CRIATIVIDADE, ASSISTÊNCIA E TRATAMENTO Uma das principais características da AIDS é sua capacidade de mutação, adaptando-se às constantes investidas e esforços que vêm sendo feitos em relação ao controle da epidemia. Certamente - esperamos que em breve - poderemos olhar para trás e ver a AIDS como mais uma doença que, além de poder ser evitada, poder ser controlada e curada. Enquanto isso não acontece, cabe a todos nós também sermos mutantes, mantendo sempre acesa a criatividade para descobrir caminhos e alternativas viáveis para enfrentar as principais questões que envolvem a epidemia de HIV/AIDS. Entre elas, assistência e tratamento. Por ser um assunto abrangente, optamos por fazer uma edição ampliada do Boletim ABIA: o objetivo foi apresentar o máximo de informações possíveis. Começamos com a participação de Betinho, que faz um apanhado geral da situação, sinalizando que, apesar das dificuldades no acesso a medicamentos, já surgem iniciativas governamentais que devem ser apoiadas. Numa longa entrevista exclusiva, o coordenador substituto do Programa Nacional de DST/AIDS, Pedro Chequer, apresenta as ações desenvolvidas pelo Ministério da Saúde em relação a assistência e tratamento, assim como o infectologista Caio Rosenthal assina artigo apresentando uma visão global do tratamento antiretroviral. Contamos, ainda, com as opiniões de Mário Scheffer (Pela VIDDA/SP), sobre o Protocolo 028, em relação aos testes do medicamento indinavir em São Paulo envolvendo soropositivos; Chico Pedrosa (RNP+/Núcleo Pernambuco), comentando as atuais lutas da Rede; e Jorge Beloqui (GIV/ABIA), que faz considerações sobre o acesso a medicamentos, pedindo maior criatividade de cientistas e governantes. Também acreditando na criatividade como forma de luta, a ABIA, com esta edição, espera estar contribuindo para novas discussões e munir as pessoas, direta e indiretamente envolvidas com a epidemia, de um número maior de informações para que seja possível conhecer para dialogar, tratar e assistir as pessoas com HIV/AIDS. A AIDS HOJE: POSSIBILIDADES E DESAFIOS Herbert de Souza Presidente da ABIA Quando a AIDS surgiu, o HIV foi apresentado pela comunidade científica como fatal, dramático, epidêmico e praticamente incurável. Era o pior dos mundos, sem contar que a questão foi tratada com alta dose de preconceito e discriminação, em que as únicas vítimas que se salvavam da "culpa" eram os hemofílicos. Desde o início da epidemia de HIV/AIDS no Brasil, em 1985, a velocidade no tratamento da epidemia foi, e continua sendo, muito grande. Praticamente não existe um dia que não surjam novidades, abrindo novos horizontes e possibilidades. Os desenvolvimentos mais positivos e importantes, no entanto, se deram nos últimos anos com o surgimento de novos tratamentos, os coquetéis. E é exatamente aí que se encontra a dimensão mais dramática do problema: o coquetel funciona, mas é caro e não está acessível à maioria dos portadores do vírus ou doentes. A doença pode ser controlada, mas só por aqueles que dispõem de meios financeiros ou assistência de órgãos públicos para ter acesso aos novos medicamentos. Foi criada assim uma nova divisão dentro do campo da AIDS: os que podem sobreviver, e inclusive manter sua qualidade de vida, e os que devem morrer sabendo que a solução está na esquina. Essa situação é comum a praticamente todos os países do mundo, com diferenças notáveis em alguns poucos países desenvolvidos, que estão garantindo os coquetéis de forma mais universal e gratuita. No Brasil, foi necessária uma luta muito grande para que essa questão entrasse na agenda dos serviços públicos. Desde o início, a questão era apresentada como ausência de recursos financeiros para a compra de medicamentos tão caros. A situação, hoje, está longe de estar resolvida, mas já se pode observar avanços expressivos nessa direção. O número de pessoas infectadas e doentes é visivelmente superior ao atendimento que está sendo propiciado pelos serviços de saúde pública; a continuidade dessa assistência ainda não é uma situação totalmente resolvida. Enquanto isso, a epidemia cresce e se pauperiza cada vez mais, a classe média de alguma maneira consegue se tratar e os pobres não assistidos estão condenados a morrer, como morriam nos anos 80. A ABIA tem insistido que o principal tratamento de AIDS ainda continua a ser a prevenção e a maior atenção e prioridade aos esforços no sentido de termos campanhas amplas, permanentes, gerais e dedicadas a públicos específicos como forma de diminuir e depois eliminar a expansão da epidemia. Mas também insiste que a questão dos tratamentos, principalmente agora que novas e promissoras possibilidades surgiram, deve ter, da parte dos poderes públicos, um tratamento especial, urgente e constante, dado que neste momento trata-se efetivamente de salvar vidas. Os critérios médicos para o uso dos coquetéis devem ser considerados junto com os critérios sociais que afetam as possibilidades de tratamento dos portadores do vírus e doentes de AIDS. Há que se atender aos que mais necessitam, aos mais pobres e há que se acreditar - agora mais do que nunca - que a AIDS está a caminho da cura; ganhar tempo é fundamental. Há uma abertura e iniciativas nas novas autoridades do Ministério da Saúde que devem ser apoiadas e ampliadas. A AIDS não é uma questão somente do Estado, é também das empresas e de toda a sociedade. ESCLARECENDO SUA DÚVIDA Esta coluna é fruto da participação da ABIA no programa "É de manhã", da TVE do Rio de Janeiro, levado ao ar diariamente ao vivo e em rede nacional até o final de 1996. O objetivo do Esclarecendo sua dúvida foi responder às perguntas feitas pelos telespectadores, via telefone, que não puderam ser contempladas durante a transmissão. Com o término do programa, a ABIA decidiu manter a coluna, acreditando ser um espaço aberto para continuar esclarecendo questões sobre HIV/AIDS enviadas diretamente à nossa sede. INIBIDORES DA PROTEASE: INFORMAÇÕES BÁSICAS O QUE SÃO OS INIBIDORES DA PROTEASE? Os inibidores da protease são uma nova classe de medicamentos anti-retrovirais (drogas que impedem a reprodução do HIV no corpo humano). Os inibidores da protease bloqueiam uma parte do HIV, chamada "protease". Sem ela, o HIV produz cópias perfeitas de si mesmo que não podem infectar novas células. Vários estudos clínicos de inibidores da protease têm demonstrado que estes medicamentos, tomados isoladamente ou em combinação com outras drogas antivirais (AZT, ddl, ddC, d4T, 3TC), podem diminuir a carga viral (a quantidade de HIV presente no sangue). Também podem aumentar a contagem de células T (células CD4). Os melhores resultados vêm sendo observados em pessoas que tomam uma terapia combinada de medicamentos. É importante mencionar que são necessários mais estudos para compreender melhor o uso desta nova classe de drogas. QUANDO SE DEVE COMEÇAR A TOMAR OS INIBIDORES DA PROTEASE? Ainda não se sabe qual á a melhor época para começar o tratamento com