ARTIGO ORIGINAL CRIANÇAS HIV POSITIVAS

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ARTIGO ORIGINAL
CRIANÇAS HIV POSITIVAS: CARACTERÍSTICAS ANTROPOMÉTRICAS E
SOCIODEMOGRÁFICAS1
HIV POSITIVE CHILDREN: ANTHROPOMETRIC AND SOCIAL-DEMOGRAPHIC CHARACTERISTICS
Rosa Maria DIAS2; José Luiz Vieira FERNANDES3; Eliete da Cunha ARAÚJO3; Andréa das Graças Ferreira
FRAZÃO2; Claudia Daniele Tavares Dutra3 e Laélia Maria Barra Feio BRASIL2
RESUMO
Introdução: crianças infectadas pelo vírus HIV por transmissão vertical geralmente apresentam baixo
peso. Objetivo: estudar as características antropométricas e sociodemográficas de crianças soropositivas
para o HIV, infectadas por transmissão vertical, que faziam uso de antirretrovirais. Método: estudo
transversal, descritivo com 30 crianças soropositivas, em uso de terapia antirretroviral (TARV). A
avaliação nutricional foi feita, segundo os índices de altura para idade, peso para idade e Índice de Massa
Corporal (IMC) para idade. Outros dados foram obtidos por meio de um formulário semi-estruturado,
respondido pelos pais/responsáveis pela criança. Resultados: a maioria das crianças era meninos (60%).
As mães tinham até 8 anos de estudo (73,4%), viviam com até 1 salário mínimo e somente 3,3% usaram
TARV durante a gestação e parto. A avaliação do estado nutricional das crianças apontou percentual de
13,3% para baixo peso para idade e 23,3% de baixa estatura para idade. Em todas as idades foram
observados déficits estaturais, embora os mesmos não se apresentassem de forma regular e crescente com
o aumento da idade. Em relação ao IMCI observou-se adequação de peso para altura e sobrepeso.
Conclusão: a desnutrição crônica traduzida pela baixa estatura foi comum nas crianças HIV positivas
estudadas, agravada, possivelmente, pela situação socioeconômica materna e a baixa adesão ao prénatal.
DESCRITORES: HIV, Crianças, Avaliação Nutricional, AIDS, Antropometria
INTRODUÇÃO
A síndrome da imunodeficiência
adquirida (AIDS) é a manifestação clínica
avançada da infecção pelo vírus da
imunodeficiência humana, conhecido como HIV.
Desde os primeiros casos relatados pelo Center
for Disease Control and Prevention – CDC, em
1981, a AIDS tornou-se a mais globalizada de
todas as epidemias conhecidas 1,2.
Desde o primeiro caso de AIDS
identificado em São Paulo nos anos 80 até os
dias atuais, observou-se mudanças no perfil
epidemiológico da doença. No início, a AIDS
seguia a tendência global, com maior
prevalência nos homens, homossexuais ou
bissexuais, usuários de drogas injetáveis, com
alto nível socioeconômico, além dos hemofílicos
e receptores de sangue3. A partir da década de 90
vem
sofrendo
mudanças
no
perfil
1
epidemiológico,
resultando
na
heterossexualização, feminização, pauperização
e interiorização da doença4,3, o que favoreceu o
aumento da transmissão materno-infantil, a qual
vem assumindo papel de destaque, se
transformando em grande desafio para a saúde
pública 5,6.
A transmissão vertical é a principal via
de infecção infantil pelo vírus HIV, podendo
ocorrer durante a gestação, parto e aleitamento
materno. A transmissão intra-uterina é possível
em qualquer fase da gravidez, embora menos
freqüente no primeiro trimestre, sendo
responsável por cerca de 35% dos casos da
doença2.
A desnutrição é uma das principais
manifestações da infecção pelo HIV e assume
característica e evolução diversificadas nos
Pesquisa Realizada no ambulatório do Centro de Atenção à Saúde em Doenças Infecciosas Adquiridas- Casa Dia.
Município de Belém, Pará, Brasil
2
Professora Mestre da Universidade Federal do Pará- UFPA. Belém, Pará, Brasil
3
Professor (a) Doutor (a) da Universidade Federal do Pará - UFPA. Belém, Pará, Brasil
adultos e nas crianças7, sendo mais severas nas
crianças devido à maior demanda por nutrientes
para seu crescimento e desenvolvimento 8, 9.
