ANÁLISE GEOGRÁFICA DAS ÁREAS DE RISCO EM MANAUS

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VI Seminário Latino-Americano de Geografia Física
II Seminário Ibero-Americano de Geografia Física
Universidade de Coimbra, Maio de 2010
ANÁLISE GEOGRÁFICA DAS ÁREAS DE RISCO EM MANAUS
(AMAZONAS, BRASIL)
Karla Regina Mendes Cassiano – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
[email protected]
Reinaldo Corrêa Costa – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
[email protected]
Introdução
A pouca importância com a ecodinâmica dos espaços herdados da natureza
impactando o cotidiano (história em movimento) urbano contribui para a formação de
áreas vulneráveis, ou seja, áreas de risco que comprometem o cotidiano da cidade e
dos citadinos (principalmente na época das chuvas) e já causaram eventos fatais. Este
fato pode ser observado em Manaus (Amazonas, Brasil), onde os espaços para a
construção de habitações são apropriados pelas classes sociais com maior poder
aquisitivo, enquanto os pobres (com menor poder aquisitivo) ocupam as margens
alagáveis de igarapés (pequenos cursos fluviais) e encostas susceptíveis aos processos
erosivos.
O sítio geomorfológico de Manaus está localizado à margem esquerda do Rio Negro
próximo à confluência com o Rio Amazonas sobre terrenos datados do
Terciário/Quaternário, onde está a formação Altér do Chão. A geomorfologia do sítio
de Manaus influencia, pela sua constituição, os espaços ocupados por classes sociais
diferentes cujo custo da construção é influenciado pela dinâmica topográfica e pelas
bacias hidrográficas urbanas, assim como pela susceptibilidade à especulação
imobiliária para diversos fins. Essa geomorfologia mostra as áreas mais propensas a
acidentes e danos e quais estão em tipos geomorfológicos “seguros” (geralmente
tabuleiros bem drenados), em fim quais os espaços que receberam infra-estrutura no
sítio urbano.
Deste modo, o presente trabalho traz uma análise das áreas de risco em Manaus
utilizando os procedimentos de Geossistema e Formação Sócioespacial, ambos como
teoria e como método, pois é a partir do encontro entre esses dois paradigmas que se
tem uma visão integrada entre Geografia Física e Geografia Humana como relação
interativa natureza-sociedade, pensar o risco como elemento da dinâmica
geomorfológica e social para construção de cartas de análise e grau de risco com fins
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Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios
de planejamento e zoneamento aliada à dinâmica social e suas contradições em
específicas unidades espaciais de análise.
Manaus
Nos últimos trinta anos a cidade de Manaus (340 anos; 1.646.602 habitantes, 2009;
4º maior PIB do Brasil) passou por um acentuado processo de crescimento
demográfico, vinculado, principalmente, à implantação da Zona Franca de Manaus
(ZFM) em 1967. Concomitantemente, tal crescimento ocorreu sobre espaços herdados
da natureza que foram apropriados para fins de habitação. Estes novos espaços de
moradia se constituíram, em sua maioria, sem infra-estrutura adequada e em áreas
potencialmente vulneráveis, como as margens alagáveis de igarapés e encostas
susceptíveis aos processos erosivos, dando origem àquilo que se convencionou chamar
“áreas de risco”. É próprio da cidade a formação de áreas de risco quando a dinâmica
da natureza entra em contato com a dinâmica da sociedade, em outras palavras, “a
falta de planejamento associada à dinamicidade dos processos naturais existentes,
principalmente às intensas chuvas, constituem áreas de risco” (CASSIANO e COSTA,
2009, p. 2).
A geomorfologia do sítio urbano de Manaus (Figura 1) constitui um dos elementos
na formação de áreas de risco pelo modo como transformada sua “epiderme” em
padrões históricos de construções que se acumulam no tempo. Localizada à margem
esquerda do Rio Negro inserido na Bacia Sedimentar do Amazonas a qual é constituída
principalmente por rochas paleozóicas e, secundariamente, por sedimentos mais
recentes, do Cretáceo Superior e Terciário (ROQUE, 2006), entre interflúvios tabulares
e colinas pertencentes à Formação Altér do Chão (COSTA, 2008), com influência de
ambientes fluviais e altos índices pluviométricos em diversas bacias hidrográficas dos
sistemas hidrogeomorfológicos no sítio urbano com diferentes ordens de grandeza,
escala e impactos na formação da cidade.
