultoria Evidências comparou os critérios
da Anvisa e das agências reguladoras Food and Drug Administration
(FDA) e European Medicines Agency (EMA) na análise de cinco medicamentos. O primeiro dos cinco agentes é empregado no tratamento
de linfoma. Aqui, o estudo mostra que os critérios da Anvisa, FDA e
EMA foram convergentes. No entanto, o medicamento para sarcoma,
segundo item avaliado, foi indeferido pela Anvisa, mas aprovado pelos
órgãos reguladores dos Estados Unidos e da Europa. O medicamento
também teve sua evidência reconhecida em países como Canadá, Argentina, Chile, Rússia, Austrália e Nova Zelândia.
iníqua e excludente de financiamento, é, paradoxalmente, maior
que o gasto público, configurando na prática os contornos de um
sistema pluralista, com gasto majoritariamente privado, em contraste com a universalidade do SUS apregoada por preceito constitucional. No mundo real, mais da metade das necessidades de saúde
de um brasileiro é paga pelo próprio cidadão, e não pelo Estado.
E, sem financiamento, fica mesmo difícil falar em universalidade
e integralidade no atendimento à saúde. Acumulam-se as críticas
de que a União tem progressivamente se desresponsabilizado pelo
financiamento à saúde, e os números confirmam. Em 2000, o governo federal participava com 58,6% do total de gastos, mas a presença da União encolheu, tendo chegado a 43,4%, em 2008, e a
45,4%, em 2011.
A Fiocruz dimensiona o desafio no estudo A saúde no Brasil em
2030: diretrizes para a prospecção estratégica do sistema de saúde
brasileiro” (Fiocruz, 2012). Em relação ao panorama da oncologia
brasileira, reconhece que “as taxas de sobrevivência estão abaixo
daquelas observadas em países desenvolvidos, refletindo diagnóstico tardio e falhas nos tratamentos”. O estudo também admite que
“o Brasil apresenta baixo gasto público per capita e baixo comprometimento do gasto público em saúde, mesmo se comparado a outros países da América Latina”.
Os três medicamentos que completaram o estudo comparativo
são para câncer do colo (C1), rim (R1) e pulmão (P1). A conclusão
do documento é que houve mudanças nos critérios da Anvisa. “No
caso dos quatro medicamentos negados, o órgão regulador brasileiro
difere da posição adotada por outras agências internacionais, assim
como destoa de critérios que já utilizou na avaliação de outros remédios para a mesma finalidade, que receberam aprovação“, esclarece
Otávio Clark, diretor da Evidências (e entrevistado nesta edição).
“A maior dificuldade é que, sem critérios claros, fica até difícil entender o que tem motivado as negativas”, diz Silvestrini, da SBOC.
“Que endpoints, afinal, são considerados aceitáveis?”, levanta.
A Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH) é outra que discute os critérios da Anvisa e
lembra que o medicamento lenalidomida, utilizado em mais de 80
países e aprovado pela FDA e pela EMA, ainda não tem sua eficá-
Direito ou distorção?
A judicialização da saúde chega no esteio da abertura democrática, da visão da saúde como um direito social e de uma dose extra
de protagonismo cidadão. Nesse caldeirão, entram questões que
vão da política de ciência, tecnologia e inovação à assistência farmacêutica; da gestão da saúde ao controle social.
“É um tema superlativo, e deve ser enfrentado sem rodeios em
razão do número cada vez mais frequente de decisões administrativas e judiciais referentes ao pleito de cidadãos na busca por essa
garantia elementar.” É essa a visão do ministro Joaquim Barbosa,
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), expressa na abertura do seminário Direito
à Saúde, realizado no início de junho em Brasília.
Comparação da evolução dos gastos com decisão judicial e a incorporação de medicamentos
do Componente Especializado à lista do SUS (em número de vezes) Brasil: 2005-2010
35,0
33,3
30,0
25,0
20,0
19,2
15,0
10,0
6,0
5,0
0,0
0,00
2005
Fonte: DAF/SCTIE/MS
2,8
1,02
2006
1,01
2007
1,05
2008
1,05
2009
1,42
2010
Evolução dos gastos com decisão judicial
Evolução da incorporação de medicamentos de alto custo à lista do SUS
Superlativo, diz o ministro. E a oncologia responde por uma
parcela importante das demandas que chegam à Justiça. Agentes
como sunitinibe, rituximabe, sorafenibe, cetuximabe e bortezomibe
aparecem entre as 20 demandas judiciais na saúde com maior im-
22
setembro/outubro 2013 Onco&
cia reconhecida no Brasil para o tratamento dos pacientes de mieloma múltiplo.
Douglas Simões Costa Souto, que representou a Anvisa no workshop realizado pela Interfarma em Brasília, contestou a falta de critérios
e informou que, entre 2003 e 2013 a agência recebeu 346 solicitações
de registro, das quais 277 foram aprovadas e 69 reprovadas.
Um time de peso se dispõe a apontar novos caminhos. Agora, uma
comissão científica passa a assessorar a Anvisa, com participantes do
calibre de Carlos Gil Moreira Ferreira, diretor de Pesquisa Clínica do
Instituto Nacional de Câncer (Inca), e Paulo Hoff, diretor-geral do
Icesp e do Hospital Sírio-Libanês. A chamada Comissão Científica
(CCVISA) foi instituída no último dia 14 de agosto com sete integrantes, que terão mandato de três anos.
A ideia é contribuir com a avaliação e regulação de novas tecnologias e assessorar nos temas de caráter técnico-científico.
pacto nos custos do Estado em 2011.
O debate vem crescendo. Estudo realizado pela Advocacia Geral
da União (AGU) mostra que em 2009 foram 10.486 novas ações;
em 2010, 11.203; e em 2011 as demandas somaram 12.436 processos na Justiça.
Os gastos com compras não programadas para aquisições de medicamentos, insumos e equipamentos para cumprir as demandas
judiciais alcançou cifras significativas. O estudo da AGU mostra
que em 2009 as despesas para cumprir demandas judiciais na
saúde chegaram a R$ 83.165.223,93; em 2010 o valor totalizou
R$ 124.103.206,10, para atingir em 2011 a cifra de R$ 243.954.000,00.
Fórum nacional
O governo começou a preparar a reação em maio de 2009,
quando o Senado Federal decidiu abrigar em Brasília o fórum Medicamentos, Políticas Públicas e Judicialização da Saúde. Foi o primeiro de uma série de encontros desde que o projeto de lei nº 219
de 2007, do Senado Federal, estabeleceu a oferta de medicamentos
pelo SUS somente com base em prescrições amparadas em protocolos clínicos aprovados pelo Ministério da Saúde.
Em abril de 2010, o CNJ instituiu o Fórum Nacional do Judiciário, para monitorar as demandas de assistência à saúde. Em dezembro de 2011, representantes dos Comitês Estaduais do Fórum
discutiram em Brasília as diretrizes para atuação dos magistrados.
Mais uma tentativa de inibir o impacto da judicialização veio
no fim de abril deste ano, quando o Conselho Nacional de Saúde
criou o Comitê Organizador do Fórum Nacional do Judiciário,
“para monitoramento e resolução das demandas de assistência à
saúde” (Portaria nº 70 de 30 de abril de 2013).
Como saldo, fica o dever de casa de estabelecer uma nova relação Estado-Sociedade, capaz de refletir sobre caminhos mais propositivos para a regulação sanitária brasileira e a inovação na saúde.
imagem
O papel da radiologia intervencionista
no diagnóstico e tratamento do câncer
O
S CUIDADOS COM O PACIENTE COM CÂNCER
Divulgação
VÊM EVOLUINDO DE FORMA IMPRESSIONANTE.
Charles Edouard Zurstrassen
* Médico diretor do Departamento
de Radiologia Intervencionista do
A.C.Camargo Cancer Center
Contato:
[email protected]
24
setembro/outubro 2013 Onco&
MELHORIAS NAS TÉCNICAS CIRÚRGICAS, ESquemas quimioterápicos e na radioterapia têm
elevado de forma surpreendente a sobrevida e melhorado a qualidade de vida dos pacientes. Com os
avanços nos métodos de imagem e a necessidade
de buscar tratamentos mais eficazes e ao mesmo
tempo menos agressivos, vem crescendo na escola
oncológica a representatividade da radiologia intervencionista. Assim, é necessário conhecer métodos
de imagem, como a angiografia por subtração digital, a tomografia computadorizada e a ultrassonografia, isso associado ao conhecimento do arsenal
de instrumentação, que é fundamental, como cateteres, introdutores vasculares, drenos, balões, agulhas e próteses.
Neste texto, a proposta é demonstrar os principais tratamentos realizados pela radiologia intervencionista no cenário oncológico, aqui discriminados
em procedimentos vasculares e não vasculares, apenas para fins de entendimento.
Os procedimentos vasculares têm como base a
angiografia diagnóstica. Uma grande variedade de
situações em oncologia cursa com alterações do padrão vascular do órgão doente, o que nos permite
reforçar a hipótese diagnóstica e ainda realizar tratamento através do mesmo cateter.
Por meio dessas imagens conseguimos, por um
acesso vascular em um ponto remoto, nos guiar
pelo sistema circulatório, tanto arterial como venoso, a fim de alcançar o território alvo do estudo,
realizar o diagnóstico angiográfico e, dependendo
da situação, também realizar o tratamento.
Dos procedimentos intervencionistas vascula-
res, os mais utilizados pela especialidade em oncologia são a emboloterapia, as recanalizações vasculares e a quimioterapia intra-arterial.
A emboloterapia consiste na oclusão intencional
de um leito vascular definido através de um acesso
vascular à distância. Esse método pode ser empregado tanto no território arterial como venoso.
A embolização arterial é um dos procedimentos
mais realizados pela radiologia intervencionista na
oncologia. Quadros hemorrágicos em vísceras sólidas ou ocas são passíveis de tratamento eficaz, sem
a necessidade de explorações extensas. Para isso são
necessários um acesso vascular seguro e cateteres,
que, guiados por técnicas de angiografia, acessam
a área doente e, por meio da embolização, são capazes de interromper o sangramento.
Também é possível o tratamento do câncer através da embolização arterial. Com o uso da oclusão
superseletiva de um território vascular definido, podemos produzir necrose de tecido tumoral por intermédio da produção de efeito isquêmico. Entre as
lesões mais tratadas por esse método, podemos citar
o carcinoma hepatocelular e os tumores neuroendócrinos e colorretais metastáticos para o fígado.
No tratamento dos tumores hepáticos é frequentemente realizada a associação da embolização
com a quimioterapia intra-arterial, procedimento
chamado de quimioembolização transarterial. A administração de quimioterápicos diretamente no
tumor pela via arterial permite concentrações teciduais elevadas de droga, com menores concentrações sistêmicas e consequentemente menores efeitos colaterais. Associamos então o efeito isquêmico
da embolização com o citotóxico, da quimioterapia
intra-arterial.
Um procedimento cada vez mais frequente na
prática oncológica é a embolização superseletiva da
veia porta. Em pacientes candidatos a grandes ressecções do fígado, existe a preocupação de deixar
volume de tecido hepático suficiente para evitar a
insuficiência hepática no pós-operatório. Não é infrequente a necessidade de hepatectomias ampliadas, com a finalidade de ressecção de todo o tecido
tumoral, onde apenas dois segmentos hepáticos
estão livres de doença. Já é bem estabelecido que
existe risco importante de insuficiência hepática no
pós-operatório, quando o volume de fígado residual é inferior a 20% do volume total do fígado.
Essa proporção volumétrica é definida por tomografia ou ressonância nuclear magnética, na qual o
volume total do fígado e o futuro volume do fígado
remanescente são calculados. Nos pacientes submetidos à quimioterapia neoadjuvante e nos pacientes cirróticos, o remanescente hepático deve
corresponder a 30% e 40% do volume total do fígado, respectivamente.
O resultado da embolização superseletiva é o
desvio do fluxo portal para o território, produzindo
hipertrofia, com aumento do volume do tecido hepático. Depois de três a quatro semanas é realizado
novo estudo de imagem, no qual nova volumetria
é calculada. Alcançando-se os valores de segurança,
o paciente segue para a cirurgia de ressecção.
Quando tratamos pacientes oncológicos, não é
incomum observar territórios vasculares importantes comprometidos pelo câncer ou complicados
por seu tratamento, produzindo fenômenos isquêmicos – no caso das oclusões e estenoses arteriais –
e fenômenos congestivos – nas lesões vasculares venosas com comprometimento de seu fluxo.
Entre as lesões no território venoso podemos
citar a síndrome da cava superior, observada principalmente como complicação do câncer pulmonar
avançado, e as estenoses das anastomoses venosas,
como as de veia porta, ocorrendo em 2% dos casos
após o transplante do fígado.
Já no território arterial, a doença aterosclerótica,
observada principalmente em pacientes idosos, não
infrequentemente é causa de descompensação da
condição clínica nos pacientes oncológicos.
Com o intuito de restabelecer o fluxo sanguíneo
em um vaso com estenose significativa ou oclusão
total de sua luz, podemos lançar mão da angioplastia transluminal percutânea.
A angioplastia é um termo genérico. Ela pode
ser realizada por dilatação da lesão com um cateter
balão ou através do implante de uma prótese vascular, o stent. Na angioplastia com balão, posicionase o balão através da lesão para realizar a dilatação
da mesma. Nessa situação, o que ocorre é a fratura
da placa com ampliação da luz vascular. A angioplastia com balão é indicada nas lesões estenóticas
arteriais ou venosas.
O implante do stent justifica-se quando existe
um alto risco de oclusão com a angioplastia com
balão. Os stents são utilizados nas lesões vasculares
oclusivas de forma primária, ou quando ocorre dissecção ou recuo elástico após a dilatação pelo balão.
Eles também são indicados nas invasões vasculares
ou compressões extrínsecas. Um exemplo clássico
dessa situação é a invasão neoplásica da veia cava
superior na síndrome de cava superior.
Outra situação bastante interessante é a quimioterapia intra-arterial associada ao isolamento circulatório. Um exemplo dessa técnica é a infusão de
membro, utilizada no tratamento da metástase
em trânsito do melanoma acral de extremidades.
Quando a lesão é no membro inferior, realiza-se o
cateterismo superseletivo da artéria e veia femorais
do membro ipsilateral, e garroteia-se a raiz da coxa
com manguito de pressão. O sangue é então aspirado do sistema venoso, misturado com o quimioterápico, aquecido, e infundido pelo sistema arterial,
formando um sistema fechado. Terminado o tempo
de infusão, todo o efluente, contendo sangue e
quimioterápico, é drenado, descartado, sendo então
liberado o garrote. Através dessa técnica, é possível
conseguir altas concentrações de droga no tecido
tumoral, reduzindo significativamente a toxicidade sistêmica.
