o ensino de língua estrangeira na educação básica brasileira

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O ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA NA EDUCAÇÃO BÁSICA
BRASILEIRA: NOVOS CAMINHOS
MALVEZZI, Karina Falcioni1 - FATEC/ FACINTER
Grupo de Trabalho: Didática: Teorias, Metodologias e Práticas
Agência Financiadora: não contou com financiamento
Resumo
O presente artigo tem como objetivo analisar as novas propostas e direcionamentos para o
ensino de língua estrangeira na educação básica brasileira. Por meio de uma pesquisa
documental e bibliográfica, foi apresentado um panorama da história do ensino da língua
estrangeira no Brasil, desenvolvendo uma análise dos documentos oficiais, que passaram a
normatizar o ensino de língua estrangeira, a partir da década de 1990. O texto destaca as
determinações e as propostas de ensino para a língua estrangeira, a partir da Lei de Diretrizes
e Bases Nacionais da Educação de 1996, com ênfase nos documentos que orientam a
organização dos conteúdos para o ensino fundamental e médio no Brasil. Com base nesses
documentos, foi possível desenvolver uma reflexão sobre as literaturas que apresentam uma
nova perspectiva para o chamado momento pós-métodos. O texto apresenta questões
relevantes sobre o ensino e a aprendizagem de língua estrangeira, entre elas: como garantir
um ensino de língua estrangeira de qualidade, nas escolas públicas brasileiras? O problema
pela falta de domínio de uma segunda língua está no método adotado? Qual é o melhor
método de ensino de língua estrangeira? Como o professor deve ensinar língua estrangeira?
As escolas públicas estão equipadas para oferecer um ensino de qualidade? A análise dos
documentos e das bibliografias resultou na constatação de que as atuais teorias buscam um
ensino de língua estrangeira de qualidade, não só nas questões estruturais da língua, mas
principalmente em seus aspectos extralinguísticos. Após anos de discussões sobre métodos e
abordagens, a ênfase passou a recair mais sobre o sujeito que aprende do que sobre a língua
que se ensina, aumentando, assim, a responsabilidade do professor neste projeto de
transformação social, cultural e individual.
Palavras-chave: Legislação Educacional Brasileira. Língua Estrangeira. Metodologia de
Ensino.
Introdução
Esta pesquisa tem como objetivo geral analisar as novas propostas metodológicas para
o ensino de língua estrangeira (doravante LE) na educação básica brasileira. Nos meios
1
Graduada no curso de Letras Português/ Francês pela Universidade Estadual de Maringá (UEM: 2011). Aluna
do curso de Especialização em Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa e Estrangeira, na FATEC/
FACINTER. Direção eletrônica: [email protected].
16288
educacionais, defende-se a ideia de que a aprendizagem de uma segunda língua é fundamental
para a formação integral do aluno, amplia a compreensão de outras manifestações culturais,
além de favorecer a competência comunicativa do educando. Assim sendo, tornam-se
relevantes os seguintes questionamentos: como garantir um ensino de LE de qualidade, nas
escolas públicas brasileiras? O problema pela falta de domínio de uma segunda língua está no
método adotado? Qual é o melhor método de ensino de LE? Como o professor deve ensinar
LE? As escolas públicas estão equipadas para oferecer um ensino de qualidade? Essas
questões devem ser analisadas, pois, na sociedade brasileira ainda é corrente a ideia de que o
domínio de uma segunda língua só se concretiza por meio de cursos particulares de idiomas.
Atualmente, no Brasil, bem como em outros países, após diversos estudos sobre
métodos e abordagens de ensino de LE, a ênfase não recai mais sobre a eficácia de
determinado método e sim sobre a responsabilidade, por parte do professor, de analisar qual a
melhor maneira de trabalhar em determinada sala de aula. Nesse sentido, torna-se necessário
levar em consideração fatores externos da língua, como: sua função social, seu caráter
transformador, a apropriação da cultura e o respeito à diversidade que ela proporciona,
observando o aluno e suas individualidades. Há uma exigência do mercado de trabalho e uma
aceleração no processo tecnológico, no qual o indivíduo deve ter domínio de uma segunda
língua. Assim sendo, o ensino de LE na educação básica brasileira requer, além de
professores capacitados, uma boa condição de trabalho, material didático de qualidade, e
estrutura suficiente para o ensino e aprendizagem nas salas de aula.
