Polícia Rodoviária Federal Prof° Ahyrton

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Polícia Rodoviária Federal
Prof° Ahyrton Lourenço
Ministério da Justiça
Departamento de Polícia Rodoviária Federal
Concurso Público para Provimento de Vagas no
Cargo de Policial Rodoviário Federal
Edital n.º 1/2009 – DPRF, de 12 de agosto de
20097.
DIREITOS
HUMANOS E CIDADANIA: 7.1. Conceito. 7.2.
Características. 7.3. Evolução histórica. 7.4.
Princípios Básicos para utilização da força e
armas de fogo, adotado pela ONU em
07/07/1990. 7.5. Código de conduta para os
encarregados da aplicação da lei, adotado pela
ONU pela Resolução 34/169 de 17/12/1979.
Direitos Humanos
– Fraternidade | 4ª Dimensão – Direito dos Povos
(na sociedade).
Direitos de 1ª Dimensão
Direitos fundamentais de primeira geração são as
liberdades públicas, os direitos políticos básicos,
que representam os direitos civis do povo,
traduzidos no valor Liberdade;
Direitos da Liberdade
Igualdade
Segurança
Propriedade
Direitos de Votar
Direitos Individuais
Direitos de 2ª Dimensão
1. Conceito.
Entende-se por Direitos Humanos o rol de direitos
que são fundamentais à existência do próprio ser
humano, que existem pelo simples fato do homem
ser um ser vivo, que decorrem de sua própria
natureza humana, independentemente de qualquer
declaração positiva da norma jurídica.
Tais como direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
fraternidade, entre outros.
Neste sentido, o Professor Baptista Herkenhoff1,
nos orienta:
“Por direitos humanos ou direitos do homem são,
modernamente, entendidos aqueles direitos fundamentais que o
homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria natureza
humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que
não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo
contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de
consagrar e garantir.”
Complementa ainda o Professor Jair Teixeira do
Reis2:
“Direitos Humanos, por sua vez, transcendem os limites de cada
Estado. São também denominados naturais. São inerentes à
existência
do
homem,
valendo
por
si
mesmos,
independentemente de positivação. Estão acima dos interesses
meramente nacionais, merecendo atenção do Direito
Internacional, onde a solidariedade substitui o individualismo.”
O Professor Nestor Sampaio Penteado Filho3 divide
os Direitos Humanos em quatro gerações, ou mais
modernamente, quatro dimensões: 1ª Dimensão –
Liberdade | 2ª Dimensão – Igualdade | 3ª Dimensão
Direitos fundamentais de segunda geração buscam
estabelecer melhorias nas condições sociais do
homem trabalhador. Representam os direitos
sociais, culturais e econômicos do povo, traduzidos
no valor Igualdade;
Direitos sociais
Relações trabalhistas
Saúde
Educação
Direitos econômicos
Direitos culturais
Direitos de 3ª Dimensão
Direitos fundamentais de terceira geração
direcionam-se para a preservação da qualidade de
vida, tutelando o meio ambiente, permitindo-se o
progresso
sem
detrimento
da
paz
e
autodeterminação dos povos, constituindo-se em
interesses
metaindividuais
(difusos),
que
transcendem o indivíduo ou grupos de indivíduos,
onde representam os direitos de solidariedade, uma
vez considerado o homem como inserido na
sociedade, traduzidos no valor Fraternidade;
(consumidor, meio ambiente, criança)
Direitos de 4ª Dimensão
Direitos fundamentais de quarta geração –
decorreriam dos avanços no campo da engenharia
genética, ao colocarem em risco a própria
existência humana, através da manipulação do
patrimônio genético. Seriam direitos de preservação
do ser humano, direitos e garantias de proteção
contra a globalização desenfreada, direito à
democracia e à informática – Direitos dos Povos.
1
HERKENHOFF, J. B.; Direitos Humanos - a construção universal de
uma utopia. Ed. Aparecida: Santuário, 2001.
2
REIS, Jair Teixeira dos; Direitos humanos: para provas e concursos;
Ed. Juruá Editora; 2005.
3
PENTEADO FILHO; Nestor Sampaio; Manual dos Direitos
Humanos; Ed. Método; 2006.
Atualizada SET/2009
Direitos à Vida numa dimensão Planetária
Direitos a uma vida saudável, em harmonia com a
natureza
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Princípios ambientais e de desenvolvimento
sustentável
Direitos à vida das gerações futuras
Bioética
Manipulação genética
Biotecnologia e bioengenharia
Direitos advindos da realidade virtual
2. Características.
Os Direitos Humanos4, tecnicamente considerados
como direitos humanos fundamentais, ditos de
primeira
geração,
investidos
do
caráter
internacional,
encontram-se
elencados
na
“Declaração Universal dos Direitos Humanos” e
gozam de destacada posição na hierarquia do
ordenamento jurídico, apresentando características
que elevam seu poder e seu âmbito de atuação,
quais
sejam:
a
imprescritibilidade;
a
inalienabilidade;
a
irrenunciabilidade;
a
inviolabilidade; a universalidade; a efetividade;
a interdependência; e, a complementaridade.
Neste sentido o
Comparato5 orienta:
Professor
Fábio
Konder
“Quanto aos princípios estruturais dos direitos humanos, eles
são de duas espécies: a irrevogabilidade e a complementaridade
solidária.
O principio da complementaridade solidária dos direitos
humanos de qualquer espécie foi proclamado solenemente pela
Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena
em 1993, nos seguintes termos:
Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis,
interdependentes
e
inter-relacionados.
A
comunidade
internacional deve tratar dos direitos humanos globalmente, de
modo justo e eqüitativo. Com o mesmo fundamento e a mesma
ênfase. Levando em conta a importância das particularidades
nacionais e regionais, bem como os diferentes elementos de
base históricos, culturais e religiosos, é dever dos Estados.
Independentemente de seus sistemas políticos, econômicos e
culturais, promover e proteger todos os direitos humanos e as
liberdades fundamentais.”
As principais características doutrinárias
atribuídas aos Direitos Humanos fundamentais
são:
1. Historicidade.
4
Melhores detalhes:
ARENDT, Hannah. A Condição Humana Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1987.
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
COMPARATO, Fábio Konder. Para Vivera Democracia, São Paulo:
Brasiliense, 1989.
JELIN, Elisabeth. Cidadania e Alteridade. O reconhecimento da
pluralidade Brasília
Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Ministério da
Cultura, n. 24, 1996.
SOUZA, Herbert José de. Ética e Cidadania. São Paulo: Moderna,
1994.
5
COMPARATO, Fabio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos
Humanos, Saraiva, 6ª Ed., 2008.
2
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
São históricos como qualquer direito. Nascem,
modificam-se e desaparecem. Eles apareceram
com a revolução burguesa e evoluem, ampliam-se,
com o correr dos tempos;
2. Inalienabilidade.
São direitos intransferíveis, inegociáveis, porque
não são de conteúdo econômico-patrimonial. Se a
ordem constitucional os confere a todos, deles não
se pode desfazer, porque são indisponíveis;
Não há possibilidade de transferência, seja a título
gratuito ou oneroso;
3. Imprescritibilidade.
O exercício de boa parte dos direitos fundamentais
ocorre só no fato de existirem reconhecidos na
ordem jurídica (...). Se são sempre exercíveis e
exercidos, não há intercorrência temporal de não
exercício que fundamente a perda da exigibilidade
pela prescrição;
Os Direitos Humanos não se perdem pelo decurso
de prazo;
4. Irrenunciabilidade.
Não se renunciam direitos fundamentais. “Alguns
deles podem até não ser exercidos, pode-se deixar
de exercê-los, mas não se admite sejam
renunciados”6.
Não podem ser objeto de renúncia (polêmica
discussão: eutanásia, aborto e suicídio).
5. Inviolabilidade
Os Diretos Humanos são invioláveis, ou seja,
nenhuma pessoa possui o direito de desrespeitar
os direitos do seu próximo.
Impossibilidade de desrespeito por determinações
infraconstitucionais ou por ato das autoridades
públicas, sob pena de responsabilidade civil,
administrativa e criminal.
6. Universalidade
Todos os seres humanos são titulares dos Direitos
Humanos, não podendo existir qualquer tipo de
discriminação.
Os Direitos Humanos devem ser iguais e para
todas as pessoas em qualquer lugar do Mundo.
A abrangência desses direitos engloba todos os
indivíduos, independente de sua nacionalidade,
sexo, raça, credo ou convicção político-filosófica.
7. Efetividade
A efetividade dos Direitos Humanos é característica
fundamental, atribuindo a sua aplicabilidade
independentemente de terem sidos reconhecidos
por alguém ou por algum Estado Soberano.
A atuação do Poder Púbico deve ser no sentido de
garantir a efetivação dos direitos e garantias
previstas, com mecanismos coercitivos.
6 SILVA, José Afonso; Curso de Direito Constitucional Positivo; 2009;
Ed. Malheiros.
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Direitos Humanos
8. Interdependência / Indivisibilidade
Os Direitos Humanos devem ser estão todos
interligados entre si e com os sistemas políticos,
econômicos e culturais dos Estados para promover
e proteger todos os direitos humanos e as
liberdades fundamentais.
Não devem ser analisados isoladamente. Por
exemplo: o direito à vida, exige a segurança social
(satisfação dos direitos econômicos). A declaração
universal, ressalta a Ilustre Professora Flávia
Piovesan7, coloca no mesmo patamar de igualdade
os direitos civis e políticos com os direitos
econômicos e culturais.
pensamento já nasce numa perspectiva universal,
pois a idéia de Direito Natural surge da procura de
determinados princípios gerais que sejam válidos
para os povos em todos os tempos.
9. Complementaridade
Os Direitos Humanos são complementares a
qualquer Direito, mesmo que o Estado não o
reconheça expressamente.
Este é o ponto de partida para o pensamento do
Direito Natural que se desenvolverá através dos
tempos, e a resposta a esta questão se transformou
na conquista gradual, permanente e ainda distante
para nós, do que hoje conhecemos por Direitos
Humanos.
Será a partir do momento em que os pensadores
gregos percebem a existência de uma grande
diversidade de leis e costumes nas várias nações e
povos, que eles colocam a seguinte questão:
"existem princípios superiores a estas normas
específicas que sejam válidas para todos os povos,
em todos os tempos, ou a Justiça e o Direito são
uma mera questão de conveniência?"
3. Evolução histórica.
Esta parte do nosso material é fundamentada na
obra do Professor João Baptista HERKENHOFF.
1 - A Antigüidade.
Vários
são
os
pensadores
ocidentais
contemporâneos, que buscaram no pensamento
grego
da Antigüidade,
recursos para o
desenvolvimento de suas teses. Na verdade,
encontraremos entre os gregos, precursores dos
pensadores, ao longo do tempo, com as mais
variadas idéias que vieram a ser desenvolvidas
durante toda a história do pensamento filosófico e
jus-filosófico.
Desta forma, entende BODENHEIMER, encontrar
no sofista TRASIMACO, o precursor da
interpretação marxista do Direito, ensinando que
"as leis eram criadas pelos homens ou grupos que
estavam no poder, com o objetivo de fomentar seus
próprios interesses". Para TRASIACO a justiça não
é senão o que convém ao mais forte (01).
PROTAGORAS (481 (?) - 411 a.C.) pode ser
considerado o pensador que antecipou as opiniões
dos positivistas modernos. Sustentava que as leis
feitas pelos homens eram obrigatórias e válidas,
sem considerar o seu conteúdo moral (02).
Será, portanto, também no pensamento grego, que
encontraremos a idéia da existência de um Direito,
baseado no mais íntimo da natureza humana, como
ser individual ou coletivo. Acreditavam alguns
pensadores, que existe um "direito natural
permanente e eternamente válido, independente de
legislação, de convenção ou qualquer outro
expediente imaginado pelo homem" (03). Este
7
PIOVESAN, Flávia; “Direitos Humanos e o Direito Constitucional
Internacional; 4ª Edição; Ed. Max Limonad; 2000.
Atualizada SET/2009
Diversas e interessantes idéias começam a ser
desenvolvidas a partir deste momento, e como são
as idéias, que direcionam as mudanças, produto do
conflito de interesses opostos, vamos aqui
demonstrar algumas.
Sem a pretensão de esgotar o tema, e nos
permitindo a não citação de determinados
pensadores, comecemos por HESÍODO (poeta do
período heróico grego - séc. VIII e século VII a.C.).
Segundo OLIVEIROS LITRENTO, HESÍODO dará
melhor caracterização jurídica à idealização do
HOMERO em sua A Ilíada, simbolizando Dike,
deusa da Justiça com vistas a "facultas agendi").
No poema "A Teogonia, Dike com suas duas irmãs:
a Eumonia (boa ordem) e Eirene (a paz), todas
filhas de Themis e Zeus. Dike, que tem a missão de
realizar a concretização do intrinsecamente justo
através dos juizes, combate três opositores: Eris
(como a pendência, que subverte a ordem), Bia
(como a força que desafia o Direito) e Hybris (como
a incontinência, que transforma o justo em injusto,
uma vez ultrapassados os limites do Direito).
"Portanto, não apenas os homens cometem delitos.
Os juizes também erram quando suas sentenças
não refletem o pensamento de Dike. Logo, a ordem
jurídica pode ser afetada por ethos, ou seja, pelo
caráter de uma pessoa, que pode ser o juiz.
Quando Dike é desprezada, a subversão pela
injustiça destrói o Estado" (04).
HERÁCLITO será o melhor expositor da doutrina
panteísta da razão universal, considerando todas
as leis humanas subordinadas à lei divina do
Cosmos. HERÁCLITO assinala que ike (a Justiça)
assumia também a face de Eris (a discórdia ou
litígio), (daí se compreendendo que Dike - Eris não
apenas governam os homens, mas o mundo), a
verdade é que o grande filósofo traduz a Justiça
como resultado de permanente tensão social,
resultado jamais definitivo porque sempre
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renovado. HERÁCLITO transmitiu para Aristóteles
as primeiras especulações em torno de uma justiçatensão, revolucionária porque sempre renovada,
mas sem opor, antes submetendo e integrando a lei
positiva ao Direito Natural. Outro não é o motivo por
que à lei de um Logos natural e divino (Physis) (05).
Esta idéia dinâmica de mudança constante da
realidade e do surgimento de novas tensões, novos
direitos é desenvolvida por ARISTOTELES. Afirma
ARISTOTELES que o justo por natureza é mutável
na medida que mudam as realidades a que se
refere este critério de justiça. Desta forma, pode-se
concluir do pensamento de ARISTOTELES
segundo RECASÉNS SICHES, que, enquanto o
justo vai se realizando progressivamente, brotam
novas e diversas exigências da justiça natural (06).
Na opinião de RECASÉNS SICHES, esta
interpretação pode ser correta se se levar em conta
que Aristóteles afirmou a mudança não somente do
justo por lei ou por Convenção, mas também o justo
por natureza (07).
