O Canteiro - Portal Pedreiros Livres

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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
O C a n te i r o
Cultura, Maçonaria e Ação Social
Informativo Cultural para Maçons
Editorial
O Canteiro.....página 2
Liberdade de Pensamento
Irmão Raimundo Rodrigues.....página 4
Um Esbarrão - Editora Martin Claret
O Canteiro.....página 5
Jesus, Maçom
Irmão José Castellani.....página 6
Lilith. Um Texto Fundador da Mulher na Maçonaria
Irmão Frederico Guilherme Costa.....página 14
Um Destaque - Rito Brasileiro em Santa Catarina
O Canteiro e o Irmão Wagner Sandoval Barbosa.....página 16
O Mestre Instalado no Rito Escocês
Antigo e Aceito – Invenção?
Irmão Marcelo Abuchaim Fattore.....página 17
As Armadilhas da Perfeição
Irmão Jurandy Cordeiro de Souza Júnior.....página 19
Fundação Hermon
O Canteiro e o Irmão Luiz Lunardelli.....página 21
Outro Esbarrão - Editoras HUCITEC e UNESP
O Canteiro.....página 23
Boa Leitura
O Canteiro.....página 24
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Editorial
Da Terra de José Bonifácio
O trabalho cultural requer muito esforço e perseverança para
que dê "frutos", mas talvez seja interessante, como primeiro
passo para bem entender a importância deste trabalho,
considerarmos o conceito de cultura. No âmbito deste "projeto",
podemos aceitar cultura como o conjunto das características
humanas que não são inatas e que são criadas, preservadas
ou aprimoradas via comunicação e cooperação entre
indivíduos que vivem em sociedade. Neste ponto, talvez uma
analogia com um jardim ou um pomar seja aceitável, uma vez
que para colhermos ou apreciarmos algo nestes recantos, temos
que manter as condições necessárias ao desenvolvimento das
plantas (temos que cultivar). A Maçonaria, com a Construção
Social que propõem aos seus iniciados, talvez possa ajudar
muito, transposta a idéia do jardim para a sociedade e para a
cultura que a desenvolve. Antes, entretanto, é preciso promover
o desenvolvimento e manter o nível cultural em seu seio, para
que não ocorra algo tão triste e tão contraditório como a
influência dos maus costumes "externos" nas Lojas, quando as
Lojas deveriam influenciar, com bons costumes "internos" e com
os frutos do trabalho maçônico, a Sociedade.
Não pretendemos indicar que a Maçonaria não esteja,
atualmente, em boas condições culturais, mas sim que a sua
ação na sociedade não vem sendo suficiente para enfrentar as
desigualdades cada vez mais avassaladoras, acarretadas pela
confusão das lideranças político-econômicas acerca dos
desenvolvimentos econômico, tecnológico e humano (social). E a
"ação" dos Maçons, aqui, não é referida como simplesmente
filantropia.
A idéia deste informativo digital, O Canteiro, nasceu justamente
do entendimento de que precisamos multiplicar os efeitos de
nossa atuação. Assim, a proposta foi de reunir um verdadeiro
time de colaboradores, alguns dos escritores e obreiros mais
conhecidos do Brasil, juntamente com "novas vozes", para tentar
levar aos mais distantes lugares o estímulo à Ação Social,
fundamentada nos princípios que nos são tão caros: Liberdade,
Igualdade e Fraternidade. Isso como resultado de discussões
nascidas das leituras de material "rico" e do desenvolvimento
cultural maçônico que delas deve nascer, nos impelindo, sem
parar, no processo cíclico e progressivo de tese-antítese-síntese,
sendo cada nova síntese a base para um novo desenvolvimento.
O Canteiro não tem compromisso com qualquer sistema
"obediencial" e, por isso, é um veículo para todos os maçons,
sejam eles praticantes do Rito Escocês Antigo e Aceito, do Rito
Moderno, do Rito de York (Emulation), do Rito Adonhiramita, do
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Rito Brasileiro ou do Rito de Schroeder. Entretanto, fica
assumido o compromisso de jamais divulgarmos material que
tenha fundo estritamente comercial, político-partidário, que
ataque lideranças maçônicas ou que atente contra os nossos
ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Enfim, não
pretendemos divulgar material que escape à abrangência do que
se pode entender por Cultura, Maçonaria ou Ação Social.
A proposta, enfim, é de um "canteiro para nossa obra", onde
pretendemos facilitar a troca de informações, a preparação de
nossas "ferramentas" e a discussão de novas idéias, sempre no
sentido de estimular as ações que visem o bem social, a
"Construção Social", que é nossa meta comum.
Agradecemos especialmente aos colaboradores e donos desta
idéia, alguns Eternos Aprendizes que, mesmo sem os nomes
citados, sabem que nada, aqui, seria possível sem eles.
Dedicamos este pequeno esforço a todos os Maçons que honram
seus aventais. Gostaríamos, também, de fazer uma menção
carinhosa a todos os integrantes das listas maçônicas de
discussão (dialética), em especial os Irmãos das listas: U.F.G.,
Cavaleiros da Luz, Rito Moderno, Acácia, Atalaia, Solidariedade,
Grandes Lojas, Maçonaria-ES e CCCPM.
Mens Agitat Molens
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Você pode enviar comentários e seus trabalhos
para O Canteiro, usando o endereço eletrônico:
[email protected].
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Liberdade de Pensamento
Irmão Raimundo Rodrigues
Quando dizemos que a Maçonaria é uma Escola do filosofar,
fazemo-lo porque entre nós se exige estudo, pesquisa,
meditação.
No entanto, não tememos afirmar que nossa Ordem é
fundamentalmente filosófica, uma vez que ela tem por mira
alcançar um ideal superior. A beleza do filosofar maçônico está
no estudo comparativo dos sistemas filosóficos que a história
nos proporciona.
A Maçonaria não se prende a uma escola ou a um determinado
sistema, porque se tal o fizesse estaria tirando a liberdade de
pensamento de seus membros, obrigando-os a seguir um único e
mesmo caminho.
Haveria, então, é de supor-se, uma verdadeira lavagem cerebral;
se tal ocorresse mais cedo ou mais tarde, nossa Ordem ou se
desvirtuaria ou desapareceria.
O Maçom tem inteira liberdade de interpretação, pois o símbolo
permite exegese variada e, muitas vezes, desigual.
Se houvera uma uniformidade obrigatória de interpretação, isto
seria um verdadeiro atentado contra um dos sagrados
postulados que ela prega: liberdade.
Portanto, é impossível, maçonicamente, alguém pretender fixar
determinada corrente ideológica.
