A AÇÃO DO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
A AÇÃO DO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM
TERRA (MST) E A LUTA POR HEGEMONIA NA AMAZÔNIA: O CASO
DO SUDESTE PARAENSE.
Rogério Rego Miranda1
Resumo: A ação do MST no sudeste paraense ajudou a redefinir a geografia deste
território da Amazônia, visto que por meio de manifestações, acampamentos e
ocupações vários assentamentos foram sendo criados, especialmente por meio de
estratégias, que perpassam pelas alianças criadas com entidades, como CPT
(Comissão Pastoral da Terra), e outros segmentos de luta social rurais e urbanos,
além de proposição de um outro projeto hegemônico manifesto por uma produção
agroecológica, cooperativa, diversificada e a educação do campo, ou seja, uma
reforma agrária mais ampla do que a mera distribuição de terra.
Palavras chave: MST, território, políticas públicas, assentamento.
Abstract: The MST's action in southeast Pará helped redefine the geography of this
area of the Amazon, as through demonstrations, camps and occupations several
settlements have been created, especially through strategies that move through the
alliances created with entities such as PLC (Pastoral Land Commission), and other
segments of rural and urban social struggle, in addition to proposing another
hegemonic project by a manifest agroecological production, cooperative, diverse and
education field, namely a broader land reform than mere distribution of land.
Key-words: MST, territory, public policy, settlement.
1 - Introdução
No
Sudeste
Paraense
diversos
empreendimentos
agropecuários
e
mineradores se instalaram concorrendo para a valorização e apropriação
empresarial da terra e para uma forte migração, contribuindo para o aparecimento
1
Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade de São Paulo. E-mail de
contato: [email protected]
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DE 9 A 12 DE OUTUBRO
de uma grande massa de trabalhadores sem terra, que se organizam em
movimentos sociais, com destaque ao Movimento dos Trabalhadores Rurais SemTerra (MST), que associado aos sindicatos e posseiros que atuavam na região
desde a década de 1980, inaugura novas estratégias de territorialização, propondo
um projeto político-territorial mais amplo do que a luta pela terra, visto que hoje
existe também a luta pela permanência na mesma, devido a processos de
apropriação ilícita por parte de fazendeiros que realizam ameaças em relação aos
assentados; conversão de lotes rurais em chácaras; e pecuarização da produção
nos assentamentos, tornando os camponeses cada vez mais dependentes da lógica
do mercado. Com efeito, a luta pelo território não consiste apenas ao acesso a terra,
mas a uma reforma agrária mais abrangente, que inclui a questão da saúde do
trabalhador rural, da educação do campo, políticas públicas destinadas à produção
diversificada e agroecologica e formas de potencializar a comercialização dos
cultivos produzidos nos assentamentos, por exemplo, nas feiras. Esses elementos
que entram em debate nos assentamentos da realidade em relevo foram sendo
gradativamente incorporados por meio da ação do MST, mediante algumas
estratégias como reuniões em Núcleos de Base (NB’s), aproximação das
Universidades e Institutos tecnológicos, manifestações e ocupações de instituições e
de vias públicas para a viabilização de estradas, feiras e outras políticas públicas.
Isso em meio a uma realidade geográfica marcada por grandes projetos minerais,
com destaque a VALE, siderúrgicas, produção de eucalipto e fazendas de criação de
gado, o qual é vendido a conglomerados, como a JBS S.A., ou levados a leilão.
Assim, a pesquisa visa analisar a ação do MST no sudeste paraense, com o intuito
de observar as estratégias deste movimento social no sentido de construir um
projeto contra hegemônico, embora inacabado e realizado cotidianamente e em
meio às contradições da região e dos próprios assentamentos, especialmente 1º de
Março (São João do Araguaia), 26 de Março (Marabá) e Palmares II (Parauapebas),
selecionados para o estudo. Para alcançarmos os resultados da pesquisa em
andamento utilizamos como procedimentos metodológicos o levantamento de
material bibliográfico e documental; observação sistemática; registros fotográficos;
entrevistas semiestruturadas; e formulários.
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DE 9 A 12 DE OUTUBRO
2 – CONFLITOS TERRITORIAIS NO ESPAÇO AGRÁRIO DO SUDESTE PARAENSE
O território do sudeste paraense, na Amazônia brasileira, é disputado há
décadas
entre
indígenas,
castanheiros,
fazendeiros,
grileiros,
garimpeiros,
posseiros, empresas mineradoras, dentre outros, conferindo a sub-região a condição
de uma das áreas mais conflituosas do Brasil, devido à alta concentração de terras
na região.
