Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 05801 CARACTERIZAÇÃO DIELÉTRICA E FERROELÉTRICA DE FILMES FINOS DE PZT. E.B. Araújo e J.A. Eiras Universidade Federal de São Carlos, Departamento de Física, Grupo de Cerâmicas Ferroelétricas, Caixa Postal 676, 13565-970 São Carlos - SP Email: [email protected] RESUMO Neste trabalho, filmes finos ferroelétricos de PZT preparados pelo método dos precursores óxidos, foram depositados sobre substratos de Pt/Si. Os filmes obtidos apresentaram uma espessura média de 0,5 m. Caracterizações dielétricas e ferroelétricas foram realizadas nesses filmes. Os filmes apresentaram uma constante dielétrica entre 455 e 516. A ferroeletricidade foi confirmada por características de Capacitância-Voltagem (C-V) e ciclos de histerese P-E. A polarização remanente para os filmes apresentou um valor em torno de 5,0 µC/cm 2 e um campo coercitivo entre 64,5 kV/cm e 88,8 kV/cm. Palavras-chaves: Filmes finos, PZT, ferroelétrico. INTRODUÇÃO O titanato zirconato de chumbo PbZrxTi1-xO3 (PZT) tem sido um dos materiais ferroelétricos mais estudados nos últimos anos, na forma de materiais cerâmicos e filmes finos. A solução sólida do PZT é conhecida pelas excelentes propriedades piezoelétricas, dielétricas e piroelétricas (1). Composições de PZT com Zr/Ti = 54/46 encontram-se em uma região de transição estrutural da fase tetragonal para a fase romboédrica (2). As propriedades de composições próximas a essa região apresentam os máximos valores da constante dielétrica, fator de acoplamento, dentre outros (1). 05802 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. Com o advento da microeletrônica, tornou-se indispensável a miniaturização de dispositivos sem perda de propriedades. Para tanto, a tecnologia de filmes finos foi desenvolvida. Por mais de uma década a fabricação de filmes finos de PZT tem sido reportada usando-se métodos como rf sputtering (3,4), sol gel (5) dentre outros. Os métodos de deposição a partir de soluções geralmente possuem melhor controle da estequiometria de composições complexas do que outros métodos físicos como rf sputter, laser ablation (6) ou deposição por vapor químico (CVD) (7). Por essa razão, a procura por novas rotas para a produção de filmes a partir de soluções tem sido de interesse constante de pesquisadores. Recentemente, propôs-se uma rota alternativa para a preparação de filmes finos de PZT a partir de precursores óxidos (8). Trata-se de um método híbrido que está baseado na pré-clacinação de óxidos ou carbonatos e posterior obtenção de uma resina polimérica para a deposição dos filmes. O método foi aplicado com sucesso para a produção de filmes finos de PZT e Bi4Ti3O12 sobre substratos Pt/Si e quartzo. Os filmes apresentaram boa qualidade, homogeneidade e bom controle da estequiometria. O estudo estrutural desses filmes foi reportando anteriormente usando-se difração de raios-x (9) como também o estudo da estequiometria, utilizando-se espectroscopia de retroespalhamento Rutherford (RBS) e espectroscopia infravermelho (10). Neste trabalho, reportamos as propriedades elétricas e ferroelétricas de filmes de PZT obtidos pelo método dos precursores óxidos. As propriedades dielétricas incluem constante dielétrica em função da freqüência e sob a ação de um campo elétrico dc aplicado. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL As medidas elétricas e ferroelétricas foram conduzidas na configuração MetalFerroelétrico-Metal (MFM). Para medir as propriedades elétricas e ferroelétricas, vários eletrodos circulares de ouro, com diâmetro de 0.3 mm, foram depositados sobre uma área de 22 cm2 sobre o filme usando-se uma máscara para formar capacitores na configuração MFM, gerando uma matriz de 1010 pontos (eletrodos). As caracterizações foram realizadas em diferentes eletrodos, que serão representados como pontos cartesianos (x,y). A constante dielétrica e o fator de dissipação foram medidos usando-se um analisador de impedâncias HP 4194A. Um circuito SawyerTower foi utilizado para medir as propriedades ferroelétricas a várias freqüências. 