A preocupação maçônica pelo ser, pelo conhecer, pelo alcançar a
verdade, exige análises, debates, troca de idéias e, sobretudo,
respeito ao pensamento alheio.
O esoterismo se sobrepõe ao exoterismo, porque os problemas
interiores merecem maior atenção que os exteriores.
O Maçom deve conscientizar-se de que tem um compromisso
consigo mesmo, com o seu pensar, com o que fazer de sua vida
maçônica.
Ele não pode prescindir de si próprio, não pode prescindir de
seus direitos e, sobretudo, de seus deveres, porque se o fizera
estaria negando-se como ser, como homem, como Maçom.
Não podemos escapar da grande verdade de que o saber
humano, mormente o saber filosófico - vem do homem, pelo
homem e para o homem.
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Devemos ter sempre diante dos olhos esta verdade: a Maçonaria
proporciona aos seus membros os meios necessários para que
adquiram o saber. Infeliz do Maçom que disto não se aperceber.
É necessário, no entanto, que tenhamos a melhor boa vontade
em assimilarmos tudo aquilo que ela põe ao nosso dispor não só
para adquirirmos o saber, mas também para alcançarmos
aquele Grau de educação maçônica que nos projetará como
verdadeiros e autênticos Maçons.
RODRIGUES, Raimundo. A Filosofia da Maçonaria Simbólica Vol. 1,Londrina : A Trolha, 1999, pp.20-1.
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Um Esbarrão - Editora Martin Claret
O Canteiro
A editora Martin Claret vem oferecendo uma coleção muito
interessante: "A Obra-Prima de Cada Autor". São mais de 80
títulos, em formato "de bolso", com obras de autores
consagrados de todos os tempos, romancistas, filósofos,
sociólogos etc. Mas o que justifica o destaque aqui não é apenas
a variedade de títulos oferecidos. Com exceção de quatro
volumes, que custam cerca de R$ 14,00 (os especiais), cada um
custa R$ 7,00. Isso é uma maravilha! Trata-se, de fato, de um
projeto que pode popularizar a leitura mais "consistente", o que
nos dá uma esperança animadora. A editora Martin Claret está
de parabéns pela iniciativa.
No apresentação da obra da coleção, a Ética Protestante e o
Espírito do Capitalismo, de Max Weber, há um texto de Sílvio L.
Sant'anna, que julgamos interessante citar:
Nos recentes lançamentos da Coleção "A Obra-prima de Cada
Autor" temos oferecido ao público obras de referência das Ciências
Humanas, com o objetivo de atender simultaneamente a um
público específico de estudiosos, bem como disponibilizar ao
grande público reflexões geralmente restritas a poucos iniciados.
Foi o que fez Lutero com a Bíblia, tirando-a do convento e levandoa para a casa do crente, possibilitando sua livre interpretação.
Nossa filosofia editorial, se inspira na "Cruzada da Boa
Imprensa", conduzida pelo professor Huberto Rohden, e na
revolução do livro propugnada por Monteiro Lobato. Podemos
resumi-la com a seguinte profissão de fé do editor: "Nós
acreditamos na função do livro".
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Jesus, Maçom
Irmão José Castellani
A imaginação
“Emanuel foi o nome dado a Jesus ao vir ao mundo. Era um
menino possuidor de alta inteligência, Q.I. bastante alto.
Na ordem maçônica dos essênios só era permitido iniciar
candidatos com idade mínima de dezessete anos: Emanuel, com
doze anos de idade, procurou ingressar na Ordem Maçônica, mas
como não era permitida Iniciação com aquela idade, os padres
essênios levaram-no para educa-lo numa escola na Alexandria.
Quando completou dezessete anos, Emanuel foi iniciado na
Ordem Maçônica dos essênios. Os Maçons receberam nomes
simbólicos em suas Iniciações, Elevações e Exaltações a depender
do Ritual utilizado pela Loja. Emanuel, em sua Iniciação, recebeu
o nome simbólico de Jesus que quer dizer JUSTO, e na
Exaltação recebeu o nome simbólico de CRISTO, que
significa PERFEITO. Até a idade de dezessete anos só era
conhecido pelo seu nome profano, Emanuel. A Exaltação de Jesus
ou seu ingresso no terceiro Grau, da Ordem Maçônica dos
essênios ocorreu no dia vinte e cinco de dezembro do ano
trinta. Os Reis Magos também eram maçons. Os seus nomes
simbólicos eram: Gaspar, Melchior e Baltazar. Gaspar era Rei da
Índia, Melchior, Rei do Egito, Baltazar, Rei da Babilônia. Eles
estiveram presentes às solenidades de Exaltação de
Emanuel. Emanuel nasceu em vinte e três de dezembro do
ano um. Os Reis Magos não estiveram presentes no nascimento
de Emanuel e sim em sua Exaltação na Ordem Maçônica. Jesus
foi um grande maçom. Tudo foi tão JUSTO E PERFEITO com
Jesus Cristo, que tornou-se muito mais conhecido na história
da humanidade pelos seus nomes simbólicos --- Jesus,
Cristo --- do que pelo seu nome profano, Emanuel. A Iniciação
na Maçonaria dá-se no primeiro Grau, a Elevação no segundo
Grau e a Exaltação no terceiro Grau. Já sabemos que no primeiro
Grau, Emanuel recebeu o nome simbólico de Jesus e de Cristo no
terceiro. O segundo Grau era também conhecido como o Grau de
profeta. Nesse Grau Jesus recebeu o nome simbólico de Issa”. (os
grifos são meus)
“Jesus foi nosso Irmão, iniciado numa Loja essênia”.
*
O primeiro texto está inserido no certificado de presença de uma
Loja brasileira, sem que conste o nome de qualquer autor, ou
bibliografia. O segundo texto fez parte de uma palestra feita por
um antigo maçom. Asas à imaginação!
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
A realidade histórica
Dificilmente são vistas tantas informações sem qualquer
compromisso com a verdade histórica, que vive apenas de fatos e
não de especulações. Alguns tópicos merecem uma análise mais
profunda:
1. “Emanuel foi o nome dado a Jesus ao vir ao mundo. Era um
menino possuidor de alta inteligência. Q.I. bastante alto”.
Comentário:
Inicialmente, cabe perguntar como é que se media o Q.I. há
2000 anos, já que essa prática é recente, do século XX. Em
segundo lugar, é necessário esclarecer que Emanuel - que,
realmente, significa Deus conosco - foi o título pelo qual o
profeta Isaías chamou o Messias que viria, como se pode
constatar em Isaías, 7 – 14 e em 8-8 e em Mateus 1 – 23:
O nome do Messias, na realidade, era mesmo Jesus, forma
latina da palavra hebraica Ieshua, que significa Salvador. E
existiram, na História hebraica, outros homens com esse
nome: um Jesus, sumo sacerdote, depois do exílio na
Babilônia (538 a.C.); um Jesus, chamado o Justo, louvado
por Saulo (S. Paulo) como auxiliar no reino de Deus: e um
Jesus, filho de Sirac, autor do Eclesiastes.
