a CiênCia vai venCer a luta COntra O - Bristol

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Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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a CiênCia vai
venCer a luta
COntra O
Produção Aline Prado
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Foto Leo Eloy/Estúdio Garagem
semináriosfolha
ab
câncer?
Tubos
de ensaio
vistos
de cima
a cada dia, milhares de pessoas no mundo recebem o diagnóstico de câncer. se no passado
isso era uma sentença de morte, no futuro espera-se que a doença seja
crônica e controlável, como a aids. fórum promovido pela folha sobre
o tema mostrou um misto de otimismo e realismo. enquanto as pesquisas avançam, os custos do tratamento dificultam sua universalização.
o câncer desafia a ciência há mais de um século. nenhuma outra doença
foi tão estudada. por dia, são publicados em média 280 artigos científicos sobre o tema. o caminho para o futuro se divide em três possibilidades: imunoterapia, terapia-alvo e manipulação de dna. nada disso elimina a prevenção e o diagnóstico precoce. enquanto a guerra não é vencida, pacientes comemoram o sucesso em cada batalha.
c acesse em folha.com/combateaocancer
2
Nós temos um
sistema de
avaliação de
medicamentos
velho e
burocratizado
Fotos Eduardo Knapp/Folhapress
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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Paulo hoff
presidente do Icesp
A discussão
do custo não
pode ser o
valor da vida
porque isso
não tem
limite; tem
que ser o
benefício do
tratamento
O rico paga
quanto for
preciso por
sua saúde,
mas o pobre
morre sem
tratamento
drauZio Varella
oncologista e colunista da Folha
henrique Prata
diretor-geral do Hospital do
Câncer de Barretos
OncOlOgia evOlui nO país,
mas custO limita acessO
tratamentos Caros e esCassez de pesquisas ClíniCas no Brasil estÃo
entre os prinCipais proBlemas no
Lucra-se muito
com a verdade;
a conspiração
do silêncio
não beneficia
nenhuma
parte
Vera anita Bifulco
coordenadora do serviço
de psico-oncologia do Instituto
Paulista de Cancerologia
Não existe
um remédio
genérico para
câncer; o que
é bom para
um, pode
matar outro
Marco antonio Zago
reitor da USP
Tratamento
interdisciplinar
facilita ver o
paciente não
como um órgão
comprometido,
mas como
um todo
fernanda caPareli
oncologista do Hospital Sírio-Libanês
ComBate ao CÂnCer; seminário em
sÃopauloreuniuespeCialistas para
disCutir os avanços, os entraves e
o futuro da luta Contra a doença
DE SÃO PAULO
cOLAbOrAçÃO PArA A folha
De um lado, a medicina oncológica avança, com tratamentos sofisticados como a
imunoterapia, que promete
transformar tumores agressivos em doenças tratáveis.
De outro, os entraves que
já são velhos conhecidos no
Brasil: a burocracia para a
realização das pesquisas clínicas, que atrasa o lançamento de medicamentos, e os altos custos do tratamento, que
oneram os cofres dos sistemas de saúde público e suplementar.
Enquanto isso, cresce o
clamor popular por soluções
acessíveis para tratar a doença, ao ponto de a fosfoetanolamina, a “pílula do câncer”,
ter sido aprovada pelo Senado antes mesmo de passar
por ensaios clínicos (teste em
seres humanos).
Esses e outros temas foram
discutidos no fórum O Futuro do Combate ao Câncer, realizado pela Folha no Tucarena, em São Paulo, na terça
(29) e na quarta (30), com patrocínio dos laboratórios MSD
e Bristol-Myers Squibb.
A cada ano, 15 milhões de
pessoas em todo o mundo recebem o diagnóstico de câncer, doença que mata 8 milhões anualmente.
“É a segunda causa de morte em nosso país. E, nesta década, se tornará a primeira
causa em vários países da Europa e algumas regiões dos
Estados Unidos”, disse o oncologista Paulo Hoff, presidente do Icesp (Instituto do
Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias de Oliveira),
que abriu o evento.
Com os tratamentos disponíveis hoje, segundo Hoff,
60% dos pacientes sobrevivem. Mas muitos ainda sofrem por falta de diagnóstico
precoce, o que diminui as
chances de cura.
Uma questão recorrente
durante os dois dias do encontro foram os valores altos
dos tratamentos de câncer.
“Chegamos a uma situação
em que o custo do tratamento oncológico ficou absurdo.
Calcular custo é uma equação complexa, e esse cálculo
é um buraco negro”, afirmou
o oncologista Drauzio Varella, colunista da Folha.
Ele lembra que há novos
medicamentos que, se fossem
comprados, custariam metade de todo o orçamento do
Ministério da Saúde.
“É preciso identificar quais
tratamentos fazem a diferença e quais pacientes seriam
mais beneficiados por eles.”
Stephen Stefani, oncologista do Instituto do Câncer
do Hospital Mãe de Deus, disse que o custo de um tratamento chega a mais de US$ 1
milhão (R$ 3,6 milhões) por
ano por paciente. “Está cada
vez mais difícil encarar esse
custo. Isso aumenta a desigualdade entre os recursos
para a saúde pública e os
aplicados na privada.”
Raquel Lisboa, gerente-geral de regulação da Agência
Nacional de Saúde Suplementar, afirmou que, embora haja uma pressão para que
os planos de saúde incorporem tecnologias sofisticadas,
os recursos são limitados.
“Quem financia o sistema
é o próprio usuário, por isso
usamos tantos critérios.”
PÚBLICO E PRIVADO
Durante o evento, Henrique Prata, diretor-geral do
Hospital do Câncer de Barretos, criticou a isenção fiscal a
grandes hospitais privados
em um cenário em que os recursos para saúde pública
são escassos. Segundo ele, a
isenção de R$ 1,6 bilhão ao
ano beneficia só seis hospitais em todo o país.
“Existe, por debaixo dos
panos, favorecimento à medicina privada.”
O aumento de custo causado pelo diagnóstico tardio e
pela demora no atendimento
também foi apontado.
No Hospital do Câncer de
Barretos, mais de 50% dos tumores de mama chegam em
estágio avançado, quando o
tratamento custa dez vezes
mais do que na fase inicial.
Antonio Luiz Frasson,
mastologista do Hospital Israelita Albert Einstein, conta que, no sistema privado,
tumores de mama têm, em
média, 1,5 centímetro, enquanto no SUS a metade das
mulheres chega com tumores de 5 centímetros. “Tumores avançados exigem todas
as terapias disponíveis, a
custo muito alto.”
Para ele, o acesso rápido
ao tratamento é mais importante do que terapias caras,
como exames ultrassensíveis.
“Detectamos alterações mínimas, mas, talvez 30% das
intervenções feitas hoje não
fossem necessárias.”
Mesmo com tantos problemas e limitações orçamentárias, Paulo Hoff se diz otimista: “O Brasil está melhor do
que há 15 anos e temos ferramentas para progredir mais”.
(cláudia collucci, saBine righetti, Walter Porto, andrea Vialli,
iara BiderMan e Julio laMas)
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Sexta-Feira, 1° De abril De 2016
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semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
O pioneirismo da Bristol-Myers Squibb no campo da
Imuno-Oncologia mudou a maneira como medicamentos
para o câncer são desenvolvidos, pesquisas clínicas são
conduzidas e dados clínicos são avaliados e, atualmente,
possibilita uma sobrevida a longo prazo e melhor qualidade
de vida para os pacientes que convivem com a doença.
Esta é uma nova abordagem para o tratamento
de diversos tipos de câncer que utiliza a capacidade
natural do próprio sistema imunológico para
combater as células tumorais.
Material destinado ao público leigo. Março/2016
3
Fotos Arquivo pessoal
4
semináriosfolha
Há vida além da doença
Fiz meu primeiro tratamento há 17 anos, quando tive
câncer de mama. Amputei a mama e fiz quimioterapia
e radioterapia. Depois tive metástase pulmonar em
2007 e óssea em 2011 e 2015. Estou escrevendo um livro
com minha história. Depois do primeiro diagnóstico,
me separei depois de 30 anos e então tive alguns
namorados. Também dirigi uma escola da Aeronáutica —
sou professora de matemática aposentada—, fiz pós em
design de interiores e mudei de casa. Fiz ainda diversas
viagens, a última à Europa depois de um tratamento de
tuberculose. Minha família achou um abuso. Eu, não.
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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Maria Christina Pinheiro, 63
Rio de Janeiro
de dentro para fora
O QUE É UM CÂNCER
CiÊNCiA obtém suCesso Com mediCAmeNto que fortAleCe sistemA imu-
Células
normais
NológiCo pArA que ele CombAtA só
o CâNCer, em vez de AtACAr CélulAs
tumorAis e sAdiAs Ao mesmo tempo
SABINE RIGHETTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Um novo holofote sobre as
pesquisas de câncer parece
indicar o rumo dos estudos
daqui para frente. Cientistas
norte-americanos conseguiram uma sequência de bons
resultados contra a doença
ao ativarem o próprio sistema imunológico dos doentes.
É a chamada “imunoterapia”, bola da vez da ciência
oncológica de ponta.
O que se chama de câncer,
na verdade, é um conjunto de
mais de uma centena de
doenças. Elas começam com
a mutação inicial de um gene, que leva à multiplicação
descontrolada das células até
formar uma massa tumoral.
O momento épromissorpara as pesquisas porque há
muita informação científica
acumulada, segundo Dirce
Carraro, que estuda a identificação de novos genes associados a câncer hereditário no
A.C. Camargo Cancer Center.
Levantamento feito por Estêvão Gamba, especialista em
dados científicos da Unifesp,
mostra que de 2012 a 2014 foram publicados 305.858 artigos sobre câncer. Quase 280
estudos por dia.
Há décadas, a praxe da medicina é tratar a doença com
uma combinação de cirurgia,
de fármacos para atacar as
células (cancerígenas e saudáveis) e de radiação no tumor. Às vezes, dá certo e o
câncer vai embora (se desco-
berto no início, a chance de
cura é de até 90%).
O problema é que a maioria dos tumores avança em silêncio, e o número de diagnósticos não para de crescer:
o Inca (Instituto Nacional de
Câncer) estima 596 mil casos
novos até 2017 no Brasil.