A atual legislação educacional brasileira determina a obrigatoriedade do ensino de LE
nos anos finais do ensino fundamental – 6º ao 9º ano, bem como no ensino médio (BRASIL,
1996; 1998a; 1998b; 2000; 2002; 2006; PARANÁ, 2008). Com base nessa legislação, as
reflexões sobre o ensino de LE passaram a enfatizar, além do conteúdo programático, o modo
de ensinar e a importância de um ensino sociointeracionista. O ensino de línguas está
deixando aos poucos de ser uma simples matéria escolar e passando a ser uma oportunidade
de crescimento individual, cultural e social. Diante desses fatos, torna-se relevante a análise
sobre as novas possibilidades de ensino de LE na educação básica brasileira.
Nesta pesquisa foi realizada uma revisão das leis e projetos educacionais referentes ao
ensino de LE no Brasil. As análises desses documentos foram complementadas com
bibliografias que tratam sobre o tema na atualidade. Trata-se de uma pesquisa de caráter
documental e bibliográfico, na qual a legislação que normatiza o ensino de LE na educação
16289
básica brasileira foi analisada, especialmente, com base nos documentos aprovados a partir da
década de 1990.
A análise documental e bibliográfica apontou que a responsabilidade pela escolha de
uma metodologia adequada para os alunos recai, principalmente, sobre o professor. É ele
quem deve se atentar para as especificidades de sua turma, adaptando o ensino diante das
divergências que ocorrem em uma sala de aula. No entanto, vencer os percalços que se
apresentam diante das condições de trabalho e da realidade das salas de aula é um grande
desafio para o professor de LE no Brasil.
O texto está estruturado em três seções. Na primeira há um breve apanhado histórico
sobre a LE no Brasil, destacando os entraves que a disciplina enfrentou e como ela foi
conquistando seu espaço no ensino público brasileiro. Na segunda seção há uma reflexão
sobre o que os documentos oficiais determinam a respeito do ensino de LE nas escolas
públicas brasileiras e quais orientações educacionais os documentos apresentam. A terceira
seção apresenta uma revisão bibliográfica do que podemos chamar de momento pós-métodos
e uma reflexão sobre os novos caminhos que a LE tem tomado no Brasil.
Breve histórico do ensino de língua estrangeira no Brasil
Através de um levantamento histórico podemos observar que já no período do
descobrimento do Brasil, em 1500, tem-se a presença do ensino de LE no país. Os jesuítas
impuseram aos índios que aprendessem a língua portuguesa para facilitar a comunicação e a
catequese. Com a expulsão dos jesuítas do território brasileiro e a proibição do ensino do tupi,
em 1759, a língua portuguesa tornou-se oficial no Brasil. Em 1808, com a chegada da família
Real ao país, houve uma preocupação com o ensino das línguas modernas, como Inglês,
Francês, Alemão e Italiano. Assim, em 1837, teve início no Brasil o ensino oficial de línguas
estrangeiras, com a criação do Colégio Pedro II.
As línguas modernas ocuparam então, e pela primeira vez, uma posição análoga à
dos idiomas clássicos, se bem que ainda fosse muito clara a preferência que se
votava ao latim. Entre aquelas figuravam o francês, o inglês e o alemão de estudo
obrigatório, assim como o italiano, facultativo; e entre os últimos apareciam o latim
e o grego, ambos obrigatórios (CHAGAS, 1967, p. 105 apud PAIVA, 2003, p. 53).