Pela técnica de infusão de membro conseguimos uma taxa de resposta completa de aproximadamente 40%. Além dos procedimentos vasculares
descritos acima, a radiologia intervencionista também conta com uma modalidade que podemos
chamar genericamente de procedimentos intervencionistas não vasculares. Os procedimentos não
“A embolização
arterial é um
dos procedimentos
mais realizados
pela radiologia
intervencionista na
oncologia. Quadros
hemorrágicos em
vísceras sólidas ou
ocas são passíveis
de tratamento eficaz,
sem a necessidade de
explorações extensas”
Onco& setembro/outubro 2013
25
vasculares têm como ponto em comum a utilização dos métodos de
imagem, como a fluoroscopia, o ultrassom ou a tomografia, como guias
para acesso de lesões antes só alcançadas através da cirurgia aberta.
As biópsias percutâneas exercem hoje um papel fundamental no
tratamento do câncer. A importância do diagnóstico histopatológico
consiste na correta identificação do tumor para programar então o tratamento específico. Com o auxílio do ultrassom ou da tomografia, podemos guiar uma agulha em tempo real através da pele, passando pelos
tecidos, até a lesão. Acessada a lesão, são coletadas amostras de tecido
e enviadas para análise.
plicados com a icterícia colestática. Também no cenário oncológico,
complicações de procedimentos cirúrgicos, como estenoses de derivações biliodigestivas e fístulas biliares, podem ser diagnosticadas e tratadas por procedimentos percutâneos.
Figura 2 Arteriografia superseletiva demonstra microcateterismo dos
ramos nutridores da lesão hepática hipervascular
Figura 1 Arteriografia hepática seletiva demonstra lesão hipervascular
em lobo hepático direito compatível com carcinoma hepatocelular
A ablação percutânea, especialmente a realizada por radiofrequência
(RF), consiste em um método de tratamento alternativo para várias neoplasias sólidas focais. Os benefícios desse método, quando comparados
com a cirurgia aberta, são menor morbidade, menor mortalidade, menor
custo e menor tempo de internação, além da possibilidade de inclusão
de pacientes de maior risco.
A ablação por RF consiste na produção de calor sobre o tecido tumoral, ocasionado pela resistência do tecido adjacente à energia por
RF. O sucesso de seu tratamento depende do balanço entre a completa
destruição do tecido tumoral e a redução de danos ao parênquima normal e às estruturas adjacentes. Excelentes resultados têm sido relatados
no tratamento de pequenas lesões hepáticas focais (< 3 cm de diâmetro). Também têm sido tratadas lesões focais nos pulmões e nos rins.
As colangiografias percutâneas, também chamadas de colangiografias transparietohepáticas, exercem papel fundamental no arsenal diagnóstico e terapêutico do carcinoma primário das vias biliares, assim
como no de outros tumores primários e secundários do fígado com-
26
setembro/outubro 2013 Onco&
As colangiografias percutâneas são procedimentos invasivos e
envolvem riscos, sendo indicadas somente quando existem dúvidas a
respeito do diagnóstico ou como guia dos procedimentos biliares percutâneos. Os riscos são relacionados principalmente à instrumentação
da via biliar e à exposição ao meio de contraste.
Os procedimentos biliares percutâneos podem ser divididos em
três procedimentos principais: a drenagem biliar externa, a drenagem
biliar interna-externa e a drenagem biliar interna.
A drenagem biliar externa tem como principal finalidade tratar a
bile infectada antes de um procedimento definitivo, pela menor manipulação da via biliar.
No local de punção, avança-se um guia atraumático, que é posicionado próximo ao local de obstrução. Através desse guia avança-se
o dreno biliar. O dreno posicionado próximo à lesão permite o fluxo
de bile da via biliar para fora do paciente. Esse dreno é conectado a
um coletor estéril, onde a bile é então armazenada e depois descartada.
A drenagem biliar interna-externa é um procedimento mais trabalhoso e consequentemente mais arriscado, pois necessita da recanalização da doença biliar. No local de punção avança-se o guia até a obstrução
e, com movimentos delicados, tenta-se a passagem através da lesão, buscando-se a alça duodenal. Uma vez alcançada a alça, progride-se o dreno
sobre o guia, posicionando-se sua extremidade distal abaixo da papila
duodenal. A manipulação excessiva eleva o risco de infecção da via biliar,
assim como de apresentação de traumatismo e sangramento.
A drenagem interna-externa pode ser empregada em pacientes para
tratamento de estenoses benignas da via biliar, podendo ser também
realizada como ponte, precedendo a drenagem interna no paciente
com doença maligna irressecável. Em relação à drenagem externa, tem
a vantagem de permitir o fluxo fisiológico da bile para o duodeno.
A drenagem biliar interna é reservada para o tratamento da obstrução maligna irressecável. Entre os procedimentos descritos, é o mais
efetivo nesse cenário, com menor incidência de eventos como obstrução e colangite, além de proporcionar maior conforto ao paciente. Consiste na colocação definitiva de uma prótese metálica autoexpansível
sobre a lesão biliar, com o intuito de paliar a icterícia colestática.
Quando a lesão causadora da obstrução é passível de tratamento curativo através da ressecção, a presença do stent dificulta o procedimento cirúrgico e ele não deve ser implantado.
Comparando-se com a quimioterapia, a cirurgia e a radioterapia,
a utilização da radiologia intervencionista para tratamento do câncer
ainda é modesta, porém mantém-se em exponencial crescimento. No
Brasil, ainda são poucos os centros formadores de especialistas, e a
quantidade de mão de obra qualificada é muito pequena. Muita experiência vem sendo acumulada pelos centros de intervenção em oncologia em todo o mundo, e muitas situações obtiveram um progresso
Figura 3 Paciente com lesão pulmonar a esclarecer, submetido a biópsia percutânea guiada por tomografia. Imagem cedida gentilmente
por Rubens Chojniak, médico responsável pelo Departamento de Imagem do A.C.Camargo Cancer Center
surpreendente. Métodos de imagem, assim como o instrumental terapêutico, evoluem a cada dia e nos permitem hoje realizar tratamentos
mais complexos e com maior segurança, prevendo uma participação
cada vez maior da especialidade neste cenário.
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Onco& setembro/outubro 2013
27
radioterapia
Radioterapia no tratamento do
câncer de próstata avançado
S
INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER
NORTE-AMERICANO (NCI), UM EM CADA SEIS AMEEGUNDO O
Divulgação
RICANOS DESENVOLVE CÂNCER DE PRÓSTATA APÓS
Robson Ferrigno
* Coordenador dos Serviços de
Radioterapia da Beneficência
Portuguesa de São Paulo e do
Centro Oncológico Antônio Ermírio
de Moraes; doutor em medicina
pela Universidade de São Paulo;
presidente da Sociedade Brasileira
de Radioterapia
Contato:
[email protected]
28
setembro/outubro 2013 Onco&
os 60 anos de idade1. Isso representa aproximadamente 241.740 casos novos diagnosticados em
2012. No Brasil, a incidência não é diferente e,
como nos Estados Unidos, é a neoplasia não cutânea
mais frequente e a terceira causa de morte por câncer entre os homens2.
O prognóstico dessa doença depende de fatores
relacionados às características da neoplasia, entre
eles o estadio clínico, o valor do PSA ao diagnóstico
e o índice de Gleason na biópsia3. Esses três fatores
são utilizados para estratificar os pacientes em três
grupos de risco: baixo, intermediário e alto, quando
a doença ainda não é metastática (Tabela 1). Atualmente, a decisão terapêutica é primariamente baseada no grupo de risco em que o paciente se
encontra e, na prática clínica, outros critérios relacionados ao paciente, como idade, condições clínicas e volume da próstata, também são levados em
consideração na escolha de uma ou mais opções de
tratamento. Em geral, o paciente deve participar da
decisão terapêutica.
Os principais tratamentos utilizados no combate ao câncer de próstata são a radioterapia, a
prostatectomia radical e o bloqueio hormonal. A radioterapia pode ser utilizada com finalidade curativa no tumor localizado em todos os grupos de
risco. Ela é realizada através da emissão de radiação
ionizante de um aparelho, como o acelerador linear,
chamada teleterapia ou radioterapia externa; por
meio da colocação de material radioativo no interior da próstata, chamada de braquiterapia; e tam-
bém por implante intersticial. Esse último pode ser
permanente ou temporário. No implante permanente são utilizadas unidades de um material radioativo chamado Iodo-125, de 5 mm de comprimento
por 0,5 mm de diâmetro, que são introduzidas por
via perineal, guiadas por ultrassom transretal e vão
ficar para sempre no interior da próstata, onde liberará a dose prescrita ao longo de aproximadamente dez meses, razão pela qual é considerada de
baixa taxa de dose. No implante temporário, a próstata é agulhada através do períneo, sob orientação
também de ultrassom transretal, e um material radioativo, chamado Irídio-192, é levado por controle
remoto computadorizado através de várias paradas
ao longo das agulhas até liberar a dose prescrita,
quando é recolhido para um aparelho que o armazena. Devido à rapidez da liberação de dose, essa
braquiterapia é considerada de alta taxa de dose.
Essas três opções de radioterapia, utilizadas isoladamente ou combinadas, são indicadas também de
acordo com o grupo de risco do paciente.
Quando alguma técnica de radioterapia é utilizada, toda a próstata deve ser tratada, porque o
câncer de próstata é multifocal. A inclusão das
vesículas seminais ou dos linfonodos pélvicos
nas áreas irradiadas é realizada quando a probabilidade de comprometimento desses locais é maior
que 15%, obtida pela consulta de nomogramas4.
No entanto, a inclusão de linfonodos pélvicos
como parte do tratamento ainda é controversa e
fruto de pesquisa clínica, uma vez que os estudos
ainda não conseguiram demonstrar aumento de
sobrevida quando esses são incluídos nos campos
de radioterapia5.
Evolução técnica da radioterapia
O fator limitante mais importante do tratamento com radioterapia é a proximidade da próstata com órgãos normais adjacentes, como o reto e
a bexiga. A evolução técnica da radioterapia nos
últimos anos teve como principal objetivo concentrar a dose de radiação no volume alvo (próstata +/vesículas seminais) e diminuí-la ao máximo possível nos órgãos normais.
A radioterapia convencional utiliza campos extensos e sem a exata definição das estruturas anatômicas pelas quais a radiação vai atravessar. Com
isso, liberam-se doses proibitivas no reto e na bexiga, o que limita o emprego de doses adequadas
na próstata para controlar a doença local. Essa técnica, portanto, não deve ser utilizada no tratamento
do câncer de próstata.
Para possibilitar a liberação de altas doses na
próstata, limitando ao mesmo tempo a dose em tecidos normais, duas técnicas de radioterapia externa
foram desenvolvidas nas últimas décadas. A primeira foi a radioterapia conformada, que utiliza
exame de tomografia computadorizada para delimitar e informar ao sistema de planejamento computadorizado a localização das estruturas anatômicas
e, com a distribuição de vários campos, concentrase a dose de radiação na próstata. A segunda foi a
radioterapia de intensidade modulada (IMRT), desenvolvida a partir da radioterapia conformada e
que, como o próprio nome indica, modula a intensidade de dose de radiação por onde o feixe atravessa. Isso ocorre por meio da movimentação de
lâminas na frente do campo de radiação, que filtra
ou permite mais radiação no local tratado. Como resultado, a distribuição de dose na próstata é mais
concentrada do que na radioterapia conformada.
Aumento de dose (escalonamento)
Com o desenvolvimento tecnológico, surgiram
estudos para testar se uma dose maior de radiação
aumentaria as taxas de cura do câncer de próstata.
Cinco estudos prospectivos e aleatorizados fase III
(nível de evidência 1) já foram publicados. Todos
demonstraram aumento do controle bioquímico do
câncer de próstata quando a dose é aumentada a
partir de 72Gy6,7,8,9,10. Com exceção de um deles6,
esses estudos demonstraram ausência de aumento
de toxicidade retal ou vesical. Infelizmente, nenhum deles demonstrou aumento de sobrevida
global, mesmo com o aumento de controle local de
doença com doses altas. A causa mais provável
desse achado é o fato de o câncer de próstata ser
uma doença de curso indolente e o tempo de vida
do paciente ser bastante prolongado com o emprego de outros tratamentos, como o bloqueio hormonal, permitindo muitas vezes que o paciente
morra de outras causas. Portanto, as doses mais
altas de radiação permitem uma melhor qualidade
de vida dos pacientes tratados, uma vez que evitam
ou atrasam o emprego de bloqueio hormonal, que
não é isento de efeitos colaterais.
Tumores localmente avançados
Os tumores localmente avançados são considerados de alto risco, uma vez que podem ter invadido a cápsula (estadio T3a), uma ou ambas as
vesículas seminais (estadio T3b) ou estruturas adjacentes (estadio T4). Nessas situações, a braquiterapia não deve ser utilizada como forma de radioterapia, uma vez que trata apenas a próstata, sem
margens para extensões extraprostáticas. A radioterapia externa deve ser utilizada nesses casos com
técnica, no mínimo, conformada, e, se disponível,
a técnica de modulação da intensidade do feixe de
radiação (IMRT), principalmente em volumes de
tratamento maiores que 50 cm3. Algumas publicações já reportam diminuição da toxicidade com o
emprego da radioterapia com IMRT em comparação com a técnica conformada11-17.
“Os principais
tratamentos para
o câncer de próstata
são a radioterapia,
a prostatectomia
radical e o bloqueio
hormonal. A radioterapia pode ser
utilizada com
finalidade curativa
no tumor localizado
em todos os grupos
de risco”
A escolha do tratamento
Os dois tratamentos-padrão para o controle
local do câncer de próstata são a prostatectomia
radical e a radioterapia (externa, braquiterapia ou
a combinação de ambas). Não há na literatura estudo prospectivo e aleatorizado que compare essas
duas modalidades, e não há perspectivas de que um
dia haja algum. É muito difícil recrutar um paciente
para que a decisão de seu tratamento seja por sorteio. A maioria dos trabalhos publicados reporta
comparação entre séries históricas, o que impede
uma interpretação adequada de resultados devido
Onco& setembro/outubro 2013
29
à interferência de diversos fatores. Isso ocorre porque os pacientes mais
jovens e saudáveis são mais frequentemente selecionados pelos urologistas para serem operados, ao passo que os mais idosos e clinicamente
menos favorecidos são encaminhados para radioterapia.