A imunoterapia, no lugar
de atacar o organismo como
a quimioterapia e a radioterapia, fortalece o corpo para
que ele combata a doença. O
objetivo é o mesmo: atingir a
massa tumoral. A área tem sido estudada há mais de uma
década, com foco em melanoma, tipo agressivo de câncer
de pele (que responde a 1,6%
dos cânceres no mundo).
A Bristol-Myers Squibb
aprovou, em 2013, nos EUA,
o primeiro imunoterápico do
mercado. O Yervoy, contra
melanoma, consegue “desbloquear” os freios do sistema imunológico que o próprio câncer provoca.
“Não se trata de matar o
câncer, mas de ajudar o corpo a matá-lo”, diz Roger
Miyake, diretor médico da
Bristol no Brasil. A empresa
e a MSD também aprovaram
mais dois imunoterápicos
nos EUA, no ano passado. Um
deles, o Opdivo, para melanoma e câncer de pulmão, deve chegar ao Brasil neste ano.
O outro, Keytruda, da MSD,
foi usado com sucesso no tratamento do melanoma do expresidente norte-americano
Jimmy Carter, 91. Conseguiu
driblar a doença, já em me-
As células do nosso corpo
são programadas para se
reproduzirem de forma
organizada e controlada
Essa reprodução é
responsável pela formação, crescimento e
regeneração dos tecidos
Células
tumorais
Célula tumoral
circulante
Quando um grupo de
células se multiplica de
modo desordenado,
chamamos isso de tumor
Ele é chamado de maligno
quando tem comportamento invasivo, capaz de invadir
tecidos e gerar metástases
COMO UM CÂNCER SE ESPALHA PELO ORGANISMO
Células
normais
Células do
tumor
Metástase
Célula tumoral
circulante
Algumas células do tumor
podem se desprender do
tecido e viajar dentro da
corrente sanguínea
Algumas dessas células
param em outra parte do
organismo e se reproduzem no órgão invadido
CARACTERÍSTICAS DE ALGUNS TIPOS DA DOENÇA
Pulmão
Mama
Próstata
Pele comum
(não-melanoma)
Características
Mais comum dentre os
tumores malignos, o câncer
de pulmão é o que mais mata
no mundo: um em cada cinco
mortos por câncer tiveram a
doença no pulmão
Tipo de câncer mais comum
entre as mulheres no Brasil
e no mundo, depois de pele
não-melanoma
Câncer da terceira idade:
75% dos casos a partir dos
65 anos; no Brasil, é o
segundo mais comum entre
os homens (atrás de pele
não-melanoma)
Câncer mais frequente
no Brasil, corresponde
a 25% de todos os
tumores malignos
registrados no país
Fatores de risco
O consumo de derivados do
tabaco está na origem de
90% dos casos dese tipo de
tumor maligno
Fatores vão desde estímulo
do hormônio estrogênio,
obesidade e até a presença
de mutações em genes
transmitidos na família,
como BRCA1 e BRCA2
A idade é um fator de risco
importante. Já está comprovado que uma dieta rica em
frutas, verduras, legumes, e
com menos gordura, ajuda a
diminuir o risco desse câncer
Exposição aos raios
ultravioletas do sol. Esse
câncer é mais comum em
adultos, mas a média de
idade dos pacientes tem
diminuido recentemente
Tosse e o sangramento
pelas vias respiratórias;
nos fumantes, há crise
de tosse em horários
incomuns para o paciente
A principal manifestação
da doença é um nódulo
nas mamas, fixo e
geralmente indolor, em
cerca de 90% dos casos
Muitos pacientes não têm
sintoma ou, se apresentam,
são semelhantes aos do
crescimento da próstata
(como dificuldade de urinar)
Feridas na pele com cicatrização demorada (mais de
quatro semanas), manchas na
pele que coçam, ardem,
descamam ou sangram
Sintomas
Fonte: Inca
tástase no cérebro. Hoje, o
câncer de Carter está em processo de remissão.
O problema é que a evolução dessas drogas é bem mais
lenta que o aparecimento das
doenças em uma população
que está envelhecendo e, por
isso, tende a ter mais câncer.
A expectativa é que a aprovação de novos medicamentos ainda demore cerca de
cinco anos, diz Luciana Fanti, diretora médica de oncologia do laboratório MSD. Ela
participou na última quarta
(30) de uma mesa sobre imunoterapia durante o fórum O
Futuro do Combate ao Câncer, promovido pela Folha.
O desenvolvimento de remédios como o Yervoy pode
levar de dez a 15 anos e o custo fica de US$ 1 bilhão a US$
1,5 bilhão (R$ 3,7 bilhões a R$
5,5 bilhões), diz Miyake. A cada 10 mil moléculas testadas,
apenas uma vira um remédio
no mercado. Todo o resto fica
pelo caminho. “O acesso é o
maior desafio e o preço do medicamento, uma das variáveis
desse desafio”, diz Fanti.
Hoje, há uma espécie de
corrida atrás de novos tratamentos. “Toda empresa está
buscando a imunologia”, diz
Eurico Correia, diretor médico da Pfizer Brasil. “Faz muito mais sentido usar o sistema imune do que combatêlo.”A Novartis também anunciou que está investindo “significativamente” em imunooncologia, com foco em melanoma, hematologia, pulmão, mama e rins.
COMBINAÇÕES
A imunoterapia, no entanto, não deve enterrar a quimioterapia. Se hoje os tratamentos combinam químio e
rádio, o futuro deve casar
imunoterapia com uma das
duas. “Combinar terapias é o
que funciona melhor”, diz
Martin Bonamino, biomédico e pesquisador do Inca.
No futuro, acreditam cientistas, cada câncer será tratado pela mutação que o causou
e não pelo órgão no qual foi
localizado. Conhecer qual gene se alterou será mais importante do que saber se o problema está nos rins ou no fígado.
A matemática do câncer é
complexa. “Excesso de sol
causa câncer de pele, mas a
sua ausência causa deficiência de vitamina D, ligada ao
câncer de mama”, diz Dirce
Carraro, do A.C. Camargo.
ESTIMATIVA DE NOVOS CASOS, EM 2016
175.760
Pele comum
61.200
Próstata
57.960
Mama
34.280
Colorretal
28.220
Pulmão
20.520
Estômago
16.340
Colo do útero
Leucemia 10.070
Bexiga 9.670
Ovário 6.150
Pele melanoma 5.670
MORTES EM 2013
Pulmão
Colorretal
Mama
Estômago
Próstata
Leucemia
Colo do útero
Bexiga
Ovário
Pele comum
Pele melanoma
6.316
5.430
3.642
3.283
1.769
1.547
15.415
14.388
14.182
13.772
24.490
HHH
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
ONCO-1172032-0001
Sexta-Feira, 1° De abril De 2016
CIÊNCIA
VISIONÁRIA NA
IMUNO-ONCOLOGIA:
TRANSFORMANDO IDEIAS
EM RESULTADOS
A imuno-oncologia é uma das área
mais fascinantes da atual pesquisa
sobre o câncer.
Gursel Aktan, Médica, PhD
Vice-Presidente Adjunta,
Pesquisas Clínicas de Oncologia da MSD
CORP-1160902-0002
ab
DE UM
JEITO NOVO
A CADA DIA
Há 125 anos ajudando o mundo a ficar bem.
5
arquivo Pessoal
6
Sentir a morte iminente é assustador
semináriosfolha
A notícia de ter um carcinoma cai como uma bomba.
Sentir a morte iminente é assustador. Olhei para o céu é
pedi a Deus uma chance. A sensação de queda livre, em
um buraco negro sem fim, é o sentimento mais marcante
que já tive. Cirurgia, quimioterapia, radioterapia, ficar
careca, nada se compara à hora do diagnóstico. Hoje
digo com clareza que o câncer é mais uma doença que,
se não descoberta e tratada precocemente, pode não ter
um resultado bom. Continuo o tratamento e ainda tenho
oito anos pela frente para receber alta, mas não me sinto
doente. Vivo feliz e me sinto amada e linda.
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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Marilene Meneguzzo Schnornberger
Pato Branco (PR)
COMBATE AO CÂNCER
Entenda as diferenças entre a quimioterapia convencional e a terapia alvo-direcionada
atinge células
cancerígenas…
TIPOS DE TERAPIA-ALVO
TERAPIA-ALVO
Atua sobre molécula-alvo associada
ao crescimento do tumor
QUIMIOTERAPIA
Ataca células com alta taxa de divisão,
sejam malignas ou saudáveis
…e atinge também
células normais
células normais
são preservadas
bloqueia a proliferação
de células cancerígenas
Inibidores da angiogênese
O surgimento de novos vasos
sanguíneos (angiogênese)
na região do tumor garante
o seu crescimento. Inibidores
de angiogênese interferem,
assim, no crescimento do tumor
Ação citostática: bloqueia
Ação citotóxica:
mata células do tumor
a proliferação do tumor
Limitação: fortes efeitos colaterais, como
Limitação: células cancerígenas
podem se tornar resistentes às drogas
náuseas, perda de cabelo, anemia, fadiga
Fonte: National Cancer Institute (EUA)
NAÍLA BARBOSA DA COSTA
colaboração Para a FOLHA, DE bElo
HorIZoNTE
Rosalina Lopes, 64, já teve
de encarar três vezes um diagnóstico positivo de câncer: a
primeira em 2001, quando detectou tumor na mama, depois em 2005, com câncer no
mediastino (região torácica),
e em 2014, no cérebro.
Professora aposentada,
Rosalina passou por cirurgia
para retirada dos tumores,
além de sessões de químio e
radioterapia, que provocaram diversos efeitos colaterais como enjoos e queda de
cabelo. Ao mesmo tempo,
tentou uma nova técnica,
chamada terapia-alvo, para
controlar a doença.
A terapia-alvo age diretamente nas células malignas
e poupa as saudáveis, com resultados mais específicos e
efeitos colaterais menos drásticos que a quimioterapia. Ela
aponta o caminho para uma
medicina cada vez mais personalizada, que atenda às necessidades do paciente após
avaliação de como a doença
se desenvolve em cada corpo.