os inibidores da protease. Um estudo de pessoas com AIDS que tinham uma contagem de células T menor do que 100 demonstrou que as que tomaram os inibidores da protease sobreviveram por mais tempo (aproximadamente seis meses mais) que as pessoas que não os tomaram. Com base nestes resultados sabemos que se a pessoa tem contagem baixa de células T, contagem viral alta, sintomas de doença e/ou vem sendo portador do HIV por muito tempo, deve falar com seu médico sobre a possibilidade de começar o tratamento de combinação que inclua um inibidor da protease. Os médicos não sabem se tomar estes medicamentos na etapa inicial da infecção - quando o conteúdo de células T é alto e a carga viral é baixa - ajuda a prolongar a vida ou a prevenir o desenvolvimento da AIDS. Em tese, o começo de tratamento com um inibidor da protease quando a carga viral é baixa deve ajudar a droga a trabalhar melhor. É POSSÍVEL O DESENVOLVIMENTO DA RESISTÊNCIA VIRAL COM OS INIBIDORES DA PROTEASE? Depois de algum tempo no organismo humano, o HIV aprende a se "sobrepor" ou a "resistir" aos efeitos dos medicamentos antivirais. Este fenômeno é chamado "resistência viral". A resistência faz com que a droga não funcione bem ou não funcione completamente, mas ela não desaparece. É possível que quando a pessoa desenvolve resistência a um tipo de inibidor da protease também tenha desenvolvido resistência a outros inibidores da protease (é preciso lembrar que existem inibidores da protease diferentes). Este fenômeno se chama "resistência cruzada". Alguns estudos demonstram que os inibidores da protease em combinação com outras drogas anti-retrovirais reduzem as possibilidades de desenvolvimento da resistência viral. A melhor maneira de evitar o atraso de desenvolvimento da resistência é tomar as drogas da maneira indicada. As seguintes condições propiciam a resistência aos medicamentos: tomá -los irregularmente, não tomá los como foram prescritos e não seguir as indicações de alimentos que devem ou não ser ingeridos com eles. _____________ Estas informações constam da série "inibidores da Protease”, produzida pelo Gay Men's Health Crisis. Tradução: Marta Torres. ACESSO A MEDICAMENTOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES JORGE BELOQUI Integrante do Grupo de Incentivo à Vida (GIV/SP) e do conselho de curadores da ABIA. A questão do acesso a medicamentos no Brasil e nos demais países do Terceiro Mundo envolve muitos aspectos. Aqui, alguns pontos que considero importantes e que, acredito, devam ser mais amplamente discutidos. I - De acordo com a Constituição, a saúde dos brasileiros é de responsabilidade do Estado. O artigo nº 21 do Ministério da Saúde garante, desde 1995, o acesso a AZT, ddl, aciclovir (apenas em alguns estados), ddC e ganciclovir a todos os pacientes HIV+ que precisem tomar estes medicamentos. Além disso, o decreto-lei n.º 9.313, de outubro de 1996, amplia esta obrigação, fazendo com que o governo padronize os tratamentos utilizados em cada uma das etapas da infecção por HIV/AIDS e exigindo a compra, conforme sejam descobertos, de medicamentos mais poderosos que venham surgindo contra as doenças relacionadas à AIDS. II - Em maio de 1995 o congresso brasileiro aprovou a Lei de Patentes, que beneficia e protege produtos patenteados fora do país. Isto significa que a indústria estrangeira volta a ter o monopólio sobre vários produtos no Brasil, inclusive remédios para AIDS e outras doenças. A pressão mais forte e mais ostensiva veio do presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton. O nosso governo cedeu, e a lei foi aprovada, inclusive pelos Estados Unidos. Este é um dos resultados da "globalização": monopólio. Uma importante iniciativa seria a desaprovação destas leis de patentes nos países em desenvolvimento, já que, através delas, os países mais pobres são obrigados a pagar aos países desenvolvidos altas somas de dinheiro em razão de seu subdesenvolvimento. III - O lucro per capita das indústrias farmacêuticas nos países em desenvolvimento é mais alto que nos desenvolvidos: na Costa Rica o invirase custa U$800, enquanto nos Estados Unidos o mesmo medicamento custa muito mais barato (U$337). O lucro per capita deveria ser menor nos países mais pobres do que nos ricos. OU NÃO? IV - Penso que a epidemia de HIV/AIDS e as vacinas antiHlV são questões de saúde pública, mas até‚ o momento os governos têm desenvolvido suas políticas de modo totalmente dependente dos interesses das indústrias farmacêuticas, como se essas saúde pública e não em seus próprios lucros. Portanto, é preciso preservar e criar instituições dedicadas saúde pública, cujas soluções nem sempre com os interesses do mercado. V - Outra sugestão seria a de que pensam e fazem a respeito de medicamentos acessíveis. Durante a 4ª Conferência sobre Retrovírus, realizada em janeiro de 1997 relatou-se uma variedade de medicamentos em experimentações que agem de forma inovadora. As únicas propostas sobre acesso foram apenas duas: uma nevirapina (um novo antiviral) em mulheres grávidas soropositivas imediatamente antes do parto seguida de uma única dose para o recém-nascido no prazo de três dias, para prevenir a infecção pelo HIV. Também foi proposta a realização de um teste para vacina preventiva de vírus atenuado em pacientes terminais com doenças como no cólon. Isto motivou que a pesquisadora Ann Collier, ao fazer um resumo dos resultados da conferência, apontasse a criatividade científica na busca de medicamentos para deter o HIV. Acreditamos ser necessária também a criatividade aplicada na campo do acesso, inclusive aos medicamentos inovadores. VI - Como se pode concluir: nenhuma perspectiva de tratamento para pessoas nos países em desenvolvimento, apenas prevenção! Será que a ciência está realmente interessada ou comprometida em desenvolver terapias para todas as pessoas com HIV/AIDS no mundo ou apenas para aquela minoria que pode adquiri-las individualmente ou através dos sistemas de saúde de seus países? Será que a ciência atual realmente está interessada ou comprometida com a saúde pública? Penso que o tratamento deve significar tratamento concreto e correto para todos os que têm o vírus. Para isso, criatividade e independência são mais que necessárias! TROCANDO IDÉIAS COM PEDRO CHEQUER Por Jacinto Corrêa Jornalista NA BUSCA DE AÇÕES GOVERNAMENTAIS MAIS EFICIENTES Desde agosto de 1996 à frente do Programa Nacional de DST/AIDS, o epidemiologista Pedro Chequer em entrevista exclusiva ao Boletim ABIA, comenta os mais variados aspectos da atual situação de assistência e tratamento em HIV/AIDS no Brasil. Como destaque, os obstáculos para uma distribuição de medicamentos mais eficiente e as perspectivas futuras em tratamento e assistência. COMO O SENHOR VÊ O PANORAMA ATUAL DE ASSISTÊNCIA E TRATAMENTO EM HIV/AIDS NO BRASIL ? O Programa Nacional de DST/AIDS (PN DST/AIDS) é responsável pela organização, normatização, coordenação e supervisão das atividades diretamente ligadas