De acordo com dados da CPT (Comissão Pastoral da Terra) de 2014, os
conflitos por terra – compreendidos como despejos, expulsões, ameaças de
despejos e expulsões, bens destruídos e pistolagem – registrados no Brasil foram na
margem de 793 casos, envolvendo 89.289 famílias. Em termos regionais
observamos a seguinte distribuição: Norte com 266 (33,54 %) casos, envolvendo
29.437 (32,96%) famílias; Nordeste com 282 (35,56%) casos, envolvendo
34.976(39,17%) famílias; Centro-Oeste com 81(10,21%) casos, envolvendo
8.041(9%) famílias; Sudeste com 117 (14,75%) casos, envolvendo 9.902 (11,08%)
famílias; e Sul com 47 (5,92%) casos, envolvendo 6.933 (7,76%) famílias. Com base
nesses dados acima percebemos que o Norte e o Nordeste ainda permanecem
como as áreas de maiores conflitos no campo, totalizando juntos 69,10% dos
conflitos por terra no país.
Em relação à região norte visualizamos que os estados que se destacam em
número de conflitos, em ordem descrente, são: Amapá (74 casos, envolvendo 1.888
famílias), Pará (54 casos, envolvendo 7.006 famílias), Rondônia (51 casos,
envolvendo 2.805 famílias), Acre (46 casos, envolvendo 5.360 famílias), Tocantins
(21 casos, envolvendo 1.456 famílias), Amazonas (11 casos, envolvendo 2.087
famílias) e Roraima (9 casos, envolvendo 8.835 famílias).
No Pará, especificamente, as mesorregiões de maiores conflitos foram as do
sudeste paraense com 27 (50%) casos, envolvendo 4.013 (57,27%) famílias, Marajó
com 13 (24,07 %) casos, envolvendo 308 (4,39%) famílias, Baixo amazonas com 6
(11,11%) casos, envolvendo 517 (7,37% ) famílias, Sudoeste paraense com 4 (7,40
%) casos, envolvendo 1.746 (24,92%) famílias, e Nordeste paraense com 3 (5,55 %)
casos, envolvendo 300 (4,28%) famílias (CPT, 2014).
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Como podermos perceber o sudeste paraense se sobressai sobre as demais
mesorregiões em termos de casos de conflitos por terra, fato que se repetiu em anos
anteriores, por exemplo, no período de 2006 a 2011, o Pará apresentou 606 áreas
em conflito, envolvendo 77.028 famílias, ocupando uma área de 6.982.002 hectares.
Quase metade desse número de conflitos está localizada no sudeste paraense, o
qual concentra 284 casos de conflitos (46,86% de todo o estado do Pará),
envolvendo 43.933 famílias (57,03%) e ocupando uma área de 2.743.867 hectares
(39,29%).
Nessa porção do território, ao visualizarmos o quadro 1 abaixo, identificamos
que
os
sujeitos
sociais
envolvidos
são
diversos
(quilombolas,
posseiros,
trabalhadores rurais, sem terra, assentados e indígenas) e que entram em choque
principalmente com fazendeiros e empresas mineradoras como a VALE. Os
municípios com maior quantidade de conflitos são Abel Figueiredo (4 registros), Bom
Jesus do Tocantins (4 registros), Marabá (4 registros) e São Felix do Xingu (4
registros), em quase sua totalidade envolvendo sem terras que ocuparam fazendas
com o intuito de pressionar o governo pela reforma agrária, com exceção do primeiro
município onde se observa também 650 quilombolas.
Mesorregião
Municípios
Sudeste
Paraense
Abel Figueiredo
Bom Jesus do Tocantins
Canaã dos Carajás
Conceição do Araguaia/Floresta do
Araguaia
Cumaru do Norte/Tucumã
Curionópolis/Marabá/Parauapebas
Marabá
Nova Ipixuna
Ourilândia do Norte
Rio Maria
Santana do Araguaia
São Domingos do Araguaia/São
Geraldo do Araguaia
São Félix do Xingu
Total
Nº. de
conflitos
4
4
1
1
N.º de famílias envolvidas no conflito
1
1
4
1
2
2
1
1
30 indígenas
200 sem terra
1300 sem terra
400 assentados
250 sem terra
30 sem terra
1 posseiro
66 indígenas
4
27
450 sem terra
4.013
Aprox. 116 sem-terra e 650 quilombolas
430 sem terra
60 posseiros
30 trabalhadores Rurais
Quadro 1: Conflitos por terra no sudeste paraense no ano de 2014.