Assim, como Aristóteles, Platão está convencido de
que o Direito e as leis (nomos e nomoi) são
essenciais para a estruturação da Polis. Aliás, com
relação à expressão Polis, CARL J. FRIEDRIH
ressalta que muitas vezes ela é traduzida como
Estado, o que é uma "expressão moderna que é
bastante enganadora quando aplicada à ordem
política grega" (08). De acordo com a convicção
dos dois grandes filósofos da Antigüidade,
"qualquer espécie de Positivismo legal segundo o
qual a ordem arbitrária de um tirano pudesse ser
considerada lei" - uma opinião que tem sido
freqüentemente
sustentada
sob
modernas
ditaduras - "é por eles complemente excluída". (09)
Com esta afirmação surge uma questão
fundamental: qual a origem, a fonte da lei, se esta
não está na vontade daquele que possui o poder
efetivo no Estado? A difícil resposta pode ser
encontrada na doutrina platônica de idéias. A
própria palavra "idéia" tem sido, muitas vezes,
considerada imprópria para representar o que
constitui a essência da doutrina socrático-platônica
de idéia ou eidos. Palavras como "forma" têm sido
sugeridas para satisfazer ao fato de que essas
idéias não são, para Sócrates e Platão, algo criado
pelo espírito subjetivo do homem, mas uma
realidade objetiva e transcendente, estranha ao
homem. Platão pensava que a tarefa do reformador
é de tentar criar um Estado que participe, tanto
quanto possível, da idéia, pois esta é eterna e
imutável. "Quando Platão escreveu seu famoso
diálogo intitulado Politeia ou Constituição (não
República!), pensou estar a braços com um
problema muito difícil, mas não insolúvel. Platão
acreditava que a solução seria ou os filósofos se
tornarem governantes ou os governantes se
tornarem filósofo, isto é, homens buscando a
4
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
sabedoria através de um entendimento real das
idéias".
Entre os estóicos, uma escola de filosofia fundada
pelo pensador de origem semita Zenon (350-250
a.C) colocava o conceito de natureza no centro do
sistema filosófico. Para eles o Direito Natural era
idêntico à lei da razão, e os homens, enquanto
parte da natureza cósmica, eram uma criação
essencialmente racional. Portanto, enquanto este
homem seguisse sua razão, libertando-se das
emoções e das paixões, conduziria sua vida de
acordo com as leis de sua própria natureza". "A
razão como força universal que penetra todo o
"Cosmos" era considerada pelos estóicos como a
base do Direito e da Justiça. A razão divina - diziam
- mora em todos os homens, de qualquer parte do
mundo, sem distinção de raça e nacionalidade.
Existe um Direito Natural comum, baseado na
razão, que é universalmente válido em todo o
Cosmos. Seus postulados são obrigatórios para
todos os homens em todas as partes do mundo"
(10). Esta doutrina foi confirmada por Panécio
(cerca de 140 a.C), sendo a seguir levada para
Roma, para ser finalmente reestruturada por
Cícero, "de um modo que tornou o direito estóico
utilizável, dentro do contexto do Direito Romano, e
propício à sua evolução" (11).
Para EDGAR DE GODOI DA MATA-MACHADO, há
uma certa indiscriminação exagerada entre os
estóicos, que confundem "lei geral do universo"
com o direito natural que se aplicará a todas as
criaturas: plantas, animais e homens. Entretanto,
salienta o professor, que já entre eles e mais tarde
entre os romanos, mas sobretudo entre os filósofos
cristãos, se realçará o aspecto humano do Direito
Natural (12).
Muitas das formulações encontradas entre os
estóicos são semelhantes às estabelecidas por
Platão e ARISTOTELES. Entretanto, a obscura
doutrina dos estóicos fez explodir a estrutura da
polis, o que para os dois filósofos gregos era algo
indiscutível.
Os
estóicos
proclamaram
a
humanidade como uma comunidade universal (13).
Como já afirmamos, o estoicismo influiu sobre a
jurística romana, e Cícero será o maior
representante na Antigüidade clássica da noção de
Direito Natural, real, objetiva. Esta concepção pode
ser encontrada no plano do diálogo De Legibus (I,
17-19): "O que nos interessa, neste discurso, não é
o modo de prevenir cautelas processuais ou a
maneira de despachar uma consulta qualquer...,
devemos abraçar, nesta dissertação, o fundamento
universal do direito e das leis, de modo que o
chamado direito civil fique reduzido, diríamos, a
uma parte de proporções bem pequenas. Assim
haveremos de explicar a natureza do direito,
deduzindo-a do pensamento do homem..." (14).
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O que interessa a CÍCERO é o direito e não a Lei.
Para ele os homens nasceram para a Justiça e será
na própria natureza, não no arbítrio, que se funda o
Direito. (15)
Apesar da riqueza do pensamento encontrada na
Antigüidade, sobre o direito natural e o conceito de
justiça, a realidade social não correspondia, à
preocupação demonstrada pelos pensadores.
As civilizações ocidentais antigas baseavam-se,
muitas delas, em conceitos primitivos de Justiça,
sendo que o trabalho escravo se colocava na base
da sociedade, como sustentáculo da vida na polis
grega ou nas cidades do Império Romano.
A dinamicidade demonstrada no pensamento de
Heráclito e Aristóteles fica bem clara quando
confrontamos certos aspectos da vida na
Antigüidade, com as mais recentes conquistas no
campo dos direitos da pessoa humana.
Ao estudarmos a vida privada na Antigüidade
podemos por vezes pensar que muito já se
caminhou na conquista dos Direitos Fundamentais,
mas ao nos depararmos com a nossa realidade de
país do terceiro mundo, notamos que o leque de
direitos muito aumentou, pelas mudanças da
sociedade moderna, entretanto, mais direitos ainda
têm que ser conquistados, sendo que muito do que
se percebe na Antigüidade, ainda não foi resolvido.
Apenas para exemplificar o que viemos de afirmar,
citaremos trecho de trabalho coletivo intitulado
História da vida privada, onde percebemos nos
costumes gregos e romanos da Antigüidade o
desapreço a determinados direitos individuais
básicos. Entretanto, percebemos que alguma coisa
não nos é estranha na realidade atual:
"O nascimento de um romano não é apenas um
fato biológico. Os recém-nascidos só vêm ao
mundo, ou melhor, só são recebidos na sociedade
em virtude de uma decisão do chefe de família; a
contracepção, o aborto, o enjeitamento das
crianças de nascimento livre e o infanticídio do filho
de uma escrava são, portanto, práticas usuais e
perfeitamente legais (...). Em Roma um cidadão
não "têm" um filho: ele o "toma", "levanta" (tollere);
(...). A criança que o pai não levantar será exposta
diante da casa ou num monturo público; quem
quiser que a recolha. (...) Na Grécia era mais
freqüente enjeitar meninas que meninos; no ano 1
a.C. um heleno escreveu à esposa: "Se (bate na
madeira!) tiveres um filho, deixa-o viver; se tiveres
uma filha, enjeita-a. Mas não é certo que os
romanos tivessem a mesma parcialidade.
Enjeitavam ou afogavam as crianças malformadas
(nisso não havia raiva, e sim razão), diz Sêneca:
"É preciso separar o que é bom do que não pode
servir para nada", ou ainda os filhos de sua filha
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
que "cometeu uma falta". Entretanto, o abandono
de filhos legítimos tinha como causa principal a
miséria de uns e a política patrimonial de outros. Os
pobres abandonavam as crianças que não podiam
alimentar; (...) a classe média, os simples notáveis,
preferia, por ambição familiar, concentrar esforços e
recursos num pequeno número de rebentos". (16)
Como se pode notar, muitas características da
sociedade romana estão ainda presentes entre nós,
mais notadamente a existência de valores que
colocam o patrimônio privado em escala valorativa
maior do que a própria vida humana. Isto se
manifesta ainda na atualidade em algumas normas
jurídicas esparsas, civis e penais.
Em análise da origem e desenvolvimento das
diferenças sociais causadas pela transformação de
Roma em grande potência, Léon Bloch escreve:
"Na Antigüidade a política imperialista era um
fenômeno necessário que coexistia com a
democracia; ensinamento que também a história de
Atenas, única potência grega nos proporciona (...).
A política imperialista das democracias não foi outra
coisa senão uma política de exploração. O trabalho
corporal, pessoal, não goza de consideração
nenhuma onde impera a escravidão. Na
Antigüidade o cidadão não sentia alegria com os
trabalhos no campo ou na obscura oficina; ao
contrário: aspirava a que outros trabalhassem por
ela da mesma maneira que as famílias nobres do
país, em gerações passadas, mantiveram em
sujeição econômica as demais classes sociais - e
tudo isto em plena consciência da dignidade que
confere a soberania popular" (17).
2 - Do pensamento
Revolução Francesa.
cristão
medieval
à
O pensamento cristão primitivo, no tocante ao
Direito Natural, é herdeiro imediato do Estoicismo e
da Jurídica Romana. A noção objetiva do Direito
Natural pode ser encontrada muito bem figurada no
famoso texto de São Paulo:
"... quando os gentios, que não têm lei, cumprem
naturalmente o que a lei manda, embora não
tenham lei, servem de lei a si mesmos; mostram
que a lei está escrita em seus corações" - Rom. 2,
14-15 (18).
Os Padres da Igreja vão pegar dos estóicos a
distinção entre Direito Natural absoluto e relativo.
Para eles o Direito Natural absoluto era o direito
ideal que imperava antes que a natureza humana
tivesse se viciado com o pecado original. Com este
Direito Natural absoluto todos os homens eram
iguais e possuíam todas as coisas em comum, não
havia governo dos homens sobre homens nem
domínio de amos sobre escravos. Todos os
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homens viviam em comunidades livres sobre o
império do amor cristão.
O Direito Natural relativo era, ao contrário, um
sistema de princípios jurídicos adaptados à
natureza humana após o pecado original. Portanto,
como nos explica BODENHEIMER: "Do pecado
original derivou a obrigação do trabalho e com ele a
instituição da propriedade. A aparição da paixão
sexual depois do pecado exigiu as instituições do
matrimônio e da família. Do crime de Caim surgiu a
necessidade do Direito e da Pena. A fundação do
Estado por Nemod foi o começo do governo.
A confusão de línguas que se produziu quando os
homens construíram a torre de Babel motivou a
divisão da humanidade em nações distintas. O
ultraje de Caim serviu como justificação da
escravidão. Desta forma, a propriedade privada, o
matrimônio, o Direito, o governo e a escravidão se
converteram em instituições legítimas de Direito
Natural relativo. Mas os Padres da Igreja
ensinavam que era preciso tentar sempre se
aproximar o Direito Natural relativo ao ideal de
Direito Natural absoluto" (19). Esperava-se que a
hierarquia da Igreja vivesse daquela forma,
entretanto os fiéis poderiam se limitar a cumprir o
Direito Natural relativo. Com esta solução
aristocrática a Igreja conseguiu manter os ideais
cristãos longe da realidade (20).
A doutrina de SANTO AGOSTINHO (354-430 d.C.)
tem um importante papel nos postulados do Direito
Natural absoluto. Ele considerava o governo, o
direito, a propriedade, a civilização toda como
produto do pecado, e a Igreja, como guardiã_ da
Lei Eterna de Deus, poderia intervir nestas
instituições quando julgasse oportuno. Para SANTO
AGOSTINHO, se as leis terrenas (lex temporalis)
contêm disposições claramente contrárias à Lei de
Deus, estas normas não têm vigência e não devem
ser obedecidas (21).
Novecentos anos mais tarde, a doutrina de São
TOM°S DE AQUINO (1226-1274) mostra em maior
grau a necessidade da realidade mostrada através
do conceito de Direito Natural relativo expressar os
ideais cristãos (22): "As opiniões de São TOMAS
DE AQUINO sobre questões jurídicas e políticas
mostram especialmente a influência do pensamento
aristotélico adaptado às doutrinas do Evangelho e
dos Padres da Igreja integrado em um importante
sistema de pensamento" (23).
O papel da Igreja, em sua relação com o governo,
levará São Tomás de Aquino, assim como grande
parte dos pensadores medievais, a colocar o Direito
Natural como de importância decisiva, pois só com
uma norma de caráter mais geral, colocada acima
do Direito Positivo, poderia haver alguma
esperança de realização da Justiça Cristã (24).
6
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
A doutrina do representante máximo da filosofia
cristã_ é um primeiro passo para a autonomização
do Direito Natural como Ciência, pois se a lei
natural exprime o conteúdo de Direito Natural como
algo devido ao homem e à sociedade dos homens,
esta adquire, no tocante à criatura racional,
características específicas (25).
São Tomás distingue quatro classes de Lei:
a) a Lei Eterna, que é a razão do governo universal
existente no Governante Supremo. Esta Lei dirige
todos os movimentos e ações do Universo;
b) a Lei Natural, que é a participação da criatura
humana na Lei Eterna, uma vez que nenhum ser
humano pode conhecer a Lei Eterna em toda sua
verdade. A Lei Natural é a única concepção que
tem o homem dos interesses de Deus. Ela dá ao
homem a possibilidade de distinguir o bem e o mal,
e por esta razão deve ser guia invariável e imutável
da lei humana;
c) a Lei Divina: uma vez que a Lei Natural consiste
em princípios gerais e abstratos, deve se completar
com direções mais particulares dadas por Deus,
acerca de como devem os homens se conduzir.
Esta é a função da Lei Divina que é revelada por
Deus nas Sagradas Escrituras;
d) a Lei Humana - finalmente, a Lei Humana é um
ato de vontade do poder soberano do Estado, mas
para ser lei deve estar de acordo com a razão. Se
esta lei contradiz um princípio fundamental de
Justiça, não será lei e sim uma perversão da Lei. O
governante temporal deve observar os princípios da
Lei Eterna refletidos na Lei Natural (26).
Podemos perceber neste período da História, que
mais uma vez, todo o pensamento desenvolvido
sobre os Direitos Naturais, e as aspirações de
Justiça, permanecem distantes da realidade. Aliás,
como a própria Igreja havia pregado, enquanto o
Direito Natural absoluto era privilégio de seus
Padres, para o imenso rebanho bastava o Direito
Natural relativo ou, na realidade, algo muito pior,
quando em "12 de maio de 1314 dá-se o primeiro
auto de fé e seis indivíduos, acusados de heresia,
foram queimados vivos vinte e cinto indivíduos que
não quiseram arrepender-se, abjurar de suas
crenças e confessar que a Igreja estava certa. _
medida que as heresias alastravam-se, o herege
passou a ser visto como uma perigosa ameaça à
sociedade e como um traidor de Deus" (27).
Enquanto que no continente europeu permaneciam
as violações dos Direitos Fundamentais mais
elementares, na Inglaterra começava-se a
transformação da realidade com o surgimento do
esboço do que seria uma Constituição Moderna.
Em 1215 na Inglaterra é elaborada a Magna Carta,
imposta pelos Barões ingleses ao Rei, marcando o
início da limitação do poder do Estado. Trata ainda
esse texto, muito mais de uma garantia dos direitos
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Direitos Humanos
dos Barões, proprietários de terra, do que de uma
ampla garantia dos direitos de todo o povo.
mais destacado desta época foi ROUSSEAU, que
exerceu influência sobre KANT (29).
No restante da Europa um fato ao qual pode não
ser dada tanta importância, contribui de forma
decisiva para que os direitos da pessoa deixem de
ser meras construções filosóficas, para começarem
a se tornar realidade. Este fato foi o
aperfeiçoamento da imprensa por Gutemberg, que
em 1455 fez o primeiro livro com a nova técnica por
ele inventada: os tipos, ou seja, as letras, formadas
por uma liga de antimônio e chumbo. Este primeiro
livro será a Bíblia em dois volumes.