ao atendimento das DST/HIV/AIDS em todos os estados e municípios conveniados. Foi definido o Programa de Serviços Integrados para a Assistência Adequada aos Portadores de DST/HIV/AIDS no âmbito dos princípios básicos de universalidade, regionalização, hierarquização e integralidade do Sistema Único de Saúde (SUS), com vistas a organizar o atendimento e institucionalizar um sistema de referência e contra-referência entre os níveis primário, secundário e terciário da rede assistencial. Nesta área destacamos a assistência domiciliar terapêutica (ADT), modelo implantado pelo Ministério da Saúde para o atendimento aos doentes com AIDS no Brasil, procurando cumprir uma das metas definidas pelo Governo Federal de viabilizar alternativas à internação hospitalar. Trata-se de um modelo de atendimento diferenciado, através de equipes formadas por médicos, enfermeiros, assistentes sociais e psicólogos aos portadores de HIV/AIDS, em nível domiciliar. Os projetos de assistência domiciliar refletem, ainda, a política de garantir que as formas alternativas assistenciais complementem as ações para a melhoria da qualidade de vida das pessoas que vivem com AIDS no Brasil. Um dos fatores que justificam a implantação desse sistema no Brasil é a grande demanda de assistência dos pacientes com AIDS, sobretudo na internação e, principalmente, devido à necessidade de múltiplas internações. Com isso, esperamos a diminuição de internações convencionais, do índice de ocupação e do período de permanência de pacientes nos leitos hospitalares, reduzindo custos para o SUS, além do aspecto que considero mais fundamental: a humanização do atendimento e a participação da família no processo. Além da ADT, o PN DST/AIDS vem incentivando e desenvolvendo os hospitais-dia (HDS), para atender aos pacientes de AIDS que precisam de intervenções em ambiente hospitalar e que possam ser efetuadas num período de, no máximo, 8 horas. É necessário, também, que os pacientes tenham condições de transporte para retornar as suas casas depois do atendimento. A implantação desse sistema foi realizada através do acordo de cooperação entre os governos brasileiro e francês, na área de saúde. O acordo existe desde 1990 e prevê, além do hospital-dia e da ADT, programas de intervenção em populações específicas e pesquisas diretas em HTLV1/2 e HIV. Segundo dados da Secretaria de Assistência a Saúde, do Ministério da Saúde, em 1995 houve 28 mil 509 AIHs (autorização de internação hospitalar) emitidas para internações de doentes de AIDS em hospitais tradicionais, com um valor médio de R$ 639, 90. No mesmo ano, foram emitidas 3 mil 568 AIHs para internação nos hospitais-dia, com valores médios de R$ 154,18. No ano passado, o número de AIHs emitidas para internações em AIDS aos hospitais tradicionais caiu para 25 mil 458, sendo que o valor médio ficou em R$ 662,04. No entanto, as AIHs para internações nos hospitais-dia subiram para 5 mil 937, com o valor médio de R$ 166,78. O número de hospitais-dia credenciados no SUS também subiu de 288, em 95, para 313, em 96. No entanto, tenho claro que o panorama da assistência ao paciente de AIDS, apesar dos avanços obtidos, ainda se encontra muito aquém do que consideramos ideal. A mudança deste quadro não passa apenas pelas ações e intervenções dos programas de AIDS e sim por uma profunda reformulação do SUS e fortalecimento do setor público de saúde. COMO O PROGRAMA RELACIONA PREVENÇÃO E ASSISTÊNCIA EM HIV/AIDS? É importante salientar o trabalho de prevenção às doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), porta de entrada do HIV no organismo. Para preveni-las, tanto quanto a AIDS, o Programa insiste na eficácia do uso de preservativos. Em estudo multicêntrico realizado em sete países europeus, com 256 pares heterossexuais discordantes (o homem positivo para o HIV e a mulher negativa), entre os 124 pares que usaram preservativo constantemente, tanto em relações vaginais quanto anais, não houve nenhum caso de transmissão do HIV do homem para a mulher, em um total de 15 mil episódios de relações sexuais. No Brasil, um estudo multicêntrico da mesma natureza, realizada pela Fiocruz, no Rio de Janeiro, sob a coordenação do cientista Euclides Castilho, verificou que o risco de um homem transmitir o HIV para a sua parceira sexual foi três vezes maior quando não usava o preservativo em comparação com aqueles casos que usavam. Além disso, o Programa oferece aconselhamentos aos pacientes nos atendimentos de hospitaldia, ADT e hospitais convencionais, em que os doentes são informados da importância do uso de preservativos em suas relações sexuais. QUAIS OS PRINCIPAIS OBSTÁCULOS QUE O PROGRAMA ENFRENTA PARA UMA DISTRIBUIÇÃO MAIS EFICIENTE DE MEDICAMENTOS EM HIV/AIDS? Nosso principal problema é o desrespeito a alguns critérios de uso básicos. São comuns, por exemplo, os casos de pacientes que pegam medicamento num local e depois em outro com outra receita, fazendo um estoque pessoal. Alguns estados já regionalizaram a distribuição e os pacientes só podem retirar seus medicamentos num único local. Além disso, alguns profissionais de saúde estão prescrevendo os medicamentos de modo inadequado, prejudicando os pacientes e criando uma "demanda artificial". Um tratamento mal realizado ou indicado pode causar o desenvolvimento de vírus resistentes a esses medicamentos, deixando ineficaz a ação dos remédios anti-HIV. Outro problema que vem acontecendo com os medicamentos distribuídos pelo Ministério da Saúde é a falta de balanceamento nas prescrições médicas. Os três inibidores da protease - saquinavir, ritonavir e indinavir - foram comprados na razão de 1/3 cada um. Como as prescrições não acontecem nesta proporção, alguns estados têm carência de um medicamento e sobra um outro similar que não é utilizado. Para mudar esse quadro, o PN DST/AIDS está montando um sistema, inédito no mundo, de controle na distribuição de medicamentos para controlar a AIDS. É o Sistema de Controle Logístico de Medicamentos, que permitir uma visão global do caminho percorrido pelo medicamento desde a saída do Ministério até a distribuição em todos os postos de dispensação dos remédios no Brasil. Com o sistema, teremos um controle efetivo do estoque, uma agilidade maior e simplificação dos trabalhos gerenciais, uma previsão precisa do consumo de medicamentos, além de proporcionar uma maior segurança do paciente no recebimento contínuo de medicação. A centralização da aprovação dos cadastros de pacientes, informatização de todos os postos de dispensação, a inscrição na carteira de identidade ou CPF dos pacientes cadastrados, a autentificação dos formulários de movimentação do estoque e a estipulação de um local fixo para dispensa são premissas para o controle eficiente do estoque de medicamentos. O Sistema de Controle Logístico de Medicamentos é composto por três módulos: o do PN DST/AIDS controla o estoque de medicamentos da Central de Medicamentos do Ministério da Saúde; programa