ARTIGO ORIGINAL CRIANÇAS HIV POSITIVAS: CARACTERÍSTICAS ANTROPOMÉTRICAS E SOCIODEMOGRÁFICAS1 HIV POSITIVE CHILDREN: ANTHROPOMETRIC AND SOCIAL-DEMOGRAPHIC CHARACTERISTICS Rosa Maria DIAS2; José Luiz Vieira FERNANDES3; Eliete da Cunha ARAÚJO3; Andréa das Graças Ferreira FRAZÃO2; Claudia Daniele Tavares Dutra3 e Laélia Maria Barra Feio BRASIL2 RESUMO Introdução: crianças infectadas pelo vírus HIV por transmissão vertical geralmente apresentam baixo peso. Objetivo: estudar as características antropométricas e sociodemográficas de crianças soropositivas para o HIV, infectadas por transmissão vertical, que faziam uso de antirretrovirais. Método: estudo transversal, descritivo com 30 crianças soropositivas, em uso de terapia antirretroviral (TARV). A avaliação nutricional foi feita, segundo os índices de altura para idade, peso para idade e Índice de Massa Corporal (IMC) para idade. Outros dados foram obtidos por meio de um formulário semi-estruturado, respondido pelos pais/responsáveis pela criança. Resultados: a maioria das crianças era meninos (60%). As mães tinham até 8 anos de estudo (73,4%), viviam com até 1 salário mínimo e somente 3,3% usaram TARV durante a gestação e parto. A avaliação do estado nutricional das crianças apontou percentual de 13,3% para baixo peso para idade e 23,3% de baixa estatura para idade. Em todas as idades foram observados déficits estaturais, embora os mesmos não se apresentassem de forma regular e crescente com o aumento da idade. Em relação ao IMCI observou-se adequação de peso para altura e sobrepeso. Conclusão: a desnutrição crônica traduzida pela baixa estatura foi comum nas crianças HIV positivas estudadas, agravada, possivelmente, pela situação socioeconômica materna e a baixa adesão ao prénatal. DESCRITORES: HIV, Crianças, Avaliação Nutricional, AIDS, Antropometria INTRODUÇÃO A síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) é a manifestação clínica avançada da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana, conhecido como HIV. Desde os primeiros casos relatados pelo Center for Disease Control and Prevention – CDC, em 1981, a AIDS tornou-se a mais globalizada de todas as epidemias conhecidas 1,2. Desde o primeiro caso de AIDS identificado em São Paulo nos anos 80 até os dias atuais, observou-se mudanças no perfil epidemiológico da doença. No início, a AIDS seguia a tendência global, com maior prevalência nos homens, homossexuais ou bissexuais, usuários de drogas injetáveis, com alto nível socioeconômico, além dos hemofílicos e receptores de sangue3. A partir da década de 90 vem sofrendo mudanças no perfil 1 epidemiológico, resultando na heterossexualização, feminização, pauperização e interiorização da doença4,3, o que favoreceu o aumento da transmissão materno-infantil, a qual vem assumindo papel de destaque, se transformando em grande desafio para a saúde pública 5,6. A transmissão vertical é a principal via de infecção infantil pelo vírus HIV, podendo ocorrer durante a gestação, parto e aleitamento materno. A transmissão intra-uterina é possível em qualquer fase da gravidez, embora menos freqüente no primeiro trimestre, sendo responsável por cerca de 35% dos casos da doença2. A desnutrição é uma das principais manifestações da infecção pelo HIV e assume característica e evolução diversificadas nos Pesquisa Realizada no ambulatório do Centro de Atenção à Saúde em Doenças Infecciosas Adquiridas- Casa Dia. Município de Belém, Pará, Brasil 2 Professora Mestre da Universidade Federal do Pará- UFPA. Belém, Pará, Brasil 3 Professor (a) Doutor (a) da Universidade Federal do Pará - UFPA. Belém, Pará, Brasil adultos e nas crianças7, sendo mais severas nas crianças devido à maior demanda por nutrientes para seu crescimento e desenvolvimento 8, 9. O baixo peso e a wasting syndrome ou síndrome consumptiva é comum em crianças infectadas pelo vírus HIV e precede outras manifestações da doença, constituindo uma das principais causas de morbidade, independentemente da deficiência imunológica. A síndrome