O baixo peso e a wasting syndrome ou
síndrome consumptiva é comum em crianças
infectadas pelo vírus HIV e precede outras
manifestações da doença, constituindo uma das
principais
causas
de
morbidade,
independentemente da deficiência imunológica.
A síndrome de wasting é definida, segundo o
Center of Diseases Control and Prevention
como perda de peso involuntária de 10% ou mais
do peso corpóreo usual, diarréia, fraqueza ou
febre por mais de 30 dias10.
A patogênese da desnutrição é
multifatorial e está relacionada a complicações
específicas que levam a alterações na ingestão
alimentar, na absorção de nutrientes, e/ou no
gasto energético, promovendo um balanço
energético negativo11.
Considerando a limitada disponibilidade
de estudos sobre o assunto, este trabalho se
propõe
a
estudar
as
características
antropométricas e sociodemográficas de crianças
soropositivas para o HIV, infectadas por
transmissão vertical, que faziam uso de
antirretrovirais.
MÉTODO
Foi realizado estudo epidemiológico
transversal com 30 crianças portadoras de HIV,
infectadas
por
transmissão
vertical,
acompanhadas no ambulatório do Centro de
Atenção à Saúde em Doenças Infecciosas
Adquiridas (Casa Dia) da Secretaria de Saúde do
Município de Belém, Estado do Pará, no período
de janeiro a outubro de 2010.
Foram incluídas no estudo crianças
infectadas pelo HIV por transmissão vertical e
que faziam uso regular de antirretroviral, com
idade de 5 a 9 anos, de ambos os sexos. Foram
excluídas as crianças que nasceram ou
apresentaram má formação congênita, portadoras
de agravos que pudessem repercutir na absorção
dos alimentos e crianças, cujos responsáveis não
autorizaram a participação no estudo.
Os dados foram coletados dos
prontuários disponíveis no local do estudo e por
meio de entrevistas com as mães ou responsáveis
pela criança, com aplicação do protocolo de
pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade Federal do Pará
(Parecer n°. 166/2010). Após esclarecimentos
sobre os procedimentos e objetivos da pesquisa,
foi solicitada, ao responsável/mãe da criança
participante, a assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido.
As variáveis estudadas nas crianças
foram: tempo e tipo de antirretroviral utilizado,
tempo de aleitamento materno e medidas
antropométricas.
Os
indicadores
antropométricos
utilizados foram o índice de massa corporal para
a idade (IMCI), peso para a idade (P/I) e altura
para a idade (A/I). Para a aferição das medidas
de peso corporal foi usada balança digital com
definição de 100 gramas, aferida a cada pesagem
e para as medidas de altura foi utilizado
estadiômetro com escala de 1 mm, com
procedimentos propostos pela Organização
Mundial de Saúde. O índice de massa corporal
para a idade (IMCI) foi calculado pela relação
entre o peso, em quilogramas, dividido pelo
quadrado da altura, em metros, e classificado de
acordo com a Organização Mundial da Saúde12.
Os z scores calculados equivalentes ao índice de
massa corporal para idade, peso para idade e
altura para idade foram comparados aos valores
de referência.
As características maternas estudadas
foram: idade, escolaridade, cor, ocupação,
situação conjugal, uso de antirretroviral durante
a gravidez, tipo de parto e número de consultas
prénatal.
As variáveis foram apresentadas de
forma descritiva, de acordo com o nível de
mensuração (média, desvio padrão). Para as
comparações entre os sexos das variáveis
contínuas, análise da significância das possíveis
associações entre as categorias do estado
nutricional com sexo e idades e seus intervalos
de confiança foram utilizados testes paramétrico
(t de student) e não paramétricos (Qui-quadrado,
exato de Fischer). Os dados foram tabulados e
analisados nos programas WHO AnthroPlus,
versão 1.0.30 e Epi Info, versão 3.5.1. O nível de
significância aceito foi de p≤0,05.
RESULTADOS
Foram estudadas 30 crianças HIV
positivo com idade média de 7,64 (±1,40) anos.