a compra com base na previsão do consumo calculado a partir dos dados coletados, acompanha o processo de compra, distribuição às Secretarias Estaduais de Saúde e as pendências; e gera gráficos e relatórios estatísticos conjunturais com referência à distribuição, consumo, perdas e prescrições dos medicamentos. O módulo das Secretarias de Saúde controla o estoque nos níveis de hierarquia pertinentes; estoque de segurança, indicadores de consumo e validade e oferece acesso às informações de consumo dos dispensadores. Além disso, as secretarias podem controlar e acompanhar pelos seus módulos todos os níveis de distribuição dos medicamentos; programar a recomposição dos estoques; prever o consumo em nível estadual, municipal e hospitalar e gerar gráficos e relatórios estatísticos conjunturais com referência à distribuição, consumo, perdas e prescrições. O terceiro módulo do sistema é o da dispensação, a partir do qual serão realizados o controle efetivo de estoque e previsão de consumo para recomposição do mesmo. Este módulo também permite o controle e acompanhamento individualizado dos pacientes, seu consumo, alteração na medicação e pendências de fornecimento. POR QUE OS EXAMES DE CD4 E DE CARGA VIRAL AINDA NÃO SE ENCONTRAM COMPLETAMENTE DISPONIBILIZADOS NA REDE PÚBLICA DE SAÚDE? O Ministério da Saúde divulgou este ano o novo consenso de terapia anti-retroviral de condutas terapêuticas em HIV/AIDS para tratamento de adultos, que inclui o exame de carga viral, que mede a quantidade do vírus no sangue para acompanhar a resposta do paciente aos medicamentos utilizados. Esse exame - que junto com o de contagem de CD4 e a situação clínica indicam o esquema terapêutico mais eficaz – estará disponível aos usuários do SUS ainda neste semestre. Apesar de termos iniciado o processo licitatório em novembro de 96 , apenas agora foi concluído pelo PNUD. As empresas que ganharam a licitação para o exame de CD4 e o de carga viral estão em processo de instalação do equipamento e treinamento de técnicos. A rede de laboratórios públicos que fará exames de CD4 é formada por 32 instituições e a que fará de carga viral por 30. Todos os laboratórios que farão exames de quantificação de carga viral irão fazer o de contagem de CD4. Farão exames de quantificação de CD4 e carga viral os laboratórios públicos de Amazonas (Instituto de Medicina Tropical ou Alfredo da Matta – a definir), Pará (UFPA), Ceará (Lacen), Pernambuco (Lacen e Fundação Hemope), Bahia (Laboratório Avançado de Saúde Pública e Lacen), Minas Gerais (Faculdade de Medicina da UFMG e Funed), Rio de Janeiro (Hospital dos Servidores, Hospital Pedro Ernesto, UFRJ, Fiocruz, Gafrée Guinle e Noel Nutels), São Paulo ( Instituto Adolfo Lutz, Emílio Ribas, USP, Escola Paulista de Medicina, Fundação Pró-Sangue, Laboratório Municipal de Saúde de Santos, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/USP, Laboratório do Hospital das Clínicas da Unicamp), Paraná (Lacen e Laboratório Municipal de Curitiba), Santa Catarina (Hospital Universitário e Lacen), Rio Grande do Sul (Hospital de Clínicas e Lacen) e Distrito Federal (Lacen). Além dos citados, farão apenas exames de CD4 os laboratórios centrais de saúde pública de Roraima, Maranhão, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, Sergipe, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. É importante ressaltar que as pessoas com HIV dos estados onde não serão realizados exames de carga viral ou de CD4 devem procurar as unidades públicas de saúde do seu município para as providências necessárias (pedido médico e remessa do sangue para realização do exame). O Governo está pagando R$ 56,00 por cada kit de exame de carga viral e R$26,00 pelo de CD4. Além desses custos, devem ser considerados os gastos operacionais dos laboratórios. Na iniciativa privada, um exame de carga viral custa cerca de R$ 500,00, e de CD4 R$ 110,00. QUAL A ESTRATÉGIA DO PROGRAMA PARA INCLUSÃO/ DISPONIBILIZAÇÃO DE NOVOS MEDICAMENTOS RELATIVOS A HIV/AIDS NA REDE PÚBLICA DE SAÚDE? O programa Nacional conta com um grupo técnico-assessor que se reúne periodicamente para discutir novos avanços de terapia, padronização de condutas terapêuticas e decisão de inclusão no elenco de medicamentos do Ministério da Saúde. Além disso, a lei n.º 9.313 deu origem a uma comissão técnica – para estudar e propor soluções técnico-científicas para a questão de DST/AIDS – e outra que define responsabilidades nos níveis federal, estadual e municipal. Não tenho qualquer dúvida de que a lei será cumprida e, nesse sentido, o PN DST/AIDS tem enviado esforços em parceria com as ONGs e instâncias gerenciais do Ministério da Saúde. QUAIS OS CRITÉRIOS DO PROGRAMA PARA A UTILIZAÇÃO DE ANTIVIRAIS POR PARTE DE CRIANÇAS COM HIV/AIDS? Está prevista para os dias 5 e 6 julho uma reunião do grupo de consenso em AIDS pediátrica para definir o melhor tratamento para essa população. Atualmente, o Ministério oferece três antiretrovirais para crianças: AZT, ddl e 3TC. Para prevenir a transmissão vertical do HIV, as gestantes HIV positivas têm merecido inúmeros estudos sobre as vias de infecção e respectivas situações de risco a que estão expostas, e as formas de prevenção, assistência e tratamento. A transmissão vertical é a principal via de infecção pelo HIV na população infantil, sendo responsável, no Brasil, por mais de 90% dos casos em menores de 13 anos – cerca de 3% do total geral de casos - , considerando-se as notificações recebidas e referentes a períodos recentes. O Ministério disponibiliza o AZT para ser usado durante o pré-natal e durante o trabalho de parto das gestantes infectadas pelo HIV. Estudo em mulheres grávidas HIV positivas nos Estados Unidos e na França revelaram que o tratamento através de AZT injetável durante o parto é o mais eficaz para impedir a contaminação do recém-nascido. Estima-se que de 15% a 40% das crianças nascidas de mães soropositivas tornam-se infectadas na gestação, durante a gravidez, durante ou logo após o parto. Já foi comprovado também o grande impacto que causará a aplicação do AZT na redução da transmissão vertical do HIV, avaliada em até 60%. E, naturalmente, na indiscutível diminuição dos custos sociais que acarretará, limitando a dimensão da realidade de cuidar de crianças órfãs e enfermas de AIDS. Mas a orientação do PN DST/AIDS continua sendo para que a mulher soropositiva evite a gravidez. O Ministério da Saúde fornece gratuitamente, além do injetável, o AZT cápsula e em forma de solução oral para crianças a todos os serviços de pré-natal e maternidades definidas como referência pelas Secretarias de Saúde. Todas as coordenações do país, em níveis estaduais e municipais, foram estimuladas a fornecer dados estimativos do número de gestantes soropositivas, ou com AIDS, para estabelecermos estudos de soroprevalência e fornecer o AZT para gestantes (cápsula ou injetável) e recém-nascidos (solução oral). QUAIS AS PERSPECTIVAS FUTURAS EM ASSISTÊNCIA E TRATAMENTO