05803 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. Filmes de PZT, com Zr/Ti = 53/47, foram depositados sobre substratos de Pt/Si por dip coating. Os filmes foram previamente aquecidos a 300°C por 6 horas, para a remoção de resíduos orgânicos e solventes, e a 700°C por 2 horas, para a cristalização. A espessura dos filmes foi estimada usando-se um Rugosímetro Mytutoyo 178-896D. Em média, os filmes apresentaram uma espessura de 0,5 m. Para estudar a dependência da constante dielétrica com um campo elétrico dc aplicado, um pequeno sinal ac de 10 mV de amplitude e 100 kHz de freqüência foi aplicado sobre a amostra enquanto um campo elétrico dc negativo foi aplicado e varrido para valores positivos, voltando-se em seguida ao ponto inicial para completar um ciclo. RESULTADOS E DISCUSSÃO A constante dielétrica para os filmes de PZT foi medida em diferentes eletrodos. O comportamento da constante dielétrica e do fator de dissipação, examinados em função da freqüência, pode ser visto na Figura 1. Com base nessa figura vê-se uma pequena dependência da constante dielétrica e do fator de dissipação em função da freqüência, o que é consistente com o comportamento normal observado para filmes de PZT preparados por vários métodos, dentre eles o sol gel (11). Com base na Figura 1, para a freqüência de 100 kHz a constante dielétrica apresentou os valores 455 e 516 e o fator de dissipação 0,046 a 0,057, respectivamente para os eletrodos (6,6) e (7,7). Os valores da constante dielétrica obtida aqui foram ligeiramente menores do que aqueles observados para cerâmicas sinterizadas com a mesma composição (1). os resultados são consistentes com resultados obtidos para filmes finos Por outro lado, (12). Na Figura 1-A o comportamento observado para o fator de dissipação no intervalo de freqüência medido é considerado normal, ou seja, permanece praticamente inalterado com o aumento da freqüência e sofre uma pequena dispersão a altas freqüências. Similar dispersão também foi observada em outros filmes ferroelétricos (13). Tais dispersões são freqüentemente denominadas do tipo Maxwell-Wagner e sugerem que a dispersão com a freqüência presente nos filmes para altas freqüências pode ser proveniente de fontes externas, fato também observado em filmes de Bi4Ti3O12 (14). 05804 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 700 0,30 (A) 600 800 (B) 0,25 0,25 600 0,10 200 0,20 400 0,15 0,10 200 0,05 100 0 -1 0 10 1 10 2 10 10 3 10 4 Fator de dissipação 0,15 300 Fator de dissipação 0,20 400 Constante dielétrica 500 Constante dielétrica 0,30 0,05 0,00 0 10 -1 10 0 1 10 2 10 Freqüência (kHz) 3 10 0,00 4 10 10 Freqüência (kHz) Figura 1: Constante dielétrica e fator de dissipação para filme de PZT depositado sobre Pt/Si, para diferentes eletrodos (6,6) (A) e (7,7) (B). Filme com espessura de 0,5 m e tratado termicamente a 700°C por 2 horas. Comportamento similar ao observado na Figura 1-A também foi observado na Figura 1-B. Esse comportamento foi observado em todos os filmes de PZT. A perda observada nos filmes de PZT à freqüência de 10 MHz esteve entre o intervalo de 0,102 a 0,127. 