LEO STRAUSS (30) vai referir-se a esta fase do
Direito Natural como sendo a fase moderna e
colocará JOHN LOCKE como o mais célebre. Com
relação à classificação, a de BODENHEIMER sem
dúvida nos dá uma idéia melhor da evolução do
Direito Natural; vamos recorrer aos ensinamentos
de LEO STRAUSS, quando este analisa o
pensamento de HOBBES, LOCKE e ROUSSEAU,
aos quais faremos uma breve referência antes de
estudarmos o ressurgimento do Direito Natural na
atualidade.
Com o aperfeiçoamento da imprensa, livros serão
impressos e traduzidos e as idéias circularão com
maior rapidez e para um maior número de pessoas.
A primeira mudança sensível que ocorrerá será na
Religião, com o segundo grande Cisma da Igreja
causado pela Reforma Protestante. Posteriormente
toda a realidade social existente será objeto de
indagação, tendo como principal corrente de
questionamento e de proposição de mudanças, o
Iluminismo.
Descartes é o ponto de partida para o Iluminismo,
corrente filosófica e cultural que vai tomar conta da
Europa Ocidental. O Iluminismo é fundado no
Racionalismo. Todas as coisas poderiam e
deveriam ser explicadas através da razão. O poder
estatal, exercido pelos reis e explicado pela
vontade divina, passa a ser compreendido como
força de vontade popular. O Direito Natural é
complemente revisto. Na Idade Média este Direito
Natural era visto como vinculado à vontade de
Deus. A partir da Escola de Direito Natural de
Grotius (1625) não é mais entendido desta forma.
Os Direitos Naturais são produtos da razão (28).
BODENHEIMER chamará esta fase do Direito
Natural como fase clássica, que para o Autor será
dividida em três períodos:
O primeiro após o Renascimento e a Reforma, que
corresponde à teoria de HUGO GROTIUS (que
preparou o terreno para a doutrina clássica),
HOBBES, SPINOZA, PUFENDORF e WOLFF,
onde o Direito Natural residia meramente na
prudência e automoderação do governante; o
segundo período começa com a Revolução
Puritana de 1.649, e é caracterizado por uma
tendência para o capitalismo livre na economia e o
liberalismo na política e na filosofia, onde
encontraremos
as
idéias
de
LOCKE
e
MONTESQUIEU (nesta época a preocupação era
garantir os indivíduos contra as violações por parte
do Estado); e finalmente o terceiro período, que
está marcado por uma forte crença na soberania
popular, na Democracia. O Direito Natural estava
confiado à vontade geral do povo. O representante
Atualizada SET/2009
Assim como todos pensadores que citamos aqui
após os próprios gregos, também HOBBES
aprendeu muito com os filósofos gregos. Platão
ensinará a HOBBES que a matemática será a mãe
de toda a ciência da natureza. Entretanto HOBBES
considera a filosofia antiga mais um sonho que uma
ciência, o conjunto do pensamento hobbesiano nos
mostra uma combinação tipicamente moderna feita
de idealismo político e de uma concepção
materialista e atéia do universo (31).
HOBBES será o continuador do pensamento de
HUGO GROTIUS (1583-1645), a quem se atribui a
origem do Jusnaturalismo, que sustentava a
imutabilidade do Direito Natural comparando-o às
normas dos axiomas matemáticos ("nem Deus
poderia modificar as normas oriundas da
conformidade ou não conformidade dos atos
humanos com a natureza, tal como não poderia
fazer com que dois e dois não fossem quatro") (32).
Como bem observa o Professor EDGAR DE
GODOI DA MATA-MACHADO: "Racionalizado,
reduzido o conceito inventado pelo espírito, sem
qualquer referência às circunstâncias e às
situações
concretas,
históricas
e
fáticas,
existenciais da condição humana, o Direito Natural
dos jusnaturalistas estava fadado, em breve,
apenas iniciado o século XIX, a ser complemente
elidido pelos que não vêem outro objeto para o
Direito senão o estudo de normas originárias da
vontade estatal expressa sob as mais diferentes
formas" (33).
É a época do Jusnaturalismo abstrato, a explicação
de tudo é encontrada no próprio homem, na própria
razão humana, nada de objetivo é levado em
consideração, a realidade social, a História, a razão
humana se tornam uma divindade absoluta.
Outro importante representante do racionalismo ou,
como chamamos anteriormente, do Jusnaturalismo
abstrato será JOHN LOCKE. "Individualista como
HOBBES, o filósofo inglês JOHN LOCKE (16321704) sustentou teoria jurídico-política sob muitos
aspectos diferentes e oposta à de seu compatrício
igualmente famoso" (34). Enquanto HOBBES era
politicamente favorável à extensão do poder real e
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com isso contribuiu para reforçar teoricamente o
absolutismo do Estado, LOCKE era um partidário
da supremacia do Parlamento (35).
Para LOCKE a lei natural é uma regra eterna para
todos, sendo evidente e inteligível para todas as
criaturas racionais. A lei natural, portanto, é igual à
lei da razão. Para ele o homem deveria ser capaz
de elaborar "a partir dos princípios da razão um
corpo de doutrina moral que seria seguramente a
lei natural e ensinaria todos os deveres da vida, ou
ainda formular o enunciado integral da lei da
natureza, a moral completa, ou ainda um "código"
que nos dê a lei da natureza "integral". Este código
compreenderia, entre outras coisas, a lei natural
penal" (36). Podemos notar que com este
pensamento está aberto o caminho para o
positivismo.
Outro grande pensador a quem não podemos
deixar de fazer referência é ROUSSEAU.
Para LEO STRAUSS, a primeira crise deste espírito
moderno se manifesta com o pensamento de
ROUSSEAU. ROUSSEAU pensa que a aventura
moderna era um erro radical e procura um remédio
para isso no retorno ao pensamento antigo. Ele
atacava esta modernidade em nome de duas idéias
da Antigüidade: em nome da cidade e da virtude,
de um lado, e em nome da natureza, de outro. "Os
antigos políticos falavam sempre dos modos e da
virtude; os nossos só falam do comércio e do
dinheiro" (37). "O comércio, o dinheiro, as luzes, a
emancipação do desejo de adquirir o luxo e a
crença na onipotência das leis, estas são as
características do nosso Estado Moderno, quer se
trate de uma monarquia absoluta, ou de uma
República Parlamentar" (38).
Existe um claro conflito no pensamento de
ROUSSEAU, que defende duas posições
diametralmente opostas: em um momento ele
defende ardentemente os direitos do indivíduo
contra toda a opressão e autoridade; no momento
seguinte, não menos ardentemente, ele defende a
disciplina moral ou social, a mais rigorosa. Os
estudiosos de ROUSSEAU dizem que no seu
período de maior maturidade ele finalmente
conseguiu superar esta hesitação temporária.
ROUSSEAU acreditará até o fim que o bom tipo de
Estado, ele mesmo é uma forma de escravidão.
Logo ROUSSEAU não pôde considerar sua solução
do problema do conflito entre indivíduos e
sociedade como além de uma aproximação
passável que está exposta a dúvidas legítimas. A
libertação do homem, da autoridade, da opressão e
da responsabilidade em uma palavra, retornar ao
Estado da Natureza, é para ROUSSEAU uma
possibilidade legítima. Logo a questão que se
coloca é como ROUSSEAU compreendeu este
insolúvel conflito (39).
8
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
No "Discurso sobre a Ciência e as Artes",
ROUSSEAU ataca as ciências e as artes que
sustentam os poderosos, e por isso são
incompatíveis com a virtude. Para o filósofo a
virtude é a única coisa que importa. "ROUSSEAU
mostra a significação da virtude bem claramente ao
se referir aos exemplos do cidadão-filósofo
Sócrates, de Fabricius e sobretudo de Caton: Caton
era o maior dos homens. A virtude é principalmente
a virtude política, a virtude do patriota ou a virtude
do povo inteiro. Ela pressupõe uma sociedade livre:
a virtude e a sociedade livre são ligadas entre si
(40).
Antes de seguirmos adiante, para estudarmos o
ressurgimento do Direito Natural na época atual, é
oportuno transcrever dois trechos do "Discurso
sobre as Ciências e as Artes", de JEAN-JACQUES
ROUSSEAU:
"Enquanto o governo e as leis provêm a segurança
e o bem-estar dos homens reunidos, as ciências, as
letras e as artes, menos despóticas e quiçá mais
poderosas, estendem guirlandas de flores às
cadeias de ferro a que os homens estão presos,
neles sufocam o sentimento dessa liberdade
original para a qual pareciam ter nascido, fazemnos amar a própria escravidão, e criam o que se
costuma chamar de povos policiados. A
necessidade ergueu os tronos; as Ciências e as
Artes os consolidaram. Poderosos da Terra, amai
os talentos, e protegei os que os cultivam! Povos
policiados, cultivai-nos! Venturosos escravos,
deveis a eles esse gosto delicado e fino com o qual
vos picais, essa doçura de caráter e essa
urbanidade de costumes que correspondem entre
vós ao comércio tão afável e tão fácil; numa
palavra, as aparências de todas as virtudes sem
que haja alguma" (41).
Neste trecho ROUSSEAU combate as artes que
sustentam o Poder opressor do Estado. No trecho
que se segue, ROUSSEAU coloca a virtude com a
base de tudo: "Como seria agradável viver entre
nós, se a continência exterior fosse sempre a
imagem das disposições do coração, se a decência
constituísse a virtude, se nossas máximas nos
servissem de regra, se a verdadeira filosofia
estivesse separada do título de filósofo! Mas tantas
qualidades raramente caminham juntas, e a virtude
nunca marcha em meio a própria pompa. A riqueza
do adorno pode anunciar um homem opulento, e
sua elegância um homem de gosto. O Homem são
e robusto se reconhece por outras marcas; é sob o
hábito rústico de um trabalhador, e não sob os
enfeites de um cortesão que encontraremos a força
e o vigor do corpo. O adorno não é menos estranho
à virtude, que é a força, o vigor da alma. O homem
de bem é um atleta que se compraz em combater
nu; despreza todos esses vis ornamentos que
prejudicariam o uso de suas forças, a maior parte
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dos quais foi inventada para ocultar alguma
deformidade" (42).
Entretanto, apesar de todas as questões que
possam
ser
levantadas
à
respeito
do
Jusnaturalismo, ou Jusracionalismo o fato mais
importante será o início das garantias formais dos
Direitos Humanos, entendidos na época como
sinônimos de Direitos Individuais Fundamentais.
O Professor JOAQUIM CARLOS SALGADO sobre
esta conquista escreve: "A idéia de garantir os
direitos fundamentais a cada indivíduo é uma
conquista teórica dos pensadores franceses" (43).
Estas mesmas idéias serviram de fundamento para
a Declaração de Independência dos Estados
Unidos da América do Norte, e foram
posteriormente materializadas na Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão (1.789, França).
Não se pode deixar de citar de forma alguma todo o
processo pioneiro de materialização destes direitos
fundamentais ocorrida na Inglaterra. Após a já
citada Magna Carta de 1215, seguiram-se o "Ato de
Habeas Corpus" de 1679 e o Bill of Rights de 1688,
assim como o Instrumento de governo de Cromwell,
para muitos autores a primeira Constituição no
sentido moderno da palavra e que inspirou a
Constituição Norte-Americana de 1787.
O professor RAUL MACHADO HORTA sintetiza
muito bem este processo histórico até aqui
estudado:
"A recepção dos direitos individuais no
ordenamento jurídico pressupõe o percurso de
longa trajetória, que mergulha suas raízes no
pensamento e na arquitetura política do mundo
helênico, trajetória que prosseguiu vacilante na
Roma imperial e republicana, para retomar seu
vigor nas idéias que alimentaram o Cristianismo
emergente,
os
teólogos
medievais,
o
Protestantismo, o Renascimento e, afinal,
corporificar-se na brilhante floração das idéias
políticas e filosóficas das correntes do pensamento
dos séculos XVII e XVIII. Nesse conjunto temos
fontes espirituais e ideológicas da concepção, que
afirma a precedência dos direitos individuais inatos,
naturais, imprescritíveis e inalienáveis do homem"
(44).
Direitos Humanos
travadas entre a monarquia absoluta e a nobreza
latifundiária na Inglaterra. O primeiro dos atos
legislativos que demarca a passagem da Monarquia
Absoluta para a Monarquia Constitucional é o que
se concretizou no Assise de Clarendon em 1166.
Entretanto, o grande marco desta transição será a
Magna Carta de 1215, derivada do conflito entre o
Rei João e os barões. Após este texto novas
limitações ao poder absoluto foram feitas,
garantindo-se aos indivíduos certos Direitos
Fundamentais. Desta forma teremos em 1629 o
Petition of Rights, o Habeas Corpus Act de 1679 e
principalmente o Bill of Rights de 1.689 (45).
A primeira Constituição escrita, nacional e limitativa
no mundo foi o Instrument of government
promulgado por Cromwell em 1652, durante a curta
experiência republicana inglesa e segundo A.
ESMEIN, o protótipo da Constituição dos Estados
Unidos (46).
O professor francês, destaca como momento
marcante para o direito constitucional, a Revolução
Norte-Americana de 1776 e a Revolução Francesa
de 1789 (47). Os Direitos Fundamentais serão
reafirmados pela declaração de independência dos
Estados Unidos e pela Declaração dos direitos do
homem e do cidadão de 1789, na França. Estes
direitos consagrados pela declaração de 1789 vão
constar dos textos constitucionais franceses de
1791, 1793, 1795, 1799, 1802, 1804, 1814 e 1830
(48).
A Constituição Norte-Americana de 1787,
inicialmente não continha uma declaração de
direitos.
Após a exigência dos Estados-Membros, foram
votadas em 1789 dez emendas à Lei Suprema que
irão conter o chamado "Bill of Rights",
posteriormente ratificados por 3/4 partes dos
Estados-membros (49).
Será a partir destas revoluções, que vão se
consagrar os princípios liberais político e
econômico. Surge portanto o Estado Liberal que
pouco a pouco irá tomar conta da Europa. Porém,
como bem salienta Paulo Bonavides, triunfou
apenas o Liberalismo e não a Democracia (50).
O processo de materialização dos Direitos
Fundamentais se inicia na Inglaterra e marca o
início da derrocada da monarquia absoluta que irá
ceder lugar a um novo tipo de Estado: O Estado
Liberal.
O Estado Liberal típico, não vai fazer em suas
Constituições nenhum dispositivo referente à ordem
econômica. As declarações de Direito Fundamental
não fazem menção ao aspecto econômico. Este
tipo de Estado vai se caracterizar pela omissão
como regra de conduta só se preocupando com a
manutenção da ordem através do poder de polícia,
e a manutenção da soberania através das forças
armadas (51).
O Professor Pinto Ferreira ensina que a origem das
Constituições na história européia remonta às lutas
"O Liberalismo Clássico corresponde ao Estado
Liberal que traduzia o pensamento econômico do
3 - Do Estado Liberal ao Estado Social
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laissez-faire, laissez-passer, deixava aos cidadãos
a possibilidade do exercício da livre concorrência
de modo que o egoísmo de cada um ajudasse a
melhoria do todo" (52).
Para Maurice Duverger, o Liberalismo Político está
resumido no artigo 1º na declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão de 1789:
"Os homens nascem e permanecem livres e iguais
em direitos".
A ideologia liberal demonstra-se individualista,
baseada na busca dos interesses individuais (53).
O conteúdo dos Direitos Fundamentais nesta época
seriam os Direitos Individuais relativos à liberdade e
igualdade.
