TCC Elenir - Versão Final (Original)

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ELENIR MARIA RICHTER
ESTUDO DO LUGAR: GIRUÁ E O BUTIÁ,
MANIFESTAÇÕES DA CULTURA NO ESPAÇO
Trabalho apresentado ao Curso de Graduação
em Geografia da Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul –
UNIJUÍ, Câmpus Ijuí, RS, como requisito
parcial à obtenção do título de Licenciada em
Geografia.
Orientadora: Profª Ms. Célia Clarice Atkinson
Ijuí, RS
2014
ESTUDO DO LUGAR: GIRUÁ E O BUTIÁ,
MANIFESTAÇÕES DA CULTURA NO ESPAÇO
Elenir Maria Richter1
Célia Clarice Atkinson2
RESUMO
Este trabalho dedica-se ao estudo das manifestações culturais que permeiam as
relações sociais dentro de um determinado território. A ação humana ocorre de diferentes
formas em tempos simultâneos, resultado da infinidade de culturas que agem sobre o espaço
natural. É este espaço e lugar que propiciam a percepção que ultrapassa o reconhecimento
puramente físico do meio, havendo também aspectos da subjetividade e identidade que devem
ser considerados. O município de Giruá tem como árvore símbolo o butiazeiro, espécie
arbórea muito comum em toda a extensão geográfica que compreende a área urbana e rural,
sendo que, desde o processo inicial de povoamento, os índios faziam uso de seu fruto e da
palha, o que se estendeu a outros povos que aqui se estabeleceram, utilizando-se do mesmo
para fazer compotas e, de sua palha, chapéus e colchões. Na década de 90 houve uma
preocupação maior da comunidade local em resgatar suas raízes. O Decreto Municipal nº
972/90 instituiu o butiazeiro como árvore símbolo do município. A comunidade - imbuída de
sentimento coletivo em firmar uma identidade cultural, através do resgate de seus referenciais
histórico ambientais – buscou, através de ações concretas, incentivar o culto ao butiá,
promovendo, além do reflorestamento, festivais de música nativista, Festa do Butiá com
culinária e artesanato voltados à valorização do butiazeiro.
Palavras-chave: Espaço. Território. Identidade.
1 Aluna do Curso de Geografia da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul UNIJUÍ, Câmpus Ijuí, RS.
2 Geógrafa e Licenciada em Geografia, Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina UFSC. Professora orientadora, docente da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
- UNIJUÍ, Câmpus Ijuí, RS.
STUDY OF PLACE: GIRUA AND THE BUTIA,
MANIFESTATIONS OF CULTURE IN SPACE
Elenir Maria Richter3
Célia Clarice Atkinson4
ABSTRACT
This work is dedicated to the study of cultural events that permeate the social
relations within a given territory. Human action occurs in different forms in concurrent time,
the result of myriad cultures that act on the countryside. Is this space and place that provide
the perception that goes beyond the purely physical recognition, while also having issues of
subjectivity and identity that must be considered. The Girua city has the Pindo palm as the
tree symbol, very common tree species across the geographic extent comprising urban and
rural areas, while since the initial settlement process, the Indians made use of its fruit and
straw, which spread to other people who settled here, using the same to make jams and their
straw hats and mattresses. In the 90s there was a major concern of the local community to
rescue their roots. The Municipal Decree Nbº 972/90 established the Pindo palm tree as a
symbol of the city. The community - imbued with collective feeling in establishing a cultural
identity, through the redemption of their notional environmental history - sought, through
concrete actions, encourage the cult of butia, promoting reforestation addition, nativist music
festivals, Festival of the Butia with cooking and crafts focused on valuing the Pindo palm .
Keywords: Space. Territory. Identity.
3 Aluna do Curso de Geografia da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul UNIJUÍ, Câmpus Ijuí, RS.
4 Geógrafa e Licenciada em Geografia, Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina UFSC. Professora orientadora, docente da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
- UNIJUÍ, Câmpus Ijuí, RS.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Vale dos Butiazais......................................................................................................19
Figura 2. Bandeja de bambú com fibras de butiazeiro..............................................................21
Figura 3. Almofada trançada com folha de butiazeiro..............................................................22
Figura 4. Luminária de porongo com crochê e caroços de butiá..............................................22
Figura 5. Conjunto de avental e pegador com butiás................................................................23
Figura 6. Embalagem com poesia de Cecília Maicá ................................................................23
Figura 7. Bolsa, chinelo, carteira e chapéu com fibras de butiazeiro e detalhes em tecido......24
Figura 8. Colar de macramê com butiá de resina......................................................................24
Figura 9. Torta Dourada............................................................................................................25
Figura 10. Delícia Gelada.........................................................................................................25
Figura 11. Licores de butiá.......................................................................................................26
Figura 12. Empada Missioneira................................................................................................26
INTRODUÇÃO
A identidade cultural de um indivíduo tem como base aspectos simbólicos
relacionados ao seu território e a sua história, dentro de um contexto social mais amplo e de
desenvolvimento coletivo, pois o território é espaço de práticas que incluem a apropriação
espacial manifestando as intenções sobre este espaço.
Toda sociedade define formas particulares de relações com seu espaço de vivência e
produção, traduzindo-se em relações econômicas, políticas e culturais. Destas vivências
deriva o valor que se atribui ao espaço, tendo grande relevância e significado na medida em
que acentua a importância conferida à diferenciação concreta entre os lugares, ou como
podemos chamar de reinvenção local.
A cultura é a herança deixada pelos antepassados e, portanto, transmitida de uma geração
a outra. É por isso que torna-se necessário para cada sociedade preservá-la e perpetuá-la, o que
fortalecerá o sentimento de identidade e pertencimento a um lugar.
