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SOLENIDADE DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS
07.06.2013
Leituras: Ez 34,11-16; Sl 22 (23),1-3a.3b-4.5.6 (R/. 1); Rm 5,5b-11;
Lc 15,3-7
DEUS (REPRESENTADO PELO CORAÇÃO DE JESUS) É BEM ASSIM: ELE DÁ
TUDO DE SI PARA RESGATAR O SER HUMANO. ESSE DEUS É MUITO BOM.
Não faz muito tempo, celebramos durante cinquenta dias as solenidades pascais. Hoje,
solenidade do Sagrado Coração de Jesus, é como se entrássemos de novo naquelas
solenidades e revivêssemos o imenso mistério do amor de Deus manifestado em Cristo. E o
fazemos pela via simbólica do coração. Do coração de Jesus.
A devoção ao Sagrado Coração provém de tempos bastante remotos. Grandes santos
medievais, como São Bernardo e São Boaventura, teceram “profundas considerações sobre o
amor de Deus manifestado em Cristo Jesus, sobretudo em sua sagrada Paixão”.
Mas foi o realce dado à humanidade de Jesus Cristo que “fez brotar a devoção ao seu
Coração sagrado, símbolo do amor de Deus transformado em amor humano. A devoção como
tal tem início nos fins do século 13 e inícios de século 14, sobretudo em regiões da França e
Alemanha. Sua festa começou a ser celebrada a partir do século 16, sobretudo na França” (A.
Beckhäuser. Viver em Cristo. Espiritualidade do ano litúrgico. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 161).
Vários papas deram sua chancela ao novo culto, desde Pio IX que estendeu a festa a
toda a Igreja em 1856, passando por Leão XIII que consagrou o mundo ao Sagrado Coração
de Jesus, até Pio XII que mais uma vez recomendou esta devoção mediante uma carta
encíclica.
Mas, afinal de contas, o que nos diz a Palavra de Deus nesta solenidade de hoje e qual
o mistério de Cristo que nela celebramos?
Hoje ouvimos Jesus contando uma parábola, através da qual nos fala da paixão que
Deus tem pelo ser humano. E notemos um detalhe: Jesus conta a parábola a duas classes de
pessoas religiosas sabidamente cheias de vaidade e orgulho por se considerarem justas só
porque cumpriam a lei, achando-se no direito de desprezar e até apagar quem não cumprisse
os preceitos legais. Eram os escribas e fariseus, que já opunham resistência a Jesus e até o
perseguiam pelo que fazia e ensinava em favor dos empobrecidos. Eles já haviam inclusive
criticado Jesus por sua aproximação ao mundo dos pecadores. Jesus se defende, dizendo que
veio como um médico para os doentes (Lc 5,31), ou, como um “pastor”. Assim vemos que o
coração de Deus, representado no coração de Jesus, contrasta abertamente com a atitude dos
escribas e fariseus.
A estes é que Jesus se dirige: “Se um de vocês tem cem ovelhas e uma se perde, não
deixa as noventa e nove e vai atrás daquela que se perdeu, até encontrá-la? E quando a
resgata, não é assim que você fica imensamente feliz, e faz aquela festa?!” (cf. Lc 15,4-6). Em
seguida, com fina ironia, o Mestre Jesus expõe-lhes o sentido da parábola: “Assim haverá no
céu mais alegria por um só pecador que se converte, do que por noventa e nove justos [alusão
aos escribas e fariseus!] que não precisam de conversão” (v. 7). Deus, representado pelo
coração de Jesus, é bem assim: ele dá tudo de si para resgatar o ser humano.
Houve uma fase na história do povo de Israel, no Antigo Testamento, em que seus
“pastores”, isto é, seus líderes, decepcionaram. Não cuidaram dos fracos (cf. Ez 34,1-6).