Temos então a liberdade de locomoção, a liberdade
de empresa, ou seja, a liberdade de comércio e de
indústria, a liberdade de consciência, a liberdade de
expressão, de reunião, de associação, o direito à
propriedade privada (54), a inviolabilidade de
domicílio, e entre outros direitos do indivíduo
isolado, a igualdade perante a lei.
Entretanto, convém ressaltar que a base
fundamental deste Estado liberal, será o direito de
propriedade que é absoluto e intocável. Como já
dissemos anteriormente, Liberalismo não é
sinônimo de Democracia, sendo que só
posteriormente, haverá uma fusão destes dois
conceitos. Desta forma, o liberal Charles
Tocqueville vai constatar a existência de duas
concepções diferentes de Estado: a concepção
liberal, que defende a correlação entre propriedade
e liberdade e a concepção democrática que
defende a correlação entre igualdade e liberdade
(55).
Este individualismo dos séculos XVII e XVIII
corporificados no Estado Liberal, e a atitude de
omissão do Estado frente aos problemas sociais e
econômicos vai conduzir os homens a um
capitalismo desumano e escravizador. O século XIX
vai conhecer desajustamentos e misérias sociais
que a revolução industrial vai agravar e que o
Liberalismo vai deixar alastrar em proporções
crescentes e fascista a liberal-democracia se viu
encurralada (56). O Estado não mais podia
continuar se omitindo perante os problemas sociais
e econômicos.
Desta forma, após a Primeira Guerra Mundial, as
novas Constituições que irão surgir, "não ficam
apenas preocupadas com a estrutura política do
Estado, mas salientam o direito e o dever do
Estado em reconhecer e garantir a nova estrutura
exigida pela sociedade" (57).
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Direitos Humanos
A partir deste momento as superiores exigências da
coletividade vão se contrapor aos direitos absolutos
da Declaração de 1789. "Aos princípios que
consagram a atitude abstencionista do Estado
impõe-se o do artigo 151 da Constituição de
Weimar: A vida econômica deve ser organizada
conforme os princípios de Justiça, objetivando
garantir a todos uma existência digna" (58).
O Estado agora, irá preocupar-se com o social. O
conteúdo dos Direitos Fundamentais se ampliam
ainda mais. Agora, além dos Direitos Individuais,
dos Direitos Políticos, que foram se afirmando nas
democracias - liberais, estão também consagrados
os Direitos Sociais, nas Constituições Modernas.
Boris Mirkine-Guetzevitch confirma o que viemos de
afirmar quando escreve: "É em matéria de Direitos
do homem que essas Constituições de após 1918
são particularmente inovadoras. Sua principal
contribuição é o alargamento do catálogo clássico:
novos direitos sociais são reconhecidos, aparecem
novas obrigações positivas do Estado. (...) Os
textos que daí decorrem, começam a ocupar-se
menos do homem abstrato do que do cidadão
social" (59).
Mirkine-Guetzevitch,
estudando
a
evolução
constitucional européia, escreve que a Constituição
de Weimar (Alemanha) será a primeira
cronologicamente que reservará um grande lugar
aos direitos sociais abrindo a série das novas
Declarações dos Direitos (60).
A Constituição de Weimar será a primeira
constituição social européia, sendo considerada a
matriz do novo constitucionalismo social. Entretanto
esta não será a primeira do mundo. A Constituição
do México de 1917, precede a de Weimar,
marcando o início do Estado Social, preocupado
com os problemas sociais. Esta Constituição é
produto da Revolução Mexicana iniciada em 1.910
(61).
4 - A crise do nascente Estado Social, os
Estados totalitários e a internacionalização dos
Direitos Humanos.
A Constituição de Weimer de 1.919 marca o início
do Estado Social Alemão, servindo de modelo para
diversos outros Estados europeus. Será a Primeira
Guerra Mundial reflexo de todas as tensões sociais
internas causadas pela incontrolável miséria em
vários países europeus, sendo decisiva "para a
Revolução Russa em 1.917 e quase um ano
depois, para o movimento popular de marinheiros,
soldados e operários que proclamou a república na
Alemanha" (62).
Percebe-se neste momento que o Estado deveria
deixar aquela sua conduta abstencionista e passar
a garantir os Direitos Sociais mínimos da
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população. Para que realmente os Direitos
Individuais pudessem ser usufruídos por toda
população, deveriam ser garantidos os meios para
que isto fosse possível. Desta forma, se o
Liberalismo fala em liberdade de expressão e
consciência, deve toda população ter acesso ao
direito social à educação, para formar livremente
sua consciência política, filosófica e religiosa e ter
meios, ou capacidade de expressar esta
consciência.
Portanto, os Direitos Sociais aparecem como
mecanismo de realização dos Direitos Individuais
de toda população. Percebe-se desde o início que
embora os Direitos Individuais e Sociais sejam
grupos de direitos com características próprias, não
são estanques. Quando no pós 1ª Guerra se fala
em Direitos Fundamentais dos seres humanos,
agora não se fala somente em Direitos Individuais,
mas também em Direitos Sociais. Este novo
componente dos Direitos Fundamentais dos seres
humanos passa, a partir deste momento, a formar
um novo todo indivisível dos Direitos Humanos no
início do século. Note-se que a idéia do Estado
Social também contém outro Direito Fundamental
que vem se afirmando lentamente no século XIX:
os Direitos Políticos, entendidos principalmente
como direito do povo de participar no Poder do
Estado. É a democracia social.
Estes Direitos Sociais, portanto, com a Constituição
do México de 1.917 e de Weimar (Alemanha) de
1919, passam a ser considerados Direitos
Fundamentais dos seres humanos, passando a
integrar os novos textos constitucionais.
Nesta mesma época começa também a
internacionalização dos Direitos Humanos. É criada
a Sociedade das Nações e especificamente no
campo dos Direitos Sociais, a O.I.T. (Organização
Internacional do Trabalho). O Direito do Trabalho é
o Direito Social por excelência sendo que os
precursores da idéia de uma legislação
internacional "são dois industriais, o inglês Robert
Owen e o francês Daniel Le Grand, no começo do
século XIX" (63).
Explica Amauri Mascaro do Nascimento que "para o
direito do trabalho, o tratado de Versalhes (1919)
assumiu especial importância, pois dele surgiu o
projeto de organização internacional do trabalho. A
Parte XIII desse trabalho é considerada a
Constituição Jurídica da Organização Internacional
do Trabalho - O.I.T., e foi complementada pela
Declaração de Filadélfia (1944) e pelas reformas da
Reunião de Paris (1945) da O.I.T. (64). A atividade
normativa da O.I.T. consta das Convenções,
Recomendações e Resoluções que podem
depender ou não de ratificação dos Estados
Soberanos: As "Convenções Internacionais são
normas jurídicas emanadas da Conferência
Internacional da OIT, destinadas a constituir regras
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
gerais e obrigatórias para os Estados deliberantes
que as incluem no seu ordenamento interno,
observadas
as
respectivas
prescrições
constitucionais" (65).
Durante a primeira guerra também, percebem os
homens de Estado a necessidade de se criar um
mecanismo encarregado de fazer valer um certo
ideal de relações internacionais que conforme
Stanley Hoffmann pode-se chamar de um ideal de
submissão dos Estados a grandes princípios
jurídicos definidos na Carta da Sociedade das
Nações (66).
A Sociedade das Nações é criada em Versalhes
sob a influência do Presidente Norte-Americano
Wilson trazendo uma esperança de paz universal.
Logo após, outros textos se sucedem: a
conferência de Washington sobre desarmamento
em 1921 e o Pacto Briand - Kellog de 1928
condenando a guerra são exemplos destas etapas
em direção à paz que entretanto, muito brevemente
se transformará em grande decepção. Embora haja
uma certa unificação do progresso social graças à
criação do OIT, muitos governantes europeus
hesitam entre uma política social e uma atitude
conservadora que facilite os empreendimentos
capitalistas (67).
A grande crise econômica de 1928-1929,
especialmente brutal nos Estados Unidos,
conseqüência direta da relação entre a produção e
a repartição mostra a fragilidade do mundo liberal
(68), introduzindo a questão do direito econômico
como outro elemento essencial dos Direitos
Humanos.
Essa crise faz aumentar a influência da idéia
fascista do Estado Totalitário já introduzido na Itália
da década de 20 e nascente na Alemanha e outros
Estados na década de 30. O Estado Social mal
nascera já cede lugar a um outro modelo de
Estado: opressor e violento, onde os Direitos
Individuais, Sociais e Políticos são ignorados.
Leandro Konder em estudo sobre o fascismo
escreve: "O fascismo italiano de Mussolini extraiu
de Sorel muitos aspectos de sua concepção de
violência, muito do seu entusiasmo pelos "remédios
heróicos", extraiu de Nietzche sua ética
aristocrática, seu culto do "super homem". O
fascismo alemão de Hitler também aproveitou algo
de Nietzche e se apoiou decisivamente nas idéias
racistas de Eugen Dühring (aquele professor cego
de Berlim contra quem Friedrich Engels polemizou),
de Paul Botiches e sobretudo de Houston Steuart
Chamberlain. Na França, o fascismo de Charles
Maurras e Leon Daudet foi precedido pelo racismo
de Arthur de Lobineau (o amigo do imperador D.
Pedro II) de Vacher de Lapouze e de Gustave Le
Bon, além de ter encontrado importantes pontos de
apoio nos escritos de Joseph de Maistre, de René
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de La Tour du Pin e de Maurice Barrès. De maneira
geral, todo pensamento de direita que, ao longo do
século XIX, se empenhou na "demonização" da
esquerda, desempenhou um papel significativo na
preparação das condições em que o fascismo
pôde, mais tarde, irromper" (69).
A falta de coordenação entre países chaves da
Sociedade das Nações põe em cheque aquela
organização. De outro lado, o desemprego
generalizado na Alemanha (cerca de 5 milhões e
meio de desempregados em 1933) explica o
sucesso crescente do Partido Nacional Socialista
de Hitler que se torna o único representante do
Poder Alemão em 1934 (70).
Pouco tempo depois o mundo se encontrava no
mais violento conflito armado levando à morte
milhões de pessoas. Marca a segunda guerra
mundial o sacrifício da população soviética, país
chave na vitória aliada, a perseguição violenta e
genocida dos judeus em toda a Europa, e o crime
inesquecível das bombas nucleares norteamericanas sobre Hiroshima e Nagasaki no Japão,
cujos efeitos seguiram-se à explosão, matando
lentamente aqueles que foram expostos a radiação
da bomba A.
Após a 2ª Guerra Mundial sente-se a necessidade
de criar mecanismos eficazes que protejam os
Direitos Fundamentais do homem nos diversos
Estados. Já não se podia mais admitir o Estado nos
moldes liberais clássicos de não intervenção. O
Estado está definitivamente consagrado como
administrador da sociedade e convém, então,
aproveitar
naquele
momento,
os
laços
internacionais criados no pós-guerra para que se
estabeleça um núcleo fundamental de Direitos
Internacionais do homem (71).
É desta forma que se fará a Declaração Universal
de Direitos Humanos de 1948, a Declaração
Americana dos Direitos e Deveres do Homem
(Bogotá, 1948), a Convenção Americana dos
Direitos do Homem, assinada em 22 de novembro
de 1.969, em São José da Costa Rica, entre outras
declarações, convenções e pactos, além de
organizações não estatais, sendo que entre estas
organizações, atuam hoje com maior destaque, a
Anistia Internacional, a Comissão Internacional dos
Juristas, o Instituto Interamericano de Direitos
Humanos, este último, com sede na Costa Rica,
tendo como finalidade a divulgação de idéias e a
educação em Direitos Humanos.
Entretanto, o mundo pós Segunda Guerra, após um
curto período de calma encontra a novidade da
divisão do mundo em duas áreas de influência: uma
norte americana e a outra soviética. Assiste-se
neste período à violência norte americana contra o
Vietnã, Cuba, Granada, Nicarágua e quase todos
os países latino-americanos que receberam
12
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
regimes autoritários impostos e financiados pelos
Estados Unidos. A tortura, as perseguições e
assassinatos praticados pelo Estado e por grupos
para-militares é comum no Chile, na Argentina,
Uruguai, Brasil, Honduras e El Salvador.
]Do outro lado, o exército soviético impõe, à força, a
política soviética na Hungria, Tchecoslováquia,
Afeganistão.
O processo de libertação das colônias africanas é
doloroso e cruel, sendo que aqueles mesmos
países que se comprometeram a respeitar os
Direitos Humanos de 1948 violam de forma
agressiva estes direitos. É o caso da França na
Argélia. As colônias portuguesas após uma longa
guerra de libertação, recebem seu país arrasado,
sendo que o difícil processo de reconstrução é
impedido por movimentos guerrilheiros em
Moçambique e Angola, financiados pelo Governo
Sul-Africano e Norte-Americano.
A ordem econômica mundial que favorece os
países do norte é responsável pela morte de
crianças diariamente em todo o chamado terceiro
mundo, por fome e pela violência gerada pela
injustiça social.
Esta realidade é o desafio para os teóricos dos
Direitos Humanos, responsáveis pela divulgação da
idéia, pela formação de consciências, único meio
eficaz de se realizarem os Direitos Humanos.
(01) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, Fondo de
Cultura Económica, México, 1942, p. 128; Maillet. J. Institutions
Politiques et Sociales de L'Antiquité. 2ª ed., Dalloz, Paris, 1971,
p. 53; Prélot, Marcel. Historie des Idées Politiques, Dalloz, Paris,
p. 15.
(03) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p.
127; Friedrich, Carl Joachim. La Filosofía del Derecho. Fondo de
Cultura Económica, México, 1969, pp. 27 e ss; Machado Neto.
A. L. Para uma Sociologia do Direito Natural. Livraria Progresso,
Salvador, 1.957.
(04) LITRENTO, Oliveiros Lessa. Curso de Filosofia de Direito,
Rio de Janeiro, Ed. Rio, 1.980, p. 31.
(05) LITRENTO, Oliveiros Lessa. Curso de Filosofia do Direito,
ob. cit., p. 41.
(06) SICHES, Recaséns. Tratado General de Filosofia del
Derecho, 6ª edição, Editorial Porruá, S.A., México, 1978, p. 428.
(07) SICHES, Recaséns. Tratado General de Filosofia des
Derecho, ob. cit., p. 428.
(08) FRIEDRICH, Carl Joachim. Perspectiva Histórica de
Filosofia do Direito, p. 31.
(09) FRIEDRICH, Carl Joachim. Perspectiva Histórica da
Filosofia do Direito, p. 31.
(10) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., pp.
131/132.
(11) FRIEDRICH, Carl J. Perspectiva Histórica da Filosofia do
Direito, ob. cit., p. 44.
(12) MATA-MACHADO, Edgar de Godói da. Elementos de
Teoria Geral do Direito, 3ª edição, Editora UFMG/PROED, Belo
Horizonte, 1.986, pp. 62 e 63.
(13) FRIEDRICH, Carl Joachim. Perspectiva Histórica da
Filosofia do Direito, ob. cit., p. 44.
(14) MATA-MACHADO, Edgar de Godói da. Elementos de
Teoria Geral do Direito, ob. cit., p. 63.
(15) MATA-MACHADO, Edgar de Godói da. Elementos de
Teoria Geral do Direito, ob. cit., p. 64.
Neste curso os melhores alunos estão sendo preparados pelos melhores Professores
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(16) História da Vida Privada. São Paulo, Companhia de Letras,
1.990, coleção dirigida por Philipe Ariés e Geoges Duby, vol. I.
pp. 23-24.
