Teoria do Afluente, Hierarquia das Normas do Direito

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Teoria do Afluente, Hierarquia das Normas do Direito do
Trabalho, Princípios, Conflitos e Flexibilização
*Daniel Castro do Vale Lagash
É possível tal Mixórdia e Adequação?
Teoria do Afluente¹, Hierarquia das Normas do Direito do Trabalho, Princípios,
Conflitos e Flexibilização é possível tal Mixórdia e Adequação?
*Daniel Castro do Vale Lagash
A título de explicação preliminar, e remetendo-me ao questionamento do título deste
artigo, respondo que é possível a adequação ou convivência desses institutos na ciência
trabalhista, visto que a aparente mistura ou confusão se dá por tratar-se o direito de
uma ciência humana em constante evolução entremeada e sujeita às intempéries
históricas, culturais, sociais e econômicas da sociedade.
O Direito do Trabalho, por ser composto por um complexo de regras, princípios e
institutos jurídicos que regulam as relações de trabalho, é entendido como ramo
autônomo do direito. Esta autonomia se dá pelo preenchimento de três exigências² para
determinar a autonomia de um ramo qualquer do direito quais sejam: domínio
suficientemente vasto, doutrinas homogêneas e conceitos gerais comuns além de
possuir método próprio.
As normas de direito do trabalho que acabam por representar as fontes deste direito,
podem ser apresentadas e reconhecidas pela Constituição da República Federativa do
Brasil, Leis Ordinárias e seus regulamentos, Sentença Normativa, Convenção Coletiva,
Acordo Coletivo, Costume, Regulamento de Empresa e Contrato de Trabalho.
Ressalte-se que a hierarquia das normas trabalhistas se dão nesta ordem respectiva,
contudo, apesar dehaver o seu reconhecimento, esta hierarquia poderá ser mitigada.
Tal mitigação, ou melhor, movimentação de perfectibilização de normas, se dá a partir
do entendimento da teoria do afluente bem como do princípio específico do direito do
trabalho nomeado "da proteção" que regerá conflitos e sua não aplicação quando em
termos de flexibilização. Adiante, estes serão deslindados, mais com um escopo de um
breve preleção.
Para um melhor entendimento, partirei da análise do que vem a ser um princípio, vindo
posteriormente a conceituar e conseqüentemente destrinchar o Princípio da Proteção,
identificando neste, o viés que rege o conflito entre duas normas de direito do trabalho
para aí sim adentrarmos na teoria do afluente e a prevalência de normas
flexibilizadoras no direito do trabalho hodierno.
Celso Antonio Bandeira de Mello³ ao discorrer sobre a importância dos princípios e
seu estudo na ordem jurídica afirma que um princípio é mandamento nuclear de um
sistema, vindo a configurar seu verdadeiro alicerce sendo uma:
"[...] disposição que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e
servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a
lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá
sentido harmônico. É do conhecimento dos princípios que preside a intelecção das
diferentespartes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico
positivo."
Considerando bastante tal definição para efeitos das análises que doravante virão,
apesar de certamente não esgotar o tema, temos, portanto, que o Princípio da Proteção
vem a ser aquele que contrabalanceia a desigualdade entre empregador e empregado.
Assim concerne ao desequilíbrio de forças entre estes, quando o último muitas vezes
deixa de lado sua dignidade para manter-se no emprego. Muitos autores justificam a
existência deste princípio tutelar pela história de séculos de dominação do mais forte
sobrepujando o mais fraco.
Maurício Godinho4 no que tange a tal princípio assim aduz:
"O princípio tutelar influi em todos os segmentos do Direito Individual do Trabalho,
influindo na própria perspectiva desse ramo ao construir-se, desenvolver-se e atuar
como direito. Efetivamente, há ampla predominância nesse ramo jurídico
especializado de regras essencialmente protetivas, tutelares da vontade e interesse
obreiros; seus princípios são fundamentalmente favoráveis ao trabalhador; suas
presunções são elaboradas em vista do alcance da mesma vantagem jurídica
retificadora da diferenciação social prática. Na verdade, pode-se afirmar que sem a
idéia protetivo-retificadora, o Direito Individual do Trabalho não se justificaria
histórica e cientificamente."
Desta maneira podemos afirmar que o princípio da proteção é composto pelas
seguintes regras ou seguintes vieses: in dubio pro operario, norma mais favorável e
condição mais benéfica. Daremos aqui uma pincelada em cada uma delas.