A formação Altér do Chão representa o quarto nível deposicional da Bacia do
Amazonas (SANTOS JÚNIOR, 2002). Silva (2005) reforça que tal formação compreende
arenitos finos a médios, vermelhos, argilosos, cauliníticos, inconsolidados, contendo
grânulos de seixos de quartzo esparsos, geralmente com estratificação cruzada. Sua
característica peculiar na região é o predomínio de camadas arenosas estratificadas e
cauliníticas, com aparência esbranquiçada e o ambiente fluvial, embora também
existam pacotes avermelhados (ferruginosos). Tal diferenciação de cores existe devido
ao processo de intemperismo. Sobre esse substrato desenvolve-se um manto de
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intemperismo formando latossolo com até 15 metros de espessura. A região é
constituída de latossolos amarelos álicos com, horizonte “A” moderado e textura
argilosa, areno-argilosa ou argilo-arenosa e arenosa (ROCHA, 2006).
Figuras 1 e 2: A primeira imagem apresenta o sítio urbano de Manaus onde se destacam a
topografia do relevo com bastante declividade e os principais igarapés da rede hidrográfica. A
segunda imagem mostra a cidade construída sobre o espaço natural, na qual se destacam as
áreas verdes da Reserva Adolpho Ducke (canto superior direito), Universidade Federal do
Amazonas (área centro-direita) e o Centro de Instrução de Guerra na Selva, do Exército (área
esquerda).
Dentro do quadro geomorfológico da cidade está inserida também a rede de
drenagem representada por diversos cursos fluviais, dentre os quais se destacam as
bacias hidrográficas do Mindu, Bindá, Passarinho e Quarenta (COSTA et al, 2008). As
planícies de inundação dos referentes igarapés se encontram, muitas vezes, ocupadas
por diferentes tipos de construção (canalizações, retificação de cursos fluviais,
aterramentos entre outros) com diferentes impactos nas margens e na própria
planície. Os igarapés principais das referentes bacias desembocam no rio Negro, com
uma oscilação em torno de 10 metros entre o período de cheia e o de estiagem
(ROCHA, 2006).
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Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios
Procedimentos teóricos e metodológicos
O poder público brasileiro, por meio da Defesa Civil nacional, trata o risco como
uma relação entre a probabilidade de ocorrência de um evento adverso de acidente e
o grau de vulnerabilidade do sistema receptor e seus efeitos. Com base neste conceito
de cunho burocrático jurídico, para a presente discussão o risco será pensado como
uma probabilidade de perigos, danos e catástrofes em diferentes escalas e impactos
em específicas unidades espaciais do geossistema e da formação sócioespacial e
expressos em paisagens.
O risco também é pensado em uma determinada escala onde elementos, tanto de
fato/ordem natural como de fato/ordem social, encontram-se interligados. Traduzindo
esta acepção para a análise geográfica, o risco deve ser analisado pelos procedimentos
de Geossistema (BERTRAND, 1972) e Formação sócioespacial (SANTOS, 1977).
Referente à análise geossistêmica das áreas de risco em Manaus, três conceitos se
fazem necessários para o método GTP: Geossistema, Território e Paisagem.
- o geossistema: “é um conceito espacial que define unidades espaciais *...+ uma
entrada vertical (geótopo, geófacie, geocomplexo [...], uma entrada horizontal
(geohorizonte). É um conceito temporal e histórico” (BERTRAND, 1995, p. 105);
- o território: “*...+ o espaço é anterior ao território. O território se forma a partir do
espaço, é o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático [...] em
qualquer nível.” (RAFFESTIN, 1993, p. 143);
- a paisagem: “*...+ uma determinada porção do espaço que resulta na combinação
dinâmica dos elementos físicos, biológicos e antrópicos, os quais interagindo
dialeticamente uns sobre os outros, formam um conjunto único e indissociável em
perpétua evolução.” (BERTRAND, 1972, p. 2).