(17) BLOCH, Léon. Lutas Sociais na Roma Antiga, 2ª edição,
Publicações Europa-América, Portugual, 1.974, pp. 89 e 90.
(18) MATA-MACHADO, Edgar de Godói da. Elementos de
Teoria Geral do Direito, ob. cit.
(19) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p. p.
143-144.
(20) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p.
144.
(21) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p. p.
144-145.
(22) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p.
145.
(23) DODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p.
145.
(24) FRIEDRICH, Carl Joachim. Perspectiva Histórica da
Filosofia do Direito, ob. cit., p. 59.
(25) MATA-MACHADO, Edgar de Godói da. Elementos de
Teoria Geral do Direito, ob. cit., p. 65.
(26) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p. p.
146-147.
(27) NOVINSKY, Anita. A Inquisição, 2ª edição, Ed. Brasiliense,
São Paulo, 1.983, p. 19.
(28) SALGADO, Joaquim Carlos. "Os Direitos Fundamentais e a
Constituinte in "Constituinte e Constituição", Conselho de
Extensão, UFMG, Belo Horizonte, 1.986.
(29) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p. p.
152-153.
(30) STRAUSS, Leo. Droit Naturel et Histoire. Librairie Plon,
Paris, Traduit de l'anglais pour Monique Nathan et Eric
Dampière, 1.954, p. 180.
(31) STRAUSS, Leo. Droit Naturel et Histoire, ob. cit., p. 185.
(32) MATA-MACHADO, Edgar de Godói da. Elementos de
Teoria Geral do Direito, ob. cit., p. 77.
(33) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., p. p.
146-147.
(34) BODENHEIMER, Edgar. Teoría del Derecho, ob. cit., pp.
152-153.
(35) STRAUSS, Leo. Droit Naturel et Histoire, p. 180.
(36) STRAUSS, Leo. Droit Naturel et Histoire, ob. cit., p. 185.
(37) STRAUSS, Leo. Droit Naturel et Histoire, ob. cit., p. 263.
(38) STRAUSS, Leo. Droit Naturel et Histoire, ob. cit., p. 263.
(39) STRAUSS, Leo. Droit Naturel et Histoire, ob. cit., p. 264.
(40) STRAUSS, Leo. Droit Naturel et Histoire__, Ob. cit., p. 265.
(41) ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social e Outros
Escritos. Editora cultrix, São Paulo, 1987, tradução do Rolando
Roque da Silva, pp. 210-211.
(42) ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social e Outros
Escritos, ob. cit., p. 211.
(43) SALGADO, Joaquim Carlos, "Os Direitos Fundamentais e a
Constituinte", ob. cit., p. 13.
(44) MACHADO HORTA, Raul. "Constituição e Direitos
Individuais", Separata da Revista de Informação Legislativa. a.
20 n.- 79, Julho/Set., 1.983, p. 147-148.
(45) FERREIRA, Luis Pinto. Princípios Gerais de Direito
Constitucional Moderno, 6ª edição ampl. e atualizada. São
Paulo, Saraiva, 1983, p. 57.
(46) A. ESMEIN. Elements de Droit Constitutionnel Français et
Comparé, 6ª ed. Recueil Sirey, Paris, 1914, p. 577-578.
(47) A. ESMEIN. Elements de Droit Constitutionnel Français et
Comparé, ob. cit., p. 565.
(48) A. ESMEIN. Elements de Droit Constitutionnel Français et
Comparé, ob. cit., p. 559.
(49) RUSSOMANO, Rosah. Curso de Direito Constitucional. 3ª
ed. rev. ampl., Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1978, p. 214.
(50) BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 4ª
edição, Forense, Rio de Janeiro, 1980, p. 7.
(51) NICZ, Alvacir Alfredo. A Liberdade de Iniciativa na
Constituição, Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1.981, p. 2.
(52) NICZ, Alvacir Alfredo. A Liberdade de Iniciativa na
Constituição, ob. cit., p. 11.
(53) DUVERGER, Maurice. Instituciones Politicas y Derecho
Constitucional, 5ª edição espanhola, Ariel, Barcelona, 1.970, p.
90.
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
(54) HAURIOU, André. Droit Constitutionnel et Institutions
Politiques, 4ª edição, Editions Montchrestien, Paris, 1970, pp.
180, 181
(55) GRUPPI, Luciano. Tudo começou com Maquiavel. 3ª
edição, LePM editores, Porto Alegre, 1980, pp. 22 e 23.
(56) MALUF, Sahid. Direito Constitucional, 15ª edição rev. ampl.,
Sugest•es Literárias, São Paulo, 1.983, p. 495.
(57) BARACHO, José Alfredo de Oliveira. "Teoria Geral do
Constitucionalismo", Separata da revista de informação
Legislativa (a. 23, n. 91 Jul/Set. 1986), p. 46.
(58) BARACHO, José Alfredo de Oliveira. "Teoria Geral do
Constitucionalismo", ob. cit., p. 46.
(59) MIRKINE-GUETZEVITCH, Boris. Evolução Constitucional
Européia. Tradução de Marina Godoy Bezerra, José Konfine
editor, Rio de Janeiro, 1957, p. 169.
(60) MIRKINE-GUETZEVITCH, Boris. Evolução Constitucional
Européia, ob. cit., p. 171.
(61) CORREA, Ana Maria Martinez. A Revolução Mexicana
(1910-1917) Editora Brasiliense, São Paulo, 1983, p. 104.
(62) REIS FILHO, Daniel Aarão. A Revolução Alemã - mitos e
versões, Ed. Brasiliense, São Paulo, 1.984, p. 11.
(63) NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do
Trabalho, 7ª edição, Editora Saraiva, São Paulo, 1989, p. 59.
(64) NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do
Trabalho, ob. cit., p. 60.
(65) NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do
Trabalho, ob. cit., p. 63.
(66) HOFFMANN, Stanley. Organisations Internationales et
Pouvoirs Politiques des Etats. Librairie Armand Colin, Paris,
1954, p. 119.
(67) TRORAVAL, Jean. Les Grandes Etapes de la Civilization
Française. Bordas, Paris, 1978, p. 404-405.
(68) TRORAVAL, Jean. Les Grandes Etapes de la Civilization
Française, ob. cit., p. 405.
(69) KONDER, Leandro. Introdução ao Fascismo. 2ª edição,
Ediç•es Graal Ltda., Rio de Janeiro, 1.979, p. 28.
(70) THORAVAL, Jean. Les Grandes Etapes de la Civilisation
Français, ob. cit., p. 405.
(71) ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos
Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Livraria
Almedina, Coimbra, 1983, p. 14.
Comentários da Professora Daniela Paes Moreira
Samaniego
professora de Direito na Universidade de Cuiabá
(UNIC), mestranda em Direito pela UNIC/UNESP
HISTÓRICO DOS DIREITOS
BRASIL E NO MUNDO
HUMANOS
NO
Histórico dos Direitos Humanos no Mundo
Em sua obra "Curso de Direitos Humanos –
Gênese dos Direitos Humanos, Volume 1", João
Baptista Herkenhoff(VII) ensina que, utilizando-se a
expressão "Direitos Humanos" como quaisquer
direitos atribuídos ao homem, pode-se encontrar o
reconhecimento de tais direitos até mesmo na
Antiguidade. E cita, como exemplos, o Código de
Hamurábi, no século XVIII antes de Cristo, na
Babilônia; os pensamentos do imperador do Egito,
Amenófis IV, no século XIV a.C.; as idéias de
Platão, na Grécia, no século IV a.C.; o Direito
Romano, e várias outras civilizações e culturas
ancestrais.
No entanto, o próprio Herkenhoff salienta que, não
obstante já haver uma preocupação com tais
direitos, estes não possuíam uma "garantia legal",
Neste curso os melhores alunos estão sendo preparados pelos melhores Professores
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de forma que eram bastante precários em sua
estrutura política, já que o respeito à eles dependia
da sabedoria dos governantes. Apesar de tais fatos,
tal contribuição não deixou de ser relevante na
criação da idéia dos Direitos Humanos.
Solicitamos a devida vênia para concordar, em
parte, com o autor supra citado, quando este afirma
não estar de acordo com a posição de certos
doutrinadores em afirmar que a história dos Direitos
Humanos começou com "balizamento do poder do
Estado pela lei", por entender que essa posição
"obscurece o legado de povos que não conheceram
a técnica de limitação do poder mas privilegiaram
enormemente a pessoa humana nos seus
costumes e instituições sociais". (VIII)
De fato, a preocupação com a proteção à
integridade da pessoa humana remonta de muitos e
muitos séculos e faz parte da própria natureza
humana, que busca o reconhecimento de suas
necessidades em prol de uma sociedade que
garanta uma distribuição igualitária e justa. Não se
pode vincular algo que faz parte da natureza
humana com as determinações da lei, que muitas
vezes nada têm a ver com justiça e muito menos
com as limitações do poder estatal por esta, uma
vez que a preocupação humana com relação à
proteção de suas necessidades básicas, existe até
mesmo antes de tais limitações legais.
Além do mais, como bem enfatiza Herkenhoff, "a
simples técnica de estabelecer em constituições e
leis, a limitação do poder, embora importante, não
assegura, por si só o respeito aos Direitos
Humanos. Assistimos em épocas passadas e
estamos assistindo, nos dias de hoje, ao
desrespeito dos Direitos Humanos em países onde
eles são legal e constitucionalmente garantidos.
Mesmo em países de longa estabilidade política e
tradição jurídica, os Direitos Humanos são, em
diversas situações concretas, rasgados e
vilipendiados." (IX)
No entanto, em recente trabalho, que nos foi
solicitado no curso de Mestrado em Direito, de
nome "A Homossexualidade Brasileira em face de
Declaração Universal dos Direitos Humanos",
tivemos a oportunidade de afirmar que os primeiros
marcos da "internacionalização dos Direitos
Humanos" foram constituídos pelos Direitos
Humanitários que são os aplicados nas hipóteses
de guerra, tendo como escopo impor limites à
atuação do Estado e assegurar, dessa forma, a
observância dos direitos fundamentais, de modo a
proteger, nesses casos, os militares postos fora de
combate e as populações civis, regulando
juridicamente o emprego da violência no âmbito
internacional e limitando, com isso, a liberdade e a
autonomia dos Estados.
14
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
Vejam, que não estamos a falar que a história dos
Direitos Humanos iniciou-se com a limitação pela
lei, da autonomia estatal. O que afirmamos, ora, é
que
um
dos
primeiros
marcos
da
internacionalização
dos
Direitos
Humanos
constituiu-se nas limitações dos poderes do Estado,
de forma a assegurar o respeito aos direitos
fundamentais da pessoa humana.
Além do Direito Humanitário, outro importante
marco foi a Liga das Nações, criada após a primeira
guerra mundial com o intuito de promover a
cooperação, a paz e a segurança internacional, de
forma a condenar as agressões externas contra a
integridade territorial e a independência política de
seus membros. Através de uma convenção da Liga
das Nações, os Estados tinham o compromisso de
assegurar condições justas e dignas de trabalho
para homens, mulheres e crianças, sendo
estabelecidas sanções econômicas e militares
contra Estados que, porventura, viessem a violar
seus preceitos. Seu principal objetivo era "promover
a cooperação internacional e alcançar a paz e a
segurança internacionais."
Junto com tais organizações, estava, também, a
OIT (Organização Internacional do Trabalho), que
deixou importantes contribuições para o chamado
processo de internacionalização dos Direitos
Humanos. A OIT foi criada após a Primeira Guerra
Mundial, para promover parâmetros básicos de
trabalho e bem-estar social. Um de seus objetivos
foi o de regular a condição dos trabalhadores no
âmbito mundial.
Todos esses institutos forneceram a sua parcela de
contribuição para o processo de internacionalização
dos Direitos Humanos e se assemelham, na
medida em que projetam o tema dos Direitos
Humanos na ordem internacional, uma vez que
estão todos voltados, exclusivamente, para a
guarda e proteção dos direitos do ser humano, de
forma que o Estado deixou de ser o único sujeito de
direitos internacional, não se podendo, atualmente,
negar a personalidade internacional do indivíduo.
Entretanto, foi em meados do século XX, em
decorrência da Segunda Guerra Mundial e com o
intuito de proteger os seres humanos das
atrocidades do Holocausto e das barbaridades
cometidas pelos nazistas contra os judeus, na
Alemanha, que surgiram as mais profundas
preocupações no que pertine à proteção
internacional dos Direitos Humanos. Preocupações,
estas, que consistiam em afirmar que a soberania
estatal encontra-se limitada pelo respeito aos
Direitos Humanos, não sendo, portanto, totalmente
absoluta. E foi justamente essa preocupação, que
acabou
por
impulsionar
o
processo
de
internacionalização
dos
Direitos
Humanos,
culminando com a criação de normas de proteção
internacional que possibilitaram a responsabilização
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do Estado no domínio internacional, quando as
instituições nacionais se mostrarem falhas ou
omissas na tarefa de proteção dos Direitos
Humanos.
Podemos afirmar, portanto, que foi a Carta das
Nações Unidas de 1945 que internacionalizou os
Direitos Humanos. No entanto, apesar de conter,
em seu bojo, normas que determinavam a
importância de se defender, promover e respeitar
os direitos humanos e as liberdades fundamentais,
ela não definiu o conteúdo dessas expressões, que
só vieram a ser definidas, com precisão com o
advento da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, em 1948.
A História dos Direitos Humanos no Brasil
A história dos Direitos Humanos no Brasil está
vinculada, de forma direta com a história das
constituições brasileiras. Portanto, para falarmos a
respeito de tal assunto, abordaremos, brevemente,
a história das várias Constituições no Brasil e a
importância que as mesmas deram aos Direitos
Humanos.
A primeira Constituição Brasileira já surgiu
provocando o repúdio de inúmeras pessoas,
falamos da Constituição Imperial de 1824, que foi
outorgada após a dissolução da Constituinte, razão
da rejeição em massa que acarretou protestos em
vários Estados brasileiros, como em Pernambuco,
Bahia, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte.
Essas reivindicações de liberdade, culminaram com
a consagração dos Direitos Humanos, pela
Constituição Imperial, que apesar de autoritária (por
concentrar uma grande soma de poderes nas mãos
do
imperador),
revelou-se
liberal
no
reconhecimento de direitos.
De acordo com a Constituição Imperial Brasileira de
1824, a inviolabilidade dos direitos civis e políticos
baseavam-se na liberdade, na segurança individual
e, como não poderia deixar de ser, na propriedade
(valor, de certa forma, questionável).
Em 24 de fevereiro de 1891, surgiu a primeira
Constituição Republicana que tinha como objetivo,
como ensina Herkenhoff, "corporificar juridicamente
o regime republicano instituído com a Revolução
que derrubou a coroa." (X)
Foi essa Constituição que instituiu o sufrágio direto
para a eleição dos deputados, senadores,
presidente e vice-presidente da República, no
entanto, determinava, também, que os mendigos,
os analfabetos, os religiosos, não poderiam exercer
tais direitos políticos. Além disso, ela aboliu a
exigência de renda como critério de exercício dos
direitos políticos.
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
O sufrágio direto estabelecido por esta Constituição
no entanto, não modificou as regras de distribuição
do poder, já que a prioridade da força econômica
nas mãos dos fazendeiros e o estabelecimento do
voto, a descoberto, contribuíram para que estes,
pudessem
manipular
os
mais
fracos
economicamente, de acordo com seus interesses
políticos.
