Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. RELATÓRIO DE PESQUISA LODO DE ETE DA EMPRESA DE RECICLAGEM DE PAPEL ABBASPEL COMO INSUMO PARA A NEUTRALIZAÇÃO DA ACIDEZ DO SOLO. ESTUDO DE INCUBAÇÃO EM SOLO RESPONSÁVEL: Eng. Agr. M.Sc. José Alfredo da Fonseca Canoinhas, 15 março de 2013. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. APRESENTAÇÃO O presente relatório apresenta os resultados de experimentação com lodo de estação de tratamento de efluentes da indústria Abbaspel, visando testar a hipótese de que o lodo é eficaz para a neutralização da acidez do solo, além de influenciar outros atributos desse mesmo solo. O resíduo e sua aplicação com o viés agronômico é fruto do esforço da Empresa no sentido de adequar o seu passivo ambiental, por um lado, e de outro, do interesse do Estado em gerar tecnologias aplicáveis pelo setor rural com ganhos técnicos, econômicos e ambientais para a sociedade. Assim, essa parceria Epagri/Abbaspel é uma iniciativa de integração dos setores produtivos do Território do Planalto Norte Catarinense visando perenizar as pessoas e as instituições. Canoinhas, 15 de março de 2013. Eng. Agr. M.Sc. José Alfredo da Fonseca CREA 6242-3 Epagri - Estação Experimental de Canoinhas Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. INTRODUÇÃO O desenvolvimento sustentável pressupõe equilíbrio duradouro, o que remete para a necessidade de gerenciar adequadamente todas as variáveis envolvidas em qualquer ambiente. Dessas, o gerenciamento adequado dos resíduos, passivos ambientais, são de grande importância, pois podem interferir em equilíbrios sensíveis. O Planalto Norte Catarinense tem nos produtos oriundos da produção e da reciclagem de papel importante componente para a construção do seu PIB. O setor integra um contingente expressivo de pessoal técnico e de mão de obra no território, ao mesmo tempo em que explora os recursos naturais desse mesmo território. Um dos objetivos da reciclagem de materiais é reduzir a contaminação ambiental proveniente de resíduos gerados pela humanidade. A transformação ou a reciclagem de papel em novos produtos a serem comercializados como, por exemplo, papel higiênico e papel toalha, gera resíduos, também denominados de lodo de ETE. A produção desse resíduo ocorre a partir da perda de fibra de celulose e, principalmente, da remoção da carga mineral contida nas aparas de papel durante o processo de reciclagem. O lodo de aparas apresenta características de uma massa fibrosa de cor acinzentada, sendo classificado como um resíduo de classe IIA não inerte (ABNT, 2004). Mais recentemente as empresas vêm buscando alternativas de descarte deste resíduo, com o intuito de evitar passivos ambientais. Uma alternativa de disposição deste resíduo é a alocação em aterros sanitários. Todavia, esta estratégia possui custo elevado. Em adição, este resíduo apresenta baixa capacidade de drenagem de água, o que praticamente inviabiliza a utilização de aterros para disposição deste produto. Entre as alternativas estudadas, a Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. disposição no solo visando a adequação do pH do solo às culturas tem merecido atenção cada vez maior (Fierro et al., 1999; Nemati et al., 2000; Foley & Cooperband, 2002). No resíduo gerado pelo processo de reciclagem ocorre a presença de compostos que podem servir como corretivos da acidez do solo, principalmente, óxidos de cálcio (CaO) e de magnésio (MgO). Além disso, a aplicação deste resíduo ao solo pode elevar os níveis de fósforo (P) no solo, macronutriente essencial às plantas e que, em geral, se apresenta em baixos teores nos solos da região Sul do Brasil. Enfatiza-se que estes resíduos também apresentam em sua constituição elementos que, potencialmente, podem causar danos ao ambiente, tais como: Chumbo (Pb), Cádmio (Cd), Cromo (Cr), Níquel (Ni) e Mercúrio (Hg), entre outros. Estes metais pesados provêm da tinta contida nas aparas utilizadas no processo industrial. O acúmulo de metais pesados em solos agrícolas, devido a aplicações sucessivas de resíduo, é o aspecto que causa maior preocupação com relação à segurança ambiental necessária para viabilização desta prática. Os metais pesados podem expressar seu potencial poluente diretamente nos organismos do solo, pela disponibilidade às plantas em níveis tóxicos, além da possibilidade de transferência para a cadeia alimentar por meio das próprias plantas ou pela contaminação das águas de superfície e subsuperfície (Chang et al., 1987; Oliveira e