2.
“Na ordem maçônica dos essênios só era permitido iniciar
candidatos com idade mínima de dezessete anos; Emanuel,
com doze anos, procurou ingressar na Ordem Maçônica, mas
como não era permitida iniciação naquela idade, os padres
essênios levaram-no para educá-lo numa escola de
Alexandria: quando completou dezessete anos, Emanuel foi
iniciado na Ordem Maçônica dos essênios”.
Comentário:
A maçonaria, mesmo que os místicos fantasistas e sem base
histórica desejem o contrário, é uma ordem que surgiu na
Idade Média. Não havia, portanto, maçonaria no início do
Universo, na Pré-História, no Parque dos Dinossauros, no
Paraíso, ou no início da era atual. Falar, portanto, em “ordem
maçônica dos essênios”, é absoluta heresia histórica. Além
de tudo, os essênios foram bem conhecidos, historicamente,
graças a Flávio Josefo e Filon, historiadores contemporâneos
de Jesus, os quais nos dão conta de que eles - que nem são
citados no Evangelho - formavam uma comunidade de
homens e mulheres, que levavam uma vida austera,
praticavam o celibato e tinham os seus bens em comum.
Nada, historicamente, autoriza a afirmação de que eles
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possuíam ritos iniciáticos para a sua seita, simplesmente
contemplativa, e muito menos de que havia uma idade
mínima - 17 anos - para a “iniciação”. De onde foi tirado
isso? Existe, sim, a iniciação religiosa do menino e da
menina judia - o bar-mitsvá e o bat-mitsvá, respectivamente
- aos 13 anos de idade.
Os hebreus e - a partir do exílio na Babilônia - judeus,
tinham de maneira geral, os seus sacerdotes, da tribo dos
Levitas, os quais oficiavam os serviços do templo de
Jerusalém. Mas os essênios, que não participavam dos
serviços litúrgicos do templo, não possuíam sacerdotes
(muito menos “padres”, que são sacerdotes católicos),
segundo os historiadores, já citados, da época.
A afirmação de que Jesus foi levado, para ser educado numa
escola de Alexandria, é altamente temerária, por incidir em
improbabilidades. Em primeiro lugar, Alexandria foi fundada
pelo macedônio Alexandre Magno, em 332 a.C., no
Mediterrâneo, a 206 quilômetros do Cairo, e disputava, com
Roma, o título de maior cidade do mundo, sendo um grande
centro da cultura grega. Mas a Judéia era província romana,
o que tornava, portanto, muito mais lógico e racional que
alguém, de lá saindo, fosse estudar em Roma e não na
Alexandria grega.
Em segundo lugar, muitos levantam dúvidas sobre a
existência real de Jesus, que teria nascido no ano 749 de
Roma, ou ano 4 antes da era atual. Porém, a sua existência
histórica é amplamente aceita pela comunidade científica,
por comparação do contexto político, religioso e social de sua
vida com os documentos e as informações arqueológicas.
Embora Flávio Josefo e os historiadores romanos Tácito e
Suetônio não o mencionem, suas descrições dos locais, dos
costumes e das pessoas da época confirmam os dados dos
evangelhos, escritos por contemporâneos de Jesus. Existe,
todavia, uma fase oculta em sua vida, a qual não é abordada
nem por esses contemporâneos, por ser absolutamente
desconhecida. Seu nascimento e infância são descritos nos
evangelhos, principalmente no de Lucas, terminando no
regresso da família a Nazaré, depois da fuga para o Egito. O
período da vida oculta de Jesus compreende os anos
passados em Nazaré, após o retorno do Egito, e, dele, os
evangelistas apenas abordam o episódio da peregrinação a
Jerusalém - ao templo - quando ele tinha doze anos de idade.
Depois disso, só há registro de sua vida pública, cerca de
vinte anos depois, quando ele iniciou a sua pregação e a
divulgação de suas idéias, como se pode ver no Evangelho
segundo Mateus.
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
É exatamente esse período, por não ter nenhum relato - por
isso é chamado de “vida oculta” - que é altamente explorado
pelos fantasistas, cujas elucubrações não têm nenhum
compromisso com a realidade. Assim, segundo alguns, Jesus
teria estado no Tibete; ou, segundo outros, na Índia, onde,
entre budistas, teria o nome de Jesse; ou, ainda, no Egito,
ou......, ou......... . e até numa escola em Alexandria e na
“ordem maçônica dos essênios”!!!
3. “Emanuel, em sua iniciação, recebeu o nome simbólico de
Jesus, que quer dizer Justo, e, na Exaltação, recebeu o nome
simbólico de Cristo, que quer dizer Perfeito”.
Comentário:
Como já foi visto, Ieshua (Jesus) significa “Salvador”, ou
“Deus é o seu auxílio”. Existiu um outro Jesus, que foi
cognominado “o Justo” - não que o nome significasse “Justo”
- mas não se devem misturar alhos com bugalhos.Já a
palavra Cristo é originária do grego “Khristos”, que é a
tradução do termo hebraico “Meshiakh”, que significa
“Messias”, ou “Ungido”. Não tem nada de “justo e Perfeito”.
Parece que o texto do certificado quer ligar Jesus a essa
expressão, que era típica dos canteiros - operários que
esquadrejavam a pedra de cantaria - medievais e que chegou
à moderna maçonaria. Entre os canteiros, um Zelador, ou
Vigilante, media a horizontalidade da pedra, com o nível,
enquanto o outro media a sua verticalidade com o prumo,
anunciando, depois, ao proprietário (ou o master): “tudo está
justo e perfeito”; isso era feito no início e no fim dos
trabalhos, para surpreender possíveis sabotagens do
trabalho, coisa comum, diante da rivalidade das
organizações profissionais de canteiros, que eram muito
requisitados e considerados, já que, da perfeita forma cúbica
das pedras, dependia a estabilidade das construções.
4. “A exaltação de Jesus, ou seu ingresso no terceiro grau, da
Ordem maçônica dos essênios ocorreu no dia 25 de dezembro
do ano trinta”.
Comentário:
Alguém deve ter visto a ata dessa sessão de Exaltação!
E por que falar de ano trinta, se o calendário atual estava
longe de ser inventado? Por que não 3791 da era hebraica, já
que os essênios eram judeus, como Jesus?