Apesar disso, podemos afirmar que a primeira
Constituição republicana ampliou os Direitos
Humanos, além de manter os direitos já
consagrados pela Constituição Imperial.
Em 1926, com a reforma constitucional, procurouse em primeiro lugar, remediar os abusos
praticados pela União em razão das intervenções
federais nos Estados, no entanto, não atendeu, de
forma plena, a exigência daqueles que entendiam
que a Constituição de 1891 não se mostrava
adequada à real instauração de um regime
republicano no Brasil.
A Revolução de 1930 provocou um total
desrespeito aos Direitos Humanos, que foram
praticamente esquecidos. O Congresso Nacional e
as Câmaras Municipais foram dissolvidos, a
magistratura perdeu suas garantias, suspenderamse as franquias constitucionais e o habeas corpus
ficou restrito à réus ou acusados em processos de
crimes comuns. Não foram poucos os que se
rebelaram contra essa "prepotência", culminando
com a Revolução constitucionalista de 1932, que
acarretou na nomeação, pelo governo provisório,
de uma comissão para elaborar um projeto de
Constituição, comissão esta que, por reunir-se no
Palácio do Itamaraty, recebeu o nome de "a
comissão do Itamaraty". A participação popular, no
entanto, ficou por demais reduzida em razão da
censura à imprensa. Entretanto, apesar desta
censura, a Constituição de 1934 estabeleceu
algumas franquias liberais, como por exemplo:
determinou que a lei não poderia prejudicar o direito
adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
vedou a pena de caráter perpétuo; proibiu a prisão
por dívidas, multas ou custas; criou a assistência
judiciária para os necessitados (assistência esta,
que ainda hoje, não é observada por grande parte
dos Estados brasileiros); instituiu a obrigatoriedade
de comunicação imediata de qualquer prisão ou
detenção ao juiz competente para que a relaxasse,
se ilegal, promovendo a responsabilidade da
autoridade coatora, além de várias outras franquias
estabelecidas.
Além dessas garantias individuais, a Constituição
de 1934 inovou ao estatuir normas de proteção
social ao trabalhador, proibindo a diferença de
salário para um mesmo trabalho, em razão de
idade, sexo, nacionalidade ou estado civil; proibindo
o trabalho para menores de 14 anos de idade, o
trabalho noturno para os menores de 16 anos e o
trabalho insalubre para menores de 18 anos e para
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mulheres; determinando a estipulação de um
salário mínimo capaz de satisfazer às necessidades
normais do trabalhador, o repouso semanal
remunerado e a limitação de trabalho a oito horas
diárias que só poderão ser prorrogadas nos casos
legalmente previstos, além de inúmeras outras
garantias sociais do trabalhador.
A Constituição de 1934 não esqueceu-se também
dos direitos culturais. Tratava-se de uma
constituição que tinha como objetivo primordial, o
bem estar geral. Ao instituir a Justiça Eleitoral e o
voto secreto, essa constituição abriu os horizontes
do constitucionalismo brasileiro, como bem ensina
Herkenhoff (Curso de Direitos Humanos, pg. 77),
para os direitos econômicos, sociais e culturais. Ela
respeitou os Direitos Humanos e vigorou durante
mais de 3 anos, até a introdução do chamado
"Estado Novo", em 10 de Novembro de 1937, que
introduziu o autoritarismo no Brasil.
Foi no "Estado Novo" que foram criados os tão
polêmicos Tribunais de exceção, que tinham a
competência para julgar os crimes contra a
segurança do Estado. Nesta época, foi declarado
estado de emergência no país, ficaram suspensas
quase todas as liberdades a que o ser humano tem
direito, dentre elas, a liberdade de ir e vir, o sigilo
de correspondência (uma vez que as mesmas eram
violadas e censuradas) e de todos os outros meios
de comunicação, sejam orais ou escritos, a
liberdade de reunião e etc.
Os Direitos Humanos praticamente não existiram
durante os, quase, oito anos em que vigorou o
"Estado Novo".
Com a Constituição de 1946, o país foi como diz
Herkenhoff(XI), "redemocratizado", já que essa
constituição restaurou os direitos e garantias
individuais, sendo estes, até mesmo ampliados, do
mesmo modo que os direitos sociais. De acordo
com estes, foi proibido o trabalho noturno a
menores de 18 anos, estabeleceu-se o direito de
greve, foi estipulado o salário mínimo capaz de
atender as necessidades do trabalhador e de sua
família, dentre outros demais direitos previstos.
Os direitos culturais também foram ampliados e
essa Constituição vigorou até o surgimento da
Constituição de 1967, no entanto sofreu várias
emendas e teve a vigência de inúmeros artigos
suspensa por muitas vezes por força dos Atos
Institucionais de 9 de Abril de 1964 (AI-1) e de 27
de outubro de 1965 (AI-2), no golpe,
autodenominado "Revolução de 31 de março de
1964". Apesar de tudo isso, podemos afirmar que,
durante os quase 18 anos de duração, a
Constituição de 1946 garantiu os Direitos Humanos.
Direitos Humanos
tornando
restrito
o
direito
de
reunião,
estabelecendo foro militar para os civis, mantendo
todas as punições e arbitrariedades decretadas
pelos Atos Institucionais. Hipocritamente, a
Constituição de 1967 determinava o respeito à
integridade física e moral do detento e do
presidiário, no entanto na prática, tal preceito não
existia.
No que pertine aos demais direitos, os retrocessos
continuaram: reduziu a idade mínima de permissão
para o trabalho, para 12 anos; restringiu o direito de
greve; acabou com a proibição de diferença de
salários, por motivos de idade e de nacionalidade;
restringiu a liberdade de opinião e de expressão;
recuou no campo dos chamados direitos sociais,
etc.
Essa Constituição vigorou, formalmente, até 17 de
outubro de 1969, com a nova Constituição, porém,
na prática, a constituição de 67 vigorou apenas até
13 de dezembro de 1968, quando foi baixado o
mais terrível Ato Institucional, o que mais
desrespeitou os Direitos Humanos no País,
provocando a revolta e o medo de toda a
população, acarretando a ruína da Constituição de
1967, o AI-5.
O AI-5 trouxe de volta todos os poderes
discricionários do Presidente, estabelecidos pelo
AI-2, além de ampliar tais arbitrariedades, dando ao
governo a prerrogativa de confiscar bens,
suspendendo, inclusive, o habeas corpus nos casos
de crimes políticos contra a segurança nacional, a
ordem econômica e social e a economia popular.
Foi um longo período de arbitrariedades e
corrupções. A tortura e os assassinatos políticos
foram praticados de forma bárbara, com a garantia
do silêncio da imprensa, que encontrava-se
praticamente amordaçada e as determinações e
"proteções legais" do AI-5. Tanto foi assim, que a
Constituição de 1969 somente começou a vigorar,
com a queda do AI-5, em 1978. A constituição de
1969, retroagiu, ainda mais, já que teve
incorporadas ao seu texto legal, as medidas
autoritárias dos Atos Institucionais. Não foram
respeitados os Direitos Humanos.
A anistia conquistada em 1979, não aconteceu da
forma que era esperada, já que anistiou, em nome
do regime, até mesmo os criminosos e torturadores.
No entanto, representou uma grande conquista do
povo.
Para João Baptista Herkenhoff (obra citada, pg. 88)
e inúmeros brasileiros, a luta pela anistia
representou "uma das páginas de maior grandeza
moral escrita na História contemporânea do Brasil",
juntamente com a convocação e o funcionamento
da Constituinte.
A Constituição de 1967, porém, trouxe inúmeros
retrocessos, suprimindo a liberdade de publicação,
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A Constituição de 1988 veio para proteger, talvez
tardiamente, os direitos do homem. Tardiamente,
porque isso poderia ter se efetivado na Constituição
de 1946, que foi uma bela Constituição, mas que,
logo em seguida foi derrubada, com a ditadura. É
por isso que Ulisses Guimarães afirmava que a
Constituição de 1988 era uma "Constituição
cidadã", porque ela mostrou que o homem tem uma
dignidade, dignidade esta que precisa ser
resgatada e que se expressa, politicamente, como
cidadania.
O problema da dignidade da pessoa humana, vem
tratado na Constituição de 1988, já no preâmbulo,
quando este fala da inviolabilidade à liberdade e,
depois, no artigo primeiro, com os fundamentos e,
ainda, no inciso terceiro (a dignidade da pessoa
humana), mais adiante, no artigo quinto, quando
fala da inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à segurança e à igualdade.
Mas o que significa esta dignidade? Significa que o
homem não pode ser tratado como um animal
qualquer, pois ele tem a sua individualidade. Tem
uma essência, que é própria dele. Cada indivíduo é
totalmente diferente de outro e o que nos identifica
é essa essência de ser pessoa.
A única coisa capaz de garantir a dignidade da
pessoa humana, é a justiça! A dignidade é um valor
supremo. O homem é digno, pelo simples fato de
ser racional, o que o diferencia dos outros animais.
A dignidade é, portanto, um valor fundamental!
Flávia Piovesan(XII) ensina que "a ordem
constitucional de 1988 apresenta um duplo valor
simbólico: é ela o marco jurídico da transição
democrática, bem como da institucionalização dos
direitos humanos no país. A Carta de 1988
representa a ruptura jurídica com o regime militar
autoritário que perpetuou no Brasil de 1964 a
1985".
Com a Constituição de 1988, houve uma espécie
de "redefinição do Estado brasileiro", bem como de
seus direitos fundamentais.
Ao ler os dispositivos constitucionais, podemos
deduzir o quanto foi acentuada a preocupação do
legislador, em garantir a dignidade, o respeito e o
bem-estar da pessoa humana, de modo a se
alcançar a paz e a justiça social.
4. Princípios Básicos para utilização da força e
armas de fogo, adotado pela ONU em
07/07/1990.
O Oitavo Congresso das Nações Unidas para a
Prevenção do Crime e o Tratamento dos
Delinqüentes,
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
Recordando o Plano de Ação de Milão 130 adotado
por consenso pelo Sétimo Congresso das Nações
Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento
dos Delinqüentes e aprovado pela Assembléia
Geral na sua Resolução 40/32 de 29 de Novembro
de 1985,
Recordando também a Resolução 14 do Sétimo
Congresso 131 na qual o Congresso solicitou ao
Comitê para a Prevenção do Crime e a Luta contra
a Delinqüência que considerasse medidas
adequadas para favorecerem a aplicação efetiva do
Código de Conduta para os Funcionários
Responsáveis pela Aplicação da Lei,
Tomando nota com satisfação dos trabalhos
realizados em aplicação da Resolução 14 do
Sétimo Congresso131 pelo Comitê, pela Reunião
Preparatória Inter-regional do Oitavo Congresso
das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o
Tratamento dos Delinqüentes consagrada às
"Normas e Princípios Orientadores da Organização
das Nações Unidas no domínio da prevenção do
crime e da justiça penal e aplicação e prioridades
tendo em vista a definição de novas normas" 132 e
pelas reuniões preparatórias regionais do Oitavo
Congresso,
1. Adota os Princípios Básicos sobre a Utilização da
Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários
Responsáveis pela Aplicação da Lei, que figuram
no anexo à presente resolução;
2. Recomenda os Princípios Básicos para ação e
aplicação a nível nacional, regional e inter-regional,
tendo em conta a situação e as tradições políticas,
econômicas, sociais e culturais de cada país;
3. Convida os Estados membros a tomarem em
consideração e a respeitarem os Princípios Básicos
no quadro das respectivas legislação e prática
nacionais;
4. Convida igualmente os Estados membros a
submeterem os Princípios Básicos à atenção dos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei e de
outros membros do poder executivo, de
magistrados, advogados, órgãos legislativos e do
público em geral;
5. Convida ainda os Estados membros a
informarem o Secretário-Geral, de cinco em cinco
anos a partir de 1992, dos progressos realizados na
aplicação dos Princípios Básicos, incluindo a sua
difusão, incorporação na legislação, práticas,
procedimentos e políticas internas, problemas
encontrados na sua aplicação a nível nacional e
assistência que poderia ser necessária da parte da
comunidade internacional e solicita ao SecretárioGeral que elabore um relatório sobre o assunto
para o Nono Congresso das Nações Unidas para a
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Prevenção do
Delinqüentes;
Crime
e
o
Tratamento
dos
6. Apela aos Governos para que promovam a
organização, a nível nacional e regional, de
seminários e cursos de formação sobre a função de
aplicação da lei e sobre a necessidade de limitar a
utilização da força e de armas de fogo pelos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei;
7. Solicita insistentemente às comissões regionais,
aos institutos regionais e inter-regionais para a
prevenção do crime e a justiça penal, às instituições
especializadas e outros organismos do sistema das
Nações
Unidas,
às
outras
organizações
intergovernamentais
interessadas
e
às
organizações não governamentais dotadas de
estatuto consultivo junto do Conselho Econômico e
Social, que participem ativamente na aplicação dos
Princípios Básicos e informem o Secretário-Geral
dos esforços feitos para difundir e aplicar os
Princípios Básicos, bem como da medida em que
aqueles princípios são aplicados, e solicita ao
Secretário-Geral que inclua essa informação no seu
relatório para o Nono Congresso;
8. Convida o Comitê para a Prevenção do Crime e
a Luta contra a Delinqüência a examinar com
prioridade os meios de garantir a aplicação efetiva
da presente resolução;
9. Solicita ao Secretário-Geral que:
a) Tome as medidas adequadas para submeter a
presente resolução à atenção dos Governos e de
todos os organismos das Nações Unidas
interessados e para assegurar a mais ampla
difusão possível dos Princípios Básicos;
b) Inclua os Princípios Básicos na próxima edição
da publicação das Nações Unidas intitulada Direitos
do
Homem:
Compilação
de
Instrumentos
Internacionais;
c) Forneça aos Governos, que o solicitem, os
serviços de peritos e conselheiros regionais e interregionais para colaborarem na aplicação dos
Princípios Básicos e informe o Nono Congresso
sobre a assistência técnica e a formação
efetivamente prestadas;
d) Elabore um relatório para a décima segunda
sessão do Comitê, sobre as medidas tomadas para
aplicação dos Princípios Básicos;
10. Solicita ao Nono Congresso e às respectivas
reuniões preparatórias que apreciem os progressos
realizados na aplicação dos Princípios Básicos.