EM HIV/AIDS NO BRASIL ? O Ministério Público está renegociando um novo acordo de empréstimo com o Banco Mundial em que prioriza as mulheres, adolescentes, população de baixa renda e índios nas suas ações de prevenção - populações fundamentais em nossas ações de prevenção pois, ao longo desses anos, a AIDS mudou bastante seu perfil. Antes os casos aconteciam basicamente entre homossexuais e usuários de drogas injetáveis das grandes cidades. Hoje é cada vez mais freqüente a participação das mulheres entre os casos notificados, e a relação entre os gêneros, que já foi de 40 homens para cada mulher, atualmente é de 3 para 1. A tendência também é de continuar investindo em formas alternativas de assistência e tratamento às DSTs/AIDS. Para 97 está previsto um orçamento de R$1,66 milhão na implantação de 40 novos hospitais-dia e R$810 mil para 29 novas ADTs. Esses recursos serão aplicados em equipamentos e treinamento de pessoal. Além disso, 50 novos hospitais convencionais também prestarão assistência aos doentes com AIDS. O chamado "AIDS II" ser discutido de forma preliminar junto ao Banco Mundial pelo Ministro da Saúde em viagem a Washington. O teto do financiamento dever girar em torno de U$150 milhões que, somados à contrapartida do Tesouro Nacional, chegar aos US300 milhões. O novo acordo de empréstimo garantirá ações de prevenção e assistência no quadriênio 1998-2002. Este recurso, entretanto, não representa o total de investimentos feitos no período, já que o Tesouro Nacional investir bem mais que o previsto no projeto. O acordo com o Banco Mundial não inclui recursos para compra de medicamentos, cujo fornecimento é assegurado por lei a HIV positivos e pessoas vivendo com AIDS. Estimativa do PN DST/AIDS aponta uma necessidade de quase U$1 bilhão para os medicamentos, somente neste ano. Esse custo dever ser compartilhado com estados e municípios. POR QUE ALGUNS SEGMENTOS, COMO MULHERES, POPULAÇÕES DE BAIXA RENDA, ADOLESCENTES E ÍNDIOS FORAM PRIORIZADOS PARA ESSE NOVO PROJETO? MULHERES - O Ministério está promovendo uma série de ações para conter o avanço da AIDS entre mulheres. Desde o início dos anos 90 a epidemia tem se expandido entre essa população e, segundo a UNAIDS (órgão das Nações Unidas para a AIDS), 40% das novas infecções que ocorrem diariamente no mundo atingem mulheres, principalmente entre 15 e 25 anos. O PN DST/AIDS, em fevereiro de 97, criou um comitê assessor para apoiar a formulação de diretrizes e políticas de prevenção e controle de DST/AIDS em mulheres. O aumento de ocorrências de casos femininos, categorizados como usuárias de drogas injetáveis a partir da segunda metade da década de 80 e o cresci mento de casos cuja via de infecção se deu através de relações heterossexuais a partir do início dos anos 90 são fatores que têm conduzido ao perfil apresentado. Do total de casos notificados, 20% correspondem ao sexo feminino, sendo que, desses, 82% foram registrados nos estados de São Paulo (51%), Rio de Janeiro (14%), Minas Gerais (7%), Rio Grande do Sul (6%) e Santa Catarina (4%). Cinqüenta e três por cento do total dos casos femininos adquiriram o vírus através de relações heterossexuais. Entre esses casos, a maioria se deve a relações sexuais com parceiros usuários de drogas injetáveis e/ou parceiros heterossexuais que tiveram contato sexual com múltiplas parceiras. ADOLESCENTES - Para aumentar a eficácia na prevenção e assistência em AIDS entre os adolescentes, o PN DST/AIDS mantém projetos em parceria com ONGs em vários estados. Os adolescentes são considerados uma população específica na política de prevenção e assistência do Ministério por estarem iniciando a vida sexual e não terem uma percepção temporal mais elaborada, minimizando o risco da AIDS por ser uma doença que costuma demorar a se manifestar. ÍNDIOS - Detectamos uma interiorização da doença, com novos casos sendo detectados tanto nas grandes como pequenas cidades. Os índios - frente a essa tendência - tornam-se mais vulneráveis à infecção pelo HIV. O PN DST/AIDS está desenvolvendo uma série de ações para prevenir a epidemia de HIV/AIDS entre os índios. Dados oficiais mostram que 31 índios (18 homens e 13 mulheres segundo dados preliminares do Programa) das regiões Norte, Nordeste, Sul e Centro-Oeste se infectaram pelo HIV e desenvolveram a doença. Os índios são vulneráveis à infecção por DST/AIDS por se localizarem em regiões de fronteira, normalmente próximas a áreas de projetos de expansão econômica - como mineração, estradas, barragens, hidroelétricas, exploração de madeira e das barreiras culturais que dificultam a assimilação de medidas de proteção individual e coletiva. Além disso, foram identificados vários problemas relacionados à estrutura das instituições que atuam junto à essa população, colaborando com o agravamento do quadro. A população indígena que vive em aldeias está estimada pela FUNAI em 323 mil pessoas. Para reverter a epidemia nessa população, o PN DST/AIDS realiza, em parceira com o Ministério da Educação e a FUNAI, treinamento de professores e alunos nas escolas indígenas, já que os dois órgãos estimam que 20% dessa população encontram-se em idade reprodutiva e freqüentam essas escolas. Como parte desse projeto, ser realizada em abril uma reunião entre as Coordenações Estaduais de DST/AIDS e os coordenadores de projetos de escolas indígenas para implantar uma estratégia de educação voltada à prevenção de DST/AIDS e sensibilizar esses grupos para a necessidade de mudanças no currículo com a inclusão de temas relacionados à sexualidade e outros meios de transmissão de DST/AIDS. Além desse trabalho em escolas indígenas, o Programa, ao lado do Ministério da Educação, FUNAI e Fundação Nacional de Saúde, apóia projetos de ONGs que trabalham diretamente com a população indígena. O Exército também está envolvido nas ações pela sua capacidade de atuação nas áreas de fronteira, possibilitando apoio logístico e assistencial nas regiões onde dispõe de equipamentos de saúde. POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA – Esta é outra grande prioridade para o próximo projeto, já que cada vez mais vem sendo atingida pela epidemia de HIV/AIDS como comprovam estudos feitos no Estado de São Paulo e pelos dados disponíveis em nível nacional, que mostram claramente uma mudança de perfil sócio-econômico, mensurado indiretamente através do nível de escolaridade dos pacientes notificados. Dada a magnitude desta população e as adversidades decorrentes de sua condição de segmento populacional historicamente marginalizado e com precário acesso à informação e serviços de saúde, esta população representa um grande desafio para as ações de controle da epidemia. REVISÃO ANALÍTICA DO TRATAMENTO ANTI-RETROVIRAL CAIO ROSENTHAL INFECTOLOGISTA DO INSTITUTO DE INFECTOLOGIA EMÍLIO RIBAS (SP) E DO HOSPITAL DO SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL (SP) Até bem pouco tempo atrás, as opções que tínhamos para oferecer aos