A técnica já existe há pelo
menos duas décadas, mas o
progresso nos últimos anos
faz dela uma boa aposta no
tratamentocontraocâncerem
seus mais diversos tipos. Medicamentos mais efetivos e
menos tóxicos compõem seu
arsenal terapêutico, atuando
diretamente na causa molecular do desenvolvimento e multiplicação do tumor.
“O câncer não é uma doença só, mas um conjunto de
doenças caracterizadas pela
proliferação celular desordenada. A quimioterapia foi desenvolvida para atacar de forma generalizada células em
fase de multiplicação, com o
objetivo de atingir o tumor,
ao passo que a proposta da
terapia-alvo é atuar em vias
celulares exclusivas do tipo
de câncer apresentado pelo
paciente”, afirma Roberto
Fonseca, oncologista e presidente do conselho superior
da SBC (Sociedade Brasileira
de Cancerologia).
No caso de Rosalina, ela
usa a droga-alvo Herceptin
(Transtuzumabe), específica
para pacientes com um tipo
de tumor de mama agressivo,
em que há alta expressão de
um gene promotor do crescimento celular, o HER2.
O medicamento usado pela professora é injetável, di-
DIRETO AO PONTO
Moduladores da expressão
gênica
Os tumores resultam da
expressão de um gene alterado
por mutação. O crescimento
desses tumores pode ser controlado ao bloquear proteínas
terapia-alvo age diretamente nas células cancerígenas e
preserva as saudáveis ao redor; apresenta menos
efeitos colaterais, mas tem custo elevado e tumor
muitas vezes desenvolve resistência
ferentemente de outras drogas-alvo, de administração
oral, e composto por anticorpos que bloqueiam o estímulo ao crescimento tumoral.
O presidente do conselho
superior da SBC enxerga a terapia-alvo como complementar à quimioterapia —ela é
usada isoladamente apenas
em alguns casos. “Não podemos informar à população
que a cura está no tratamen-
to-alvo, mas ele é hoje um
processo que pode ser associado aos tradicionais.”
A professora aprendeu a lidar com a doença e afirma
que, diferentemente da quimioterapia, que lhe causou
enjoos, ou da radioterapia
que, por ter sido na região da
cabeça, provocou queda de
cabelo, o tratamento-alvo é
tranquilo e ela não sente efeitos colaterais.
alexandre rezende/Folhapress
Rosalina Lopes enfrentou três tipos de câncer e hoje usa terapia-alvo
Marcos Portella, oncologista do Instituto Mário Penna, afirma que as drogas-alvo agem contra o tumor em
um sistema semelhante ao
modo como uma chave combina com sua fechadura. “O
medicamento-alvo é a chave
que reconhece como fechadura um receptor da célula
tumoral”, diz.
Apesar das vantagens, Portella afirma que é ilusório
pensar que as medicações-alvo não são tóxicas. Luiz Lodi, oncologista clínico da Oncomed BH, concorda. “Elas
apresentam outros tipos de
efeitos colaterais. Podem
ocorrer problemas na pele,
por exemplo, mas não os
mesmos efeitos da quimioterapia, como queda de cabelo, enjoos, anemia e demais
alterações no sangue.”
A terapia-alvo possui limitações. “Na maioria das vezes, infelizmente, a célula
cancerosa desenvolve resistência, e o tratamento deve
ser mudado, sendo associado à quimioterapia ou administrado mais de um tipo de
medicamento-alvo”, afirma
Fonseca, da SBC.
Além disso, as drogas têm
custo de desenvolvimento
elevado e esse valor se reflete no preço pago pelo paciente, já que nem sempre elas
são oferecidas pelo SUS ou
mesmo pelo sistema privado.
Portella alerta que o SUS enfrenta um conflito entre o individual e o coletivo.
Sendo os medicamentos
muito caros e restritos a um
grupo específico de pessoas
com a alteração genética usada como alvo, destinar recursos a eles, ainda que sejam
mais eficientes, nem sempre
é uma estratégia viável aos
sistemas de saúde.
Hormonioterapia
Alguns tumores crescem a
partir do estímulo de hormônios. A hormonioterapia impede
a produção ou atuação desses
hormônios e é usada no
tratamento de alguns tumores
Inibidores de sinais
celulares
Algumas células tumorais possuem receptor para fatores de
crescimento. Drogas que interferem nesse processo bloqueiam
o aumento do câncer
Indutores de morte celular
Células cancerosas possuem
estratégias para evitar um
processo do corpo para se livrar
de células defeituosas. Algumas
drogas contornam essas
estratégias e matam as células
Linfócito-alvo
Por meio da imunoterapia
é possível agir diretamente
no sistema de defesa e “desbloqueá-lo”para que ele combata
as células cancerígenas
ab
Sexta-Feira, 1° De abril De 2016
HHH
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
ONCOTYPEDX
éparaoseubem.
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Arquivo pessoal
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É um bicho comendo nossa carne
semináriosfolha
Tive câncer de mama aos 44 anos, quando me preparava
para conceber um filho, meu sonho. Saber que se está com
câncer é uma sentença de morte. Por menor que seja a
lesão, está lá, como um bicho comendo a nossa carne. Meu
prognóstico era razoável, oito químios e 30 radioterapias.
Tinha um cabelo lindo, que caiu 15 dias depois da primeira
sessão. Eu tinha um envelope no trabalho para colocar
dentro dele as madeixas que caíam. Vai fazer nove anos
que operei. O câncer não tem cura. Ilude-se quem acredita
que tem. Pode voltar a qualquer momento e isso nos torna
reféns de uma esperança de que pelo menos adormeça.
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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MAyte M.GArciA
São Paulo
promessa GenÉTica
O MÉTODO CRISPR
Técnica pode revolucionar o uso terapêutico
da engenharia genética
Vírus
DNA do vírus
invasor
Técnica de manipulação dos genes é visTa como promissora pa-
Nos últimos anos, a sigla
inglesa CRISPR (pronunciase “crísper”) se transformou
na grande vedete das principais publicações científicas
do planeta. O termo designa
um tipo de manipulação genética simples de fazer e relativamente preciso, com potencial para tratar vários tipos de doenças —inclusive o
câncer, que invariavelmente
surge a partir de mutações no
genoma. Será que a CRISPR
pode mesmo “desarmar” o
DNA dos tumores?
É cedo para dizer, embora
as coisas nessa área caminhem numa velocidade acima da média do que se vê na
pesquisa básica.
No curto prazo, a tecnologia vai ser útil para entender
detalhes da transformação de
uma célula normal numa “vilã” tumoral e tentar achar
possíveis calcanhares de
aquiles do câncer. Mais desafiadora é a tarefa de transformá-la em arma terapêutica
capaz de atacar tumores mais
comuns, que muitas vezes
surgem a partir de uma miríade de alterações no DNA,
nada fáceis de rastrear.
“É inegável que existe muito ‘hype’ em relação à
CRISPR, em grande parte porque se trata de uma técnica
de edição do genoma muito
mais fácil de ser aplicada em
qualquer laboratório do que
as demais”, diz o bioquímico
Guilherme Baldo, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que tenta aplicar a
tecnologia ao tratamento de
doenças genéticas raras.
Esse sistema de edição de
DNA envolve três componentes (veja quadro). O primeiro
é uma espécie de tesoura molecular, cuja especialidade é
cortar DNA. O segundo é um
pequeno trecho de RNA (molécula “prima” do DNA) que
serve como guia: ele identifica uma sequência similar de
“letras” químicas no genoma
que se deseja editar.
Finalmente, pode-se inserir a sequência “certa” de
DNA, suficiente para corrigir
um problema genético. Se der
certo, o RNA ajuda a “tesoura” a picotar a mutação indesejável, enquanto a própria
câncer ao aposTar no ‘desarme’ do
dna de Tumores; ainda são necessários ajusTes para eviTar efeiTos indesejados e aumenTar eficácia nos
casos mais comuns da doença
célula se encarrega de substituí-la com o DNA correto.
Embora a técnica seja muito mais precisa que os métodos tradicionais de manipulação do genoma, não dá para descartar os efeitos “off target”, ou seja, quando o pesquisador mira a região X do
genoma mas altera também
a região Y, o que pode ser péssimo para a saúde do corpo
cujo DNA está sendo editado.
Isso acontece porque o
RNA que serve de guia é curto, o que significa que a mesma sequência de “letras” pode estar presente em mais de
uma área do genoma (o qual
tem cerca de 3 bilhões de letras no caso do ser humano).
Pequenas modificações na
tesoura molecular poderiam
minimizar esse risco. “Outra
possibilidade é usar softwares de análise do genoma
que vão predizer a chance de
pegar uma região errada por
engano. A partir daí, você pode refinar o seu RNA-guia para evitar isso”, explica Baldo.
Uma primeira aplicação da
técnica, na qual não seria necessário nem usar o DNA
“corretor”, é o desligamento
sistemático de diversos genes
para entender o papel deles,
separados ou em conjunto,
na gênese dos tumores. Só isso já traria avanço para o estudo da biologia do câncer
porque, antes do advento da
CRISPR, alterações genéticas
equivalentes eram muito caras e trabalhosas de obter.
polÊmica principal
As primeiras aplicações terapêuticas da tecnologia talvez aconteçam no caso de tumores mais raros, causados
por mutações em um único
gene que são transmitidas de
pai para filho.
“No caso dessas síndromes
de causa bem conhecida, você poderia corrigir diretamente aquele gene”, explica Martin Roffe, bioquímico argentino que trabalha no hospital
A.C. Camargo, em São Paulo.
“Outra possibilidade é que
casais portadores dessas síndromes modifiquem seus embriões para que seus filhos
não herdem o problema.” Essa, aliás, é uma das principais
polêmicas em torno do uso
da CRISPR em humanos.
A questão, porém, é que a
maioria dos cânceres surge a
partir de uma grande variedade de mutações, as quais
não costumam ser passadas
de pai para filho.
“Nesse caso, vai ser importante unir a técnica aos avanços da genômica de alto desempenho e da medicina personalizada, porque o ideal será saber o perfil genético completo de cada paciente”, diz
o pesquisador argentino.