Fonte: CPT, 2014 / Org. Miranda, Rogério Rego.
Nesses conflitos participam diversos movimentos sociais, mas iremos
destacar nesse estudo a ação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST), cujos sujeitos uma vez desterritorializados, devido à expropriação de suas
terras, almejam uma reterritorialização mais inclusiva, ou seja, a reforma agrária,
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visto que eles não possuem no presente momento o direito de dispor de um pedaço
de chão para se reproduzirem em suas mais variadas formas.
O movimento em relevo e sua territorialidade se expressa por meio, por
exemplo, das ocupações de terras, acampamentos e assentamentos, apresentando
articulações com outros segmentos de luta social, como a Comissão Pastoral da
Terra (CPT), a Via Campesina, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), a
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará (Fetagri -PA),
dentre outros. Assim, torna-se importante a discussão da construção do território do
MST, com destaque a sua configuração no sudeste paraense, processo que advém
desde o início da década de 1990.
O Sudeste Paraense, de acordo com Souza (2002), apresenta três
importantes períodos de reordenação espacial. O primeiro na década de 1970,
mediante a política de distribuição de lotes, provocando um forte movimento
migratório para a região. E nesse contexto algumas famílias permaneceram; outras
foram obrigadas a abandonarem seus estabelecimentos e se dedicarem a atividades
não agrícolas; e muitas procuraram diferentes frentes de trabalho. O segundo
momento, refere-se à ocupação da área pela atividade agropecuária com fortes
incentivos estatais ao capital privado nacional e internacional; além da exploração
mineral, estimulando uma nova leva de força de trabalho, para atuar nas obras de
infraestrutura, acirrando os conflitos sociais, especialmente aqueles ligados a posse
da terra. Também se evidencia o garimpo, a exemplo de Serra Pelada. Por fim, no
terceiro momento, observa-se uma redução do incremento populacional; o
fechamento de garimpos; e a ausência de uma política pública que realizasse de
fato a reforma agrária, favorecendo o aparecimento de uma grande massa de
sujeitos desterritorializados, que passam a lutar pela permanência no território e a
pressionar o Estado para atingir esse fim.
A Amazônia no contexto supracitado recebe inúmeros incentivos ficais e
creditícios, porém esses foram direcionados aos empresários nacionais e
estrangeiros e aos grandes projetos agrominerais, que concorreram para o aumento
da concentração de terras, especialmente na mesorregião em relevo, provocando,
ao contrário do que o governo militar propagandeava, um desenvolvimento da
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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
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miséria e da pobreza, principalmente em função da diminuição dos postos de
trabalho oferecidos inicialmente; da expulsão dos índios de suas reservas; do
remanejamento
de
ribeirinhos,
em
decorrência
do
represamento
do
rio,
proporcionado pela construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí (UHT); da retirada
violenta dos posseiros existentes na área pela ação de grileiros e empresários.
Com a desterritorialização desses diversos grupos sociais e a entrada de
muitos migrantes que vão para o Sudeste Paraense e lá se territorializam
precariamente, trabalhando como agricultores, peões, rendeiros e garimpeiros,
embora igualmente destituídos da terra, entraram igualmente para movimentos
sociais como uma alternativa de realizar o desejo de acesso à terra (SOUZA, 2002).
O MST nasce exatamente em meio ao enfrentamento e a resistência contra
esse modelo desenvolvimentista instaurado durante o regime militar, e tem como
fundamento a luta contra a expropriação e exploração existente no processo de
reprodução do capitalismo. E a sua construção está assentada no bojo das
discussões sobre democracia, em que a classe trabalhadora conquista novos
espaços no campo e na cidade. Momento em que surgem diversos movimentos
sociais. Logo, o MST inicia sua gestação em meio a uma série de experiências de
lutas populares enquanto estratégia político-cultural estabelecida no seio destes
sujeitos sociais, que iniciam ocupações de terra em vários estados. Essas lutas mais
localizadas ganham repercussão no país por meio da igreja e em menor parte pela
mídia, mas foi pela troca de experiências que a articulação em nível nacional desses
movimentos se estruturou, objetivando a superação do isolamento e a autonomia
política. Nesse contexto foram realizados encontros maiores reunindo lideranças
estaduais por intermédio da CPT, especialmente no Centro-Sul, e dessas iniciativas
se fundou e organizou um movimento dos camponeses sem-terra nacional, que
lutaria por reforma agrária, originando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (FERNANDES, 1999).
