“Influência da educação do paciente e do familiar no ambiente hospitalar” por Jorge Luiz da Silveira Silva Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre Modalidade Profissional em Saúde Pública. Orientadora principal: Prof.ª Dr.ª Cristiane Machado Quental Segundo orientador: Prof. Dr. Marcelino José Jorge Rio de Janeiro, agosto de 2011. Esta dissertação, intitulada “Influência da educação do paciente e do familiar no ambiente hospitalar” apresentada por Jorge Luiz da Silveira Silva foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros: Prof. Dr. Geraldo Luiz Moreira Guedes Prof.ª Dr.ª Marizete Pereira da Silva Prof.ª Dr.ª Cristiane Machado Quental – Orientadora principal Dissertação defendida e aprovada em 10 de agosto de 2011. Catalogação na fonte Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica Biblioteca de Saúde Pública S586 Silva, Jorge Luiz da Silveira Influência da educação do paciente e do familiar no ambiente hospitalar. / Jorge Luiz da Silveira Silva. -- 2011. 64 f. : tab. ; graf. Orientador: Quental, Cristiane Machado Jorge, Marcelino José Dissertação (Mestrado) – Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2011 1. Educação de Pacientes como Assunto. 2. Família. 3. Ambiente de Instituições de Saúde. 4. Hospitais. 5. Gerenciamento de Segurança. 6. Acreditação. 7. Inovação Organizacional. 8. Controle de Qualidade. I. Título. CDD - 22.ed. – 362.11068 Dedico esta dissertação a meus filhos Tiago, Lívia e Júlia que me permitiram descobrir minha maior emoção e o amor que dá sentido à vida. A Regina, minha esposa, em especial, por toda dedicação e companheirismo. A meus pais, em memória, pelo que me ensinaram. 4 AGRADECIMENTOS Aos meus orientadores Profs. Drs. Cristiane Machado Quental e Marcelino José Jorge, pelo apoio de forma especial, pelo aprendizado e sugestões para a realização desta dissertação e pelo dispêndio incansável de seus tempos nesta trajetória. Aos Profs. Drs.Geraldo Luiz Moreira Guedes e Marizete Pereira da Silva por aceitarem participar da banca examinadora. Ao Prof. Dr. Frederico Antônio Azevedo de Carvalho que participou da banca de qualificação, as sugestões para o trabalho. À Direção, Vice-Direção e colegas de trabalho do IPEC o apoio e compreensão durante os afastamentos para o curso. A minha família por todo o incentivo e apoio desde o “pensar o mestrado”, preparar o projeto e finalizar a dissertação. Aos colegas de turma, e docentes o muito que contribuíram nas discussões de curso, além dos momentos alegres que suavizaram o dia a dia. À FIOCRUZ que possibilitou a minha pós-graduação. 5 “Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar a olhar e refletir.” Michel Foucault 6 RESUMO Com foco empírico em unidades hospitalares (UHs), esta dissertação testa a associação entre Educação do Paciente e do Familiar (EPF) e Gerenciamento do Ambiente Hospitalar e Segurança (GAS). A amostra de conveniência é composta de 33 relatórios de avaliação da Acreditação Hospitalar (AH) sobre 27 UHs não-identificadas concluídos entre 2004 e 2009. Para tratar o material empírico, primeiro foi desenvolvida uma análise confirmatória dos dados sobre as unidades de observação amostradas, apoiada em técnicas paramétricas, visando confirmar a associação da função gerencial EPF com a função GAS e, em seguida, foi feito um estudo de caso sobre o resultado da última avaliação da função EPF do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (IPEC) pela AH, realizada em 2006, com vistas a produzir contribuições gerenciais relativas à sua conformidade. Os objetivos propostos foram atingidos com o auxílio da Análise Fatorial, em parte devido ao reduzido tamanho da amostra e também em decorrência de elevada colinearidade, além da reduzida variação dos escores usados como variáveis independentes. Como contribuição metodológica, a dissertação divulgou uma fonte de dados inédita na pesquisa sobre economia da gestão. Como contribuição gerencial, identificou os fatores componentes de EPF influentes na GAS e esclareceu as relações entre as funções organizacionais da AH e o desempenho em GAS, contribuindo para o empenho de gestores e profissionais de saúde na mudança na organização. Palavras-chave: Educação do Paciente e do Familiar, Ambiente Hospitalar, Custos de Transação, Acreditação Hospitalar, Contribuição Gerencial Rio de Janeiro 2011 7 ABSTRACT By empirically focusing on hospital units this master dissertation tests whether Education of Patients and Relatives is useful to manage health services environment. The convenience sample consisted of 33 assessment reports relating to 27 unidentified hospitals and completed between 2004 and 2009. To investigate the empirical information confirmatory analysis were performed with the help of statistical techniques. Factoral Analysis was used with Multiple Regression Model to complete stated research goals which were only partially attained due to both the small sample and collinearity problems, as well as to the small range of most independent variables in the study. With views to produce managerial contribution about Education of Patients and Relatives in Evandro Chagas Clinical Research Institute of Oswaldo Cruz Foundation in Brazil (IPEC/FIOCRUZ), a case study was developed using data of Hospital Accreditation report. Two contributions of the dissertation should be noted: first, its pioneering use of Hospital Accreditation reports as a data source on the economics of organizations; second, the managerial implications stemming from its investigation of the organizational environment around hospital units and pointing to a necessary compromise of managers and professionals toward organizational change. Keywords: Patient Promotion, Health Services Environment, Transaction Costs, Accreditation Standards for Hospitals, Management Solutions Rio de Janeiro 2011 8 SUMÁRIO 1. Introdução ................................................................................................................. 12 2. Objetivos.................................................................................................................... 16 2.1. Objetivo geral ...................................................................................................... 16 2.2. Objetivos específicos........................................................................................... 16 3. Justificativa ............................................................................................................... 17 4. Marco Conceitual ..................................................................................................... 20 4.1. Educação do paciente e do familiar..................................................................... 20 4.2. Complexo Econômico-Industrial da Saúde, unidade hospitalar e inovação organizacional............................................................................................................. 24 4.3. Organização, estrutura hierárquica e governabilidade na unidade ...................... 29 4.4. Mudança tecnológica, inovação e treinamento na unidade hospitalar ................ 32 4.5. Bens comercializados com base na experiência de uso e sinal de qualidade ...... 33 4.6. Sistema de certificação do controle de qualidade e incentivo ............................. 35 4.7. Acreditação hospitalar, inovação gerencial e gerência do ambiente hospitalar .. 36 5. Material e Métodos................................................................................................... 40 6. Resultados e Discussão ............................................................................................. 44 6.1. Associação estatística entre educação do paciente e familiar e ambiente hospitalar da UH......................................................................................................... 44 6.2. Influência efetiva e perspectivas de aperfeiçoamento dos fatores componentes da educação do paciente e familiar na gerência do ambiente hospitalar do IPEC .......... 47 7. Conclusões ................................................................................................................. 55 8. Referências Bibliográficas ....................................................................................... 60 9 Lista de Quadros Quadro 1: Acreditação Hospitalar: EMs exemplificativos dos esforços de inovação da educação do paciente e do familiar na UH. .................................................................... 39 Quadro 2: Conformidade dos EMs representativos dos esforços de inovação da educação do paciente e do familiar na UH: IPEC - 2006............................................... 48 Lista de Tabelas Tabela 1: Matriz de Cargas Fatoriais. ........................................................................... 45 Tabela 2: Resultados da Regressão Múltipla. ............................................................... 46 Tabela 3: Frequências absoluta e relativa do Elemento de Mensuração da função educação do paciente e do familiar da UH: IPEC - nov/2006........................................ 49 Lista de Figuras Figura 1: Frequência dos rótulos dados à atividade educativa...................................... 22 Figura 2: Complexo Econômico-Industrial da Saúde - Caracterização Geral. ............. 24 Figura 3: Sistema Nacional de Inovação em Saúde. ..................................................... 26 Figura 4: Arcabouço conceitual para o desempenho hospitalar.................................... 30 10 Lista de abreviaturas, siglas e símbolos ACC Acesso ao Cuidado e Continuidade do Cuidado AH Acreditação Hospitalar ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária AP Avaliação dos Pacientes C Conformidade CBA Consórcio Brasileiro de Acreditação CEIS Complexo Econômico-Industrial da Saúde CP Conformidade Parcial CPa Cuidados ao Paciente CT Custo de Transação DPF Direitos dos Pacientes e Familiares EM Elementos de Mensuração ENSP Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca EPF Educação de Pacientes e Familiares EQP Educação e Qualificação dos Profissionais FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz GAI Gestão da Atividade Inovadora GAS Gerenciamento do Ambiente Hospitalar e Segurança GI Gerenciamento de Informação GLD Governo, Liderança e Direção GUM Gerenciamento e Uso de Medicamentos IPEC Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas JCI Joint Commission International NC Não Conformidade NEI Nova Economia Institucional OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico OMS Organização Mundial da Saúde ONA Organização Nacional de Acreditação OPAS Organização Pan-Americana de Saúde PCI Prevenção e Controle de Infecções PINTEC Pesquisa Industrial sobre Inovação Tecnológica QSP Melhoria da Qualidade e Segurança do Paciente UH Unidade Hospitalar 11 INFLUÊNCIA DA EDUCAÇÃO DO PACIENTE E DO FAMILIAR NO AMBIENTE HOSPITALAR 1. Introdução Com o crescimento econômico e a Reforma do Estado no Brasil, a prestação de serviços de saúde tornou-se uma atividade crescentemente suprida através do mercado. Face ao seu caráter especializado, o crescimento da produção desses serviços depende da efetividade em custo e também da qualidade do serviço prestado, o que tornam necessário, considerá-los como um dos critérios de avaliação das Unidades Hospitalares (UHs). Nessas organizações, no entanto, é comum a dispersão dos microdados - ou seja, o menor nível de desagregação dos dados de uma pesquisa, apresentado nesta dissertação pelas notas dos Elementos de Mensuração (EM) nos relatórios educativos necessários à pesquisa sobre recursos, processos e resultados, bem como o desconhecimento a priori das rotinas das atividades, tornando difícil a sua avaliação pelo observador externo. A participação do paciente e familiar no processo de cuidado e em sua recuperação apresenta-se como um alvo importante das instituições de saúde modernas. Compreender a inter-relação entre o ambiente hospitalar, o paciente e o familiar, em sua internação, é de extrema importância para que se possa aperfeiçoar a contribuição de cada participante indissociável deste processo. Esse ambiente hospitalar quase sempre negligencia as necessidades emocionais do paciente bem como o seu conhecimento da doença. Porém, quando o paciente vê suas necessidades individuais serem satisfeitas e percebe a atenção e o cuidado da equipe, ele se sente mais seguro. Esta sensação de segurança, por sua vez, contribui de forma efetiva para a sua melhora. Lidar com pessoas, com sua dimensão social e subjetiva e não somente biológica, é um desafio para a saúde em geral, inclusive a clínica realizada nos hospitais. Nesta dissertação, portanto, foram utilizadas informações disponíveis nos relatórios educativos da Acreditação Hospitalar (AH) e ainda pouco exploradas na literatura, com vistas a comparar o desempenho das UHs. Com isso pode-se usar 12 medidas quantitativas sobre os esforços de inovação em funções micro-organizacionais das UHs, que sejam reconhecidas como de fonte independente de avaliação e observar sua influência no ambiente hospitalar, de forma a subsidiar a gestão destas organizações e, em particular, a formulação de diretrizes gerenciais para a promoção da educação do paciente e do familiar e da melhoria da qualidade dos serviços de saúde. A AH é um processo de avaliação externa, contratado de forma voluntária pelas UHs, através do qual uma organização, em geral não-governamental, avalia periodicamente se elas atendem um conjunto de padrões de qualidade do cuidado ao paciente que são reconhecidos. Sob a ótica da AH, a educação do paciente e dos familiares ajuda-os a terem o conhecimento e as informações necessárias para que possam participar e tomar decisões sobre o seu cuidado (CBA, 2003). Como um resultado específico da análise, o conhecimento da influência de algumas “funções de organização” examinadas pelos relatórios educativos da AH na gerência do ambiente hospitalar serve de referência da avaliação das soluções a serem propostas com respeito ao Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (IPEC), Unidade Técnico-Científica da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), com vistas ao aperfeiçoamento das características micro-organizacionais relativas à educação do paciente e do familiar nesta UH. Face aos resultados obtidos sobre a associação positiva entre, de um lado, a conformidade aos padrões da AH da capacitação de pessoal, da gerência da informação e da gestão participativa com governabilidade e, de outro, a qualidade do ambiente hospitalar da UH, foi avaliado o efeito da educação do paciente e do familiar na gerência do ambiente hospitalar. O motivo de interesse pelo tema foi a observação, nestes tempos de altas tecnologias e que tanto se discute inovação em saúde, de como os pacientes de modo geral desejam fazer uso dessas inovações tecnológicas, e as formas dos profissionais a utilizarem e, a necessidade de olhar o básico e tão essencial para o ser humano, que é a educação e conhecimento, permitindo ao paciente (re)pensar sobre suas aspirações e expectativas em saúde. Essa dissertação está organizada, além desta introdução, em seis capítulos divididos em assuntos que subsidiam e fundamentam a discussão principal e, ao final, inclui as referências bibliográficas. 