Fantasia, imaginação e mistificação! Seria bom que o
desconhecido redator do texto conhecesse um pouco da
História maçônica, para saber que o terceiro grau só foi
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introduzido no século XVIII e o segundo, no século XVII. E
para saber que só se afirma alguma coisa à luz de
documentos, ou de bibliografia fidedigna e não “sonhando”.
Seria interessante conhecer, também, a situação políticoreligiosa da época de Jesus:
Desde a reconstrução do templo de Jerusalém, após o exílio
na Babilônia - 586 a 538 a.C. - por Zorobabel, a vida
religiosa em torno dele sempre foi muito intensa e vibrante,
com a finalidade de preservar a pureza e a autenticidade das
tradições hebraicas, constantemente ameaçadas pelos
invasores. Existiam, todavia divergências teológicas e
rivalidades políticas, que iriam originar três seitas, ou, na
realidade, verdadeiros partidos de política religiosa: a dos
saduceus, a dos fariseus e a dos essênios.
Os saduceus compunham o partido sacerdotal e dos
poderosos, baseando toda a sua atividade na fidelidade
intransigente aos texto da Torá - os cinco primeiros livros
bíblicos : Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio
- e lutando pela supremacia do povo eleito e pela grandeza
espiritual do templo. Para os saduceus, somente as
disposições legais e as crenças explícitas na Torá é que
determinavam o rumo da fé de Israel. Daí a sua extrema
severidade nas leis penais e o fato de não aceitarem
interpretações e especulações sobre o texto da lei, que teria
sido recebida por Moisés, no monte Horeb, no Sinai. Por isso,
eram adversários dos fariseus, que defendiam princípios não
formulados, explicitamente, na Torá. Aferrados ao templo, os
saduceus desapareceriam junto com ele, quando da
destruição de Jerusalém, no ano 70 da era atual (3830 da
era hebraica), pelas tropas romanas do imperador Tito, no
dia 9 do mês av.
Os fariseus (do hebraico: perushin = separados), cuja
importância havia crescido a partir do século II a.C.,
admitiam, além da tradição escrita da Torá, uma extensa
tradição oral, que, segundo eles, autorizava, aos doutores da
Lei, a interpretação do texto e a adaptação dele às diversas
circunstâncias concretas da História. Compondo uma ordem
religiosa, contemplativa e docente, os fariseus definiram as
estruturas básicas do judaísmo, as quais iriam ser, em larga
escala, absorvidas pelo cristianismo: a justiça de Deus e a
liberdade do homem; a imortalidade pessoal: o julgamento
após a morte; o paraíso, o purgatório e o inferno; a
ressurreição dos mortos; o reinado de glória. Tais conceitos
doutrinários seriam levados, ao cristianismo, por Saulo canonizado como São Paulo - que se proclamava “fariseu,
filho de fariseus”.
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No primeiro século antes da era cristã, o movimento farisaico
dividia-se em duas facções rivais: a de Shamai, rigorosa e
intransigente na interpretação da Torá - a ala extremista dos
zelotes, que inspirou a revolta contra Roma era dessa facção
- e a de Hilel, o Velho, mais moderada. Quando o templo foi
definitivamente destruído, foi a corrente de Hilel que manteve
a unidade doutrinária do farisaísmo e que, por meio dele,
proporcionou a sobrevivência do judaísmo. Com o
conhecimento, que se possui, sobre a doutrina farisaica e
sobre o aproveitamento desta pela Igreja, não se compreende
o grosseiro conceito que se faz dos fariseus, o juízo
pejorativo, geralmente injusto e que não considera a função
fundamental que eles exerceram na vida religiosa judaica e,
por extensão, na de toda a humanidade, através do
aproveitamento de sua doutrina por outras religiões. O
conceito
pejorativo,
que
deles
se
faz,
deve-se,
fundamentalmente, à interpretação clerical dos Evangelhos,
a qual os rotula como fanáticos e hipócritas, em geral,
embora fanáticos e hipócritas existam em qualquer grupo
religioso, ou seita.
Os essênios, embora sua atividade fosse descrita por Flávio
Josefo e Filon, tornaram-se mais conhecidos a partir da
descoberta dos manuscritos de Cumrán, ou manuscritos do
Mar Morto. Eles formavam comunidades que praticavam um
monaquismo, através do qual homens e mulheres, provindos
de diversas regiões de Israel, agrupavam-se, para uma vida
consagrada ao ideal de uma vida religiosa de isolamento,
contemplação e silêncio. O ingresso na comunidade
implicava o voto de viver, de acordo com os preceitos da
Torá, uma existência de oração, pobreza, obediência e
pureza, através da submissão à vontade de Deus. Isolados e
quase enquistados, não participavam das atividades do
templo, tendo pouca influência na vida religiosa judaica,
embora alguns de seus hábitos, exclusivamente religiosos,
tivessem sido aproveitados, chegando até à Igreja : preces e
estudos em comum, preparando a alma para a eternidade;
ressurreição dos mortos; purificação pela água; e a
comunhão da confraria no vinho e no pão consagrados,
origem da eucaristia. A comunidade dos essênios também
iria desaparecer com a derrocada nacional, após a destruição
de Jerusalém e do terceiro templo.
5. “Emanuel nasceu a 23 de dezembro do ano um”.
Comentário:
Eureka! Fez-se a luz! Ninguém, até hoje, sabia a data exata
do nascimento de Jesus, nem mesmo os mais profundos
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estudiosos da História e da Arqueologia. Agora já se sabe,
graças à sábia informação contida nesse folheto!
Sabe-se - ou seria melhor dizer “sabia-se”? - que a data de
25 de dezembro, para o nascimento de Jesus, é
completamente fictícia e foi baseada no mitraismo persa,
adotado pelos romanos. Como a noite de 24 para 25 de
dezembro é a mais longa - e, geralmente, a mais fria - do
ano, no hemisfério Norte, os adoradores do deus Mitra (o
Sol), realizavam uma cerimônia , “Natalis Invicti Solis”
(Nascimento do Sol Vitorioso), onde, durante a longa e fria
noite, eram realizados cultos propiciatórios, pela volta da luz
do Sol e do calor. O cristianismo, aproveitando essa
cerimônia mitraica e assimilando Jesus à luz do mundo,
fixou essa data, como se fosse a do nascimento de Jesus, já
que não se sabe nem o dia e nem o ano em que isso ocorreu.
Ou melhor, não se sabia!!!!
6. “Gaspar era rei da Índia; Melchior, rei do Egito; Baltazar, rei da
Babilônia”.