A partir de 1915, já no período republicano, o grego foi retirado e após a Revolução de
1930, com a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública, foram destinadas 17 horas
semanais ao ensino de francês e inglês, da primeira à quarta série (PAIVA, 2003). Outra
16290
mudança ocorrida no período republicano foi a implantação do caráter opcional das línguas
inglesa e alemã nos currículos. No governo de Getúlio Vargas, o ensino de LE foi mantido na
escola pública, com a Reforma Capanema.
A reforma Capanema, de 1942, teve o grande mérito de equiparar todas as
modalidades de ensino médio - secundário, normal, militar, comercial, industrial e
agrícola - de um lado democratizando o ensino, ao dar a todos os cursos o mesmo
status, embora, de outro lado, tenha sido acusada por alguns de ser uma reforma
fascista e de promover o classicismo aristocrático e acadêmico dos últimos dias do
Império. O próprio ministro Capanema, na sua exposição de motivos, ao apresentar
o projeto ao governo, reforça a idéia de que o ensino não deve ficar apenas nos
aspectos instrumentais (LEFFA, 1999, p. 9).
A reforma trouxe uma preocupação sobre as metodologias. Neste período, o francês, o
inglês e o latim eram estudados no ginásio e no colegial o espanhol substituía o latim. A Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB n. 4.024 retirou a obrigatoriedade do
ensino de línguas no colegial, deixando ao Estado a decisão de incluir ou não a disciplina no
currículo (BRASIL, 1961).
Na Resolução n. 58/76 do Ministério da Educação em 1977, ocorreu um resgate
parcial do ensino de LE na escola, tornando-o obrigatório para o colegial, mas não para o
ginásio. O professor José Carlos Paes de Almeida Filho foi o primeiro brasileiro a defender
uma dissertação de mestrado, com foco na abordagem comunicativa no ensino de um idioma,
no ano de 1977. Um evento da Universidade Federal de Santa Catarina, no ano de 1978, foi o
pioneiro no Brasil a combater as ideias do ensino estruturalista2.
A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB n. 9.394/96 (BRASIL,
1996) tornou obrigatório o ensino de uma LE, a partir da quinta série do ensino fundamental,
cabendo à comunidade escolar decidir qual língua deverá ser ensinada.
Nos Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino
fundamental: língua estrangeira – documento publicado em 1998 para orientar a organização
dos conteúdos de 5ª a 8ª séries –, os objetivos da disciplina de LE são apresentados com base
no princípio da transversalidade, sugerindo uma abordagem sociointeracionista (BRASIL,
1998a). Na edição dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, a LE tem
2
Fonte: História do Ensino de Línguas no Brasil - Projeto do Programa de Pós-Graduação em Lingüística
Aplicada da Universidade de Brasília. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/linguaestrangeira/fundamentos/alem-gramatica-426788.shtm>l. Acesso em: 10 ago. 2012.
16291
a função de veículo de acesso ao conhecimento para levar o aluno a comunicar-se de maneira
adequada em diferentes situações (BRASIL, 2000)3.
Em 2005, a Lei n. 11.161 institui a obrigatoriedade do ensino de Espanhol (BRASIL,
2005). Os Conselhos Estaduais deveriam elaborar normas para que a medida fosse implantada
em cinco anos, de acordo com a peculiaridade de cada região. No ano de 2002, foram
desenvolvidas novas orientações ao Ensino Médio, com a publicação do PCN+ Ensino
Médio: Orientações Educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Linguagens, códigos e suas tecnologias. O documento apresenta sugestões de procedimentos
pedagógicos adequados às transformações sociais e culturais do mundo contemporâneo
(BRASIL, 2002).