13 O próximo capítulo explicita os objetivos geral e específicos da dissertação que buscam, a partir da avaliação da importância da educação do paciente, aperfeiçoar o ambiente hospitalar. No terceiro capítulo se justifica a importância do estudo considerando sua relevância para a gestão participativa entre a administração, os profissionais de saúde e os pacientes e seus familiares e a baixa exploração na literatura da utilização de microdados. O quarto capítulo é dedicado à formulação do marco teórico da análise. Encontra-se dividido em sete subitens que apresentam conceitos relativos à educação em saúde de uma forma mais geral e no ambiente hospitalar, mais especificamente; ao Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS) e inovação organizacional na perspectiva do Manual de Bogotá; comercialização de bens com base na experiência de uso e sinal de qualidade; custos de transação e assimetria de informação. Descrevem-se brevemente os conceitos de certificação de controle de qualidade, AH e gerência do ambiente hospitalar. No quinto capítulo se explicita o material utilizado para pesquisa e o método para sua análise. Foi usada uma amostra de conveniência composta de 33 relatórios de avaliação educativa da AH produzidos pelo Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA), de acesso disponível para este estudo. Esses relatórios foram concluídos entre 2004 e 2009 e realizados em 27 UHs, não-identificadas. Serviram de referência os padrões da AH do Manual de Certificação Hospitalar da Joint Commission International (JCI), que são de dois tipos: Padrões com Foco no Paciente e Padrões de Administração de Instituições de Saúde. Foram usadas técnicas paramétricas para uma análise confirmatória dos dados, que permitiu identificar o tipo de influência exercido pelas funções organizacionais. Para a pesquisa empírica com vistas às contribuições gerenciais relativas às características micro-organizacionais da Educação do Paciente e Familiar (EPF) foi elaborado um quadro com os Elementos de Mensuração (EM) relativos à EPF, a partir do relatório de avaliação educativa do IPEC, realizado pelo CBA, em novembro de 2006. O sexto capítulo apresenta a análise estatística confirmatória da hipótese sobre a influência da educação do paciente e do familiar na gerência do ambiente hospitalar. Explora os resultados dos relatórios educativos da AH para discutir contribuições 14 gerenciais sobre o aperfeiçoamento da educação do paciente e familiar e melhoria do ambiente hospitalar do IPEC. No sétimo capítulo é feita uma síntese das questões levantadas tentando estabelecer uma relação entre funções organizacionais a priori levantadas e sua influência no ambiente hospitalar. São feitas, ainda, considerações sobre função EPF que se espera poder contribuir na gerência do Hospital do IPEC com respeito a essa função. 15 2. Objetivos 2.1. Objetivo geral Analisar os efeitos das características organizacionais e funções gerenciais relativas a tamanho, tipo de propriedade, capacitação do pessoal, educação do paciente e do familiar, gestão participativa com governabilidade e gerência da informação na qualidade do ambiente hospitalar da UH e avaliar a importância da educação do paciente e do familiar para propor esforços de inovação de características organizacionais de educação do paciente e do familiar, com vistas a aperfeiçoar o ambiente hospitalar. 2.2. Objetivos específicos a) caracterizar os esforços de inovação relativos à educação do paciente e do familiar e a sua influência na qualidade do ambiente hospitalar; b) avaliar a influência dos esforços de inovação relativos à educação do paciente e do familiar na qualidade do ambiente hospitalar; c) extrair contribuições gerenciais relativas à educação do paciente e do familiar; d) avaliar a influência dos esforços de inovação relativos à capacitação profissional na qualidade do ambiente hospitalar; e) avaliar a influência dos esforços de inovação relativos à gestão participativa com governabilidade na qualidade do ambiente hospitalar; f) avaliar a influência dos esforços de inovação relativos à gerência da informação e da comunicação na qualidade do ambiente hospitalar; g) avaliar a influência do tipo de propriedade na qualidade do ambiente hospitalar; h) avaliar a influência do tamanho na qualidade do ambiente hospitalar; e i) produzir contribuições gerenciais para a melhoria do ambiente hospitalar do IPEC como resultado do aperfeiçoamento da função gerencial de educação do paciente e do familiar da UH. 16 3. Justificativa Na área da saúde receber o cliente que vem em busca de assistência envolve os aspectos comerciais, culturais, receptivos, além de toda infraestrutura específica oferecida pelo hospital. O paciente vem em busca de tratamento, de médicos e de enfermagem competentes, mas ele também deseja qualidade, segurança e conforto no seu período de internação. É a partir dessa necessidade do paciente que o hospital deve se adaptar e buscar um ambiente acolhedor e menos hostil. Mas, para isso não bastam apenas mudanças na estrutura física do hospital, tornam-se indispensáveis mudanças na estrutura organizacional. Segundo o Ministério da Saúde (2000), harmonizar “é garantir à palavra a sua dignidade ética”. Essa linguagem precisa ser decodificada, ou seja, o outro deve reconhecer o seu significado. No ambiente hospitalar, dor e sofrimento precisam ser reconhecidos e compreendidos de maneira humanizada, pois só assim o paciente percebe que todos no hospital têm um objetivo comum, atendê-lo bem. Esta preocupação deve levar em consideração a necessidade de saber falar e ouvir o outro, respeitando as diferenças existentes. Enfim, deve ser uma constante procura de meios que facilitem a comunicação entre as pessoas. No processo de AH, na função EPF, “a educação ocorre quando o paciente interage com seu médico ou com o corpo de enfermagem” (CBA, 2003). Esse momento pode influenciar positivamente o ambiente hospitalar. Daí o interesse em poder estudar esta relação, por meio dos relatórios educativos da AH na função EPF. Ainda que pouco explorada na literatura, a utilização de microdados para o estudo da inovação organizacional na UH e para a avaliação comparativa de organizações do tipo almejado nesta dissertação, justifica-se uma vez que as UHs são organizações peculiarmente complexas devido à diversidade de produtos e serviços que as UHs utilizam e proporcionam à sociedade, seja na forma de assistência, seja na forma de conhecimentos científicos de qualidade. Organizações com esse perfil defrontam-se, no entanto, com dificuldades críticas de obter e manter dados básicos com abrangência significativa, assim como de construir inventários (de estoques e de fluxos) de recursos e de resultados de forma exaustiva, razoavelmente precisa e sistemática. 17 Consequentemente, a obtenção de medidas diretas de avaliação de efetividade organizacional, como as medidas de cumprimento dos padrões de qualidade que são estabelecidos pelo sistema de certificação do controle da qualidade da AH e monitoradas por meio dos relatórios educativos da AH, visa evitar que a avaliação comparativa das UHs fique comprometida, ou tenha o seu escopo excessivamente circunscrito à disponibilidade de informações. Tratando-se de serviços de saúde, a avaliação do desempenho do produtor e a sua comparação com os seus concorrentes não pode considerar só os seus preços; precisa também levar em conta a qualidade dos serviços que ele comercializa no mercado. Isso porque, praticamente todas as relações de troca, tanto as que ocorrem entre as UHs, como as que ocorrem entre os agentes econômicos no interior destas unidades – produtores ou consumidores envolvem custos adicionais aos do preço que é pago pelo serviço objeto da transação (DJELLAL; GALLOUJ, 2005, p. 818). Quando o usuário deseja serviços escolhidos com base na experiência de uso, do tipo dos serviços de saúde, tem que investir tempo e fazer despesas para avaliar a qualidade da assistência que lhe é oferecida, assim como o prestador do serviço depende de informações sobre os pacientes de que ele não dispõe e que não consegue obter com facilidade nestas ocasiões, como está explicitado no capítulo 4, subitem 4.4. Em ambos os casos surgem dificuldades para concretizar um acordo entre as partes envolvidas na transação do serviço. Tais dificuldades introduzem ineficiências na relação de atendimento que não existiriam se o conhecimento necessário fosse disponível sem custos. Nas aplicações da teoria do consumidor às condições da concorrência em mercados imperfeitos de bens e serviços é destacado que esses ‘custos de transação’ incorridos na conciliação dos interesses entre os produtores e os consumidores de fato existem, e que uma parcela relevante deles decorre das ‘assimetrias’ entre as informações sobre a qualidade de que os produtores e consumidores dispõem no momento da transação (ENGEL, 1995, p. 9). Os custos de transação podem, além disso, ser tipicamente altos em alguns mercados, impedindo as transações entre as partes e, em alguns casos, bloqueando completamente a formação do mercado. 18 Diante das dificuldades daí decorrentes para o desenvolvimento das atividades econômicas, ganha destaque, então, a informação adequada sobre a qualidade do bem ou serviço ao consumidor. A avaliação do desempenho das organizações públicas de prestação de serviços, em particular, apresenta pelo menos três traços que traduzem a sua complexidade e, por isso mesmo, conferem interesse acadêmico à dissertação: (1) utilizam múltiplos insumos e funcionam sob limitação orçamentária, de modo que faz todo o sentido avaliar como são empregados esses recursos variados, porém limitados; (2) frequentemente, para os serviços prestados, não existem “preços de mercado” que pudessem servir como sinalizadores da alocação de recursos, ao contrário do que ocorre na contabilidade gerencial privada, configurando, neste sentido, mais um desafio à avaliação do desempenho organizacional; e (3) são organizações multipropósito, para as quais existem não somente dificuldades de mensuração de resultados, mas nas quais também pode acentuar-se o problema da subotimização por dificuldades de coordenação. Face ao aguçamento do fenômeno da crescente judicialização das transações e aos limites da regulamentação de tipo comando e controle no mercado de serviços de saúde a dissertação pode, em primeiro lugar, trazer uma contribuição objetiva para a percepção da influência da educação do paciente e do familiar na redução dos custos de transação do ambiente hospitalar. Pode, em segundo lugar, sugerir aplicações a respeito dos mecanismos operacionais passíveis de serem acionados para a gestão das tensões entre a administração, os profissionais de saúde e os pacientes e familiares nas UHs. 19 4. Marco Conceitual O marco de referência da análise está fundamentado em conceitos da literatura sobre educação em saúde e economia da gestão, tais como: a participação do usuário durante a prestação de serviço de saúde (CAMPOS, 1997); a construção de sujeitos autônomos ((SCHIMITH; LIMA, 2004); a função da organização na Nova Economia Institucional (NEI) (NORTH, 1994); a natureza da inovação (DJELLAL; GALLOUJ, 2005) no CEIS (GADELHA, 2003); o contexto de ajuste mútuo e de falha de governabilidade na Teoria das Configurações (MINTZBERG, 1995); a abrangência da inovação organizacional conforme a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) (TIGRE, 2006), o Manual de Bogotá (RICYT/OEA/CYTED, 2001) e Birkinshaw, Hamel e Mol (2005); a busca de vantagem competitiva através do treinamento dos funcionários (BATESON; HOFFMAN, 2001); a certificação da qualidade (ENGEL, 1995); e a satisfação do consumidor pela qualidade (IACOBUCCI et al., 2004). 