Comentário:
Nada prova que os três personagens eram, realmente, reis,
embora sejam tidos, popularmente, como tal. As Escrituras,
em momento algum, fornecem informações suficientes para
que se possa estabelecer qual é o país de cada um,
destacando, apenas, que eram do Oriente. Até o número dos
“reis magos” é motivo de controvérsia, pois já se falou em 3,
4, 5, 6 e até 12! O número de três se deveu à tradição,
segundo a qual eles se apresentavam como representantes
das três raças: branca, negra e amarela.
Os nomes pelos quais ficaram conhecidos também são
duvidosos, pois resultam de uma tradição tardia e não da
época em que os fatos teriam acontecido. E é mais provável
que tais personagens fossem meros viajantes, com
conhecimentos de ciências naturais e de astrologia. Quem
disse que eles eram, respectivamente, reis da Índia, do Egito
e da Babilônia? Da Babilônia, seria impossível! Depois do
domínio persa, iniciado com Ciro, o Grande, em 539 a.C., a
Babilônia conheceu o período helenístico, quando entrou em
decadência, desaparecendo antes do início da era cristã. O
termo “babilônia” surge, no Novo Testamento, apenas de
forma metafórica, para designar a Roma pagã, ou o próprio
mundo. Como Baltazar poderia ser rei de um Estado
desaparecido? E como Melchior poderia ser rei do Egito, se o
Egito, desde 30 a.C., era província romana? E nem se fale
da Índia, que, na época, estava tão dividida, que nem se
poderia falar em um governo único. Conclusão: “invenção”!
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
7. “O segundo grau era também conhecido como o grau de
profeta. Nesse grau, Jesus recebeu o nome simbólico de Issa”.
Comentário:
Abstraindo essa história fantástica de segundo grau, sem
qualquer comprovação - o segundo grau, na maçonaria,
surgiria no final do século XVII - a própria explicação sobre
esse nome, a mais aceita, é, também, mera especulação:
“Issa” teria sido o nome de Jesus, quando de sua
permanência nos claustros do Tibete. Isso, obviamente, é
mera suposição, embora Raul Silva, um místico sem
bagagem histórica, em seu antigo livro “Maçonaria
Simbólica” - da editora ocultista Pensamento - diga que “um
nosso irmão russo, de nome Nicktowysk, compulsando esses
documentos da antiguidade, neles encontrou a permanência
de Jesus, durante anos, no convento do Tibete, sendo ali
conhecido com o nome de profeta Issa”. Só que ninguém
sabe quem é Nicktowysk e tais “documentos” nunca foram
exibidos, o que leva à conclusão de que se trata de mais uma
farsa. Mais uma!
Acrescente-se, porém, que, para o Islã - a religião fundada
por Mohammed ibn Abdallah (Maomé), no século VI da era
atual - Adão foi o primeiro profeta e Jesus, um dos profetas
mais perfeitos. Daí a origem desse título, que nada tem a ver
com o Tibete e nem com uma eventual e fantástica
“maçonaria dos essênios”.
8. “Os Reis Magos também eram maçons”.
Comentário:
SEM COMENTÁRIOS!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Do livro, em preparo,
“Manias e Crendices, em nome da Maçonaria”.
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Lilith. Um Texto Fundador da Mulher na Maçonaria
Irmão Frederico Guilherme Costa
A maçonaria, como todos sabem, procura suas origens em mitos
fundadores de origens longínquas na corte de Salomão. São
contribuições lendárias que estão ligadas aos grandes mitos da
criação.
O nome “Lilith” tem uma filiação semítica e indo-européia. A
palavra suméria “lil” significa “vento”, “ar” e “tempestade”. Lilith
foi inicialmente associada às forças hostis da natureza, parte de
um grupo de três demônios, um masculino e duas femininas:
Lilu, Lilithu e Ardat Lili, esta última sendo a companheira do
portador da luz. 1
Lilith também está sempre associada a uma mulher lasciva,
sedutora e de rara beleza. Com seus longos cabelos negros
mostra-se altamente sensual e destrutiva. Muito provavelmente
os judeus a conheceram no cativeiro da Babilônia.
Lilith é mencionada no Antigo Testamento, Livro dos Profetas,
Isaías 34/14:
“lá também descansará Lilith, achará um pouso para
si em companhia dos gatos selvagens, das hienas,
dos sátiros da víbora e dos abutres”.
Para transportar Lilith para a modernidade, entendida como
estilo, costume de vida ou organização social que emergiu na
Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram
mais ou menos mundiais em sua influência2 , vou chamar a
atenção para os dois relatos da criação do homem e da mulher
nos capítulos I e II do Gênesis de onde foi extraído o mito
reatualizado de Lilith.
Modernamente ela é considerada a primeira mulher que ousou
pronunciar o nome inefável que lhe deu as asas por meio das
quais fugiu do Éden, abandonando o seu companheiro, com
quem não se entendia.
Apesar de perseguida por três anjos – Sinou, Sinsinoi e
Samengelof – recusou-se a deixar sua nova morada no mar
vermelho e a sua fuga transformou-se em expulsão. Tornou-se,
posteriormente à criação da segunda mulher – Eva – , não mais
criada do barro, mas de uma costela, uma rival vingativa para
fazer o mal aos descendentes de Adão e Eva. Esta a razão de
diversos textos judaicos associarem Lilith aos demônios com
asas e formas humanas, inclusive na Cabala, onde vemos Lilith
unir-se a Sammael.
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Interessa neste estudo mostrar a Lilith transformada na mulher
libertada e revoltada na afirmação dos seus direitos, na busca da
igualdade em relação ao homem. Uma mulher rejeitada pela
sociedade dos homens e que está sempre buscando o seu
reconhecimento, ainda que para isso tenha que fazer “mal” aos
homens.
Em diversas formas de sociabilidades, e entre elas,
fundamentalmente, a maçonaria, ela, a “mulher”, está excluída
sob o argumento de que, por sua própria essência, arrastaria os
homens para o infortúnio.
É o próprio Pierre Brunel3 que nos lembra certas associações de
Lilith com a Rainha de Sabá na aparência falsamente luminosa.
Cumulando com seus dons, o homem, se deixa prender por seus
atrativos, ela o orienta para uma procura que o isola dos outros
e o arrasta para um caminho que segue em sentido contrário à
vida.
Portanto, o mito de Lilith, assim como a mulher moderna na
maçonaria, tem por objetivo afastá-la dos homens, por ser
perigosa e destrutiva, apesar de certos homens estarem
dispostos a visitá-lo no seu exílio.
Assim, Lilith pode vir a representar possíveis respostas para a
mulher excluída em determinadas sociabilidades centradas
simbolicamente nos mitos fundadores de origens longínquas que
não têm nada a ver com o racional. Trata-se do arrebatamento
do Ser em contraposição ao Não Ser. O único caminho que pode
ser transitado.