Os documentos oficiais e o ensino de língua estrangeira nas escolas brasileiras
Como foi visto no tópico anterior, ao longo de sua história, o Brasil passou por
diversas mudanças com relação ao ensino de LE nas escolas. Cabe, a partir de então, analisar
o que os documentos oficiais trazem a respeito do modo como ensinar uma segunda língua
para crianças e jovens.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs para 5a e 8a séries (BRASIL, 1998a),
tratam de uma série de reflexões sobre o aprender e o ensinar LE nas escolas brasileiras. O
documento aponta uma preocupação com relação à proliferação dos cursos de línguas e a falta
de prestígio que este tipo de ensino tem nas escolas. Trata também da importância do ensino
de uma segunda língua na formação do cidadão, para o seu desenvolvimento cultural e social
na formação de seu discurso. O documento explicita a importância do ensino da leitura como
prioridade, da seguinte forma:
Deve-se considerar também o fato de que as condições na sala de aula da maioria
das escolas brasileiras (carga horária reduzida, classes superlotadas, pouco domínio
das habilidades orais por parte da maioria dos professores, material didático
3
Os Parâmetros Curriculares Nacionais constituem um referencial de qualidade para a educação [...] em todo o
País. Sua função é orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional, socializando
discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores brasileiros,
principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com a produção pedagógica atual.
Por sua natureza aberta, configuram uma proposta flexível, a ser concretizada nas decisões regionais e locais
sobre currículos e sobre programas de transformação da realidade educacional empreendidos pelas autoridades
governamentais, pelas escolas e pelos professores. Não configuram, portanto, um modelo curricular homogêneo
e impositivo, que se sobreporia à competência político-executiva dos Estados e Municípios, à diversidade
sociocultural das diferentes regiões do País ou à autonomia de professores e equipes pedagógicas (BRASIL,
1997, p. 13).
16292
reduzido a giz e livro didático etc.) podem inviabilizar o ensino das quatro
habilidades comunicativas. Assim, o foco na leitura pode ser justificado pela função
social das línguas estrangeiras no país e também pelos objetivos realizáveis tendo
em vista as condições existentes (BRASIL, 1998a, p. 19).
Contudo, isso não significa que não devam ser trabalhadas as outras habilidades, até
porque em alguns casos elas podem estar inseridas em uma mesma atividade, e como o
documento apresenta, o avanço tecnológico contribui para o trabalho com as demais
habilidades.
Dentre várias outras questões, o documento também trata dos conhecimentos que os
alunos carregam em sua língua materna e de que forma eles podem contribuir para o ensino
de LE. De acordo com esses Parâmetros, o aluno tende a utilizar o conhecimento de mundo
que possui e o uso que faz dele como usuário de uma língua, e normalmente acabam
correlacionando com a língua estrangeira em questão. O mesmo pode acontecer com o
conhecimento sistêmico que apresenta convergências e divergências entre línguas. E para
facilitar o conhecimento sistêmico é interessante trabalhar com textos que se enquadrem no
conhecimento de mundo do aluno. Depois ao longo do trabalho vai se ampliando o nível do
texto para que o aluno tenha contato com novas questões (BRASIL, 1998a).
O documento ressalta também o papel das línguas estrangeiras na construção da
cidadania, deixando claro que a disciplina de LE no ensino fundamental não pode ser
considerada um “exercício intelectual em aprendizagem de formas e estruturas linguísticas em
um código diferente”, mas “uma experiência de vida, pois amplia as possibilidades de se agir
discursivamente no mundo” (BRASIL, 1998a, p. 38). O ensino de LE também contribui para
a formação cultural do aluno e apropriação tanto de sua própria cultura como da cultura de
diferentes países.
A publicação do PCN+ para o ensino médio intensifica o foco da aprendizagem na
comunicação, a partir da leitura e da compreensão de textos verbais orais e escritos, em um
trabalho com diversas situações da vida cotidiana (BRASIL, 2002). O documento sustenta
que a língua estrangeira tem papel privilegiado no currículo:
A língua estrangeira ocupa posição privilegiada no currículo por servir como
“ferramenta” a todas as outras disciplinas, facilitando a articulação entre áreas e
oferecendo múltiplos suportes para várias atividades e projetos. O que ocorre nos
projetos interdisciplinares, ainda que de modo simulado, é uma antecipação do que
acontecerá na futura vida social do aluno, no mundo do trabalho e no âmbito
acadêmico, se for prosseguir seus estudos (BRASIL, 2002, p. 94).