Matiazzo, 2001). Assim, é necessário verificar os efeitos do uso desses resíduos sobre a elevação dos níveis desses elementos no solo e nos produtos colhidos. Trabalhos de pesquisa já foram realizados para verificar as variações nas características químicas do solo decorrentes da aplicação de resíduos de fábrica de celulose (Suzuki et al., 1991; Fonseca et al., 2012), resíduo siderúrgico (Prado & Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. Fernandes, 2000), resíduos de curtume e carbonífero (Ferreira et al., 2003) e lodo de esgoto (Anjos & Mattiazzo, 2000; Borges & Coutinho, 2004; Nascimento et al., 2004). Em que pese a potencialidade do produto, a sua adequação aos critérios ambientais lhe é exigida, o que aponta para a necessidade de avaliações criteriosas, sob crivo de metodologias de pesquisa, que avaliem sua eficácia e sua probidade ambiental. A hipótese de estudo do presente trabalho foi de que o produto possui propriedades que o credencia como insumo neutralizador da acidez e fertilizante do solo e não altera, significativamente, o nível de metais pesados no solo. O objetivo foi obter e avaliar indicadores relativos a acidez do solo e de variáveis correlacionadas a ela, dos nutrientes essenciais às plantas e dos principais metais pesados que ocorrem no solo após aplicação do lodo. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. MATERIAIS E MÉTODOS O experimento foi conduzido no período de maio a julho de 2012, em casa de vegetação localizada na estação experimental da Epagri, em Canoinhas-SC, e constou da incubação do lodo de ETE (LETE) em solo coletado na camada de 020cm de um Nitossolo Háplico contendo as características químicas demonstradas na tabela 1. Tabela 1 – Atributos químicos do solo incubado. Canoinhas - SC, 2012. pH H O Índice SMP 4,7 5,1 2 P K MOS Al Ca Mg 3 mg/dm³ mg/dm³ g/dm cmolc/dm³ cmolc/dm³ cmolc/dm³ 5,2 H+Al cmolc/dm³ CTC pH 7.0 cmolc/dm³ Al (valor m) 10,9 15,6 35 66 47 2,5 2,7 1,8 % Saturação na CTC a pH 7.0 Bases K Ca Mg Ca/Mg Ca/K Mg/K 30 1,5 1,1 17,3 11,6 Relações 15,9 10,6 *P-fósforo, K-potássio, MOS-materia orgânica do solo, Ca-cálcio, Mg-magnesio, H+Al-hidrogênio+alumínio, CTCcapacidade de troca de cátions, valor m- saturação da CTCefetiva por Al, Bases-Ca+Mg+K. O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado com 8 tratamentos e 4 repetições. Os tratamentos constaram das seguintes doses do LETE: 1) 0 t/ha; 2) 40 t/ha; 3) 80 t/ha; 4) 120 t/ha; 5) 200 t/ha; 6) 320 t/ha; e 7) 480 t/ha, correspondendo, respectivamente, a 0%, 50%, 100%, 150%, 250%, 400% e 600%, da quantidade recomendada pelo índice SMP (ISMP) para a elevação do pH do solo à 6,5 (CQFS–RS/SC, 2004). Para termos comparativos, foi constituído um tratamento com um calcário dolomítico (CD) comumente usado na região, na dose correspondente a 100% da recomendação para a elevação do pH a 6,5, pelo ISMP. As características químicas medias do lodo de ETE utilizado no experimento estão listadas na tabela 2. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. Cada unidade experimental constou de 6Kg do solo peneirado em peneira com malha de 8mm. Os tratamentos foram adicionados ao solo e, imediatamente, homogeneizados. Tendo vista os altos volumes a serem aplicados, houve necessidade de prévia mistura do lodo com água, a fim de obter-se distribuição uniforme do produto. Tabela 2. Características químicas do lodo de estação de tratamento de efluentes. DETERMINAÇÃO UNIDADE QUANTIDADE Umidade 65°C (desidratação) Densidade (picnômetro) Densidade (base seca – picnômetro) pH (CaCl2) Fósforo total (gravimetria) Potássio (HNO3+HClO4) Cálcio (HNO3+HClO4) Magnésio (HNO3+HClO4) Enxofre (HNO3+HClO4 - turbidimetria) Zinco (HNO3+HClO4) Cobre (HNO3+HClO4) Boro (titulação potenciométrica) Manganês (HNO3+HClO4) Ferro (HNO3+HClO4) Alumínio (HNO3+HClO4) Cádmio (EPA 3051) Chumbo (EPA 3051) Cromo (EPA 3051) Níquel (EPA 3051) Mercúrio (EPA 1631, 245.7) Arsênio (EPA 3051) Selênio (EPA 6010) Óxido de Cálcio (cálculo) Óxido de Magnésio (cáculo) Poder de Neutralização (titulação pot.) *IBRA – Instituto Brasileiro de Análise. g/1000g g/cm3 g/cm3 g/1000g g/1000g g/1000g g/1000g g/1000g mg/Kg mg/Kg mg/Kg mg/Kg g/1000g g/1000g mg/Kg mg/Kg mg/Kg mg/Kg mg/Kg mg/Kg mg/Kg g/1000g g/1000g % 680,7 0,88 0,5 7,4 1,6 0,5 166,6 1,7 0,1 314 48,24 0 20,14 1,1 8,1 <LQ 19,82 4,9 <LQ <LQ <LQ <LQ 234,6 2,8 35,63 Em seguida as misturas solo/tratamentos foram colocadas em sacos plásticos escuros mantidos parcialmente abertos visando permitir trocas