Antes disso, porém, também é necessário achar
maneiras mais eficazes de
“entregar” o CRISPR às células tumorais.
Uma abordagem comum é
usar vírus como carregador,
mas a desvantagem é que ele
não consegue transportar
muitos genes ao mesmo tempo, além de poder causar
alterações indesejáveis no
DNA do paciente.
Já métodos não virais poderiam modificar uma grande quantidade de genes ao
mesmo tempo, o que é ideal
para o caso de câncer, mas é
mais difícil fazer com que
“entreguem” a CRISPR ao tumor como um todo.
Defesa de bactéria
O método CRISPR se baseia numa das defesas de certas
bactérias contra vírus invasores. Ao entrar nas células
bacterianas, esses vírus injetam seu DNA lá dentro
RNA da
bactéria
Produção de RNA
A bactéria, porém, reage produzindo trechos específicos de
RNA (molécula “prima” do DNA), um dos quais possui uma
sequência de “letras” químicas capaz de se encaixar com
precisão no DNA viral
Proteína
Cas9
Corte no DNA
O RNA, então, une-se à proteína Cas9, uma molécula
especializada na tarefa de cortar DNA. Juntas, elas se
dirigem ao DNA do vírus e o cortam, derrotando o invasor
la
âncer
mc
co
Trecho
do gene
corrigido
Cé
lu
REINALDO JOSÉ LOPES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
dida
inva
ria
cté
Ba
ra TraTamenTo de Tipos raros de
ciência só saberá como usar os resuLTaDos
Do mapeamenTo Do Dna Daqui a 30 anos
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O mapeamento genético
pode detectar alterações nos
genes relacionadas a algum
tipo de câncer que ainda não
se manifestou, mas a medicina ainda não sabe o que fazer com essa informação.
Atualmente, não há como
atuar para neutralizar essas
alterações. “Talvez daqui a 30
anos saibamos”, disse Mar-
co Antonio Zago, reitor da
USP e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto, durante o seminário O
Futuro do Combate ao Câncer, realizado pela Folha nos
dias 29 e 30 de março.
Embora ainda não consiga
garantir se a pessoa desenvolverá ou não a doença, a pesquisa genética tem servido
para importantes avanços.
“A identificação da altera-
ção genética ligada à leucemia mieloide crônica possibilitou a criação da terapiaalvo para a doença”, exemplificou Nelson Hamerschlak,
hematologista do hospital Albert Einstein, durante a mesa que debateu os novos
meios de prevenção e detecção, realizada na terça (29),
primeiro dia do seminário.
Para uso individual, entretanto, o mapa genético está
longe de ser algo definitivo.
“Genética não é destino.
Há uma área que estuda como estilo de vida e hábitos como a meditação podem causar alterações químicas no
DNA, modificando a carga genética”, disse José Claudio
Casali da Rocha, criador do
primeiro serviço de aconselhamento genético para pacientes de câncer do hospital
A.C. Camargo. (iArA biderMAn)
Inserir DNA
Essa técnica pode ser usada para substituir um gene
indesejado pela versão “correta”. Pode-se inserir esse
trecho de DNA junto com o RNA e a Cas9. O sistema natural
de reconstrução do DNA da célula vai incorporar a versão
“corrigida” do gene a ela
Fonte: National Cancer Institute (EUA)
Tinha apenas 31 anos quando fui diagnosticada com câncer de
mama. Fiz a quadrantectomia, que remove o câncer mas deixa
a maior parte da mama. Depois, com as sessões de químio e
rádio, fiquei careca, inchada e engordei 14 Kg. Um ano depois,
nova surpresa. Descobri que estava grávida. Os médicos me
aconselharam a interromper a gestação, porque representava
risco para a minha saúde e para o bebê. Insisti, e a gravidez
correu bem, mas levou apenas um ano para que eu descobrisse
que a doença tinha voltado. Tive que retirar toda a mama. Foi
muito mais difícil porque fiquei com o braço imobilizado, não
podia pegar meu filho no colo e ele me rejeitou.
Ricardo Borges/Folhapress
Não podia pegar meu filho no colo
9
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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┆┆┆
ELiAnE CAnEgAL, 43
Rio de Janeiro
escola é omissa
na prevenção
RELAÇÃO ENTRE A dOENÇA E O TAbAgismO Ou A ALimENTAÇÃO dECOLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A relação entre alimentação, hábitos e doenças como
o câncer deveria estar nos livros didáticos, mas ainda segue longe da escola.
A observação é do oncologista e diretor científico do
Instituto Oncoguia, Rafael
Kaliks. “Aprender a fazer escolhas certas para preservar
a saúde me parece mais importante do que ser bom em
matemática”, diz. Kaliks participou da mesa sobre “Novidades em tratamento” no fórum promovido pela Folha.
Entre as “escolhas” mencionadas por Kaliks estão,
por exemplo, o cigarro e a alimentação.
VERiA sER ExpLicAdA TAmbÉm NA sALA dE AuLA, dEfENdEm mÉdicOs
Estima-se que o fumo esteja ligado à incidência de 30%
dos casos de câncer. A obesidade também é considerada
fator de risco.
Hoje, temas ligados à saúde aparecem na escola em
disciplinas como a biologia.
O problema, afirma Luis
Felipe Ribeiro Pinto, coordenador de ensino do Inca (Instituto Nacional do Câncer), é
que o ensino de biologia —ou
“ciências naturais”— segue
com foco em outras doenças,
caso das parasitárias.
“Isso é importante, claro,
mas precisamos ensinar que
existeumarelaçãoentreoshábitoseoaparecimentodeuma
doença —o câncer— que vai
atingir mais meio milhão de
brasileiros até 2017”, afirma .
MarcoAntonioZago,hematologista e reitor da USP, que
também participou do fórum,
concorda. “Há vacinas que
podem prevenir a doença [caso do câncer de colo de útero
causado pelo vírus HPV]. Precisamos falar disso na escola”, diz. (SAbinE RigHEtti)
paÍs ensina ‘oncoloGia’
em DeZ GraDuações; na
pós, há só seis cursos
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Dá para contar nos dedos:
o Brasil tem seis programas
de pós-graduação acadêmicos especificamente em oncologia. Só um deles funciona fora do Sudeste, no Pará.
Na graduação, a situação
também preocupa. De acordo com Ademar Lopes, cirurgião oncológico e vice-presidente do hospital A.C.Camargo, cerca de “dez faculdades
de medicina têm oncologia
como disciplina obrigatória.”
O problema é que o primeiro diagnóstico de câncer, em
geral, é feito por um médico
que não é oncologista. São
gastros, neuros, pediatras.
“Já peguei paciente com
sangramento que foi diagnosticado com hemorroida, mas
tinha um tumor colorretal”,
diz Fernanda Capareli, do
hospital Sírio Libanês.
Ambos participaram do fórum da Folha sobre o futuro
do combate ao câncer.
Na pós, o número de programas acadêmicos em onco-
logia —que formam mestres
e doutores— representa menos de 1% do total do país.
“Não estamos formando
gente suficiente para pesquisar câncer”, diz Luis Felipe
Ribeiro Pinto, coordenador de
ensino do Inca (Instituto Nacional do Câncer)—uma das
instituições que têm a pós.
A USP de São Paulo e de Ribeirão Preto, a UFPA (Universidade Federal do Pará) e os
hospitais A.C. Camargo e de
Barretos também têm pós
acadêmica em oncologia.
Para Carlos Cezar Fritscher, coordenador-adjunto de
uma das áreas de medicina
da Capes, órgão que regula a
pós no país, o número de cursos em oncologia é pequeno
porque os programas tendem
a ser mais genéricos.
É possível estudar câncer
em uma pós genérica em medicina, por exemplo.
Há, no entanto, outros programas bem específicos mais
numerosos do que em oncologia. Caso de biologia molecular (30 programas). (SR)
Arquivo pessoal
10
Confiar na equipe médica ajudou
semináriosfolha
Derrotar o câncer não é uma vitória, são muitas. É preciso
vencer medos, angústias, incertezas, dores e dificuldades
para realizar tarefas que deixaram de ser automáticas
por causa dos efeitos da químio. O que tornou tudo isso
mais fácil foi parar de perguntar ‘por que comigo?’ e
questionar ‘por que não comigo?’. Passei a acreditar que
seria capaz de vencer essa, que ainda tenho muito a fazer.
Confiar na equipe médica e deixar para eles preocupações
que não eram minhas também ajudou. Agradeço pela
nova chance, para aproveitar a companhia das pessoas que
amo e ver meus filhos crescerem e se tornarem adultos.
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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Carolina Bessa
Lorena (SP)
A CADA OITO MORTES NO MUNDO, UMA É CAUSADA POR CÂNCER
25%
O câncer de mama
é o mais incidente
em mulheres
brasileiras*
dos casos de
câncer no Brasil
são de pele
90%
dos casos de
câncer de pulmão
são causados
por cigarro
DE FORA PARA DENTRO
Câncer de colo
de útero é o
que tem mais
chance de
prevenção e cura
População
do Brasil
206
milhões de
habitantes
nem genética nem acaso: um estudo americano aponta que estilo de vida e
Fatores amBientais, como polui-
1/3 dos casos de câncer podem ser evitados
COMO EVITAR O CÂNCER
ção, podem ser responsáveis por
300.800
mulheres
90% de todos os tipos de câncer
DÉBORA MACHADO ANDRADE
COLABORAÇÃO PARA A FolHa, DE OXFORD
Estudo publicado na revista científica “Nature” colocou
lenha na fogueira do debate
sobre as causas do câncer ao
concluir que até 90% de todos os tumores têm sua origem em fatores externos, ou
seja, não são produto de um
DNA desfavorável ou simplesmente do azar.
“É importante que a população saiba disso”, disse à Folha Song Wu, professor da
Universidade de Stony Brook,
nos Estados Unidos, um dos
líderes do estudo.
Segundo ele, como a pesquisa mostra a força dos fatores externos para o aumento do risco, mais esforços devem ser empenhados na prevenção da doença, e não apenas na cura.