ANEXO
Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de
Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis
pela Aplicação da Lei
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Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
Considerando que o trabalho dos funcionários
responsáveis pela aplicação da lei 133 representa
um serviço social de grande importância e que,
consequentemente, há que manter e, se
necessário, aperfeiçoar, as suas condições de
trabalho e o seu estatuto,
Considerando que a ameaça à vida e à segurança
dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei
deve ser considerada como uma ameaça à
estabilidade da sociedade no seu todo,
Considerando que os funcionários responsáveis
pela aplicação da lei têm um papel essencial na
proteção do direito à vida, à liberdade e à
segurança da pessoa, tal como garantido pela
Declaração Universal dos Direitos do Homem 134 e
reafirmado no Pacto Internacional sobre os Direitos
Civis e Políticos 135,
Considerando que as Regras Mínimas para o
Tratamento de Reclusos prevêem as circunstâncias
em que os funcionários prisionais podem recorrer à
força no exercício das suas funções,
Considerando que o artigo 3.º do Código de
Conduta para os Funcionários Responsáveis pela
Aplicação da Lei 136 dispõe que esses funcionários
só podem utilizar a força quando for estritamente
necessário e somente na medida exigida para o
desempenho das suas funções,
Considerando que a reunião preparatória interregional do Sétimo Congresso das Nações Unidas
para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos
Delinqüentes, que teve lugar em Varenna (Itália),
acordou nos elementos que devem ser apreciados,
no decurso dos trabalhos ulteriores, com relação às
restrições à utilização da força e de armas de fogo
pelos funcionários responsáveis pela aplicação da
lei 137,
Considerando que o Sétimo Congresso, na sua
resolução 14 138 , sublinha, nomeadamente, que a
utilização da força e de armas de fogo pelos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
deve ser conciliada com o respeito devido pelos
Direitos do Homem,
Considerando que o Conselho Econômico e Social,
na secção IX da sua Resolução 1986/10, de 21 de
Maio de 1986, convidou os Estados membros a
concederem uma atenção particular, na aplicação
do Código, à utilização da força e de armas de fogo
pelos funcionários responsáveis pela aplicação da
lei e que a Assembléia Geral, na sua Resolução
41/149, de 4 de Dezembro de 1986, se congratula
com esta recomendação do Conselho,
Considerando que é conveniente atender, tendo em
devida conta as exigências de segurança pessoal,
ao papel dos funcionários responsáveis pela
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aplicação da lei na administração da justiça, na
proteção do direito à vida, à liberdade e à
segurança
das
pessoas,
bem
como
à
responsabilidade dos mesmos na manutenção da
segurança pública e da paz social e à importância
das suas qualificações, formação e conduta,
Os Governos devem ter em conta os Princípios
Básicos a seguir enunciados, que foram formulados
tendo em vista auxiliar os Estados membros a
garantirem e a promoverem o verdadeiro papel dos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei, a
observá-los no quadro das respectivas legislação e
prática nacionais e a submetê-los à atenção dos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei,
bem como de outras pessoas como os juízes, os
magistrados do Ministério Público, os advogados,
os representantes do poder executivo e do poder
legislativo e o público em geral.
Disposições gerais
1. Os Governos e os organismos de aplicação da
lei devem adotar e aplicar regras sobre a utilização
da força e de armas de fogo contra as pessoas, por
parte dos funcionários responsáveis pela aplicação
da lei. Ao elaborarem essas regras, os Governos e
os organismos de aplicação da lei devem manter
sob permanente avaliação as questões éticas
ligadas à utilização da força e de armas de fogo.
2. Os Governos e os organismos de aplicação da
lei devem desenvolver um leque de meios tão
amplo quanto possível e habilitar os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei com diversos
tipos de armas e de munições, que permitam uma
utilização diferenciada da força e das armas de
fogo. Para o efeito, devem ser desenvolvidas armas
neutralizadoras não letais, para uso nas situações
apropriadas, tendo em vista limitar de modo
crescente o recurso a meios que possam causar a
morte ou lesões corporais. Para o mesmo efeito,
deveria também ser possível dotar os funcionários
responsáveis
pela
aplicação
da
lei
de
equipamentos defensivos, tais como escudos,
viseiras, coletes antibalas e veículos blindados, a
fim de se reduzir a necessidade de utilização de
qualquer tipo de armas.
3. O desenvolvimento e utilização de armas
neutralizadoras não letais deveria ser objeto de
uma avaliação cuidadosa, a fim de reduzir ao
mínimo os riscos com relação a terceiros, e a
utilização dessas armas deveria ser submetida a
um controle estrito.
4. Os funcionários responsáveis pela aplicação da
lei, no exercício das suas funções, devem, na
medida do possível, recorrer a meios não violentos
antes de utilizarem a força ou armas de fogo. Só
poderão recorrer à força ou a armas de fogo se
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
outros meios se mostrarem ineficazes ou não
permitirem alcançar o resultado desejado.
5. Sempre que o uso legítimo da força ou de armas
de fogo seja indispensável, os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei devem:
a) Utilizá-las com moderação e a sua ação deve ser
proporcional à gravidade da infração e ao objetivo
legítimo a alcançar;
b) Esforçar-se por reduzirem ao mínimo os danos e
lesões e respeitarem e preservarem a vida humana;
c) Assegurar a prestação de assistência e socorros
médicos às pessoas feridas ou afetadas, tão
rapidamente quanto possível;
d) Assegurar a comunicação da ocorrência à família
ou pessoas próximas da pessoa ferida ou afetada,
tão rapidamente quanto possível.
6. Sempre que da utilização da força ou de armas
de fogo pelos funcionários responsáveis pela
aplicação da lei resultem lesões ou a morte, os
responsáveis farão um relatório da ocorrência aos
seus superiores, de acordo com o princípio 22.
7. Os Governos devem garantir que a utilização
arbitrária ou abusiva da força ou de armas de fogo
pelos funcionários responsáveis pela aplicação da
lei seja punida como infração penal, nos termos da
legislação nacional.
8. Nenhuma circunstância excepcional, tal como a
instabilidade política interna ou o estado de
emergência, pode ser invocada para justificar uma
derrogação dos presentes Princípios Básicos.
Disposições especiais
9. Os funcionários responsáveis pela aplicação da
lei não devem fazer uso de armas de fogo contra
pessoas, salvo em caso de legítima defesa, defesa
de terceiros contra perigo iminente de morte ou
lesão
grave,
para
prevenir
um
crime
particularmente grave que ameace vidas humanas,
para proceder à detenção de pessoa que
represente essa ameaça e que resista à autoridade,
ou impedir a sua fuga, e somente quando medidas
menos extremas se mostrem insuficientes para
alcançarem aqueles objetivos. Em qualquer caso,
só devem recorrer intencionalmente à utilização
letal de armas de fogo quando isso seja
estritamente indispensável para proteger vidas
humanas.
10. Nas circunstâncias referidas no princípio 9, os
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
devem identificar-se como tal e fazer uma
advertência clara da sua intenção de utilizarem
armas de fogo, deixando um prazo suficiente para
que o aviso possa ser respeitado, exceto se esse
modo de proceder colocar indevidamente em risco
a segurança daqueles responsáveis, implicar um
perigo de morte ou lesão grave para outras
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pessoas ou se se mostrar manifestamente
inadequado ou inútil, tendo em conta as
circunstâncias do caso.
11. As normas e regulamentações relativas à
utilização de armas de fogo pelos funcionários
responsáveis pela aplicação da lei devem incluir
diretrizes que:
a) Especifiquem as circunstâncias nas quais os
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
sejam autorizados a transportar armas de fogo e
prescrevam os tipos de armas de fogo e munições
autorizados;
b) Garantam que as armas de fogo sejam utilizadas
apenas nas circunstâncias adequadas e de modo a
reduzir ao mínimo o risco de danos inúteis;
c) Proíbam a utilização de armas de fogo e de
munições que provoquem lesões desnecessárias
ou representem um risco injustificado;
d) Regulamentem o controle, armazenamento e
distribuição de armas de fogo e prevejam
nomeadamente procedimentos de acordo com os
quais os funcionários responsáveis pela aplicação
da lei devam prestar contas de todas as armas e
munições que lhes sejam distribuídas;
e) Prevejam as advertências a efetuar, sendo caso
disso, se houver utilização de armas de fogo;
f) Prevejam um sistema de relatórios de ocorrência,
sempre que os funcionários responsáveis pela
aplicação da lei utilizem armas de fogo no exercício
das suas funções.
Manutenção da ordem em caso de reuniões
ilegais
12. Dado que a todos é garantido o direito de
participação em reuniões lícitas e pacíficas, de
acordo com os princípios enunciados na
Declaração Universal dos Direitos do Homem e no
Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e
Políticos, os Governos e os serviços e funcionários
responsáveis pela aplicação da lei devem
reconhecer que a força e as armas de fogo só
podem ser utilizadas de acordo com os princípios
13 e 14.
13. Os funcionários responsáveis pela aplicação da
lei devem esforçar-se por dispersar as reuniões
ilegais mas não violentas sem recurso à força e,
quando isso não for possível, limitar a utilização da
força ao estritamente necessário.
14. Os funcionários responsáveis pela aplicação da
lei só podem utilizar armas de fogo para
dispersarem reuniões violentas se não for possível
recorrer a meios menos perigosos, e somente nos
limites do estritamente necessário. Os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei não devem
utilizar armas de fogo nesses casos, salvo nas
condições estipuladas no princípio 9.
Manutenção da ordem entre pessoas detidas ou
presas
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Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
15. Os funcionários responsáveis pela aplicação da
lei não devem utilizar a força na relação com
pessoas detidas ou presas, exceto se isso for
indispensável para a manutenção da segurança e
da ordem nos estabelecimentos penitenciários, ou
quando a segurança das pessoas esteja
ameaçada.
16. Os funcionários responsáveis pela aplicação da
lei não devem utilizar armas de fogo na relação
com pessoas detidas ou presas, exceto em caso de
legítima defesa ou para defesa de terceiros contra
perigo iminente de morte ou lesão grave, ou
quando essa utilização for indispensável para
impedir a evasão de pessoa detida ou presa
representando o risco referido no princípio 9.
17. Os princípios precedentes entendem-se sem
prejuízo dos direitos, deveres e responsabilidades
dos
funcionários
dos
estabelecimentos
penitenciários, tal como são enunciados nas
Regras Mínimas para o Tratamento de Presos, em
particular as regras 33, 34 e 54.
Habilitações, formação e aconselhamento
18. Os Governos e os organismos de aplicação da
lei devem garantir que todos os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei sejam
selecionados de acordo com procedimentos
adequados, possuam as qualidades morais e
aptidões psicológicas e físicas exigidas para o bom
desempenho das suas funções e recebam uma
formação profissional contínua e completa. Deve
ser submetida a reapreciação periódica a sua
capacidade para continuarem a desempenhar
essas funções.
19. Os Governos e os organismos de aplicação da
lei devem garantir que todos os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei recebam
formação e sejam submetidos a testes de acordo
com normas de avaliação adequadas sobre a
utilização da força. Os funcionários responsáveis
pela aplicação da lei que devam transportar armas
de fogo devem ser apenas autorizados a fazê-lo
após recebimento de formação especial para a sua
utilização.
20. Na formação dos funcionários responsáveis
pela aplicação da lei, os Governos e os organismos
de aplicação da lei devem conceder uma atenção
particular às questões de ética policial e de direitos
do homem, em particular no âmbito da
investigação, aos meios de evitar a utilização da
força ou de armas de fogo, incluindo a resolução
pacífica de conflitos, ao conhecimento do
comportamento de multidões e aos métodos de
persuasão, de negociação e mediação, bem como
aos meios técnicos, tendo em vista limitar a
utilização da força ou de armas de fogo. Os
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organismos de aplicação da lei devem rever o seu
programa
de
formação
e
procedimentos
operacionais, em função de incidentes concretos.
21. Os Governos e os organismos de aplicação da
lei devem garantir aconselhamento psicológico aos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
envolvidos em situações em que sejam utilizadas a
força e armas de fogo.
Procedimentos de comunicação hierárquica e
de inquérito
22. Os Governos e os organismos de aplicação da
lei devem estabelecer procedimentos adequados
de comunicação hierárquica e de inquérito para os
incidentes referidos nos princípios 6 e 11 f). Para os
incidentes que sejam objeto de relatório por força
dos presentes Princípios, os Governos e os
organismos de aplicação da lei devem garantir a
possibilidade de um efetivo procedimento de
controle e que autoridades independentes
(administrativas ou do Ministério Público), possam
exercer a sua jurisdição nas condições adequadas.
Em caso de morte, lesão grave, ou outra
conseqüência grave, deve ser enviado de imediato
um relatório detalhado às autoridades competentes
encarregadas do inquérito administrativo ou do
controle judiciário.
23. As pessoas contra as quais sejam utilizadas a
força ou armas de fogo ou os seus representantes
autorizados devem ter acesso a um processo
independente, em particular um processo judicial.
Em caso de morte dessas pessoas, a presente
disposição aplica-se às pessoas a seu cargo.
24. Os Governos e organismos de aplicação da lei
devem garantir que os funcionários superiores
sejam responsabilizados se, sabendo ou devendo
saber que os funcionários sob as suas ordens
utilizam ou utilizaram ilicitamente a força ou armas
de fogo, não tomaram as medidas ao seu alcance
para impedirem, fazerem cessar ou comunicarem
este abuso.
25. Os Governos e organismos responsáveis pela
aplicação da lei devem garantir que nenhuma
sanção penal ou disciplinar seja tomada contra
funcionários responsáveis pela aplicação da lei que,
de acordo como o Código de Conduta para os
Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei e
com os presentes Princípios Básicos, recusem
cumprir uma ordem de utilização da força ou armas
de fogo ou denunciem essa utilização por outros
funcionários.
26. A obediência a ordens superiores não pode ser
invocada como meio de defesa se os responsáveis
pela aplicação da lei sabiam que a ordem de
utilização da força ou de armas de fogo de que
resultaram a morte ou lesões graves era
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
manifestamente ilegal e se tinham uma
possibilidade razoável de recusar cumpri-la. Em
qualquer caso, também existe responsabilidade da
parte do superior que proferiu a ordem ilegal.
5. Código de conduta para os encarregados da
aplicação da lei, adotado pela ONU pela
Resolução 34/169 de 17/12/1979.
A Assembléia Geral,
Considerando que um dos objetivos proclamados
na Carta das Nações Unidas é o da realização da
cooperação internacional para o desenvolvimento e
encorajamento do respeito pelos direitos do homem
e das liberdades fundamentais para todos, sem
distinção de raça, sexo, língua ou religião,
Lembrando, em particular, a Declaração Universal
dos Direitos do Homem 108 e os Pactos
Internacionais sobre os direitos do homem 109,
Lembrando igualmente a Declaração sobre a
Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura e
Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos
ou Degradantes, adotada pela Assembléia Geral na
sua resolução 3452 (XXX) de 9 de Dezembro de
1975,
Consciente de que a natureza das funções de
aplicação da lei para defesa da ordem pública e a
forma como essas funções são exercidas, têm uma
incidência direta sobre a qualidade de vida dos
indivíduos e da sociedade no seu conjunto,
Consciente das importantes tarefas que os
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
levam a cabo, com diligência e dignidade, em
conformidade com os princípios dos direitos do
homem,
Consciente, no entanto, das possibilidades de
abuso que o exercício destas tarefas proporciona,
Reconhecendo que a elaboração de um Código de
Conduta para os Funcionários Responsáveis pela
Aplicação da Lei é apenas uma das várias medidas
importantes para garantir a proteção de todos os
direitos e interesses dos cidadãos servidos pelos
referidos funcionários,
Consciente de que existem outros importantes
princípios e condições prévias ao desempenho
humanitário das funções de aplicação da lei,
nomeadamente:
a) Que, como qualquer órgão do sistema de justiça
penal, todos os órgãos de aplicação da lei devem
ser representativos da comunidade no seu
conjunto, responder às suas necessidades e ser
responsáveis perante ela,
b) Que o respeito efetivo de normas éticas pelos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei,
depende da existência de um sistema jurídico bem
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21
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concebido, aceite pela população e de caráter
humano,
c) Que qualquer funcionário responsável pela
aplicação da lei é um elemento do sistema de
justiça penal, cujo objetivo consiste em prevenir o
crime e lutar contra a delinqüência, e que a conduta
de cada funcionário do sistema tem uma incidência
sobre o sistema no seu conjunto,
d) Que qualquer órgão encarregado da aplicação
da lei, em cumprimento da primeira norma de
qualquer profissão, tem o dever de autodisciplina,
em plena conformidade com os princípios e normas
aqui previstos, e que os atos dos funcionários
responsáveis pela aplicação da lei devem estar
sujeitos ao escrutínio público, exercido por uma
comissão de controle, um ministério, um
procurador-geral, pela magistratura, por um
provedor, uma comissão de cidadãos, ou por vários
destes órgãos, ou ainda por um outro organismo de
controle,
e) Que as normas, enquanto tais, carecem de valor
prático, a menos que o seu conteúdo e significado
seja inculcado em todos os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei, mediante
educação, formação e controle,
Adota o Código de Conduta para os Funcionários
Responsáveis pela Aplicação da Lei, que figura em
anexo à presente resolução e decide transmiti-lo
aos Governos, recomendando que encarem
favoravelmente a sua utilização no quadro da
legislação e prática nacionais como conjunto de
princípios que deverão ser observados pelos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei.