gasosas. Para a Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. incubação do produto as amostras receberam uma quantidade de água correspondente a 30% do seu peso. Este nível de umidade foi mantido durante toda a fase experimental de incubação do produto. Após 90 dias foram coletadas amostras de solo de cada parcela e enviadas para a Universidade Federal do Rio Grande do Sul para análise dos atributos: pH em água (1:1); H+Al (acidez potencial-tampão SMP); teores de fósforo (P) e potássio (K) (Mehlich I); alumínio (Al), cálcio (Ca), magnésio (Mg), manganês (Mn) e sódio (Na) trocáveis (KCl 1mol L-1); matéria orgânica do solo (MOS) (digestão úmida); enxofre (S) (CaHPO4 500 mg L-1 de P); zinco (Zn) e cobre (Cu) (HCl 0,1 mol L -1); boro (B) (água quente); cádmio (Cd), chumbo (Pb), níquel (Ni), cromo (Cr), molibdênio (Mo), selênio (Se), cobalto (Co) e arsênio (As) (EPA 3050/ICP-OES); e para os teores de Hg, o método EPA 7471 A/vapor frio (USEPA, 1986). Foram calculadas ainda as relações Ca/Mg; Ca/K; Mg/K; CTC; saturação da CTC por bases (V%) e saturação da CTC por alumínio (m%). Os dados coletados foram analisados estatisticamente por meio de análise de variância e teste F. Os indicadores que apresentaram diferenças significativas entre tratamentos a 5 % de probabilidade foram submetidos a análise de regressão, selecionando-se o modelo com o melhor ajuste aos dados analisados. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. RESULTADOS E DISCUSSÃO O teor de argila avaliado diminuiu conforme aumentaram as quantidades de LETE aplicadas (Figura 1). Entretanto, não foram observadas diferenças entre tratamentos até quantidades aplicadas equivalentes a 100% da recomendação pelo ISMP. Os valores observados até essas quantidades aplicadas foram semelhantes aquele obtido pela aplicação da dose recomendada de CD. 60 Teores de argila no solo - % 2 R = 0,93 Y = 25,6279 + 31,3810*exp (-0,0072*X) 55 50 45 40 35 30 25 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha Figura 1 – Evolução dos teores de argila do solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. O aumento do pH do solo pela aplicação dos tratamentos, aumentando as cargas negativas no solo, contribui para a dispersão das argilas. Assim, esse poderia ser um dos efeitos observados nesse estudo. Entretanto, a alta concentração de cátions di (Ca) e trivalentes (Al e Fe), além do alto conteúdo em matéria orgânica (M.O.) presentes no material, trabalham no sentido inverso, ou seja, tem ação agregante no solo. Nesse caso, aparentemente, o efeito dos altos teores de sais preponderaram, possivelmente, através da ocupação das cargas negativas geradas, cumprindo, a partir daí, a função de elo de agregação entre partículas, o que favorece a floculação (Raij, 2008). Observe-se que o efeito vai no Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. sentido da agregação em detrimento da dispersão, o que é positivo. Contudo, até a dose máxima recomendada, 80t/ha, as diferenças não foram significativas. Na figura 2 estão apresentados os resultados referentes aos efeitos do LETE e do CD sobre o pH do solo, três meses após incubação. 8,0 7,5 pHH2O do solo 7,0 6,5 6,0 5,5 2 R = 0,99 Y = 4,6630+3,0585*(1-exp(-0,0146*X)) 5,0 4,5 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Figura 2 – Evolução pHH2O do solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. Observa-se que a aplicação de 63,8t/ha do LETE foi suficiente para elevar o pH em água do solo a 6,5, o que era esperado pela aplicação de 80t/ha pela recomendação do ISMP (CQFS RS/SC, 2004). Já, pela aplicação dessa última quantidade, o pH alcançou valores em torno de 6,8 e pela aplicação do CD, 5,7. Portanto, verificou-se alta eficácia do produto na elevação do pH. Fonseca et al. (2012) trabalhando com resíduos de indústria de celulose observaram comportamento semelhante, atribuindo como uma das possíveis causas para tal comportamento a natureza do resíduo, produto de reações químicas durante processo fabril, que lhe confere maior produto solubilidade comparativamente ao CD, oriundo de rocha. Há que se considerar, entretanto, que para a aplicação e avaliação da capacidade de neutralização da acidez do solo do LETE, houve Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. necessidade de fazer-se a mistura desse com água, dado ao grande volume aplicado e a necessidade de distribuição homogênea, o que, certamente, favoreceu a rápida ação do produto. Entretanto, fica caracterizada a capacidade intrínseca do produto