INCA. Diretrizes para a vigilância do câncer relacionado ao trabalho

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Mortalidade por Neoplasia Maligna em Trabalhadores rurais do Vale do
São Francisco, Brasil
Introdução: A realidade do acometimento e mortalidade por câncer na
sociedade é algo que nos últimos anos tem adquirido destaque dentro das estratégias
políticas da Saúde Pública. Apesar de etiologia multifatorial, o desencadeamento de
tumores malignos associados à exposição ocupacional torna-se cada vez acentuada e
evidenciada em estudos. A contaminação por agrotóxico é uma realidade descrita em
diversos estudos apontando o trabalhador rural como o profissional mais propenso de
desenvolver alguma neoplasia maligna. Atualmente, a agricultura é um campo de
trabalho indicado como uma das ocupações mais perigosas de todos os tempos (CLAPP
RW, 2008). E considerando a região de Petrolina e Juazeiro como uma das regiões
agrícolas mais dinâmicas do Nordeste Brasileiro, a realidade frente ao uso dos
agrotóxicos é bastante preocupante. Dentre os agentes tóxicos responsáveis por mais da
metade das mortes/acometimento por câncer estão os metais, os agrotóxicos, os
solventes orgânicos, formaldeído e as poeiras (resultado da degradação intencional ou
acidental de metais e agrotóxicos) (EUROGIP, 2010).
De acordo com NUNES; TAJARA, 1998 apud Bedor, 2008 nas intoxicações
agudas, a contaminação/exposição do organismo com o composto químico ocorre em
evento único ou por várias vezes em intervalo curto de tempo. As manifestações clínicas
são imediatas, necessitando de atendimento médico. As intoxicações crônicas
caracterizam-se por exposições contínuas de baixas concentrações ao longo do tempo,
em muitos casos o contato inicia-se desde a infância. De acordo com informações do
Ministério da Saúde, no Brasil mais de 400.000 pessoas são contaminadas por
agrotóxico ao ano (Moreira et. al., 2002). Daí investigar a epidemiologia do câncer
ocupacional torna-se fundamental para a construção de estratégias dentro dos locais de
trabalho que minimizem os riscos para o desenvolvimento de alterações fisiológicas
malignas. Nesse sentido, o objetivo foi analisar a mortalidade por neoplasia maligna,
avaliando sua relação com características demográficas, em trabalhadores rurais do Vale
do São Francisco entre 1999 e 2010.
Material e Métodos: Trata-se de uma pesquisa com abordagem quantitativa, cuja fonte
de informações foi as Declarações de Óbitos (DOs) presentes nos estabelecimentos da
Vigilância Epidemiológica em Petrolina- PE e Juazeiro-BA, mediante a aprovação e
entrega das Cartas de Anuência. As DOs eram retiradas dos acervos e avaliadas quanto
a causa básica de morte, ocupação, idade e sexo. O recorte temporal da pesquisa
compreendeu no período de 1999 a 2010. A amostra foi constituída por 430 declarações
de óbitos com causa básica de morte alguma neoplasia maligna de acordo com a
classificação do CID-10. Para análise estatística contou-se com as ferramentas da
estatística descritiva, os testes quiquadrado e de proporção.
Resultados e Discussão: Dentre os dados analisados constou-se que as principais
neoplasias notificadas responsáveis pela causa básica de morte entre a população de
trabalhadores rurais, foram: neoplasias malignas de próstata; de pulmão; estômago;
encéfalo; colo de útero; esôfago e mama, respectivamente. Por meio das taxas de
prevalência tem-se que os trabalhadores rurais do sexo masculino (69%) foram os mais
acometidos por mortes provocadas por câncer do que as trabalhadoras mulheres. Em
relação à faixa etária mais prevalente dentre a mortalidade por câncer nos trabalhadores
rurais, destaca-se o grupo etário de 70 a 79 anos 79 o mais prevalente (22%), com a
principal taxa de mortalidade por neoplasia maligna foi o câncer de próstata com 50,02
casos por 100.000 mil habitantes. Os óbitos registrados com valores etários acima de 80
anos apresentaram uma das menores taxas dentre os intervalos estudados.
Utilizando os testes estatísticos evidenciou-se que as características faixa etária e o
sexo, mantém uma relação quanto às neoplasias notificadas, de modo que, a partir da
amostra, foi percebido que os homens com idade mais avançadas (acima dos 50 anos)
são mais acometidos do que as mulheres. Já no sexo feminino foi evidenciado que essas
são mais acometidas em outras faixas (entre 30 a 79 anos).
Além disso, ao relacionar as principais neoplasias notificadas e o sexo dos participantes,
observa-se que o acometimento independe do sexo (p-value = 0,35). Entre as principais
neoplasias e a população rural e urbana houve significância estatística entre neoplasias
de mama, fígado e pâncreas, respectivamente, na população urbana.
Em síntese, os resultados indicam que ao analisar separadamente a variável sexo com as
variáveis, faixa etária e principais neoplasias notificadas conclui-se que homens e
mulheres apresentam grupos etários diferentes em relação ao acometimento por câncer,
porém, trabalhadores rurais do sexo masculino e feminino encontram-se igualmente
expostos aos riscos de morte por câncer para àquelas neoplasias que não estão
diretamente relacionadas com o sexo.