16293
Outro documento oficial importante para o ensino de LE são as Orientações
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias,
documento publicado pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC (BRASIL, 2006). Como
o próprio nome já diz, o documento procura orientar os professores com relação à prática de
ensino, e neste caso, especificamente, o ensino de LE para o nível médio.
Uma primeira discussão que o documento levanta é com relação a eficiência do ensino
de LE nas salas de aula. O que se observa é que há uma desigualdade no nível de
aprendizagem entre as escolas e em institutos de idiomas, e logo uma insatisfação dos
estudantes. Algumas escolas da rede pública oferecem ainda o curso de LE fora do horário
escolar e com turmas menores. Porém, fica, então, uma lacuna nos objetivos da disciplina de
LE na grade curricular do ensino médio, esses objetivos podem não estar bem definidos para
professores e alunos. A esse respeito, o documento traz o seguinte esclarecimento:
Verifica-se que, em muitos casos, há falta de clareza sobre o fato de que os objetivos
do ensino de idiomas em escola regular são diferentes dos objetivos dos cursos de
idiomas. Trata-se de instituições com finalidades diferenciadas. Observa-se a citada
falta de clareza quando a escola regular tende a concentrar-se no ensino apenas
linguístico ou instrumental da Língua Estrangeira (desconsiderando outros objetivos,
como os educacionais e os culturais). Esse foco retrata uma concepção de educação
que concentra mais esforços na disciplina/conteúdo que propõe ensinar (no caso, um
idioma, como se esse pudesse ser aprendido isoladamente de seus valores sociais,
culturais, políticos e ideológicos) do que nos aprendizes e na formação desses. A
concentração em tais objetivos pode gerar indefinições (e comparações) sobre o que
caracteriza o aprendizado dessa disciplina no currículo escolar e sobre a justificativa
desse no referido contexto (BRASIL, 2006, p. 90).
Fica claro mais uma vez, a preocupação que os órgãos educacionais brasileiros têm
com relação à educação de forma mais ampla, a formação do cidadão, a apreensão da cultura,
a visão social. Esses não são somente objetivos da disciplina de LE, mas de todas as demais
do currículo. Porém, há uma contribuição eminente da aprendizagem da LE que vai além das
estruturas linguísticas:
•
•
•
•
Estender o horizonte de comunicação do aprendiz para além de sua
comunidade lingüística restrita própria;
Fazer com que o aprendiz entenda que há diversas maneiras de organizar,
categorizar e expressar a experiência humana e de realizar interações sociais
por meio da linguagem;
Aguçar o nível de sensibilidade linguística do aprendiz quanto às
características das Línguas Estrangeiras em relação à sua língua materna e em
relação aos usos variados de uma língua na comunicação cotidiana;
Desenvolver a confiança do aprendiz, por meio de experiências bem-sucedidas
no uso de uma língua estrangeira, enfrentar os desafios cotidianos e sociais de
16294
viver, adaptando-se, conforme necessário, a usos diversos da linguagem em
ambientes diversos (BRASIL, 2006, p. 92).
Outro ponto inerente ao documento são as Orientações Pedagógicas: desenvolvimento
da comunicação oral, da leitura e da prática escrita. Sobre esses aspectos as Orientações
Curriculares Nacionais – OCN’s tendem a desvincular os termos da concepção anterior de
quatro habilidades com uma visão homogênea, para uma visão heterogênea aberta e
socioculturalmente contextualizada. E ainda, tratam da questão gramatical em meio a
recontextualização. O documento sinaliza para um ensino de gramática dentro de um contexto
de uso da linguagem, sem um sistema abstrato e código fixo e descontextualizado (BRASIL,
2006, p. 110).
Sobre as práticas pedagógicas, as OCN’s propõem “o desenvolvimento da leitura, da
comunicação oral e da escrita como práticas culturais contextualizadas” (BRASIL, 2006, p.
111). Recomendam ainda “que todas essas habilidades comunicativas sejam trabalhadas ao
longo dos três anos do ensino médio. Os trabalhos de leitura devem ter continuidade, embora
com mudanças de perspectivas” (BRASIL, 2006, p. 111).