quanto a sua capacidade de neutralizar a acidez quando solubilizado, por ocasião de aplicação do mesmo no solo. Infere-se também, que a velocidade de ação do LETE na forma sólida quando aplicada ao solo natural, provavelmente, não seja a mesma, sendo os resultados obtidos em maior espaço de tempo, porém não superior ao calcário (Balbinot et al., 2010). As observações a serem feitas em experimentos implantados no ambiente real de produção, já em curso, serão balizadores para o afinamento dessas observações. A alta correlação existente entre o pH, o teor de alumínio (Al), a acidez potencial (H+Al) e a saturação por bases (V%) no solo ficou demonstrada pelos dados observados nesse experimento (Figuras 3a, 3b, 3c e 3d). Apesar dos teores de Al contidos no LETE, houve drástica redução dos teores desse metal no solo pela aplicação do lodo. Os dados obtidos revelam a mesma efetividade do LETE, comparativamente ao CD (Figura 3b). A presença de Al3+ em teores altos na solução do solo, além de ser tóxico à maioria das plantas, pode interferir na disponibilidade de outros nutrientes. Porém, quando o pH do solo, determinado em água, atinge valores próximos a 5,5, o Al 3+ é reduzido a, praticamente, zero (Souza et al., 2007), fato ratificado pelos dados obtidos nesse trabalho. A precipitação do Al como gibsita já é conhecimento de domínio. Além disso, no presente estudo, o efeito floculante observado pela aplicação do LETE, sugere a possibilidade do envolvimento do Al em complexos organo-minerais e nas estruturas do solo agregado, reforçando a diminuição da solubilidade do cátion. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. 2,0 Teores de Al no solo - cmol c/dm3 8,0 pHH2O do solo 7,5 7,0 a) 6,5 6,0 5,5 R2=0,99 Y=4,6630+3,0585(1-exp(-0,0146*X)) 5,0 R2=0,95 Y=1,8200*exp(-0,3436*X) 1,5 1,0 b) 0,5 0,0 0 4,5 0 200 400 600 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. 100 12 Saturação de bases do solo - % Teores de H+Al no solo - cmolc/dm3 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. R2=0,99 Y=1,1146+10,0808*exp(-0,0347*X) 10 8 c) 6 4 2 90 80 70 d) 60 50 R2=0,99 Y=35,0554+60,7124*(1-exp(-0,0331*X)) 40 30 0 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. 0 200 400 600 Quantidades do LETE aplicadas - t/ha. Figura 3 – Evolução do pHH2O (a), dos teores de Al trocável (b), do H+Al (c) e da saturação por bases (d) no solo pela aplicação de LETE (○) e CD (●). Canoinhas, 2013. A saturação da CTC do solo por bases atingiu 79% com a aplicação do equivalente a 50% do ISMP (Figura 3d). Valores de saturação por bases da CTC do solo próximas a 70% atendem as necessidades da maioria das espécies cultivadas (CQFS–RS/SC, 2004). Esse valor foi atingido com a aplicação de apenas 37% da recomendação. A aplicação do CD na dose recomendada elevou a saturação de bases do solo a 81%. Evidencia-se, portanto, que o LETE concorre para a obtenção de ambiente químico do solo desejável para os cultivos com provável redução das quantidades de equivalentes químicos aplicadas. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. Pela composição do LETE, material calcítico, a sua aplicação interfere em relações de equilíbrio entre nutrientes importantes no solo que podem, por sua vez, interferir na eficiência nutritiva das plantas, para além daquelas decorrentes da reação do solo. As relações Ca/Mg, Ca/K e Mg/K são afetadas nesse contexto, necessitando que se lhes avaliem. Os teores de Ca, como esperado, foram fortemente afetados pela aplicação do LETE, chegando a atingir 15,6cmolc/dm3 com a aplicação da quantidade equivalente a 100% do ISMP. Já os teores de Mg, diminuíram na medida do aumento das quantidades aplicadas (Figura 4a). Essa última constatação não se constituí em fato esperado para esses casos. Esperava-se a não alteração ou um pequeno aumento dos teores de Mg no solo, tendo em vista haver no LETE pequenas quantidade de MgO. Teoricamente, duas das possíveis causas que podem estar envolvidas nesse fenômeno são: primeiro, a precipitação do Mg, mais instável do que o Ca, com ânions advindos da dissolução do LETE e, segundo, eventuais substituições de cátions em nível estrutural de minerais do tipo 2:1 eventualmente presentes no Nitossolo Háplico utilizado no experimento, envolvendo o Mg. Embora haja baixa probabilidade de os solos tropicais conterem esse tipo de mineral em quantidades significativas, Silva et al. (1995) observaram a presença de micas em Latossolos do Estado do Paraná e demonstraram a ocorrência da liberação de K dos mesmos para o solo. Contudo, essas são considerações teóricas, já que no âmbito de avaliação do presente trabalho não foram possíveis tais determinações. Nesse contexto a relação Ca/Mg (Figura 4b) sofreu elevações consistentes, atingindo valores próximos àqueles considerados como limites superiores adequados para a relação. Pela aplicação do CD o valor da relação foi 1,18, valor Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. situado abaixo daqueles de solos nativos, e igual aquele da testemunha (solo já 35 35 30 30 Relação Ca/Mg no solo Teores no solo - cmolc/dm3 trabalhado). 