de wasting é definida, segundo o Center of Diseases Control and Prevention como perda de peso involuntária de 10% ou mais do peso corpóreo usual, diarréia, fraqueza ou febre por mais de 30 dias10. A patogênese da desnutrição é multifatorial e está relacionada a complicações específicas que levam a alterações na ingestão alimentar, na absorção de nutrientes, e/ou no gasto energético, promovendo um balanço energético negativo11. Considerando a limitada disponibilidade de estudos sobre o assunto, este trabalho se propõe a estudar as características antropométricas e sociodemográficas de crianças soropositivas para o HIV, infectadas por transmissão vertical, que faziam uso de antirretrovirais. MÉTODO Foi realizado estudo epidemiológico transversal com 30 crianças portadoras de HIV, infectadas por transmissão vertical, acompanhadas no ambulatório do Centro de Atenção à Saúde em Doenças Infecciosas Adquiridas (Casa Dia) da Secretaria de Saúde do Município de Belém, Estado do Pará, no período de janeiro a outubro de 2010. Foram incluídas no estudo crianças infectadas pelo HIV por transmissão vertical e que faziam uso regular de antirretroviral, com idade de 5 a 9 anos, de ambos os sexos. Foram excluídas as crianças que nasceram ou apresentaram má formação congênita, portadoras de agravos que pudessem repercutir na absorção dos alimentos e crianças, cujos responsáveis não autorizaram a participação no estudo. Os dados foram coletados dos prontuários disponíveis no local do estudo e por meio de entrevistas com as mães ou responsáveis pela criança, com aplicação do protocolo de pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Pará (Parecer n°. 166/2010). Após esclarecimentos sobre os procedimentos e objetivos da pesquisa, foi solicitada, ao responsável/mãe da criança participante, a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As variáveis estudadas nas crianças foram: tempo e tipo de antirretroviral utilizado, tempo de aleitamento materno e medidas antropométricas. Os indicadores antropométricos utilizados foram o índice de massa corporal para a idade (IMCI), peso para a idade (P/I) e altura para a idade (A/I). Para a aferição das medidas de peso corporal foi usada balança digital com definição de 100 gramas, aferida a cada pesagem e para as medidas de altura foi utilizado estadiômetro com escala de 1 mm, com procedimentos propostos pela Organização Mundial de Saúde. O índice de massa corporal para a idade (IMCI) foi calculado pela relação entre o peso, em quilogramas, dividido pelo quadrado da altura, em metros, e classificado de acordo com a Organização Mundial da Saúde12. Os z scores calculados equivalentes ao índice de massa corporal para idade, peso para idade e altura para idade foram comparados aos valores de referência. As características maternas estudadas foram: idade, escolaridade, cor, ocupação, situação conjugal, uso de antirretroviral durante a gravidez, tipo de parto e número de consultas prénatal. As variáveis foram apresentadas de forma descritiva, de acordo com o nível de mensuração (média, desvio padrão). Para as comparações entre os sexos das variáveis contínuas, análise da significância das possíveis associações entre as categorias do estado nutricional com sexo e idades e seus intervalos de confiança foram utilizados testes paramétrico (t de student) e não paramétricos (Qui-quadrado, exato de Fischer). Os dados foram tabulados e analisados nos programas WHO AnthroPlus, versão 1.0.30 e Epi Info, versão 3.5.1. O nível de significância aceito foi de p≤0,05. RESULTADOS Foram estudadas 30 crianças HIV positivo com idade média de 7,64 (±1,40) anos. Destas, 60,0% eram meninos. Todas faziam uso de terapia antirretroviral (TARV), com o tempo médio de 3,6 anos (±1,77). Metade das crianças já tinha utilizado três classes de antirretrovirais (Inibidores de transcriptase reversa análogos aos nucleosídeos (ITRN), inibidores de transcriptase reversa não análogos aos nucleosídeos (ITRNN) e inibidores de protease (IP)), e no momento