As dimensões da vida constituem campos particulares de investigação da Geografia
no estudo de uma sociedade local e historicamente determinada pelas relações produtivas,
econômicas, políticas, culturais, religiosas que se estabelecem, entrecruzando escalas
próximas e distantes. Além do mais, as experiências geográficas se dão pelos sentidos que
mediam as experiências ambientais.
Partindo desse pressuposto, o butiá, fruto símbolo do município de Giruá, confere à
comunidade local singularidade, na medida em que, ao perpetuar a história dos antepassados,
valoriza aquilo que é nosso e pertence à cultura local. A culinária, artesanato, poemas e outras
manifestações culturais locais são exemplo disso.
Hoje se reconhece o butiá como parte da história e cultura do povo local, envolvendo
muitas pessoas da comunidade que vivem da produção gastronômica e do artesanato,
utilizando a palha do butiá com características próprias que o diferenciam e estão promovendo
o município a nível nacional e internacional. São os produtos com raízes locais que se
espalham e levam a história local. Visitantes que chegam à cidade buscam produtos
gastronômicos derivados do butiá para sentir seu sabor.
De maneira geral, o butiazeiro faz parte da vida cotidiana do povo local, sendo o
fruto e a palha utilizados para fins diversos na culinária e no artesanato, perpetuando as raízes,
a história e a cultura. São poemas, músicas, culinária e artesanato que declaram o amor do
povo por esta terra e por este fruto.
Através de pesquisa de campo com pessoas da comunidade diretamente envolvidas
na produção, venda e organização dos eventos com o tema butiá e revisão bibliográfica
existente acerca do assunto, buscou-se o resgate da história com este fruto que
geograficamente existe em abundância neste território e faz parte do cotidiano local, sendo
hoje um dos grandes responsáveis pela união da comunidade não somente na busca e resgate
da história e cultura, mas numa consciência coletiva de valorizar o que é inerente ao lugar – o
butiá que serve de inspiração para elaboração de comidas, bebidas e um belo artesanato com
características peculiares.
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2 MANIFESTAÇÕES DA CULTURA NO ESPAÇO
2.1 A geografia cultural
Falar sobre identidade cultural e territorial nos remete à necessidade de retomar a
importância da geografia cultural, que terá suas origens no final do século XIX, dentro da
Europa, num contexto de profundas discussões acerca da natureza da geografia e sua
identidade frente a outras ciências. Claval apud Rosendahl e Corrêa (1999, p.7) destaca que:
“foi a diversidade dos resultados da ação humana sobre a superfície da terra que atraiu o
interesse dos geógrafos para essas diferenças que são efetivamente da natureza cultural”.
Além de discutir aspectos naturais, a nova geografia cultural se caracteriza pela
preocupação de incluir estudos sobre a dimensão material de cultura e não material – religião.
Por isso, manifestações culturais dos diferentes povos são adotadas, o que contribui para a
conclusão de que aspectos econômicos não são suficientes para explicar os diferentes
processos e formas de interação espacial portadoras de “uma objetividade, mas também
geradoras de uma avaliação que culmina com diferentes intersubjetividades” (Claval apud
Rosendahl e Corrêa, 1999, p.9).
A ação humana na Terra ocorre simultaneamente e de diferentes formas, pois
coexiste uma infinidade de culturas agindo sobre o espaço natural, desenvolvendo atividades
que objetivem mostrar a dimensão espacial da cultura dentro de um território. Cosgrove
(1999, p.20) diz que: “(...) a geografia cultural tem sido influenciada por questões de
enraizamento, mobilidade e identidade”.
Graças à mobilidade, são as diferenças decorrentes do espaço e especificidade de
cada lugar que fornecem os elementos necessários e seguros para explicar tal diversidade.
Espaço e lugar propiciam a percepção que vai além do reconhecimento puramente físico do
meio, dando uma explicação que envolve contexto histórico, portanto há aspectos de
subjetividade e identidade que devem ser considerados. A compreensão da temporalidade,
sentido do lugar e experiência da paisagem como elementos temporais e que se constituem de
lembranças e anseios do espaço geográfico, devem ser entendidos como elementos
fundamentais que determinam a cultura e identidade de um povo, pois, segundo Cosgrove
(1999, p.23), “a memória e o desejo substituem a temporalidade através do qual os lugares
emergem como fenômenos vividos e significativos”.
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Estudos recentes tanto da Geografia Cultural quanto da História revelaram que a
memória social ou individual representa a memória das “relações sociais”, extremamente
importantes na constituição da identidade e do lugar. Bell apud Cosgrove (1999, p.23)
descreve que: “as almas estão misturadas com as coisas, as coisas estão misturadas com as
almas. (...) através de fantasmas reencontramos a aura da vida social na aura do lugar”.
Os lugares reforçam a memória social e o passado modela e confirma uma
hegemônica temporalidade, como diz Cosgrove (1999, p.25), “o milenarismo é
profundamente geográfico e histórico e, ao mesmo tempo, global e majestoso e intensamente
localizado”. Abandona-se uma história linear em favor de uma temporalidade “mais flexível
implicada pelo passado, tornando-se possível o olhar aberto como uma interrupção situada no
fluxo do tempo, sendo tanto o futuro como o passado significativos” (Cosgrove, 1999, p.26).
Considera-se, portanto, o vivenciado, independentemente da época, como de
fundamental importância para reverenciar o tempo, pois é na memória que estão as
impressões de cada um. Aqui cabe destacar a fenomenologia, que valoriza as experiências
vividas e adquiridas pelo indivíduo, sendo o espaço considerado um contexto experienciado.