Uma análise retrospectiva, envolvendo 2.991 pacientes com câncer de próstata localizado, comparou os resultados de sobrevida livre
de doença de 1.034 deles tratados com prostatectomia, 484 com radioterapia externa com dose menor que 72Gy, 301 com radioterapia
com dose maior que 72Gy, 950 apenas com braquiterapia e 222 com
braquiterapia e radioterapia externa. Em cinco anos, a sobrevida livre
de doença dos pacientes foi de 81% para os tratados com cirurgia,
51% para radioterapia com dose abaixo de 72Gy, 81% para radioterapia acima dessa dose, 83% para braquiterapia exclusiva e 77% para
o tratamento combinado, sugerindo resultados semelhantes, exceto
no grupo de pacientes tratados com dose baixa de radiação17. Com
o advento da radioterapia de alta tecnologia, os resultados são atualmente semelhantes, desde que os mesmos grupos de pacientes sejam
comparados.
Com relação à qualidade de vida, os trabalhos comparativos
mostram que nos primeiros meses os pacientes tratados com radioterapia possuem um melhor indicativo, porém, a longo prazo, não há
diferença significativa entre os tratados com cirurgia, radioterapia
ou braquiterapia18.
GRUPOS
DE RISCO
FATORES
Estadio clínico
Gleason
PSA
Baixo
T1 – T2a
2–6
< 10 ng/ml
Intermediário
T2b – T2c
7
10 – 20 ng/ml
Alto
T3a – T4
8 – 10
> 20 ng/ml
Tabela 1 Estratificação por grupo de risco para câncer de próstata de
acordo com os fatores de risco para recorrência
cas modernas de liberação de dose, essa complicação diminuiu
substancialmente11-17.
A principal desvantagem da radioterapia é a ausência das informações detalhadas das características patológicas da doença e sua real infiltração. No entanto, toda a próstata, com margens além da cápsula,
é incluída no volume de tratamento. Outra desvantagem é o tempo
relativamente longo do curso da radioterapia externa, em torno de
36 a 40 dias úteis, período necessário para liberar a dose prescrita,
que varia de 72 a 78Gy, em frações diárias de 1,8 a 2Gy, cinco vezes
por semana.
Há poucas contraindicações da radioterapia externa e elas são mais
relativas do que absolutas. É o caso de pacientes muito idosos com
saúde debilitada; de portadores de colagenoses, de doenças inflamatórias
e do intestino, que aumentam o risco de complicações da radioterapia19.
A tolerância da radioterapia externa é muito boa pelos métodos
atuais de tratamento. Muitos pacientes não chegam a reportar nenhum
sintoma durante as aplicações. As queixas mais comuns são urinárias,
coma disúria e polaciúria, que ocorrem em aproximadamente um terço
dos pacientes20 e são causadas pela irradiação do colo vesical. Por causa
disso, antes de iniciar um curso de radioterapia externa, os pacientes
devem ser questionados sobre a presença de sintomas urinários e, se
houver, uma avaliação urológica deve ser realizada para indicação de
um possível tratamento que possa evitar piora desses sintomas durante
o tratamento. Em geral, esses sintomas são amenizados com medicação oral.
Assim como a cirurgia, a radioterapia também pode causar disfunção, e ela ocorre em aproximadamente um terço dos pacientes após o
término das aplicações21. Isso se deve às alterações da vasculatura peniana, porém, outras têm sido descritas18. A real incidência da impotência sexual é difícil de ser mensurada porque vários fatores devem
ser considerados, como doenças associadas, potência antes do tratamento, efeitos psicológicos, uso de bloqueio hormonal e outros que
podem afetar o desempenho sexual. Além disso, muitos pacientes não
são totalmente fidedignos quanto às informações sobre a sua capacidade de libido. Uma característica da impotência gerada pela radioterapia é a resposta favorável a drogas que agem no mecanismo vascular,
como o Viagra e o Cialis.
Associação com bloqueio hormonal
Características da radioterapia externa
A radioterapia externa possui várias vantagens: tratamento não invasivo, indolor, não possui risco anestésico, pode ser oferecida para
pacientes idosos e para aqueles contraindicados para a cirurgia. A
incontinência urinária é raramente observada apenas com radioterapia
externa. Em contrapartida, pode causar complicações retais tardias,
como sangramento fecal de difícil controle. Com o advento das técni-
30
setembro/outubro 2013 Onco&
A literatura tem demonstrado que a supressão androgência central,
periférica ou associada, melhora os resultados da radioterapia nos pacientes dos grupos de risco intermediário e alto. Para os pacientes de
risco intermediário, um curso rápido desse bloqueio, em torno de seis
meses, associado à radioterapia externa, tem sido benéfico nos pacientes que recebem doses não superiores a 70Gy22,23, porém, seu valor
ainda é incerto entre os que recebem doses altas de radioterapia24,25.
Grupos de risco Opções terapêuticas
Baixo
Radioterapia externa com técnica conformada,
braquiterapia, prostatectomia radical com ou sem
dissecção de linfonodos pélvicos*, ou conduta expectante se expectativa de vida < 10 anos.
Intermediário
Radioterapia externa conformada com ou sem
complementação de dose com braquiterapia,
prostatectomia radical com ou sem dissecção
linfonodal, ou conduta expectante se expectativa
de vida < 10 anos.
Alto
Radioterapia externa conformada com supressão
hormonal# ou prostatectomia radical@ com dissecção de linfonodos pélvicos em estadios até T3a.
* A dissecção de linfonodos pélvicos, segundo o guia da NCCN, é indicada quando a
probabilidade de metástases linfonodais for maior que 3%.
# A supressão hormonal pode ser longa (2 a 3 anos), porém, pode ser considerada como
de curta duração (6 meses) em pacientes selecionados com apenas um fator de risco.
@ A prostatectomia radical é indicada apenas em pacientes com pequeno volume tumo-
vado se o benefício do bloqueio hormonal foi apenas para compensar
a baixa dose de radiação utilizada ou se a associação de radioterapia e
supressão androgênica são tratamentos sinérgicos.
Seguimento após radioterapia
O seguimento de pacientes tratados com radioterapia é realizado
através da mensuração de PSA a cada seis meses durante os primeiros
cinco anos e anualmente após esse período. História e exame clínico
com toque retal anual também são recomendados3. Recaída bioquímica, pelo critério de Phoenix, o mais utilizado atualmente, é quando
o valor excede em 2ng por mililitro além do nadir (menor valor atingido após a radioterapia)27. A velocidade de duplicação do PSA é uma
informação importante para orientar a investigação de uma recaída.
Duplicação do valor em intervalo menor que seis meses sugere recaída
a distância. Nesses casos, deve-se investigar a presença de metástases.
Em intervalo maior que seis meses, a recaída local é mais provável28.
Conclusões e recomendações
Para os pacientes de alto risco, os estudos prospectivos e aleatorizados
têm demonstrado benefício com o emprego de bloqueio hormonal
mais duradouro, em torno de dois22 a três anos26. No entanto, esses
estudos foram realizados com pacientes que receberam dose baixa de
radiação na próstata, em torno de 70Gy. Ainda está para ser compro-
A radioterapia externa é considerada tratamento apropriado do
câncer de próstata localizado em todos os grupos de risco e para os
tumores localmente avançados (alto risco). As técnicas de radioterapia
conformada ou IMRT devem ser utilizadas devido à capacidade de liberar doses adequadas na próstata, ou seja, de 72 a 75Gy nos pacientes
de baixo risco e de 75 a 80Gy nos de risco intermediário e alto (incluídos os localmente avançados). A adição de supressão hormonal
por seis meses é recomendada para pacientes de risco intermediário e
de dois a três anos para pacientes de alto risco, incluindo os localmente
avançados e sem evidência de metástase a distância.
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ginecologia
Câncer do endométrio: como diagnosticar
e definir o estadiamento?
O
CÂNCER DE ENDOMÉTRIO MAIS FREQUENTE É O
Divulgação
ADENOCARCINOMA ENDOMETRIAL.
Etelvino de Souza Trindade
*Presidente da Federação
Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia
(FEBRASGO); membro da
Federação Internacional de
Ginecologia e Obstetrícia (FIGO)
e da International Federation of
Cervical Pathology and
Colposcopy (IFCPC)
Contato:
[email protected]
34
setembro/outubro 2013 Onco&
ELE SE DESENVOLVE A PARTIR DE LESÃO PRECURSORA, A
hiperplasia atípica do endométrio. Os tumores serosos endometriais também têm descrita uma lesão
precursora, o carcinoma intraepitelialendometrial1.
Quando se identifica uma lesão precursora, o
tratamento prevenirá o câncer. A identificação dessa
lesão, embora almejável, não é custo-efetiva, devido
à baixa prevalência do carcinoma endometrial, que
ocorre em 5/1.000 mulheres em idade maior que
45 anos, época de maior incidência da neoplasia.
Assim, os programas de rastreamento, se aplicados,
se tornam ineficientes2.
O American College of Obstetrics and Gynecology (ACOG) e a Society of Gynecologic Oncology
(SGO) não recomendam rastreamento de rotina. A
American Cancer Society (ACS) recomenda rastreamento anual após os 35 anos de idade, com biópsia
endometrial anual, para mulheres portadoras de
mutação genética correlacionada ao câncer de cólon
não polipoide (HNPCC) ou suspeita familiar para
esse risco, síndrome de Lynch II3.
A investigação das mulheres com risco aumentado ou sintomáticas é mais eficaz que o rastreamento populacional. Portanto, merece atenção o
sangramento anormal após a quarta década da vida,
obesidade significativa, síndrome dos ovários policísticos e anovulação crônica. O uso de tamoxifeno
é fator de risco, mas a investigação se aplica somente quando houver sangramento4.
Mesmo não havendo indicação de rastreamento, as mulheres após a menopausa, com sobrepeso,
diabéticas, em uso de hormônios esteroides sexuais
ou com qualquer manifestação de hiperestroge-
nismo são de maior risco para câncer endometrial
que a população geral, na mesma faixa etária. Para
elas, a realização de ultrassonografia (US) anual
pode ser benéfica na possibilidade de antecipar alterações do endométrio5,6.
O adenocarcinoma endometrial frequentemente
se manifesta precocemente com sangramento anormal, sendo esse o principal sintoma. A idade é o
fator de risco mais importante, e o aumento da idade
é diretamente proporcional ao risco para a doença.
Na pós-menopausa, 20% das mulheres com sangramento uterino têm carcinoma7. Aos 70 anos o
risco sobe para 50% e, se a mulher for nulípara ou
diabética, chega a 87%4.
Na doença inicial são também relatados outros
sintomas e sinais, como dor pélvica, peso no baixo
ventre, sangramento intermenstrual e menorragia.
Os achados em exames como piometra, hematometra e presença de células glandulares atípicas
na colpocitologia representam sinais de alerta.
Quando a doença está em fase mais avançada
ocorre dor abdominal baixa, descarga vaginal com
odor fétido, alterações no sistema urinário e/ou intestinal e emagrecimento.
A colpocitologia não é um bom método para
detectar o carcinoma endometrial. A fragilidade do
exame se deve ao fato de as células observadas não
serem colhidas sobre a lesão.
O exame US é usado no diagnóstico de mulheres com sangramento irregular, particularmente
após a menopausa. O estudo clássico de Gramberg
e colaboradores mostrou que, em mulheres que
sangraram após a menopausa e nas quais o endométrio tinha menos de 8 mm de espessura, nenhuma tinha câncer8.
Os estudos que se seguiram permitiram estabelecer parâmetros de risco de existência de câncer
baseados na espessura do endométrio. Atualmente
considera-se que, se a espessura do endométrio estiver menor que 5 mm, a probabilidade de existir
neoplasia maligna pode ser desconsiderada.
Para as mulheres que usam tamoxifeno, os
valores referidos não se aplicam. Os estudos demonstram que, nesses casos, o endométrio é mais
espessado no exame US e o estudo histológico descreve endométrio atrófico na maioria das vezes. Os
laudos dos exames US referindo endométrio muito
espessado se devem à avaliação de quem realiza o
laudo e incorpora o miométrio adjacente.
Casos de carcinoma seroso papilífero, carcinoma de alto grau e de células claras podem mostrar espessura endometrial menor que 5 mm9.
Atualmente, pensa-se que a US poderia evitar
grande quantidade de biópsias endometriais com
redução de custos e menor desconforto para as
mulheres.
Estudos de custo-efetividade realizados em mulheres na pós-menopausa que sangram, comparando doze estratégias diagnósticas, demonstraram
que a abordagem inicial deve ser realizada por US
ou biópsia ambulatorial10.
O Comitê de Práticas do ACOG recomenda que
as mulheres que sangram após a menopausa sejam
avaliadas inicialmente por US transvaginal ou por
biópsia endometrial ambulatorial, não sendo necessário aplicar os dois testes. No caso de a abordagem
inicial por biópsia ter obtido amostra insuficiente,
se realiza a US na sequência e, se o endométrio tiver
espessura de 4 mm ou menos, não é necessário repetir a biópsia. Caso o sangramento persista, os dois
procedimentos devem ser repetidos11.
Historicamente, a comprovação diagnóstica do
carcinoma é feita pela curetagem uterina. Atualmente, nos Estados Unidos os médicos têm confirmado o diagnóstico por histologia de amostras
obtidas por biópsia endometrial, realizada no consultório. Os estudos têm demonstrado acurácia de
até 90%12.
A obtenção de amostras endometriais para o
diagnóstico pode ser feita por várias instrumenta-
ções de uso ambulatorial. Avaliações de performance diagnóstica usando biópsia por aspiração
com Pipelle, em pacientes com carcinoma na
pós-menopausa, chegaram a resultados positivos
em 90%12,13.
A biópsia endometrial em ambulatório e a curetagem uterina têm desempenho diagnóstico equivalente no diagnóstico do câncer, porém a acurácia
da biópsia ambulatorial é inferior por resultar em
diagnósticos com graduação a mais quando se faz
a comparação entre os dois métodos14. Se o laudo
da biópsia ambulatorial for inconclusivo mas houver a ocorrência de sangramento anormal, a pesquisa deve continuar.
A histeroscopia tem a vantagem de permitir a
realização da biópsia dirigida e a avaliação da extensão da doença com abordagem ambulatorial.
Em revisão de literatura com 63 estudos, os resultados do uso da histeroscopia diagnóstica foram
muito bons para o adenocarcinoma e moderados
para doenças benignas, com apenas 0,6% de casos
negativos15.
O estadiamento do carcinoma do endométrio
(Quadro 1) se inicia pelo exame físico da paciente.
A palpação das cadeias linfáticas, inguinais e supraclaviculares visa evidenciar possíveis metástases; o
exame vaginal e o toque retal avaliam a ocorrência
de comprometimento locorregional da neoplasia.
Na suspeita de comprometimento da bexiga
e/ou reto, devem ser indicados os exames endoscópicos para esses órgãos, cistoscopia e retossigmoidoscopia.
