Temperatura Máxima Local e o Sol a Pino

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Temperatura Máxima Local e o Sol a Pino
João Luiz Kohl Moreira
Coordenadoria de Astronomia e Astrofísica
Observatório Nacional - MCT
18 de fevereiro de 2013
Resumo
Todo lugar tem o dia mais quente e o mais frio do ano. Há aqueles em que a estatística indica marcas
históricas. Sabemos que há localidades na Região Centro-Oeste que se transformam em verdadeiros infernos,
quando quentes, ou viram um freezer quando nos dias mais frios. O Rio de Janeiro cansa as simpáticas
"moças do tempo" dos canais de televisão, tanto que elas são obrigadas a registrar altas temperaturas no
verão. Recentemente o Rio registrou "alta" histórica (segundo dia mais quente registrado), na entrada desse
ano de 2013.
Acontece que nós vemos que há locais onde a época da temperatura máxima não coincide com outras
localidades. Em outras palavras, parece que Cuiabá é quente, quente mesmo, lá por outubro-novembro.
Ou que as praias nordestinas apresentam um clima bem ameno em janeiro-fevereiro, a ponto dos locais
chamarem de inverno o que os "sulistas" chamam verão. Essas regiões, do Nordeste, preferem "torrar" lá
pelo que, normalmente, chamamos primavera ou outono.
O que determina isso? A primeira idéia seria a insolação, ou seja, espera-se que em certos lugares a
presença do sol no céu é mais longa que em outros. Porém, vemos que a insolação pode inuir no valor do
máximo e mínimo da temperatura no local, e não na época que esses extremos (pelo menos o máximo) se
dão.
Surge, então, a idéia do "sol a pino". Em outras palavras, sol a pino é a condição em que a distância do
sol ao zenite local é nula ou muito pequena, quando do trânsito deste pelo meridiano. Estudei a média de
temperatura em função do tempo, para diferentes faixas de latitude no Brasil, desonsiderando a longitude
e altitude local. Comparei o resultado com a distância zenital média do sol para as latitudes médias. O
resultado é bem interessante.
1
Introdução
A motivação desse trabalho é denir se se pode estabelecer uma correlação entre um fenômeno climático, a
temperatura máxima, com efemérides astronômicas, especicamente, a posição do sol e condições de iluminação
solar nas diferentes regiões do Brasil. Observa-se que as temperaturas máximas registradas em território nacional
dão-se em épocas diferentes em função da região, aparentemente seguindo a sequência das estações e alguma
coisa mais. Resta saber se há coerência nessa observação.
Não resta dúvida que o valor da temperatura máxima é superior em regiões de baixas latitudes. O mesmo,
inversamente, pode-se dizer com respeito à temperatura mínima. No entanto, essa parece permanecer presente
e invariante com respeito à latitude no inverno. Espera-se observar uma diminuição dessa correlação na medida
que nos aproximamos do equador visto a evidente degenerescência das estações do ano nessas regiões. É claro
que, mesmo em termos astronômicos, essa parte do mapa apresenta, essencialmente, apenas duas estações: a da
seca e das chuvas. Essa particularidade climática será determinada mais por fatores geográcos e geológicos do
que astronômicos. Portanto, não podemos esperar resultados animadores quanto ao tema desse trabalho para
essas regiões.
2
Obtenção e Tratamento dos Dados
1
Os dados para a temperatura máxima no Brasil foram obtidos do INMET, Instituto Nacional de Meteorologia .
As localidade foram agrupadas por latitudes sendo ordenadas no sentido crescente. Não se estabeleceu qualquer
relação com a longitude, muito embora seus valores foram mantidos em uma coluna designada a esse m
e, possivelmente, poderá, em trabalho futuro, determinar um parâmetro adicional a ser incluído na análise.
Calculou-se, então, a temperatura média para grupos de maneira a perfazer médias próximas a latidudes
a
o
φ = 25
sul, em intervalos de
5
o
φ = 0o
, as quais são designadas negativas. Há um espalhamento dos dados para cada
1 http://www.inmet.gov.br/portal/index.php?r=clima/normaisClimatologicas
1
ponto.
A origem desse espalhamento está na variação da temperatura com respeito à latitude mas também
com respeito à longitude. Há forte componente geográca nessa variação determinada pelo microclima em cada
região.
Estamos, obviamente, lidando com diferentes pers climáticos, desde clima oceânico, na orla, até o
continental, no Centro-Oeste. Devemos, portanto, entender os resultados aqui como comportamento médio e
não determinando qualquer previsão mantendo relação de causa e efeito.