da pesquisa, 60,0% faziam uso do esquema antirretroviral alternativo (2 ITRN+1IP). Outro aspecto importante observado foi o aleitamento materno, visto que a grande maioria das crianças (96,7%), mamou no peito, conforme demonstrado na Tabela 1. Tabela I – Características sóciodemográficas e clínica de crianças HIV positivo, Belém-PA, 2010. Sexo Masculino Feminino Terapia ITRNs, IP ITRNs, ITRNNs ITRNs, ITRNNs, IP Tempo de Aleitamento materno Não mamou >0 a 6 >6 a 12 >12 HIV positivo % 60,0 40,0 n 18 12 IC 40,6-77,3 22,7-59,4 3 12 15 10,0 40,0 50,0 2,1-26,5 22,7-59,4 31,3-68,7 1 14 3 12 3,3 46,7 10,0 40,0 0,1-17,2 28,3-65,7 2,1-26,5 22,7-59,4 Fonte: Protolo de Pesquisa ITRN - inibidores de transcriptase reversa análogos aos nucleosídeos ITRNN- inibidores de transcriptase reversa não análogos aos nucleosídeos IP – Inibidores de Protease A análise das características sociodemográficas dispostas na Tabela 2, mostra que as mães soropositivas eram jovens, com 50,0% na faixa etária de 20 a 30 anos, 40,0% possuíam até quatro anos de estudo. A cor da pele “não branca” foi predominante (82,8%), assim como a situação conjugal não estável (63,3%). No tocante a renda familiar, observouse que a família vivia com renda de até um salário mínimo (60,7%). A avaliação do estado nutricional das crianças, apresentada na Tabela 3, indica percentual elevado de baixa estatura para idade ou retardo de crescimento (23,3%), peso baixo para a idade (13,3%) e excesso de peso (16,7%), segundo o IMCI. A Tabela 4 apresenta os dados da mediana de altura e de peso das crianças HIV Em relação às características clínicas observou-se que metade das mães (50,0%) realizou prénatal e destas somente 40,0% realizaram 6 ou mais consultas. O parto cesariano foi mais frequente, com 66,7%. É importante ressaltar que 90,0% referiram ter contraído o vírus por via sexual e que a grande maioria das mães (97,7%) não fez a TARV durante a gestação e parto, por desconhecerem sua situação de soropositivas. positivo em comparação com os valores medianos da população de referência12. Em todas as idades podem ser observados déficits estaturais em centímetros, em relação aos respectivos valores referenciais, entretanto, os mesmos não se apresentam de forma regular e crescente com o aumento da idade. A comparação desses déficits com os valores de referencia, aponta retardo de crescimento nas crianças portadoras do vírus, com diferenças estatísticas significantes (p<0,05). Embora acentuados, quando transformados em números de desvio padrão (escore z), em nenhuma faixa etária esses déficits atingiram valores inferiores a menos dois desvio padrão (-DP), portanto não se configurando como retardo de crescimento severo pelo sistema de classificação adotado12. A tendência de crescimento físico das crianças, dada pelos valores medianos de altura em cada faixa de idade, em comparação às medianas de referência, estão apresentadas na Figura 1 e evidenciam a desvantagem de crescimento das crianças soropositivas. Na comparação do peso das crianças soropositivas com padrão de referência da Organização da Saúde12, foram observados déficits ponderais em ambos os grupos, sendo estes mais acentuados nas crianças HIV positivo (Tabela 4), contudo sem significância estatística (p>0,05). Tabela II – Características sociodemográficas e clínicas das mães de crianças HIV positivo, Belém-PA, 2010. Características Mães de crianças HIV positivo Faixa etária (anos) 20-30 31-40 >40 Anos de estudo 1-4 5-8 9-11 ≥12 Cor da pele Branca Não branca Situação conjugal Estável1 Não estável2 Pré-natal Sim Não Não sabe Número consultas Não sabe Não fez 1-3 4-5 ≥6 Parto Normal Cesariano Fonte: Protolo de Pesquisa 1 Estável (com companheiro fixo) 2 N % IC 15 13 2 50,0 43,3 6,7 31,3-68,7 25,5-62,6 0,8-22,1 12 10 7 1 40,0 33,4 23,3 3,3 22,7-59,4 19,9-56,1 7,7-38,6 0,1-17,2 5 25 16,7 83,3 5,6-34,7 65,3-94,4 11 19 36,7 63,3 19,9-56,1 43,9-80,1 15 12 3 50,0 40,0 10,0 31,3-68,7 22,7-59,4 2,1-26,5 3 12 4 5 6 10,0 40,0 13,3 16,7 20,0 2,1-26,5 22,7-59,4 