Experiência é um termo que abrange as diferentes maneiras através das quais uma
pessoa conhece e constrói a realidade. Estas maneiras variam desde os sentidos mais
diretos e passivos como o olfato, paladar e tato, até a percepção visual ativa e a
maneira indireta desimbolização. (Tuan, 1983, p.9)
A experiência vivida, independente de tempo, através das emoções dá colorido a
toda experiência humana. Toda experiência individual ou coletiva é muito valorizada pela
Geografia Humanista, a qual procura compreender o comportamento e maneiras de sentir das
pessoas em relação aos seus lugares. É dentro desse contexto de valorização da subjetividade
individual - que se dá através de atitudes e valores que se refletem no meio e no contexto onde
a pessoa está inserida - que a geografia cultural se destaca por compreender a cultura* como
elemento significativo nas relações que se estabelecem na sociedade. A esse respeito merece
destaque o que diz Claval apud Nogueira (2013, p.25): “a geografia cultural surgiu da
diversidade dos gêneros de vida e das paisagens, modificou-se com a urbanização e
industrialização para relacionar-se na atualidade às representações e sentimentos de
identidade”.
* Cultura – é a expressão maior da diversidade entre povos e raças, regiões e territórios. Em cada canto do
território há uma manifestação de cultura como produto da herança histórica (Vieira et al., p. 17. Revista
Administração em Diálogo. Programa de Pós-Graduados em Administração. PUC – São Paulo).
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2.2 Cultura, memória, identidade social e territorial
A cultura interfere na estrutura espacial das sociedades apresentando diferentes
aspectos em cada lugar, pois, segundo Tuan (1983, p.4), “os espaços são centros aos quais
atribuímos valores e onde são satisfeitas as necessidades biológicas”. A cultura é a mediação
entre o homem, a natureza e a humanidade não se relaciona diretamente com o meio natural,
mas sim tira dele os meios de subsistência e os transforma através do saber fazer e dos
conhecimentos pelos quais os homens foram mediatizando suas relações com este meio, o que
se constitui em cultura deixada aos descendentes. Conforme expõe Claval apud Nogueira
(2013, p.26),
A cultura é herança e resultado do jogo de comunicação. Os indivíduos são
condicionados pela educação recebida, portanto a cultura aparece como herança. A
forma como a cultura é transmitida de uma geração a outra ou de um lugar a outro,
beneficiada pelas trocas, deslocamentos ou migrações, está relacionada ao meio e ao
nível técnico, contribuído para a diversidade das sociedades.
Recordar nossa própria vida é fundamental para nosso sentimento de identidade e
pertencimento a uma cultura e o constante lembrar deste passado pode fortalecer ou
recapitular nossa autoconfiança. Tempo e espaço compõem o quadro interior do qual o sujeito
se reconhece, sendo que o espaço possibilita ao autor reconhecimento, que é um conceito de
identidade. A memória não reduz apenas ao recordar, agregando diversidade de significados,
como Delgado apud Nogueira (2013, p.27) destaca:
Ordenação e releitura de vestígios, relacionada à comportamentos, mentalidades,
valores, retenção de elementos inerentes ao conhecimento adquirido;
estabelecimento de nexos entre o presente e as experiências vividas; e invocação do
passado, através de reminiscências e lembranças; afirmação de identidades através
do reconhecimento da pluralidade e da alteridade, que conformam a vida em fluxo
contínuo; atualização do passado no eterno presente; retenção e manifestação,
através do ato de relembrar de reminiscências vagas, profundas, registradas,
esquecidas, relacionadas; evocação de utopias, que libertam o homem, fazendo do
passado suporte para reconstrução do presente e do futuro; manifestação de
identidades plurais, múltiplas e sempre atualizadas; reconhecimento ou até mesmo
superação de traumas marcados pela ausência de raízes; reconhecimento de espaços
perdidos ou reencontrados.
A cultura é a construção adquirida em comunidade e sua permanência ou mutação
deve-se às experiências vividas pelo homem ao longo dos tempos em sociedade, pois tanto o
indivíduo como o grupo podem se projetar no presente e no futuro. Aqueles que a recebem
como herança não a vivenciam passivamente, mas também criam formas de fazer, interiorizar
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traços ou negá-los, criticam valores que acham inadequados as suas ambições. A cultura
permite que o indivíduo imagine o futuro e trabalhe para criar um conjunto melhor do que o
presente (Claval apud Nogueira 2013, p.27).
Cultura não é estática nem existe cultura em estado puro sempre igual sem sofrer
influências externas, sendo o processo de aculturação um fenômeno global, mesmo que de
diferentes dimensões. Não estamos imunes à mudança e aos contatos com culturas variadas e
posterior aculturação. “A cultura carrega uma dimensão simbólica, pois é formada de
realidades e signos criados para descrevê-la, dominá-la e verbalizá-la, portanto é um fator
essencial de diferenciação cultural pelos indivíduos” (Claval apud Nogueira 2013, p.28).
Existir coletivamente compreende construir a identidade de um povo. Dentro desse
processo a memória pode ser interpretada como fenômeno social coletivamente elaborado e
reproduzido ao longo do tempo, constituindo-se em patrimônio cultural, sendo ela dinâmica,
mutável e seletiva, visto que nem tudo o que é importante ficará gravado para as futuras
gerações, pois a memória não é algo do passado, mas um fenômeno que traz em si um
sentimento de continuidade e coerência, seja ele processado individualmente ou em grupo em
reconstrução em si, tornando-se fator preponderante para o entendimento do sentimento de
identidade.
Entendendo-se a memória como um processo social e histórico composto de
narrativas, acontecimentos marcantes, coisas vividas que, por sua vez, vão legitimar e reforçar
a reprodução da identidade* do grupo, cabe então entender a identidade como a revelação de
todo o investimento que um grupo faz, ao longo do tempo, na construção de sua memória. A
respeito da identidade, Haesbaert (1999, p.172) destaca que:
Partimos do pressuposto geral de que toda identidade territorial é uma identidade
social definida fundamentalmente através do território, ou seja, dentro de uma
relação de apropriação que se dá tanto no campo das ideias quanto no da realidade
concreta, o espaço geográfico constituindo assim parte fundamental dos processos de
identificação social.
