_>>> Jornal Valor Econômico - CAD A - BRASIL - 6/6/2011 (20:35) - Página 13- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW Enxerto Segunda-feira, 6 de junho 2011 | Valor | A13 Opinião Desvalorização fiscal e o equilíbrio Igor Barenboim A s dificuldades econômicas da Grécia causada pelo desequilíbrio fiscal e falta de competitividade de sua economia sem fácil solução cambial, devido à aderência do país à moeda comum europeia, fizeram os economistas se aplicarem em soluções tributárias para a desvantagem competitiva. No ano passado Domingo Cavallo, ex-ministro da Economia da Argentina, publicou no “Vox”, revista eletrônica de artigos de política econômica, dois artigos com sua opinião a respeito da melhor saída para a falta de competitividade da periferia europeia. A análise de Cavallo e aplicações para o momento atual da economia brasileira são os temas deste ensaio. Na opinião de Cavallo, abandonar o euro, resgatando o dracma temporariamente e readerí-lo em patamar mais competitivo como era feito nos tempos do antigo sistema monetário europeu e na época em que vigorava o acordo de Bretton Woods é uma opção mais temerária para a Grécia e para a zona do euro como um todo, porque geraria uma desconfiança com respeito à adesão à moeda única por parte de todas as economias europeias em dificuldade hoje e no futuro. Além disso, levaria o governo a fazer um processo não transparente de reestruturação da dívida do país criando mais desconfiança do que necessário por parte de investidores e colocando boa parte do sistema de pagamentos europeus em maior risco do que necessário. Segundo a avaliação em tela, a Grécia e outros países da zona do euro em dificuldade similar deveria valer-se de medidas tributárias que podem levar a resultado similar. A proposta é a seguinte: 1) reduzir os custos do tributário sobre o trabalho como as contribuições previdenciárias patronais e as contribuições das empresas para a poupança obriga- tória; e 2) financiar essa perda elevando o imposto sobre o valor agregado que incide sobre o consumo de produtos nacionais e importados, incentivando a poupança, desincentivando importações e incentivando exportações já que estas são isentas do IVA. Esse enunciado econômico de Cavallo, de que é possível copiar os efeitos de uma desvalorização cambial com uma desvalorização fiscal, está sendo provado por vários economistas como em um artigo científico que será em breve divulgado por professores de Harvard e Princeton: Fahri, Gopinath e Itskhoki. Em vista desse quadro, a pergunta que segue para os pensantes da economia nacional é: será que essa observação de Cavallo tem aplicabilidade para o Brasil de hoje, que convive com uma moeda bastante apreciada, com um pequeno, porém crescente desequilíbrio nas transações correntes internacionais, com um recrudescimento das exportações de primários e relativo declínio das de manufaturados, com consequente grita industrial com respeito à falta de competitividade? A resposta não é trivial, pois por um lado estamos com um pa- tamar alto de inflação, na verdade estamos no teto da banda da meta de inflação e qualquer medida que copiasse os efeitos de uma depreciação cambial nos faria furar o teto, o que seria indesejável. Por outro lado, uma vez que a inflação esteja em xeque, vale considerar essa medida, já que pelo lado monetário nossas autoridades têm tido dificuldade em evitar a apreciação cambial persistente com prejuízo para as indústrias exportadoras tão cruciais para a economia nacional em momentos de baixos preços de commodities como argumentam Caballero e Lorenzoni. Para Cavallo é possível copiar os efeitos de uma desvalorização cambial com uma desvalorização fiscal Ademais, no caso brasileiro, pode existir uma questão federativa interessante caso seja utilizado como instrumento equivalente ao imposto sobre o valor adicionado o ICMS que é estadual ao invés do PIS e Cofins que têm características similares mas são tri- butados pela fazenda federal. A promulgação da lei Kandir isentou os exportadores de ICMS com promessa federal nunca cumprida plenamente de indenização das perdas das arrecadações estaduais. Essa quebra de promessa afetou confiança dos Estados na União, o que vem dificultando em muito as negociações para uma reforma tributária. Outro ponto que dificulta essa confiança é que os entes federativos vivem às turras com a burocracia da União para obter as verbas que foram a eles destinados em acordos com cerimônias de pompa e circunstância e que muitas vezes nunca alcançam seu destino final. Nesse sentido, utilizar a ampliação da arrecadação do ICMS para compensar a perda