Doutrinas Bíblicas / IBNC 2. Revelação Especial Pr Luciano R. Peterlevitz Tema e assunto Nessa aula estudaremos a revelação especial, que é a Palavra escrita de Deus. Os seguintes tópicos serão abordados: O significado da palavra “Bíblia”. A inerrância da Bíblia. A veracidade da Bíblia. A inspiração da Bíblia. A autoridade da Bíblia. A preciosidade da Bíblia. Objetivos Após estudar essa lição você será capaz de: Entender o significado de inspiração. Identificar a origem e a autoridade divinas na Bíblia. Procurar conhecer mais a Palavra de Deus. O significado da palavra “Bíblia” “Bíblia” é a tradução da palavra grega biblion, um diminutivo de biblos, que significa “livro” ou “rolo” (Mt 1.1; Lc 4.17). Originalmente o termo biblos se referia ao “papiro”1, que era um material amplamente usado no Egito, Grécia e Roma para escrita de documentos. A partir do 2º século da era cristã, o termo biblion passou a ser aplicado aos livros sagrados considerados inspirados por Deus. Portanto, a Bíblia é um livro; na verdade, é uma composição de vários livros. Mas é claro que a Bíblia não é um livro qualquer. É a Palavra de Deus. Ela recebe as seguintes designações: Escritura(s): a Bíblia é composta por livros inspirados por Deus (Mt 21.42; 2Tm 3.16; Rm 3.2). As Escrituras são “as sagradas letras” (2Timóteo 3.15). 1 O papiro era uma planta aquática que se reproduzia em grande quantidade na região do rio Nilo, no Egito. Os egípcios retiravam a camada fina fibrosa que fica entre a casca e o tronco, e a cortavam em tiras, que eram alocadas em duas camadas transversais sobre uma superfície plana. As folhas eram compactadas com batidas de um objeto de madeira, e a substância liberada da seiva colava as folhas umas nas outras. O material era secado ao sol, e depois era alisado e cortado em pedaços retangulares. 1 02. REVELAÇÃO ESPECIAL Palavra de Deus: expressão aplicada tanto ao Antigo Testamento como para o Novo Testamento: (Mt 15.6; Jo 10.35; Hb 4.12). A inerrância da Bíblia Wayne Grudem define a inerrância da Bíblia nos seguintes termos: “Por inerrância das Escrituras entende-se que as Escrituras nos manuscritos originais não afirmam nada contrário aos fatos” (itálico do autor).2 A Bíblia é inerrante não somente em relação aos assuntos de fé e prática, mas também em relação aos detalhes históricos. Podemos crer não somente nas afirmações teológicas e doutrinarias das Escrituras, mas também nas afirmações que ela faz sobre acontecimentos que envolvem seus personagens e a história. A Bíblia é verdadeira, em todas as suas afirmações, e não contém nenhum tipo de erro. O próprio Jesus disse que a “Escritura não pode falhar” (Jo 10.35)3, e em sua oração afirmou: “a tua palavra é a verdade” (João 17.17). Para Jesus, o que está na Escritura é “o que foi dito por Deus” (Mateus 22.31). Então, considerando que Deus é “verdadeiro” (João 17.3; Romanos 3.4), ou seja, a verdade faz parte do caráter de Deus, e considerando ainda que “Deus não é homem, para que minta” (Números 23.19), seguese então que a Palavra que vem de Deus também é verdadeira. A palavra é a verdade, porque ela procede do Deus verdadeiro. Portanto, podemos dizer como o salmista: “As palavras do Senhor são puras, são como prata purificada num forno, sete vezes refinada” (Salmo 12.6). Alguém pode perguntar: se a inerrância está restrita aos manuscritos originais, e considerando que não existe mais nenhum desses manuscritos, então quer dizer que temos acesso à cópias que contém erros? A ausência dos manuscritos originais não compromete a pureza das Escrituras? Nossa resposta é a seguinte: os eruditos que estudam os manuscritos do Antigo Testamento e do Novo Testamento afirmam que, entre os manuscritos, há pouquíssimas variantes textuais que apresentam alguma alteração significativa de sentido. Há cerca de 1% de diferenças significativas entre os antigos manuscritos. Ou seja, eles concordam em mais de 99%. “Assim, quando dizemos que os manuscritos originais eram inerrantes, estamos também subentendendo que mais de 99% das palavras dos nossos manuscritos são também inerrantes, pois são cópias exatas dos originais.”4 E mesmo o 1% de diferenças não compromete nenhuma das doutrinas cristãs! Ou seja, as cópias dos manuscritos e nossas atuais versões verdadeiramente são a Palavra de Deus, pois elas apresentam essencialmente a mesma mensagem dos manuscritos originais. A veracidade da Bíblia Afirmamos no item anterior que a Bíblia é verdadeira porque procede do Deus verdadeiro. Mas isso não seria uma afirmação de fé destituída de qualquer base racional? Como podemos saber que a Bíblia possui veracidade? 