É possível que surjam aporias4 a este ensaio. Entretanto, já
ensinava Aristóteles que existe uma interessante ligação entre a
lógica e a metafísica. O que procurei fazer foi convidar os meus
ouvintes para verem as coisas de um outro modo, mas sempre
cauteloso com os conceitos e com a linguagem. Lilith é o desejo
libertado: a contestadora. Ela representa a mãe das excluídas.
Ela é o prazer, o desejo, logo, o perigo, a transgressão, a culpa e
o medo. Ela não pode participar do centro, da Ágora. Ela deve
ser excluída do espaço da produtividade. Enfim, ela deve viver
no exílio que escolheu porque corrompeu os valores da
dominação masculina e ousou dizer que foi feita do mesmo pó e
não admitir a submissão. Esta é Lilith!
Notas:
1. Remeto o interessado ao excelente trabalho de Pierre Brunel
(organização), Dicionário de Mitos Literários, Brasília: Editora UNB/
José Olympio Editora, 1997, pp. 582/85.
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
2. Anthony Giddens, As Conseqüências da Modernidade, São Paulo:
Edusp, 1991, p11.
3. Pierre Brunel, op. , cit., p. 584.
4. Estou me referindo a eventuais conflitos entre opiniões, contrárias
e igualmente concludentes, em atenção às questões aqui expostas.
***
Um Destaque - Rito Brasileiro em Santa Catarina
Irmão Wagner Sandoval Barbosa
Em Florianópolis, Santa Catarina, no dia 19 de novembro de
l980, nasceu a 1º Loja do Rito Brasileiro, em Orientes, com o
nome de A∴
∴R∴
∴L∴
∴S∴
∴ União Brasileira II, 2085. Assim chegava
o Rito Brasileiro no sul do país. No dia 19 de novembro de 2001,
foram comemorados os 21 anos da Loja, com festividades
promovidas por seus obreiros e pelos Irmãos das demais Lojas
do Rito Brasileiro de Santa Catarina.
Participaram os Irmãos Walmor Backes, Grão Mestre Estadual, e
Nei Inocêncio dos Santos, Grande Primaz do Rito Brasileiro.
Houve apresentação da Orquestra Sinfônica de Santa Catarina e
foi lançada oficialmente a homepage da Loja União Brasileira:
http://planeta.terra.com.br/arte/comarella.
Hoje, existem 13 Lojas do Rito Brasileiro em Santa Catarina, três
Ilustres Capítulos (Florianópolis, Balneário Camboriú e Joinville)
e um Conselho Kadosh.
O Canteiro recomenda, para melhor conhecer o Rito Brasileiro, a
obra:
Rito Brasileiro de Maçons Antigos, Livres e Aceitos,
do Irmão Mário Name (A Trolha, 1992).
***
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
O Mestre Instalado no Rito Escocês
Antigo e Aceito – Invenção?
Irmão Marcelo Abuchaim Fattore
Após a cisão no Grande Oriente do Brasil, em 1927, e a criação
das Grandes Lojas Estaduais uma das conseqüências mais
contundentes foi o “azulamento” do Rito Escocês Antigo e Aceito,
visto que, por motivos que não cabem discutir neste trabalho, o
R∴E∴A∴A∴ praticado nas Grandes Lojas foi, em boa parte,
desvirtuado e aproximado do Rito Inglês – York ou, ainda,
Emulation.
Esse “azulamento” não se restringiu à cor dos aventais e uma
das práticas introduzidas no Rito, foi a instalação dos Mestres
eleitos para presidir a Loja, prática até então exclusiva do Rito
de York.
Tanto que o Grande Oriente do Brasil resistiu a essa prática até
1968, quando “o Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil,
Álvaro Palmeira, mandou imprimir um ritual de Instalação,
padrão para todos os Ritos, e decalcado, indisfarçavelmente, nos
Rituais utilizados pelas Grandes Lojas Estaduais.” (Castellani –
Manual do Mestre Instalado, pg. 12).
Em virtude disso freqüentemente nos deparamos com
questionamentos quanto à condição de “Mestre Instalado”, visto
que, considerando o anteriormente exposto, essa condição é
estranha, não só ao REAA, mas a todos os demais Ritos, que não
o Rito de York.
Entretanto, mesmo no Rito de York essa prática não era
unanimidade entre as Lojas Inglesas, conforme nos ilustra o
Irmão Nevile B. Cryer em seu trabalho “A parte do Mestre: uma
reapresentação”, traduzido pelo Irmão Gilson da Silveira Pinto e
publicado no livro Pérolas Maçônicas – Volume III, Ed. A Trolha,
quando afirma:
“um segundo fator é aquele conquanto entre os modernos, da
assim chamada 'Instalação', não se tornou uma característica
regular de Lojas (Craft) Operativas particulares, até a última parte
do século 18, e é bastante esclarecido pelos antigos como um
passo essencial para o que eles consideravam ser o verdadeiro
'coração e medula da franco-maçonaria'.”
Então nos parece claro, pelo até aqui analisado, que a
“Instalação” não é uma prática inerente e nata da Maçonaria
Operativa, tendo surgido e se consolidado ao longo do primeiro
século da Maçonaria Moderna.
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Assim como o Grau de Mestre, a lenda Hirâmica e outras tantas
práticas, foi (a Instalação) introduzida gradualmente nos seios
das Lojas Inglesas, tal qual o foi, posteriormente, introduzida
nos demais Ritos praticados no Brasil.
Entretanto, o que queremos demonstrar, efetivamente, é que a
condição de Ex-Venerável ou Mestre Instalado, com ou sem
cerimônia de instalação e posse, sempre existiu, inclusive e
principalmente nos primórdios da Maçonaria Moderna.
Podemos comprovar através do mesmo trabalho de Nevile, onde
diz: "...A contribuição mais importante nas nossas transações
para esta parte da minha tese é o trabalho feito pelo Irm.'.
Norman B. Spencer (premiado com o Prize Essay) sobre "A
Cerimônia de Instalação" (AQC 72). No curso do seu argumento e
nos comentários que se seguiram, diversos fatores significantes
são esclarecidos. O primeiro é que na ocasião da Constituição de
1723, e portanto presumivelmente em um período anterior àquela
data, existiu no mínimo na ocasião de formação de uma nova
Loja, alguma cerimônia especial, com um Sinal ou Sinais, Palavra
e Toque, que era somente para ser comunicado para um Maçom,
que era para assumir a posição de 'Mestre encarregado de uma
Loja de Companheiros'".