500 550 (A) (B) 500 Constante dielétrica Constante dielétrica 450 400 350 300 450 400 350 250 300 -150 -100 -50 0 50 100 150 200 -100 Campo elétrico (kV/cm) -50 0 50 100 150 Campo elétrico (kV/cm) Figura 2: Constante dielétrica em função do campo elétrico aplicado. Filme de PZT depositado sobre Pt/Si, para diferentes eletrodos (5,5) (A) e (6,6) (B). A Figura 2 mostra a dependência da constante dielétrica em função do campo elétrico aplicado, para diferentes eletrodos. Os campos elétricos nos dois máximos, claramente observados nesta figura, são geralmente atribuídos ao duplo campo elétrico coercitivo (Ec) (15). Os resultados aqui obtidos concordam com outras observações em filmes finos de PZT, produzidos por dc sputtering (16), laser ablation (17) e sol gel (11). A partir da Figura 2, obtêm-se um campo coercitivo de 32,7 e 21,3 kV/cm, para os eletrodos (5,5) e (6,6) respectivamente. Geralmente, o campo coercitivo determinado a partir desses ensaios apresentam valores menores do que aqueles determinados a 05805 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. partir do ciclo de histerese P-E convencional. Isso geralmente é atribuído à dependência de Ec com o campo elétrico aplicado e a freqüência. Quando um campo elétrico é aplicado ao longo do eixo de polarização de um cristal ferroelétrico isto pode causar a inversão ou rotação dos domínios. Os domínos de 180° podem ser alinhados no mesmo sentido ou no sentido inverso ao do campo aplicado. Os domínios de 90° são orientados perpendicularmente ao eixo polar na ausência de campo elétrico externo. Esses domínios, por uma rotação de 90°, são alinhados paralelamente ao campo elétrico aplicado. Quando o campo elétrico é aplicado, ' muda o seu valor, dependendo do grau de mobilidade dos domínios ou da intensidade do campo elétrico aplicado. Para cerâmicas de PZT, normalmente existem quatro picos na constante dielétrica, quando aplica-se um campo elétrico partindo-se de valores negativos, passando por valores positivos e retornando-se ao valor inicial (15,18). Os picos observados, tanto em cristais ou cerâmicas ferroelétricas, são atribuídos à orientação e rotação dos domínios de 180° e 90°, respectivamente. Para filmes finos de PZT, independentemente da técnica para produzi-los, somente dois picos foram observados no ciclo do campo elétrico. Esses dois picos são atribuídos a movimentos de domínios de 180°. A Figura 3 mostra o comportamento do pico para campos elétricos positivos da constante dielétrica para várias freqüências em função do campo elétrico aplicado (Figura 3-A) e em função da freqüência sob um campo elétrico aplicado de 20 kV/cm (Figura 3-B), para o eletrodo (6,6).. Figura 3: Constante dielétrica em função do campo elétrico aplicado para várias freqüências (A) e constante dielétrica em função da freqüência para um campo elétrico de 20 kV/cm (B) para o eletrodo (6,6). 05806 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. A Figura 3-A mostra quatro curvas para as freqüências 20 kHz, 100 kHz, 500 kHz and 1 MHz. O decréscimo de ’ observado a diferentes freqüências, sob um campo elétrico dc aplicado, tem sido atribuído à relaxação dipolar e ao movimento das paredes de domínio e foi antes observado em cerâmicas de PZT (18). O mesmo comportamento foi aqui observado para filmes de PZT. A inclinação das curvas não difere apreciavelmente de uma curva para outra, contanto que a freqüência empregada seja menor do que a freqüência de relaxação do dipolo. A Figura 3-B mostra o comportamento da constante dielétrica em função da freqüência quando um campo elétrico dc de 20 kV/cm é aplicado ao filme de PZT. A constante dielétrica passa por um mínimo por volta de 1 MHz. Para freqüências mais elevadas a constante dielétrica cresce novamente. Essa dispersão para freqüências acima de 1 MHz, como discutido anteriormente, são denominadas do tipo MaxwellWagner. Ciclos de histereses P-E para filmes de PZT, foram observados à temperatura ambiente para várias freqüências, entre o intervalo de freqüências de 300 Hz a 300 kHz. A Figura 4 mostra histereses ferroelétricas típicas para filme de PZT, em diferentes eletrodos, para a freqüência de 1 kHz. Na Figura 4, (A) e (B) correspondem aos eletrodos (4,7) e (6,6), respectivamente. Com base nessa figura, os valores obtidos para a polarização remanente (Pr) foram 5,0 µC/cm2 e 4,9 µC/cm2 e o campo coercitivo (Ec) de 88,8 kV/cm a 64,5 kV/cm. Na literatura, valores de P r e Ec encontram-se no intervalo 1-7 C/cm2 e 26-80 kV/cm, respectivamente, para filmes de PZT obtidos por sol gel (5) ou no intervalo 3-30 C/cm2 e 25-64 kV/cm, para filmes obtidos por dc magnetron sputtering (19). Para filmes finos, em geral os valores de Pr são menores e Ec são maiores, se comparados àqueles obtidos para corpos cerâmicos ser associado com o menor tamanho de grãos nos filmes finos. (1), fato que pode 05807 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 18 15 (B) 10 12 5 6 2 Polarização (C/cm ) 2 Polarização (C/cm ) (A) 0 -5 -6 -12 -10 -15 0 -300 100 0 -100 -200 200 -18 300 -300 -200 -100 100 0 200 300 Campo elétrico (KV/cm) Campo elétrico (KV/cm) Figura 4: Histereses P-E para filme de PZT depositado sobre Pt/Si, para os eletrodos (4,7) (A) e (6,6) (B), obtidas para a freqüência de 1 kHz. 15 15 300 Hz 3 kHz 300 kHz (B) 10 V (A) 10 10 2 Polarização (C/cm ) 2 Polarização (C/cm ) 7V 5 4V 0 -5 5 0 -5 -10 -10 -15 -15 -400 -300 -200 -100 0 100 Campo elétrico (KV/cm) 200 300 400 -400 -300 -200 -100 0 100 200 300 400 Campo elétrico (KV/cm) Figura 5: Histerese P-E para filme de PZT depositado sobre Pt/Si, para o eletrodo (4,7). Comportamento sob efeito da voltagem aplicada (A) e freqüência (B). A Figura 5 mostra o comportamento da histerese P-E no filme de PZT segundo a voltagem aplicada e a freqüência, Figura 5-A e Figura 5-B, respectivamente. À medida que a voltagem aplicada aumenta a curva P-E tende a uma saturação (Figura 5-A). Como pode ser visto na Figura 5-B, a histerese ferroelétrica pode ser observada em uma larga faixa de freqüências sem que os valores de P r e Ec sofram variações no intervalo medido. CONCLUSÕES Filmes finos de PZT, produzidos pelo método dos precursores óxidos, foram caracterizados em suas propriedades dielétricas e ferroelétricas. Os resultados Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 05808 apontaram para uma constante dielétrica que variou entre 455 e 516, valores que estão de acordo com aqueles obtidos para filmes finos de PZT por outros métodos. A ferroeletricidade foi estudada por meio de medidas C-V e ciclos de histereses P-E. A polarização remanente para os filmes de PZT estudados apresentou um valor em torno de 5,0 µC/cm2 e um campo coercitivo com valores entre 64,5 kV/cm e 88,8 kV/cm, valores esses que também estão de acordo com valores reportados na literatura. AGRADECIMENTO Agradecemos ao CNPq pelo apoio financeiro. REFERÊNCIAS 1. B. Jaffe, W.R. Cook and H. Jaffe; Piezoelectric Ceramics, Academic Press, New York, 1971. 2. P. Ari-Gur and L. Benguigui, Solid State Communications 15, (1974) 1077. 3 . K. Sreenivas, M. Sayer and P. Garret, Thin Solid Films, 172 (1989) 251. 4 . R. Takayama and Y. Tomita, J. Appl. Phys. 65(4) (1989) 1666. 5 . G. Yi, Z. Wu and M. Sayer, J. Appl. Phys. 64(5) (1988) 2717. 6 . O. Auciello, L. Mantese, J. Duarte, X. Chen, S.H. Rou, A.I. Kingon, A.F. Schreiner and A.R. Krauss, J. Appl. Phys. 73(10) (1993) 5197. 7 . M. de Keijser and G. J. M. Dormans; MRS Bulletin, june 1996, p. 37. 8. E.B. Araújo and J.A Eiras, J. Mat. Sci. Letters 17(10) (1998) 833. 9. E.B. Araújo and J.A. 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DIELECTRIC AND FERROELECTRIC CHARACTERIZATION OF PZT THIN FILMS ABSTRACT In this work ferroelectric thin films of PZT were prepared by oxide precursor method, deposited on Pt/Si substrate. Films of 0.5 m thickness in average were obtained. Electrical and ferroelectric characterization were carried out in these films. Films presented dielectric constant with values between 455 and 516. Ferroelectricity was confirmed by Capacitance-Voltage (C-V) characteristics and P-E hysteresis loops. Remanent polarization for films presented value around 5.0 µC/cm 2 and a coercive field with value between 64.5 kV/cm and 88.8 kV/cm.