4.1. Educação do paciente e do familiar A educação em saúde pode ser definida como um campo multifacetado para o qual convergem diversas concepções, tanto da área da educação quanto da área da saúde, que retratam diferentes concepções de mundo, de acordo com distintas posições político-filosóficas sobre o homem e a sociedade (SHCHALL; STRUCHINER, 1999). Apesar dessa definição, ainda persiste, na prática, a educação em saúde ser vista como a transmissão de conhecimentos, de alguém detentor do conhecimento, para alguém sem conhecimentos. Esse problema denota, ainda, apesar de esforços em contrário, uma acentuada ênfase no biologismo, com profunda raiz, o que não só restringe a visão dos outros horizontes, como cria sérias dificuldades pelo seu sentido unilateral. Durante o período higienista (final do século XIX e início do século XX) não se percebe a preocupação com a educação em saúde, pois, ao se atribuir a doença a um agente específico, bastava eliminar o causador e a saúde estaria restabelecida. A transmissão de informações era uma das poucas atividades educativas relacionadas à saúde. Somente no início dos anos 40, com a criação do Serviço Especial de Saúde, no Brasil, inicia-se uma nova fase onde a educação sanitária é reconhecida como uma atividade básica e se atribui a vários profissionais a sua responsabilidade. A população ainda continua a ser considerada como passiva e incapaz de iniciativas próprias. 20 A partir dos anos 60, com o novo enfoque trazido pela medicina comunitária, que prioriza a participação ativa e consciente dos indivíduos e grupos sociais, inicia-se uma nova mudança. A maioria das intervenções em saúde pode envolver interação, direta ou não, entre sujeitos (profissional e usuário), o que implica em ações pedagógicas que podem se dar de forma autoritária (como historicamente esteve presente em várias abordagens da Saúde Pública), ou pode se revestir de uma concepção interpretativa sobre o processo saúde-doença. Campos (1997) afirma que o vínculo dos usuários com o serviço de saúde amplia a eficácia das ações de saúde e favorece a participação do usuário durante a prestação de serviço. Esse espaço deve ser utilizado para a construção de sujeitos autônomos, tanto profissionais quanto pacientes, pois não há construção de vínculos sem que o usuário seja reconhecido na condição de sujeito, que fala, julga e deseja (SCHIMITH; LIMA, 2004). Assim, podemos superar a visão centrada em conhecimentos biológicos aliados às técnicas pedagógicas voltadas apenas para a transmissão de conhecimentos não pertinentes às necessidades sociais e desvinculadas das condições de vida dos indivíduos, que fazem com que as informações fornecidas pelos profissionais, geralmente, consideradas essenciais por estes, não sejam informações consideradas necessárias pelo próprio paciente (FALVO, 2004). Em nível conceitual, a atividade educativa tem recebido diferentes denominações, e em alguns trabalhos, dois ou três nomes são utilizados. Entre as denominações utilizadas, o rótulo orientação, como mostra a Figura 1, encontra-se citado com maior frequência (38,57 %), seguido de educação em saúde (21,43%), ação educativa (11,43%) e aconselhamento na saúde (4,29%). O conteúdo informativo dos programas educativos apresentados foi classificado em dois tipos: informações processuais e sensoriais, ambos com conteúdos sobre a doença e não da visão da saúde (MELLES; ZAGO, 1999). 21 Figura 1: Frequência dos rótulos dados à atividade educativa. Orientação Sistematizada 2,86% (2) Orientação Planejada 1,43% (1) Processo Educativo Treinamento do Ação Educativa Aconselhamento na 5,71% (4) 11,43% (8) Paciente Saúde 1,43% (1) 4,29% (3) Educação 2,86% (2) Educação do Paciente 1,43% (1) Educação em Saúde 21,43% (15) Orientação 38,57% (27) Educação Popular 1,43% (1) Ensino 4,29% (3) Educação Sanitária 2,86% (2) Fonte: Adaptado de MELLES; ZAGO, 1999 Para Zago (1994 apud MELLES; ZAGO, 1999), a desvantagem da prática ritualística da orientação está na negação do paciente como agente ativo do processo com sua singularidade e suas necessidades específicas de aprendizagem, tendente a ser excluída do processo ou pouco considerada. A educação do paciente é uma experiência planejada, que usa uma combinação de métodos como ensino, aconselhamento e técnicas de modificação do comportamento que influenciam o conhecimento do paciente e, consequentemente, o seu comportamento de saúde (BARTLETT, 1985). Para a mesma autora, aconselhamento é um processo individualizado que envolve soluções de problema colaborativo para ajudar o paciente a melhor lidar com o problema da saúde No internamento do paciente, as relações existentes entre este e os profissionais criam uma negociação visando à identificação de suas necessidades e uma busca de produção de vínculo. É necessário ampliar o foco para além da doença, agregando a esta também situações que ampliam o risco ou vulnerabilidade das pessoas. O Ministério da Saúde (BRASIL, 2007) tem a proposta da clínica ampliada, que visa o compromisso com o sujeito, assumindo a responsabilidade sobre ele, buscando a 22 intersetorialidade, reconhecendo os limites de conhecimento e das tecnologias usadas que são baseadas em princípios éticos. Desse modo, a ampliação mais importante, contudo, seria considerar que, concretamente, não há problema de saúde ou doença sem que esteja encarnado em sujeitos, em pessoas. Os pacientes são consumidores diretos e imediatos do hospital, mas a família do paciente está também envolvida e influencia a visão deste de si mesmo e do que é esperado (BELL; ZUCKER, 1968). Segundo Corraliza (1998), um dos processos mais relevantes da interação indivíduo-ambiente está relacionado à conversão do espaço físico em um espaço significativo para o paciente. Santos e Silva (2002) lembram, por sua vez, que a educação desempenha papel de destaque na equipe multidisciplinar, para a promoção do autocuidado no sujeito. A educação para o autocuidado enfoca as necessidades e objetivos do sujeito, promovendo um aumento do vínculo do paciente com a instituição e com os profissionais que atuam nesta atividade. Além disso, proporciona um momento de troca de experiência com outros usuários do serviço de saúde e, consequentemente, redução da ansiedade relacionada ao período de internação, entre outras dúvidas comuns que ocorrem neste período. Assim, essa troca de experiências e de conhecimento entre os profissionais de saúde, pacientes e seus familiares, voltada à condição de saúde do paciente como um sujeito, pode ter um impacto positivo para a sua recuperação durante o seu período de internação e após sua alta. A construção de uma função gerencial de educação do paciente e do familiar deve ampliar o grau de autonomia dos usuários para compreenderem e atuarem sobre si mesmos e sobre o mundo da vida. O grau de autonomia pode ser medido pela capacidade de autocuidado, de compreensão sobre o processo saúde/enfermidade e pela capacidade de usar o poder de estabelecer compromissos e contratos com outros. A educação inclui os conhecimentos necessários durante o processo do cuidado e aqueles após a alta do paciente e sua transferência para outro local de cuidado ou para sua residência. A educação efetiva em uma instituição emprega os formatos eletrônicos e visuais disponíveis e uma variedade de técnicas, como ensino à distância e outras (CBA, 2008). 23 4.2. Complexo Econômico-Industrial da Saúde, unidade hospitalar e inovação organizacional As atividades de assistência e de desenvolvimento científico e tecnológico na área da saúde estão inseridas num contexto produtivo e econômico que conforma o CEIS, que apresenta relações de interdependência entre as diversas atividades econômicas, a saber: • o subsistema de base química e biotecnológica, envolvendo a indústria farmacêutica, de vacinas, hemoderivados e reagentes para diagnóstico; • o subsistema de base mecânica, eletrônica e de materiais, envolvendo as indústrias de equipamentos médico-hospitalares e materiais médicos; e • o subsistema de serviços, envolvendo a produção hospitalar, laboratorial e serviços de diagnóstico e tratamento (Figura 2). Figura 2: Complexo Econômico-Industrial da Saúde - Caracterização Geral. Setores industriais Indústrias de base química e biotecnológica • Fármacos e medicamentos • Vacinas • Hemoderivados •Reagentes para diagnóstico Indústrias de base mecânica, eletrônica e de materiais • Equipamentos mecânicos • Equipamentos eletroeletrônicos • Próteses e órteses • Materiais de consumo Setores prestadores de serviço Hospitais Ambulatórios Serviços de diagnóstico e tratamento Fonte: (GADELHA, 2003) A conceituação do CEIS ressalta, portanto, a relação entre inovações, estruturas produtivas e serviços de saúde cuja interdependência na evolução dos paradigmas tecnológicos aponta o caráter sistêmico deste Complexo Produtivo (GADELHA, 2003). 24 Essa relação evidencia uma dinâmica de compra e venda na cadeia produtiva, com fortes interações na geração e difusão de conhecimento, nas relações políticas e nas estratégias competitivas vigentes. A saúde, dessa forma, pode ser vista como um espaço econômico interdependente que configura um sistema de inovação (conhecimento transformado em bens e serviços) e um sistema produtivo, com alto potencial de geração de conhecimentos e uma base econômica setorial de alta importância - o consumo de massa e a presença do Estado na sua regulação e promoção. Esse conceito de CEIS procura captar, ao mesmo tempo, a dimensão sanitária e econômica, numa perspectiva de pensar a interação entre saúde e desenvolvimento, ou seja, uma relação que vai além da concepção de um sistema de atenção adequado e nos remete, também, para uma inserção estratégica de desenvolvimento que privilegie, ao mesmo tempo, a atenuação da dependência econômica em áreas estratégicas no contexto atual, tais como as de equipamentos eletrônicos, biotecnologia e novos materiais. A não observação desta relação fez com que este complexo se configurasse sem considerar o seu caráter sistêmico, prejudicando a entrega de bens e serviços de saúde com resultado social e econômico insatisfatório. Nesta perspectiva, ao invés da saúde ser considerada apenas como um “problema” a ser enfrentado com mais despesa e aumento de sua eficiência, passa a ser vista como uma parte da solução que abre frentes de expansão econômica e de geração de renda e emprego em segmentos de alta densidade de conhecimento e de inovação, como é o caso da biotecnologia, da química fina, da eletrônica e dos novos materiais. No Sistema Nacional de Inovação, o CEIS encontra-se como o local deste sistema produtivo ocupado pela empresa (setores industriais e serviços de saúde) como agente transformador do conhecimento em inovação. Essa concepção nos permite ressaltar a interface entre sistemas e políticas voltadas ao “desenvolvimento econômico como processo de mudança social pelo qual o crescente número de necessidades humanas, pré-existentes ou criadas pela própria mudança, são satisfeitas através de uma diferenciação no sistema produtivo, gerado pela introdução de inovações tecnológicas” (FURTADO, 1964, apud GADELHA, 2005). O grande desafio estratégico é justamente o de viabilizar uma expansão e transformação articulada de todo o sistema produtivo da saúde para permitir o atendimento, a um só tempo, da expansão das ações e serviços de saúde com o 25 desenvolvimento do potencial nacional produtivo e de inovação. A configuração sistêmica do CEIS no Brasil permite, portanto, se desenhar perspectivas políticas articuladas de médio e longo prazo. A Figura 3 apresenta o Sistema Nacional de Inovação em Saúde, identificando a estrutura do seu sistema produtivo, o sócio-institucional e político que o envolve. Figura 3: Sistema Nacional de Inovação em Saúde. Estado 1 Complexo econômicoindustrial da saúde Sociedade Serviços civil de saúde organizada Instituições 2 Setores industriais População Fonte: GADELHA; MALDONADO, 2007 1. Incorpora relações de poder, estrutura decisória, e a formulação e implementação de políticas implícitas e explícitas. 2. Desde instituições formais de C&T e de educação, agências de fomento, órgãos de financiamento, entre outras, até de normas de conduta institucionalizadas na sociedade. Sob a perspectiva da dinâmica do CEIS, a inovação organizacional na UH é um tema desafiador na literatura econômica, face às dificuldades envolvidas em: (a) representar esta organização econômica; (b) caracterizar a inovação na unidade de produção em geral e a produção da UH em particular; (c) mapear a inovação organizacional; e (d) compreender a inovação neste setor para além da lógica organizacional-administrativa ou da mera dependência da absorção de tecnologia da indústria. 