Na avaliação desse pesquisador, a população deve pressionar os governos para que
protejam o meio ambiente do
excesso de poluentes e produtos químicos.
estatística x azar
O paradigma até então
mais aceito pelos cientistas
era que a causa da maior parte dos cânceres era, literalmente, azar. Quanto mais ve-
lhos ficamos, mais vezes nossas células se dividem, e cada uma dessas divisões tem
uma pequena probabilidade
de apresentar mutações.
O câncer é uma consequência dessas mutações e, por isso, o risco de sua ocorrência
aumenta com a idade.
Mas o estudo liderado por
Song Wu concluiu que isso é
apenas uma pequena parte
da história. Se a aleatoriedade sempre respondesse pelo
aparecimento de tumores,
células que ao longo da vida
acumulam o mesmo número de divisões teriam probabilidade semelhante de originar um câncer, independentemente do órgão que
formassem (e, consequentemente, a que substâncias
fossem expostas).
Mas a análise estatística
feita pelo grupo norte-americano mostrou o contrário.
Além disso, o pesquisador
observa, é notável a diferença de incidência de diversos
tipos de câncer em diferentes
regiões do planeta.
Dados populacionais mostram que ao mudar de país, a
incidência de um determinado tumor na população migrante muda rapidamente,
refletindo, assim, o novo estilo de vida adotado.
Imagens reprodução
Mantenha-se
longe do
cigarro
Coma de modo
saudável com
variedade de
frutas e verduras
Proteja a pele da
exposição
prolongada ao sol
Faça atividade física
regularmente
Faça testes
regularmente
Limite a
quantidade de
álcool ingerida
Conheça seu
histórico familiar
EXAMES QUE DEVEM SER
FEITOS ANUALMENTE
Mulheres
Homens
• Mamografia a partir
• Sangue especifico para
dos 40 anos
câncer de próstata (PSA)
a partir dos 50 anos
• Papanicolau entre 25
e 59 anos
• Toque retal a partir
dos 50 anos
• Exame de fezes para identificar sangue oculto
a partir dos 50 anos
90%
é a chance de
sucesso no tratamento se o câncer for
descoberto no início
*Excluindo-se o câncer de pele comum (não melanoma), que tem alta curabilidade
e, por isso, costuma ficar de fora das estatísticas de incidência e mortes por câncer
295.200
homens
Por outro lado, os fatores
de risco conhecidos até hoje,
quando considerados de forma isolada, só respondem
por um terço de todos os tipos da doença.
“Pode ser que haja fatores
de risco que ainda não conhecemos. Há exemplos disso: o
câncer de estômago, que está bastante associado à infecção pela bactéria H. pylore.
Há pouco mais de 30 anos,
essa bactéria não tinha nem
sido identificada”, afirma Jane Green, que é professora da
Universidade de Oxford, no
Reino Unido.
O problema que os cientistas têm em quantificar os
fatores de risco é a dificuldade em isolá-los. O cigarro
é uma exceção. Por ser tão
extraordinariamente danoso para a saúde, seus efeitos são bem óbvios em todos
os estudos.
“Fumar apenas cinco cigarros por dia já dobra sua
chance de morrer nos próximos 15 anos”, afirma Valerie
Beral, professora da Universidade de Oxford.
Além do câncer de pulmão,
o tabagismo aumenta as
chances de desenvolver pelo
menos 14 tipos diferentes da
doença, como o de estômago, garganta, bexiga e rim.
*Excluindo-se o câncer de pele comum (não melanoma), que tem alta curabilidade
e, por isso, costuma ficar de fora das estatísticas de incidência e mortes por câncer
A LUTA CONTRA O CÂNCER NO BRASIL
1900 O médico Arnaldo
Vieira de Carvalho, da
Santa Casa de São Paulo,
consegue a extirpação
total de um estômago
atacado por câncer. Teria
sido a quinta cirurgia
desse tipo no mundo
Novos casos de câncer
596 mil (até 2017)
1904 Azevedo Sodré
publica “Frequência do
Câncer no Brasil”,
considerado o primeiro
trabalho acadêmico
científico feito sobre a
doença no país
1933 Após estudos na
Europa, o médico Antonio
Prudente publica uma
série de artigos sobre o
câncer. Defende que a
doença “é uma moléstia
de perfeita curabilidade,
quando tratada a tempo"
1910 O médico paulista
Olympio Portugal publica
no periódico “O Brasil
Médico” um novo estudo
que refuta as conclusões
de Sodré. Ele acreditava
que a doença era
transmissível
1934 Fundada a Associação Paulista de Combate
ao Câncer, organização
que daria base ao
Hospital do Câncer
1938 Inauguração do Centro de
Cancerologia,
embrião do Inca
1941 Criado o Serviço
Nacional de Câncer,
primeiro órgão público
especializado em
políticas sobre a doença
1946 Jornalista
Jornalista
Carmen Prudente cria
a Rede Feminina de
Combate ao Câncer,
voltada à mobilização
e ao
recolhimento
recolhimento
de
de
doações
doações
Em julho de 2014, quando tinha 25 anos, descobri um
tumor no intestino. Consultei especialistas, fiz cirurgia e
descobri indício de metástase hepática. Fiz 12 sessões de
quimioterapia. Desde então, há quase um ano, realizo as
revisões periódicas, que só apontam resultados positivos,
com remissão total da doença. Não parei de trabalhar, sair,
viajar e fazer projetos durante o tratamento. Encarei todo o
câncer como uma imensa oportunidade de aprendizado e
com enorme tranquilidade. Hoje encaro a vida com muito
mais leveza e com a certeza de que sou um privilegiado,
que vive o agora e que tem uma história bonita pra contar.
Arquivo pessoal
Sou privilegiado, vivo o agora
11
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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Murilo Chaves, 27
Goiânia
Bruno Santos/Folhapress
FERNANDA ATHAS
DE SÃO PAULO
Jarbas Barbosa (Anvisa), Sérgio Queiroz (Unicamp), o consultor de pesquisa Eduardo Motti e a mediadora Sabine Righetti no fórum em São Paulo
a BUROCRaCIa E a VIDa
a lentidão do GoVeRno na apRoVação de peSQUiSaS ClÍniCaS É UM doS FatoReS
QUe pReJUdiCaM o deSenVolViMento de noVoS MediCaMentoS paRa tRataMento
do CÂnCeR, SeGUndo a QUeiXa doS eSpeCialiStaS
cisa ser descentralizada.
“Há no Brasil a ideia de que
a ética é apenas preservada
pela atuação da comissão. Os
pesquisadores, alunos e professores não são éticos?”,
questiona Antonio Brito, presidente da Interfarma (associação da indústria farmacêutica em pesquisa).
Barbosa, da Anvisa, fez coro à ideia no fórum da Folha.
“A articulação com a universidade ainda não ocorre
como deveria. Se não descentralizarmos o processo de
avaliação ética, sempre teremos essa barreira”, diz.
Todo esse imbróglio pode
03.out.1988 - Lula Marques/Folhapress
As pesquisas clínicas para
novos medicamentos no Brasil são raras porque há muita burocracia e lentidão dos
órgãos federais para aproválas ou porque os pedidos de
autorização desses estudos
têm falhas? A resposta vai depender do interlocutor.
Para pesquisadores como
Fábio Franke, coordenador
do Centro de Alta Complexidade em Oncologia do Hospital de Caridade de Ijuí (RS),
o problema é a lentidão.
O tempo de aprovação dos
protocolos, de até 18 meses,
prejudica pacientes.“As pessoas vão para o exterior participar de pesquisas que podemos fazer aqui”, diz.
Em Ijuí, ele conduz pesquisas clínicas até com imunoterápicos —fronteira atual da
medicina contra o câncer.
No seminário da Folha,
contou que acabou de participar de testes de imunoterapia para câncer de pulmão.
“Já perdi pesquisas por
lentidão da burocracia local.”
Já Jarbas Barbosa, diretorpresidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que também participou do seminário da Folha,
diz que o problema, na verdade, está na outra ponta.
Barbosa afirma que o país
poderia ter um número maior
de pesquisas se os pedidos
não chegassem com falhas.
“Isso faz com que projetos
tramitem ao menos duas vezes pelo mesmo órgão.”
Atualmente, a aprovação
dos testes clínicos no Brasil é
feita em três fases.
Primeiro, em um Comitê de
Ética em Pesquisa local, depois pela Conep (Comissão
Nacional de Ética em Pesquisa) e pela Anvisa, que verifica a qualidade técnica do protocolo da pesquisa.
Um dos grandes gargalos,
diz Marcos Moreira, diretor
de assuntos regulatórios para a América Latina da farmacêutica MSD, está na imprevisibilidade das respostas.
“Apesar de a Anvisa ser
uma agência reconhecida por
seu rigor técnico, uma resposta pode demorar 90 dias ou
dois anos”, afirma.
Em países que avaliam testes em uma única fase, como
EUA e Coreia do Sul, os estudos são aprovados, em média, em quatro meses. No Brasil, leva um ano, em média.
Cientistas defendem que a
aprovação ética, que garante
os direitos dos pacientes voluntários, deva permanecer
rígida no país, mas que pre-
1953 Antônio Prudente e a
mulher, Carmen Prudente,
fundam o Hospital do Câncer,
hoje A.C.Camargo Cancer
Center, em homenagem ao
médico Antonio Cândido de
Camargo, pioneiro na luta
contra a doença
1984 Primeiro
transplante de medula
óssea realizado no
Brasil, no Inca, RJ
1988 Constituição
reconhece ao Inca
responsabilidade sobre
políticas de câncer
mudar. Há um projeto de lei
em tramitação no Senado, o
PL 200/2015, com a proposta
de descentralizar e reduzir o
tempo o processo de aprovação e das pesquisas clínicas.
A proposta passou por comissões na casa, mas aguarda novas apreciações.
“A fosfo foi aprovada rapidamente [no Senado] por
causa do clamor popular”,
diz Franke. “Precisamos de
apoio da sociedade para que
mais pacientes tenham acesso a pesquisas clínicas.”