No que concerne a regra in dubio pro operario esta não tem por escopo corrigir a
norma ou integrá-la, mas determinar o verdadeiro sentido dentro dos inúmeros
possíveis. Tem como pressuposto uma única norma, suscetível de diferente
interpretação, devendo a dúvida ser dirimida em favor do empregado. Diz-se que é
imperativa a existência de uma norma. Além do mais, apresenta como condições de
aplicação desta regra quando exista dúvida do alcance da norma legal, não ocorrendo
assim desacordo com a vontade do legislador. 5
Já no que tange a condição mais benéfica estamos tratando de aplicação de normas
relativas ao confronto de leis no tempo. Posso afirmar que tem relação com a
existência de uma condição de fato anterior. Tal condição é entendida como uma
situação in concreto que, por já ser existente, pode-se dizer então ser determinada.
Contudo deve ser reconhecida de modo que de posse desses requisitos tal regramento
deve ser respeitado se mais favorável ao trabalhador. A título de exemplificação, se
uma empresa outorga ou confere situação concreta ao trabalhador ou mesmo se haja
um direito concedido por lei anterior deve se conservar as vantagens auferidas pelo
trabalhador caso se entenda mudar uma lei ou regulamento com o escopo de assim
evitar a piora na vida do trabalhador.
Por fim, a norma mais favorável, conforme uma ampla gama de doutrinadores,
parafraseio aqui Amauri Mascaro Nascimento, considera o princípio da norma mais
favorável como o grande princípio do Direito do Trabalho, por possuir tríplice função:
a primeira referente a elaboração de normas jurídicas mais favorável ao trabalhador; a
segunda é o princípio da hierarquia das normas jurídicas, já que havendo diversos tipos
de normas prevalecerá a mais benéfica ao trabalhador; a terceira função é a de
interpretação das normas jurídicas de modo que havendo duas ou mais formas da
interpretar a norma jurídica será escolhida a que conduzir ao melhor resultado para o
trabalhador. 6
Neste desiderato utilizaremos, portanto, a regra da norma mais favorável para dirimir o
conflito de normas no espaço. Se observarmos o previsto no art. 620 da CLT temos in
verbis:
Art. 620 As condições estabelecidas em Convenção quando mais favoráveis
prevalecerão sobre as estipuladas em acordo.
Donde não necessariamente trata-se de regra que aplica-se somente a essas duas
fontes(convenção e acordo), mas por estarmos aqui tratando de um princípio, este se
aplicará a todas as normas de direito do trabalho anteriormente citadas.7
Partindo, portanto, deste conhecimento aqui auferido em caso de conflitos de duas
normas no espaço deve-se aplicar a norma mais favorável. A Teoria do Afluente tem
por objeto o conflito de normas a fim de se identificar qual a norma deverá ser
aplicada independentemente da hierarquia das normas de direito do trabalho
reconhecida pelos doutrinadores trabalhistas, apesar de estes também não a
entenderem de forma estanque assim como este autor. Temos, portanto, que quando
houver duas normas a serem aplicadas no mesmo momento, ou ao mesmo tempo,
deve-se aplicar aquela que é mais favorável ao empregado por força do princípio da
proteção.
A teoria do afluente, aqui se movimenta a partir do momento em que se vislumbra, a
partir desta explicação teórica, que é perfeitamente possível uma norma
hierarquicamente inferior suplantar uma norma hierarquicamente superior. A teoria do
afluente, portanto, como um rio que deságua noutro, trata-se da perfectibilização de
uma norma mesmo que hierarquicamente inferior quando de um conflito de aplicação
simultânea de normas(conflito de normas trabalhistas no espaço) esta se mostrar mais
favorável ao empregado vindo a prevalecer. Para efeito de exemplificação, basta
imaginar um contrato de trabalho que se encontra na base do sistema hierárquico das
normas trabalhista que possui normatização mais benéfica do que uma lei ordinária
que trata de direitos trabalhistas, certo será que apesar de hierarquicamente superior a
lei ordinária o direito desaguará naquele que se mostrar mais favorável ao empregado,
o que no exemplo aqui dado se configura o contrato de trabalho firmado entre
empregador e empregado.
Apesar da movimentação hierárquica possibilitada pela teoria do afluente deve-se aqui
registrar o caput do art. 7º da Constituição da República Federativa do Brasil, que
apresenta os direitos dos trabalhadores criando espaço a outros direitos quando aduz
que "são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais além de outros que visem a
melhoria de sua condição social". Assim sendo, desde que visem a melhoria da
condição social, mesmo não estando previstos na Constituição, mas estando previstos
num contrato de trabalho, como no exemplo dado anteriormente, é perfeitamente
possível a teoria do afluente.Até mesmo porque a continuidade deste direito que
deságua noutro direito mais favorável tem previsão na sistemática jurídica da carta
maior, consubstanciando as demais normas do Estado Democrático de Direito
Brasileiro.