Destas, 60,0% eram meninos. Todas faziam uso
de terapia antirretroviral (TARV), com o tempo
médio de 3,6 anos (±1,77). Metade das crianças
já tinha utilizado três classes de antirretrovirais
(Inibidores de transcriptase reversa análogos aos
nucleosídeos (ITRN), inibidores de transcriptase
reversa não análogos aos nucleosídeos (ITRNN)
e inibidores de protease (IP)), e no momento da
pesquisa, 60,0% faziam uso do esquema
antirretroviral alternativo (2 ITRN+1IP). Outro
aspecto importante observado foi o aleitamento
materno, visto que a grande maioria das crianças
(96,7%),
mamou
no
peito,
conforme
demonstrado na Tabela 1.
Tabela I – Características sóciodemográficas e clínica de crianças HIV positivo, Belém-PA, 2010.
Sexo
Masculino
Feminino
Terapia
ITRNs, IP
ITRNs, ITRNNs
ITRNs, ITRNNs, IP
Tempo de Aleitamento materno
Não mamou
>0 a 6
>6 a 12
>12
HIV positivo
%
60,0
40,0
n
18
12
IC
40,6-77,3
22,7-59,4
3
12
15
10,0
40,0
50,0
2,1-26,5
22,7-59,4
31,3-68,7
1
14
3
12
3,3
46,7
10,0
40,0
0,1-17,2
28,3-65,7
2,1-26,5
22,7-59,4
Fonte: Protolo de Pesquisa
ITRN - inibidores de transcriptase reversa análogos aos nucleosídeos
ITRNN- inibidores de transcriptase reversa não análogos aos nucleosídeos
IP – Inibidores de Protease
A
análise
das
características
sociodemográficas dispostas na Tabela 2, mostra
que as mães soropositivas eram jovens, com
50,0% na faixa etária de 20 a 30 anos, 40,0%
possuíam até quatro anos de estudo. A cor da
pele “não branca” foi predominante (82,8%),
assim como a situação conjugal não estável
(63,3%). No tocante a renda familiar, observouse que a família vivia com renda de até um
salário mínimo (60,7%).
A avaliação do estado nutricional das
crianças, apresentada na Tabela 3, indica
percentual elevado de baixa estatura para idade
ou retardo de crescimento (23,3%), peso baixo
para a idade (13,3%) e excesso de peso (16,7%),
segundo o IMCI.
A Tabela 4 apresenta os dados da
mediana de altura e de peso das crianças HIV
Em relação às características clínicas
observou-se que metade das mães (50,0%)
realizou prénatal e destas somente 40,0%
realizaram 6 ou mais consultas. O parto
cesariano foi mais frequente, com 66,7%. É
importante ressaltar que 90,0% referiram ter
contraído o vírus por via sexual e que a grande
maioria das mães (97,7%) não fez a TARV
durante a gestação e parto, por desconhecerem
sua situação de soropositivas.
positivo em comparação com os valores
medianos da população de referência12. Em todas
as idades podem ser observados déficits
estaturais em centímetros, em relação aos
respectivos valores referenciais, entretanto, os
mesmos não se apresentam de forma regular e
crescente com o aumento da idade.
A comparação desses déficits com os valores de
referencia, aponta retardo de crescimento nas
crianças portadoras do vírus, com diferenças
estatísticas significantes (p<0,05). Embora
acentuados, quando transformados em números
de desvio padrão (escore z), em nenhuma faixa
etária esses déficits atingiram valores inferiores a
menos dois desvio padrão (-DP), portanto não se
configurando como retardo de crescimento
severo pelo sistema de classificação adotado12.
A tendência de crescimento físico das
crianças, dada pelos valores medianos de altura
em cada faixa de idade, em comparação às
medianas de referência, estão apresentadas na
Figura 1 e evidenciam a desvantagem de
crescimento das crianças soropositivas.
Na comparação do peso das crianças
soropositivas com padrão de referência da
Organização da Saúde12, foram observados
déficits ponderais em ambos os grupos, sendo
estes mais acentuados nas crianças HIV positivo
(Tabela 4), contudo sem significância estatística
(p>0,05).
Tabela II – Características sociodemográficas e clínicas das mães de crianças HIV positivo, Belém-PA, 2010.