Afirma-se, portanto, que não há território sem algum tipo de identificação e
valoração simbólica (positiva ou negativa) do espaço pelos seus habitantes. “Assim como a
identidade individual, a identidade social é também carregada de subjetividade e
objetividade” (Haesbaert, 1999, p.174). O simbólico e o real - que carregam as marcas do
* A identidade pode tanto se referir à pessoas como a objetos, coisas, implicando uma relação de semelhança ou
de igualdade num objeto ou pessoa (HAESBAERT, 1999, p.173).
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vivido - constituem a identidade, a qual nada mais é do que elementos culturais que
demarcam espaços que se refletem na arquitetura, gastronomia, práticas e costumes
semelhantes e reconhecíveis em um local, ainda fortalecendo um sentimento de pertencimento
daqueles que a usufruem.
Não devemos entender território apenas como espaço físico, já que o mesmo é
carregado de significados e sentido para os integrantes dos grupos sociais que o ocupam:
Ao buscar compreender o movimento que faz com que o território constitua o lócus
da vivência, da experiência do indivíduo com seu entorno com os outros homens,
fazemos isso tendo a identidade como fator de aglutinação, de mobilização para ação
coletiva. Essa relação identidade-território toma a forma de um processo em
movimento, que se constitui ao longo do tempo como o principal elemento o sentido
de pertencimento do indivíduo ou grupo com seu espaço de vivência. Esse
sentimento de pertencer ao espaço em que se vive, de conceber o espaço como lócus
das práticas, onde se tem o enraizamento de uma complexa trama de sociabilidade é
que dá a esse espaço o caráter de território (Souza e Pedon, 2007, p.136).
De forma geral, pode-se dizer que território é a soma de intenções e ações que se
concretizam a todo instante em diferentes pontos da Terra. É o homem formando e
transformando, definindo e redefinindo o espaço tendo como elemento seu grupo, que carrega
consigo as referências culturais, objetivos e sonhos. “É o real e o imaginário agindo” a todo
instante.
2.3 O sabor enquanto experiência geográfica
A experiência geográfica é um fenômeno completo, envolvendo nossa relação com o
mundo de maneira essencial. Ela se dá pelos sentidos - intuição e razão - operados pela
percepção, sensação e entendimento do real e do símbolo.
Se o espaço está relacionado ao patrimônio natural existente numa região definida, o
território nada mais é do que a incorporação e apropriação do espaço pela ação social de
diferentes atores e nesta ação estão os sentidos como elementos subjetivos, portanto o sabor
está contido nessa relação. Gratão e Marandola Jr. (2011, p.59) destacam que: “pensar a
relação geografia e sabor implica a compreensão da existência experiencial e cultural humana,
expressa pela geograficidade - expressão e significado do envolvimento homem-meio.”
O sabor é um dos sentidos que, como os demais, media a experiência ambiental, pois
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como diz Dardel apud Gratão e Marandola Jr. (2011, p.60), fundando a partir do corpo de uma
geograficidade: expressão e significado do envolvimento homem-meio. Não percebemos o
ambiente apenas pela visão ou audição, devendo considerar que todos os sentidos mediam
nossa experiência espacial, tendo eles significados culturais específicos.
Claval apud Gratão e Marandola Jr. (2011, p.60) é da opinião que uma geografia que
se pretende humanista e cultural necessita para pensar o espaço e o significado da experiência
humana sobre a terra, “incorporar o paladar e seus temas de interesse”, sendo necessário ir
além da degustação, da alimentação e da gastronomia. Ainda segundo ele, o “paladar se
manifesta enquanto fenômeno da experiência geográfica a partir do sabor”, isto porque está
ligado ao gosto, à experiência, à memória e aos valores culturalmente construídos; o sabor
permite incorporar as dimensões da experiência e da cultura da geograficidade*.
2.4 Sabor da Geografia
Sabor vem de saborear. Saborear é uma experiência com o mundo mediada pelo tato
(sabor é tátil, palativo) no ato de comer, sendo uma experiência mediada pela boca (contato
direto) e não apenas pelo olhar; portanto, sabor em Geografar “faz parte da experiência da
paisagem que é gosto e sensações, além de cor, som e cheiro”, conforme destaca Gratão apud
Gratão e Marandola Jr. (2011, p.61).
O sabor é um traço de ligação do homem com a natureza, sendo ela fonte e projeção
imaginária. Oliveira (2012, p.27) destaca que: “experiência gustativa envolve além do sabor, o
cheiro, o som e a cor. A experiência evoca a memória, o imaginário e a identidade,
transmitidos mediante linguagens, significados e símbolos: as essências de vida e de
permanência”.
O sabor tem uma linguagem que é conduzida pelo paladar de cada alimento, sendo
os significados do sabor exalados pelos aromas desprendidos da comida. O símbolo do sabor
chega até nós pelo arranjo de cores e harmonia nos temperos. Essa experiência é única em
cada um de nós de acordo com a subjetividade e o imaginário inerente ao processo de
saborear.
* Paisagem, lugar, identidade e imaginário são os fenômenos revelados desta geograficidade, reclamando um
entendimento epistemológico que permite pensar não apenas o sabor enquanto tema do estudo geográfico, mas,
sobretudo o sabor como fenômeno, constituindo a essência da experiência geográfica (GRATÃO e
MARANDOLA JR., 2011, p.61).
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Por mais palpável e subjetivo, o sabor é um sentido humano manifestado pelo
paladar expresso no gosto (saboroso ou não; doce, amargo), e, por mais “material”
que seja, embala os sonhos, a memória, fonte de inspiração poética, tal como se
presencia em outras imagens simbólicas. O sabor é fruto da terra. Está presente no
imaginário da natureza e na cultura. (Gratão apud Oliveira, 2012, p.28)
De forma ampla, pode-se afirmar que o sabor está enraizado na geograficidade,
ligação essencial, telúrica, homem-terra e esta relação é muito subjetiva, pois, partindo de seu
envolvimento com o lugar, o sabor adquire diferentes conotações. Ao degustar um alimento o
homem se joga no imaginário, onde a realidade se transfigura para ser saboreada
metaforicamente. É conservar o gosto de uma lembrança passada ou ainda não provada.