Mulheres com contraindicação para cirurgia
podem ser estadiadas pelo estadiamento clínico da
Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO), de 1971, realizando a correlação com
o atual18.
Não havendo contraindicações para tratamento
cirúrgico, o estadiamento será realizado durante a
cirurgia, conforme recomendado pela FIGO.
Com métodos de imagem, pode-se antecipar o
estadiamento no pré-operatório: US, tomografia
computadorizada (CT), ressonância magnética (RM)
e tomografia com emissão de pósitrons (PET/CT). Os
exames podem auxiliar no planejamento cirúrgico.
“A idade é o fator
de risco mais
importante, e o
aumento da idade
é diretamente
proporcional ao
risco para a doença.
Na pós-menopausa,
20% das mulheres
com sangramento
uterino têm
carcinoma. Aos 70
anos o risco sobe
para 50% e, se a
mulher for nulípara
ou diabética,
chega a 87%”
Onco& setembro/outubro 2013
35
A acurácia dos métodos de imagem não tem variação significativa.
O exame de RM com contraste pode demonstrar invasão miometrial e
também doença extrauterina. O PET/CT, na avaliação de metástases
linfonodais, tem alto valor preditivo negativo, o que valoriza o método
no caso de a paciente apresentar contraindicações para a cirurgia. Embora apresentem vantagens, esses exames não substituem o estadiamento cirúrgico16 e também não devem ser utilizados na rotina do
estadiamento, pois requerem estudos adicionais.
Na comparação entre imagem e estudo histológico intraoperatório
por congelação, o método histológico é mais acurado17.
Estadio
Achados patológicos pós-operatórios
I*
Tumor confinado ao corpo uterino
Ia*
Sem invasão ou invasão miometrial menor de 50%
Ib*
Invasão miometrial igual ou maior de 50%
II*
Tumor invade o estroma do colo do útero, mas sem se estender além do útero**
III*
Tumor local e/ou regionalmente avançado
IIIa*
Tumor invadindo serosa e/ou anexos***
IIIb*
Tumor invadindo vagina e/ou paramétrios***
IIIc*
Metástases para linfonodos pélvicos e/ou para-aórticos***
IIIc1*
Linfonodos pélvicos positivos
IIIc2*
Linfonodos para-aórticos positivos com ou sem linfonodos pélvicos positivos
IV*
Tumor invadindo bexiga e/ou mucosa retal e/ou metástases à distância
IVa*
Tumor invadindo bexiga e/ou mucosa retal
IVb*
Metástases à distância, incluindo metástases intra-abdominais e/ou linfonodos inguinais
* G1, G2 e G3.
** O envolvimento glandular endocervical único deve ser considerado como estadio Ie não mais como estádio II.
*** A citologia positiva deve ser relatada separadamente sem mudar o estadiamento.
Quadro 1 Estadiamento cirúrgico do carcinoma do endométrio
FIGO, revisão de 2009
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36
setembro/outubro 2013 Onco&
Exame clínico:
Exame físico geral:
Exame das drenagens linfáticas com palpação dos linfonodos
supraclaviculares e inguinais
Exame ginecológico
Exame retovaginal com ou sem analgesia
Exames radiológicos
RX do tórax
Exames específicos
Biópsia endometrial, histeroscopia com biópsia ou curetagem
uterina, cistoscopia* e retossigmoidoscopia*
Outros exames não considerados para estadiamento mas
que podem ser realizados para
planejamento terapêutico
Tomografia computadorizada, ressonância magnética,
tomografia com emissão de pósitrons, cintilografia óssea,
laparoscopia, dosagem sérica do CA-125
* exames a serem solicitados de acordo com sintomas e sinais clínicos
Quadro 2 Exames para estadiamento do carcinoma endometrial
A realização da biópsia diagnóstica define o tipo e o grau histológico do tumor (Quadro 2); com a histerectomia total e a anexectomia
bilateral é definida a invasão miometrial, assim como o comprometimento do colo do útero e das tubas e ovários; com o lavado peritoneal
será definida a presença de células na cavidade abdominal; e a avaliação dos linfonodos permite diagnosticar metástase retroperitoneal pélvica e/ou para-aórtica.
O exame de congelação do útero pode ser realizado para estabelecer com maior certeza a profundidade de invasão do miométrio.
Dessa forma se faz o estadiamento do carcinoma endometrial, base
do planejamento da conduta terapêutica.
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oncogenética
Hereditariedade e câncer de mama
D
IANTE DA ALTA INCIDÊNCIA E DE UM PROGNÓS-
TICO RELATIVAMENTE FAVORÁVEL
– DADOS EU-
Divulgação
ROPEUS APONTAM UMA TAXA DE SOBREVIVÊNCIA
Edenir Inêz Palmero
* Geneticista molecular;
pesquisadora do Hospital de
Câncer de Barretos; professora
do Programa de Pós-Graduação
em Oncologia do Hospital de
Câncer de Barretos
Contato:
[email protected]
38
setembro/outubro 2013 Onco&
de 91% no primeiro ano pós-diagnóstico e de 65%
nos cinco anos subsequentes –, o câncer de mama
é hoje o mais prevalente no mundo1. No Brasil, é a
primeira causa de morte relacionada ao câncer em
mulheres de todas as idades2.
No caso do câncer de mama, assim como para
a maioria dos tumores malignos, a incidência está
relacionada, principalmente, com fatores ambientais e estilo de vida, como exposição a substâncias
químicas, radioativas e poluentes em geral, alimentação, fumo, sedentarismo, obesidade, entre outros3. Não menos importante, mas muitas vezes
menos conhecidos, a idade ao diagnóstico e a história familiar de câncer também representam fatores
de risco significativos para o desenvolvimento da
doença, principalmente quando se trata de um câncer com caráter hereditário.
Do total de casos de câncer de mama diagnosticados a cada ano, estima-se que de 5% a 10% sejam
hereditários, ou seja, causados por uma alteração
genética herdada que confere a seu portador um
risco de câncer significativamente maior que o da
população em geral. Se trouxermos esses percentuais à realidade brasileira, estamos falando de
aproximadamente 2.600 a 5.300 novos casos de
câncer de mama hereditários por ano, conforme estimativas do INCA, o que é assustador tanto pelas
suas proporções numéricas quanto pelo fato de que
a maior parte desses tumores não é reconhecida
como de origem hereditária2. Famílias que apresentam múltiplos casos de câncer, várias gerações afe-
tadas por câncer, tumores bilaterais ou tumores
diagnosticados em idade precoce em relação à
média de idade ao diagnóstico para aquele tipo de
neoplasia devem ser avaliadas cuidadosamente, já
que esses fatores são indicadores importantes de
risco para o câncer de mama hereditário. Os indivíduos considerados “suspeitos” ou de alto risco
devem ser encaminhados para aconselhamento genético, no qual a hipótese diagnóstica pode ser confirmada e informações sobre a doença, sua forma
de herança, estratégias preventivas e de redução de
risco, assim como as chances de recorrência para
outros familiares, podem ser avaliadas e discutidas
dentro de um contexto multidisciplinar4.
Além da história familiar de câncer, outra variável importante na identificação de famílias em risco
para câncer de mama hereditário refere-se às características histopatológicas dos tumores. Indivíduos
com mutações germinativas em BRCA1 apresentam
um excesso de carcinomas mamários ductais do
tipo medular, além de um excesso de tumores triplo
negativos (TN) (negatividade para os receptores
hormonais estrógeno ER, progesterona PR e HER2)5.
Outra característica importante é que esses tumores
expressam um ou mais dos marcadores “basais”,
como citoqueratina 5/6 (CK5/6), 14 (CK14), EGFR,
SMA, P-caderina, caveolina 1, apresentando dessa
forma um fenótipo “basal-like”.
A identificação de indivíduos em risco para
câncer de mama hereditário é importante por várias
razões. Primeiro, porque indivíduos afetados apresentam risco cumulativo vital muito superior ao da
população em geral para vários tipos de câncer. Segundo, porque outros familiares de um indivíduo
afetado podem estar em risco para o câncer hereditário. Os tumores
hereditários apresentam um padrão de herança autossômico dominante, de forma que cada indivíduo possui uma chance de 50% de
herdar o alelo alterado. Terceiro, a possibilidade de identificar familiares de elevado risco para o desenvolvimento de câncer torna possível
o emprego de uma abordagem preventiva e de detecção precoce do
câncer, já que medidas de rastreamento intensivo e intervenções preventivas (cirurgias profiláticas e quimioprofilaxia) se mostram significativamente eficazes na redução do risco de câncer em portadores de
mutação4,6,7. Além disso, os rápidos avanços em técnicas de biologia
molecular nas últimas décadas resultaram na identificação de genes
que, quando alterados, aumentam significativamente o risco de desenvolver câncer de mama, câncer de ovário e outros tumores. Por outro
lado, a identificação de um indivíduo não afetado em uma família com
risco aumentado permite a sua tranquilização e elimina os gastos e complicações de rastreamento e intervenções preventivas desnecessárias8.
No caso das intervenções preventivas, estudos prospectivos e retrospectivos demonstraram que a mastectomia bilateral profilática é a
intervenção de maior redução de risco de câncer de mama em mulheres portadoras de mutação nos genes BRCA1/BRCA2 (redução de até
90% do risco)9,10. A salpingo-ooforectomia bilateral profilática em pacientes portadoras de mutações promove redução de 90% do risco de
câncer de ovário, bem como redução de 50% no risco de câncer de
mama11. Entre as opções não cirúrgicas destacam-se a quimioprevenção e a modificação da exposição a fatores de risco10. Além disso, cabe
destacar o desenvolvimento de novas terapias, utilizando inibidores
da enzima PARP (Poly-Adenosine Diphosphate-Ribose Polymerase 1),
específicas para pacientes portadores de mutações nos genes BRCA.
Câncer de mama hereditário – aspectos moleculares
O primeiro gene relacionado à síndrome de predisposição hereditária ao câncer de mama e ovário (Hereditary Breast and Ovarian Cancer
– HBOC OMIM #114480), BRCA1 (OMIM #113705) foi identificado
em 1994, por Miki et al.12. Esse gene foi mapeado no cromossomo
17q12-23 e sua descoberta foi decorrente de estudos de ligação em
membros de famílias com múltiplos casos de câncer de mama e ovário.
O segundo gene associado à predisposição hereditária ao câncer de
mama, ovário e outros tumores é o gene BRCA2 (OMIM #600185), localizado no cromossomo 13q12-1313.
Acredita-se que o gene BRCA1 seja responsável por cerca de 45%
a 50% de todos os casos de câncer de mama hereditários. Portadoras
de mutação germinativa nesse gene têm um risco cumulativo vital
(RCV) de desenvolver câncer de mama de 40% a 65% até os 80 anos
de idade14. Além disso, o RCV para câncer de ovário nessas pacientes
também é significativamente maior, e pode chegar até 40% aos 80 anos
de idade14,15.
O gene BRCA2, quando alterado, aumenta o risco de desenvolvi-
mento de múltiplos tumores. BRCA2 é responsável por cerca de 30%
a 40% de todos os casos de câncer de mama hereditários. O RCV para
câncer de mama em mulheres portadoras de mutações germinativas
nesse gene é similar ao risco de portadoras de mutações germinativas
em BRCA1 (40% a 65% até os 80 anos de idade)14,15, enquanto o risco
para câncer de ovário é de 15% a 30%14. Embora menor que o RCV
para câncer de ovário associado a mutações germinativas em BRCA1,
esse risco ainda é dez vezes maior que o da população em geral. Homens com mutações germinativas em BRCA2 têm um RCV significativamente maior de desenvolver câncer de mama, cerca de 6% até os
70 anos de idade, o que representa um aumento de 80-100 vezes
quando comparado ao risco da população em geral16.
Além disso, existem outros genes envolvidos na predisposição hereditária ao câncer de mama, como TP53, PTEN, PALB2, ATM, entre
outros. Cabe ainda ressaltar que uma fração das famílias com características sugestivas de hereditariedade como fator causal permanece uma
incógnita, já que pode resultar do somatório do efeito de alterações em
genes de suscetibilidade ou ainda de alterações em algum gene ainda
não associado ao desenvolvimento do câncer de mama hereditário.
Do ponto de vista técnico, a pesquisa de mutações germinativas
em BRCA1 e BRCA2 (teste genético) é um processo de alta complexidade, resultante, principalmente, do tamanho desses genes e da extensa heterogeneidade molecular observada na doença. Além da ampla
gama de mutações pontuais já identificadas (ausência de hot spots),
grandes rearranjos gênicos em BRCA1 e BRCA2 vêm sendo identificados e associados ao mesmo fenótipo clássico de predisposição ao câncer de mama e ovário. A estratégia considerada gold-standard para a
identificação de mutações germinativas na sequência codificadora dos
genes BRCA é o sequenciamento de todos os éxons de ambos os genes.
Por se tratar de uma estratégia extremamente laboriosa (e, em consequência, um processo demorado) e cara, outras estratégias estão surgindo, como o emprego do sequenciamento de nova geração (next
generation sequencing), que consiste basicamente no sequenciamento,
de forma massiva e paralela, de milhões de sequências-molde de DNA.
Sendo assim, vários pacientes podem ser analisados simultaneamente,
não apenas para BRCA1 e BRCA2, mas também para outros genes suspeitos e, dessa forma, a hipótese diagnóstica pode rapidamente ser
comprovada/refutada. No entanto, essa tecnologia ainda necessita de
validações antes de sua implementação na rotina diagnóstica.
Por último, cabe enfatizar que o teste genético não deve ser utilizado para o rastreamento de quaisquer pacientes com câncer de mama,
mas sim dentro de um contexto de aconselhamento genético direcionado para famílias de alto risco para câncer hereditário e, dessa forma,
deve ser uma ferramenta para confirmação objetiva de uma suspeita
diagnóstica que surge a partir da história médica e familiar de um indivíduo. O resultado, seja ele positivo, negativo ou inconclusivo, deve
ser interpretado com extrema cautela e considerado no âmbito da história familiar em questão17.
Onco& setembro/outubro 2013
39
Câncer de mama hereditário – realidade
nacional
“Somente
conhecendo melhor
a nossa população
estaremos aptos a
construir nossas
próprias estatísticas
e a adaptar os
protocolos clínicos
e modelos de risco à
realidade brasileira”
40
setembro/outubro 2013 Onco&
No Brasil existem poucos serviços especializados no diagnóstico de síndromes de predisposição
hereditária ao câncer, bem como no acompanhamento prospectivo dos pacientes e seus familiares.