Por fim, para que não me estenda em demasia, vimos que a ordem hierárquica é
possível de ser alterada diante de uma norma mais favorável. Contudo, quando
tratamos de norma flexibilizadora, esta norma não será alterada, devido norma mais
favorável. A flexibilização, grosso modo, tem por escopo constituir um ordenamento
flexível, com vistas a se adaptar às exigências empresariais e à criação de novos
empregos, apesar de alguns doutrinadores a considerarem como um tipo de
desregulamentação do direito do trabalho. De toda forma, o que importa ressaltar é que
caso se tenha a ocorrência de uma norma flexibilizadora em face da autonomia privada
coletiva, não se aplicará esta norma mais favorável ao empregado, mas sim a norma
flexibilizadora. Exemplo seria a de uma convenção coletiva que reduz o salário e a
respectiva jornada de trabalho dos empregados quando o país passa por uma crise
econômica. Numa análise pela norma mais favorável, a regulamentação salarial
anterior é mais benéfica vista superficialmente, posto que um salário maior é melhor
do que um salário menor. Todavia, o que incumbe ressaltar e diferenciar a Teoria do
Afluente de criações assemelhadas como a da hierarquia dinâmica das normas é que
mais do que a diferenciação de nomes, a Teoria do Afluente se mantém absoluta
mesmo em face da flexibillização. A Teoria do Afluente engloba a flexibilização
afirmando que no caso de conflitos é possível ser alterada a ordem hierárquica diante
de uma norma mais favorável. Contudo, quando da presença de norma flexibilizadora,
permanecerá atuando diante de "norma mais favorável", mas agora não só em vistas a
singularidade de um empregado, mas a coletividade. Consoante o último exemplo,
temos na verdade a observância, no entender deste autor, de uma "norma mais
favorável", não para o empregado singular, apesar de também em análise última o ser
também, mas para a coletividade de empregados. Neste mesmo exemplo a redução de
salários, apesar de regra geral não ser permitida, tem por objetivo manter os
empregados em seus respectivos empregos, evitando assim uma demissão em massa.
O que seria, portanto, mais favorável? Manter um princípio protetivo que viesse a
desproteger o trabalhador, caso se analisasse a questão de maneira estanque? Para um
melhor entendimento: ser rígido na aplicação da norma mais favorável ao empregado,
mesmo que a permanência dessa rigidez acabe por criar a situação de desproteção
deste trabalhador, como no caso em comento, gerando seu desemprego? Assim é que a
teoria do Afluente englobando o conceito de norma flexibilizadora atua como protetora
dos direitos em sede de direitos trabalhistas, sendo flexível o suficiente para interpretar
que o favorável ao empregado nem sempre é o que aparenta ser "mais favorável". Por
outro lado o que pode estar por trás de uma constante flexibilização? Uma verdadeira
desregulamentação do direito do trabalho que venha posteriormente a configurar um
cenário de aniquilação do princípio protetivo? Um novo caminhar para
desregulamentação, vindo o diploma civil a dirimir os problemas contratuais? Vejo
como improvável este cenário apesar das inúmeras pressões neoliberais. A dose a ser
aplicada pelos operadores do direito e as ações dos legisladores é que demonstrarão os
rumos do direito do trabalho.
1.Teoria do Afluente é uma teoria engendrada pelo Sr. Daniel Castro do Vale, também
conhecido como Dr.Lagash, autor deste artigo. A teoria do afluente, como um rio que
deságua noutro, ensina que é perfeitamente possível uma norma hierarquicamente
inferior suplantar uma norma hierarquicamente superior. Trata-se da movimentação de
perfectiblização de normas quando da não precedência da hierarquia de normas do
direito do trabalho englobando o conceito de norma flexibilizadora e atuando como
protetora dos direitos em sede de direitos trabalhistas, sendo flexível o suficiente para
interpretar que o favorável ao empregado nem sempre é o que aparenta ser mais
favorável.
2. Alfredo Rocco citado por RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do
Trabalho, 2000, p.23.
3. Celso Antônio Bandeira de Mello apud SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da
Principiologia do Direito do Trabalho,1999, p.12.
4. DELGADO, Maurício Godinho.Curso de Direito do Trabalho. Editora: Ltr 2004,
p.197-198
5. RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho, 2000, p.110.
6. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho.1990, p.26.
7. As normas de direito do trabalho foram descritas no terceiro parágrafo deste artigo,
tratam-se da Constituição da República Federativa do Brasil, Leis Ordinárias e seus
regulamentos, Sentença Normativa, Convenção Coletiva, Acordo Coletivo, Costume,
Regulamento de Empresa e Contrato de Trabalho.
Fonte: Webartigos.com | Textos e artigos gratuitos, conteúdo livre para reprodução. 1
*Daniel Castro do Vale Lagash: Psicanalista, bacharel em Direito, Professor de
Administração e Filosofia
Disponível em: http://www.webartigos.com/articles/22711/1/teoria-do-afluentehierarquia-das-normas-do-direito-do-trabalho-principios-conflitos-eflexibilizacao/pagina1.html
Acesso em: 17 ago. 2009.
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