106.ª sessão plenária
17 de Dezembro de 1979
Código de Conduta para os Funcionários
Responsáveis pela Aplicação da Lei
ARTIGO 1.º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei
devem cumprir, a todo o momento, o dever que a
lei lhes impõe, servindo a comunidade e
protegendo todas as pessoas contra atos ilegais,
em conformidade com o elevado grau de
responsabilidade que a sua profissão requer.
Comentário *
a) A expressão «funcionários responsáveis pela
aplicação da lei» inclui todos os agentes da lei, quer
nomeados, quer eleitos, que exerçam poderes de
polícia, especialmente poderes de prisão ou
detenção.
b) Nos países onde os poderes policiais são
exercidos por autoridades militares, quer em
uniforme, quer não, ou por forças de segurança do
Estado, a definição dos funcionários responsáveis
pela aplicação da lei incluirá os funcionários de tais
serviços.
22
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
c) O serviço à comunidade deve incluir, em
particular, a prestação de serviços de assistência
aos membros da comunidade que, por razões de
ordem pessoal, econômica, social e outras
emergências, necessitam de ajuda imediata.
d) A presente disposição visa, não só todos os atos
violentos, destruidores e prejudiciais, mas também
a totalidade dos atos proibidos pela legislação
penal. É igualmente aplicável à conduta de pessoas
não
susceptíveis
de
incorrerem
em
responsabilidade criminal.
ARTIGO 2.º
No cumprimento do seu dever, os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei devem respeitar
e proteger a dignidade humana, manter e apoiar os
direitos fundamentais de todas as pessoas.
Comentário
a) Os direitos do homem em questão são
identificados e protegidos pelo direito nacional e
internacional.
De
entre
os
instrumentos
internacionais relevantes contam-se a Declaração
Universal dos Direitos do Homem, o Pacto
Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a
Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas
contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos
Cruéis, Desumanos ou Degradantes, a Declaração
das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas
as Formas de Discriminação Racial, a Convenção
Internacional sobre a Supressão e Punição do
Crime de Apartheid, a Convenção sobre a
Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, as
Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos, e
a Convenção de Viena sobre Relações Consulares.
b) Os comentários nacionais a esta cláusula devem
indicar as provisões regionais ou nacionais que
definem e protegem estes direitos.
ARTIGO 3.º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei
só podem empregar a força quando tal se afigure
estritamente necessário e na medida exigida para o
cumprimento do seu dever.
]
Comentário
a) Esta disposição salienta que o emprego da força
por parte dos funcionários responsáveis pela
aplicação da lei deve ser excepcional. Embora
admita que estes funcionários possam estar
autorizados a utilizar a força na medida em que tal
seja razoavelmente considerado como necessário,
tendo em conta as circunstâncias, para a
prevenção de um crime ou para deter ou ajudar à
detenção legal de delinqüentes ou de suspeitos,
qualquer uso da força fora deste contexto não é
permitido.
b) A lei nacional restringe normalmente o emprego
da força pelos funcionários responsáveis pela
aplicação da lei, de acordo com o princípio da
proporcionalidade. Deve-se entender que tais
princípios nacionais de proporcionalidade devem
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ser respeitados na interpretação desta disposição.
A presente disposição não deve ser, em nenhum
caso, interpretada no sentido da autorização do
emprego da força em desproporção com o legítimo
objetivo a atingir.
c) O emprego de armas de fogo é considerado uma
medida extrema. Devem fazer-se todos os esforços
no sentido de excluir a utilização de armas de fogo,
especialmente contra as crianças. Em geral, não
deverão utilizar-se armas de fogo, exceto quando
um suspeito ofereça resistência armada, ou
quando, de qualquer forma coloque em perigo vidas
alheias e não haja suficientes medidas menos
extremas para o dominar ou deter. Cada vez que
uma arma de fogo for disparada, deverá informarse prontamente as autoridades competentes.
ARTIGO 4.º
As informações de natureza confidencial em poder
dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei
devem ser mantidas em segredo, a não ser que o
cumprimento do dever ou as necessidades da
justiça estritamente exijam outro comportamento.
Comentário
Devido à natureza dos seus deveres, os
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
obtêm informações que podem relacionar-se com a
vida particular de outras pessoas ou ser
potencialmente prejudiciais aos seus interesses e
especialmente à sua reputação. Deve-se ter a
máxima cautela na salvaguarda e utilização dessas
informações as quais só devem ser divulgadas no
desempenho do dever ou no interesse. Qualquer
divulgação dessas informações para outros fins é
totalmente abusiva.
ARTIGO 5.º
Nenhum funcionário responsável pela aplicação da
lei pode infligir, instigar ou tolerar qualquer ato de
tortura ou qualquer outra pena ou tratamento cruel,
desumano ou degradante, nem invocar ordens
superiores ou circunstanciais excepcionais, tais
como o estado de guerra ou uma ameaça à
segurança nacional, instabilidade política interna ou
qualquer
outra
emergência
pública
como
justificação para torturas ou outras penas ou
tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
Comentário
a) Esta proibição decorre da Declaração sobre a
Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura e
outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos
ou Degradantes, adotada pela Assembléia Geral,
de acordo com a qual:
«tal ato é uma ofensa contra a dignidade humana e
será condenado como uma negação aos propósitos
da Carta das Nações Unidas e como uma violação
aos direitos e liberdades fundamentais afirmados
na Declaração Universal dos Direitos do Homem (e
noutros instrumentos internacionais sobre os
direitos do homem)».
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
b) A Declaração define tortura da seguinte forma:
«Tortura significa qualquer ato pelo qual uma dor
violenta ou sofrimento físico ou mental é imposto
intencionalmente a uma pessoa por um funcionário
público, ou por sua instigação, com objetivos tais
como obter dela ou de uma terceira pessoa
informação ou confissão, puni-la por um ato que
tenha cometido ou se supõe tenha cometido, ou
intimidá-la a ela ou a outras pessoas. Não se
considera tortura a dor ou sofrimento apenas
resultante, inerente ou conseqüência de sanções
legítimas, na medida em que sejam compatíveis
com as Regras Mínimas para o Tratamento de
Reclusos*».
c) A expressão «penas ou tratamento cruéis,
desumanos ou degradantes» não foi definida pela
Assembléia Geral, mas deve ser interpretada de
forma a abranger uma proteção tão ampla quanto
possível contra abusos, quer físicos quer mentais.
ARTIGO 6.º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei
devem assegurar a proteção da saúde das pessoas
à sua guarda e, em especial, devem tomar medidas
imediatas para assegurar a prestação de cuidados
médicos sempre que tal seja necessário.
Comentário
a) «Cuidados Médicos», significando serviços
prestados por qualquer pessoal médico, incluindo
médicos diplomados e paramédicos, devem ser
assegurados quando necessários ou solicitados.
b) Embora o pessoal médico esteja geralmente
adstrito aos serviços de aplicação da lei, os
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
devem tomar em consideração a opinião de tal
pessoal, quando este recomendar que deve
proporcionar-se à pessoa detida tratamento
adequado, através ou em colaboração com pessoal
médico não adstrito aos serviços de aplicação da
lei.
c) Subentende-se que os funcionários responsáveis
pela aplicação da lei devem assegurar também
cuidados médicos às vítimas de violação da lei ou
de acidentes que dela decorram.
ARTIGO 7.º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei
não devem cometer qualquer ato de corrupção.
Devem, igualmente, opor-se rigorosamente e
combater todos os atos desta índole.
Comentário
a) Qualquer ato de corrupção, tal como qualquer
outro abuso de autoridade, é incompatível com a
profissão de funcionário responsável pela aplicação
da lei. A lei deve ser aplicada na íntegra em relação
a qualquer funcionário que cometa um ato de
corrupção, dado que os Governos não podem
esperar aplicar a lei aos cidadãos se não a
puderem ou quiserem aplicar aos seus próprios
agentes e dentro dos seus próprios organismos.
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b) Embora a definição de corrupção deva estar
sujeita à legislação nacional, deve entender-se
como incluindo tanto a execução ou a omissão de
um ato, praticada pelo responsável, no
desempenho das suas funções ou com estas
relacionado, em virtude de ofertas, promessas ou
vantagens, pedidas ou aceites, como a aceitação
ilícita destas, uma vez a acção cometida ou omitida.
c) A expressão «ato de corrupção», anteriormente
referida, deve ser entendida no sentido de abranger
tentativas de corrupção.
ARTIGO 8.º
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei
devem respeitar a lei e o presente Código. Devem,
também, na medida das suas possibilidades, evitar
e opor-se vigorosamente a quaisquer violações da
lei ou do Código.
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei
que tiverem motivos para acreditar que se produziu
ou irá produzir uma violação deste Código, devem
comunicar o fato aos seus superiores e, se
necessário, a outras autoridades com poderes de
controle ou de reparação competentes.
Comentário
a) Este Código será observado sempre que tenha
sido incorporado na legislação ou na prática
nacionais. Se a legislação ou a prática contiverem
disposições mais limitativas do que as do atual
Código, devem observar-se essas disposições mais
limitativas.
b) O presente artigo procura preservar o equilíbrio
entre a necessidade de disciplina interna do
organismo do qual, em larga escala, depende a
segurança pública, por um lado, e a necessidade
de, por outro lado, tomar medidas em caso de
violações dos direitos humanos básicos. Os
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
devem informar das violações os seus superiores
hierárquicos e tomar medidas legítimas sem
respeitar a via hierárquica somente quando não
houver outros meios disponíveis ou eficazes.
Subentende-se que os funcionários responsáveis
pela aplicação da lei não devem sofrer sanções
administrativas ou de outra natureza pelo fato de
terem comunicado que se produziu ou que está
prestes a produzir-se uma violação deste Código.
c) A expressão «autoridade com poderes de
controle e de reparação competentes» refere-se a
qualquer autoridade ou organismo existente ao
abrigo da legislação nacional, quer esteja integrado
nos organismos de aplicação da lei quer seja
independente destes, com poderes estatutários,
consuetudinários ou outros para examinarem
reclamações e queixas resultantes de violações
deste Código.
d) Nalguns países, pode considerar-se que os
meios de comunicação social («mass media»)
desempenham funções de controle, análogas às
descritas na alínea anterior. Consequentemente, os
funcionários responsáveis pela aplicação da lei
24
Atualizada SET/2009
Direitos Humanos
poderão como último recurso e com respeito pelas
leis e costumes do seu país e pelo disposto no
artigo 4.º do presente Código, levar as violações à
atenção da opinião pública através dos meios de
comunicação social.
e) Os funcionários responsáveis pela aplicação da
lei que cumpram as disposições deste Código
merecem o respeito, o total apoio e a colaboração
da comunidade em que exercem as suas funções,
do organismo de aplicação da lei no qual servem e
dos demais funcionários responsáveis pela
aplicação da lei.
EXERCÍCIOS
1) (Delegado/SP 01/98) Segundo a moderna
concepção doutrinária, os direitos humanos
fundamentais podem ser classificados como
“ de primeira, segunda e terceira gerações”. Os
direitos de terceira geração consagram o
princípio da:
a) Solidariedade (ou fraternidade);
b) Liberdade;
c) Igualdade;
d) Efetividade.
2) (Delegado de Polícia 01/98) São, dentre
outras, características dos direitos humanos
fundamentais:
a) a irrenunciabilidade, a universalidade e a
proporcionalidade;
b) a complementaridade, a previsibilidade e a
efetividade;
c) a inalienabilidade, a imprescritibilidade e a
irrenunciabilidade;
d) a dependência, a oficialidade e a historicidade.
3) (Delegado/ SP 01/99) No campo dos Direitos
Humanos, num eventual conflito entre normas
previstas em tratados internacionais e preceitos
de direito interno, aplica-se o princípio da:
a) anterioridade da lei;
b) especialidade;
c) norma mais favorável à vítima;
d) norma de hierarquia superior.
4) (Delegado / SP 01/2000) Quais os primeiros
marcos do processo de internacionalização dos
Direitos Humanos:
a) Direito Humanitário, Liga das Nações e a Carta
Internacional dos Diretos Humanos;
b) Direito Humanitário, Liga das Nações e a
Organização Internacional do Trabalho;
c) Liga das Nações, Organização Internacional do
Trabalho e a Carta Internacional dos Diretos
Humanos;
d) Organização Internacional do Trabalho, Direito
Humanitário e a Carta Internacional dos Diretos
Humanos;
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5) (Delegado / MG 1998) Assinale a alternativa
CORRETA:
a) é da competência exclusiva do Congresso
Nacional resolver definitivamente sobre a
aprovação ou não de quaisquer Tratados
Internacionais, incluindo matéria de Direitos
Humanos;
b) após a assinatura de Convenção Internacional
sobre Direitos Humanos, é imediata e plena a sua
vigência, no âmbito do ordenamento jurídico interno
brasileiro, independentemente de ser referendada,
em momento posterior, pelo Congresso Nacional;
c) as normas das Convenções Internacionais que
versam sobre Direitos Humanos, considerada a
sua natureza, não se sujeitam ao controle
concentrado de constitucionalidade das leis,
conforme posição adotada pelo Supremo Tribunal
Federal;
d) a celebração de Convenções Internacionais é
competência privativa do Presidente da República
Federativa do Brasil, sujeitando-se sempre ao
referendo do Congresso Nacional, condição esta
que não se aplica aos Tratados Internacionais
bilaterais;
6) (Delegado / MG 1998) Em face das assertivas
abaixo, indique a alternativa CORRETA:
I. no plano histórico, as primeiras Declarações de
Direitos Humanos proclamaram a necessidade de
um Estado de índole positivista, democrática e
intervencionista, objetivando a garantia das
liberdades fundamentais;
II. o princípio da igualdade constitui o principal
fundamento dos Direitos Humanos de primeira
geração;
III. o princípio da ‘prevalência dos Direitos
Humanos’ foi previsto, de maneira explícita, pela
Constituição brasileira de 1988, como fundamento
para reger as relações internacionais da nossa
República Federativa;
IV. em face do sistema constitucional brasileiro,
podem ser introduzidos no ordenamento jurídico
pátrio direitos ou garantias fundamentais, por força
da adoção e vigência de um Tratado Internacional;
a) as alternativas I e IV estão corretas;
b) apenas a alternativa IV está correta;
c) as alternativas I e II estão incorretas;
d) apenas a alternativa II está incorreta;
e) as alternativas II e III estão corretas.
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