de receita previdenciária e talvez parte das perdas dos Estados com a lei Kandir poderia aumentar o poder de barganha do lado mais fraco da corda do pacto federativo contribuindo para reestabelecer a confiança mútua entre estados e União, tão fundamental para o contínuo progresso de nossa república federativa. Igor Barenboim é PhD em Economia por Harvard. Duras críticas a Paulson e a defesa da reforma do setor financeiro. Por Pedro C. Chadarevian Recuperação francesa fortalece Lagarde C hristine Lagarde, primeira mulher no Ministério da Economia francesa e a mais longeva no cargo, destoa visivelmente no gabinete do presidente francês Sarkozy. Ponderada, tomou distância das polêmicas e abusos do governo em sua estratégia mediática para conquistar simpatizantes da extrema-direita. Autodenominada “liberal moderada”, não esconde o descontentamento em relação à atual ordem financeira internacional. Sua candidatura à presidência do Fundo Monetário Internacional (FMI) em meio à saída turbulenta de Dominique Strauss-Kahn é uma inteligente estratégia de recuperação da legitimidade da instituição, que, com uma mulher no comando, responderia às crescentes acusações de machismo da direção. Porém, muito mais que aspectos morais ou ideológicos, o que parece explicar o favoritismo de Lagarde à sucessão no FMI é o seu papel na gestão da crise econômica na França. Dentre as economias mais avançadas, a França, ao lado de Alemanha e EUA, é a que conhece o melhor desempenho desde o início da crise econômica global em fins de 2007. O crescimento esperado do Produto Interno Bruto (PIB) em 2011 deverá anular, nesses países, as perdas acumuladas no período. Entretanto, a posição francesa é sólida e sustentável. Primeiramente porque o seu sistema financeiro, muito mais seguro que o da Alemanha (cujos bancos são os principais credores da dívida grega), e bem mais regulado que o americano, pouco se abalou com a turbulência iniciada com a falência do Lehman Brothers. Em segundo lugar, porque o seu endividamento é considerado saudável pelas agências de rating, diferentemente do risco associado à dívida americana ou alemã, por exemplo. E, por fim, porque a dinâmica de sua economia se fundamenta no consumo interno, ao contrário do modelo alemão — fortemente ancorado no desempenho das exportações, e portanto sujeito às intempéries da economia global — ou do americano, cujo padrão de crescimento sustentado no endividamento das famílias está na própria origem da instabilidade atual. Saber articular medidas anticíclicas — relativamente tímidas, pois a expansão da dívida pública no período de 2008-2010, da ordem de 18 pontos percentuais, está um pouco abaixo da média da zona euro — com a ação de mecanismos de proteção social pré-existentes, é o segredo da recuperação econômica francesa. Na realidade, é importante Frase do dia “Nós ainda temos um longo caminho a trilhar.” Disse o presidente dos EUA, Barack Obama, em discurso a empregados da indústria automobilística Chrysler visto como início da sua campanha de reeleição, ao comentar o sucesso de pacote de resgate às montadoras e a fraca reação do mercado de trabalho. A taxa de desemprego aumentou de 9% em abril para 9,1% em maio. Cartas de Leitores Confaz “O Secretário da Fazenda da Bahia afirmou que os benefícios com o ICMS foram concedidos para suprir uma lacuna gerada pelo desenvolvimento industrial centrado nas regiões Sul e Sudeste. Não concordo com a afirmação. Os benefícios fiscais foram concedidos ao arrepio da Constituição e por governos e empresários mais interessados em faturar em cima do ICMS dos outros Estados. Foram concedidos benefícios para empresas atacadistas que levavam (ou não) a mercadoria para passear só para receber o incentivo fiscal. Uma alíquota interestadual única acabaria certamente com esse passeio fiscal dos atacadistas e, caso seja realmente baixada, diminuiria o poder de atração para as indústrias.” Ronaldo Neves de Carvalho [email protected] Dilma refém “Presidente Dilma. A senhora diz que não será refém do medo ou da timidez, seja lá o que isso significa. Mas, infelizmente para a nação, a senhora é refém do que há de pior na política brasileira, haja vista seus aliados da base governista. É refém também do PT e do fogo amigo”. Luiz Nusbaum, [email protected] Afinal “Finalmente o governo da presidente Dilma partiu para o ataque, lancetando esse tumor que é a administração pública, vergonhosa a sugar o povo brasileiro. O primeiro passo com os aeroportos já foi dado. Estou começando a gostar desse governo que começa a governar.” Sebastião Junqueira Villela [email protected] Código Florestal