25 20 a) R2 = 0,99 Y = 2,9863+29,8864*(1-exp(-0,0077*X)) 15 10 R2 = 0,68 Y=2,2370-0,0026X 5 25 20 b) 15 10 5 R2=0,94 Y=36,9772*(1-exp(-0,0031*X)) 0 0 0 200 400 0 600 80 600 R2 = 0,78 Y=4,8762-0,0051X 12 Relação Mg/K no solo Relação Ca/K do solo 400 14 70 60 50 200 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. c) 40 R2=0,99 Y=5,9416+69,9411*(1-exp(-0,0080*X)) 30 20 10 d) 8 6 4 2 10 0 0 0 200 400 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. 600 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Figura 4 – Evolução dos teores de Ca-LETE (●), Ca-CD (▼), Mg-LETE (○) e Mg-CD (∆)(a), e das relações Ca/Mg (b), Ca/K (c), da Mg/K (d) no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas 2013. A relação Ca/K também cresceu substancialmente (Figura 4c), sobretudo pelo grande aumento dos teores de Ca ao solo pelo LETE. Assim, a relação seguiu a lógica esperada a partir da composição do LETE. Com a aplicação do CD a relação atingiu valores de 15,1, enquanto que pela aplicação do LETE chegaram a 38, quando aplicadas quantidades equivalentes a 100% da recomendação. A relação Mg/K variou proporcionalmente a variação dos teores de Mg adicionados e disponibilizados no solo (Figura 4d). Pela aplicação do CD obteve-se valor de 13 enquanto que pela aplicação do LETE, 4,5, quando aplicados 100% das Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. quantidades recomendadas de ambos os produtos. A testemunha sem aplicação de corretivos apresentou um valor igual a 5. Do ponto de vista de aplicação corrente do LETE (material calcítico), fica claro pelas relações entre os nutrientes observadas, e mesmo pela concentração individual dos mesmos, que o seu uso deve ser orientado considerando essa especificidade fundamental a fim de preservar esses equilíbrios do solo, embora, atualmente, muitos autores relativizem a importância das relações Ca/Mg, Ca/K e Mg/K em detrimento dos adequados teores desses nutrientes no solo (Oliveira e Parra, 2003; CQFS–RS/SC, 2004; Souza et al., 2007). Pelas quantidades de LETE aplicadas ao solo poder-se-ia incorporar ao mesmo, teoricamente, 64mg/dm3 de P total pela aplicação de 100% da recomendação pelo ISMP. Entretanto, o P disponível situou-se no entorno de 3,9mg/dm3 nessa situação (Figura 5), demonstrando que a maior parte do P aplicado ficou indisponível, segundo o método utilizado. Apesar da elevação do pH disponibilizar cargas negativas no solo diminuindo o poder de fixação de P pelo solo, os processos de sorção, ainda assim, predominaram. Devido ao aumento da força iônica da solução do solo pela aplicação de neutralizadores da acidez, há maior competição entre íons pelos sítios de adsorção pela diminuição de suas atividades, como resultado da formação de pares iônicos (Alleoni et al., 2009). Nesse contexto, é provável que reações outras que não somente aquelas com os óxidos de ferro (Fe), Alumínio (Al) e manganês (Mn) envolvendo troca de ligantes e covalência (Novais et al., 2007) com o ânion fosfato, ocorram. Fosfatos pouco solúveis podem ser formados com os metais pesados (Beckett, 1989). Compostos prováveis e importantes no ambiente gerado pela Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. aplicação do LETE, pH 6,8 e alta concentração de Ca, são os fosfatos de cálcio, que precipitam. Teores de P no solo - mg/dm 3 5,2 5,0 4,8 4,6 4,4 4,2 4,0 3,8 2 R = 0,81 Y = 3,6391 + 0,0031X 3,6 3,4 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Figura 5 – Evolução dos teores de P no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. O quadro descrito ilustra a complexidade que envolve a dinâmica de P no solo. Contudo, a reta obtida a partir das quantidades de LETE aplicadas, apresentam teores crescentes de P no solo. Há, portanto, acréscimos de P disponível no solo pela aplicação do LETE que são mais evidentes na medida do aumento das quantidades aplicadas. Embora tenham ocorrido diferenças