Esses serviços estão, em sua maioria, alocados em
hospitais-escola e também em instituições privadas,
oferecendo, nesses casos, um atendimento de alto
custo, o que torna o acesso cada vez mais restrito e
difícil18,19. Concorre para agravar a dificuldade de
acesso o fato de que a grande maioria desses centros
de ensino (hospitais-escola) se localiza em grandes
centros populacionais, geralmente em capitais, deixando a população das regiões periféricas sem
acesso ao serviço20. O teste genético para câncer de
mama hereditário não recebe cobertura do Sistema
Único de Saúde nem de planos de saúde privados.
Existem alguns hospitais públicos e privados (sem
fins lucrativos) que oferecem o teste gratuitamente
aos pacientes da própria Instituição (exceção à regra
vigente no país), assim como alguns centros que
oferecem o teste genético vinculado a protocolos de
pesquisa para pacientes em risco provenientes de
seus próprios serviços.
Como uma consequência da quase inexistência
de serviços de genética e câncer no Brasil, dados
sobre agregados familiares de câncer de mama ou
portadores de mutação em BRCA1 e BRCA2 em
nosso meio ainda são escassos. Os principais trabalhos até agora publicados envolvem i) populações
específicas, como mulheres jovens com câncer de
mama; pacientes de origem judaica Ashkenazi ou
ii) regiões e/ou mutações específicas dos genes,
sendo que a maior parte dos estudos concentra suas
análises nas mutações fundadoras situadas nos
genes BRCA1 e BRCA2.
Uma situação peculiar no Brasil é a alta prevalência da mutação p.R337H no gene supressor tumoral TP53. Trata-se de uma mutação fundadora
exclusivamente brasileira, já detectada em diversas
famílias brasileiras, com e sem critérios clínicos
para síndrome de Li-Fraumeni (síndrome autossômica dominante de predisposição hereditária a vários tipos de câncer, especialmente sarcomas,
câncer de mama, tumores do sistema nervoso central, leucemias e tumores adrenocorticais diagnosticados em idade jovem). Inicialmente descrita por
Ribeiro e colaboradores em famílias com carcinoma
adrenocortical do estado do Paraná21, essa mesma mutação, presente no éxon 10 do gene TP53
(c.1010G>A, p.R337H), vem sendo descrita em alta
frequência em várias famílias brasileiras aparentemente não relacionadas. Trabalho realizado por Assumpção e colegas22 analisou 123 mulheres da
região Sudeste do Brasil com história pessoal de
câncer de mama com e sem história familiar positiva de câncer e detectou a mutação p.R337H em
2,4% delas. Adicionalmente, Gomes e colaboradores encontraram essa mutação em 0,5% de 390 mulheres brasileiras com câncer de mama analisadas23.
Estudo realizado pelo nosso grupo indicou que a
frequência populacional da mutação p.R337H na
região Sul do Brasil é de 0,3%24.
Pode-se concluir que, considerando uma população grande e heterogênea como a nossa, muito há
para se pesquisar a fim de compreender melhor a
epidemiologia do câncer de mama hereditário no
Brasil, os principais genes envolvidos, as principais
mutações causadoras, os principais fatores genéticos, epigenéticos e ambientais que possam estar
envolvidos, pois somente conhecendo melhor a
nossa população estaremos aptos a construir as nossas próprias estatísticas e a adaptar os protocolos
clínicos e modelos de risco criados com base em
populações europeias e/ou norte-americanas à realidade brasileira.
Conclusões
Identificar pacientes em risco é fundamental
para direcionar condutas específicas de rastreamento de câncer, permitindo a detecção da doença
em estadios menos avançados e dessa forma aumentando a possibilidade de cura. É fundamental
que se estimule o acompanhamento prospectivo
das famílias de maior risco de forma personalizada.
É preciso transmitir aos pacientes e a seus cuidadores a importância de conhecer a própria história e
guardar bons registros acerca das patologias que
acometem a família.
Referências bibliográficas:
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cirurgia
Evolução do tratamento oncológico
cirúrgico do aparelho digestivo
O
TRATAMENTO DO CÂNCER DO APARELHO DIGES-
Divulgação
TIVO EVOLUIU CONSIDERAVELMENTE AO LONGO
Ulysses Ribeiro Jr.
*Professor associado de Cirurgia do
Aparelho Digestivo da Faculdade
de Medicina da Universidade de
São Paulo; coordenador cirúrgico
do Instituto do Câncer do Estado
de São Paulo Octávio Frias de
Oliveira (Icesp) e oncologista do
Hospital Sírio-Libanês
Contato:
[email protected]
42
setembro/outubro 2013 Onco&
DA ÚLTIMA DÉCADA. TECNOLOGIAS EMERGENtes de imagem e métodos endoscópicos/laparoscópicos melhoraram substancialmente a capacidade
de estadiamento, assim como as intervenções terapêuticas. Houve melhor compreensão do papel
do tratamento cirúrgico dentro do conceito de tratamento multimodal. A avaliação funcional dos
candidatos a tratamento cirúrgico melhorou a indicação e a qualidade da operação, e posteriormente
a qualidade de vida e maior sobrevida dos pacientes oncológicos.
Por outro lado, os cirurgiões têm a responsabilidade de avaliar as novas tecnologias de forma crítica e incorporar a tecnologia em assistência ao
paciente de forma segura e eficiente. Além disso, o
cirurgião continuará com o desafio de manter-se
atualizado e treinado para essas novas tecnologias,
mantendo a coerência, a ética e a boa relação médico-paciente4.
Neste artigo, comentaremos e exemplificaremos
alguns avanços na área do diagnóstico endoscópico
e do tratamento cirúrgico.
Aspectos endoscópicos
Diversos foram os avanços da endoscopia digestiva durante os últimos dez anos. Foram desenvolvidas técnicas diagnósticas mais apuradas, como a
cromoscopia óptica (NBI = narrow banding image e
ou FICE), que permitiu a avaliação mais precisa das
alterações epiteliais através da alteração da frequência da luz utilizada; a endoscopia confocal, que permite visualizar alterações microscópicas em tempo
real no epitélio; e a ecoendoscopia, que possibilitou
um grande avanço no estadiamento das lesões e
permitiu biópsias não acessíveis anteriormente à
endoscopia convencional. Porém, sem dúvida, o
avanço mais importante neste setor foi no campo
do tratamento endoscópico de lesões precoces. Até
1999, a endoscopia era capaz de realizar ressecções
de lesões epiteliais gástricas, esofágicas e colônicas
pequenas (menores que 20 mm), através da mucosectomia. Porém, essa técnica muitas vezes fornecia
peças fragmentadas (piece meal), o que impossibilitava a avaliação anatomopatológica das margens,
dificultando a tomada de conduta por parte do cirurgião. Além disso, a impossibilidade de ressecção
de lesões pré-malignas maiores era responsável por
um grande número de operações, aumentando a
morbidade do tratamento2.
Em 1999 foi descrita pela primeira vez a técnica
conhecida atualmente por ESD (endoscopic submucosal dissection), que consiste em elevar a lesão por
injeção submucosa de substância líquida para realizar cuidadosamente a dissecção por via endoscópica, utilizando-se de pequenos instrumentos de
corte e coagulação desenvolvidos para esse fim. Na
segunda metade da década passada, esse método se
popularizou no Japão e também em países da Europa, da Ásia e no Brasil. Essa técnica possibilita a
ressecção de lesões benignas e malignas não invasivas, inclusive maiores do que 20 mm, como as
LST colorretais, com maior taxa de ressecção R0 e
índice de recorrência local menor do que todas as
outras técnicas endoscópicas. As taxas de complicações, que incluem perfuração e sangramento, são
ao redor de 5%, e a mortalidade é próxima a zero.
O ESD é considerado atualmente peça fundamental no tratamento
das lesões precoces e pré-malignas do trato gastrointestinall2,16. As técnicas ablativas da mucosa (ablação por radiofreqüência e crioterapia)
são coadjuvantes eficazes para EMR e ESD e reduzem a ocorrência de
lesões sincrônicas e metacrônicas dentro do esôfago de Barrett, por
exemplo2,6.
Cirurgia minimamente invasiva
Talvez não haja assunto mais relevante no cuidado de pacientes cirúrgicos oncológicos do que o uso da cirurgia minimamente invasiva
(CMI). Avanços relevantes na técnica cirúrgica tiveram impacto sobre
morbidade perioperatória precoce, tempo de permanência hospitalar,
controle da dor e questões de qualidade de vida3. Os custos gerais da
internação também foram afetados com a introdução da videolaparoscopia cirúrgica. No caso dos doentes oncológicos, esse conceito assume
importância ainda maior, pois permite rápido retorno funcional e número reduzido de complicações da ferida operatória, muito relevante
em pacientes com baixa expectativa de vida.
A rápida convalescença pós-operatória permite a administração
mais rápida de químio e radioterapia, com maior possibilidade de cumprimento de protocolos, talvez melhorando a sobrevida e diminuindo
a recorrência. No entanto, para pacientes oncológicos, historicamente
as questões clínicas mais importantes foram respondidas no contexto
de estudos prospectivos randomizados realizados nesta década.
Apesar de ser considerada a grande revolução na cirurgia abdominal, alguns conceitos relacionados à segurança oncológica resultaram
na introdução tardia do método laparoscópico no tratamento curativo
das neoplasias intra-abdominais12,14. O risco potencial de implantes
tumorais nos locais de introdução dos trocateres e os resultados tardios
do tratamento oncológico (recidiva e sobrevida) limitaram inicialmente
a indicação da videolaparoscopia. Trabalhos posteriores demonstraram, em tumores de cólon e outros órgãos, que a taxa de implante nas
feridas operatórias é semelhante à encontrada nas operações por laparotomia, desde que os princípios oncológicos sejam respeitados.
Dessa maneira, pode-se afirmar que os princípios do tratamento cirúrgico oncológico são perfeitamente atingidos com o método laparoscópico. Ressalta-se que o treinamento deve ser adequado e a curva de
aprendizado é relativamente longa para os procedimentos ditos avançados. Esses princípios abrangem: correto diagnóstico anatomopatológico (exame de congelação e anatomopatológico); no intraoperatório,
deve-se promover a proteção do local da neoplasia; minimizar a manipulação das estruturas ou órgãos; manter a dissecção centrípeta; congelação de margens de ressecção; reconhecimento dos pedículos e
ligadura precoce das veias de drenagem; linfadenectomia adequada com
número satisfatório de linfonodos para o adequado estudo posterior.
Os tumores colorretais, do esôfago e do estômago foram mais am-
plamente estudados e, portanto, teceremos alguns comentários a respeito do papel do método laparoscópico nesses tumores1,5-11,13-17.
Na última década, abordaram-se aspectos relevantes da CMI em
câncer, tais como as consequências imunológicas da CMI versus cirurgia aberta e o papel da laparoscopia no estadiamento dos tumores gastrointestinais (GI). Um marco recente na era dos ensaios clínicos para
CMI e câncer foi a conclusão dos desfechos clínicos de Tratamento Cirúrgico (COST), que randomizou 872 pacientes com adenocarcinoma
do cólon em colectomia por laparotomia versus colectomia por laparoscopia. Esse ensaio clínico de referência demonstrou que os dois grupos não foram significativamente diferentes em termos de sobrevivência
geral em três anos. Esse e outros ensaios clínicos abriram o caminho
para a histórica reconsideração da utilidade da CMI para o câncer1.
Adicionalmente, as complicações pós-operatórias e os resultados
têm sido comparados em vários artigos. Metanálise de Abraão et al.,
publicada em 2004, que incluiu 2.512 pacientes a partir de 12 estudos
controlados e randomizados, não mostrou redução significativa da taxa
de morbidade com CMI contra cirurgia aberta. A única diferença encontrada em complicações locais foram as taxas de infecção da ferida,
duas vezes mais alta nos casos abertos se comparados aos laparoscópicos, mas esses estudos não foram controlados para o uso de protetores de feridas e outros fatores conhecidos por reduzir a incidência
de feridas da infecção pós-operatória15.
No ensaio CLASICC, publicado em maio de 2005, a mortalidade
após a cirurgia aberta foi de 5% em comparação a apenas 1% após a
cirurgia laparoscópica. No entanto, nesse estudo, 29 pacientes necessitaram de conversão, e a taxa de mortalidade para os pacientes desse
grupo foi de 9%, ainda maior do que se o paciente tivesse sido submetido à cirurgia aberta inicialmente. Não foram encontradas diferenças
em complicações perioperatórias, aos 30 ou 90 dias de pós-operatório,
número de transfusões até 7 dias, ou escores de qualidade de vida10.
No estudo COLOR, relatado em 2005, nenhuma diferença foi observada em termos de morbidade e mortalidade, mas esse estudo não
foi controlado cuidadosamente no perioperatório7.
Metanálise publicada por Murray et al. em 2006 encontrou 88
comparações de CMI com cirurgia aberta. Apenas 22 desses estudos
foram, de fato, estudos randomizados controlados. Não houve diferença em termos de mortalidade perioperatória e/ou morbidade perioperatória, a taxa de infecção da ferida foi 2,9% para os pacientes
submetidos à laparoscopia, em comparação com 4,4% para a laparotomia. O grupo laparotomia mostrou um ligeiro aumento na incidência
de problemas respiratórios (1,6% versus 1%), mas nenhuma outra diferença significativa. O tempo médio de internação após a cirurgia laparoscópica nesses grupos foi de 7,8 dias, em comparação com 11,6
dias para a cirurgia aberta15.
O seguimento de longo prazo revelou que a CMI promove igual
Onco& setembro/outubro 2013
43
ou maior sobrevida aos pacientes operados, mostrando de maneira convincente o valor do método
laparoscópico no tratamento dos pacientes com tumores colorretais7,10,15.
Esôfago
“Pode-se afirmar
que os princípios
do tratamento
cirúrgico oncológico
são perfeitamente
atingidos com o
método laparoscópico.
Ressalta-se que o
treinamento deve ser
adequado e a curva
de aprendizado é
relativamente longa
para os procedimentos ditos avançados”
O grande problema da cirurgia de ressecção
esofágica em câncer é a morbidade pós-operatória
elevada, principalmente decorrente de problemas
respiratórios. A incisão cirúrgica, seja no tórax ou
no andar superior do abdome, é a grande responsável por essa elevada morbidade. A laparoscopia e
a toracoscopia têm sido utilizadas no intuito de reduzir a morbidade e promover recuperação mais rápida. A linfadenectomia, torácica ou abdominal, é
perfeitamente factível, e os estudos revelam número
de linfonodos ressecados semelhante pela via aberta
ou laparoscópica. É necessário mencionar que a experiência do serviço é crucial para se obter bons resultados oncológicos e de morbidade e mortalidade
para pacientes já combalidos pela doença11,14.