Resultado, o povo sofreu a tragédia da deportação, no ano 587 a.C. Daí em diante, Deus
mesmo será o Pastor de seu povo, para o reconduzir, cuidando carinhosamente das ovelhas
fracas e desgarradas: “Eu mesmo vou apascentar as minhas ovelhas”, diz Deus, “e fazê-las
repousar” (Ez 34,15). Foi o que ouvimos na primeira leitura, cuja continuação aponta que
Deus mandará um novo pastor, numa nova aliança (Ez 34,23-35). Temos aí uma prefiguração
do Cristo nosso “bom pastor” (cf. J. Konings. Liturgia dominical. Mistério de Cristo e formação dos fiéis
(anos A – B – C). Petrópolis: Vozes, 22003, p. 398). Por isso que hoje nós cantamos o Salmo 22(23),
repetindo como refrão exatamente este seu versículo: “O Senhor é o pastor que me conduz;
não me falta coisa alguma” (v. 1).
De fato, temos agora um verdadeiro Pastor que nos conduz, um verdadeiro Guia que
nos orienta por caminhos plenamente seguros e confiáveis. Na pessoa de Jesus, Deus mostrou
todo o seu amor para com o ser humano, a saber, deu tudo de si para nos resgatar e nos
orientar. É o que ouvimos na segunda leitura, da carta do apóstolo Paulo à comunidade cristã
de Roma. “O dom do Espírito no batismo é o sinal de que Deus nos quer bem; em Cristo, seu
amor nos procurou quando éramos ainda inimigos. Não fomos nós que aplacamos um Deus
irado; foi ele que nos reconciliou consigo, porque sempre nos amou. Paulo conclui: 1) se
Deus tanto fez por nós enquanto éramos pecadores, tanto mais fará agora que somos
reconciliados; 2) não temos nada para nos gabar, a não ser o amor de Deus por nós, em Jesus
Cristo” (ibid.).
Para entendermos o mistério e a mensagem que a parábola de hoje nos traz, temos que
levar em conta a imagem do pastor no tempo de Jesus. Para o pastor, “as ovelhas são sua vida,
sua quase única riqueza, seu ‘meio de produção’. Por isso, não quer que alguma se perca...
Para o pastor, as ovelhas são seu tesouro. São para ele o que o pedaço de terra é para o colono,
a fábrica local para o operário. Tira a fábrica, a terra, o rebanho, e o homem fica sem sustento.
Por isso se apaixona por seu meio de produção... O homem tem seus desejos, suas paixões, e é
bom que os tenha, porque são a mola propulsora de sua vida. Ora, qual é o verdadeiro desejo,
eis a questão” (ibid.).
Jesus nos revela o verdadeiro objeto da paixão de Deus: são os seres humanos, seus
filhos e filhas. Por eles, ele deixa todo o resto, por assim dizer. Foi o que aconteceu com
nosso Mestre Jesus Cristo que “morreu pelos ímpios” (Rm 5,6); e esta é a maior prova de que
Deus nos ama, e muito (cf. v. 8), isto é Reino de Deus.
Logo, nós que seguimos Jesus, somos discípulos e discípulas dele, “também devemos
investir nossa paixão, não em ovinos e bovinos, terra ou negócios – embora sirvam para
sobreviver, e quem não sobrevive não pode cantar o louvor de Deus (cf. Sl 115,17 – mas em
seres humanos de carne e osso, filhos de Deus, tesouros de amor eterno. No Reino de Deus,
os ‘meios de produção’ que absorvem nosso interesse são as pessoas, e não podemos permitir
que uma delas se estrague. Se todos são chamados a gozar o amor do Pai, como poderíamos
desinteressar-nos daqueles que dele se afastaram, ou são afastados pelo contratestemunho
daqueles que se gabam de Deus?... Deus quer que todos sejam amados: esse é o fruto que ele
quer ver produzido. Sem voltar-nos para os seus filhos, será impossível produzir esse fruto. E
os melhores 'produtores do Reino’ são os que mais nos desafiam, os que mais precisam ser
amados: os pobres, os oprimidos, os abandonados. Eles suscitam o maior potencial de ternura,
de amor gratuito, no coração humano; e é nisto que Deus se realiza. Podemos dizer que as
ovelhas perdidas ‘libertam’ o potencial de amor que Deus colocou em nós” (ibid., p. 398-399).