entre tratamentos para o teor de S no solo, nenhum modelo pode ser ajustado aos dados (Figura 6). Os teores cresceram rapidamente até a aplicação de 120t/ha de LETE, 150% do ISMP, após o que decresceram rapidamente até estabilizarem-se em valores próximos a 25mg/dm3. Segundo Bissani & Tedesco (1988) a grande fonte de enxofre para o solo é a matéria orgânica. A elevação do pH acelerando a transformação da matéria orgânica do solo e o alto conteúdo dessa no LETE contribuem, fortemente, para explicar o rápido crescimento dos teores de S já com as primeiras quantidades aplicadas. De Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. Marco et al. (2012) observaram aumento da atividade microbiológica no solo pela aplicação de LETE semelhante. Concomitantemente, houve aumento das cargas negativas decorrentes da elevação do pH do solo provocando a dessorção de ânions sulfato. Fonseca (2013), avaliando essa variável pela aplicação de produto similar ao LETE e doses variadas de calcário dolomítico, concluiu que até doses equivalentes a 200% do ISMP, o aumento de enxofre no solo se deve na sua grande maioria aos processos de dessorção do SO42- e não à quantidade adicionada pelo produto. Teores de S no solo - mg/dm3 40 35 30 25 20 15 10 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Figura 6 – Evolução dos teores enxofre no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. A estabilização dos teores coincide com a estabilização do pH, entre outros atributos correlatos, o que pode orientar para a estabilização dos processos de geração de cargas negativas no solo. Os Teores de K no solo foram afetados pela aplicação do LETE, porém nenhum modelo pode ser ajustado aos dados, pela falta de uma tendência clara (Figura 7). Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. Teores de K no solo - mg/dm3 190 185 180 175 170 165 160 155 0 200 400 600 Quantidades de resíduo aplicadas - t/ha. Figura 7 – Evolução dos teores de K no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. A composição do LETE permite afirmar que a aplicação de quantidades equivalentes a 100% da recomendação pelo ISMP agrega ao solo 20mg/dm 3 de K total. A máxima variação observada foi de 26mg/dm 3, valor de importância relativamente baixa para o solo. Os teores de Zn no solo cresceram com o aumento das quantidades de LETE aplicadas. Contudo, esse aumento só foi observado pela aplicação de quantidades acima de 150% da recomendação pelo ISMP (Figura 8). Esse resultado não está em conformidade com a maioria dos estudos que relacionam os efeitos da elevação do pH e a disponibilidade de Zn no solo, que relatam sensível diminuição dos teores desse cátion com a elevação daquele. Altos aportes de LETE, substância de extrema complexidade química, gera, pela sua dissolução, uma solução do solo com grande força iônica. Espera-se daí maiores e mais diversificadas interações entre os componentes químicos presentes, permitindo obter-se maior teor de Zn pela existência no meio de formas mais disponíveis (Alleoni et al., 2009). Fosfatos, carbonatos, sulfatos e outros ânions Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. presentes nesse ambiente concorrem para o sequestro do Zn do meio, podendo, os produtos resultantes, apresentarem menor poder de fixação do Zn do que aquelas que ocorrem por ligações de esfera interna com os óxidos de Fe e Al do solo. Teores de Zn no solo - mg/dm3 1,6 1,4 1,2 1,0 0,8 2 R = 0,85 2 Y = 0,7047 + 0,0027*X - 0,000002*X 0,6 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Figura 8 – Evolução dos teores de Zn no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. Segundo Lindsay (1972), valores altos de pH alteram as formas de Zn no solo, podendo surgir compostos do tipo Zn(OH)2, ZnCO3 e Zn(OH)2.ZnSO4, que são mais solúveis que o Zn-solo. A formação de quelatos do tipo Zn-ácidos fúlvicos oriundos da transformação da MOS, mais solúveis que os húmicos, também poderiam contribuir nesse sentido (Stevenson & Ardakani, 1972). Há que se agregar ainda, nesse contexto, o fato de que o LETE contém Zn, incorporando, portanto, quantidades desse elemento ao solo. Contudo, no contexto desse trabalho essas são discussões em nível teórico, já que as espécies de Zn na solução do solo não foram determinadas e os valores de Zn acrescidos ao solo não apresentam nenhum inconveniente à saúde do solo, pelo contrário, melhoram a disponibilidade desse nutriente às plantas. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. Os teores de Cu no solo diminuiram com o aumento das quantidades de LETE aplicadas (Figura 9). 