3,8-30,7 5,6-34,7 7,7-38,6 10 20 33,3 66,7 17,3-52,8 47,2-82,7 Não estável (sem companheiro fixo) Tabela III – Classificação do Estado Nutricional, segundo medidas antropométricas, de crianças HIV positivo e HIV negativo. Belém-PA, 2010. N Crianças HIV positivo % IC Altura baixa 7 23,3 9,9-42,3 Altura adequada 23 76,7 57,7-90,1 Peso baixo 4 13,3 3,8-30,7 Peso adequado IMCI 26 86.7 69,3-96,2 Magreza 1 3,3 0,1-17,2 Adequado Excesso de peso 24 80,0 61,4-92,3 5 16,7 5,6-34,7 Altura/Idade Peso/Idade Fonte: Protolo de Pesquisa 1 Abaixo de -2DP da mediana da população de referência IMCI: Índice de massa corporal para idade Tabela IV – Comparação dos valores medianos de estatura (cm) e peso (kg) segundo grupo de idade das crianças HIV positivo de 5 a 10 anos, com o padrão antropométrico da OMS, Belém-PA, 2010. Idade (anos) 5├ 6 6├ 7 7├ 8 8├ 9 9├ 10 WHO (a) Estatura (cm) HIV+ Δ (b) (b-a) 114,27 112,00 -2,27 -0,49 119,38 112,40 -6,98 -1,32 124,86 118,40 -6,46 -1,19 128,92 125,25 -3,67 -0,66 135,89 128,36 -7,53 -1,25 p* Z 0,0088 Peso (kg) Δ (b-a) WHO (a) HIV+ (b) 19,90 19,7 -0,2 21,86 19,52 -2,34 24,22 24,08 -0,14 26,25 27,67 1,42 30,04 26,19 -3,85 Fonte: Protolo de Pesquisa * Teste t de student Δ: Valores medianos de referência menos valores medianos observados p* Z 0,40 0,91 0,33 0,06 1,02 0,7072 Figura 1 – Curva de crescimento de altura de crianças HIV positivo e comparação com o padrão antropométrico da OMS. Belém-PA, 2010. 140 135 Altura (cm) 130 OMS 125 HIV positivo 120 115 110 5 6 7 8 9 Idade (anos) Fonte: Protolo de Pesquisa DISCUSSÃO Anormalidades no crescimento são comuns em crianças infectadas com o HIV, e podem ser os principais responsáveis pela morbidade e mortalidade infantil nesse grupo. A associação entre infecção pelo HIV, baixo peso para a idade e deficiência de crescimento em crianças infectadas foi relatada tanto em situações socioeconômicas favoráveis, quanto em situações desfavoráveis13, 9. A classificação do estado nutricional considerando o padrão de referencia proposto pela Organização de Saúde12, demonstra, neste estudo, que a maioria das crianças apresentou eutrofia (Tabela 3), independente do índice utilizado. Entretanto, foi possível identificar que aproximadamente uma, entre quatro crianças HIV positivo, apresentou baixa estatura para a idade. Vale ressaltar que o déficit estatural encontrado neste estudo foi elevado, uma vez que, o nível crítico utilizado para sua definição foi o escore z abaixo de -2 da população de referência. Assim sendo, a proporção esperada de valores abaixo deste ponto, caso a condição nutricional destas crianças se assemelhassem ao padrão, seria de cerca de 2,3%. O estado nutricional verificado a partir do índice de massa corporal para a idade (IMCI), o qual traduz a adequação do peso em relação à altura, aponta que 16,7% das crianças estavam com excesso de peso, indicando uma exposição ao risco de obesidade na infância. Estudos realizados com crianças menores de dez anos, nas últimas décadas, demonstram a redução dos déficits estaturais no País, entretanto, na Região Norte tais valores, ainda, permanecem expressivos, tornando esta região a detentora da maior prevalência e severidade do retardo de crescimento na infância. A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher- PNDS, aponta uma redução da prevalência do déficit estatural severo (escore z <-2,0) de 20,7%, em 1996, para 14,8%, na pesquisa de 200614). Contudo, não foi suficiente para nivelar a Região Norte às demais regiões do país, que apresentaram média de déficit de altura para idade de 6,38%, conferindo a esta região prioridade para a execução de medidas de controle da desnutrição infantil. Por outro lado, a adequação de massa corporal encontrada, pode traduzir uma situação favorável para essas crianças, tendo em vista que o peso adequado para a altura representa um estado nutricional atual satisfatório. Portanto, apesar de terem perdido velocidade de crescimento e alcançado mais baixa estatura, conseguiram adequar seu peso