pacientes soropositivos eram desanimadoras. Hoje, o "menu terapêutico", além de ampliar o estoque de opções, nos oferece também melhora significativa em termos de qualidade. MENU TERAPÊUTICO Análogo de nucleosídeos AZT Ddl DdC D4T 3TC 159U89 Nucleosídios não análogos Nevirapina Delavirdina Lovirida Inibidores da protease Saquinavir Indinavir Ritonavir Nelfinavir VX-478 ABT-378 Imunomodulação e novas terapias Interleucinas e citocinas Antagonistas do TNF Terapia genética Inibidores da integrase Após as publicações em 1996 do ACTG 175 e do estudo Delta, encerrou-se por definitivo a era do tratamento com monoterapia. No que diz respeito aos análogos de nucleosídeos, os primeiros a serem licenciados e, portanto, os mais familiares, hoje nossas maiores preocupações se resumem a encontrar as melhores combinações entre eles e com os inibidores da protease. Combinações sinérgicas, como AZT+ddl, AZT+3TC ou D4T+ddl, nos permitem uso por tempo mais prolongado com terapia dupla antes de lançarmos mão dos inibidores da protease. Iniciar um tratamento com dois análogos de nucleosídeos e preservar o uso do inibidor da protease para situações mais adiantadas ou de média gravidade, é um princípio consensual entre os europeus, que preconizam a assim chamada "individualização do tratamento". O médico, de forma criteriosa, analisa caso a caso e "individualiza" o tratamento sempre se baseando nos marcadores clínicos, imunológicos (contagem de linfócitos CD4) e virológicos (carga viral). São situações, por exemplo, em que o paciente sempre esteve assintomático, com contagem de linfócitos CD4 sempre maiores que 250 células/mm3 e contagens de partículas virais plasmáticas menores que 10 mil/mm3. O monitoramento desses pacientes deve ser mais freqüente, geralmente a cada 45 ou 60 dias. A médio prazo (estudos em Fase III), o 159U89, análogo de nucleosídeo a ser lançado pela GlaxoWellcome, deverá conquistar importante lugar na terapêutica antiviral, sendo o medicamento que dever atingir as maiores concentrações em sistema nervoso central. A partir do segundo semestre de 1996, pudemos contar com dois nucelosídeos não análogos inibidores da transcriptase reversa (NNRTIs) para uso comercial: a nevirapina e mais recentemente a lovirida. São medicamentos extremamente eficazes, com características de fazer baixar rapidamente os níveis de RNA viral plasmático e de apresentarem poucos efeitos adversos. Situações que eventualmente terão lugar os NNRTIs: • • • • transmissão perinatal profilaxia pós-exposição infecção aguda componentes de microbicidas vaginais. O rápido desenvolvimento de resistência por parte do HIV e a presença de variantes resistentes aos NNRTIs, preexistentes, são fatores limitantes ao uso desses medicamentos. INIBIDORES DA PROTEASE E ADERÊNCIA A análise dos inibidores da protease deve passar obrigatoriamente por três itens considerados de fundamental importância que dizem respeito a: resistência cruzada, aderência ao tratamento e toxicidade. A resistência cruzada entre eles tem enorme significado, à medida em que o indinavir e o ritonavir têm padrões muito semelhantes. Na prática, isso quer dizer que um não deve ser substituído pelo outro, a não ser em casos de intolerância por algum deles. Por outro lado, o saquinavir já apresenta algumas diferenças em termos de resistência, podendo teoricamente ser substituído, quando necessário . Em casos de falha de tratamento durante o uso do indinavir ou do ritonavir, ‚ preciso lembrar que não ‚ aconselhável fazer a substituição pelo saquinavir, visto que estaríamos perdendo em termos de eficácia, pois a absorção deste último ‚ muito inferior (cerca de 4%). Há uma perspectiva de lançamento pelo próprio laboratório Roche de uma nova formulação do saquinavir, apresentado em cápsulas gelatinosas que aumentaria sobremaneira sua absorção, a curtíssimo prazo. O nelfinavir ("Viracept") foi o último inibidor da protease lançado no mercado, mas já é conhecido seu padrão de resistência. A questão mais debatida atualmente no tratamento com inibidores da protease diz respeito à aderência do paciente. Senão vejamos: a meia vida dessas drogas ‚ muito curta, o que significa que no momento da próxima tomada já não há mais níveis circulantes detectáveis das mesmas. Se neste momento o paciente não respeitar o próximo horário, os vírus saem do estado de "pressão seletiva" em que se encontram e passarão a se replicar em velocidade acentuada. É conhecida a predisposição para erros dos genes que processam as enzimas inibidoras da transcriptase reversa e as inibidoras da protease principalmente em situações de replicação rápida, sendo a conseqüência disso a seleção de mutantes com altos graus de resistência àqueles medicamentos que os mantinham sob pressão seletiva. Não seria incorreto, portanto, do ponto de vista prático, deixar de oferecer tratamento àquele que não tivesse condições de adesão plena. Nem todos podem obedecer às indicações de forma precisa: alguns medicamentos devem ser ingeridos após uma "refeição hipercalórica", enquanto outros com "estômago vazio". O ritonavir, por exemplo, deve ser mantido em geladeira... Os horários, como vimos, devem ser respeitados rigorosamente. Aliás, se o saquinavir é tomado com suco de grapefruit, a absorção melhora bem mais. E assim por diante. Os efeitos adversos dos inibidores da protease constituem uma das maiores dificuldades em manter os pacientes integralmente vinculados aos tratamentos. Cada um deles com suas listas de toxicidades que não são poucas (ver quadro a seguir) e, ainda pior, como vimos, em nenhuma hipótese ‚ permitido diminuir doses, espaçar horários ou alterar o pH do estômago para tentar tornar algo mais palatável. O tratamento torna-se um compromisso que o paciente deve assumir, com risco de, se não o fizer, sofrer enormes prejuízos e ainda "criar" vírus com altos graus de resistências, dificultando mais ainda a queda dos níveis de viremia e oferecendo riscos de transmissão de "supervírus" mais refratários aos tratamentos que dispomos. SAQUINAVIR Gastrointestinal Cefaléia INDINAVIR Cálculo renal RITONAVIR Náuseas vômitos Aumento de bilirubina Diarréia indireta Dor abdominal Flatulência Alteração do paladar Anorexia Exantema cutâneo Dor abdominal Formigamento perioral Provas de função hepática elevadas NELFINAVIR Náuseas vômitos Diarréia USO ASSOCIADO DE INIBIDORES DA PROTEASE A associação entre essa classe de medicamentos baseia-se no racional clínico, em que todos possuem benefícios demonstrados individualmente, além do virológico, à medida em que possuem padrões de resistência também divergentes e também na farmacocinética de cada um. Associação clássica se dar entre o ritonavir e o saquinavir na futura apresentação deste em cápsulas gelatinosas, pois através do poder de inibição do complexo enzimático P-450 exercido pelo ritonavir, a concomitância dos dois resultar em níveis bem mais elevados do saquinavir. O mesmo dever ocorrer se associarmos o nelfinavir