26 Algumas contribuições mais recentes sobre a inovação na UH merecem ser, a propósito, destacadas, a saber, (a) os agentes econômicos não contam, de fato, com informação completa para tomar decisões sobre suas transações no mercado de serviços de saúde; (b) o conhecimento sobre a natureza diversificada da produção e da inovação na UH é necessário ao conhecimento das causas da inovação na UH; e (c) os resultados da pesquisa empírica devem subsidiar a formulação de modelos teóricos sobre o desenvolvimento da inovação organizacional (DJELLAL; GALLOUJ, 2005). Como destacam os autores da chamada Teoria do Crescimento Endógeno por sua vez, o conhecimento tratado como “bem livre”, a inovação exógena, a eficiência absoluta e a ausência de desequilíbrios com ineficiência no curto prazo são hipóteses equivalentes à hipótese de informação completa na construção do modelo de equilíbrio da firma em concorrência perfeita no curto prazo (ROMER, 1994). O custo da informação, em particular, implica no reconhecimento da presença de estruturas de organização interna que substituem a regulação do mercado e a regulamentação (HARRIS, 1977), das eventuais ineficiências na escolha de técnicas (OZCAN, 2008), da heterogeneidade tecnológica, do aprendizado, da inovação adaptativa (DJELLAL; GALLOUJ, 2005, p. 829) e da inovação incremental – todas estas premissas devem então incorporar-se à axiomática dos modelos de determinação da firma em concorrência imperfeita. Em particular, o custo da informação incorpora o custo da chamada “sinalização da qualidade” (ENGEL, 1995), que é incorrido pelo produtor para viabilizar a comercialização dos bens cujo consumo depende da experiência de uso. Durante o processo de produção de serviço ocorre um encontro que vai impactar a percepção total da qualidade de um serviço. Segundo Grönroos (1995, p.55), esses momentos representam oportunidades para o prestador de serviço demonstrar ao cliente a qualidade de seus serviços. É quando o cliente sente o serviço acontecendo. Segundo a representação em Djellal e Gallouj (2005, p. 820), por exemplo, a UH é um “prestador de serviço e ponto focal (hub) do sistema de saúde”, cuja produção é uma atividade complexa. Como ressalta Gradey (2001), cada serviço é frequentemente prestado a partir da interação de diferentes operações de serviço. Neste sentido, o resultado esperado pelo cliente, as características do serviço esperado, são valores buscados a partir de um processo de produção multifuncional. A inovação tem um espectro mais amplo nesse tipo de organização multiprodutora: pode ser de natureza tecnológica, organizacional ou de produtos e serviços; pode ser de grau de novidade absoluto ou relativo – inovação radical, incremental ou adaptativa; e é extensiva quanto à sua origem, ou seja, é desenvolvida internamente ou obtida de fonte externa. 27 Quanto à inovação organizacional, em particular, Birkinshaw, Hamel e Mol (2005) concluem que é limitada a contribuição da literatura sobre suas diferentes formas e processos constituintes e sobre seu elo com a inovação tecnológica, e formulam, então, o seu modelo teórico sobre inovação organizacional a partir do estudo de sua natureza e de suas causas. Examinando as causas da inovação organizacional, por seu turno, propõem conceituar o estágio inicial como resultado do ajustamento do “mercado de práticas e ideias de gestão”. Do lado da demanda, o usuário das práticas de gestão, sujeito à “racionalidade limitada”, substitui ou não as “melhores práticas”, já incorporadas à “moda da gestão” no seu ambiente institucional pela experimentação interna, com vistas a preencher uma defasagem percebida entre o desempenho corrente e o desempenho potencial de sua firma com a introdução de novas práticas de gestão que concorram para estender seus objetivos e metas. Os fornecedores de práticas e ideias de gestão incluem as organizações de comunicação de massa, os formadores de opinião, os acadêmicos e os consultores, que são os responsáveis pelo estabelecimento da “norma de racionalidade da indústria” nesse mercado que consideram sujeito a “falhas”, até tornálas aceitáveis e apropriadas às necessidades dos usuários (BIRKINSHAW; HAMEL; MOL, 2005, p. 27-33, 36). Face, então, às relações existentes entre os diferentes tipos de inovação, sob condições de informação incompleta: a confirmação de que certos tipos de inovação organizacional contribuem mais para a criação de vantagens competitivas ainda depende de novas evidências que permitam separar suas consequências em termos do impacto no desempenho da firma inovadora, do impacto do processo de difusão nas organizações e dos benefícios para a sociedade como um todo (BIRKINSHAW; HAMEL; MOL, 2005, p. 44). Para distinguir uma inovação na gestão, três fatores são propostos por Birkinshaw et al. (2008): i) é impossível proteger por patente uma inovação na gestão; ii) poucas organizações têm conhecimentos especializados neta área de estudo, assim como os possuem na gestão tecnológica e iii) a introdução de algo novo cria ambiguidade e incerteza para os indivíduos em uma organização. A referência conceitual e metodológica mais utilizada para analisar o processo de inovação é o Manual de Oslo, desenvolvido pela OCDE. Ele permite a comparação de estatísticas internacionais e serve como base para a pesquisa da União Europeia sobre inovação. No Brasil inspirou a Pesquisa Industrial sobre Inovação Tecnológica 28 (PINTEC). Ambas monitoram três tipos de inovação: produtos, processos e mudanças organizacionais (TIGRE, 2006, p.72). Nesse Manual, a política de inovação é considerada como uma ligação entre a política científica e tecnológica e a industrial. A inovação é mais enfocada em termos de interação entre oportunidades de mercado e a base de conhecimentos e as competências das empresas. O Manual, entretanto, identifica a inovação mais com a inovação tecnológica, ou seja, com a geração de novos produtos e processos no âmbito do setor produtivo, dando pouca atenção às inovações organizacionais e às inovações nos serviços (CONDE; ARAÚJO-JORGE, 2003). O Manual de Bogotá (RICYT/OEA/CYTED, 2001) tem como referência os países em desenvolvimento e mais particularmente, os países da América Latina e Caribe. Este manual apresentou uma adaptação do Manual de Oslo às especificidades desses países. A acumulação de mudanças menores e de pequenas inovações pode ter grande impacto em produtos e processos e essas mudanças incrementais desempenham, nos países em desenvolvimento, um papel tão importante quanto as radicais (RICYT/OEA/CYTED, 2001). O Manual de Bogotá sugere a introdução do conceito de Gestão da Atividade Inovadora (GAI) que inclui não somente a inovação em sentido estrito, mas também o conjunto de atividades constitutivas do esforço tecnológico. A GAI tem, entre suas premissas, o reconhecimento da necessidade de dar uma maior importância aos mecanismos de reconversão, como modernização organizacional, monitoramento, avaliação e adoção de adaptação tecnológica. 4.3. Organização, estrutura hierárquica e governabilidade na unidade Os hospitais, sobretudo os que pertencem ao âmbito público, são organizações que traduzem os arranjos institucionais expressos no ambiente externo pelas leis, pelas instituições políticas e pelas normas para a provisão de bens e serviços públicos (Ministério da Saúde, 1999). Os arranjos organizacionais (ambiente organizacional) vão responder aos incentivos produzidos pelo ambiente externo. É no ambiente interno que se observa a influência dos ambientes anteriores. Dessa forma, o resultado do desempenho hospitalar 29 (qualidade no tratamento, equidade, eficiência) é o conjunto direto dessas três esferas, conforme ilustrado na Figura 4 (LA FORGIA; COUTTOLENC, 2008). Figura 4: Arcabouço conceitual para o desempenho hospitalar. Ambiente organizacional (arranjos organizacionais e de governança) Ambiente interno Práticas de gestão Estruturas Processos Desempenho organizacional (Resultados, eficiência, qualidade, equidade, satisfação dos pacientes) Ambiente externo (políticas, regulamentos, mercados e sistemas de pagamentos) Fonte: LA FORGIA; COUTTOLENC, 2008 A Nova Economia Institucional, por seu turno, sustenta que o desempenho econômico está fortemente associado à função e à evolução das instituições (NORTH, 1994). Especifica que, em uma sociedade, as instituições constituem as regras de um jogo em que os “jogadores” são as organizações, tais como as firmas e os consumidores (GARCIA; GOLDBAUM, 2001): as instituições representam os limites estabelecidos pela sociedade para disciplinar as interações humanas, enquanto que as organizações são compostas de grupos de indivíduos dedicados a alguma atividade executada com determinado fim (NORTH, 1994). Como decorrência, vale sublinhar, as instituições podem ser restrições formais ou informais, ou, ainda, ser os mecanismos responsáveis pelo cumprimento dessas regras e restrições (GARCIA; GOLDBAUM, 2001), enquanto as organizações surgem da estrutura institucional de uma sociedade e passam a interagir com outras organizações, com as próprias instituições e com as restrições de ordem econômica. As 30 agências reguladoras, as firmas, as cooperativas, os clubes, os hospitais, as escolas e as universidades são exemplos de organizações (NORTH, 1994). O conceito de custo de transação (CT) de Arrow (1969) define que estes são os custos associados à administração do sistema econômico. Para o autor, os custos de produção formam a variável de que se ocupou detidamente a Economia Neoclássica, os CT caracterizam-se por serem aqueles que ocorrem ao se colocar em funcionamento o sistema econômico. Coase (1980) assinala, por sua vez, que os resultados neoclássicos sobre mercados eficientes só são obtidos quando não há custos de transação e que as instituições passam a adquirir importância quando estes são consideráveis. Assim, a existência de mercados eficientes de produtos e de fatores, necessários ao crescimento econômico, será viabilizada por um conjunto de instituições políticas e econômicas que ofereçam transações de baixo custo (NORTH, 1994). Sob a ótica da NEI, portanto, o fator decisivo para o desempenho econômico não é o avanço tecnológico ou a acumulação de capital, mas as regras ou arranjos institucionais que estimulam ou inibem as transações neste sentido (NORTH; THOMAS, 1973). Para que a eficiência econômica seja duradoura, é essencial haver instituições que se adaptem às novas oportunidades, ofereçam incentivos para a obtenção de conhecimento e instrução, promovam inovações, e estimulem a disposição de correr riscos e a criatividade (NORTH, 1994). Segundo a Teoria das Configurações (MINTZBERG, 1995), por sua vez, a configuração da organização interage com diversos outros aspectos organizacionais, tais como a forma de gestão, as relações de poder, os mecanismos de coordenação e os parâmetros de desenho, assim como com a efetivação das formas de padronização, considerada particularmente importante, para eliminar aquelas dificuldades de organização interna das UHs mais persistentes dentre as identificadas na literatura (HARRIS, 1977). O ‘ajuste mútuo’ entre a administração e os prestadores de serviços clínicos da UH (HARRIS, 1977) depende da governabilidade por meio, por exemplo, de instâncias deliberativas e consultivas substitutas da supervisão direta, estruturadas na forma de colegiados de gestão participativa da organização (MINTZBERG et al., 2006, p. 187). 31 4.4. Mudança tecnológica, inovação e treinamento na unidade hospitalar Quanto ao efeito do avanço científico e da mudança tecnológica na pesquisa biomédica, pode-se afirmar que as grandes descobertas, aquelas que levam a um salto de desenvolvimento e a uma cura diferenciada, são relativamente poucas, como é o caso de certas vacinas, dos transplantes de órgãos, de um novo medicamento e de novos procedimentos diagnósticos. Persiste, sim, a busca de inovação incremental que, de tempos em tempos, leva a uma evolução em sua prática. O volume de informações geradas nesta busca tornou a atualização da prática médica mais rápida nos últimos anos. Inúmeros estudos, com resultados por vezes conflitantes, são publicados. Esses novos métodos de atendimento, por sua vez, introduzem novos riscos para os pacientes e custos cada vez maiores, tornando a medicina cada vez mais complexa e transformando a atualização em uma tarefa a ser perseguida pelo esforço individual e coletivo, acionando meios institucionais e requerendo o desenvolvimento de estruturas organizacionais apropriadas. Diante da dificuldade para padronização do atendimento com que se defronta, o corpo médico empenha a reputação dos seus membros como especialistas e, sendo independente o seu compromisso com o paciente, reivindica soberania na elaboração do protocolo clínico, com vistas à eficácia do atendimento. Dessa forma, as regras internas, formais e informais, que regem a alocação de recursos em uma UH são complexas. Além disso, a influência dessas regras na escolha de técnicas com mais amplitude de tratamento muitas vezes prevalece em detrimento de protocolos clínicos mais efetivos em custo (HARRIS, 1977). Nesse contexto, uma UH é uma organização complexa – “architectural in nature” (DJELLAL; GALLOUJ, 2005, p. 826) - devido à pauta diversificada de produtos e serviços, de forma que os estudos recentes associam a percepção da qualidade do serviço de saúde prestado, condicionada pela experiência de uso (ENGEL, 1995), à preocupação de introduzir novos processos de gerência da informação para monitorar e coordenar as atividades de assistência em situações de informação incompleta, visando a eficácia da gestão na UH - “target of measurement” (DJELLAL; GALLOUJ, 2005, p. 829). Além disso, associam, ainda, o aumento dos custos decorrentes da mudança tecnológica na assistência a partir dos anos 70 (UBEL, 1999) à busca de eficiência e à utilização de recursos especializados de assistência multiprofissional na UH. No mercado de saúde, em especial, “a omissão frente a aspectos referentes ao desenvolvimento dos recursos humanos é tender à negligência na prestação de qualquer 32 dos seus tipos de serviço que lhe são potencialmente atribuíveis.” (MALIK, 1992). Funcionários adequadamente preparados para o trabalho, que possuam atitude adequada em relação ao serviço e que saibam aproveitar com eficácia o suporte de sistemas, de tecnologias, dos demais prestadores de serviços internos e de seus gerentes e supervisores, são uma das condições para o sucesso de uma organização. Desse modo, é estratégico o estabelecimento de práticas que visem assegurar que os funcionários contribuam para o desempenho externo da organização, apesar do desenvolvimento da tecnologia de informação e do crescimento dos serviços de alta tecnologia (GRÖNROOS, 2003). Para Lovelock e Wright (2004), capacitação significa dotar os funcionários das habilidades, das ferramentas e dos recursos de que necessitam para utilizar seu próprio arbítrio profissional com confiança e eficácia. Cenzo e Robbins (1996) afirmam, por sua vez, que o treinamento pode envolver uma mudança de habilidades, conhecimento, atitudes ou comportamento. O propósito do treinamento é aumentar a produtividade do funcionário em seu cargo, influenciando seu comportamento (CERTO, 1994), fazendo-o contribuir melhor para os objetivos organizacionais, ou seja, é uma via para um melhor desempenho competitivo (BATESON; HOFFMAN, 2001). Isso significa mudar o que os funcionários conhecem, como trabalham, suas atitudes perante o trabalho ou suas interações com os colegas ou supervisor. 