para sua baixa estatura, gozando, atualmente, de condição nutricional mais favorável. Vale ressaltar ainda que, pelo menos em parte, esse resultado positivo pode ser explicado pela menor estatura das crianças. No Brasil, estudo realizado em Pelotas, RS15 sobre a prevalência elevada de retardo de crescimento linear com baixo percentual de déficit de peso para altura na população, concluiu que o perímetro abdominal aumentado, reflete a composição corporal e explica parcialmente, a baixa prevalência de déficit de peso para a altura na presença de elevada ocorrência de déficit de estatura para idade. As condições socioeconômicas e intrafamiliares desfavoráveis observadas neste estudo, refletiram o perfil das mães. Mais de 60% referiram união não estável. A maioria apresentou idade entre 20 a 30 anos, fato relevante visto que é o período de maior freqüência de gravidez, o que pode contribuir para o aumento da transmissão vertical. Prevaleceu a baixa escolaridade das mães e dos cuidadores. A maioria vivia com até um salário mínimo, renda que de uma forma expressiva vinha do benefício recebido pela criança. Tais achados refletem a situação social na qual vivem as famílias que convivem com o HIV, reforçando a importância do acesso universal a TARV, como forma de garantir o tratamento adequado às crianças portadoras do HIV. O HIV afeta todas as classes sociais, entretanto é naquela menos favorecida que a doença prevalece atualmente16,17. Vários estudos indicaram que no Brasil a epidemia se disseminou na população mais pobre, especialmente entre as mulheres de menor escolaridade, refletindo o padrão de 18,19,20 desigualdade predominante no País . A baixa escolaridade é preocupante, uma vez que pode constituir fator limitante ao acesso às informações indispensáveis ao cuidado requerido pelo portador do HIV. Estudo realizado21 sobre a prevalência e os fatores associados à adesão ao tratamento das crianças a TARV comprovaram que a baixa adesão foi fortemente associada ao perfil dos cuidadores, tais como pouca escolaridade, renda abaixo de um salário mínimo e a desintegração do meio familiar (mãe solteira ou viúva e alto grau de pobreza). Outro aspecto importante da condição materna é a assistência prénatal, preconizada pelo Ministério da Saúde com a finalidade de prevenir a transmissão vertical do HIV no período gestacional, no parto e no puerpério22. Não obstante estas recomendações, somente 50,0% das mães soropositivas realizaram o prénatal, e somente 20,0% destas atenderam o número mínimo de consultas preconizadas, corroborando com pesquisa23 realizada que utilizou informações coletadas no Estudo Sentinela Parturiente, 2002, as quais indicaram que na Região Norte, apenas 27,9% das parturientes realizaram seis ou mais consultas no prénatal e que 53,0% não realizaram sorologia para o HIV. Das 30 crianças HIV positivo que participaram deste estudo, somente uma não foi aleitada ao seio. Estudos relatam que o HIV está presente no leite materno e é responsável por 14% dos casos de transmissão vertical do vírus, na amamentação natural prolongada, em gestantes com infecção crônica, aumentando para 29%, em casos de infecção materna aguda24,22. O fato da mãe utilizar TARV não controla a eliminação do HIV pelo leite. A amamentação está associada a um risco adicional de 7 a 22% de transmissão. Portanto, toda mãe soropositiva para o HIV deve ser orientada, durante o prénatal, a não amamentar seu filho22. Essas situações demonstram a importância da realização do prénatal, por todas as mulheres para garantir a detecção do HIV e outras doenças que possam comprometer a saúde da criança. O parto cesariano é preconizado pelo Ministério da Saúde para todas as gestantes HIV positivo, como medida de prevenção à transmissão materno infantil22. Estudos realizados comprovaram a redução da transmissão perinatal nas mulheres HIV positivo quando submetidas ao parto cesariano eletivo 26,27 . Os resultados do presente estudo mostraram que, embora 66,7% das mães soropositivas tenham