Outro documento relevante para o ensino de LE foi publicado pelo governo do Estado
do Paraná, no ano de 2008. Trata-se das Diretrizes Curriculares da Educação Básica Língua Estrangeira Moderna (PARANÁ, 2008). Essas Diretrizes tratam, mais
propriamente, com a questão das abordagens e metodologias de ensino, dando destaque à
abordagem comunicativa como orientadora dos trabalhos nas escolas paranaenses. Segundo o
documento:
A abordagem comunicativa apresenta aspectos positivos na medida em que
incorpora em seu modelo o uso da gramática exigida para a interpretação, expressão
e negociação de sentidos, no contexto imediato da situação de fala, colocando-se a
serviço dos objetivos de comunicação (PARANÁ, 2008, p. 50).
No entanto, apesar da clara contribuição que a abordagem comunicativa trouxe para o
ensino de línguas, há um questionamento sobre as relações sociais e o conceito de cultura que
muitas vezes está estereotipado. Uma vertente mais crítica da abordagem comunicativa se
atentou à questão da visão cultural como prática social. Neste sentido, o documento apresenta
os fundamentos teórico-metodológicos que referenciam as Diretrizes e os princípios que
orientam sua escolha:
16295
•
•
•
O atendimento às necessidades da sociedade contemporânea brasileira e a
garantia da equidade no tratamento da disciplina de Língua Estrangeira
Moderna em relação às demais obrigatórias do currículo;
O resgate da função social e educacional do ensino de Língua Estrangeira no
currículo da Educação Básica;
O respeito à diversidade (cultural, identitária, linguística), pautado no ensino de
línguas que não priorize a manutenção da hegemonia cultural (PARANÁ,
2008, p. 50).
Mais uma vez fica clara a condição do ensino de LE nas escolas públicas brasileiras.
Mais do que aprender as estruturas sistematizadas de uma língua, o objetivo da disciplina
deve contemplar as relações culturais, o sujeito e a sua identidade. Por isso é preciso que os
professores entendam o que se pretende com o ensino de LE na Educação Básica.
[...] ensinar e aprender línguas é também ensinar e aprender percepções de mundo e
maneiras de atribuir sentidos, é formar subjetividades, é permitir que se reconheça
no uso da língua os diferentes propósitos comunicativos, independentemente do grau
de proficiência atingido (PARANÁ, 2008, p. 55).
O documento ressalta a interação necessária entre “professores e alunos e pelas
representações e visões de mundo que se revelam no dia-a-dia” (PARANÁ, 2008, p. 55). As
Diretrizes buscam dar ênfase às necessidades de os sujeitos interagirem ativamente pelo
discurso, tendo capacidade de se comunicarem através dos diferentes tipos de textos e levando
em conta as informações que circulam na sociedade.
Em suma, podemos verificar que os documentos abordados nesta seção procuram
orientar, contribuir e levantar questionamentos sobre o ensino de LE nas escolas públicas
brasileiras. Os documentos mais atuais, como as Diretrizes propostas pelo Estado do Paraná,
tratam das abordagens e metodologias de ensino, mas deixam claro que não há um caminho
único e totalmente verdadeiro ao tratarmos do ensino e aprendizagem de LE.
A era do pós-método no ensino de língua estrangeira
As teorias sobre ensino de LE têm tomado novos rumos. Através de levantamento
bibliográfico nota-se que pouco tem se falado em metodologias e abordagens, no sentido que
essas possam trazer um caminho absoluto para se ensinar LE nas escolas. Hoje a discussão
deixa de ser qual a melhor abordagem e metodologia para se trabalhar o ensino de LE, e passa
a ser qual a melhor abordagem e metodologia para trabalhar com determinada classe, alunos,
escolas etc. Revela-se, então, uma preocupação muito maior com o sujeito que aprende do que
16296
com o objeto que se ensina. A este respeito Márcio Luiz Corrêa Vilaça faz o seguinte
acréscimo:
Por fim, a crítica mais contundente é a inexistência do método perfeito. Essa é a
critica mais frequente. Ela é relativamente mais nova que as demais aqui citadas.