4.5. Bens comercializados com base na experiência de uso e sinal de qualidade Já no que diz respeito à decisão do consumidor, a maioria dos autores postula que a sua satisfação para com um serviço é função da qualidade percebida, e, por conseguinte, da disparidade entre a expectativa prévia do consumidor e sua percepção quanto à utilização do produto ou serviço (IACOBUCCI et al., 2004; BATESON; HOFFMAN, 2001). Aquilo que se entrega ao consumidor não é um objeto, mas um desempenho, uma performance, que não pode ser sentida, tocada ou experimentada da mesma forma que se faz com todos os bens tangíveis. Quanto aos serviços escolhidos com base na experiência de uso, por exemplo, surgem dificuldades para concretizar um acordo entre as partes envolvidas na transação. Tais dificuldades introduzem ineficiências na relação de atendimento, que não existiriam se a informação necessária fosse disponível sem custos. Segundo os pressupostos da economia da informação (ENGEL, 1995), quando deseja serviços com essas características, o usuário tem que investir tempo e fazer despesas para avaliar a 33 qualidade do que lhe é oferecido, assim como o prestador do serviço depende de informações sobre os usuários de que ele não dispõe e que não consegue obter com facilidade nestas ocasiões. Nas aplicações da teoria do consumidor às condições da concorrência em mercados imperfeitos de bens e serviços é destacado que esses custos de transação de fato existem e que uma parcela relevante deles decorre das ‘assimetrias’ entre as informações de que os produtores e consumidores dispõem no momento da transação (ENGEL, 1995, p. 9). O grande desafio que a informação assimétrica impõe é a formulação de contratos completos que busquem minimizar as perdas de bem-estar decorrentes deste tipo de problema. O mercado de saúde apresenta características bastante peculiares e é cercado por algumas falhas de mercado, basicamente relacionadas à assimetria de informações entre administração, médicos, usuários, familiares e demais profissionais da área. Apresenta ainda uma demanda irregular, imprevisível e se comporta de maneira diferenciada em relação à demanda de outro bem qualquer. Os custos de transação podem, além disso, ser muito altos em alguns mercados, impedindo as transações entre as partes e, em alguns casos, bloqueando completamente a formação do mercado. Os custos de transação estão associados aos custos relativos ao planejamento, à adaptação e ao monitoramento da execução de ações em diferentes estruturas de governança; aos custos para medir os atributos do que está sendo negociado e aos custos de proteger os direitos de propriedade e monitorar e implantar acordos (NORTH, 1994) Diante das dificuldades decorrentes para o desenvolvimento das atividades econômicas (VISCUSI; VERNON; HARRINGTON, 1997, p. 716-717), seja pelas vias da regulação direta ou judicial, seja pela via do mercado, ganha destaque, então, o incentivo que o produtor possa ter para proporcionar a informação adequada sobre o produto (ou serviço) ao consumidor. O fato de ser dispendioso avaliar se o serviço prestado corresponde às características anunciadas pelo produtor ou decidir a adequada compensação devida ao consumidor em caso contrário concorre para essa situação (ENGEL, 1995, p. 24). No mercado de serviços de saúde, em particular, tal tipo de garantia de exclusão a priori das distorções associadas à presença de assimetria de informação costuma ser descartado (HARRIS, 1977), uma vez que são transacionados serviços cuja qualidade, em geral, só é percebida após terem sido adquiridos: são tipicamente “bens de experiência” (OZCAN, 2009, p. 289). 34 Todas as transações, seja entre as UHs, seja entre os produtores ou consumidores no seu interior, envolvem custos adicionais aos do preço pago pelo serviço, considerado “especialmente adaptadas para um paciente em particular” (DJELLAL; GALLOUJ, 2005, p. 818). Por força desses ‘custos de transação’, o aumento da satisfação dos clientes assegura maior rentabilidade no futuro, menores custos relacionados a produtos e serviços defeituosos e níveis superiores de retenção e de lealdade do consumidor. A chave para a satisfação de longo prazo e para a retenção de clientes é focalizar o desenvolvimento de produtos e serviços de alta qualidade e adaptados para a satisfação das necessidades do cliente. Existirão, então, transações envolvendo barganha entre a administração da UH e o profissional prestador de serviços clínicos, entre a administração e o paciente e seus familiares, entre os prestadores de serviços clínicos e o paciente e seus familiares, e entre a administração e a coletividade. Resumindo, transações desse tipo são realizadas a custos muitas vezes elevados, porque dizem respeito ao valor de preservação da vida e se espraiam no interior do ambiente hospitalar, assim como nas interfaces da UH com seu ambiente externo. Nessa atividade, portanto, a questão central para o bom funcionamento do mercado é saber se os produtores têm o incentivo suficiente para informar o consumidor sobre as características do bem e saber o que fazer a respeito de forma adequada (LA FORGIA; COUTTOLENC, 2008, p. 264). O reconhecimento de que os consumidores mais bem educados beneficiam tanto a si próprios, quanto promovem um “efeito aprendizado” sobre a qualidade do serviço prestado para benefício da sociedade como um todo, explica a importância hoje atribuída ao efeito conjunto do treinamento do prestador de serviço clínico, da educação do paciente e do familiar e da gestão participativa com governabilidade para o controle das perdas de terceiros, para a expansão da UH e para o desenvolvimento do mercado de serviços de saúde em geral. 4.6. Sistema de certificação do controle de qualidade e incentivo Quando não há incentivo para que a informação suprida pelo prestador de serviço seja suficiente, então pode ser vantajoso para o prestador e para o consumidor do serviço que a informação seja suprida por terceiros. A moderna teoria do consumidor destaca, a propósito, os mecanismos usados pela regulação direta para a promoção do consumidor e os chamados mecanismos orientados pelo mercado – market-based remedies (ENGEL, 1995, p. 24-33). 35 Os mecanismos do primeiro tipo, que incluem políticas governamentais e nãogovernamentais destinadas a auxiliar o consumidor, podem levar longo tempo antes que produzam o efeito desejado; descartam qualquer tentativa de modificar o ambiente e, ao invés disso, têm em comum o objetivo de mudar o próprio comportamento do consumidor. Dentre os chamados mecanismos orientados pelo mercado, os sistemas de certificação do controle de qualidade são um caso importante. Com o efeito direto, em primeiro lugar, de aumentar o número de consumidores informados de imediato, tais sistemas ainda dão origem a externalidades positivas que beneficiam os consumidores desinformados de maneira mais geral. Um exemplo desse tipo de sistema é o da AH, surgida no Brasil na década de 1980 e regulamentada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). São considerados estratégicos para o desenvolvimento da qualidade da assistência em saúde na América Latina pela Organização Mundial de Saúde (OMS) desde 1989 e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) desde 1992 (SCHIESARI; KISIL, 2003; FELDMAN; GATTO; CUNHA, 2005). 4.7. Acreditação hospitalar, inovação gerencial e gerência do ambiente hospitalar Os sistemas de acreditação hoje existentes no país incluem o Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA), o da Organização Nacional de Acreditação (ONA) e o do Controle de Qualidade Hospitalar (CQH), baseados nas normas da Joint Comission on Accreditation of Healthcare Organizations (JCAHO) (LA FORGIA; COUTTOLENC, 2008). O CBA foi constituido em 1998, por cooperação entre a Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a Fundação CESGRANRIO da UFRJ, o Colégio Brasileiro de Cirurgiões e a Academia Nacional de Medicina (CBA, 2011). O uso de sistemas de certificação cresceu entre as UHs brasileiras, inclusive em inúmeras UHs governamentais. Há evidências de que contribui para ganhos de eficiência e de qualidade bem significativos (LA FORGIA; COUTTOLENC, 2008). O Manual Internacional de Padrões de Acreditação Hospitalar da Joint Commission International (JCI) contém todos os padrões, propósitos, elementos de mensuração dos padrões, políticas e procedimentos de AH. Esses padrões são organizados em funções comuns a todas as UHs, divididas em dois grupos: (i) as relacionadas com o cuidado ao paciente e (ii) as relativas à garantia de uma organização segura, eficaz e bem gerenciada. 36 Os Elementos de Mensuração (EMs) de um padrão são os requisitos do padrão e dos seus propósitos, que são avaliados e verificados e aos quais é atribuída uma pontuação durante a avaliação da AH. São classificados de duas formas nas avaliações: Padrões com Foco no Paciente e Padrões de Administração de Organizações de Saúde. (CBA, 2003). O manual é dividido em onze capítulos. Os seis primeiros compreendem os Padrões com Foco no Paciente: (a) o de Acesso ao Cuidado e Continuidade do Cuidado (ACC); (b) o de Direitos dos Pacientes e Familiares (DPF); (c) o de Avaliação dos Pacientes (AP); (d) o de Cuidado aos Pacientes (CPa)1; (e) o de Educação de Pacientes e Familiares (EPF); e (f) o de Prevenção e Controle de Infecções (PCI). Os outros cinco contemplam os Padrões de Administração de UHs: (g) o de Melhoria da Qualidade e Segurança do Paciente (QSP); (h) o de Governo, Liderança e Direção (GLD); (i) o de Gerenciamento do Ambiente Hospitalar e Segurança (GAS); (j) o de Educação e Qualificação dos Profissionais (EQP); e (l) o de Gerenciamento de Informação (GI). Cabe destacar que o padrão de Gerenciamento do Ambiente Hospitalar e Segurança (GAS) trabalha para assegurar uma estrutura segura, funcional e assistencial aos pacientes, familiares, profissionais e visitantes. Para atingir essa meta, a estrutura física, equipamentos médicos e outros equipamentos e pessoas devem ser administradas efetivamente. O gerenciamento efetivo inclui planejamento, educação e monitoramento (CBA, 2008). Leis, regulamentos e inspeções realizadas por autoridades locais determinam, em grande parte, como as instalações são projetadas, utilizadas e mantidas. Todas as instituições, independentemente de seu tamanho ou dos recursos disponíveis, devem cumprir essas exigências como parte de suas responsabilidades perante os pacientes, familiares, funcionários e visitantes (CBA, 2008). Cada padrão é composto de um ou mais EMs, aos quais é atribuída uma das seguintes opções ordinais de pontuação: “Conformidade” (C); “Conformidade Parcial” (PC); ou “Não Conformidade” (NC). Ao fim do processo, é elaborado um relatório completo com os resultados e as pontuações da avaliação. (CBA, 2003). A avaliação verifica a conformidade da UH com base em: (a) entrevistas com profissionais e pacientes; (b) observações locais, feitas pelos avaliadores e outros documentos fornecidos pela UH; e (c) resultados de autoavaliações, quando fizerem parte do processo de AH. (CBA, 2003). A visita é o momento em que todos os setores e 1 Para esta Dissertação foi usada a sigla CPa para Cuidados ao Paciente como forma de diferenciar da sigla CP de Conformidade Parcial. 