A distância zenital no trânsito meridiano foi obtida de Kohl-Moreira (2003):
z = φ − δ ,
sendo que a declinação do sol (δ ) se obtém
sin δ = sin ε sin l ,
onde l é a longitude eclíptica do sol, que foi obtida de
l = 265.68 + 0.9855td ,
onde
td
é o tempo dado em dias, contado a partir do primeiro dia do ano.
Foi adotada como variável o cosseno da distância zenital (cos z ), no lugar da distância zenital porque
considera-se que o mecanismo responsável pelo aquecimento é a exposição, que é proporcional ao cosseno da
distância zenital, assim como é inversamente proporcional à massa de ar, a quantidade de atmosfera que a
radiação solar deve atravessar, que é igual, ou muito aproximadamente
sec z .
O cômputo da insolação baseia-se nas notas do cálculo para a duração do dia e da noite, em função da
2
latitude no serviço internet da página WEB do Observatório Nacional . Tanto a insolação, quanto a distância
zenital foram obtidas para o valor médio das latitudes consideradas.
3
Discussão
Podemos ver a variação da temperatura máxima em cada mes, para as latitudes consideradas na Figura (1).
São seis grácos mostrando os valores tomados mes a mes e ligados entre si por segmentos de reta. As barras de
o
erro mostram o espalhamento dos valores obtidos para as localidades no intervalo de latitude considerado (5 )
para todas as longitudes. Vê-se que o espalhamento aumenta consideravelmente na medida que se aproxima do
equador.
Para a grande maioria das curvas de temperatura vê-se que a função é bi-modal, exceptuando as latitudes
φ ≈ −5o
e
φ ≈ −25o .
Para o último caso é de se esperar porque, estando fora da zona tropical, as estações são
melhor denidas e há somente um verão. No primeiro, há essa anomalia. Perceba que o espalhamento de dados
para a região do equador (φ
≈ 0), é grande na primeira parte do ano, indicando que, também aí, a bi-modalidade
não é absoluta. Há nítida assimetria nas curvas. Para as baixas latitudes verica-se que a temperatura máxima
se dá na segunda metade da curva, isto é, na entrada do verão.
Para altas latitudes, passa-se o contrário,
enquanto que as médias latitudes mostram falta de denição, podendo-se encontrar máximas temperaturas
tanto na primeira, quanto na segunda parte do ano.
As curvas contínuas, em linha sólida representam o cosseno da distância zenital do sol, quando este cruza o
meridiano local. As curvas são para as latitudes médias em cada conjunto. Como já vimos, adota-se o cosseno
do ângulo, em vez do ângulo, ele mesmo, por considerações a respeito da dependência da função de exposição
e massa de ar.
Na Figura 2 vemos a variação da insolação para as latitudes médias aqui consideradas. A primeira observação
é que todas elas diferenciam-se umas das outras apenas pela intensidade. Não há variação do aspecto da curva
no que tange a posição horizontal do máximo e mínimo. Vemos que a curva da insolação não é suciente para
descrever a posição da temperatura máxima no ano, de acordo com a latitude.
A curva de
cos z
caracteriza-se por ter dois comportamento segundo a região. Para
|z | < ε,
onde
ε
é a
obliquidade da eclíptica, em outras palavras, para os trópicos, a curva apresenta dois máximos, representado as
duas ocasiões em que o sol passa a pino, isto é, para
z = 0.
A primeira, quando o sol está se dirigindo para
o solstício de verão (no hemisfério sul) e a outra, quando o sol está voltando em direção ao hemisfério norte.
Contudo, quando a localidade encontra fora da região tropical (z
≥ ε),
a curva é unimodal. Contudo, para
todos os casos, o mínimo é único e encontra-se, exatamente, no solstício de inverno, para todas as regiões.
Se a insolação serve para marcar alguma coisa, será para a temperatura mínima. No entanto, aqui, também,
a distância zenital do sol, no trânsito meridiano local, que representa o solstício de inverno, também acompanha
bem a temperatura mínima, como podemos ver no gráco comparativo mostrado na Figura 3. Visto as funções
insolação mínima e a distância zenital máxima são funções exclusivas da latitude, uma simples dependência de
uma função dessa seria suciente.
2 http://staff.on.br/~jlkm/InsolacaoMedia/index.html
2
O comportamento da temperatura máxima média e a semelhança com o cosseno da distância zenital do sol
no meridiano nos anima a estudar a correlação entre elas. É o que pode ser visto na Figura 4. Examinando esses
grácos de correlação vemos que há uma grande concordância com aquilo que já tinhamos observado no exame
dos grácos da Figura 1. Enquanto a correlação para o equador é virtualmente inexistente (variação entre o
máximo e mínimo inferior a 0.002%), a correlação vai se consolidando na medida que o valor absoluto da latitude
φ ≈ −10o , −15o , −20o
o
o pico se sobressai em cerca de 1% e para φ ≈ −25 chega a um pouco menos de 11%. Exceptuando φ ≈ −5 ,
a correlação máxima é em zero, o que signica dizer que a temperatura máxima média e cos z estão em fase.
o
Para o caso de φ ≈ −5 há uma defasagem de cerca de 1.5 mes. Observando o gráco das duas funções na
Figura 1 essa defasagem pode ser creditada na assimetria da função de temperatura. No caso de φ ≈ 0, mesmo
vai aumentando. Na altura de
φ ≈ −5o
o pico já chega a 0.2% sobre o valor mínimo, em
o
com baixa correlação, podemos considerar que há uma defasagem de um mes, isto é, a temperatura se atrasa
de um mes com respeito ao sol ao pino.