Colaboraram ANDREA VIALLI, JULIO
LAMAS e SABINE RIGHETTI
1996 Lei federal proíbe
o fumo em recintos
coletivos e limita a
propaganda de cigarros,
de bebidas e de remédios
1999 Início do Projeto
Genoma Humano do Câncer,
renomado internacionalmente
2005 Inaugurado o
primeiro Banco Nacional de
Tumores e DNA do Brasil;
Ministério da Saúde
reconhece o câncer como
problema de saúde pública
arquivo pessoal
12
Horror começa no dia seguinte à químio
semináriosfolha
Sou uma sobrevivente. Fiz uma cirurgia de vesícula e, quando
acabou o tratamento, o médico me disse: ‘Volte para a sua
vida e vá ser feliz’. Seis meses depois, recebi o diagnóstico
do câncer. Na primeira sessão de químio, meu filho foi junto.
Eu estava apavorada, vi minha irmã falecer por causa de
um câncer. Sai da sessão e não aconteceu nada. O horror
começou no dia seguinte. Comecei ver que não precisava de
ninguém na químio e sim nos dias posteriores. Ia de ônibus,
de táxi. Eu sobrevivi ao câncer mas penei muito. Senti dor,
medo, estou com cicatrizes, mas eu encaro e vou. Já tive altos
e baixos, mas o gosto pela vida não perdi.
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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sOLAnge brAun
Florianópolis (SC)
DÉBORA MACHADO ANDRADE
Colaboração Para a FOLHA, de oxford
A existência de uma pílula
milagrosa, capaz de curar todos os tipos de câncer, é vista com muita desconfiança
pela comunidade científica
internacional. A razão é que
existem quase 200 tipos de
câncer, cada um com diferentes mecanismos.
É por isso que existe tanto
ceticismo com relação à “fosfo”, como é conhecida a “pílula do câncer” desenvolvida
por pesquisadores da USP de
São Carlos, interior de SP.
“Se essa droga supostamente funciona em todos os
cânceres, como cientista eu
diria: pode me explicar como?”, diz Steve Jackson, professor da Universidade de
Cambridge, no Reino Unido.
Ele é inventor da droga anticâncer olaparibe (comercializada em 15 países sob o nome LynparzaTM e que aguarda aprovação no Brasil).
“A triste verdade é que é
improvável que [a fosfoetanolamina] seja milagrosa”,
escreveram os editores da revista científica “Nature”.
Fato: os primeiros testes de
caracterização e síntese da
“pílula do câncer”, divulgados no dia 21 de março, mostram baixo grau de pureza e
pouco ou nenhum efeito sobre células tumorais. Os resultados foram divulgados
pelo Ministério da Ciência e
Tecnologia.
A Câmara dos Deputados
e o Senado já aprovaram um
projeto de lei que permite que
todos os pacientes de câncer
tenham acesso à substância.
A droga ainda passará por
estudos clínicos conduzidos
com a participação do Icesp
(Instituto de Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias
de Oliveira). “Espero ter algumas respostas nos próximos
seis meses”, diz Paulo Hoff,
diretor do instituto.
Mesmo antes da aprovação, alguns médicos prescreviam a “fosfo” informalmente em várias partes do Brasil.
A educadora infantil Débora Freitas, de Uberlândia
(MG), conta que foi a médica
de seu pai que a encorajou a
buscar a droga, usada por ele
nas últimas semanas de sua
luta contra o câncer.
“A médica falava que se
prescrevesse a fosfo numa receita, corria o risco de perder
o registro profissional. Mas
que, se a gente tivesse condição de ir atrás da pílula, que
era para ir.” Débora conseguiu as cápsulas com um vendedor que, segundo ela, foi
preso em dezembro.
O Canadá também vive o
fenômeno de uma “pílula do
câncer”. Chama-se dicloroacetato de sódio (DCA) e surgiu a partir de pesquisa na
Universidade de Alberta.
O DCA é usado há anos para tratar doenças metabólicas
raras. A equipe canadense
descobriu, em 2007, que ele
teria potencial antitumoral
em vasta gama de cânceres.
O oncologista Akbar Khan,
de Toronto, disse à Folha que
um de seus pacientes, com
câncer em estágio avançado,
propôs o DCA como alternativa. Khan revisou o estudo
do grupo de Alberta e decidiu
dar a droga a seus pacientes.
Após processo judicial, ficou definido que médicos poderiam prescrever o DCA desde que o doente tivesse esgotado as possibilidades de terapia convencional. “Houve
melhora em dois terços dos
pacientes”, diz Khan.
A adoção de droga ainda
a PÍLULa Da POLÊMICa
Cientistas são CétiCos em relação a um mediCamento Capaz
de Curar todos os tipos de CânCer;
testada clinicamente por pacientes que esgotaram outras
possibilidades é chamada de
uso compassivo.
“A Anvisa e o Ministério da
Saúde deveriam facilitar o
acesso ao uso compassivo de
produtos que já têm algum tipo de embasamento clínico”,
diz Hoff, diretor do Icesp.
Embora ressalte que a legislação brasileira está “exageradamente burocrática”, ele
ressalva que não se pode enquadrar a “fosfo” no uso compassivo por ela não ter embasamento clínico provado.
Hoff lembra, também, que
nos EUA cerca de 85% dos pacientes oncológicos fazem
uso de algum tipo de terapia
alternativa por conta própria.
“É uma realidade do mundo inteiro. É preciso que o médico tenha uma cabeça aberta para discutir isso”, diz.
No Canadá, segundo Khan,
muitos médicos além dele
prescrevem o DCA. Preferem
não assumi-lo publicamente
por medo de processos judiciais e julgamento de colegas.
“O juramento de Hipócrates, ‘acima de tudo, não causar mal’, foi substituído por
‘acima de tudo, não ser processado’”, afirma Martin Winer, jornalista de Toronto e
ativista do uso compassivo.
Ele organiza uma petição
pedindo a desburocratização
do uso do DCA, que conta
com milhares de assinaturas.
Para os doentes, a chance
de sucesso de uma droga experimental, mesmo pequena,
representa uma esperança.
O ex-motorista de caminhão João Vianei Lopes, de
Biguaçu, no interior catarinense, fundador da Associação dos Amigos e Pacientes
de Câncer de Santa Catarina,
desabafa: “Queremos ter
acesso à esperança, paciente
de câncer vive de esperança”.
Vianei, diagnosticado há
seis anos com linfoma nãoHodgkin, organiza petição
com milhares de assinaturas
pela liberação da “fosfo”.
O debate sobre o uso compassivo não é trivial. Para
Adrian Harris, professor da
Universidade de Oxford, há
mais danos que benefícios.
“Mesmo que você já tenha
tentado cinco quimioterapias
diferentes, ainda terá uma
chance maior com uma droga que está no mercado e já
se mostrou eficaz do que com
uma que não foi testada.
Apoio que todos tenham
acesso a drogas aprovadas.”
Jackson, de Cambridge,
discorda: “Se você é paciente de câncer e só tem alguns
meses de vida, a situação é
diferente. Eu jamais poderia
dizer a essas pessoas se elas
devem ou não tentar algo”.
Pesquisadores ouvidos são
unânimes em defender mais
apoio para estudos clínicos
capazes de acelerar a pesquisa do câncer. “Tentamos colocar o paciente em estudos
clínicos o mais cedo possível”, diz Harris.
No Reino Unido, 10% dos
pacientes com câncer participam de algum estudo clínico. Nos EUA, a meta é ter 5%
dos pacientes. O Brasil tem
cerca de 1%, lamenta Hoff.
mas há Quem defenda drogas ainda não testadas para o uso de doentes Que esgotaram as possibilidades da mediCina ConvenCional
O que nós
queremos
é ter acesso
à esperança,
o paciente de
câncer vive
de esperança
JOãO ViAnei LOpes, que LutA peLA
LiberAçãO dA FOsFOetAnOLAminA
Caio Cezar/folhapress
João Vianei Lopes, diagnosticado com linfoma não-Hodgkin, na igreja de Biguaçu, em Santa Catarina
MOvIMentO a favOr Da nOva
DrOga Chega a COLOCar MéDICOs
e PaCIentes COMO aDversárIOs
de são Paulo
Ativistas pró-fosfoetanolamina alimentam a versão
de que médicos e imprensa
têm uma conspiração com a
indústria farmacêutica para barrar a droga, afirmou
Helano Freitas, coordenador de pesquisa clínica do
A.C. Camargo.
A afirmação do médico foi
feita no fórum O Futuro do
Combate ao Câncer, realizado nos dias 29 e 30, no Tucarena, em São Paulo.
Freitas rechaçou a teoria
conspiratória na mesa do fórum dedicada à pílula, da
qual participaram também
Gilberto Lopes, diretor-científico do Grupo Oncoclínicas
e professor associado da Faculdade Johns Hopkins, nos
EUA, e Mauricio Tuffani, editor-chefe da revista “Scientific American Brasil” e blogueiro da Folha.
Ainda de acordo com
Freitas, essa visão chega a
opor pacientes e médicos.
“Parece que viramos adversários. Eu quero ter certe-
za sobre o que estou dando
ao paciente”, disse ele.
Freitas lembrou que a melhora propagada não é corroborada pelos exames. “E
eles dizem que nós é que não
estamos enxergando.”
Já o oncologista Gilberto
Lopes criticou o Congresso,
classificando a aprovação da
pílula como medida “populista”. “É mais fácil aprovar
logo a droga que acelerar o
processo de pesquisa.”
O oncologista sugeriu que
se mudasse o foco da mobilização popular. Em vez de defenderaliberaçãodeumadroga não testada, disse Lopes, é
melhor canalizar a energia para cobrar mais rapidez do sistema público de saúde em
diagnosticar e tratar câncer e
em incorporar novas drogas.
Tuffani afirmou ser papel
da imprensa fazer a mediação entre a ciência e a parcela da sociedade favorável a
liberar as pílulas, sendo cética com ambos os lados.
Ojornalistaacrescentouque
issotambémépapeldosrepresentantes no Congresso, que
“não está lá só para representar o povo, mas também para
mediar. Essa é a diferença entre democracia e demagogia.”