Ainda a Constituição de Anderson em pelos menos dois artigos
reconhece a figura do ex-Mestre de Loja: no Artigo IV e no artigo
02 dos Regulamentos Gerais, quando trata, no primeiro, dos
requisitos para assumir o cargo de Grande Vigilante (“... nem
Grande Vigilante antes de ter sido Mestre de Loja...”) e no
segundo, quando estabelece a substituição do Mestre de Loja
impedido para o cargo (“... não se algum Irmão que tenha sido
Mestre desta Loja anteriormente estiver presente; pois neste caso
a autoridade do Mestre ausente reverte para o último (grifo
nosso) Mestre presente...”).
Tendo sido o título de Mestre, posteriormente, transformado em
Grau – pois até então, em Loja de Companheiros, só era Mestre o
eleito para o cargo – a condição de Mestre Instalado vem resgatar
a necessária diferenciação daqueles Maçons que foram em seu
momento eleitos para dirigir uma Loja, tendo, portanto
experiência e autoridade suficientes para assim serem
distingüidos.
Entende-se que ante a deterioração das relações humanas e o
declínio moral da sociedade, a própria Maçonaria sofre o reflexo
e tem preparado mal seus integrantes, o que faz com que se
duvide, em alguns casos, da autoridade de um determinado
elemento, unicamente pela condição que ostenta, o que não
ocorria nos tempos imemoriais, mas daí a dizer que a condição
de Instalado ou ex-Venerável foi inventada, já é outra história.
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As Armadilhas da Perfeição
Irmão Jurandy Cordeiro de Souza Júnior
A perfeição impõe ao homem o controle total sobre a vida, não
abrindo espaço à experiência, à pesquisa e à livre criação. Ao
negar-lhe qualquer possibilidade de erro, este homem está se
impedindo de aceitar a si mesmo e de buscar o seu
conhecimento interior.
O conceito de perfeição, que a cultura ocidental considera como
sinônimo de valor máximo em todas as ordens, foi exaltado por
certa expressão histórica do cristianismo como o mais sagrado
dos imperativos para o gênero humano: ser perfeito como Deus é
perfeito.
Os que vivem tomados por esta dinâmica acusam uma sensação
constante de inadequação, sentindo-se malfeitas e incapazes de
aceitar os próprios erros. Vivem na presença de um juiz
implacável. Descobrem-se desprovidos de espontaneidade,
necessitando funcionar com a precisão de um relógio suíço,
vivendo em função de normas, programas e certezas, como se
tudo fosse um laboratório.
A perfeição exige seres frios emocionalmente, que se nutrem de
desestima, de sentimentos de culpa e de remorso todas as vezes
que cometem um erro ou insucesso. Seus atos tem a
necessidade de ser aprovados pelo juiz interior e pelos outros.
O ideal de perfeição exerce um controle sobre a nossa realidade,
não havendo espaço para a espontaneidade, impedindo a
pesquisa, sondagens ou experiências e aventuras.
Aceitar as próprias limitações é aceitar a si mesmo, daquilo que
se é realmente, sem alienar-se de nada nem do passado nem do
presente. Quem é dominado pela idéia de ser perfeito funciona
com uma espécie de "repelente", mas ao repelir-se quando erra,
está errando porque se rejeita. A perfeição predispõe a pessoa a
tratar com antipatia tudo o que é imperfeito, sendo muita baixa
a sua tolerância com o que se afasta do perfeito.
Para ser feliz, o homem deve aceitar-se tal como é. Nenhum
outro animal, exceto o homem, dá-se ao desprezo devido às
próprias imperfeições. O conceito que temos de perfeição nos faz
elaborar conceitos, emoções e comportamento de tal modo que
poderemos ser vítima de uma psicologia da perfeição, exigindo
que o nosso sistema mental trabalhe de forma indefectível e
infalível, admitindo que o erro e o insucesso são inimigos da
vida.
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Mas é sabido que o erro é a matéria-prima da vida, podendo
surgir numerosos recursos, e oferece a oportunidade de limar as
asperezas de nossa conduta em relação a nós mesmos e aos
outros.
O verdadeiro sucesso está em tirar proveito de nossas fraquezas,
fazer um uso construtivo de nossos erros. A perfeição
caracteriza-se pelo excesso, na ansiedade de ir cada vez mais
para cima, sobressair-se, de estar por cima.
Se mudarmos o modo de pensar poderemos alterar a nossa
relação com este fardo de imperfeições que carregamos.
Conhecer nosso limite poderá consequentemente orientar o
sistema mental de tal modo que as reações emocionais e
comportamentais em relação a nós mesmos, aos outros e à vida
em geral, se torne um exercício constante de adaptação à
realidade, proporcionando mudanças com qualidade.
Não temos como não cometer erros, não ter defeitos, podemos
porém aprender a servir-nos deles. O sistema mental coloca-se
na condição de aceitar os próprios defeitos. A perspectiva produz
representações internas aptas à aceitação de si.
A perspectiva do limite reorienta a pessoa para aquilo que ela
realmente é. Nessa reorientação não sofremos uma limitação, ao
contrário, aceitamos nossa própria realidade limite. Nesse caso,
aceitamos algo essencial: o próprio eu.
***
Baseado no primeiro capítulo do livro:
Respeita o teus Limites - Fundamentos Filosóficos da Terapia da
Imperfeição, de Ricardo Peter (São Paulo, Paulus, 1999).
***
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Fundação Hermon
O Canteiro e Irmão Luiz Lunardelli.