No Sudeste Paraense o MST surge com o intento de organizar os
camponeses, em sua grande maioria migrantes oriundos de outras regiões, que
haviam sido expulsos ou mesmo expropriados de suas terras. Mas igualmente
resulta de movimentos locais que se formam, por exemplo, a partir de organizações
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sociais impulsionadas pela igreja, mediante as Comunidades Eclesiais de Base
(CEB`s) em Marabá, que fomentaram a criação de Sindicatos de Trabalhadores
Rurais (STR`s). Além de partidos políticos ditos de esquerda (Partido Comunista do
Brasil – PC do B – e Partido dos Trabalhadores – PT) e clandestinos que vão incitar
tal processo (ALMEIDA, 2006).
Com o intuito de combater a estrutura fundiária concentrada e empreender
esforços pela reforma agraria o MST instaura uma dinâmica de luta e uso de
estratégias. A saber, ocupações de terra, que correspondem a “ações coletivas das
famílias sem terra que, por meio da entrada em imóveis rurais, reivindicam terras
que não cumprem a função social” (CPT, 2009, p.11). Nesse sentido, a partir de
dados da CPT (2011) observou-se que no Pará houve cerca de 342 ocupações
registradas entre os anos de 1999 e 2009, com aproximadamente 47.178 famílias
envolvidas. Desse total o Sudeste Paraense apresentou 270 ocupações computadas
(78,94%), com 31.852 famílias (67,51%).
Uma outra estratégia desenvolvida são os acampamentos; que, segundo a
CPT (2009, p.11), são “espaços de luta e formação, fruto de ações coletivas,
localizados no campo ou na cidade, onde as famílias sem terra organizadas,
reivindicam assentamentos”.
No Pará, de um total de 83 acampamentos desencadeados entre os anos de
2002 e 2011, envolvendo 16.632 famílias, 68 localizaram-se no Sudeste Paraense
(76,92%), compreendendo 11.672 famílias nessa situação. Essas ações dos
movimentos sociais buscam a implementação dos Projetos de Assentamentos
(PA`s) que no Sudeste Paraense perfazem um total de 502, com uma área de
4.628.312,8184 hectares, contendo 91.839 famílias assentadas (SIPRA/INCRASR/27, 2014).
Em outros termos, os movimentos sociais redefiniram a geografia regional,
visto que os assentamentos compõem uma parte significativa do território, conforme
podemos observar no quadro 2 abaixo.
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Microrregiões
do
Sudeste Paraense
Número
de
Assentamentos
Araguaia
Marabá
Parauapebas
Redenção
São Félix do Xingu
Tucuruí
Araguaia
86
109
48
76
29
99
86
Território
dos
assentamentos
(Km²)
8.414,67
5.215,52
2006,4599
2055,7235
9.405,97
10829,5425
8.414,67
Território total
da microrregião
(Km²)
31.195,54
20.073,61
22.472,05
21.168,43
121.178,10
32.879,45
31.195,54
%
do
território
dos
assentamentos em relação a
microrregião (Km²)
26,97
25,98
8,92
9,71
7,76
32,93
26,97
Quadro 2: Número de assentamentos por microrregião do sudeste paraense e percentual que
ocupam do território em 2014.
Fonte: SIPRA SR-27, 2014; IBGE, 2014 / Org. Miranda, Rogério Rego.
O quadro acima revela que os assentamentos representam no mínimo um
terço da área total de microrregiões importantes do ponto de vista agromineral, a
exemplo de Marabá (25,98%), que possui diversas fazendas, empreendimentos
hidrelétricos (Usina Hidrelétrica de Marabá, que está em desenvolvimento), grupos
fortes do agronegócio como JBS S.A, e empresas siderúrgicas (SINOBRAS); ou no
campo oposto, embora não passem de 10% em determinadas microrregiões,
ocupam espaços considerados estratégicos para o capital, com destaque a
microrregião de Parauapebas que apresenta diversos projetos minerais da VALE
(Serra de Carajás, S11D, entre outros).