37 unidades são avaliados por uma equipe de avaliadores externos, seguindo-se uma programação definida (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1999). Um relatório dos avaliadores a respeito da indicação ou não da UH para a AH é gerado ao final da avaliação. O certificado emitido tem um prazo de validade, ao término do qual a UH deve submeterse a novo processo de avaliação (QUINTO NETO; BITTAR, 2004; FELDMAN; GATTO; CUNHA, 2005). Face à realização de avaliações periódicas independentes, as pontuações conferidas pelos avaliadores externos e sua evolução no tempo são consideradas manifestações objetivas do desenvolvimento organizacional das UHs neste estudo (GINKEL; DIAS, 2006). O manual do CBA possui 959 EMs para avaliação na AH. No Quadro 1 são apresentados alguns exemplos de EMs quanto à sua identificação com os aspectos de educação do paciente e do familiar da UH. 38 Quadro 1: Acreditação Hospitalar: EMs exemplificativos dos esforços de inovação da educação do paciente e do familiar na UH. Funções de Organização EPF-Educação de Pacientes e Familiares DPF-Direito dos Pacientes e Familiares ACC-Acesso e Continuidade do Cuidado AP-Avaliação dos Pacientes CPa-Cuidado aos Pacientes GUM-Gerenciamento e Uso de Medicamentos QSP-Melhoria da Qualidade e em Segurança do Paciente PCI-Prevenção e Controle de Infecções GLD-Governo Liderança e Direção GAS-Gerenciamento do Ambiente Hospitalar e Segurança EQP-Educação e Qualificação dos Profissionais EM relativo à Educação do Paciente e do Familiar Existe uma estrutura ou mecanismo apropriado para educação em toda a instituição. A instituição desenvolve políticas e procedimentos para apoiar e promover a participação do paciente e de seus familiares nos processos de cuidado. Os pacientes recebem informações suficientes para tomar decisões informadas. O paciente e sua família são informados sobre o plano de cuidado e tratamento e participam das decisões sobre as prioridades a serem atendidas. Os pacientes e seus familiares são informados sobre os resultados do seu cuidado e tratamento. Políticas e procedimentos estão implementados para orientar a autoadministração de medicamentos. A liderança da instituição participa do monitoramento do programa de melhoria da qualidade e segurança do paciente. Os pacientes e familiares são incentivados a participar no programa de prevenção e controle de infecção. A instituição participa na educação da comunidade sobre promoção da saúde e prevenção de doenças. A instituição implementou um plano para eliminar ou restringir o tabagismo, que aplica-se a pacientes, familiares, profissionais e visitantes. A instituição integra os indivíduos em treinamento aos seus programas de orientação, qualidade, segurança do paciente, prevenção e controle de infecções e outros. Fonte: CBA, 2003; 2008 39 5. Material e Métodos Para a escolha da metodologia de avaliação dos efeitos das características organizacionais e funções gerenciais na qualidade do ambiente hospitalar da UH foram feitas considerações relacionadas com: as características específicas dos serviços de saúde; as peculiaridades das organizações públicas; e a disponibilidade dos dados necessários à sua avaliação. Usou-se uma amostra de conveniência composta de 33 relatórios de avaliação educativa da AH produzidos pelo CBA, de acesso disponível para este estudo. Esses relatórios foram concluídos entre 2004 e 2009 e realizados em 27 UHs, nãoidentificadas, para avaliar a influência da capacitação profissional, da gestão participativa com governabilidade, da educação do paciente e do familiar, da informação e da comunicação, do tipo de propriedade e do tamanho da UH na qualidade do ambiente hospitalar. Em termos operacionais, as avaliações da AH obedecem a princípios e procedimentos regulados por manuais normativos do processo de certificação. Para esta dissertação foram utilizados os padrões da AH do Manual de Certificação Hospitalar da JCI, já discriminados em 4.6, que são de dois tipos: Padrões com Foco no Paciente e Padrões de Administração de Instituições de Saúde. Seis funções de organização da UH são do primeiro tipo: ACC; DPF; AP; CPa; EPF; e PCI. Cinco funções são do segundo tipo: QSP; GLD; GAS; EQP; e GI. Cada padrão da AH do manual é composto de um ou mais EMs, que recebem pontuação ou ‘achado’ de avaliação educativa ou de certificação da UH de: Conformidade – C, ou Conformidade Parcial – PC, ou Não Conformidade – NC. Uma vez que o mecanismo de sinalização da qualidade da assistência através da certificação inclui a realização de avaliações periódicas independentes orientadas para os stakeholders, que têm validade por três anos e podem ser suspensas, as pontuações conferidas pelos avaliadores externos e a sua evolução no tempo são consideradas manifestações objetivas do desenvolvimento organizacional da UH na dissertação. Nesta dissertação foram considerados todos os EMs classificados em cada uma das cinco funções de interesse da análise e obtidos os dados necessários ao uso das características organizacionais ‘tamanho’ e ‘tipo de propriedade’ como variáveis independentes dummy. 40 Foram usadas técnicas paramétricas para uma análise confirmatória dos dados que permitiu identificar o tipo de influência exercido pelas funções organizacionais (ou grupos de padrões de AH) de Educação e Qualificação dos Profissionais, de Governo, Liderança e Direção dos objetivos e metas fixados, de Educação de Pacientes e Familiares, de Adesão a Rotinas e Normas e de Informação e Comunicação sobre a função (ou grupo de padrões de AH) de Gerência do Ambiente Hospitalar, A primeira etapa da análise para testar as hipóteses da pesquisa do estudo consistiu em identificar o conjunto de todos os EMs das cinco “funções” que foram avaliadas em pelo menos um dos relatórios das amostras de conveniência utilizada: (a) 92 EMs da função Educação e Qualificação dos Profissionais – EQP; (b) 91 EMs da função Governo, Liderança e Direção - GLD; (c) 25 EMs da função Educação de Pacientes e Familiares – EPF; (d) 104 EMs da função Gerenciamento de Informação - GI; e (e) 85 EMs da função Gerenciamento do Ambiente Hospitalar e Segurança – GAS. A nota de avaliação conferida a cada EM das cinco funções nos relatórios educativos da AH examinados foi apurada a seguir. A soma das frequências absolutas das diferentes notas de avaliação (C, NC e PC) que foram atribuídas aos EMs de cada função nos relatórios foi, então, obtida. A quarta etapa envolveu calcular a frequência relativa das diferentes notas de avaliação dadas aos EMs em cada uma das cinco funções nos relatórios. A média ponderada das notas de avaliação da UH em cada EM das 5 funções de interesse foi calculada em seguida, utilizando-se os pesos de valoração das diferentes notas que são atribuídos pelos avaliadores responsáveis pelos relatórios. As médias ponderadas resultantes foram transformadas em sete variáveis métricas contínuas representativas da consolidação das notas de avaliação que foram dadas nos K relatórios para o conjunto dos EMs de cada função ou escores: a) o escore conferido à função EQP no K-ésimo relatório – MEDEQPK; b) o escore conferido à função GLD no K-ésimo relatório – MEDGLDK; c) o escore conferido à função EPF no K-ésimo relatório – MEDEPFK; d) o escore conferido à função GI no K-ésimo relatório – MEDMCIK; e e) o escore conferido à função GAS no K-ésimo relatório – MEDGASK. Esses escores são definidos como as médias aritméticas das notas de avaliação calculadas (em cada EM) da função de organização correspondente. 41 Para completar, foram definidas duas variáveis qualitativas com o objetivo de representar os atributos organizacionais que influenciam o comportamento das variáveis MEDGASK e MEDQSPK: f) o tamanho da UH avaliada no K-ésimo relatório – DPORTEK; e g) o tipo de propriedade da UH avaliada no K-ésimo relatório – DPROPRK. Na primeira dummy, UH grande = 1 e UH pequena = 0; na segunda, UH privada = 1 e UH pública = 0. A seleção dessas variáveis, vale reiterar, foi decisiva para a opção pela técnica multivariada para o teste da hipótese neste estudo e foi respaldada em questões conceituais e não apenas em bases empíricas. Quantificadas as variáveis explicativas MEDEQP (capacitação dos profissionais), MEDGLD (governabilidade), MEDEPF (educação do paciente), MEDMCI (gerência da informação), DPORTE (tamanho da UH) e DPROPR (tipo de propriedade da UH) e a variável explicada MEDGAS (conformidade do ambiente hospitalar), foi analisada a correlação entre as variáveis da pesquisa, que revelou altos coeficientes positivos e significativos entre a variável dependente e cada variável independente, além de forte colinearidade entre os pares das variáveis independentes, sugerindo que poderia ser difícil determinar, separadamente, os efeitos individuais de algumas delas sobre a variável dependente. No entanto, os modelos de regressão múltipla têm longa tradição nas aplicações da Estatística a problemas reais e, durante muito tempo, foram a opção preferida na maioria das aplicações “práticas” de técnicas multivariadas. A regressão múltipla fornece uma forma de avaliar objetiva e, simultaneamente, o grau e natureza da associação entre uma variável dependente e várias outras independentes (ou explicativas). A interpretação mais direta para o uso da equação de regressão é a determinação da importância relativa de cada variável independente para o comportamento da mesma variável dependente. A pesquisa empírica com vistas às contribuições gerenciais relativas ao aperfeiçoamento de características micro-organizacionais da educação do paciente e familiar foi conduzida segundo o método do estudo de caso do IPEC nesta dissertação. Para essa pesquisa foi elaborado um quadro com os EMs relativos à educação do paciente e familiar com respectivas notas, a partir do relatório de avaliação educativa do IPEC, realizado pelo CBA, em novembro de 2006. Em seguida foram identificadas 09 (nove) EMs com Não Conformidades, que foram agrupadas em três tipos: i) à 42 insuficiência dos esforços de inovação relativos à sistematização do diagnóstico sobre quais são as carências existentes; ii) à insuficiência dos esforços de inovação relativos à sistematização do diagnóstico sobre quais são as vias mais promissoras de melhoria da interação educativa com os pacientes e familiares; e iii) à insuficiência dos esforços de inovação relativos à educação de caráter preventivo do paciente e familiar, tendo em vista o pós-alta do paciente Finalmente, foi feita análise à luz da bibliografia relacionada aos padrões dos EMs para sugestão de ações em busca de alcançar suas conformidades. 43 6. Resultados e Discussão Nas duas seções a seguir são apresentados, respectivamente: o resultado do teste estatístico desta pesquisa sobre a influência da educação do paciente e familiar na gerência do ambiente da UH; e o resultado do estudo desenvolvido sobre as possibilidades de aumentar a contribuição dos fatores componentes da educação do paciente e do familiar examinados no relatório educativo da AH de 2006 para a melhoria do ambiente hospitalar do IPEC. 6.1. Associação estatística entre educação do paciente e familiar e ambiente hospitalar da UH Realizadas as primeiras estimativas com as variáveis originais, confirmou-se a suspeita, anteriormente comentada, sobre presença de multicolinearidade, manifestada em um alto R2 lado a lado com baixa significância e/ou sinais diferentes dos esperados para os coeficientes de algumas variáveis. Embora a maioria dos livros considere que a multicolinearidade é um problema da amostra disponível, seria útil dispor de uma forma prática para contorná-lo. Mostrou-se desejável, então, proceder a uma Análise Fatorial antes de usar a equação de regressão múltipla para testar a hipótese nula (GUJARATI, 2006). Como o objetivo era isolar as variáveis originais em “fatores” (ou subgrupos) com menor colinearidade, o próximo passo foi escolher empiricamente o número de fatores, pois, em geral, não existe base quantitativa definitiva para a escolha desse número (HAIR et al., 1998). Tentado o critério dos eigenvalues maiores ou iguais a 1, resultou apenas um fator, solução descartada por não atender o objetivo. Foi tentado, então, o caminho de fixar o número de fatores, experimentando a partir de dois em diante. Utilizando rotações Varimax, a solução com dois fatores ortogonais foi considerada suficiente e promissora, sendo então escolhida. Os dois fatores resultantes aparecem na Tabela 1. Incidentalmente, o isolamento da variável MED_EPF (educação do paciente) em um fator exclusivo é por si só interessante, pois a variável destacada nesta análise, em oposição às outras três, se refere aos atores externos à UH, fato intuitivamente aceitável, mas ainda não registrado na literatura. 44 Tabela 1: Matriz * de Cargas Fatoriais. Cargas Fatoriais ** Variáveis FATOR 1 MED_EQP (capacitação) MED_GLD (governabilidade) MED_GI (grau de informação) MED_EPF (educação do paciente) FATOR 2 0,925 0,904 0,891 0,939 Notas - * - rotação varimax com normalização de Kaiser20 ** - extração dos fatores por Componentes Principais (id.). A seguir, a equação completa foi especificada, incluindo as quatro dummies de ano (de 2005 a 2008) – para tentar captar diferenças temporais, as duas dummies demográficas – tamanho e propriedade - e os dois fatores de agrupamento das quatro variáveis explicativas da conformidade do ambiente hospitalar - que foram fornecidos pela Análise Fatorial. Os resultados aparecem na Tabela 2. A despeito da limitação imposta pela multicolinearidade, esses resultados podem ser considerados bastante bons. Todos os coeficientes significativos têm sinal positivo, correspondente ao esperado, e sua significância conjunta foi confirmada pelo teste F, que indica que a probabilidade de que todos os coeficientes sejam simultaneamente nulos é menor ou igual a 0,1 %, ou seja, é melhor usar os valores estimados pela equação do que a média da variável dependente. A significância isolada de cada variável independente, aí incluídas as dummies, pode ser avaliada pela estatística T de Student, que aparece na quinta coluna da tabela. Em termos do coeficiente beta, que permite comparar quaisquer pares de coeficientes, independentemente da unidade de medida, o impacto mais importante se deve ao Fator 1, que representa os aspectos (ou atores) internos influentes no ambiente hospitalar – profissionais de saúde e administração, seguido do Fator 2, que é essencialmente a variável relativa aos atores externos, a saber, os pacientes e suas famílias. O tipo de propriedade da UH também foi significativo; seu sinal positivo indica que as UH privadas estão mais direcionadas à conformidade na gerência do ambiente hospitalar. 45 Tabela 2: Resultados da Regressão Múltipla. Variáveis Coeficientes Erro padrão Coeficientes Padronizados T de Student p valor (Beta) Constante 5,604 0,929 6,032 0,000*** DUM_2005 0,841 1,095 0,097 0,768 0,450 DUM_2006 0,135 1,049 0,017 0,129 0,899 DUM_2007 - 0,986 1,053 - 0,124 - 0,937 0,359 DUM_2008 - 0,815 0,978 - 0,123 - 0,833 0,414 DUM_2009 - 0,546 1,065 - 0,074 - 0,512 0,613 DUM_PROP 1,386 0,596 0,244 2,325 0,029* DUM_TAM 0,344 0,728 0,052 0,472 0,641 FATOR 1 2,355 0,337 0,816 6,990 0,000*** FATOR 2 1,147 0,336 0,398 3,414 0,002** Nota – N = 33; R2 ajust = 0,712; F = 9,805, p < 0,1%. Significância dos valores do t de Student: * - 5%; ** - 1%; *** - 0,1%. Com os dados disponíveis, mesmo sem ter sido possível individualizar completamente os impactos de EQP (treinamento), GLD (governabilidade) e GI (gerência da informação), os testes da hipótese revelaram: (a) associações positivas e significativas entre, de um lado, o grupamento das funções organizacionais EQP, GLD e GI selecionadas (FATOR 1) e o tipo de propriedade da UH e, de outro, a Gerência do Ambiente Hospitalar; e (b) associação positiva e significativa entre a função organizacional Educação do Paciente e Familiar (FATOR 2) e a função Gerência do Ambiente Hospitalar (GAS), com influência inferior à das funções de gerência agrupadas no FATOR 1. .Quanto à época em que foi feita a avaliação da UH (dummies de ano) e à característica demográfica Tamanho, finalmente, não foram confirmadas associações significativas com a função gerência do ambiente hospitalar. Isso não quer dizer que não haja tal associação, mas que sua confirmação empírica fica aguardando novos dados. 