2 Wayne Grudem, Teologia Sistemática (São Paulo: Vida Nova, 1999), p. 59. Em João 10.34-35, Jesus está fazendo referência ao Salmo 82.6: “Eu disse: Vós sois deuses, e filhos do Altíssimo, todos vós.”. O hebraico ’elohim pode ser traduzido tanto como “Deus” como por “deuses”. No contexto do Salmo 82, o termo significa “deuses”, que são os “filhos do Altíssimo”, no caso, os juízes de Israel, que eram responsáveis por julgar o povo com a mesma justiça que Deus julga seu povo. Eram “deuses”, não no sentido de que eram divinos, mas no sentido de que exerciam a autoridade de Deus para julgar os israelitas (do mesmo modo como Moisés era “como Deus a Faraó”, no sentido de que recebeu autoridade de Deus para falar com Faraó: Êxodo 7.1). 4 Wayne Grudem, Teologia Sistemática, p. 64. 3 2 Doutrinas Bíblicas / IBNC Há boas razões lógicas para crermos que a Bíblia não é mera produção humana, mas sim, é a Palavra de Deus. Vejamos algumas evidências que provam a veracidade da Escritura. 1) A evidência de vidas transformadas A Epístola aos Hebreus afirma categoricamente: “A palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes...” (4.12). Quando lemos a Palavra, interpretamos a Palavra; mas não somente somos intérpretes, porque somos também interpretados pela própria Palavra. A Bíblia é como espelho: quando olhamos para ela, vemos quem nós somos: pecadores, perdidos, carentes da graça de Deus. E também vemos que podemos ser restaurados e transformados pelo poder do Evangelho encontrado nas páginas nas Escrituras. Ou seja, na Bíblia, vemos não somente quem somos, mas também o que podemos nos tornar pela maravilhosa graça de Deus. Nenhum outro livro tem o poder de transformar vidas como a Bíblia. “Milhares e milhares têm experimentado esse poder; viciados em drogas têm sido curados pela Palavra; delinquentes têm sido transformados; o ódio tem cedido lugar ao amor; tudo isso pela leitura da Palavra de Deus (1Pe 2.2).”5 O poder transformador da Escritura demonstra que ela é de origem divina. 2) A evidência da unidade da Bíblia. A Bíblia é uma composição de 66 livros, que foram escritos num período de aproximadamente 1600 anos, em três idiomas diferentes, por aproximadamente 40 autores cujas culturas são as mais diversas: desde reis até pastores, desde doutores até pescadores. “Os assuntos sobre os quais esses livros versam são diversos e variados; não obstante, há uma unidade doutrinária e estrutural que permeia o todo”.6 A Escritura “apresenta uma espantosa unidade temática - Jesus Cristo. Um problema - o pecado - e uma solução - o Salvador Jesus - unificam as páginas da Bíblia, do Gênesis ao Apocalipse”7. Portanto, apesar da diversidade de autores e épocas, e apesar desses autores escreverem a respeito de um tema tão amplo e complexo (Deus), ainda assim não existe nenhuma contradição entre eles, antes, o que notamos é uma admirável concordância de pensamento. Isso mostra que a Bíblia tem um único Autor (Deus) que supervisionou e capacitou os autores humanos a escrevem a respeito Dele. 3) A evidência da arqueologia Muitas descobertas arqueológicas têm demonstrado a veracidade das informações históricas mencionadas pelos autores bíblicos. Ur, a cidade de Abraão, foi descoberta pela arqueologia. Pitom, a cidade edificada pelo faraó Ramsés II (Ex 1.11), foi desenterrada, e os arqueólogos comprovaram que as edificações desta cidade eram de tijolos secos ao sol, alguns com palha, mas outros sem palhas, corroborando assim a afirmação de Ex 5.7 (os israelitas não conseguiam recolher palhas, e tiveram que fazer 5 Norman Geisler; William Nix, Introdução Bíblica: como a Bíblia chegou até nós (São Paulo: Editora Vida, 1997), p. 54. 6 Emery H. Bancroft, Teologia Elementar e Conservadora (São Paulo: Imprensa Batista Regular, 5ª edição, 1983), p. 11. 