Nessas relações de força que redefinem o território, o MST foi responsável
pela organização e construção de oito assentamentos no sudeste paraense, os
quais estão dispostos no quadro 3 abaixo.
Assentamento N.
de Área
Famílias
PA 1º de
350
10960,8292
Março
PA 26 de
206
9774,0405
Março
PA 17 de Abril 690
18089,7346
Ano de
ocupação
1996
Ano de
Criação
1998
1999
2008
1995
1997
PA Cabanos
85
3426,0499
1998
2003
PA Canudos
62
2836,7248
1999
2004
PA Palmares II
517
14921,8902
1994
1996
PA Onalício
Barros
PA Nega
Madalena
68
1770,00
1998
2000
39
1.350,0000
--------
2011
Fazenda
Município
Fazenda São Tomé
(Pastoriza)
Cabaceiras
São João do
Araguaia
Marabá
Complexo
Macacheira
Fazenda Volta do rio
Eldorado do
Carajás
Eldorado do
Carajás
Eldorado do
Carajás
Parauapebas
Fazenda São José do
Refugio
Fazendas Reunidas
Rio Branco
Fazenda Goiás II
Parauapebas
Fazenda Nega
Tucumã
Madalena
Quadro 3: Projetos de Assentamentos implementados a partir da organização do MST, 2014.
Fonte: Secretaria Estadual do MST-PA/2015; SIPRA, 2014; Trabalho de campo, 2015
Org. Miranda, Rogério Rego.
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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
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Embora numericamente a ação do MST pareça não ser significativamente
expressiva se observamos o total de assentamentos existentes no sudeste do Pará,
segundo Ondetti
et all (2010), esse movimento foi o principal responsável por
mobilizar e organizar as ações de ocupação de terras no sudeste paraense,
inovando em termos de táticas de ocupação e auxiliando inclusive os STR`s
(Sindicato dos Trabalhadores Rurais) locais, apesar de
muitas divergências e
conflitos.
Atualmente um debate que se desenvolve se refere a permanência nos
assentamentos, especialmente em um contexto de forte pressão de fazendeiros e de
empresas mineradoras.
3 – A
LUTA PELA PERMANÊNCIA TERRITORIAL E CONSTRUÇÃO DE UM PROJETO CONTRA
HEGEMÔNICO
Os assentamentos construídos a partir de vários anos de ocupação e de
manifestações hoje sofrem um grande processo de desmobilização da luta social e
da organicidade2, embora isso não ocorra com a mesma intensidade em todos os
P.A.’s (Projetos de Assentamento).
Para fins de estudo, pesquisamos três assentamentos, quais sejam: 1º de
Março (São João do Araguaia), 26 de Março (Marabá) e Palmares II (Parauapebas).
Como fora discutido anteriomente o MST inicia a sua atuação no sudeste
paraense por volta de 1991 e se articula com outras entidades locais, especialmente
os STR`s, com o intuito de começar os trabalhos de base, os quais começaram em
Marabá, mediante ao cadastramento de três mil famílias (GOMES, 2009). E uma das
primeiras ocupações foi de uma área denominada de “cinturão verde” em
Parauapebas no dia 26 de Junho de 1994, com cerca de 1.500 famílias, mas que
logo são despejadas. A área em questão havia sido cedida pelo governo federal à
Companhia Vale do Rio Doce, que na época ainda era estatal, e para provocar
pressão sobre o governo as famílias acamparam em frente ao INCRA (Instituto
2
“A expressão organicidade indica no Movimento o processo através do qual uma determinada ideia ou tomada
de decisão consegue percorrer de forma ágil e sincronizada o conjunto das instâncias que constituem a
organização, desde o núcleo de base de cada acampamento e assentamento até a direção nacional do MST, em
uma combinação permanente de movimentos ascendentes e descendentes capazes de garantir a participação
efetiva de todos na condução da luta em suas diversas dimensões”. (CALDART, 2000, p. 162)
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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
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Nacional de Colonização e Reforma Agrária), em Marabá, durante cinco meses, e
embora não tenham conseguido a terra no local supracitado a luta dos militantes
possibilitou a desapropriação da fazenda Rio Branco (GOMES, 2009), que originou
três assentamentos, a saber, P.A. Rio Branco, P.A. Palmares Sul (conhecida como
Palmares I) e P.A. Palmares (popularmente denominada de Palmares II).