Sabe-se que o câncer decorre da associação entre a exposição a substâncias
cancerígenas e trabalhadores com características genéticas peculiares. Desse modo, as
exposições combinadas de certos agentes podem gerar efeito sinérgico, ou seja,
potencializar fatores para o câncer já evidenciados ou presentes no organismo. Isso
ocorre quando o efeito da combinação é maior do que o esperado dos componentes
individualmente. Esse efeito tem sido encontrado em exposições a múltiplos
cancerígenos, isso é, certas combinações podem induzir a aumento na incidência de
câncer ou reduzir o período de latência (BEDOR, 2008).
Um estudo do Instituto Nacional do Câncer e o Ministério da Saúde sobre as Diretrizes
para a vigilância do câncer relacionado ao trabalho foram elencados os principais
intercessores para os principais cânceres que acometem a população. Em relação ao
câncer de mama, a junção de agentes como agrotóxicos, benzeno, campos
eletromagnéticos de baixa frequência, campos magnéticos, compostos orgânicos
voláteis, hormônios, dioxinas, caracterizavam-se como os principais fatores
desencadeadores principalmente para esse tipo de neoplasia (INCA, 2012).
A população masculina também sofre com a sobreposição de fatores de risco, porém,
em menor intensidade em relação mulheres pelo fato das oscilações biológicas
referentes à produção de hormônios ocorrerem em menor intensidade dentre os homens.
Apesar de não ter sido evidenciado no estudo, existe a prevalência de certos tipos de
cânceres em relação ao sexo, a citar as neoplasias malignas de estômago, esôfago e
pulmão que tendem a acometer em maior grau o sexo masculino.
Os resultados indicam que não há relação significativa entre as principais neoplasias
notificadas e à condição do domicílio (rural ou urbana). O resultado do estudo corrobora
com as demais pesquisas quando estas evidenciam que independentemente das
localizações sóciodemográficas ambos os grupos encontra-se expostos a fatores de risco
diversos. Nas cidades, a exposição pode ocorrer por exemplo,
por meio da
contaminação alimentar com a presença de altos níveis de agrotóxicos em frutas,
legumes e verduras, no campo, a exposição pode ocorrer pelo contato direto com os
venenos agrícolas durante o processo de trabalho nas lavouras.
É visível e preocupante a calamitosa situação da população frente ao câncer em diversas
regiões do país inclusive na região do Vale do São Francisco. Dentre os inúmeros
fatores desencadeadores das neoplasias existem comprovadamente em estudos àqueles
intrinsecamente relacionados à exposição a agentes químicos, a citar os agrotóxicos.
À falta de informações técnicas sobre os agentes químicos, a pouca ou nenhuma
fiscalização efetiva quanto ao tipo e quantidade de agentes utilizados, a escassez de
serviços integrados de saúde que contemplem ações educacionais (FARIA, 2008),
abrangendo mecanismos da vigilância sanitária e epidemiológica em busca da promoção
e proteção em prol a saúde do trabalhador e do meio ambiente são alguns dos problemas
vigentes na realidade do Vale do São Francisco.
O presente estudo visou justamente demonstrar por meio das análises estatísticas a
situação da mortalidade por câncer na população do Vale do São Francisco, a situação
clínica e epidemiológica dos trabalhadores rurais referente à exposição aos riscos
causados pelo uso indiscriminado por agrotóxicos.
Em síntese, evidencia-se que a carga de risco atual do câncer na região comporta-se
como um grande problema no âmbito da saúde pública evidenciando a necessidade
contínua de realização de pesquisas sobre a evolução das neoplasias no Brasil.
Contudo, as avaliações e pesquisas sobre o comportamento de câncer no Brasil e na
região do Vale do São Francisco deverão sempre levar em consideração a dificuldade
dos registros da doença no país. A falta de documentos preenchidos corretamente e a
não alimentação contínua dos dados o que acaba por dificultar consideravelmente a
análise e a conclusão de resultados fidedignos.
Referência Bibliografia:
BASTOS,
Lívia
Dias
Mangueira. Caracterização
clínico-epidemiológica
da
mortalidade por neoplasia maligna em trabalhadores rurais do Vale do São
Francisco. 2011. Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Vale do São
Francisco, Campus Petrolina , 2011.
BEDOR, C. N. G. Estudo do potencial carcinogênico dos agrotóxicos empregados
na fruticultura e sua implicação para a vigilância da saúde. 2008. Doutorado em
saúde Pública, Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães-FIOCRUZ, Recife-PE, 2008.
CLAPP RW, JACOBS MM, LOECHLER EL. Environmental and occupational causes
of cancer: new evidence 2005-2007. Rev Environ Health. 2008;23(1):1-37.
EUROGIP. Cancers d’origine professionnelle: quelle reconnaissance en Europe?
Eurogip. France. 2010. [cited 2010 Sep 30 ]. Available from: http://www.eurogip.fr/
fr/docs/EUROGIP_RapportRecoCancerspro_49F.pdf
FARIA, N. M. X.; ROSA, J. A. R.; FACCHINI, L. A. Intoxicações por agrotóxicos
entre trabalhadores rurais de fruticultura, Bento Gonçalves, RS. Revista Saúde
Pública. São Paulo vol.43, n.2, p. 335-344, 2009.
INCA. Diretrizes para a vigilância do câncer relacionado ao trabalho / Instituto
Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação Geral de Ações
Estratégicas, Coordenação de Prevenção e Vigilância: Área de Vigilância do Câncer
relacionado ao Trabalho e ao Ambiente ; organizadora Fátima Sueli Neto Ribeiro. –
Rio de Janeiro : Inca, 2012.
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