Enveredar-se por esse campo da Geografia remete a um fazer enraizado na valoração
da paisagem e da cultura, o que se explica pelo sabor que brota da terra, envolvendo valores
culturais, étnicos e humanos. É uma relação que se estabelece no modo de ver o mundo,
valorizando crenças e significados dos lugares para cada um, pois entende-se que o sabor é
uma extensão de nosso corpo e media relações homem-natureza - uma projeção cultural e
uma paisagem valorizada.
A paisagem é vivida partindo-se de atributos invisíveis de sensação porque a
sentimos, experimentamos, provamos e saboreamos, experiência esta que permite estabelecer
sua essência. O sabor encontra-se na procura desta essência da paisagem, portanto a paisagem
vai além do modo de vermos o mundo, é o sentir o mundo. Gratão e Marandola Jr. (2011,
p.62), destacam que:
o sabor expresso no gosto e no cheiro é imaginação; é memória, porque nos remete a
outros lugares, sentimentos agradáveis ou não, à experiências vividas. (...)
Experienciamos o mundo com nosso corpo de sentidos que são extensões desse
corpo o qual é a própria geografia sensória que se desenha a partir de uma dada
corporeidade, fundamento da experiência do mundo.
A experiência do saborear é integral porque envolve paladar, olfato e tato, portanto
não se pode excluir os sabores como menos importantes, eles são espaciais porque constituem
e descrevem lugares e paisagens. Qualquer pessoa lembra algum prato feito pela avó ou
alguém especial, bem como sabores experimentados durante viagens a lugares que não o seu
de origem. Há sabores que nos marcam, portanto alguns lugares vêm a nós pelo sabor. A esse
respeito destaca-se o que afirma Gratão apud Gratão e Marandola Jr. (2011, p.64), “da
experiência espacial existencialmente significada, o sabor da geografia se estende aos grupos
culturais, conformando na paisagem uma forma própria de habitar o mundo”.
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Assim como a gastronomia é algo histórico de um lugar ou região, podemos também
destacar o artesanato como símbolo da cultura e história de um povo e se confunde com a
história da humanidade desde o momento em que o ser humano criou e desenvolveu artefatos
para garantir sua sobrevivência e bem-estar individual e coletivo, produzindo com suas
próprias mãos aquilo que necessitava.
O artesanato é uma das mais ricas formas de expressão da cultura de um povo, sendo
na maioria das vezes a representação da história de sua comunidade e a reafirmação de sua
autoestima. Nos últimos tempos tem-se agregado a esse caráter cultural, o viés econômico,
com impacto crescente na inclusão social, gerando trabalho e renda e potencializando
vocações regionais. Como modelo produtivo, sustenta-se em um tipo de conhecimento
especializado, não massificado e autorrenovável, fugindo do modelo produtivo massificado. O
processo produtivo do artesanato sugere o aproveitamento de recursos naturais e tecnologias
locais direcionados de forma a evitar o surgimento de influências externas negativas sobre o
meio ambiente e a sociedade, garantindo um artesanato típico de cada lugar com
características próprias e endógenas daquela comunidade.
Num mundo massificado de produtos similares, valoriza-se cada vez mais o singular
que carregue consigo a história de um povo. Cada peça produzida traz a subjetividade e o
simbólico do artesão e do lugar, portanto o artesanato é a representação e a expressão cultural
local.
2.5 O butiá como expressão da identidade territorial e cultural
Butiá, nome popular que se aplica a um gênero de palmeira, desdobrado das
palmáceas cocos. São sete espécies, cuja distribuição geográfica se faz num território que
compreende o Brasil Central e Meridional, Uruguai, Paraguai e nordeste da Argentina. São de
porte modesto com estipe marcado pelas cicatrizes foliares. As folhas são penadas e
elegantemente curvadas. São plantas campestres e sociáveis. Dos representantes mais
importantes destaca-se o B. yataí, elegante palmeira com tronco de mais ou menos 4 metros
de altura e 40 cm de diâmetro (In: Receitas com Butiá, 2003).
No Estado do Rio Grande do Sul, na região Missioneira (oeste do estado) encontra-se
16
a borda de sua ocorrência, sendo a Província de Corrientes, na Argentina, o centro. Cresce
isoladamente em campos abertos e entre vegetação arbustiva e arbórea, compondo também
densos aglomerados, as conhecidas butiatubas. O elegante formato faz recomendá-lo para
ornamento de parques, jardins e avenidas. As folhas, os frutos, bem como o tronco são de
valor econômico. O tronco (estipe) é usado em estivados, na indústria de papel, bem como na
confecção de calhas de água e cochos para alimentação de gado. As folhas fornecem crina
vegetal para a fabricação de colchões e estofados. Tanto as folhas como as espatas têm uso em
arranjos florais e ornamentações festivas. A polpa da fruta de agradável sabor, é empregada
em preparo de licores, vinho e cachaça para aperitivos e a amêndoa é alimentícia e fonte de
azeite alimentar.
Giruá pertence à região das Missões e foi território inicialmente habitado por índios
guaranis. Possuindo uma vegetação muito peculiar composta por campos de barba-de-bode e
butiazeiros que havia em grande quantidade nas áreas geográficas pertencentes a este
município. Essas palmeiras são nativas e, como já citado anteriormente, encontradas somente
em algumas regiões, constituindo um ecossistema único no mundo. Tais palmeiras
representam muito para regiões onde são originárias, pois desde os tempos remotos as
sociedades indígenas que aqui habitavam tinham como recurso alimentar o fruto do butiá, rico
em nutrientes. Os índios que aqui habitavam chamavam as abundantes palmeiras (butiazeiros)
de jerivás e pela grande quantidade dessa palmeira este local passou a chamar-se Jerivá e mais
tarde, pela dificuldade dos imigrantes aqui chegados, em pronunciar a palavra jerivá, esta
terra tornou-se Giruá.