A partir desse momento diversas ocupações foram sendo realizadas e outros
assentamentos são organizados com base na logica do MST, a exemplo do P.A. 26
de Março que resultou da ocupação da fazenda Cabaceira de propriedade da família
Mutran, iniciando com 950 famílias e findando com 400, embora apenas 206 tenham
sido assentadas.
Entretanto a ocupação que mais ganhou repercussão nacionalmente foi a do
Complexo Macaxeira, que teve por consequência o “Massacre de Eldorado de
Carajás” (área em questão fazia parte do polígono dos castanhais, que sediava o
processo produtivo da castanha-do-pará, baseado principalmente na mão de obra
escrava. No local, após o referido período, houve o investimento na criação de
animais de grande porte e na venda ilegal de madeira) (GOMES, 2009), cujo conflito
com a Polícia Militar gerou 19 mortes de sem terra, culminando com a criação do
P.A. 17 de Abril em homenagem aos que faleceram nesse dia no ano de 1996.
Entretanto, devido à pressão dos movimentos sociais e de organizações
internacionais, outros assentamentos foram criados, a exemplo do P.A. 1º de Março.
Com relação aos primeiros assentamentos resultantes da desapropriação da
fazenda Rio Branco, Palmares II foi o único no qual o MST permaneceu
desenvolvendo
atividades
de
luta
social
e
este
apresenta
uma
forte
representatividade territorial por se localizar no seio da mineração desenvolvida em
Parauapebas pela VALE, sendo seu território cortado pela Estrada de Ferro Carajás
(EFC), cuja circulação diária do trem já provocou a morte por atropelamento de dois
assentados e de animais, além do ruído e da trepidação causar poluição sonora e
rachadura nas casas (ver foto 01). Fato que provocou diversas manifestações para a
construção de tuneis para evitar que outros acidentes ocorressem. Nesse
assentamento ainda é possível observar uma grande mobilização social devido a
permanência da organicidade do movimento, muito embora com mudanças, visto
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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
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que os núcleos de base foram substituídos pelos setores (educação, saúde,
associação, igreja etc.), dos quais lideranças ou não participam de grandes
assembleias aonde se deliberam manifestações, ocupações e outras ações coletivas
(ver foto 02), que inclusive possibilitaram a criação de outros assentamentos devido
ao apoio logístico e de pessoas envolvidas na luta pela terra.
Foto 01: EFC entrecortando o P.A. Palmares II
Foto 02: Manifestação por emprego realizada pelos
jovens
na
Palmares
II.
O assentamento igualmente apresenta um forte debate sobre educação, com
escolas do pré-escolar ao ensino médio, no qual são discutidos os princípios do
movimento, a importância da reforma agraria e da luta e organização coletiva.
Também houve a implementação de iniciativas de produção agroecológica e
coletiva, que apesar de não terem surtido o efeito desejado, deixou os fundamentos
agroecológicos como elementos importantes de serem desenvolvidos.
Essas ações buscam construir um projeto aberto e dialético de hegemonia3, o
qual se apresenta ainda como uma “semente”, mas que histórica e geograficamente
está sendo germinada no cotidiano dos assentamentos, embora neles diversas
contradições existem, por exemplo na Palmares II há um processo de compra e
venda de lotes ou fragmentação deles para a criação de chácaras que servem como
locais de lazer aquelas pessoas que residem em Parauapebas.
No P.A. 1º de Março existe igualmente a venda de lotes, sendo hoje a área
ocupada mais por novos moradores do que propriamente por aqueles que
empreenderam luta pela conquista da terra. Nesta realidade os lotes são negociados
em virtude do envelhecimento dos assentados, cujos filhos não moram mais no
local, sendo empregados em Marabá e cidades próximas, ou a venda ocorre por
3
A hegemonia, no sentido gramsciano, correspo
nde à direção política, mas igualmente moral, cultural e ideológica. Mas deve-se considerar a situação concreta,
analisada a sob a ótica das suas especificidades históricas (GRUPPI, 1978).
1272
A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
meio de ameaças desenvolvidas por médios fazendeiros e comerciantes mais
capitalizados. Apesar dessa contradição alguns elementos da organicidade são
implementados por meio de muitas disputas nas escolas e associações, o que
resulta em ações coletivas, ainda que esporádica, em prol das melhorias das
condições infraestruturais e regularização fundiária devido à possibilidade de
construção da Usina Hidrelétrica de Marabá que irá impactá-los diretamente, desta
feita, reivindicam os títulos de suas terras para poderem negociar seus direitos, caso
o projeto se efetive (ver fotos 03 e 04).