46 6.2. Influência efetiva e perspectivas de aperfeiçoamento dos fatores componentes da educação do paciente e familiar na gerência do ambiente hospitalar do IPEC Durante o processo de avaliação da AH são coletadas informações sobre a conformidade com os padrões. A estrutura organizacional, os processos e a performance são avaliadas em relação aos padrões pré-determinados. A avaliação verifica a conformidade da UH com base em entrevistas com profissionais e pacientes e outras informações obtidas verbalmente: observações locais feitas pelos avaliadores dos processos de cuidado ao paciente; políticas; procedimentos; e outros documentos fornecidos pela UH (CBA, 2003). Avaliações educativas no mesmo molde da realizada para AH são realizadas antes do processo de avaliação final. O Quadro 2 apresenta os 25 (vinte e cinco) EMs da função Educação do Paciente e Familiar com as suas respectivas pontuações. Essa avaliação educativa foi realizada no IPEC em 2006, e os EMs avaliados são os requisitos dos padrões a que se atribui uma nota durante o processo de avaliação da AH. 47 Quadro 2: Conformidade dos Elementos de Mensuração Representativos dos Esforços de Inovação da Educação do Paciente e do Familiar na Unidade Hospitalar: IPEC - 2006. EM relativo à Educação do Paciente e do Familiar 01- A instituição planeja a educação de acordo com sua missão, escopo dos serviços prestados e perfil dos pacientes. 02- Existe uma estrutura ou mecanismo apropriado para a educação em toda a instituição 03- Os recursos educacionais estão organizados de modo eficiente e eficaz. 04- As necessidades de educação do paciente e familiares são avaliadas. 05- A capacidade e a prontidão de aprendizagem do paciente e familiares são avaliadas. 06- Os resultados da avaliação são anotados no prontuário do paciente. 07- Existe um processo uniforme para registrar a informação sobre educação do paciente. 08- O paciente e familiares tomam conhecimento sobre o consentimento informado. 09- O paciente e familiares tomam conhecimento sobre participação nas decisões de cuidado. 10- O paciente e familiares tomam conhecimento sobre participação no processo de cuidado. 11- O paciente e familiares tomam conhecimento sobre quaisquer implicações financeiras acarretadas pelas decisões relativas ao cuidado. 12- Pacientes e familiares recebem educação e treinamento para o atendimento de suas necessidades continuadas de saúde ou para alcançar suas metas de saúde. 13- A instituição identifica e estabelece relações com os recursos comunitários que apoiam a promoção continuada da saúde e a educação para prevenção da doença. 14- O paciente é referido a essas fontes quando apropriado. 15- Quando apropriado, pacientes e familiares são educados quanto ao uso seguro e efetivo de medicamentos e seus possíveis efeitos colaterais. 16- Quando apropriado, paciente e familiares são educados quanto à segurança e uso efetivo de equipamentos médicos. 17- Quando apropriado, pacientes e familiares são educados quanto à prevenção de interações entre medicamentos e alimentos. 18- Quando apropriado, pacientes e familiares são educados quanto à dieta e nutrição adequada. 19- Quando apropriado, pacientes e familiares são educados quanto às técnicas de reabilitação. 20- Os métodos de educação são selecionados de acordo com os valores e preferências do paciente e familiares. 21- A interação entre os profissionais, o paciente e familiares confirma que as informações foram entendidas. 22- O paciente e familiares são educados de forma compreensível. 23- O paciente e familiares são educados em uma linguagem que possam entender. 24- A informação e o treinamento do paciente são realizados de forma colaborativa, quando apropriado 25- Aqueles que proveem educação têm conhecimento e capacidade de comunicação para fazê-lo. Nota PC C C PC NC NC NC PC C C NA C C C PC C PC PC C C C C C C C Fonte: Relatório de avaliação educativa do IPEC pelo CBA; Nov/2006. 48 Como descrito na seção 4.6, uma das seguintes opções é atribuída na pontuação: 1) Conformidade (C) - quando o EM atende aos requisitos estabelecidos; 2) Não Conformidade (NC) - quando o EM não atende aos requisitos estabelecidos; e 3) Parcialmente em Conformidade (PC) - quando atende parcialmente os requisitos naquele EM. Usou-se, ainda, a classificação Não se Aplica (NA) – quando, por algum motivo, o EM não pode ser avaliado, por não fazer parte das atividades da instituição. Portanto, esse EM foi desconsiderado para efeito de cálculos. A Tabela 3 apresenta as frequências das pontuações obtidas para a função EPF: 15 (C); 6 (PC) e 3 (NC). Isso representa, respectivamente, 62,5%, 25,0% e 12,5%, para cada uma dessas notas de avaliação. Tabela 3: IPEC - Frequências Absoluta e Relativa do tipo de Pontuação dos Elementos de Mensuração na Função de Organização EPF da UH: Nov/2006. Opções de Frequência Frequência pontuação Absoluta Relativa (%) C 15 62,5 PC 6 25,0 NC 3 12,5 Total 24 100 Fonte: Relatório de avaliação educativa do IPEC pelo CBA; nov 2006 Como se pode observar na Tabela 3, o IPEC apresenta 62,5% de conformidade na função EPF, ou seja, esses EMs atenderam plenamente aos critérios de avaliação. Os restantes, 37,5% (NC e PC), demonstram a necessidade de alguma melhoria, para atenderem às exigências do padrão da função, de modo que tenham, como resultado, uma influência positiva na gerência do ambiente hospitalar. Assim, como já foi confirmada a associação direta entre a função EPF e a função Gerência do Ambiente Hospitalar (tabelas 1 e 2 ) e, tendo os EMs desta função que se encontram com as pontuações PC e NC sido identificados e a sua importância relativa 49 quantificada (Quadro2 e Tabela 3), estas evidências serão discutidas a seguir e, posteriormente, algumas sugestões de melhoria para esta função no IPEC serão apresentadas. Nesse sentido, o Quadro 2 evidencia que as deficiências de conformidade da EPF no IPEC estão concentradas, de um lado, na insuficiência dos esforços de sistematização do diagnóstico sobre quais são as carências existentes (EMs 1 e 4) e sobre quais são as vias mais promissoras de melhoria da interação educativa com os pacientes e familiares (EMs 5, 6, 7 e 8) e, de outro, na insuficiência da educação de caráter preventivo tendo em vista o pós-alta do paciente (EMs 15, 17 e 18) . É preciso considerar a propósito da primeira deficiência registrada que, no plano das práticas institucionais, a educação do paciente e familiar em saúde envolve toda a equipe da UH, exercitando o agir educativo, que decorre de práticas pedagógicas participativas e dialogadas entre os serviços e os usuários. Os diversos profissionais da UH, principalmente aqueles que atuam diretamente com o paciente e seus familiares, têm a oportunidade e a responsabilidade de manter atividades educativas. Os momentos para essas atividades ocorrem quando o paciente recebe cuidados médicos, de enfermagem, na coleta de material para exame e nos diversos momentos de relacionamento com a UH, desde o primeiro contato. Com relação ao planejamento das atividades de educação, este deve ocorrer de modo que seja garantida a cada paciente a educação de que necessita. Percebe-se que esse é um desafio a ser enfrentado no cotidiano das práticas de saúde existentes, que residem mais nos modos verticalizados de planejamento, levando a uma separação entre os que planejam, os que executam e os que recebem os cuidados e tornando a prática de gestão reduzida à administração da UH, à figura dos gestores. A interação do paciente e/ou dos seus familiares com as equipes de cuidado e com os gestores na elaboração do planejamento favorece a boa evolução do processo de aprendizagem do paciente, determinando o que aprender e a melhor maneira do aprendizado. Essa prática transdisciplinar se materializa na relação entre os sujeitos envolvidos com a construção do cuidado, nos modos de acolher, de fazer a escuta de saberes diferentes. Como sinaliza Benevides (2005, p. 23), “é no entre os saberes que a 50 invenção acontece, é no limite de seus poderes que os saberes têm o que contribuir para o outro mundo possível, para uma outra saúde possível.” Para planejar a educação sintonizada com o escopo do serviço prestado e com o perfil dos pacientes e humanizar as práticas de gestão e de cuidados, é importante que se incluam os diferentes sujeitos que participam desde as suas singularidades no planejamento, na implementação e na avaliação dos processos de produção de saúde, entendendo a UH como uma unidade de produção de ações de saúde e que as práticas de educação fazem parte desta produção. Para identificação do diagnóstico das necessidades de educação do paciente e familiar, pode-se realizar uma entrevista com os pacientes internos e seus acompanhantes. Essa entrevista, após seu término, deverá ser redigida e anexada ao prontuário do paciente, no local referente ao período da internação, junto à primeira evolução. Na entrevista deverão ser considerados os métodos preferenciais de aprendizado pelo paciente, os fatores intervenientes na aprendizagem e os familiares a serem envolvidos no processo de educação. As ações educativas devem ser realizadas por todas as categorias profissionais de assistência durante o período de internação seus registros anexados ao prontuário do paciente, em local referente à sua última evolução. É preciso considerar, por exemplo, que as condições socioeconômicas, culturais e mesmo clínicas de um paciente são igualmente fundamentais, tendo em vista que podem ser determinantes, até mesmo em relação à forma de encarar a sua própria doença (MARIN, 2003). Com relação ao consentimento informado, o médico deve prover o paciente de todas as informações que sejam necessárias para que se tome uma decisão, assim como deve informar sobre as consequências da decisão tomada pelo paciente. Tal atitude requer esforço por parte do médico, que precisa dispor de tempo, paciência e conhecimento para esclarecer sobre diagnóstico, prognóstico e tratamento, em uma linguagem simples, para ter certeza de que foi entendido. Todas as dúvidas do paciente devem ser esclarecidas, bem como o propósito da realização de exames, cirurgias e medicamentos. Um paciente adulto mentalmente sadio, com tais informações, possui o direito de dar ou não consentimento para qualquer diagnóstico ou tratamento, mesmo quando a recusa redundar em seu próprio prejuízo. O consentimento pode ser explícito de forma verbal ou por escrito, ou implícito, em casos, por exemplo, em que o paciente estica o braço para a aplicação de alguma 51 medicação. Para tratamentos que envolvem risco ou grande desconforto, é preferível obter consentimento explícito por escrito, com um termo de consentimento esclarecido. Esse termo tem, por finalidade, garantir a autonomia do paciente e delimitar a responsabilidade do médico que realiza os procedimentos. O texto deve ser desprovido de termos técnicos e detalhes excessivos, permitindo que o paciente ou seu representante legal, antes da realização do procedimento médico, entenda o que será feito e possa mudar de opinião se desejar. Em linhas gerais, o modelo do consentimento deve conter: • identificação do paciente ou de seu responsável; • nome do procedimento; • descrição técnica (em termos claros); • possíveis insucessos; • complicações pré e pós-operatórias; • descrição da anestesia; • destino da peça operatória; • explicação quanto à possibilidade de modificação de conduta durante o procedimento; • declaração de que as explicações foram efetivamente entendidas; • confirmação de autorização, com local e data da intervenção cirúrgica; • modelo para revogação da cirurgia; e • assinatura de testemunhas. Quanto à segunda deficiência registrada, por sua vez, um resumo de alta relativa à educação de pacientes e familiares deverá ser preenchido ao final do período de internação, com orientações para o paciente que segue para outro local de cuidado ou para sua residência. Quando identificadas barreiras de linguagem ou de outros tipos, serão convocados intérpretes ou outro profissional com capacidade para mediar a consulta. A cada “visita” realizada pelo profissional, este anotará sua avaliação sobre a compreensão do paciente acerca das orientações ou explicações fornecidas e as dúvidas trazidas pelo paciente, como no exemplo a seguir: “- O paciente perguntou sobre a mudança de sua alimentação. 