Esses resultados nos sugerem concluir que há uma forte correlação entre a temperatura máxima local e o
sol a pino, a despeito da grande variação do microclima nas localidades consideradas. O sol a pino seria o
parâmetro relevante na determinação dessa variável. Ela não será suciente para descrever se o máximo se dá
no lado anterior ou posterior da curva, relativa ao mínimo central. Essa variável é denida, provavelmente, a
partir de condições climáticas locais. Pelas curvas dadas na Figura 1, arriscaríamos dizer ser mais provável que,
para baixas latitudes, o máximo ocorra na "entrada do verão", para médias latitudes pode ocorrer tanto na
"entrada", quanto na "saída" do verão, e para altas latitudes, o perl se inverte com respeito às baixas latitudes.
4
Conclusão
A partir dos dados climatológicos disponíveis no Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) e de dados
de posição solar no céu, acessíveis no Observatório Nacional (ON), foi promovida uma comparação entre o
comportamento da curva de temperatura máximas e a proximidade do sol ao zenite, em sua passagem meridiana,
que chamamos sol a pino, para diferentes localidades no Brasil. Também, foram comparadas com curvas de
insolação, dadas no site do ON. O resultado é que, se as curvas de insolação não são sucientes para descrever
as diferentes curvas de temperatura em faixas diferentes de latitude, a curva do cosseno da distância zenital,
como foi descrita acima, se correlaciona muito bem. Observa-se que a curva de temperatura máxima apresenta
um caráter bi-modal que é muito bem descrito pela curva de
cos z .
Essa descrição falha apenas em explicar a
assimetria das curvas de temperatura máxima, o que é creditado a variações de ordem geográca e climatológica
local.
Por outro lado, o mínimo de temperatura é comum a todas as regiões, sendo relacionada, tanto à baixa
insolação quanto à grande distância zenital do sol no meridiano, por ocasião do solstício de inverno no hemisfério
sul.
Referências
Kohl-Moreira, J. (2003).
Sombras de prédios e torres em cidades e de montanhas na região rural.
Brasileira de Ensino de Física 25 (1),
6273.
3
Revista
0
φ≈0
φ≈-5
φ≈-10
φ≈-15
φ≈-20
φ≈-25
50 100 150 200 250 300 350 400
0
50 100 150 200 250 300 350 400
Figura 1: Curva de variação da temperatura máxima local, tirada mes a mes, comparada com o cosseno da
distância zenital do sol no instante da passagem meridiana.
comparação.
Não há interesse de um "ajuste de curvas".
dados tanto em latitude, quanto em longitude.
4
A curva do cosseno é colocada no gráco para
As barras de erro decorrem do espalhamento dos
15
14.5
14
Insulation
13.5
13
12.5
12
11.5
11
50
100
150
200
250
300
350
Days
Figura 2: Gráco mostrando as insolações locais para latitudes de zero a
−25o .
A curva mais suave representa
a insolação diária para latitude zero. A mais abaulada representa a insolação para latitude
−25o .
Note que esta
chega ao mínimo e ao máximo absolutos na gura.
-35
24
-30
-25
-20
-15
-10
-5
0
5
24
22
Min Temperature
20
22
Mean Min Temp
cosZ
Min Insulation
20
18
18
16
16
14
14
12
12
10
10
8
6
-35
8
6
-30
-25
-20
-15
Latitude
-10
-5
0
5
Figura 3: Gráco comparativo da temperatura mínima com a insolação mínima e o cosseno da distância zenital
do sol no solstício de inverno, no trânsito meridiano local, com a latitude. Os valores do cosseno e da insolação
são submetidos a um fator de escala para serem comparados com os valores da temperatura.
5
φ≈-5
φ≈0
-20
-15
-10
-5
0
5
φ≈-10
φ≈-15
φ≈-20
φ≈-25
10
15
20-20
-15
Figura 4: Gráco da correlação entre a temperatura máxima média e
-10
-5
cos z .
Considerando que os pontos foram
tirados mes a mes, cada unidade do eixo das abscissas representa um mes.
6
0
5
10
15
20
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