Segundo relatos de moradores antigos que aqui habitavam as palmeiras de butiazeiro
eram vistas por todos os lados em grande quantidade. O butiazeiro fazia parte da cultura e do
cotidiano do povo, era corriqueiro, sendo o fruto usado para compotas e para fazer “cachaça”
de butiá e a folha da palma era utilizada para fabricação de colchões e chapéus e as cascas
como lenha para fornos de cozinha. Só se valorizava isso da palmeira.
Em virtude da grande abundância e pela falta de conhecimento de culinária
diversificada com o fruto além da dificuldade da extração da polpa e do caroço, os butiazeiros
foram arrancados em grande quantidade para dar espaço à agricultura. Em 05 de julho de
1990 através do Decreto n° 972/90, o então prefeito municipal instituiu o butiazeiro como
árvore símbolo do município de Giruá sob a justificativa de tal palmeira encontrar-se ainda
em abundância em suas terras, como também participar da raiz etimológica da palavra que
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denomina o município de Giruá e também pelo fato da população de Giruá estar imbuída de
um sentimento coletivo de firmar uma identidade cultural, assim querendo resgatar seus
referenciais histórico-ambientais.
Foi um sentimento que atingiu as lideranças em todos os setores da comunidade,
destacando que essa preocupação com a identidade histórico-cultural também estava ligada
com a preservação ambiental, destacando-se a palmeira do butiá. Nos anos de 1999, 2002 e
2003, a Administração Municipal realizou o Canto das Terra dos Jerivás, evento este que além
de valorizar a música nativista tem como objetivo central enaltecer nossa terra dos butiazais.
A música Essência Guarani, composta pela poetisa giruaense Cecília Maicá , fala de nossas
origens, suas belezas naturais fazendo referência especial ao butiá. Esta música ficou em 1º
lugar no 1º Canto da Terra dos Jerivás e se destacando-se como melhor poesia. Os demais
festivais realizados também deram ênfase ao butiá.
Essência Guarani*
Terra índia,
Chão vermelho,
Pago missioneiro,
Sangue guarani...
Sangue guarani
Emprestou a cor vermelha ao teu chão
Terra dos dourados cachos de butiá
Ao sol de janeiro perfumando o ar
Terra das boas aguadas,
Das cachoeiras tantas – puros mananciais
Que quem mata a sede nas tuas vertentes
Por mais que se ausente, não te esquece mais.
* Melhor Poesia, Melhor Intérprete e 1º Lugar do 1º Canto da Terra dos Jerivás / 1999. Fonte: Cecília Maicá.
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Eu sou missioneiro, cresci em Giruá
Correndo descalço na verde campina;
Guarani-criança
com o arco do talo verde de butiá
jogando minhas flechas de ilusão no ar
Banhando meu corpo nas tuas cascatas,
Matando a sede nas tuas vertentes,
Comendo butiá
E plantando meus sonhos em cada semente.
O ventre vermelho tupi-guarani
Guardou as sementes de um sonho guri
Que desabrochou e veio me dizer
Que a liberdade cheira a butiá.
Os piás pelas ruas calmas de Giruá
São índios meninos cheirando a butiá
E atiram castanhas
Sementes de sonhos que hão de vingar.
Poesia: Cecília Maicá
Música: Roberto Carlos Salas
Intérprete: Aureo Maicá
Não foi somente um resgate cultural do butiazeiro, isto porque, pessoas da
comunidade voltaram-se para o plantio de mudas de butiás, destacando-se o Vale dos
Butiazais hoje local de referência por possuir enorme quantidade de palmeiras do butiá, sendo
o proprietário exportador da polpa e do suco para várias partes do Brasil e do Estado. O
butiazeiro faz parte da história e da cultura local, portanto houve um resgate e valorização da
cultura voltada à palmeira do butiá como fazendo parte do patrimônio cultural e da identidade
dos giruaenses, através da música, poesia, pintura, artesanato e manifestações artísticas de
trabalhos elaborados em escolas locais.
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Fig. 01 - Vale dos Butiazais
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com.br>. Acesso em: 25 out. 2013.
Para muitas pessoas da comunidade a palavra butiá traduz sabores e renda pois com a
folha da palma podem ser confeccionados adornos, bolsas, utensílios para a casa, chinelos,
chapéus entre outros, e da polpa do fruto licores, geleias, compotas, molhos, sorvetes etc.
Muitas pessoas da comunidade tem nestes produtos sua subsistência, destacando que o butiá
significa um recurso socioeconômico importante para a população, o que é comprovado pela
Festa do Butiá, realizada há alguns anos pela Administração Municipal.
Além de preservar a cultura e história de nosso povo, este evento procura a
valorização do que é próprio daqui, demonstrando uma preocupação com a conservação desse
ecossistema. Pode-se dizer que a valorização do artesanato com a palha e caroço do butiá tem
relação direta com a conservação desse ecossistema, que antigamente era uma paisagem
predominante na região e hoje conta com poucos remanescentes. Além disso, o
reconhecimento desse saber como um patrimônio cultural imaterial da comunidade da região
contribui com a formação da identidade coletiva e com o sentido de continuidade da cultura
levando ao respeito pela diversidade e estímulo ao processo criativo, restabelecimento de
conexões perdidas e autoestima de todos os grupos envolvidos. É a valorização da cultura e
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troca de saberes.
Esta valorização do que é nosso, resgate da identidade e troca de saberes se faz
através da Festa do Butiá na qual ocorre a elaboração de grande variedade de pratos derivados
do butiá e artesanato exclusivamente voltado ao tema butiá. É momento de conversas entre os
participantes do evento, encontro da comunidade, degustação de delícias feitas com o butiá.