Uma das motivações desta crítica é a constatação da enorme diversidade de fatores
cognitivos, afetivos, sociais, culturais, entre outros, envolvidos no processo de
ensino/aprendizagem (VILAÇA, 2008, p. 81).
Antonieta Celani, em entrevista à Revista Nova Escola, afirma que estamos vivendo
um momento pós-método, pois o professor é quem deve analisar a realidade em que seus
alunos estão inseridos e decidir qual a melhor forma de trabalho, a melhor metodologia para
se aplicar em determinada ocasião (CELANI, 2009). Diante disto, um termo muito discutido
na atualidade é o Ecletismo Metodológico. A escolha metodológica por conta do professor
aumenta suas responsabilidades e exige uma formação mais ampla, crítica e autônoma
(VILAÇA, 2008).
Ainda sobre o conceito de métodos, há uma crítica com relação às especificidades e às
realidades contextuais, a partir de um falso princípio de homogeneidade das salas de aula de
LE (esta mesma crítica foi feita pelas OCN’s, como vimos na seção anterior). Ainda, é
relevante ressaltar o problema que a própria terminologia traz, pois “algumas vezes o termo é
empregado como sinônimo para abordagem, metodologia, princípios, técnicas, estratégias,
entre outros termos, o que ocasiona imprecisão terminológica” (VILAÇA, 2008, p. 81).
Em nossa sociedade pós-moderna o ensino de LE tem ganhado um novo espaço, uma
nova perspectiva. Na medida em que cresce o processo de globalização, a aquisição da língua
estrangeira torna-se uma exigência para o ser humano. As novas tecnologias, as facilidades de
acesso à informação, podem ser aliadas ao ensino de LE. Vilson Leffa sustenta que o
professor, apesar do fácil acesso ao conhecimento que os alunos têm, ainda é peça
fundamenta no ensino e aprendizagem da LE. Segundo ele,
Estamos descobrindo agora, às portas de um novo milênio, que o professor não é o
problema, mas a solução e que há um retorno maior investindo no professor e no seu
aperfeiçoamento do que na metodologia. As novas tecnologias não substituem o
professor, mas ampliam seu papel, tornando-o mais importante. A máquina pode ser
uma excelente aplicadora de métodos, mas o professor precisa ser mais do que isso.
Para usar a máquina com eficiência, ele precisa ser justamente aquilo que a máquina
não é, ou seja, crítico, criativo e comprometido com a educação (LEFFA, 1999, p.
21).
16297
Por isso que muito mais do que discutir métodos, é extremamente importante, tanto
para a educação em geral, como o ensino de LE, discutir sobre o papel do professor, sobre o
que se pretende através do ensino. Como vimos nos documentos oficiais, aprender LE vai
além das estruturas gramaticais, linguísticas e funcionais da língua. É de suma importância
pensar na formação do cidadão, em uma transformação da sociedade, uma emancipação que
pretenda formar alunos críticos e participativos.
Francisco Carlos Fogaça e Telma Nunes Gimenez acreditam na transformação que
pode vir como consequência do ensino da língua estrangeira e afirmam que o professor de LE
tem um importante papel político. Professores e alunos precisam entender o mundo em que
vivem, em seus aspectos políticos, sociais, econômicos e tecnológicos, para poder participar
de uma educação transformadora. O ensino de línguas, e, portanto, o professor de LE, está no
centro da vida contemporânea, dada a importância que a linguagem tem na vida social
(FOGAÇA; GIMENEZ, 2007).
O ensino de LE além de contribuir com a transformação da sociedade, também pode
colaborar com o entendimento do conceito de cultura. O aprendizado de outra língua facilita a
compreensão do aluno com relação a sua própria cultura, e ainda o faz conhecer e aprender a
respeitar a cultura de outros países. O ato comunicativo é visto como um processo cultural.