Características
Mães de crianças HIV positivo
Faixa etária (anos)
20-30
31-40
>40
Anos de estudo
1-4
5-8
9-11
≥12
Cor da pele
Branca
Não branca
Situação conjugal
Estável1
Não estável2
Pré-natal
Sim
Não
Não sabe
Número consultas
Não sabe
Não fez
1-3
4-5
≥6
Parto
Normal
Cesariano
Fonte: Protolo de Pesquisa
1
Estável (com companheiro fixo)
2
N
%
IC
15
13
2
50,0
43,3
6,7
31,3-68,7
25,5-62,6
0,8-22,1
12
10
7
1
40,0
33,4
23,3
3,3
22,7-59,4
19,9-56,1
7,7-38,6
0,1-17,2
5
25
16,7
83,3
5,6-34,7
65,3-94,4
11
19
36,7
63,3
19,9-56,1
43,9-80,1
15
12
3
50,0
40,0
10,0
31,3-68,7
22,7-59,4
2,1-26,5
3
12
4
5
6
10,0
40,0
13,3
16,7
20,0
2,1-26,5
22,7-59,4
3,8-30,7
5,6-34,7
7,7-38,6
10
20
33,3
66,7
17,3-52,8
47,2-82,7
Não estável (sem companheiro fixo)
Tabela III – Classificação do Estado Nutricional, segundo medidas antropométricas, de crianças HIV positivo e HIV
negativo. Belém-PA, 2010.
N
Crianças HIV positivo
%
IC
Altura baixa
7
23,3
9,9-42,3
Altura adequada
23
76,7
57,7-90,1
Peso baixo
4
13,3
3,8-30,7
Peso adequado
IMCI
26
86.7
69,3-96,2
Magreza
1
3,3
0,1-17,2
Adequado
Excesso de peso
24
80,0
61,4-92,3
5
16,7
5,6-34,7
Altura/Idade
Peso/Idade
Fonte: Protolo de Pesquisa
1
Abaixo de -2DP da mediana da população de referência
IMCI: Índice de massa corporal para idade
Tabela IV – Comparação dos valores medianos de estatura (cm) e peso (kg) segundo grupo de idade das crianças
HIV positivo de 5 a 10 anos, com o padrão antropométrico da OMS, Belém-PA, 2010.
Idade
(anos)
5├ 6
6├ 7
7├ 8
8├ 9
9├ 10
WHO
(a)
Estatura (cm)
HIV+
Δ
(b)
(b-a)
114,27
112,00
-2,27
-0,49
119,38
112,40
-6,98
-1,32
124,86
118,40
-6,46
-1,19
128,92
125,25
-3,67
-0,66
135,89
128,36
-7,53
-1,25
p*
Z
0,0088
Peso (kg)
Δ
(b-a)
WHO
(a)
HIV+
(b)
19,90
19,7
-0,2
21,86
19,52
-2,34
24,22
24,08
-0,14
26,25
27,67
1,42
30,04
26,19
-3,85
Fonte: Protolo de Pesquisa
* Teste t de student
Δ: Valores medianos de referência menos valores medianos observados
p*
Z
0,40
0,91
0,33
0,06
1,02
0,7072
Figura 1 – Curva de crescimento de altura de crianças HIV positivo e comparação com o padrão antropométrico da
OMS. Belém-PA, 2010.
140
135
Altura (cm)
130
OMS
125
HIV positivo
120
115
110
5
6
7
8
9
Idade (anos)
Fonte: Protolo de Pesquisa
DISCUSSÃO
Anormalidades no crescimento são comuns
em crianças infectadas com o HIV, e podem ser
os principais responsáveis pela morbidade e
mortalidade infantil nesse grupo. A associação
entre infecção pelo HIV, baixo peso para a
idade e deficiência de crescimento em crianças
infectadas foi relatada tanto em situações
socioeconômicas
favoráveis,
quanto
em
situações desfavoráveis13, 9.
A classificação do estado nutricional
considerando o padrão de referencia proposto
pela Organização de Saúde12, demonstra, neste
estudo, que a maioria das crianças apresentou
eutrofia (Tabela 3), independente do índice
utilizado. Entretanto, foi possível identificar que
aproximadamente uma, entre quatro crianças
HIV positivo, apresentou baixa estatura para a
idade.