Foto 03: Manifestação na Transamazônica em prol
de melhorias na infraestrutura do P.A. 1º de Março.
Foto 04: Manifestação na Transamazônica em prol
da regularização fundiária dos lotes do P.A. 1º de
Março.
Por fim, no P.A. 26 de Março observamos um grande incremento da pecuária
(ver fotos 05 e 06) devido a existência de frigoríficos e do grupo JBS S.A em Marabá
ou mesmo devido a venda do leite neste mesmo município, corroborando para
aumento de financiamentos direcionados ao gado, por meio do Pronaf (Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e desenvolvendo forte vínculos
de dependência do assentado em relação ao mercado, concorrendo para a sujeição
da sua renda da terra.
Por outro lado, por meio da ação coletiva dos assentados deste P.A. foi
conquistado a implantação do Instituto Federal Rural de Marabá (IFPA- Rural) em
sua área, e por este motivo os cursos são hoje voltados para povos e comunidades
tradicionais, como educação indígena, cursos técnicos de agrônomos baseados em
uma produção agroecológica etc.
1273
A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
Foto 05: Entrada do P.A. 26 de Março.
Como
podemos
perceber,
Foto 06: Criação bovina no P.A. 26 de Março.
mesmo
em
meio
as
contradições,
os
assentamentos além de redefinirem a geografia do sudeste paraense também
possibilitam a criação de condições de um outro projeto de hegemonia, ainda que
esse, em meio as relações de poder assimétricas com fazendeiros e empresas
mineradoras, se mostre incipiente, aberto e ainda em “gestação”.
CONCLUSÕES
De uma maneira geral, no sudeste paraense existiu uma forte territorialização
de agentes econômicos, a exemplo dos castanheiros e comerciantes no inicio do
século XX e, mais recentemente, de empresas mineradoras, agropecuárias e
fazendeiros,
que
expropriaram
povos
e
comunidades
tradicionais,
desterritorializando-os. Em determinadas condições esses agentes hegemônicos
desenvolvam a territorialização do capital (Oliveira, 2002), entrando em consórcio
com os pequenos produtores e/ou assentados, subjugando-lhes a sua renda da
terra.
Esse processo, no entanto, não deve obscurecer a ação concreta dos
movimentos sociais que se territorializam e apresentam formas outras de
(re)produção, a exemplo do MST que representa uma outra proposta de
desenvolvimento territorial.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Rogério Henriquez. Territorialização camponesa no Sudeste do Pará.
Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido) Universidade Federal do Pará, 2006.
CPT. Conflitos no campo do Brasil. São Paulo: Expressão Popular, vários anos.
CALDART, R.S. Pedagogia do Movimento Sem Terra: escola é mais que escola.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
GOMES, Maria Suely Ferreira. A construção da organicidade no MST: A
experiência do assentamento 26 de Março-PA. Paraíba, 2009.
Dissertação
1274
A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
(Mestrado em Geografia Humana) – Centro de Humanidades , Universidade Federal
de Campina Grande, 2009
GRUPPI, Luciano. O conceito de Hegemonia em Gramsci. RJ: Edições Graal,
1978.
FERNANDES, Bernardo Mançano. MST: formação e territorialização. São Paulo:
Hucitec, 1999.
ONDETTI, Gabriel; WAMBERGUE, Emmanuel; AFONSO, José Batista g. De
posseiro a sem-terra: o impacto da luta pela terra do MST no Pará. In: CARTER,
Miguel (org.). Combatendo a Desigualdade Social: O MST e a Reforma Agrária
no Brasil. UNESP: SP-Presidente Prudente, 2010, p. 257-284.
OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. A geografia agrária e as transformações
territoriais recentes no campo brasileiro. In: CARLOS, A. F. A (org.). Novos
caminhos da geografia. São Paulo: Contexto, 2002.
SOUZA, Carlos Henrique Lopes de. A Trajetória da Força de Trabalho no Sudeste
Paraense: de agricultores migrantes a garimpeiros, de garimpeiros a posseiros, a
excluídos, a Sem Terra. In: XIII Encontro da Associação Brasileira de Estudos
Populacionais, realizado em Ouro Preto, Minas Gerais, Brasil de 4 a 8 de novembro
de 2002.
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