Língua, comunição e cultura estão intimamente ligadas. Não há como ensinar uma língua,
sem ensinar a cultura dos falantes de tal língua. Robert Lado afirma que é fundamental
perceber que o aprendiz precisa apreender dados sobre a cultura para evitar possíveis mal
entendidos, como por exemplo, um americano não entender o valor real da tourada para um
espanhol e a interpretar equivocadamente (LADO, 1971, p. 10).
A abordagem intercultural no ensino da língua estrangeira também já foi prevista nos
PCN’s para o ensino fundamental. O documento enfatiza que, sendo a língua um bem cultural
e patrimônio coletivo, no estudo de idioma estrangeiro é fundamental a abordagem de
aspectos que envolvem a influência de uma cultura sobre a outra. Ao trabalhar cultura nas
disciplinas de LE o professor amplia o conhecimento crítico dos alunos, diminui os
preconceitos e os estereótipos, fazendo com que o aluno aceite as diferentes visões morais e
percepções de mundo (BRASIL, 1998a, p. 100).
Outro ponto importante no ensino e aprendizagem de línguas está vinculado às
influências externas que podem ocorrer durante o processo. Não há como afirmar que exista
um método ou uma abordagem absolutamente perfeitos para o ensino de LE, pois há uma
16298
individualidade em cada aluno que deve ser respeitada e considerada. A motivação dos alunos
por aprender uma nova língua é um desses fatores que podem influenciar a aprendizagem. Na
concepção vigotskyana, é papel do professor motivar seus alunos:
A construção da motivação é um dos pilares para um bom clima da sala de aula. O
professor tem que conhecer como o alunos aprende e usar estratégias de ensino que
lhe dê a sensação de estar conquistando algo importante no ato simples de cumprir
tarefas que estão de acordo com a zona proximal de desenvolvimento (VIGOTSKY,
1993, p. 102).
A idade dos alunos também deve ser levada em conta. As diferentes faixas etárias
possuem maneiras distintas de comportamento, ritmo de aprendizagem, conhecimento de
mundo etc. Há ainda, as atitudes e personalidades que variam de aluno para aluno. Alguns são
mais calmos, tem facilidade de aprender, de reter a atenção, outros já são mais agitados, não
conseguem se prender ao conteúdo ensinado. Mais uma vez fica clara a ideia de que um só
método não pode ser útil em diferentes turmas, e também, nestes aspectos, mais uma vez, fica
a cargo do professor se adaptar às diferentes turmas, respeitar o nível e as características de
cada aluno.
Conclusão
Ao longo da trajetória histórica dos documentos oficiais e das literaturas, o ensino de
LE no Brasil tem adquirido novas formas. As atuais discussões giram em torno dos objetivos
da disciplina nas escolas públicas brasileiras. Nota-se a importância do professor neste
processo de transformação. Tanto nas leis, orientações e parâmetros, como nas bibliografias
sobre o ensino de LE, cabe ao professor definir os métodos e abordagens a serem
desenvolvidos, ter total conhecimento dos objetivos da disciplina, conduzir a transformação
social e a afirmação da cultura por meio da língua e ainda estar atento às diferenças entre
alunos e classes.
No entanto, cabe salientar as dificuldades que os professores encontram e as difíceis
condições de trabalho que eles possuem. Não há como desconsiderar estes fatores, ainda mais
quando se trata do ensino público brasileiro. Os documentos oficiais em suas teorias trazem
muitas contribuições ao ensino, mas na prática encontra-se uma divergência com relação à
realidade do nosso país. Este ponto pode e deve ser refletido em novas pesquisas sobre o
ensino de LE no Brasil.
16299
Deve-se acreditar em um ensino melhor, confiar nos novos conceitos de ensino e
aprendizagem como aliados à LE, mas para que a teoria se transforme em prática efetiva é
necessário um bom planejamento das aulas, um material didático de qualidade, condizentes
com as teorias apresentadas nos documentos oficiais, além de condições de trabalho e
recursos apropriados para professores e alunos.
REFERÊNCIAS
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