Vale ressaltar que o déficit estatural
encontrado neste estudo foi elevado, uma vez
que, o nível crítico utilizado para sua definição
foi o escore z abaixo de -2 da população de
referência. Assim sendo, a proporção esperada
de valores abaixo deste ponto, caso a condição
nutricional destas crianças se assemelhassem ao
padrão, seria de cerca de 2,3%.
O estado nutricional verificado a partir
do índice de massa corporal para a idade (IMCI),
o qual traduz a adequação do peso em relação à
altura, aponta que 16,7% das crianças estavam
com excesso de peso, indicando uma exposição
ao risco de obesidade na infância.
Estudos realizados com crianças
menores de dez anos, nas últimas décadas,
demonstram a redução dos déficits estaturais no
País, entretanto, na Região Norte tais valores,
ainda, permanecem expressivos, tornando esta
região a detentora da maior prevalência e
severidade do retardo de crescimento na
infância. A Pesquisa Nacional de Demografia e
Saúde da Criança e da Mulher- PNDS, aponta
uma redução da prevalência do déficit estatural
severo (escore z <-2,0) de 20,7%, em 1996, para
14,8%, na pesquisa de 200614). Contudo, não foi
suficiente para nivelar a Região Norte às demais
regiões do país, que apresentaram média de
déficit de altura para idade de 6,38%, conferindo
a esta região prioridade para a execução de
medidas de controle da desnutrição infantil.
Por outro lado, a adequação de massa
corporal encontrada, pode traduzir uma situação
favorável para essas crianças, tendo em vista que
o peso adequado para a altura representa um
estado nutricional atual satisfatório. Portanto,
apesar de terem perdido velocidade de
crescimento e alcançado mais baixa estatura,
conseguiram adequar seu peso para sua baixa
estatura, gozando, atualmente, de condição
nutricional mais favorável. Vale ressaltar ainda
que, pelo menos em parte, esse resultado
positivo pode ser explicado pela menor estatura
das crianças.
No Brasil, estudo realizado em Pelotas,
RS15 sobre a prevalência elevada de retardo de
crescimento linear com baixo percentual de
déficit de peso para altura na população,
concluiu que o perímetro abdominal aumentado,
reflete a composição corporal e explica
parcialmente, a baixa prevalência de déficit de
peso para a altura na presença de elevada
ocorrência de déficit de estatura para idade.
As condições socioeconômicas e
intrafamiliares desfavoráveis observadas neste
estudo, refletiram o perfil das mães. Mais de
60% referiram união não estável. A maioria
apresentou idade entre 20 a 30 anos, fato
relevante visto que é o período de maior
freqüência de gravidez, o que pode contribuir
para o aumento da transmissão vertical.
Prevaleceu a baixa escolaridade das mães e dos
cuidadores. A maioria vivia com até um salário
mínimo, renda que de uma forma expressiva
vinha do benefício recebido pela criança. Tais
achados refletem a situação social na qual vivem
as famílias que convivem com o HIV,
reforçando a importância do acesso universal a
TARV, como forma de garantir o tratamento
adequado às crianças portadoras do HIV.
O HIV afeta todas as classes sociais,
entretanto é naquela menos favorecida que a
doença prevalece atualmente16,17. Vários estudos
indicaram que no Brasil a epidemia se
disseminou na população mais pobre,
especialmente entre as mulheres de menor
escolaridade,
refletindo
o
padrão
de
18,19,20
desigualdade predominante no País
.
A baixa escolaridade é preocupante, uma
vez que pode constituir fator limitante ao acesso
às informações indispensáveis ao cuidado
requerido pelo portador do HIV. Estudo
realizado21 sobre a prevalência e os fatores
associados à adesão ao tratamento das crianças a
TARV comprovaram que a baixa adesão foi
fortemente associada ao perfil dos cuidadores,
tais como pouca escolaridade, renda abaixo de
um salário mínimo e a desintegração do meio
familiar (mãe solteira ou viúva e alto grau de
pobreza).
Outro aspecto importante da condição
materna é a assistência prénatal, preconizada
pelo Ministério da Saúde com a finalidade de
prevenir a transmissão vertical do HIV no
período gestacional, no parto e no puerpério22.