Portanto: “Amar os seres humanos como nosso tesouro; amar os mais
‘desinteressantes’ como sendo nosso verdadeiro interesse: eis a mensagem do Pastor em
busca da ovelha desgarrada” (ibid., p. 399), eis a mensagem do Coração de Jesus.
O modelo e legado desse amor misericordioso de Deus merece toda a nossa
consideração e meditação. e, que “possamos receber, desta fonte de vida, uma torrente de
graças”, como expressamos em oração no início da nossa celebração.
Consagrando, isto é, dedicando toda a nossa vida a esse Cristo com um coração assim
tão humano e compassivo, é a melhor forma mostrar-lhe o quanto lhe somos gratos por ternos salvo do jugo do pecado e da morte e, assim, nos ter garantido o verdadeiro descanso.
Sim, ao Pai santo, eterno e todo-poderoso, toda a nossa ação de graças, sempre e em
todo lugar, sobretudo por este Cristo que “elevado na Cruz, entregou-se por nós com imenso
amor”; por este Cristo, de cujo lado aberto nasceram os sacramentos da Igreja, “para que
todos, atraídos ao seu Coração, pudessem beber, com perene alegria, nesta fonte salvadora”
(Prefácio)
E pensar que, logo mais, beberemos nesta fonte, isto é, na santa Eucaristia, corpo
entregue e sangue derramado do Senhor Jesus. Então, não resta senão mais um último pedido:
“Ó Deus, que este sacramento da caridade nos inflame no vosso amor e, sempre voltados para
o vosso Filho, aprendamos a reconhecê-lo em cada irmão” (Oração depois da comunhão).
Amém! Assim seja!
Orientações para celebrar bem
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Em muitas comunidades, costuma-se neste dia (como em outros dias) dar um
destaque especial à imagem do Sagrado Coração de Jesus. Contudo, seja de tal
forma que não “roube a cena” da mesa do Senhor (altar da celebração) nem da
mesa da Palavra (ambão). Pois o altar, por ser “o centro da ação de graças que se
realiza pela Eucaristia”, lugar “onde se torna presente o sacrifício da cruz sob os
sinais sacramentais..., a mesa do Senhor na qual o povo de Deus é convidado a
participar pó meio da Missa”, é “o centro para onde espontaneamente se volte a
atenção de toda a assembleia dos fiéis (cf. Instrução Geral sobre o Missa Romano, n. 296,
299). Igualmente o ambão, por causa da dignidade da Palavra de Deus proclamada,
é o “lugar condigno... para onde se volta espontaneamente a atenção dos fiéis no
momento da liturgia da Palavra (ibid., n. 309).
No momento da liturgia da Palavra, entre uma leitura ou outro, ou após a homilia,
“reserve um lugar para o silêncio. A Palavra precisa ser acompanhada do silêncio,
a fim de que seja possível interiorizá-la, ‘ruminá-la’, guardá-la e assumi-la como
memória Dei (memória de Deus) em nosso coração. Silêncio habitado, silêncio
eloquente, silêncio que não deve ser preenchido de movimento do corpo, da
cabeça, do olhos, mas apenas do louvor e da tranquilidade (cf. Sl 65,2). Aliás, você
bem o sabe, existem silêncios impacientes que são piores do que o rumor” (E.
Bianchi. Presbíteros: Palavra e Liturgia. São Paulo: Paulus, 2010, p. 20). Para tanto, nada
custa antes uma pequena motivação; principalmente quando, neste tempo de tanto
barulho, a assembleia ainda não está habituada a silenciar e aquietar o coração.
O presidente proclame a Oração Eucarística como quem, de fato, está em diálogo
profundo e verdadeiro com o mistério de Deus. Isso aparece pela postura do corpo,
pelo olhar que se volta para o alto, pela convicção e unção com que se proclamam
as santas palavras da ação de graças (eucaristia). Para o povo, isso faz a diferença.
E, percebendo esta postura orante do presidente, a assembleia começa a sentir
também outra vibração, outra mística, exatamente pelo clima orante que se cria.
Cria-se uma participação de fato interior e, ao mesmo tempo, vibrante nas
aclamações que lhe são próprias.
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