com o saquinavir. Em futuro próximo poderemos contar com a poderosa associação do ritonavir com o ABT378, que individualmente dever apresentar potência dez vezes superior ao ritonavir. FALHAS DE TRATAMENTO Aqui estão as possibilidades que justificam eventuais falhas na terapêutica anti-retroviral: • falta de aderência • supressão incompleta do HIV • resistência do HIV aos medicamentos • resistência do hospedeiro aos medicamentos (metabolismo alterado) • emergência de variantes indutoras de sincício • declínio imunológico progressivo do hospedeiro • efeitos colaterais graves. Intolerância. DESVANTAGENS DOS INIBIDORES DA PROTEASE • alto grau de interação com outros medicamentos, inclusive essenciais, como tratamento coadjuvante, mediada pelo complexo enzimático P-450 no fígado • moderada ou baixa biodisponibilidade (baixa absorção) • meia vida curta (requer várias tomadas em curtos espaços) • alto percentual de ligação protéica (níveis inadequados em SNC) • esquemas pouco convenientes (jejum ou estômago cheio) • efeitos colaterais graves. MEDICAMENTOS E CIDADANIA CHICO PEDROSA JORNALISTA E REPRESENTANTE DO NÚCLEO DE PERNAMBUCO DA REDE NACIONAL DE PESSOAS HIV+ No cotidiano do nosso ativismo, temos priorizado a questão dos medicamentos. Garantir a continuidade dos tratamentos com a distribuição regular e gratuita das drogas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) tem sido o principal objetivo dos soropositivos que compõe a Rede Nacional de Pessoas HIV+/Núcleo Pernambuco. Coma nossa participação no Movimento Pernambuco contra a AIDS, fórum que reúne representantes do estado e da sociedade civil, mantemos um canal de discussão direta com o estado. Juntamente com algumas ONGs, pressionamos e conseguimos que a Secretaria Estadual de Saúde saísse à frente e bancasse a terapia combinada de 128 pacientes. Isso antes do Ministério da Saúde iniciar sua distribuição. Acompanhamos a implantação do programa , da Secretaria e do Ministério, defendemos a prioridade para os pacientes de baixa renda e rejeitamos as listas de espera que estavam sendo produzidas nos hospitais, algo que lembrava as “Listas de Schindler”. TRÊS LUTAS BÁSICAS Hoje pautamos nossa luta em três pontos básicos: assegurar a continuação do fornecimento, incluir outros medicamentos anti-retrovirais e pressionar para que sejam realizados na rede pública os exames CD4/CD8 e o de carga viral, para todos. Temos observado também detalhes como mapas de distribuição, cronogramas de licitação e métodos de trabalho da farmácias e hospitais de referência. Para nós, termos os remédios adequados, em terapias atualizadas cientificamente e no tempo correto, é um exercício direto de cidadania. É dizer e muitas vezes gritar, para o Estado e a sociedade, que somos cidadãos, pagamos os impostos como qualquer outra pessoa e temos direito à atenção e assistência do Estado. É influir diretamente na destinação dos gastos dos orçamentos de saúde da União, dos estados e dos municípios. A Lei Sarney - 9.313/96 – que determina o fornecimento gratuito e continuo de todos os medicamentos para o tratamento dos pacientes de AIDS, pela União, estados e municípios é um instrumento de muita importância para nossa atuação frente às autoridades de saúde e a sociedade de forma geral. ACESSO JÁ! O acesso às terapias, além de contribuir para aumentar as defesas imunológicas, é um elemento que do ponto de vista psicológico tem interferido bastante no nível de ansiedade e estresse da pessoa HIV+. Enfim, é um componente de segurança no universo de tantas incertezas do soropositivo. Acreditamos que nos beneficiando dos atuais tratamentos, temos grandes chances de continuar bem e usufruir das próximas novidades científicas. Queremos estar com saúde quando a cura ou o controle total do HIV chegarem. Não estamos vivos por acaso. Estamos bem, entre outros motivos, porque nos cuidamos e temos nossas metas, entre as quais viver. E viver bem. Nós temos assumido nossa soropositividade de forma otimista e positiva. A militância tem nos proporcionado visibilidade e bem-estar, ao reivindicar o atendimento de questões que são do nosso interesse imediato. Não temos necessitado de projetos, CGC nem de intermediários. Agir nesse processo é também desmistificar a imagem do soropositivo/doente de AIDS que infelizmente ainda ronda a cabeça de muitas pessoas, a de malditos, desfigurados e pacientes passivos. Somos parte da população, temos voz, vivemos, trabalhamos, criamos nossos filhos, amamos, fazemos sexo e temos nossas propostas e reivindicações. Pelo direito básico à assistência e à vida: medicamentos para todos os portadores de HIV/AIDS! O QUINTO ELEMENTO E O HOMEM NU MÁRIO SCHEFFER DIRETOR DO PELA VIDDA/SP E INTEGRANTE DO CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE Um paciente com AIDS saca o cartão magnético do bolso, acessa um computador e recebe informações atualizadas sobre seu prontuário clínico, diagnóstico, exames complemento e medicamentos que está tomando. A cena, que mais poderia ter saído do filme O Quinto Elemento, thriller futurista do cineasta francês Luc Besson, faz parte do projeto do Programa Nacional de DST/AIDS, que pretende controlar melhor o atendimento aos portadores do HIV. A nossa AIDS é mesmo diferente da do resto do mundo. Técnicos perdem tempo ejaculando a modernidade aprendida nos manuais americanos e viagens de quase-turismo à Europa, enquanto discussões serias são deixadas de lado. Cito pelo menos alguns assuntos que aqui não têm sido enfrentados com ações concretas, à altura de sua gravidade: pauperização e feminilização da epidemia; dificuldade de acesso a medicamentos e exames, incluindo carga viral, além de desinformação de médicos e pacientes quanto a combinações, dosagens e resistência; falta de regulamentação dos planos de saúde e desrespeito às formas de pesquisa envolvendo seres humanos no país. Fica só com o último, para não fugir ao tema desta edição do Boletim ABIA. MERCK, PROTOCOLO 028 Todos devem ter lido ou ouvido falar da pesquisa da Merck no Brasil, o protocolo 028, que transformou em cobaias quase mil voluntários soropositivos que aceitaram testar um novo medicamento, o indinavir, em São Paulo. Depois de muita polêmica e confusão, o estudo acabou. Menos pela boa vontade dos executivos da Merck ou da boa ética dos bem pagos pesquisadores. Mais pelo parecer contrário de uma instância nova, a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP). O que chamou atenção neste episódio de repercussões internacionais foi que, em matéria de pesquisas clínicas, o Brasil é terra de ninguém. Laboratórios ditam regras e testam o que querem, em quem bem entendem, com a conivência dos mais renomados profissionais e instituições. No "caso Merck" as comissões de ética dos hospitais que realizavam a pesquisa se calaram diante das denúncias. O conselho Regional de Medicina de São Paulo cruzou os braços. O Programa Nacional de DST/AIDS, a "Rede" criada para defender os direitos