realizado este procedimento, esta conduta não resultou da recomendação, uma vez que, cerca de 97,0% das gestantes não tinham conhecimento de sua soropositividade até que a doença se manifestasse nos seus filhos. CONCLUSÃO Os achados deste estudo demonstram que a desnutrição crônica, traduzida pela baixa estatura foi comum em crianças HIV positivas, agravada, possivelmente, pela situação socioeconômica materna e a baixa adesão ao prénatal. Recomendações de investigações adicionais são importantes para avaliar o significado clínico do déficit de crescimento nas crianças portadoras de HIV. Além disso, vale salientar a importância do acompanhamento contínuo da equipe multiprofissional com a presença do nutricionista para monitorar o crescimento e a situação de saúde dessas crianças. SUMMARY HIV POSITIVE CHILDREN: ANTHROPOMETRIC AND SOCIAL-DEMOGRAPHIC CHARACTERISTICS Rosa Maria DIAS; José Luiz Vieira FERNANDES; Eliete da Cunha ARAÚJO; Andréa das Graças Ferreira FRAZÃO; Claudia Daniele Tavares Dutra e Laélia Maria Barra Feio BRASIL Introduction: vertical transmission HIV virus infected children generally present a low weight. Objective: to study the socio-demographic and anthropometric characteristics of HIV positive children infected by vertical transmission, which made use of antiretrovirals. Methods: transversal study, descriptive with 30 HIV serum-positive children, under the use of antiretroviral therapy (ART). The nutritional evaluation has been performed according to the height-for-age, weight-for-age indexes and Body Mass Index (BMI) for-age. Other data have been collected through a semi-structured form, answered by the parents who are responsible for the child. Results: most of the children were male (60%). The mothers had a maximum of 8 years of formal education (73.4%) and live with up to one minimum wage and only 3.3% used ART during pregnancy and delivery. The evaluation of the children’s nutritional conditions has pointed out a percentage of 13.3% for low weight to the age and 23.3% for low height to the age. In all ages it was observed structure deficits, although they did not show up in a regular and raising basis, mainly with aging. As for BMI, it was observed an appropriation of weight to height and overweight. Conclusion: Chronic malnutrition translated by low height was common amongst the studied HIV positive children, possibly aggravated by the social-economical situation of the mother and the low adhesion to prenatal programs. KEY-WORDS: HIV, children, nutritional evaluation, AIDS, Anthropometry. REFERÊNCIAS 1. 2. 3. 4. Brasil. Ministério da Saúde. Programa Nacional de DST e AIDS. AIDS: Boletim Epidemiológico AIDS, 2000; 13(1) Brito, AM; Sousa, JL; Luna, CF; Dourado, I. Tendências da transmissão vertical de Aids após terapia antiretroviral no Brasil. Rev Saúde Pública. 2006; 40 (Suppl.1):18- 22 Dourado, I; Milroy, C; Mello, MAG; Ferraro, GA; Castro-Lima; Filho, H; Guimarães, ML et al. HIV-1 seroprevalence in the general population of Salvador, Bahia State, Northeast Brazil. Cad. Saúde Pública. 2007; 23 (1):25–32 Parker, R. Na contramão da AIDS: sexualidade, intervenção, política. Rio de Janeiro; São Paulo: Editora 34; 2000 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. 6ª . ed. Brasília: MS; 2005 UNAIDS/WHO. Joint United Nations Programme on HIV/AIDS / Word Health Organization. AIDS epidemic update. [online]. [Acesso em 2011 jan 12]. Geneva: WHO; 2007. Disponível em: http://data.unaids.org/pub/epislides/2007/2007_epiupdate_en.pdf Centeville, M; Marcillo, AM; Barros Filho, AA; Silva, MTN; Toro, AADC; Vilela, MMS et al. Lack of association between nutritional status and change in clinical category among HIV-infected children in brazil. São Paulo Med. J. 2005; 123(2): 62-5 Marques, HHS. Nutritional evaluation and support for children infected with HIV. São Paulo Med. J. Rev. Paul. Med. 2000; 118 (5):123-4 World Health Organization – WHO. Antiretroviral therapy of HIV infection in infants and children: towards universal access: recommendations for a public health approach - 2010 revision. [manual na Internet]. [Acesso em 2010 fev 23]. WHO; 2010. Disponível em: http://www.searo.who.int/LinkFiles/HIVAIDS_ARTpaediatricguidelines.pdf Centers For Disease Control And Prevention- CDC. Revised Classification System for Human Immunodeficiency Virus Infection in Children less than 13 years of age. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. [periódico online]. [acesso em 2010 nov 26]. 1994; 43:1-10. Disponível em: http://www.cdc.gov/mmwr/preview/mmwrhtml/00032890.htm Grinspoon, S; Mulligan, K. Weight loss and wasting in patients infected with human immunodeficiency virus. Clin Infect Dis. 2003; 36 (Suppl 2):S69-78 World Health Organization- WHO. Reference 2007: Growth reference 5-19 years. [online]. [Acesso em 2010 fev 23]. WHO; 2007. Disponível em: http://www.who.int/growthref/en/ Arpadi, SM. Grow failure in HIV-infected children. Consultation on nutrition and HIV/AIDS in Africa: evidence, lessons and recommendations for action. Durban, South Africa: WHO, 2005. [online]. [Acesso em jul 31 2009]. Disponível em: http://www.who.int/nutrition/ Brasil. Ministério da Saúde. Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. Pesquisa Nacional de Demografia em Saúde da Criança e da Mulher- PNDS: dimensões do processo reprodutivo e da saúde da criança. Brasília: MS; 2009d Post, CLA; Victora, CG; Barros, AJD. Entendendo a baixa prevalência de déficit de peso para estatura em crianças brasileiras de baixo nível sócio-econômico: correlação entre índices antropométricos. Cad. Saúde Pública. 2000; 16(1):73-82, jan./mar Pechansky, F; Diemen, L Von; Kessler, F; Boni, R de; Surrat, H; Inciardi, J. Preditores de soropositividade para HIV em indivíduos não abusadores de drogas que buscam centros de testagem e aconselhamento de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad. Saúde Pública. 2005; 21(1): 266-274 Praca, NS; Souza, JO; Rodrigues, DAL. Mulher no período pós-reprodutivo e HIV/AIDS: percepção e ações segundo o modelo de crenças em saúde. Texto Contexto - Enferm. 2010; 19(3): 518-525 Szwarcwald, CL; Bastos, FI; Esteves, MAP; Andrade, CLT. A disseminação da epidemia da AIDS no Brasil, no período de 1987-1996: uma análise espacial. Cad. Saúde Pública. 2000; 16(Suppl.1): 7-19 Fonseca, MGP; Szwarcwald, CL; BASTOS, FI. Análise sociodemográfica da epidemia de Aids no Brasil, 1989-1997. Rev. Saúde Pública. 2000; 36: 678-85 Lana, FCF; Lima, AS. Avaliação da Prevenção da Transmissão vertical do HIV em Belo Horizonte, MG, Brasil. Rev. Bras. Enferm. 2010; 63( 4): 587-94 Trombini, ES; Schermann, LB. Prevalência e fatores associados à adesão de crianças na terapia antirretroviral em três centros urbanos do sul do Brasil. Ciênc. Saúde Coletiva. 2010; 15(2): 419-425 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância Epidemiológica. Programa Nacional de DST e AIDS. Recomendações para profilaxia da transmissão vertical do HIV e terapia antirretroviral em gestantes. Brasília, DF: MS; 2010 Souza Júnior, PR; Szwarcwald, CL; Barbosa Júnior, A; Carvalho, MF; Castilho, EA. Infecção pelo HIV durante a gestação: Estudo Sentinela Parturiente, Brasil, 2002. Rev. Saúde Pública. 2004; 38(6):764-72 24. Duarte, G; Quintana, SM; El Beitune, P. Estratégias que reduzem a transmissão vertical do vírus da imunodeficiência humana tipo 1. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. 2005; 27(12): 768-778 25. Ioannidis, JP; Abrams, EJ; Ammann, A; Bulterys, M; Goedert, JJ; Gray, L et al. Perinatal Transmission of Human Immunodeficiency Virus Type 1 by Pregnant Women with RNA Virus Loads <1000 Copies/mL. J. Infect. Dis. 2001; 183(4): 539-45 26. Rongkavilit, C; Asmar, BI. Advances in prevention of mother-to-child HIV transmission. Indian J. Pediatr. 2004; 71(1):69-79 ENDEREÇO PARA CORRESPONDENCIA: Rosa Maria Dias Travessa Monte Alegre, 1265, apto. 101, Jurunas. Belém-Pará CEP: 66030-370 Fone: (91) 3272-3925 Email: [email protected] Recebido em 29.11.2012 – Aprovado em 14.01.2013