Augustín Carstens não deve ser páreo para Lagarde, que soube articular o apoio decisivo de credores e devedores, progressistas e conservadores, países centrais e periféricos, em torno de um discurso coerente de reforma das instituições econômicas globais. que se diga que o grau de liberalização e abertura da economia francesa é significativamente distinto dos demais países avançados. Sua política agrícola e industrial protecionistas e seu sistema de seguridade social complexo têm sido mantidos relativamente preservados. Ou seja, o grau de intervenção e regulação estatal funcionam como amortecedor do impacto da crise global nesse país, o que explica porque, apesar das medidas anticíclicas pouco ousadas, a França não apenas se sai relativamente preservada em 2009, o pior ano da recessão global, como alcança um desempenho econômico invejável no início de 2011: a produção industrial expandiu-se 6,3% no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano anterior, puxada, principalmente, pelo consumo das famílias, em progressão de mais de 3% no mesmo comparativo. Parece, no entanto, fundamental para esse desempenho a preservação de uma estrutura de proteção social avançada. No auge da crise, em 2009, os gastos sociais apresentaram crescimento significativo (6,2%), em especial o programa de renda mínima, que expandiu-se 15,1%. Além disso, a gestão econômica francesa pós-crise global, ainda que apresente sinais contraditórios como se evidencia no anúncio de redução de impostos sobre grandes fortunas, ou no recorrente discurso de austeridade fiscal da ministra, reitera o combate ao que considera falhas de mercado. É o caso mais recente das tentativas de lidar com a margem crescente das grandes corporações nativas, por meio da imposição de um bônus para os trabalhadores, ou ainda do anúncio da regulação dos preços dos combustíveis no país, vilões da inflação francesa. Strauss-Kahn, criticado por sua gestão conservadora da política econômica no governo Jospin, e que vinha liderando no FMI uma campanha por um novo marco regulatório internacional, defendia a substituição dos “dogmas” do Consenso de Washington por um novo paradigma, no qual enfatizaria o combate às desigualdades e medidas macroprudenciais. O discurso intervencionista que vem caracterizando a gestão de Lagarde no comando da economia francesa — como não recordar as duras críticas que ela dirige a Henry Paulson no documentário Inside Job, ou sua campanha por uma nova regulação do sistema financeiro internacional? — aponta para a continuidade em relação ao seu antecessor. Seu principal opositor na campanha sucessória para a direção do FMI, o presidente do Banco Central mexicano, Augustín Carstens, de formação ortodoxa — é doutor em Economia pela Universidade de Chicago — representa a ruptura; sofre, porém, da perda de credibilidade do paradigma econômico conservador, cuja pregação pela autorregulação dos mercados tem sido apontada como um dos fatores de eclosão da crise global. Não deverá ser páreo para Lagarde, que soube, como poucas, articular o apoio decisivo de credores e devedores, progressistas e conservadores, países centrais e periféricos, em torno de um discurso coerente de reforma das instituições econômicas globais. “O atual Código Florestal deixa na ilegalidade a imensa maioria dos agropecuaristas brasileiros, em especial aqueles pequenos nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste do país. Se fosse implementado, expulsaria milhões de pequenos produtores de suas atividades. Ou seriam expulsos, ou multados ou ainda não teriam mais acesso ao crédito rural. Daí a imensa força política do projeto de reforma do atual código. Como é que um deputado vai explicar à sua base eleitoral (apesar de não parecer, existe uma parcela imensa do eleitorado que vive no interior e tem na agropecuária sua base econômica) que para agradar ao governo e ao Greenpeace ele votou contra um projeto que objetiva legalizar sua principal atividade econômica? “ Brenner J.G. Brenner [email protected] Correção Diferentemente do publicado na edição de sexta-feira, à página B14, nenhuma unidade do Minerva foi afetada pelo embargo russo às carnes de três Estados brasileiros. Pedro C. Chadarevian é doutor em Correspondências para Economia pela Universidade de Paris 3 – Av. Francisco Matarazzo, 1.500 Sorbonne Nouvelle, e professor do Torre New York - CEP 05001-100 programa de pós-graduação em Água Branca - SP ou para Economia da Universidade Federal de [email protected], com nome, São Carlos – Campus Sorocaba. endereço e telefone. Os textos http://pedrochadarevian.wordpress.compoderão / ser editados.