52 - Conduta: paciente foi orientado sobre o motivo da mudança em sua dieta; Considero que houve entendimento total ou considero entendimento parcial, necessitando de esforço ao longo do acompanhamento.” Quanto ao uso de medicamentos, a comunicação com o paciente terá, como finalidades principais, o aconselhamento e a educação quanto à administração e cuidados corretos do medicamento e quanto aos procedimentos de garantia da terapêutica e a promoção da adesão, bem como quanto à consequente melhoria da eficiência do tratamento e redução dos riscos (MARIN, 2003). Apesar de não ser a única, a falta de informação sobre os medicamentos é apontada como uma das variáveis mais significativas e de maior impacto, em termos mundiais, sobre as razões pelas quais os indivíduos não cumprem adequadamente seus tratamentos. No hospital, por exemplo, a administração dos medicamentos geralmente não se faz acompanhar da correspondente informação, nem mesmo naquelas situações em que se faz necessário o aconselhamento ao paciente ou responsável para garantir adequada sequência ao tratamento a partir da alta hospitalar (MARIN, 2003). No atendimento ambulatorial, o fluxo da informação, iniciado pela consulta médica, tem continuidade na farmácia, onde o paciente vai ser esclarecido sobre itens da prescrição médica, dose, posologia, cuidados especiais na reconstituição e/ou armazenamento, considerações ao tomar o medicamento, possíveis interações (medicamento e/ou alimento), efeitos adversos etc. (CASTRO, 2000). As interações medicamentosas e os efeitos adversos dos medicamentos estão entre as informações de maior impacto que o farmacêutico pode oferecer a quem prescreve e a quem utiliza determinado medicamento (CASTRO, 2000). Orientar o usuário e desenvolver ações educativas sobre medicamentos não são atividades exclusivas do farmacêutico; ao contrário, devem estar intimamente relacionadas às atribuições de todos os profissionais da equipe de saúde (MARIN, 2003). É preciso saber se o paciente sabe ler e se tem capacidade de ler a receita e/ou o nome descrito na caixa ou no envelope do medicamento. É importante saber como o paciente se orienta para o cumprimento do horário (muitos deles não têm relógio ou não sabem ler as horas). No caso do paciente analfabeto, devem-se usar alternativas para 53 controle do uso, como diferenciar os medicamentos utilizando fitas, adesivos, canetas coloridas, números ou sinais para facilitar a compreensão do paciente. O médico deve sempre ouvir e considerar as preferências do paciente, mesmo quando elas não possam ser atendidas. Os procedimentos devem ser explicados, bem como os motivos pelos quais o paciente está sendo submetido, mesmo contra a sua vontade. Esse documento, depois de preenchido, deve ser anexado ao prontuário do paciente. Além disso, lembrar ao paciente que o seu direito acerca de informações sobre sua saúde se estende também ao prontuário, podendo ter acesso ao mesmo e solicitar cópias, se assim o desejar. As atividades educativas a serem realizadas com os pacientes e familiares deverão ocorrer durante todo o período da sua permanência de internação. Podem se dar por encontros individuais entre os profissionais da assistência e os pacientes ou em reuniões programadas com os familiares e acompanhantes e um profissional de forma periódica, para realizar uma abordagem mais geral sobre a sua área de atuação. Os temas devem abranger todos os assuntos que estão no padrão da função EPF, considerando as necessidades de cada paciente, o planejamento realizado com a participação de gestores profissionais da assistência e usuários e observando, principalmente, onde os requisitos dos EMs não estavam em conformidade no relatório da avaliação educativa. Independente do grupo de deficiências registrado, serão utilizados os seguintes recursos para educação: - Folders educativos. - Painéis expositivos - Palestras em sala de espera - Grupo com pacientes internados - Grupo com pacientes do ambulatório - Vídeos institucionais em sala de espera e internação - Orientações individualizadas Todas essas orientações, atividades desenvolvidas em sala de espera e reuniões devem ser registradas no prontuário, em local previamente estabelecido para este fim. 54 7. Conclusões O objetivo da dissertação foi quase que integralmente atingido, uma vez que foi confirmada a influência das funções de organização a priori identificadas pela Acreditação Hospitalar sobre a gerência do ambiente e, em particular, da Educação do Paciente e Familiar, mesmo que não tenha sido possível quantificá-la, em parte devido à elevada correlação entre as variáveis independentes, que dificultou individualizar sua influência sobre a gerência do ambiente hospitalar e em parte devido à pequena variância dos escores usados como variáveis independentes (GUJARATI, 2006). Em outras palavras, a confirmação desse tipo de associação e a estimativa de medidas da influência de cada variável sobre a gerência do ambiente hospitalar não foi em geral possível, em função das dificuldades encontradas para obter estimadores com pequeno erro padrão para esses coeficientes, por força da soma dos problemas de multicolinearidade com aqueles relacionados ao tamanho da amostra e à pequena variância das variáveis definidas no modelo que foram enfrentados na análise de regressão múltipla. Em termos agregados, porém, o resultado da Análise Fatorial permite confirmar, sem perda de generalidade, a associação entre, de um lado, o treinamento, a gestão participativa com governabilidade, a educação do paciente e familiar e a gerência da informação pelo prestador de serviço e, de outro lado, a melhoria da gerência do ambiente hospitalar, identificando a contribuição potencial do aperfeiçoamento destas funções para a expansão da UH e para o desenvolvimento do mercado de serviços de saúde. Em primeiro lugar, a menção detalhada aos dados contidos nos relatórios educativos, assim como ao grande número de unidades amostrais cujos dados estão potencialmente ao alcance da pesquisa sobre a gestão das UHs, visou despertar: a) o interesse dos pesquisadores pelo estudo de diferentes representações dessas organizações como unidades produtivas (DJELLAL; GALLOUJ, 2005; OZCAN, 2009) e de diferentes mecanismos orientados pelo mercado que podem suprir o incentivo para a prestação de serviços de saúde; e b) um novo tipo de engajamento da administração e dos profissionais na experiência da Acreditação Hospitalar, em que a percepção de ambos sobre as relações existentes entre os padrões das rotinas de atividades específicas, as funções da organização e os objetivos de posicionamento estratégico da UH pode contribuir para o 55 compromisso do gerente com o suporte à rotina das unidades operacionais, ao mesmo tempo em que pode descentralizar o incentivo (FAÇANHA; RESENDE, 2010) e motivar o especialista a partir de um horizonte de inserção mais abrangente e funcionalmente promissor. Quanto ao tamanho da amostra, em segundo lugar, cabe mencionar que os resultados obtidos em relação aos objetivos anteriores encorajam futuras replicações desta pesquisa empírica em amostras maiores, como caminho promissor para estudar a reconhecida influência dos diversos mecanismos internos de aperfeiçoamento da gestão sobre o desempenho das UHs (LA FORGIA; COUTTOLENC, 2008) e o desenvolvimento do mercado de serviços de saúde. Espera-se, finalmente, que a análise de um número maior de unidades de observação também possa amenizar o problema de especificação das variáveis independentes que foi apontado como terceiro óbice a um resultado mais completo, uma vez que a opção atual decorreu de limitações incontornáveis da escala com três categorias de mensuração de conformidade que é usada na avaliação educativa. As ressalvas são as variáveis representativas do tipo de propriedade e do tamanho. Com respeito à primeira dessas variáveis, que se mostrou significativa a 5%, a evidência extraída da análise aponta que a organização privada é relativamente mais propensa à conformidade dos padrões de gerência do ambiente hospitalar do que a UH sujeita à administração pública, desta forma revelando mais capacidade de resposta às limitações do marco regulatório e dos canais judiciais para a solução dos conflitos entre a administração, os usuários e os profissionais. Em contrapartida, não foi possível confirmar a influência do tamanho da UH sobre a conformidade dos padrões observados de gerência do ambiente hospitalar. Como se pode ver, a dificuldade para gerenciar o ambiente da UH representa um handicap para o sucesso da estratégia de prestação de serviço da organização e pode constituir um obstáculo ao desenvolvimento do mercado de serviços de saúde, corroborando a importância do resultado acerca do efeito ampliado que o gasto em informação tem no ambiente hospitalar, embutido no coeficiente do Fator 1. Recentemente, com a reforma do Estado e maior ênfase na busca de eficiência (SMITH; STREET, 2005) no uso dos recursos da assistência à saúde no país, a adesão aos princípios da administração pública gerencial deu origem à utilização da Certificação Hospitalar também nas organizações governamentais (LA FORGIA; COUTTOLENC, 2008). 56 Nessas organizações, particularmente caracterizadas por colegiados de tomada de decisão descentralizados, o modelo da Acreditação Hospitalar reveste-se de grande importância como um modelo de aprendizado em que os relatórios da Acreditação são usados para catalisar a adesão da administração e dos profissionais a padrões de atendimento de forma coordenada. A influência da cultura em questões dessa natureza já é conhecida. As conclusões obtidas a partir desta dissertação contribuem, portanto, para elucidar elementos da doutrina da Acreditação Hospitalar, facilitam o entendimento dos profissionais a respeito da integração das suas atividades específicas com o conjunto das funções gerenciais da UH e proporcionam o incentivo para o seu engajamento com a dinâmica de mudança com vistas à certificação. Também favorecem o entendimento da necessidade de compromisso da administração da UH com a gerência do ambiente hospitalar e esclarecem a potencial importância desta função organizacional para a busca de posicionamento estratégico da UH e, em última análise, para o desenvolvimento do mercado de serviços de saúde. Tendo em vista a oportunidade que a representação das características de organização da UH segundo o manual da Certificação Hospitalar nos abre para conhecer os fatores internos influentes sobre o desempenho destas organizações, recomenda-se (a) o desdobramento do marco analítico aqui utilizado para explorar outras relações de influência entre as funções de organização que são avaliadas nos relatórios para Acreditação, (b) a extensão deste tipo de pesquisa empírica para amostras maiores e (c) que novas pesquisas sejam direcionadas às organizações da esfera pública de prestação de serviços de saúde (SMITH; STREET, 2005). A importância que outras pesquisas deste tipo podem ter para o compromisso da administração e dos profissionais com a reestruturação interna dessas organizações deve ser em particular mencionada com relação às UHs da rede pública (VAKKURI, 2003), para as quais o conhecimento das implicações do processo de decisão colegiada no ‘ajuste mútuo’ abarca outras funções de organização não cobertas nesta dissertação (MINTZBERG et al, 2006). Com relação ao objetivo específico de produção de contribuição gerencial de interesse do IPEC, finalmente, o estudo de caso: a) permitiu caracterizar a busca de conformidade dos padrões da Educação do Paciente e Familiar como exemplo de esforço de inovação; de que “a acumulação de mudanças menores e de pequenas inovações pode ter grande impacto em produtos e 57 processos. [...] não somente a inovação em sentido estrito, mas também o conjunto de atividades constitutivas de esforços tecnológicos (RICYT/OEA/CYTED, 2001); b) permitiu acumular evidências, vale dizer, de que a inovação tem espectro mais amplo na organização de produção multifuncional do tipo da UH; de que pode ser de natureza tecnológica, organizacional ou de produtos e serviços (GRADEY, 2001); c) confirmou, nesse sentido, a influência estatisticamente significativa da educação do paciente e do familiar na qualidade do ambiente hospitalar, ou seja, de que a influência dos esforços de inovação relativos à educação do paciente e familiar, embora não quantificada, é positiva; e d) sugeriu, com respeito ao IPEC, que, dada a situação diagnosticada pelo processo educativo da AH em 2006, as deficiências de Educação do Paciente e Familiar desta UH, potencialmente impactantes na sua Gerência do Ambiente Hospitalar, estavam concentradas nas Não-Conformidades com respeito: d.1) à insuficiência dos esforços de inovação relativos à sistematização do diagnóstico sobre quais são as carências existentes; d.2) à insuficiência dos esforços de inovação relativos à sistematização do diagnóstico sobre quais são as vias mais promissoras de melhoria da interação educativa com os pacientes e familiares; e d.3) à insuficiência dos esforços de inovação relativos à educação de caráter preventivo do paciente e familiar, tendo em vista o pós-alta do paciente; e e) apontou a efetividade da inovação incremental focalizada nos seguintes tipos de esforços de inovação: e.1) relativos ao diagnóstico das carências existentes e à identificação de soluções: - práticas institucionais em que a educação do paciente e familiar em saúde envolve toda a equipe da UH; - planejamento das atividades de educação com práticas transdisciplinares; - entrevista com os pacientes e/ou familiares para identificação do diagnóstico das necessidades de educação; - registro das informações relativas à educação do paciente realizado por todos os profissionais; - registro das informações relativas à educação do paciente anotado no prontuário; e - prover o paciente de todas as informações que sejam necessárias para tomar decisão consciente em relação ao consentimento informado; e 58 e.2) relativos à educação preventiva do paciente e familiar para a alta: - um resumo de alta relativo à educação do paciente e familiar com orientações apropriadas ao seu caso; - orientação quanto ao armazenamento, possíveis interações (entre medicamentos e/ou alimentos) e efeitos adversos; e - orientações quanto à participação do processo do seu cuidado e também do autocuidado. 59 8. 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