Referente á formação sócioespacial das áreas de risco, Santos afirma (1977) afirma
que a formação social, totalidade abstrata, não se realiza na totalidade concreta senão
por uma metamorfose onde o espaço representa o primeiro papel, ou seja, é de
formações sócio-espaciais que se trata. Isto é, há uma peculiaridade, a cidade não é
construída homogeneamente.
Resultados e considerações
O presente estudo colabora no entendimento da dinâmica dos riscos, como
elemento da formação urbana, logo é reproduzido cotidianamente e 3nvolve a
conservação/perturbação de sistemas naturais e as relações sociais de valorização do
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solo urbano definindo a infra-estrutura e capacidade de suporte e resposta aos
eventos de risco.
Encontramos
um
histórica
correlação
tempo-espaço-relações
sociais
(RAFFESTIN:1993), isto é, processos erosivos, sítio geomorfológico e ações de classe na
espacialidade dos riscos urbanos. Em grande parte o risco ocorre nos períodos de
maior pluviosidade, com maior ou menor influência de processos gravitacionais e de
assoreamentos de cursos fluviais.
No panorama das áreas de risco em Manaus duas modalidades prevalecem:
deslizamentos e inundações devido a formação de fragilidade ambiental em diferentes
territorialidades devido a dinâmica existente entre os sistemas naturais e as relações
sociais e a forma como a sociedade com diferentes classes sociais interpreta ou deseja
a natureza conforme os interesses de classe. Utilizando a classificação de Kobiyama
(2004), os deslizamentos consistem na movimentação de massa encosta abaixo, como
solos, rochas e vegetação, sob a influência direta da gravidade e, as inundações são
definidas como o aumento do nível do rio além de sua vazão normal, transbordando
sobre áreas próximas a ele. A ocorrência dos referentes eventos adversos atingindo,
direta ou indiretamente, algum indivíduo ou grupo social gera o que se convencionou
denominar “áreas de risco”, ou seja, para a existência de áreas de risco é fundamental
o elemento social, caso contrário, seria apenas um evento da natureza.
Um quadro do sintético do problema de risco em Manaus revela a dimensão do
problema a partir de dados da Defesa Civil. Os mapas a seguir mostram a espacialidade
dos eventos de alagação e deslizamento no ano de 2008. Três fatores se destacam: o
relevo, o clima e a rede hidrográfica. A estrutura do relevo é relevante devido ao modo
em que é apropriado por determinadas classes sócioespaciais. As áreas mais afetadas
estão localizadas nas zonas norte e leste da cidade, sendo estas zonas situadas nas
porções mais elevadas do sítio urbano.
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Ocorrências
/anos
2005
2006
2007
2008
Total
Alagação
748
482
1.444
(849 em abril)
518
3.192
Deslizamento
441
276
639
220
1.576
Total
1.189
758
2.083
738
4.768
Deslizamentos 2008
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Alagação 2008
Aqui se compreende a cidade de Manaus como um sistema aberto onde há troca de
matéria e energia. Neste contexto, a essência da paisagem dessas áreas está
relacionada com elementos do substrato da cidade bem como a fatores externos. O
regime pluvial local atua como contribuinte na dinâmica dos igarapés na cidade, na
formação de feições erosivas (sulcos, ravinas e voçorocas) e sua evolução do relevo
através dos processos de erosividade e erodibilidade (AB’SABER, 2006), bem como por
movimentos de massa (SUGUIO, 2003). Outro fator relevante na análise dos
deslizamentos é a presença/ausência de vegetação nas encostas, favorecendo ou não,
os processos erosivos. As obras públicas, o escoamento de águas servidas e o acúmulo
de lixo também interferem na formação de áreas de risco.
A geograficidade das áreas de risco está na sua abordagem teórica e metodológica,
que combina tanto elementos da sociedade quanto da natureza. Os impactos causados
pelos processos naturais (para Manaus deslizamentos e inundações) se manifestam de
três maneiras: pontualmente, areolarmente e linearmente, isto é, o risco se
espacializou no sistema urbano.
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Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios
Referencias
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SUGUIO, K. Geologia Sedimentar. Editora Edgar Blucher. São Paulo, 2003.
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