das pessoas com HIV e a Comissão Nacional de AIDS se omitiram. Ignorância ou hipocrisia destes fóruns, abuso do poder econômico dos laboratórios, onipotência dos pesquisadores, autonomia exagerada das instituições... Sem perder tempo em uma ou outra evidência, vamos ao que realmente interessa. RESOLUÇÃO 196, DE 10/10/96 O Brasil tem uma nova legislação sobre experimentos em seres humanos que, se difundida, respeitada e efetivamente aplicada, vai impedir qualquer abuso daqui para frente. Trata-se da resolução 196, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde. Ela aprimora as normas nacionais sobre ética em pesquisa datadas de 1988. A 196 é resultado de amplo processo que incluiu consultas à sociedade civil, cientistas, entidades ligadas à pesquisa, revisão de literatura, leis de diversos países. Está fundamentada em documentos como o Código de Nuremberg, Declaração dos Direitos do Homem, Declaração de Helsinque, Acordo Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, entre outros. Incorpora os pilares da bioética: autonomia do indivíduo, não maleficência, beneficência e justiça. Na prática, em pesquisas clínicas com humanos, quer dizer: consentimento livre e esclarecido da população pesquisada, proteção aos grupos vulneráveis, certeza de que os benefícios da pesquisa são maiores que os riscos, garantia de que danos previsíveis devem ser evitados e relevância social, com vantagens diretas para os sujeitos do estudo ou para o pais onde ele se realiza. A maior novidade da 196, no entanto, é que toda pesquisa envolvendo seres humanos dever ser submetida à apreciação de um Comitê‚ de Ética em Pesquisa (CEP), em cada instituição. Os CEPs devem ter composição multidisciplinar, garantida inclusive a participação de algum que represente os pesquisados, o usuário dos serviços de saúde, o que acaba com o poder divino dos médicos. Também criou a CONEP, uma instância colegiada independente, vinculada ao Conselho Nacional de Saúde, a quem caberia julgar às maiores dúvidas éticas dos estudos. E é ai que "está pegando". Alguns médicos de unidades que se beneficiam de pesquisas arbitrárias são contra a participação de "leigos" nas comissões locais. Eles também acham que uma instância nacional vai burocratizar, amarrar e até inviabilizar pesquisas clínicas no país. Uma coisa é certa. Somente com pressão vamos fazer valer a 196. A CONEP já está funcionando a todo vapor. Seu primeiro parecer, sobre a pesquisa da Merck, deu razão à denúncia das ONGs de São Paulo. Ao questionar a monoterapia com antiviral e o não fornecimento do resultado dos exames que eram feitos nos voluntários forçou o estudo a ser interrompido antes do previsto. Também os CEPs, de alguns centros de referência em AIDS, pelo menos em São Paulo, estão aceitando, aos poucos, mas oficialmente, representantes das ONGs para discutir as novas pesquisas. É bom lembrar que muitos laboratórios multinacionais estão de olho no Brasil, terreno fértil para ensaios com novas drogas contra a AIDS. Temos muitos soropositivos virgens de tratamento e uma rede pública de saúde ineficiente. É papo sério. Todos que trabalham com AIDS deveriam incluir em suas prioridades a discussão sobre ética em pesquisa. Quanto à turma do cartão magnético, chegada em roteiros futuristas, parece que estão assistindo ao filme errado. Onde falta ética, medicamentos, exames e respeito às pessoas com AIDS, o script é outro. Sugiro O Homem Nu, o filme-piada, produto genuinamente nacional. Boletim Redes: acesso a tratamento para todos Em sua segunda edição, o Boletim Redes, publicado pelo Latin America and the Caribbean Council of AIDS Service Organizations (LACCASO) é totalmente dedicado à questão do acesso a tratamentos para soropositivos. Aproveitando as novidades reveladas na última conferência internacional sobre HIV/AIDS e no simpósio Acesso a Tratamentos nos Países em Desenvolvimento, a publicação apresenta iniciativas bem-sucedidas de países latino-americanos na solução dos problemas relativos à AIDS. Artigos do México, Argentina, Peru, Venezuela e Brasil discutem as dificuldades do acesso dos portadores de HIV a medicamentos e tratamentos em cada país. A situação brasileira é retratada nos artigos A luta pela vida frente ao Judiciário e Os medicamentos anti-retrovirais contra a AIDS no Brasil, que aponta as drogas disponíveis no sistema público de saúde. Redes também publica artigos da atualidade, como o que fala da atuação da associação sul-americana de ONGs Frente al SIDA. O boletim tem tiragem limitada. Os interessados em obter um exemplar podem escrever para: Redes c/o Coletivo Sol Apartado Postal 13-320 - 03500 México DF – México Tel. : (525) 606 7216 Fax (525) 666 6859 e-mail: [email protected] CADERNOS PELA VIDDA EM NOVA VERSÃO Editado pelo Grupo Vela Vidda/SP e tradicionalmente dedicado à questão de medicamentos e tratamentos, o Cadernos Pela Vidda apresenta um novo projeto gráfico em sua 22ª edição, que reúne matérias de atualização, polêmica, ativismo e indicações de leitura sobre HIV/AIDS. A publicação destaca uma entrevista com o coordenador do Programa Estadual de DST/AIDS de São Paulo, Artur Kalichman, sobre os esforços para disponibilizar medicamentos, a queda da mortal idade por AIDS e a cronificação da doença. Há também o depoimento de uma jovem que precisou apoiar a mãe que se descobriu soropositiva. Uma das principais matérias trata do que há de verdadeiro por trás das terapias e tratamentos freqüentemente anunciados. Outros assuntos abordados são: a importância da medição da carga viral nos portadores de HIV e a possibilidade da criação de uma vacina eficaz anti-HIV. A lei que obriga os planos de saúde a prestar atendimento aos pacientes com AIDS no Estado de São Paulo é o tema da matéria Lei obriga planos de saúde a prestar cobertura universal. outra importante questão levantada é sobre os suicídios cometidos por doentes terminais, com o conhecimento dos médicos. O novo Cadernos Pela Vidda muda de cara, mas mantém o firme propósito de ser um instrumento de informação para pessoas HIV positivas. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA INTERDISCIPLINAR DE AIDS – ABIA Entidade de Utilidade Pública Federal, Estadual e Municipal Entidade de Fins Filantrópicos EXPEDIENTE Boletim ABIA nº 35 Janeiro/Março de 1997 Tiragem: 15.000 exemplares Distribuição interna Jornalista responsável: Mônica Teixeira - MT 15309 DISTRIBUIÇÃO GRATUITA CONSELHO EDITORIAL: Bia Salgueiro, Fernando Sá, Jane Galvão, José Marmo da Silva, Marcelo Secron Bessa, Richard Parker e Veriano Terto Jr. Coordenação editorial: Jacinto Corrêa REVISÃO: Marta Torres Ilustrações: livro Giovanna Maggi. L’oeil du faucon d’integralité, Détail Tapéret Louqsor, de Detalhe pág.8: Horus, gage de la stèle de Programação visual, editoração eletrônica, produção gráfica e fotolitos: A 4 Mãos LTDA Impressão: Gráfica Lidador Este boletim foi financiado com recursos da EZE/Evangelische Zentralstelle Entwicklungshilfe e V.