Ele lembra também que,
antes de tudo, o Poder Judiciário interferiu de forma indevida ao forçar a USP a distribuir
a droga, atividade que, segundo ele, não devia ser responsabilidade da universidade.
suplemento
Na terça-feira (30), o Ministério da Ciência e Tecnologia divulgou que irá sugerir ao Congresso e à Anvisa
(Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a liberação
da fosfoetanolamina como
suplemento alimentar.
O projeto permitiria a produção e distribuição da pílula em farmácias sem o status
de medicamento e antes do
término das pesquisas préclínicas, em animais, e clínicas, em humanos.
Segundo o ministério, a
decisão se baseia nos primeiros estudos, que mostram
que a substância não é tóxica aos seres humanos.
de são paulo
Há 13 anos, a esteticista Rosângela Bittencourt, 53, recebeu um diagnóstico que lhe
tirou o chão: tinha um tumor
de mama e precisaria se submeter à retirada dos seios.
Após dois anos e muitas reuniões da equipe médica, nada de a cirurgia ser marcada.
Rosângela se aproximou
das práticas da medicina tradicional chinesa, adotou alimentação saudável e exercícios, reduziu o ritmo de trabalho. “Entendi que, se meu
corpo desenvolveu o tumor,
ele poderia se livrar dele.”
Foi quando tomou uma atitude radical: à revelia dos médicos, decidiu não fazer o tratamento proposto —cirurgia
e hormonoterapia, bloqueio
de hormônios que estimulam
o crescimento tumoral. “Diziam que eu era maluca.”
Ela afirma que a última mamografia, há três anos, já não
apontava sinais de câncer.
Grande parte dos oncologistas considera a atitude de
Rosângela, no mínimo, imprudente. Mas ela encontra
respaldo em estudos segundo os quais para certos perfis
de tumor e de pacientes o melhor tratamento pode ser não
fazer nada.
O tumor da esteticista, chamado carcinoma ductal in situ, é não invasivo na maioria
das vezes. As células anormais estão confinadas nos canais que drenam o leite.
“O problema é que não sabemos quais desses tumores
vão ou não progredir. Para
uma mulher jovem, não fazer
nada pode ser temeroso”,
afirma o mastologista José
Luiz Bevilacqua, do hospital
A.C. Camargo.
Segundo ele, faltam mais
dados sobre as características do tumor e das pacientes
para as quais “não tratar” seria uma opção segura.
Essa postura “mais liberal”, diz ele, pode ser aplicada a mulheres mais idosas,
com tumores pequenos e de
13
Marcus leoni/Folhapress
cláudia collucci
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
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a esteticista
Rosângela
Bittencourt, 53,
em São Paulo
VIGILÂNCIA ATIVA
para certos perfis de pacientes e de tumores, a melhor terapia
pode ser não fazer nada e esperar a doença regredir, estacionar ou desaparecer;
mas esse caminho, que exige
acompanhamento constante,
é dificultado pela falta de
exames precisos
baixo grau de malignidade.
“Você pode dar um [remédio]
anti-hormônio e é provável
que a pessoa vai morrer de
outra coisa. Às vezes, a lesão
até desaparece.”
Com a mamografia, o diagnóstico do carcinoma ductal
in situ aumentou de 3% para
25% em três décadas. Mas o
índice de mortalidade permaneceu inalterado, independentemente do tratamento.
“Com o diagnóstico precoce, temos identificado muitas
alterações que não se tornariam um problema. Opera-
mos e tratamos muito, mas a
mortalidade não caiu na mesma proporção”, diz o mastologista Antonio Frasson, do
Hospital Albert Einstein.
Estudos dos últimos anos
mostram que só 30% dos carcinomas in situ evoluíram para tumor agressivo. O resto teve crescimento lento e sem
malignidade. Alguns regrediram ou desapareceram. “Como não sabemos identificar
esse paciente de baixo risco
ou o ‘defeito’ que pode evoluir para carcinoma invasor,
tratamos todo mundo igual.”
A questão é que não há
exames capazes de prever
quais células se tornarão malignas, nem quando e como.
Hoje, cinco centros da Universidade da Califórnia acompanham mulheres com carcinoma in situ que não serão
submetidas a terapias, para
que seja avaliado o tipo de célula que pode evoluir ou não.
A proposta de só acompanhar tumores de baixa malignidade é chamada de vigilância ativa, e adotada desde os
anos 1990 para a próstata.
Gustavo Guimarães, chefe
de urologia do A.C. Camargo,
diz que há vários critérios de
seleção a serem adotados, como o paciente não ter nódulos visíveis e apresentar exame de PSA abaixo de 10.
Entre os mais jovens, a opção é controversa porque há
riscos associados às biopsias
frequentes feitas para acompanhar a evolução do tumor.
“Podem ocorrer sangramentos, inflamações e fibrose. Se no futuro o paciente tiver que ser operado, pode ser
complicado”, diz Guimarães.
No câncer de tireoide, a vigilância é adotada com grávidas, desde que o tumor seja pequeno. “Acompanhamos a gravidez e a amamentação e operamos depois, sem
prejuízo”, diz o cirurgião Luiz
Paulo Kowalski.
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Leonardo Wen/Folhapress
14
Ana Maria Braga,
na frente da casa
do “Mais Você”,
no Projac (Rio)
SextA-feirA, 1º de ABril de 2016
ef
┆┆┆
Tomava muita
morfina quando
eu podia. Nas
outras horas,
eu trabalhava.
Continuei
trabalhando porque
era um grande
motivo para
levantar todo dia
c o MédIco
SUZANA SINGER
editora de “treinamento”
Oncologista
defende direito a
segunda opinião
“Não dá para tomar garrafada da Amazônia e fazer quimioterapiaaomesmotempo.”
A frase não surpreenderia
se viesse de um oncologista
famoso ou de um pesquisador cético, mas o conselho é
da apresentadora Ana Maria
Braga, que fez todo o tratamento contra o câncer sob a
proteção de Nossa Senhora
de Fátima e foi a Portugal
agradecer a cura com um percurso de joelhos.
“Fé sim, mas sem abandonar o racional”, aconselha
Ana Maria, que enfrentou três
vezes a doença e que completa 67 anos nesta sexta (1º). Em
1991, era um câncer de pele
que se resolveu com cirurgia.
Dez anos depois, um carcinoma do canal anal, que exigiu
doloroso tratamento radioterápico. “Tinha hora em que
eu ligava o chuveiro, deitava
embaixo e chorava muito.”
Em dezembro do ano passado, a apresentadora surpreendeu a todos anunciando no “Mais Você” que tinha
sido operada de um câncer
pulmonar. Levou sua equipe
médica ao programa e começou uma campanha para que
as pessoas parem de fumar.
Ana Maria assumiu a doença. “Nunca dá certo tentar esconder. A verdade é voadora,
soberana”.
As três ocorrências de câncer de Ana Maria Braga não
têm ligação entre si, explica
o oncologista Antonio Carlos Buzaid, médico da apresentadora.
Ele afirma que o câncer de
pulmão, diagnosticado na fase inicial (tumor com menos
de 6 mm), foi o mais fácil de
tratar. A chance de cura do
melanoma de pele é de 90%,
a do carcinoma do canal anal
é de 50% e a do pulmão, detectado cedo, chega a 95%.
Para uma pessoa ser considerada curada de câncer,
o parâmetro que se usa é de
cinco anos após o término do
tratamento.
No fórum promovido pela
Folha, Buzaid defendeu o direitodopacienteaumasegunda opinião. “Se o seu médico
ficar chateado com isso é porque ele é inseguro”, afirmou
o médico, que chefia o Centro
de Oncologia Antonio Ermírio
de Moraes e atende no Hospital Albert Einstein.
Buzaidcontouocasodeum
paciente, com muito dinheiro, que importou um especialista. “O oncologista veio de
Boston, chegou num sábado,
examinou na segunda-feira e
fez a avaliação.”
Na decisão sobre qual tratamento seguir, o médico diz
ser imprescindível ouvir o paciente “sem a pressão da família”. “Se a pessoa diz que
não quer ser operada, por
exemplo, não adianta nem o
papa Francisco me ligar.”
★
Folha - Você teve câncer três
vezes: em 1991, em 2001 e em
2015. Como foi receber cada
diagnóstico?
Foi bem assustador. Da
primeira vez, era um câncer
de pele, tratado com uma cirurgia profunda no braço. Ficou uma grande marca, mas
a gente sempre sai com cicatriz, onde for, depois de uma
doença séria. Na segunda
vez, foi tão assustador quanto na primeira, até mais pela
violência do câncer.
Tinha medo de falar ‘câncer’?
A palavra começou a fazer
parte da minha vida. Optei
por falar com todas as letras,
c-â-n-c-e-r, para combater o
estigma, o medo de que, se
repetir a palavra ou usá-la
inteira, você morrerá disso.
Inimigo, a gente encara, olha
de frente.
Você enfrentou a doença como se fosse uma guerra?
Sim, eram células inimigas
que não queriam que eu continuasse por aqui. Em guerra,
vocênãopodeficaremestado
de desânimo. Precisa manter
a cabeça alerta porque todo o
resto dói.
Como conviveu com a dor?
Eu sou uma sortuda por ter
acesso ao que há de melhor
na medicina. Hoje, é possível
fazer um tratamento grave
e ainda viver relativamente
bem, manter suas atividades.
Mesmo assim, tive sequelas horríveis, que às vezes me
impediam de andar.
EntrEvista AnA mAriA BrAgA
não dá para fazer químio
e tomar garrafada
ApresentAdorA contA como enfrentou os três tipos de tumor
que teve desde 1991, diz que usA A pAlAvrA
a uma ofensa, a uma contrariedade. A pessoa se entrega,
por exemplo, após um abandono. Outros conseguem
sublimar, manejar, tocam a
vida e choram em casa. Tem
gente que é mais sensível ao
que a vida reservou a ela, aos
‘nãos’ que todos recebem.
Você acredita que o pensamento positivo ajudou nos
tratamentos?
Foi arrasadora. Eu tenho
um limiar alto de dor e mesmo assim sofri. Tomava muita morfina quando eu podia.
Nas outras horas, eu trabalhava.Continueitrabalhando
porque era um grande motivo
para levantar todo dia. Gosto
muito do que faço.