Estômago
Somado à laparoscopia para o estadiamento do
câncer gástrico, o método laparoscópico pode ser
utilizado nas ressecções ou derivações paliativas,
nas gastrectomias limitadas e culminando com as
gastrectomias e linfadenectomias a D2.
É um excelente método para a ressecção de
GIST gástrico, devido à não necessidade de margens extensas de ressecção e linfadenectomia.
A experiência oriental obtida no Japão, na Coreia e na China se avoluma e, apesar da falta de trabalhos randômicos e controlados, os resultados
quanto ao tratamento cirúrgico intraoperatório (limites de ressecção, linfonodos etc.), assim como de
recorrência e sobrevida de longo prazo, parecem ser
similares aos obtidos nas operações por laparotomia. A utilização de portal que propicie a introdução da mão do cirurgião tem sido feita com
resultados satisfatórios5,9,13,17.
Robótica
A cirurgia robótica surgiu recentemente como
um novo método minimamente invasivo que pode
oferecer aos cirurgiões solução técnica para as limi-
44
setembro/outubro 2013 Onco&
tações da cirurgia laparoscópica. Essas soluções
consistem de uma plataforma estável de câmara
com imagens 3D, instrumento cirúrgico com alto
grau de angulação, filtro de tremores e uma posição
ergonômica do cirurgião. Outro aspecto importante
da cirurgia robótica é que ela permite transmissões
de telesurgery, ou cirurgia remota3,6.
Poucos estudos randomizados, em algumas especialidades, evidenciam a eficácia clínica da robótica. Em cirurgia do trato gastrointestinal, seguem-se
estudos comparativos para a ressecção dos tumores
de reto, esôfago, pâncreas e estômago, mostrando
que não há diferença nos resultados clínicos e que
todos são viáveis cirurgicamente. Alguns levantamentos indicam vantagens nos tumores de reto
baixo e gástricos com T2N0 submetidos à gastrectomia com linfadenectomia a D2. Porém, ainda não
temos estudos randomizados e controlados comparando a videocirurgia e a videocirurgia assistida por
robô no tratamento dos tumores do trato gastrointestinal. Revisões sistemáticas demonstram que as
evidências científicas atuais são inconclusivas e não
dispõem de dados suficientes para confirmar a efetividade e a segurança da cirurgia robótica comparada à cirurgia laparoscópica ou à cirurgia aberta, e
vários estudos citam a necessidade de se obter
maior experiência para demonstrar resultados comparativos entre as técnicas existentes.
A cirurgia assitida por robô foi aplicada nos pacientes com câncer gástrico na Coreia do Sul mais
cedo do que em qualquer outro país. Houve a instalação de cerca de 50 sistemas da Vinci em 20 instituições até agora. As maiores vantagens da gastrectomia assistida por robô são nas manipulações delicadas como na dissecção dos linfonodos D2 e na
realização de anastomose intracorpórea. Mas existem algumas desvantagens. Não só a falta de tato,
mas também a velocidade de manipulação e a mudança de cena não são suficientemente rápidas. O
tempo operatório foi significativamente maior, entretanto, com relação à realização da linfadenectomia D2, os cirurgiões encontraram maior facilidade
de dissecção em torno de grandes vasos quando
assitidos pelo robô, devido à estabilidade da câmara, visão ampliada em 3D e articulação dos braços operacionais.
Cirurgia endoscópica por orifícios naturais (NOTES)
A cirurgia endoscópica por orifícios naturais (NOTES) é um novo
conceito que tenta reduzir o impacto do tratamento cirúrgico no paciente18. Em oncologia cirúrgica, vários estudos já revelaram que a
abordagem minimamente invasiva oferece pelo menos o mesmo resultado, se não um melhor, a longo prazo. Pode-se supor que a abordagem menos invasiva, tal como NOTES, deva aumentar ainda mais essas
vantagens. Desde sua descrição inicial, NOTES tornou-se realidade clínica e hoje quase todos os órgãos são acessíveis por uma abordagem
transluminal, pelo menos no cenário experimental. Os primeiros estudos clínicos em NOTES em oncologia foram relatos de peritoneoscopia transgástrica para estadiamento do câncer de pâncreas, que se
mostrou semelhante à laparoscopia em humanos. A gastrojejunostomia
através do acesso transgástrico também foi proposta para reduzir a invasividade de tratamento paliativo de câncer duodenal, biliar e pancreático. A ressecção de câncer colorretal via acesso transanal pode
oferecer uma vantagem clara e não está sujeita à crítica frequente de
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violar um segundo órgão inocente, como o cólon ou reto, sempre ultrapassados em uma colectomia. O tema da cirurgia por orifícios naturais na doença oncológica ainda é um tanto controverso e indica que
os esforços atuais dos laboratórios para introduzir NOTES em cirurgia
de câncer necessitam de investigações clínicas cautelosas. A determinação final do benefício ao paciente vai precisar ser bem construída
em estudos prospectivos e controlados.
Conclusão
O câncer do aparelho digestivo deve ser encarado como uma
doença crônica em que os vários agentes de saúde devem trabalhar
em conjunto e de forma harmoniosa para conseguir diminuir a morbidade, melhorar a qualidade de vida e aumentar a sobrevida dos nossos pacientes. Os tratamentos geralmente são multimodais e ainda se
procura o momento mais adequado para que cada arma terapêutica
seja utilizada, ou seja, radioterapia, quimioterapia, imunoterapia e
cirurgia3,6.
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Onco& setembro/outubro 2013
45
do bem
Prevenção de câncer
se aprende na escola
Programas levam educação e prevenção de câncer
para crianças e adolescentes
Por Sergio Azman
J
úLIA STEFANI MORAES, 14 ANOS, AINDA ESTÁ CUR9º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL EM
BARRETOS, NO INTERIOR PAULISTA, MAS JÁ SABE QUE
carreira pretende seguir. Ela pensava em trabalhar
na área da saúde, ajudar as pessoas de alguma
forma. Psicologia, talvez. Mas, depois de vencer o
concurso de redação promovido pelo Centro de
Pesquisa em Oncologia Molecular (CPOM) do Hospital de Câncer de Barretos, com direito a estágio de
uma semana no laboratório da instituição, sua escolha profissional pode ter mudado. Júlia agora quer
prestar vestibular para biomedicina. “Eu conheci
profissionais apaixonados pelo que fazem. Conversei com os médicos, comecei a entender o que é biomedicina, o que faz um biomédico, o que estuda, e
estou me interessando muito pelo assunto”, diz.
O concurso de redação teve como tema “DNA
e câncer” e foi realizado com os alunos do 9º ano
do ensino fundamental de escolas municipais e estaduais de Barretos e região, um universo de aproximadamente 2 mil adolescentes. Segundo Henrique
Silveira, coordenador e idealizador do projeto e
pesquisador do Centro de Pesquisa de Biologia Molecular do Hospital de Câncer de Barretos, o concurso é uma tentativa de popularizar a ciência.
SANDO O
46
setembro/outubro 2013 Onco&
“Sempre tivemos vontade de trazer alunos para o
laboratório. Como não conseguimos acomodar
todos os estudantes da cidade, surgiu a ideia de um
concurso de redação para selecionar alguns realmente interessados em conhecer um pouco mais
sobre ciência, que é tão pouco difundida nas escolas”, explica.
A vencedora e sua professora ganharam um tablet cada uma, e os cinco primeiros colocados participaram de um estágio de uma semana no
laboratório de biologia molecular do hospital. “A vivência no laboratório pode servir para abrir um
pouco a cabeça dos alunos sobre o que vão fazer no
futuro”, diz Henrique. A julgar por Júlia, funcionou.
A ideia é que o concurso seja anual, realizado
sempre no primeiro semestre. “Talvez no ano que
vem a gente estenda a participação aos alunos do
1º e 2º ano do ensino médio. Também queremos
ampliar o concurso territorialmente, não apenas na
região de Barretos, e trabalhar outros temas.”
Núcleo de Educação em Câncer
O concurso de redação é uma das iniciativas do
Núcleo de Educação em Câncer (NEC) do Hospital
de Câncer de Barretos, que começou a funcionar no
Divulgação
início deste ano. “Nós percebemos a necessidade de
gerar informação para a população e criamos o Núcleo para desenvolver projetos que atendam não
apenas as escolas, mas também agentes comunitários de saúde”, explica Luciana Garcia, coordenadora do NEC. Segundo ela, já existiam alguns
projetos voltados para a educação, mas não havia
um departamento específico para cuidar do assunto.
Júlia Stefani Moraes, primeira colocada no concurso de
redação promovido pelo Hospital de Câncer de Barretos
Hoje o NEC tem diversos projetos, de curto e
longo prazo. O “Crianças parceiras” acontece com
crianças do ensino fundamental 1, com idade entre
7 e 11 anos. Os professores são capacitados sobre
prevenção do câncer e trabalham o tema o ano todo
com seus alunos. “Nós desenvolvemos todo o material didático, cartilhas, cruzadinhas, exercícios
para a sala de aula, sempre com a temática da prevenção do câncer. Nossa intenção é que esses alunos se transformem em miniagentes de saúde,
propagando a informação e a importância da detecção precoce e da prevenção”, explica Luciana. No
fim do ano, os alunos mostram um pouco do que
aprenderam durante a feira de saúde, em uma
grande exposição temática.
Outro projeto-piloto é a carreta educacional,
que irá percorrer as escolas das cidades da região.
“É uma carreta interativa, com jogos, que permite
absorver esse conteúdo da detecção precoce e prevenção de câncer de uma forma mais dinâmica.”
Um museu também deve ser anexado ao hospital
infantil para explicar às crianças o que causa o câncer, como o corpo reage, o que o tratamento faz até
a cura, além de questões relacionadas à prevenção,
o que poderia ter sido feito para evitar tudo isso.
O NEC também atua no aperfeiçoamento de
agentes comunitários, que têm um contato muito
próximo com a população. “Nós capacitamos esses
profissionais em diferentes frentes, como câncer de
pele, de colo do útero, para que eles estejam mais
aptos a transmitir informações, acompanhar os exames e detectar um câncer o mais rápido possível”,
diz Luciana.
“Nossa intenção é
que esses alunos se
transformem em
miniagentes de
saúde, propagando
a informação e a
importância da
detecção precoce
e da prevenção
de câncer”
O câncer tem cura quando diagnosticado a tempo.
E, mais do que isso, podemos inibir o seu processo com
métodos preventivos e exames periódicos. A vida vale
a pena! Prevenir-se é um ato de amor com você mesmo.
Trecho da redação da aluna Júlia Stefani Moraes, vencedora do primeiro concurso de redação do
Centro de Pesquisa em Oncologia Molecular (CPOM) do Hospital de Câncer de Barretos
Onco& setembro/outubro 2013
47
Sol, amigo da infância
Apesar da adesão do grupo Mauricio de Souza, que entendeu a importância social, educativa e de saúde pública da campanha, os custos
de impressão são altos, e a tiragem inicial não contou com patrocínios,
apenas recursos próprios da SBD-SP. “O projeto foi apresentado o projeto para as empresas que geralmente apoiam as atividades da dermatologia, mas infelizmente não houve interesse. Até o momento o único
apoio que obtivemos foi do Rotary da baixada santista, que abraçou a
campanha e tem colaborado consoco”.
Divulgação
Divulgação
Educar as crianças e, através delas, seus familiares a respeito de
um comportamento seguro de exposição solar. Esse é o objetivo da
campanha “Sol, amigo da infância”, criada pela regional São Paulo da
Sociedade Brasileira de Dermatologia para crianças do ensino fundamental de escolas públicas e privadas. “Nossa campanha não é para o
uso do protetor, é uma campanha de educação à exposição solar. É o
protetor, horário do dia, o chapéu, os óculos, a roupa, são vários elementos que podem contribuir para um menor dano do ultravioleta no
DNA humano”, explica o idealizador, Paulo Ricardo Criado, presidente
da entidade.
Mônica chamado A Pele e o Sol, com uma história divertida sobre as
medidas necessárias para uma correta exposição solar. A tiragem inicial
foi de 500 mil exemplares, distribuídos nas balsas entre São Sebastião
e Guarujá, nas estradas do sistema Ecovias, em hospitais e para os 7
mil dermatologistas do estado de São Paulo.
A campanha tem como exemplo o programa australiano Sun
Smart, que desde a década de 1970 ensina atitudes sadias em relação
à exposição solar para crianças na escola. O trabalho já está produzindo algumas alterações na incidência do câncer de pele na população
adulta que recebeu esses ensinamentos 40 anos atrás.Daí a importância
de estabelecer programas de educação sobre boas práticas de exposição
solar ainda na infância.
A escolha da faixa etária, realmente, não se deu por acaso. Vários
estudos mostram que crianças são mais vulneráveis a mudar o comportamento e ser um multiplicador de informação no seu meio. “Aproximadamente 50% da carga de radiação ultravioleta que o ser humano
recebe em sua vida acontece até os 18, 20 anos de idade. As crianças
passam mais tempo em atividades recreativas, a céu aberto, e os jovens
têm uma tendência a acreditar que a exposição solar é saudável e não
tem nenhum efeito indesejável”,diz.
O projeto busca utilizar formas lúdicas como revistas em quadrinhos, desenhos animados e técnicas teatrais para ajudar a criança a
fixar a mensagem. Para isso, foi desenvolvido um gibi da turma da
48
setembro/outubro 2013 Onco&
O dermatologista Márcio Baldissera em aula sobre exposição solar
para crianças do colégio Marista São Francisco de Chapecó - SC
Prevenção nas escolas
Além da distribuição dos gibis, a campanha compreende a ação
junto às escolas. Um acordo foi firmado com as prefeituras das cidades
de Santos e São Vicente para atingir cerca de 40 mil crianças, que irão
ganhar revistas, assistir ao DVD e discutir o assunto em sala de aula.
Também está fechada uma parceria com o Sesi do estado de São Paulo
para oferecer o material da campanha a 40 mil crianças da instituição.
Para treinar os professores – 1,5 mil só na Baixada Santista –, a
prefeitura de Santos está criando um ambiente virtual, de ensino a distância, onde os professores podem se cadastrar, fazer o curso e programar as atividades que irão realizar com as crianças em sala de aula.
Serão confeccionados kits escolares com cartazes, DVD com os personagens da turma da Mônica e apostilas para o professor, com literatura
técnica a respeito de câncer de pele e prevenção, para que ele possa res-
ponder às dúvidas das crianças e dos pais e preparar
suas aulas.
Tendo em vista a importância do tema, a entidade nacional acabou encampando o projeto e pretende levá-lo para todos os estados do Brasil.
“Tivemos, de forma espontânea, mais de 50 escolas
do Brasil inteiro solicitando material e aulas. É uma
campanha que está crescendo”, comemora Criado.