0,8 Teores de Cu no solo - mg/dm 3 2 R =0,64 Y=0,06122*exp (-0,0025*X) 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Figura 9 – Evolução dos teores de Cu no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. Com a aplicação de quantidades equivalentes a 100% do ISMP os teores de Cu no solo mantiveram-se em níveis considerados altos para solos dos Estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina (CQFS–RS/SC, 2004). Observou-se que o efeito do LETE foi praticamente igual ao do CD. Ao contrário do Zn, o comportamento do Cu, nas quantidades de LETE superiores aplicadas, foi aquele que se esperava. A maior reatividade do Cu em relação ao Zn, a alta afinidade do Cu para formar complexos estáveis com a MOS, mais dinâmica pelo efeito do pH sobre a microbiota do solo, e a natural tendência de formação de complexos de esfera interna com óxidos de Fe e Al, foram, provavelmente, os principais drenos do Cu. A disponibilidade de B no solo foi afetada pela aplicação do LETE. Na figura 10, observa-se que a curva de resposta quando da aplicação do LETE seguiu o modelo exponencial decrescente. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. 0,55 Teores de B no solo - mg/dm3 2 R =0,89 Y=0,2011 + 0,3165*exp (-0,0152*X) 0,50 0,45 0,40 0,35 0,30 0,25 0,20 0,15 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Figura 10 – Evolução dos teores de B no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. Como já abordado, a diversidade química do LETE afetando a força iônica da solução do solo e, por conseguinte, as associações entre entidades químicas, afeta também o B. Contudo, na quantidade aplicada igual a 100% do ISMP, dose máxima recomendada, os teores situaram-se na faixa considerada media a alta para os padrões da maioria dos solos do Sul do Brasil (CQFS-RS/SC, 2004) e, portanto, sem maiores impactos à exploração agrícola. Os teores de Mn no solo, após a aplicação do LETE, seguiram a lógica do conhecimento existente para os casos de elevação do pH do solo, ou seja, a elevação do pH diminuiu, drasticamente, o teor de Mn (Figura 11). No presente trabalho, aplicações de apenas 50% da quantidade máxima recomendada pelo ISMP para a elevação do pH a 6,5 reduziram os teores de Mn no solo a níveis de disponibilidade considerados médios. Quantidades maiores diminuíram os teores a níveis baixos para o bom desenvolvimento das culturas (CQFS, RS/SC, 2004). Deficiências de Mn por excesso de calagem tem sido observadas a campo no Planalto Norte Catarinense. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. 18 2 R = 0,99 Y = 1,0040 + 15,7685*exp (-0,0414*X) Teores de Mn no solo - mg/dm 3 16 14 12 10 8 6 4 2 0 0 200 400 600 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha. Figura 11– Evolução dos teores de Mn no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. Esse indicativo orienta para a importância da adequada orientação técnica quando do uso de produtos neutralizadores da acidez do solo. Os teores de Na, como esperado, tiveram aumentos pela aplicação do LETE (Figura 12). Entretanto, os valores alcançados não se configuram como problemáticos para a manutenção do adequado equilíbrio do solo. A participação do Na na CTC do solo, quando aplicadas quantidades equivalentes a 100% do ISMP, representaram apenas 0,03%, o que esta muitíssimo abaixo dos conteúdos tidos como potenciais causadores de desequilíbrios físicos e químicos ao solo, que, segundo diversas fontes e normas internas de diversos países, variam de 6 a 20% da CTC (Galvão e Freire, 2007). Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. 70 2 Teores de Na no solo - mg/dm 3 60 R = 0,99 Y = 4,2363 + 0,1148*X 50 40 30 20 10 0 0 100 200 300 Quantidades de LETE aplicadas - t/ha Figura 12 – Evolução dos teores de sódio (Na) no solo pela aplicação de LETE (●) e CD (○). Canoinhas, 2013. Os teores de Fe no solo não foram afetados pela aplicação de nenhum dos corretivos. Em que pese os metais pesados - densidade acima de 5 kg dm-3 a 300° K serem elementos naturais e, como tal, existirem em praticamente todos os ecossistemas, podem tornar-se perigosos ao ambiente como um todo e aos seres vivos em especial, quando em níveis acima daqueles observados na maioria dos ecossistemas. Isso remete a necessidade da devida avaliação dos mesmos quando incorporados no solo, dado ao papel preponderante desse na dinâmica ambiental. No presente estudo foram avaliados Hg, Ni, Cr, Pb, Ba, As, Cd, Mo