Em casos de problemas físicos, não só no câncer, você
depende muito da sua cabeça, da qualidade do seu pensamento. Mas não pode ser
da boca para fora. É preciso
ter, o tempo inteiro, um nível
de alerta com você mesmo.
Precisa ajudar o seu corpo
a combater, com a rádio e a
quimioterapia, aquelas células inimigas.
Alguns pacientes não conseguem reagir tão bem, sofrem
de depressão, por exemplo.
Batia desespero, autopiedade, vontade de ficar largada
na cama?
No segundo caso, o do câncer
no canal anal, a radioterapia
foi muito difícil?
Tem gente que é mais sensível, não só à dor física, mas
Sim. Tinha hora em que eu
ligava o chuveiro,deitava em-
‘câncer’ pArA AjudAr A quebrAr o estigmA e
fAlA AindA dA necessidAde de mAnter A mente AlertA ‘porque todo o resto dói’
baixo e chorava muito. É natural que isso aconteça. Mas
você tem que acreditar de verdade. Eu dizia‘vou aguentar’.
Nunca imaginei que a doença
pudesse ser maior do que eu.
Diferentemente de outras pessoas públicas, você revelou a
doença, tanto em 2001 quanto
agora. Por quê?
Nunca dá certo tentar esconder. A verdade é voadora,
soberana. O que eu já vi de
gente tentando fazer coisas
escondidas dos mais variados tipos, problemas financeiros, de saúde, mas sempre dá errado. Duas pessoas
sabendo de alguma coisa já
são uma multidão.
Mesmo falando, há espaço
para especulações. Eu contei: foi assim, assado, estou
assim… Se escondesse, a bolha seria enorme. A verdade
é o caminho mais curto. Dá
menos trabalho.
Mas desta última vez, você só
contou ao público após retirar
o tumor.
Eu já tinha planejado uma semana de férias, ia viajar, então
aproveitei para ser operada.
Trabalhei até sexta, depois
me internei e fiz a cirurgia.
No quinto dia, fui para casa.
Voltei ao trabalho, mas tive
falta de volume de ar. Frases
longas, por exemplo, eram difíceis. Deixei passar o período
crítico e aí contei ao público.
Você se perguntou ‘por que eu
de novo?’?
Eu fumei por tanto tempo,
era previsível. Foi minha culpa. Quer dizer, não é questão
de culpa, é vício. Sou viciada
em nicotina, como um drogado é em drogas ou um alcoólatra em bebida.
Você é formada em biologia e
é muito religiosa. Tentou algum tratamento alternativo?
Eu não acredito que se possa servir a dois senhores, usar
dois chapéus. Quando eu tive
o segundo câncer, o mais pesado, chegavam ideias, tratamentos milagrosos de todos
os lados. Se eu dividisse minha força, eu enfraqueceria
o tratamento, porque bagunçaria a minha cabeça e o meu
organismo. Você precisa acreditar em uma coisa e segui-la.
Não dá para tomar garrafada
da Amazônia e fazer quimioterapia ao mesmo tempo.
Você procurou informações
na internet, tentou saber de
novas opções de drogas no
exterior?
Não adianta ler todas as
bulas nem ficar vasculhando
a internet, onde existe muita porcaria. Você tem que se
entregar, de corpo e alma, a
quem o está tratando.
Que balanço você faz desse
sofrimento todo?
Depois do câncer, eu só
melhorei. Sou muito exigente com as coisas, passei a ser
mais condescendente. Você
valoriza mais a vida.
Falar sobre isso faz com
que eu me lembre de que eu
só tenho hoje. A gente se esquece disso, de que é preciso
ser feliz agora, porque amanhã ninguém sabe.
15
Fotos Eduardo Knapp/Folhapress
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
Não precisa ter
pena de mim,
porque eu
não tenho.
Estou doente e
aproveitando
a vida mais do
que nunca
Sexta-feira, 1º de abril de 2016
ef
┆┆┆
verónica
hughes
todo natal
falo para os
meus fIlhos
que VaI ser o
últImo, mas
eu não morro
oScar ScHMiDt, 58,
ex-jogador de basquete,
que tem tumores no cérebro
DE SÃO PAULO
Bruno Santos/ Folhapress
pensamento (Im)posItIVo
pacientes reclamam de quem os trata como
A consciência
de que a vida
vai ser curta
leva o paciente
de câncer a
acelerar tudo
vítimas, falam com bom humor sobre a doença, mas se queixam da
cobrança frequente para que eles
enfrentem tudo com otimismo
WALTER PORTO
DE SÃO PAULO
Pacientes de câncer se ressentem da “pressão do pensamento positivo”, a ideia de
que o doente tem de estar
bem e feliz para se curar.
Podem até fazer graça com
a doença —como os participantes da mesa dedicada à
opinião do paciente, nesta
quarta (30), segundo dia do
Fórum O Futuro do Combate
ao Câncer—, mas não gostam
de ser tratados como vítimas.
“Eu estou vivendo, e muito bem. Não é um tumorzinho
que vai me derrubar”, disse
o ex-jogador de basquete Oscar Schmidt, um dos participantes do encontro.
Oscar contou que, após um
desmaio, há cinco anos, descobriu um tumor de oito centímetros de diâmetro na superfície do cérebro. Segundo
ele, “uma bola de softball”.
Três anos depois, descobriu outro, num grau mais
avançado. “Agora estou esperando o de grau quatro”
disse, referindo-se ao último
estágio da doença.
O atleta comentou que a vida “até melhorou” depois da
descoberta do tumor, porque
antes se preocupava mais em
economizar dinheiro. “Para
que vou ficar guardando,
agora que estou na reta final?”
A médica Verónica Hughes, 57, que há 12 anos convive com um câncer de pulmão (o mesmo tipo do que,
no ano passado, matou seu
pai, o escritor uruguaio
Eduardo Galeano), entrou no
grau quatro há meia década.
“Há uma pressão para o paciente estar sempre bem, otimista. Mas às vezes é para ficar triste mesmo”, disse.
A jornalista Elaine Bast, 42,
outra participante da mesa,
disse que receber o diagnós-
tico de câncer foi comparável
ao 7x1 do jogo entre Brasil e
Alemanha: “Inacreditável”.
“Teve dia em que eu quis
ficar trancada no quarto o dia
inteiro, e minha família respeitou,” contou Bast. Ela descobriu um tumor de mama
em novembro passado, logo
após fazer uma reportagem
sobre a importância do diagnóstico precoce.
“Passei um tempão estudando sobre câncer, mas
quando você ouve do médico
que tem, esquece tudo.”
O que mais a tranquilizou
foi a segurança passada pelo
oncologista, que explicou em
detalhes o que ela tinha e como seria o tratamento. “O paciente precisa ter um tratamento humanizado, ser olhado como um todo. E isso inclui também a estética.”
Merula Steagall, 49, presidente da Abrale (Associação
Brasileira de Linfoma e Leucemia) e da Abrasta (Associação Brasileira de Talassemia)
aponta que uma doença grave muda o olhar em relação
à vida. Ainda criança, Steagall descobriu a talassemia,
doença hereditária. “A consciência de que a vida vai ser
curta te leva a acelerar tudo.”
Cita como exemplos o estudo
de idiomas —ela fala oito.
As associações que Steagall preside trabalham com
acolhimento e educação de
pacientes e com defesa de políticas públicas. Ela conta que
quando começou, em 2000,
o Brasil estava “uns 20 anos
atrasado em relação à Europa” na questão de drogas e
tratamentos, mas melhorou.
“A maioria não tem oportunidade de se tratar como
estou me tratando”, afirmou
Oscar, que contou ter tentado de tudo. “Os médicos tendem a não acreditar muito em
alternativas. A não ser quando acontece com eles.”
Merula Steagall, 49,
presidente das associações Abrale,
de linfoma e leucemia, e Abrasta, de talassemia, doença sanguínea sem cura com
que foi diagnosticada ainda criança
Filha do escritor uruguaio
Eduardo Galeano, Verónica
Hughes tem uma história que
parece ter sido, ela própria,
romanceada.
Diagnosticada em 2004
com câncer de pulmão —um
dos mais agressivos—, Verónica se mantém plenamente
ativa até hoje, aos 56 anos.
O quadro fica mais impressionante quando se leva em
conta que seu tumor está no
estágio quatro, considerado
terminal, desde 2010.
“Eu sou persistente,” diz
ela à Folha, com o forte sotaque de quem nasceu no Uruguai e viveu mais de 20 anos
em Barcelona. “Todo Natal
falo para os meus filhos que
vai ser o último, mas eu não
morro. Estou perdendo a credibilidade,” brinca.
Ela diz acreditar que só está viva hoje porque pôde recorrer, devido a sua condição
financeira, aos melhores médicos, cirurgias e tratamentos. “Tive acesso a uma medicina mais, digamos, injusta. Sou um produto da desigualdade brasileira.”
Verónica não se furta a
olhar para o futuro: “Tenho
muita esperança nas imunoterapias. Tenho certeza de
que, assim que tiver condição
clínica, entro num estudo.”
Médica com especialização
em epidemiologia pela Universidade da Califórnia em
Berkeley (EUA), foi afastada
do trabalho após a primeira
metástase no cérebro, que,
como ela mesma concorda,
tornaria o trabalho inseguro.
Dedica-se hoje ao combate ao tabagismo. Seu pai, que
morreu em abril do ano passado da mesma doença que
a acomete, era fumante inveterado. Verónica acompanhou o hábito dos 14 aos 30
anos —parou 15 anos antes de
o câncer aparecer.
Galeano nunca falava com
a filha sobre câncer nem sobre cigarro. Ela diz que os
dois discordavam ferrenhamente em relação ao fumo —o
pai o enxergava como opção
individual. “Não é uma escolha. Depois da primeira semana, você já não é livre,” diz,
exaltada. “A nicotina é pior
do que a cocaína. Só que ninguém te trata como drogado.”
(Walter Porto)
O paciente
precisa ser
humanizado,
ser olhado
como um todo.
E isso inclui a
estética
elaine baSt, 42,
jornalista que teve câncer de mama
semináriosfolha
Fórum O Futuro do Combate ao Câncer
HHH
ab
Sexta-Feira, 1° De abril De 2016
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