A ideia é que ela se torne um programa anual, para
que a mensagem seja continuamente reforçada. Na
cidade de São Paulo, uma lei foi aprovada e determina que seja promovido em todo o município, sempre na última semana de setembro, o programa “Sol,
amigo da infância”, com atividades relativas ao ensino de boas práticas de proteção solar na infância.
Questionários podem ajudar a mapear
regiões com crianças mais vulneráveis
O câncer de pele não é uma doença de notificação compulsória. Não se é obrigado a notificar todo
diagnóstico às autoridades sanitárias. “Os dados
sobre incidência de câncer de pele são uma projeção
e podem não refletir exatamente a realidade do
país”, explica Criado. Ele explica que grande parte
desses dados são coletados nos laboratórios de anatomia patológica, para onde vão as pecas cirúrgicas
que são retiradas. “Mas nos rincões do Brasil isso
pode estar sendo subnotificado”, alerta.
A proposta levada às escolas é acompanhada de
alguns questionários para tentar traçar um perfil
populacional dessa população atendida. Um questionário é para ser aplicado ao professor, sobre as
condições do estabelecimento de ensino, se existe
quadra coberta para fazer atividade física, o horário
dessas atividades; outro é enviado para as famílias
dos alunos, com questões sobre as características
físicas das crianças, cor dos olhos, tipo de pele, se
têm muitas pintas pelo corpo. “São dados importantes para saber quais as regiões tem as crianças
mais vulneráveis, mais suscetíveis ao câncer de
pele”. Também são aplicados testes em alunos e
professores antes e depois do treinamento, para aferir o aprendizado. O preenchimento dos questionários, no entanto, é voluntário. “Esperamos que
os participantes colaborem com o retorno desses questionários para que tenhamos uma noção
melhor da vulnerabilidade da nossa infância”, diz
Criado.
“Tivemos, de forma
espontânea, mais de
50 escolas do Brasil
inteiro solicitando
material e aulas. É
uma campanha que
está crescendo”
Saber Saúde
O programa “Saber Saúde” é uma ação do Programa Nacional de Controle do Tabagismo, da
Coordenação de Controle do Tabagismo e Outros Fatores de Risco, do Instituto Nacional de Câncer
(Inca). É uma proposta de educação para a saúde que tem por objetivo formar cidadãos responsáveis
e críticos, capazes de decidir sobre a adoção de estilos de vida saudáveis.
Realizado à distância, o curso oferecido pelo Inca oferece ferramentas e conhecimento para que
os profissionais de saúde e educação desenvolvam o “Saber Saúde” nas escolas, explorando os fatores
de risco para o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis, entre elas, o câncer. No conteúdo do programa estão consumo de tabaco e álcool, exposição excessiva à radiação solar, inatividade
física, alimentação inadequada e sexo sem proteção.
O projeto-piloto, implantado no Paraná, contou com 263 inscritos, sendo que 199 participantes
concluíram o curso e receberam seu certificado. Em abril de 2013, formou-se a primeira turma. Desta
vez, foram inscritos profissionais das secretarias estaduais de saúde e educação dos 26 estados brasileiros mais o Distrito Federal, totalizando 576 participantes.
Foram disponibilizadas 540 vagas em ambiente virtual de aprendizagem (Plataforma MOODLE), com tutoria e certificação fornecidas pelo Inca. O curso, com carga horária de 60 horas, foi
concluído por 303 participantes.
Onco& setembro/outubro 2013
49
curtas
Vigilância ativa em câncer de próstata pode não ser a melhor estratégia
para homens negros
Um estudo do Johns Hopkins
Institute com mais de 1.800 homens entre 52 e 62 anos sugere
que afro-americanos diagnosticados com câncer de próstata de baixo risco têm mais probabilidade de
apresentar a doença agressiva do
que homens brancos, o que pode
passar despercebido com as atuais
abordagens diagnósticas. Embora
estudos anteriores indiquem o monitoramento de alguns tipos
de câncer de próstata de crescimento lento ou de baixo risco, a
vigilância ativa parece não ser a estratégia mais adequada para
homens negros.
“É a evidência mais convincente disponível até agora de que
a aplicação da vigilância ativa pode não ser adequada para afroamericanos”, disse Edward Schaeffer, urologista do Instituto e
coautor do estudo. “Nós acreditamos estar acompanhando um
pequeno câncer não agressivo, mas na realidade este estudo mostra que em homens negros esses tumores são às vezes mais agressivos do que se pensava. Eles apresentam risco muito maior de
ter um tumor mais agressivo em desenvolvimento em um local
que não é facilmente diagnosticado por meio de uma biópsia de
próstata padrão”, complementou.
Um relatório da investigação, publicado no Journal of Clinical
Oncology, a descreve como a maior análise de potenciais disparidades de saúde baseadas na raça dos homens diagnosticados
com uma forma de crescimento lento e não agressivo do câncer
de próstata.
O estudo também mostrou que a taxa de aumento do risco
patológico, medida pela Avaliação de Risco de Câncer de Próstata
(CAPRA), também foi significativamente maior em afro-americanos (14,8% versus 6,9%). A pontuação CAPRA é um preditor
de recorrência bioquímica da doença com base nos níveis sanguíneos do antígeno específico da próstata, escore Gleason, envolvimento dos linfonodos, extensão extracapsular, invasão da
vesícula seminal e margens cirúrgicas positivas.
Todos os participantes da pesquisa (1.473 brancos e 256 negros) se encontravam dentro dos critérios do National Compre-
50
setembro/outubro 2013 Onco&
hensive Cancer (NCCN) para câncer de próstata de risco muito
baixo, sendo bons candidatos para a vigilância ativa. Os achados
da investigação mostraram que as características pré-operatórias
foram semelhantes para brancos e negros de muito baixo risco,
embora os homens negros tivessem pior pontuação do índice de
comorbidade de Charlson, comumente usado para avaliar a expectativa de vida.
A análise detalhada revelou que os negros tinham menor taxa
de câncer confinado à próstata (87,9% versus 91%), maior score
de Gleason (27,3% versus 14,4%), assim como um PSA significativamente maior.
De acordo com Schaeffer, a média de idade dos homens
em seu estudo foi de 58 anos, mais jovem do que a idade média
(62 a 70) dos homens em grupos de vigilância ativa. Ele advertiu
que essa diferença pode confundir os resultados, destacando a
necessidade de mais pesquisas para avaliar a segurança da vigilância ativa.
Estudos anteriores revelaram uma incidência muito maior de
morte pela doença em afro-americanos em relação aos homens
caucasianos. De acordo com o National Cancer Institute, os negros têm taxas de incidência consideravelmente mais elevadas
(236 casos por 100 mil) do que os brancos (146,9 casos por 100
mil), em análise realizada de 2005 a 2009.
O médico enfatizou que os critérios utilizados para definir o
câncer de próstata de risco muito baixo funcionam bem em brancos, já que os estudos utilizados para validar os sistemas de classificação de risco são comumente realizados com caucasianos.
“Devem ser desenvolvidos critérios específicos de vigilância ativa
para os homens negros. Nossa equipe de pesquisa, em colaboração com o patologista Jonathan Epstein, do Johns Hopkins, está
desenvolvendo uma nova tabela de riscos baseada em raças para
começar a resolver esta questão fundamental”, acrescenta.
A principal limitação do estudo é que é uma análise retrospectiva da experiência de um único centro médico acadêmico.
“Os resultados não sugerem a rejeição universal da vigilância
ativa em negros, mas devem promover estudos futuros para avaliar se critérios alternativos de ingresso na vigilância devem ser
utilizados para garantir a paridade oncológica dos homens afroamericanos com os homens brancos”, diz Schaeffer.
Estudo com apoio do Breast
Cancer Collaborative Group
buscou caracterizar a associação entre as concentrações de
hormônio (estrogênio, progesterona e androgênio) e os fatores de risco para câncer de
mama em mulheres na pré-menopausa. A análise compreendeu sete estudos prospectivos
e considerou os dados individuais das participantes para prédiagnóstico de hormônio sexual e concentrações de Globulina Ligadora de Hormônio Sexual (SHBG). Apenas as mulheres que estavam na pré-menopausa, com menos de 50
anos na coleta de sangue, foram consideradas na análise,
assim como aquelas diagnosticadas com câncer de mama
antes dos 50 anos.
Estimou-se odds ratio (OR) com intervalo de confiança
de 95% para o câncer de mama associado com concentrações
de hormônio, e as mulheres do grupo controle foram pareadas por idade, data de coleta de sangue, dia do ciclo e índice
de massa corporal (IMC). As concentrações hormonais médias foram comparadas.
Foram incluídos dados de 767 mulheres com câncer de
mama e de 1.699 casos em controle identificados nas análises
de risco. O risco de câncer de mama foi associado a uma duplicação das concentrações de oestradiol (OR 1,19, 95% CI
1,06-1,35), estradiol livre (1,17, 1,03-1,33), estrona (1,27,
1,05-1,54), androstenediona (1,30, 1,10-1,55), sulfato de
dehidroepiandrosterona (1,17, 1,04 -1,32), testosterona
(1,18, 1,03-1,35) e testosterona livre (1,08, 0,97-1,21).
O risco de câncer de mama não foi associado com progesterona na fase lútea (dobrando de concentração ou 1,00,
95% CI 0,92-1,09), e ajustes para outros fatores tiveram
pouco efeito sobre qualquer uma destas ORs. Análises transversais em mulheres do grupo controle mostraram várias associações entre a presença de hormônios sexuais e fatores de
risco para câncer de mama. Os estrogênios e androgênios circulantes estão associados positivamente com o risco de câncer de mama em mulheres na pré-menopausa.
Istockphotos
Os hormônios sexuais e o risco
de câncer de mama em mulheres
na pré-menopausa
Anvisa aprova medicamento para
câncer de mama metastático
O câncer de mama metastático HER2 positivo é uma
forma agressiva de câncer de mama, na qual há um aumento
da quantidade do receptor 2 (HER2) do fator de crescimento
epidérmico humano na superfície das células tumorais. Essa
alteração afeta de 15% a 20% das mulheres que sofrem de
câncer de mama. Para tratar esse grupo, um novo medicamento, o Perjeta™ (pertuzumabe), foi aprovado no Brasil
pela Anvisa, em combinação com Herceptin® (trastuzumabe) e docetaxel. A indicação é para pacientes com câncer
de mama metastático ou localmente avançado HER2 positivo, sem tratamento prévio para a doença metastática. Já
aprovado na Europa e nos Estados Unidos, o medicamento
biológico tem como alvo o receptor HER2, proteína encontrada em grandes quantidades na parte externa de células tumorais, entre elas as do câncer de mama.
A aprovação da Anvisa se baseou no estudo Fase III
CLEOPATRA, conduzido em 25 países, que incluiu 808 pacientes com câncer de mama metastático HER2 positivo, incluindo cerca de 100 pacientes brasileiras de diversos centros
de pesquisa. O estudo demonstrou que a combinação de Perjeta™(pertuzumabe), Herceptin® (trastuzumabe) e quimioterapia proporcionou aos pacientes, em média, 6,1 meses de
sobrevida livre de progressão da doença e uma redução de
34% no risco de morte (sobrevida global) em comparação ao
uso de Herceptin® (trastuzumabe) com quimioterapia somente. Comparados à terapia atual, esses dados representam
um ganho no tratamento da doença metastática de mama.
Além de eficaz, a terapia com Perjeta™ (pertuzumabe) demonstrou ser bem tolerada e segura. O preço do medicamento ainda está em negociação com os órgãos competentes.
Onco& setembro/outubro 2013
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Estudo europeu investiga a associação entre a poluição do ar e a incidência
de câncer de pulmão
Uma análise prospectiva dos dados obtidos pelo Estudo Europeu de Coortes para Efeitos da Poluição Atmosférica (ESCAPE) utilizou informações de 17 estudos com base em nove países para avaliar
a associação entre a exposição de longo prazo à poluição do ar e a incidência de câncer de pulmão em
populações europeias. A poluição do ar foi avaliada pelos modelos de regressão de Cox para material
particulado (PM) com diâmetro inferior a 10 m (PM10), menos de 2-5 m (PM2-5), e entre 2-5 e 10
m (PMcoarse), além de avaliar o impacto da exposição a fuligem e óxidos de nitrogênio.
Ao todo, 312.944 indivíduos integraram os coortes. Durante o seguimento médio de 13 anos,
2.095 casos de câncer de pulmão foram diagnosticados.
As metanálises mostraram uma associação estatisticamente significativa entre o risco de câncer de
pulmão e PM10, com HR de 1,22 (95% CI 1,03-1,45). Para PM2-5, a HR foi de 1,18 (0,96-1,46) por
5 g/m3. Os mesmos incrementos de PM10 e PM2-5 foram associados com adenocarcinomas do pulmão, com HR de 1,51 (1,10-2,08) e 1,55 (1,05-2,29), respectivamente. Um aumento do tráfego rodoviário de 4 mil veículos por dia a cerca de 100 metros da residência foi associado com um HR para
o câncer de pulmão de 1,09 (0,99-1,21). Os resultados não mostraram associação entre câncer de pulmão e concentração de óxidos
de nitrogênio (HR 1,01 [0,95-1,07] por 20 g/m3) ou intensidade de tráfego na rua mais próxima (HR 1,00 [0,97-1,04] por 5 mil veículos por dia). A interpretação final foi de que a poluição do ar, com presença de material particulado, contribui para a incidência de
câncer de pulmão na Europa.
Novo biomarcador pode predizer o risco de metástase em câncer de intestino
Cientistas da Universidade de Southampton identificaram uma proteína capaz de desempenhar papel
crucial no reconhecimento de pacientes com câncer de intestino com alto risco de metástase. O estudo
foi publicado no British Journal of Cancer e descobriu que pacientes com níveis baixos da proteína conhecida como FOXO3 tiveram risco aumentado de progressão da doença.
Ao comparar os níveis de FOXO3 em amostras de tecido de pacientes com diferentes fases de câncer
do intestino, os investigadores encontraram a proteína e a identificaram como um bom preditor da evolução da doença, uma vez que a diminuição dos níveis da proteína estava associada a tumores metastáticos,
portanto mais agressivos. “Nossos resultados sugerem que olhar para os níveis de FOXO3 pode ajudar a
destacar quais pacientes necessitam de tratamentos adicionais para evitar a progressão ou recorrência da
doença”, disse Alexander Mirnezami, primeiro autor do estudo e cirurgião do hospital da Universidade
de Southampton.
Apesar de outros estudos terem analisado o papel de FOXO3 em tumores, esta é a primeira vez que se estabelece uma ligação clara
entre os níveis da proteína e o crescimento do tumor. “Como estamos prosseguindo com a investigação, esperamos agora identificar
outros novos biomarcadores que podem ajudar a adaptar tratamentos de acordo com as características do tumor, como parte de uma
abordagem personalizada para o tratamento do câncer”, acrescentou.