Em Santa Catarina, a Fundação Hermon, entidade sem fins
lucrativos, mantida por um grupo de mais de 150 Lojas
Maçônicas de diversas cidades, vem fazendo um trabalho digno
de destaque. Abaixo, as finalidades da Fundação, definidas em
seu estatuto, que foi aprovado em 21 de abril de 2001:
Art. 3º
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A HERMON tem por finalidade:
I
criar, instalar e manter estabelecimentos de ensino de
educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e de
educação profissional de nível técnico, além de ensino
superior;
II
criar instalar e manter centros de pesquisas e extensão,
nas áreas da educação, saúde, assistência social, turismo
e ecologia, informática e prestação de serviços;
III
criar, instalar e manter centros especializados de
formação profissionalizante, voltados ao ensino, à
ocupação e à integração de crianças e adolescentes
socialmente carentes;
IV
proporcionar integral desenvolvimento a seu corpo
discente, habilitando-o ao pleno ajustamento ao meio
social, com ênfase aos valores morais, ao civismo, à
família, à justiça, à liberdade, à igualdade e à
fraternidade, sem distinção de raça, cor, credo ou
condição econômica e social;
V
instalar e explorar orgãos de comunicação social, dentre
os quais jornais, revistas, emissoras de radiodifusão de
sons e imagens (rádio e televisão), exclusivamente com
fins educativos e culturais;
VI
instalar e manter centros de desenvolvimento esportivo,
social e cultural que ensejem plena integração aos corpos
discente e docente, funcionários, familiares e comunidade
em geral;
VII
estimular a criação de cooperativas de crédito e de
consumo entre seus funcionários e membros das Lojas
Instituidoras;
VIII
instalar, explorar e manter alojamentos, pousadas ou
hotéis e seus respectivos restaurantes ou cozinhas
industriais, visando ao atendimento e à hospedagem de
atletas, discentes, docentes e membros da coletividade;
O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Art. 4º
IX
instalar e manter empresas provedoras de Internet,
criação, desenvolvimento ou manutenção de “software”
com finalidades educativas e como maneira de ampliar e
aprimorar o ensino;
X
instalar e manter creches, ambulatórios médicos e
odontológicos, enfermarias e hospitais, para atendimento
de seus projetos e programas assistenciais;
XI
promover estágios e excursões de caráter científico e
cultural;
XII
patrocinar o intercâmbio com outros centros culturais e
científicos;
§1º
Toda e qualquer modalidade de ensino, saúde e
assistência social a ser mantida pela HERMON
dependerá de autorização dos órgãos competentes.
§2º
A HERMON, para a consecução de suas finalidades,
poderá:
I
firmar convênios ou contratos de qualquer
natureza, inclusive de comodato ou de cessão de
uso, com órgãos e entidades públicas ou privadas,
tanto para as áreas de interesse pedagógicoeducacional, saúde e assistência social como para
as de gestão financeira e administrativa;
II
estabelecer relações com outras congêneres e
organizações econômicas, bem como promover
trabalhos e pesquisas de caráter cultural e
científico;
A HERMON organizar-se-á em tantas unidades ou
departamentos quantos sejam necessários para o
atendimento de suas finalidades estatutárias, em qualquer
ponto
do
território
nacional,
todos
regidos
por
Regulamentos Internos específicos.
O nosso Irmão Luiz Lunardelli, Presidente da Fundação, ao
trocar mensagens com a redação de O Canteiro, informou que a
primeira unidade, o Centro de Educação Infantil Hermon, será
inaugurada no próximo dia 2 de dezembro, em Palhoça,
município da região metropolitana de Florianópolis. Além disso,
o Irmão Lunardelli informou que há contrato recente, assinado
com um grande banco, para um projeto de alfabetização de
adultos em 50 municípios do estado.
Conheça mais sobre a Fundação Hermon no endereço:
www.fundacaohermon.cjb.net
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O Canteiro, Ano I - no. 1 - novembro de 2001
Outro Esbarrão - Editoras HUCITEC e UNESP
O Canteiro
As duas editoras, Hucitec e UNESP, de São Paulo, ofereceram
uma coleção muito interessante, chamada Paidéia, organizada
pelo professor Paulo de Salles Oliveira, da Universidade de São
Paulo. No trabalho de abertura do primeiro volume, "Caminhos
da Construção da Pesquisa em Ciências Humanas",
encontramos algo que gostaríamos de dividir, como maneira de
recomendar a leitura do trabalho completo.
Escreveu o professor Paulo, dando seqüência a um
desenvolvimento sobre a importância do método na condução
das pesquisas, logo depois de citar a professora Marilena Chauí:
[...] A mesma autora nos lembra, retomando os gregos antigos,
que pensar é promover um passeio da alma.1 Como aqui se trata
de
estudar
diferentes
propostas
teórico-metodológicas,
fundamentando-se na leitura, intelecção, discussão e elaboração
de associações possíveis, dialogando com autores consagrados,
ler é o passo inicial. "Ler" - prossegue ela, em outra formulação - "é
aprender a pensar na esteira deixada pelo pensamento do outro.
Ler é retomar a reflexão de outrem como matéria-prima para o
trabalho de nossa própria reflexão." 2.
Supõe ultrapassar muitas práticas enviesadas, tais como: ler de
modo exterior, sem se importar em distinguir as peculiaridades do
texto em si; ler pinçando o que interessa, segundo a conveniência
do (muito descuidado) leitor; ler de maneira fragmentária, sem
recompor o encadeamento das idéias pelas quais um autor
constrói seu pensar; ler um texto usando lentes e referenciais
estranhos ao autor que o concebeu.
Longe disso, ler implica identificar os significados que o autor
confere às questões estudadas. A boa colheita na leitura, explica
Alfredo Bosi, está em distinguir e escolher adequadamente os
sentidos originalmente propostos.
"A palavra que eu leio (lego: colho) na sua ingrata renitência sobre
a página do livro desafia-me como a pergunta da Esfinge: a
resposta pode variar ao infinito, mas o enigma é sempre o mesmo:
o que eu quero dizer? Ler é colher tudo quanto vem escrito. Mas,
interpretar é eleger (ex-legere: escolher), na messe de
possibilidades semânticas, apenas aquelas que se movem no
encalço da questão crucial: o que o texto quer dizer? [...]" 3
Afinal, o que é Paidéia, o nome dado à coleção? Na nota editoral,
no mesmo primeiro volume, a professora Yara Maria de Carvalho
explica:
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O conceito de Paidéia que define e caracteriza a coleção é de
origem grega. Para os antigos gregos todas as formas de
expressão humana - filosofia, poesia, ginástica, música, retórica,
pintura, escultura, artes e ciências - aspiravam, no plano dos
princípios, formar e cultivar o Homem. Formação integral é o
sentido de Paidéia.
Encerramos a recomendação por aqui...
Notas:
1. CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo : Ática, 1994, p.
151.
2. CHAUÍ, Marilena. Os Trabalhos da Memória. In. BOSI, Ecléa.
Memória e Sociedade, "Lembranças de Velhos", 3ª edição, São Paulo
: Companhia das Letras, 1994, p. 21.
3. BOSI, Alfredo. "A Interpretação da Obra Literária". In Céu, Inferno.
Ensaios sobre crítica literária e ideologia. São Paulo : Ática, 1988,
pp. 274-5.
***
Boa Leitura
O Canteiro
Em cada número, estaremos indicando duas obras maçônicas e
de interesse geral, no sentido de manter a coerência da proposta
de Cultura, Maçonaria e Ação Social.
A Revolução dos Bichos
George Orwell
Globo - 2000
(Animal Farm, de 1962)
Antimaçonaria e os Movimentos
Fundamentalistas do Fim do Século XX
Irmão Descartes de Souza Teixeira
GLESP - 1999
24 de 24
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