Cabe aqui destacar uma publicação sobre a Festa do Butiá:
De onde nasce o amor? O amor por uma cidade, por uma cultura, pela terra que
vivemos... Penso que esse amor nasce daquilo que cultivamos, que vivenciamos, que
conhecemos. Amamos, o que vemos e admiramos e por isso a importância de
oportunizar experiências de aproximação entre a comunidade e a cultura, entre o
povo e suas raízes. (Fátima Marizete Fernandes, Revista G Mais, mar/abr/2013 n°27
ano III).
A Festa do Butiá é uma “declaração de amor dos giruaenses à sua cultura, ao seu
povo, aos que fizeram e aos que fazem a nossa história”, pois ainda Fernandes “povo culto
não é o que sabe tudo de todas as civilizações e desconhece a sua” considerando inteligente o
povo que valoriza sua história e que com a fruta da árvore símbolo do município criar arte,
artesanato, receitas culinárias, música, poesia, conseguindo emocionar com sua história outros
povos.
Em 2001, iniciou-se projeto com alunos de uma Escola da rede pública de ensino
objetivando a valorização dos produtos derivados do butiá e da palmeira, tendo sido criado e
mostrados mais de 30 itens entre artesanato, culinária, poesia e músicas com o tema butiá,
surgindo assim uma nova vertente de possibilidades. Em 2003, ocorreu a primeira edição da
Festa do Butiá, contando no ano de 2004, com a presença do Ministro do Desenvolvimento
Agrário, Sr. Miguel Rossetto. De lá para cá, todos os anos é realizada a festa com
programação diversificada, sendo que no ano de 2010 houve um resgate objetivando
investimentos no artesanato e gastronomia giruaense, bem como acreditando nas
possibilidades que se abrem a partir do cultivo do que é nosso através de ampla divulgação na
mídia, incentivo aos participantes e programação muito diversificada, levando o público a
prestigiar o evento e contando com mais de 60 expositores. As programações variaram desde
mostra de produtos do artesanato, exposição de fotos com o tema “butiá”, visita ao Vale dos
Butiazais, concurso de pratos típicos a base de butiá até apresentações culturais étnicas.
Na 5ª edição da festa (2011), foi criada a Coleção Giruaense de Artesanato tendo
como objetivo o enaltecimento da cultura e produção artesanal local, assim, como a
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preservação e valorização do nosso ambiente. A coleção pretendia fortalecer os ícones
culturais e fomentar a utilização responsável e autossustentável das matérias-primas básicas
regionais que é um dos fatores de valorização social, cultural e econômica. Tal coleção
dividiu-se em “Cachos Dourados”, “Chão Vermelho” e “Tribo Bonita”, com inúmeros itens.
Destaca-se a Coleção Cachos Dourados, que aborda o artesanato relacionado com o butiazeiro
desde o artesanato feito com a palha do butiazeiro, a castanha, o talo da folha, o cacho, a
corola (casquinha da parte superior do butiá), ráquis (talo do cacho), ráquila (galinhos onde
butiás ficam presos) até licores e compotas. Também, nesta edição da festa foi criado o
concurso gastronômico “Balaio de Sabores”, dividido nas categorias: doces e sobremesas,
bebidas e salgados, todos derivados do butiá. Em edições seguintes houve o projeto
“Plantando Meus Sonhos em Cada Semente” que buscou fortalecer e incentivar o plantio de
butiazeiros tendo sido arrecadados mais de 300 Kg de sementes e centenas de mudas de
butiazeiros foram plantadas e distribuídas à comunidade e visitantes.
=> Peças da Coleção Cachos Dourados
Fig. 02 - Bandeja de bambu e fibra de butiazeiro
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
22
Fig. 03 - Almofada trançada com folha de butiazeiro
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
Fig. 04 - Luminária de porongo com crochê e caroços de butiá
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
23
=> Peças da Coleção Chão Vermelho
Fig. 05 - Conjunto de avental e pegador com butiás
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
Fig. 06 - Embalagem com poesia de Cecília Maicá
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
24
=> Peças da Coleção Tribo Bonita
Fig. 07 - Bolsa, chinelo, carteira e chapéu com fibras de butiazeiro e detalhes em tecido
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
Fig. 08 - Colar de macramê com butiás de resina
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
25
=> Concurso Balaio de Sabores
Fig. 09 - Torta Dourada
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
Fig. 10 - Delícia Gelada
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
26
Fig. 11 - Licores de butiá
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
Fig. 12 - Empada Missioneira
Fonte:<http://www.artesanatogirua.blogspot.com>. Acesso em: 25 out. 2013.
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Os concursos de 2011 e 2012 foram propulsores da criação de um blog
(http://www.artesanatogirua.blogspot.com.br), no qual são mostrados para a comunidade,
região, Brasil e mundo as potencialidades culturais, gastronômicas e artísticas. Hoje são mais
de 40.000 acessos com mais de 40 países visitantes em especial a China, que oportunizou a
exposição dos produtos derivados do butiá na cidade de Macau na Festa da Lusofonia, que
reúne o que há de mais interessante nos 10 países que falam a língua portuguesa nos setores
de gastronomia, artesanato e musicalidade.
No blog pode-se encontrar a Coleção Giruaense de Artesanato, receitas e fotos da
culinária com butiá, telefones dos artesãos e culinaristas giruaenses, regulamentos dos
concursos gastronômicos dentre outras informações sobre nossa cultura e história. Nosso
butiá vem ganhando destaque no Degusta Missões, sendo que muitos pratos à base desse fruto
já foram premiados, citando-se a exemplo a Torta Dourada e a Empada Missioneira.