Não obstante estas recomendações, somente
50,0% das mães soropositivas realizaram o
prénatal, e somente 20,0% destas atenderam o
número mínimo de consultas preconizadas,
corroborando com pesquisa23 realizada que
utilizou informações coletadas no Estudo
Sentinela Parturiente, 2002, as quais indicaram
que na Região Norte, apenas 27,9% das
parturientes realizaram seis ou mais consultas no
prénatal e que 53,0% não realizaram sorologia
para o HIV.
Das 30 crianças HIV positivo que
participaram deste estudo, somente uma não foi
aleitada ao seio. Estudos relatam que o HIV está
presente no leite materno e é responsável por
14% dos casos de transmissão vertical do vírus,
na amamentação natural prolongada, em
gestantes com infecção crônica, aumentando
para 29%, em casos de infecção materna
aguda24,22. O fato da mãe utilizar TARV não
controla a eliminação do HIV pelo leite. A
amamentação está associada a um risco adicional
de 7 a 22% de transmissão. Portanto, toda mãe
soropositiva para o HIV deve ser orientada,
durante o prénatal, a não amamentar seu filho22.
Essas
situações
demonstram
a
importância da realização do prénatal, por todas
as mulheres para garantir a detecção do HIV e
outras doenças que possam comprometer a saúde
da criança.
O parto cesariano é preconizado pelo
Ministério da Saúde para todas as gestantes HIV
positivo, como medida de prevenção à
transmissão
materno
infantil22.
Estudos
realizados comprovaram a redução da
transmissão perinatal nas mulheres HIV positivo
quando submetidas ao parto cesariano eletivo
26,27
. Os resultados do presente estudo mostraram
que, embora 66,7% das mães soropositivas
tenham realizado este procedimento, esta
conduta não resultou da recomendação, uma vez
que, cerca de 97,0% das gestantes não tinham
conhecimento de sua soropositividade até que a
doença se manifestasse nos seus filhos.
CONCLUSÃO
Os achados deste estudo demonstram
que a desnutrição crônica, traduzida pela baixa
estatura foi comum em crianças HIV positivas,
agravada,
possivelmente,
pela
situação
socioeconômica materna e a baixa adesão ao
prénatal. Recomendações de investigações
adicionais são importantes para avaliar o
significado clínico do déficit de crescimento nas
crianças portadoras de HIV. Além disso, vale
salientar a importância do acompanhamento
contínuo da equipe multiprofissional com a
presença do nutricionista para monitorar o
crescimento e a situação de saúde dessas
crianças.
SUMMARY
HIV POSITIVE CHILDREN: ANTHROPOMETRIC AND SOCIAL-DEMOGRAPHIC CHARACTERISTICS
Rosa Maria DIAS; José Luiz Vieira FERNANDES; Eliete da Cunha ARAÚJO; Andréa das Graças Ferreira
FRAZÃO; Claudia Daniele Tavares Dutra e Laélia Maria Barra Feio BRASIL
Introduction: vertical transmission HIV virus infected children generally present a low weight.
Objective: to study the socio-demographic and anthropometric characteristics of HIV positive children
infected by vertical transmission, which made use of antiretrovirals. Methods: transversal study,
descriptive with 30 HIV serum-positive children, under the use of antiretroviral therapy (ART). The
nutritional evaluation has been performed according to the height-for-age, weight-for-age indexes and
Body Mass Index (BMI) for-age. Other data have been collected through a semi-structured form,
answered by the parents who are responsible for the child. Results: most of the children were male (60%).
The mothers had a maximum of 8 years of formal education (73.4%) and live with up to one minimum
wage and only 3.3% used ART during pregnancy and delivery. The evaluation of the children’s nutritional
conditions has pointed out a percentage of 13.3% for low weight to the age and 23.3% for low height to
the age. In all ages it was observed structure deficits, although they did not show up in a regular and
raising basis, mainly with aging. As for BMI, it was observed an appropriation of weight to height and
overweight. Conclusion: Chronic malnutrition translated by low height was common amongst the studied
HIV positive children, possibly aggravated by the social-economical situation of the mother and the low
adhesion to prenatal programs.
KEY-WORDS: HIV, children, nutritional evaluation, AIDS, Anthropometry.
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ENDEREÇO PARA CORRESPONDENCIA:
Rosa Maria Dias
Travessa Monte Alegre, 1265, apto. 101, Jurunas. Belém-Pará
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Recebido em 29.11.2012 – Aprovado em 14.01.2013
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