e Se adicionados ao solo através do LETE. Os resultados não acusaram efeitos diferenciados em relação a testemunha, sem a aplicação de LETE, para nenhum dos elementos e quantidades aplicadas (Tabela 3), até quantidades aplicadas iguais 100% da recomendação do ISMP. Nos casos do Ba e do Ni o teste F acusou significância entre tratamentos, entretanto, nenhum modelo pode ser adequado a distribuição, indicando distribuição altamente aleatória. As significâncias estatísticas Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. foram observadas somente com a aplicação de 600t/ha (600% da recomendação), volume aplicado justificável apenas com o fim de estudos. Resultados semelhantes já haviam sido observados em trabalhos anteriores, porém usando o lodo úmido (Balbinot et al., 2010; De Marco et al., 2012). Portanto, o estudo ratificou o não aumento de tais metais no solo, em formas disponíveis. Quando comparados com algumas referências e estudos em condições de solos brasileiros (Tabela 3), observa-se que os teores observados estão compatíveis com aqueles desejáveis para solos de boa qualidade. Por outro lado estão bem abaixo das exigências do USEPA (United States Environment Protection Agency, 1999), embora esses sejam dados avaliados para condições de solos de clima temperado, o que requer cautela na avaliação. Tabela 3 – Teores de metais pesados no solo após incubação com lodo de estação de tratamento de efluentes (LETE) de indústria de reciclagem de papel e de calcário dolomítico (CD). Canoinhas, 2013. Hg Ni Cr Pb Ba As Cd Mo Se Usepa* 8,5 210 1500 150 --21 19,5 50 50 Cetesb** 0,050 13 40 17 75 3,5 <0,5 <4 0,25 TEORES NO SOLO 3 mg/dm Solos do Brasil*** CD --0,055 14 11,00 36 40,50 36 19,00 201 29,00 --<2 1 0,22 7,56 <0,2 0,28 <4 LETE ns 0,052 ns 13,00 ns 39,25 ns 19,00 ns 36,00 <2 0,20 <0,2 <4 *USEPA (1999); **CETESB (2005) para solos de boa qualidade; ***Campos et al. (2003). F a 5% de probabilidade. CD – calcário dolomítico; LETE– lodo de ete. ns Testemunha ns 0,045 ns 11,25 ns 38,75 ns 19,00 ns 31,75 <2 0,22 <0,2 <4 – não significativo pelo teste A geração de cargas negativas no solo, fruto da aplicação dos neutralizadores da acidez, gera um ambiente propício para a ligação dos metais com componentes da fração argila, principalmente com os óxidos, que conferem alta retenção desses pelo solo (McLean and Bledsoe, 1992). Raio iônico e valência do metal, Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. eletronegatividade, caráter ácido-base e constantes de hidrólise são importantes para a seletividade dos metais pesados, porém nenhum deles explica sozinho o processo sorção/dessorção (Araújo et al. 2002; Maguirre et al., 1981; Hendricson & Corey, 1981). Interações com a fração orgânica do solo, de alto poder complexante, também tem sido relatados como causas da forte interação dos metais pesados com a fração sólida dos solos (Amaral Sobrinho et al. 2009). Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. CONCLUSÕES Nas condições em que se executou o presente trabalho o lodo de ETE apresenta capacidade superior ao calcário dolomítico para elevação do pH do solo. A aplicação do lodo de ETE eleva os teores de cálcio, de fósforo, de sódio, de zinco, a saturação de bases, a relação Ca/Mg e a relação Ca/K do solo e diminui os teores de, Cu, B e Mn no solo. A aplicação do lodo de ETE mantém os teores pseudo-totais de mercúrio, níquel, cromo, chumbo, bário, arsênio, cádmio, molibdênio e selênio do solo em níveis como aqueles considerados normais para solos de boa qualidade. As variações imputadas ao solo pela aplicação do lodo de ETE estão dentro dos padrões e expectativas conhecidas atualmente pela ciência do solo, o que orienta para a possibilidade do uso do mesmo como neutralizador da acidez do solo. Entretanto, a validação desses pressupostos necessita de experimentação a campo, visando ratificação das premissas aqui observadas, quando no ambiente real de produção. Governo do Estado de Santa Catarina Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. LITERATURA CONSULTADA 1- ABNT. NBR 2004: Resíduos sólidos, classificação de resíduos. Rio de Janeiro. 2004. 63p. 2- ALLEONI, L.R.F;MELLO, J.W.V. & ROCHA, W.S.D. Eletroquímica, adsorção e troca iônica no solo. In: MELO, V.F. & ALLEONI, L.R.F. (Ed.). Química e mineralogia do solo. Parte II – Aplicações. Viçosa: SBCS, 2009. p.69-129. 3- AMARAL SOBRINHO, N.M.B.; BARRA, C.M. & LÃ, O.R. Química dos metais pesados no solo. 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