A artesã Iolanda Stasiak, escolhida para representar Giruá na Festa da Lusofonia, tem
se destacado com um trabalho diferenciado feito com a palha do butiazeiro, destacando-se
almofadas, puffs, baús, espelhos, aparadores, chapeleiros, mesas, cadeiras, bolsas, luminárias,
relógios e bandejas. Tudo produzido com a fibra do butiazeiro trançada das mais diferentes
formas, numa mistura de materiais rústicos com tecidos sofisticados.
O artesanato de Giruá também participa da Coleção Missões de artesanato,
organizada pelo SEBRAE/RS. Sua escolha como selecionado para ir a um país tão distante
deve-se as suas características culturais locais, que tem o jeito, a história e as raízes do povo
giruaense, sempre utilizando técnicas e materiais nativos da cidade e da região. As pessoas
querem coisas diferentes e de preferência que trazem a história de um lugar e, os produtos e
artesanato feitos com o butiá encantaram muitos dos visitantes da feira, por se constituírem
como produtos que trazem uma identidade.
De forma geral, nosso artesanato vem se destacando nos últimos anos na mídia
regional e nacional, através de diversas reportagens como o Globo Rural, Campo e Lavoura e
na TVE no Programa da Emater. O fortalecimento do nosso artesanato e gastronomia deu-se
devido à Festa do Butiá, que funciona como maior fomentador da cultural local, onde artesãos
e culinaristas tem se superado a cada edição com muita criatividade e inovação. São
oferecidos na Festa: cucas, bolos, mousses, bombons, empadas, quibes, esfihas, cheesecake,
tapioca, tortas, docinhos, biscoitos, entre outras delícias com butiá além de bebidas e
artesanato diversificado.
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Estes produtos resultam de uma rede, tecida ao longo do tempo, que envolve recursos
da região, modos de produção, costumes e hábitos de consumo. São produtos ligados ao
território e à sociedade nos quais surgiu, trazendo como marcas a cultura, história e identidade
territorial, dando-lhes características peculiares. Neste aspecto, destaca-se o que diz Albagli
apud Flores (2006, p.07):
(…) é possível estabelecer formas de fortalecer as territorialidades, estimulando
laços de identidade e cooperação baseados no interesse comum de proteger, valorizar
e capitalizar aquilo que um dado território tem de seu – suas especificidades
culturais, tipificidades, natureza enquanto recurso e enquanto patrimônio ambiental.
O mais importante é valorizar e construir essa territorialidade dentro de um contexto
interno e daquilo que é inerente a esta comunidade: seus produtos. O saber-fazer local é uma
forma própria de expressão cultural que define a identidade, estabelece e fortalece relações,
preservando a história e cultura de um povo.
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CONCLUSÃO
O butiá está muito presente na vida cotidiana das pessoas do município de Giruá, e a
comunidade encontrou várias formas de fortalecer a cultura relacionada a ele. É o hino do
município, tendo uma legislação municipal específica que instituiu o butiazeiro como árvore
símbolo do município, festivais de música nativista com o tema butiá, poemas, artesanato,
culinária. No artesanato as diferentes coleções criadas visam a fortalecer a identidade,
enaltecer a cultura e a produção artesanal local, assim como preservação e valorização do
ambiente, fomentando a utilização responsável e autossustentável de matérias primas básicas
locais e regionais, além de incentivar o turismo, a geração de renda, onde, sem descaracterizar
o que já foi construído, valoriza e reforça as tradições locais e regionais.
As pessoas diretamente envolvidas com o butiá, tanto no cultivo da palmácea,
produção artesanal e gastronômica reconhecem seu potencial como gerador de renda e
vislumbram um grande futuro para os produtos dele derivados, isto porque seu sabor é único e
agrada aos diferentes paladares dos visitantes e dos nativos e o artesanato da palha e da
semente tem características próprias do lugar e que traduzem a história local. O gosto e o
cheiro do butiá estão presentes nas peças.
Percebe-se na revisão bibliográfica a preocupação de governantes locais e
comunidade em resgatar a história do lugar, as raízes desta comunidade e o fortalecimento de
laços que as unem. Todas as pessoas entrevistadas apresentam um entusiasmo muito grande
quando falam do butiá e se lembram de histórias contadas pelos seus antepassados, quando
dizem que o butiazeiro era muito comum e fazia parte da vida das pessoas, não de forma tão
valorizada como hoje, ”tinha muito butiazeiro por todos os lados” e as pessoas não davam o
devido valor, utilizando apenas o fruto para compotas e as palhas para chapéus e fabricação de
colchões.
A grande devastação desta árvore por todos os lugares do município levou há alguns
anos a um processo de reflorestamento em grande escala, principalmente depois que se
mostrou a importância do butiazeiro como parte da história e cultura do lugar, além do
reconhecimento de que é uma grande fonte geradora de renda nos dias atuais e que pode
trazer benefícios tanto para o artesanato - muito enaltecido hoje fora do município - quanto
para a culinária derivada do butiá - que tem se destacado regionalmente e conquistado
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paladares diferenciados.
A dinâmica envolvendo o butiá perpassa vários setores da sociedade que se unem em
torno de atividades e produção dele e de seus derivados, inclusive a imagem do município
divulgada fora está diretamente relacionada ao butiá. Visitantes, quando chegam ao local,
procuram artesanato e comidas que trazem o butiá como tema central, assim como pessoas
nativas, quando em visita a parentes, buscam nos pontos de venda os vários derivados do
butiazeiro para levar de lembrança a parentes e amigos.
O Festival da Lusofonia de Macau - do qual representantes do artesanato local
participaram levando vários produtos derivados do butiá - contribuiu para divulgar a cultura e
história do povo, fortalecendo o artesanato, pois, segundo a artesã que lá esteve, “gostaram
muito do cheiro da palha do butiazeiro e se impressionaram com as peças produzidas” e com
o sabor do butiá, o que sem dúvida divulga tanto a culinária quanto o artesanato do butiá.
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REFERÊNCIAS
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