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setembro/outubro 2013 Onco&
Equipamento de medicina nuclear
realiza estudos do corpo inteiro
em até cinco minutos
O Alta Excelência Diagnóstica, laboratório voltado para o
segmento Premium, disponibiliza um dos equipamentos de
PET-CT (tomografia por emissão de pósitrons) mais rápidos do
mercado, com capacidade para realizar estudos do corpo inteiro em até cinco minutos. O exame é um dos métodos mais
eficientes para identificação e acompanhamento de alguns tipos
de câncer, doenças do coração e neuropsiquiátricas.
Com recursos diagnósticos da medicina nuclear (PET) e da
radiologia (CT), o equipamento sobrepõe as imagens metabólicas (PET) às imagens anatômicas (CT). “Fazendo analogia
com um mapa meteorológico, podemos dizer que as áreas
quentes e frias representam o PET, e o mapa, o CT. Ou seja,
enquanto o exame PET demonstra a função biológica do corpo
antes que mudanças anatômicas ocorram, o exame CT fornece
informações sobre a anatomia do corpo, como tamanho, formato e localização”, explica Carlos Buchpiguel, responsável
pelo setor de Medicina Nuclear e Imagem Molecular do Alta
Excelência Diagnóstica.
O aparelho permite realizar exames em um curto espaço
de tempo, com eficiência e segurança. Sua tecnologia possibilita adquirir imagens em 3D e 4D, corrigindo falhas produzidas
pelos movimentos respiratórios ou por pequenos movimentos
do corpo.
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setembro/outubro 2013 Onco&
Tratamento para pessoas com
câncer de tireoide em estágio
avançado
Apresentado na ASCO 2013, em Chicago, o estudo de fase
III, internacional, multicêntrico DECISION (sorafenibe em pacientes com câncer de tireoide refratário a iodo radiativo, localmente avançado ou metastático), da Bayer HealthCare Pharmaceuticals em parceria com a Onyx Pharmaceuticals Inc.,
randomizou 417 pacientes com câncer de tireoide bem diferenciado refratário a iodo radioativo, localmente avançado ou
metastático (células de Hürthle, folicular, papilífero e pobremente diferenciada), que não haviam recebido quimioterapia
anterior, inibidores de tirosina-quinase, anticorpos monoclonais com alvo no VEGF ou o receptor do VEGF, ou outras terapias alvo para câncer de tireoide.
Os pacientes receberam 400mg de Nexavar® (tosilato de
sorafenibe) oral duas vezes por dia ou placebo equivalente. Durante o tempo de progressão e de acordo com a condição clínica de cada paciente, as pessoas do grupo que recebeu placebo
tiveram a opção de mudar para o Nexavar®. O endpoint primário foi a sobrevida livre de progressão, conforme definida pelos
Critérios de Avaliação de Resposta em Tumores Sólidos (RECIST, em inglês). Os endpoint secundários incluíram sobrevida
global, tempo até a progressão, índice e duração de resposta.
A segurança e a tolerabilidade também foram avaliadas.
Em comparação com placebo, o uso de Nexavar® apresentou redução de 41% no risco de progressão ou morte dos pacientes em comparação às pessoas tratadas com placebo. A
média se sobrevida foi de 10,8 meses em pacientes tratados
com sorafenibe em comparação aos 5,8 meses nos que receberam o placebo.
No Brasil, o Nexavar® está aprovado para o tratamento de
carcinoma hepatocelular e para o tratamento de pacientes com
carcinoma celular renal (CCR) avançado que não obtiveram
sucesso em terapia anterior à base de interferon-alfa ou interleucina-2 ou foram considerados inadequados a essa terapia.
mundo virtual
Onco& recomenda
A seção Mundo Virtual ajuda a selecionar o que é ou não relevante e confiável na internet.
A cada edição, sites e aplicativos sobre oncologia voltados tanto para médicos, com novidades
e informações sobre a área, como para pacientes, com dicas de prevenção e assistência ao doente.
Compartilhando conhecimento e experiências sobre o câncer
Se antes a palavra câncer era um tabu, uma palavra que muitas
vezes não era sequer pronunciada, hoje ela não só é falada como também muito escrita, lida, curtida, comentada e compartilhada. A oncologia, em todas as suas esferas, tem aproveitado as diversas ferramentas
das mídias sociais com informações sobre prevenção, fatores de risco,
diagnóstico e tratamento, promovendo uma troca de experiência importante entre os profissionais e alívio e informação para pacientes
e familiares.
A Mayo Clinic é um exemplo de sucesso do uso das redes sociais
por organizações de saúde. Criada em 2011, já nos primeiros dias a
rede social www.mayoclinic.org/connect contava com cerca de mil
cadastrados. A rede inclui conteúdo de vários blogs, vídeos sobre saúde
e atendimento médico no canal da instituição no YouTube, links para
notícias sobre pesquisas, avanços em tratamento, além de um fórum
de discussão para os membros. A comunidade é gratuita e aberta a
quem quiser participar.
As novas tecnologias são levadas tão a sério que foi criado a Mayo
Clinic Center for Social Media [MCCSM], um centro dedicado ao uso
das mídias sociais para promover a educação em saúde. Hoje, a Mayo
Clinic tem o canal de assistência médica mais popular no YouTube,
mais de 450 mil seguidores no Twitter e uma página de Facebook ativa
com mais de 300 mil conexões.
Oncologia no Facebook
Outro exemplo do bom uso e da importância das redes sociais é o perfil no Facebook do A.C.Camargo
Cancer Center, de São Paulo. Criada em 2011, a página se tornou a primeira do mundo – exclusivamente
voltada ao tratamento do câncer – a alcançar a marca de 100 mil fãs no Facebook, com mais de 7 milhões
de pessoas alcançadas em um único mês. O A.C.Camargo superou grandes centros da oncologia mundial,
como M.D.Anderson, John Hospkins, Memorial Sloan-Kettering, Dana-Farber, Fox Chase e Gustave Roussy.
A página possui conteúdo bastante diversificado, com dicas de saúde, prevenção de câncer, fatores de risco e a importância do diagnóstico
precoce para o sucesso no tratamento. O conteúdo multimídia traz vídeos e notícias sobre as principais novidades da oncologia, além da
cobertura online de palestras e workshops abertos ao público e eventos científicos como simpósios, conferências e congressos.
Além dos 100 mil fãs no Facebook (www.facebook.com/accamargocancercenter), os perfis do A.C.Camargo somam mais de 4 mil
seguidores no Twitter (@haccamargo), 2 mil seguidores no LinkedIn (www.linkedin.com /company/accamargo) e 200 mil visualizações no
canal oficial no YouTube (accamargovideos). A instituição também atua no Flickr (www.flickr.com/photos/accamargo).
50 mil likes
O Hospital do Câncer de Barretos também tem investido nas redes sociais. Sua página no Facebook atingiu recentemente 50 mil likes (curtidas). A página, que existe desde junho de 2011, divulga campanhas e ações do hospital, traz dicas de prevenção, relatos, histórias de vida de pacientes e notícias veiculadas sobre o hospital e funciona
também como mais um canal para doação e divulgação de campanhas de arrecadação de fundos.
Participa de redes sociais? Curta a Onco& no Facebook (facebook.com/RevistaOnco) e acompanhe nossas novidades no Twitter (twitter.com/RevistaOnco).
Onco& setembro/outubro 2013
55
acontece
Fique por dentro dos congressos, simpósios, encontros de atualização
e outros tantos eventos do mundo da oncologia. Confira aqui o que foi destaque:
XVI Jornada de Patologia do A.C.Camargo Cancer Center / VI Encontro Internacional de Patologia Investigativa /
II Consultando o Especialista
Divulgação
A análise das chamadas células tumorais circulantes (circulating tumor cells – CTCs), procedimento
que vem sendo chamado de biópsia líquida, foi um dos destaques do evento promovido pelo A.C.
Camargo Cancer Center entre 7 e 10 de agosto, em São Paulo. O evento, coordenado pelo patologista
Fernando Soares, diretor de anatomia patológica do hospital, reuniu patologistas do Brasil, dos Estados
Unidos, da Espanha, da Alemanha e do Uruguai.
Paralelamente à Jornada de Patologia aconteceu a segunda edição do Consultando o Especialista/Seminário de Lâminas, uma iniciativa inédita no país para que profissionais da área possam discutir seus
próprios casos com os principais nomes do mundo em diagnóstico histopatológico de diferentes tipos
de câncer. Os convidados deste ano foram Bruce Wenig, Antônio Nascimento, Vania Nose e José Vassalo.
Aidan Carney, patologista da Mayo Clinic
Pulmão & Câncer – O Pulmão no Contexto Oncológico
Divulgação
Realizado pelo Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês, Núcleo Avançado de Tórax do
HSL em parceria com o Memorial Sloan-Kettering Cancer Center (MSKCC), o evento Pulmão &
Câncer – O Pulmão no Contexto Oncológico trouxe para o debate vários profissionais para discutir
com profundidade os temas de prevenção, diagnóstico precoce e tratamento nas diversas fases de
evolução da doença.
Entre os convidados, o francês Philippe Camus, pneumologista com inúmeras publicações sobre
toxicidade pulmonar e grande experiência no diagnóstico diferencial de lesões pulmonares; e os profissionais do MSKCC, M. Catherine Pietanza, oncologista clínica especializada em neoplasias primárias
do pulmão, William Travis, patologista com grande contribuição internacional para a classificação das
neoplasias torácicas e entendimento do perfil molecular dessas doenças, e James Huang, cirurgião torácico responsável pela implantação e manutenção do registro de timomas do MSKCC.
I Congresso de Oncologia D’Or
Divulgação
A Rede D’Or promoveu nos dias 5 e 6 de julho o I Congresso de Oncologia D’Or, no Rio de Janeiro,
com a presença de médicos e professores do Hospital Johns Hopkins (EUA). O evento abordou
o estado da arte em tratamentos contra tumores de pulmão, mama, gastrointestinais, geniturinários
e melanomas.
Entre os médicos convidados, destaque para os brasileiros Antonio Carlos Wolff e Mario Eisenberger, que pesquisam a biologia e novos tratamentos contra câncer de mama e próstata, respectivamente.
“O Johns Hopkins é um centro médico de vanguarda em termos de pesquisa clínica. Eles são referência
global em testes com novas terapias e testes moleculares com a chamada personalização do tratamento”,
afirmou o oncologista Daniel Herchenhorn, organizador do evento.
56
setembro/outubro 2013 Onco&
calendário 2013
Evento
Data
Local
Informações
XVIII Congresso Paulista de
Obstetrícia e Ginecologia
5 a 7 setembro
São Paulo, SP
www.sogesp.com.br/congresso/2013/inicio
Encontro Nacional de Endoscopia Oncológica –
ENEO 2013 / III Curso Internacional de
Endoscopia Oncológica
6 e 7 de setembro
São Paulo, SP
www.icesp.org.br/calendario/eventos/
06-09-2013/135/III-Encontro-Nacionalde-Endoscopia-Oncol%C3%B3gica
III Congresso Internacional de Câncer
Gastrintestinal
6 e 7 de setembro
São Paulo, SP
www.hospitalsiriolibanes.org.br/
oncologia/gastro-intestinal/index.html
Breast Cancer Symposium 2013
7 a 9 de setembro
San Francisco, CA
http://breastcasym.org/
WIN Symposium 2013 – Worldwide Innovative
Networking in Personalized Cancer Medicine
10 a 12 de setembro
Paris, França
www.winsymposium.org/
Pleura e Câncer de Pulmão
13 e 14 de setembro
Manaus, AM
www.sbpt.org.br/?op=paginas&tipo=
pagina&secao=17&pagina=1118
XI ONCOCESP – Encontro de Oncologia
do Centro-Oeste Paulista
13 e 14 de setembro
Ribeirão Preto, SP
www.sbcancer.org.br/home2/site/index.
php?option=com_eventlist&view=details
&id=74:xi-oncocesp-encontro-de-oncolo
gia-do-centro-oeste-paulista&Itemid=126
BEST OF ASCO 2013
13 e 14 de setembro
Praia do Forte, BA
www.ascoinbahia.com.br
Seminários Regionais Sobrafo – Ribeirão Preto
14 de setembro
Ribeirão Preto, SP
www.sobrafo.org.br
XXIV Congresso Brasileiro de Cirurgia
de Cabeça e Pescoço
18 a 21 de setembro
Brasília, DF
www.ccp2013.com.br/
X Simpósio Mineiro de Enfermagem e
Farmácia em Oncologia
19 e 20 de setembro
Belo Horizonte, MG
www.ceomg.com.br/simposio/2013
/x/index.php
IV Simpósio de Enfermagem em Oncologia
20 e 21 de setembro
São Paulo, SP
http://iep.hsl.org.br/Paginas/curso.aspx?
IdAtividade=359&pnv=0
ASTRO’s 55th Annual Meeting
22 a 25 de setembro
Atlanta, GA
www.astro.org
3º Congresso Sul-Americano de Videocirurgia e
o V Congresso Sul-Brasileiro de Videocirurgia
26 a 28 de setembro
Porto Alegre, RS
www.socigers.org/jacad2013/
European Cancer Congress 2013
(ECCO-ESMO-ESTRO)
27 de setembro
a 1 de outubro
Amsterdã, Holanda
www.esmo.org/Conferences/EuropeanCancer-Congress-2013
68º Congresso Brasileiro de Cardiologia
28 de setembro
a 1 de outubro
Rio de Janeiro, RJ
http://congresso.cardiol.br/68/
V Congresso Internacional de Cuidados Paliativos
9 a 12 de outubro
Porto de Galinhas, PE www.vcongressoancp.com/
12º Congresso Brasileiro de Clínica Médica
9 a 12 de outubro
Porto Alegre, RS
www.clinicamedica2013.com.br
Fifth InterAmerican Oncology Conference
10 e 11 de outubro
Buenos Aires, AR
www.oncologyconferences.com.ar
Congresso e X Jornada de Psicologia da Saúde –
O Sentido do Cuidar
12 a 14 de outubro
São Paulo, SP
www.sbpo.org.br/descricao_evento_
sbpo.php?cod_eventos=98
XI Congresso da Sociedade Brasileira de
Cirurgia Oncológica
17 a 19 de outubro
São Paulo, SP
www.congressosbco.com.br
XVIII Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica
23 a 26 de outubro
Brasília, DF
www.sboc2013.com.br/index.php
Calendário de eventos de 2013 completo e atualizado:
58
setembro/outubro 2013 Onco&
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