7 Norman Geisler; William Nix, Introdução Bíblica, p. 55. 02. REVELAÇÃO ESPECIAL tijolos sem elas). A história e a cronologia dos reis de Israel têm sido apontadas por muitos arqueólogos como dignas de fé. Os hititas eram um povo que até há pouco tempo só era mencionado na Bíblia (Josué 1.4). Mas atualmente eles são objetos de estudo dos historiadores que os têm conhecido cada vez mais pelas escavações. Essas e outras evidências arqueológicas provam que as afirmações da Bíblia acerca dos acontecimentos históricos são verdadeiras. 4) A evidência da profecia cumprida Lemos no Antigo Testamento muitas profecias que se cumpriram perfeitamente no Novo Testamento. Os autores bíblicos anunciaram sobrenaturalmente acontecimentos muitos distantes, que se cumpriram em séculos posteriores. Por exemplo, Miquéias, cerca de oito séculos antes de Cristo, anunciou a cidade em que o Messias haveria de nascer (Belém, em Mq 5.2). No Salmo 22, Davi descreveu detalhadamente a crucificação do Messias, cerca de mil anos antes da morte de Jesus: todos iriam zombar do Messias crucificado (v.7-8; veja Mt 27.39-40); suas mãos e pés seriam perfurados (v.16; a palavra hebraica yad “mão” também pode ser traduzida “antebraço” ou “punho”; ou seja, mesmo que a crucificação romana perfurava os punhos e não as mãos, ainda assim o texto mantém sua precisão profética!); suas vestes seriam repartidas (v.18, veja Jo 19.24). Lembremos também de Isaías 53: oito séculos antes de Cristo, o profeta anteviu a morte expiatória do Messias, afirmando que Ele iria ao matadouro tal qual uma ovelha (Is 53.5-7). Assim, as várias evidências mostram que a fé na veracidade da Bíblia não é uma fé cega, sem nenhum fundamento lógico e racional. Os cristãos não são pessoas incultas e desinformadas, que creem em afirmações desencontradas e contraditórias. Antes, os cristãos creem num Livro que, ao longo da história e principalmente nos dias atuais, tem sido submetido às analises científicas e críticas, e ainda assim tem permanecido como a Palavra verdadeira de Deus. Os céticos tentam apresentar erros e contradições na Bíblia, mas nunca têm sucesso. A inspiração da Bíblia “Toda a Escritura é inspirada por Deus” (2Timóteo 3.16). A expresão “inspirada por Deus” é a tradução da palavra grega theopneustos, composta por dois termos: theos (“Deus”) e pneo (“respirar”). A príncipio, parece que a palavra theopneustos não tem haver com inspiração, mas com expiração, pois literalmente significa “soprado por Deus”; assim, “aspiração” ou mesmo “expiração” exprimiria com maior exatidão o sentido do adjetivo grego.8 Mas isso não impede que usemos o termo “inspiração”, desde que saibamos que o termo refere-se à Escritura como permeiada com o sopro divino.9 “Foi Deus quem colocou na mente e no coração do escritor bíblico a capacidade de apreender e de registrar sua Palavra. Assim dizemos que a Bíblia nasceu no coração e na mente de Deus. E ele soprou suas idéias para o homem. Isto é inspiração.”10 8 John Stott, Tu, porém: a mensagem de 2 Timóteo (São Paulo: ABU Editora, 1982 [versão digital] ), p. 45. 9 Paul D. Feinberg, “O significado da inerrância”, em Norman Geisler (organizador), A inerrância da Bíblia: Uma sólida defesa da infalibilidade das Escrituras (São Paulo: Editora Vida, 2003), p. 331. 10 Isaltino Gomes Coelho Filho, Teologia Sistemática 1 (apostila preparada para EBD da Igreja Batista do Cambuí, Campinas, s/d, texto não publicado), p. 20. 4 Doutrinas Bíblicas / IBNC O apóstolo Pedro afirma: “Porque a profecia nunca foi produzida por vontade dos homens, mas os homens da parte de Deus falaram movidos pelo Espírito Santo” (2Pedro 1.21). Portanto, a própria Bíblia “declara ser um livro dotado de autoridade divina, resultante de um processo pelo qual homens movidos pelo Espírito Santo escreveram textos inspirados (soprados) por Deus.”11 Dessa forma, os escritores bíblicos foram orientados pelo Espírito Santo para registrarem sem margem de erro as verdades divinas. A inspiração é verbal e plenária. Por inspiração verbal, estamos dizendo que as palavras foram inspiradas. Provas da inspiração verbal: As Escrituras são inspiradas (2Tm 3.16). O termo “Escritura” (grego graphe) significa “coisa escrita”. Em várias ocasiões Deus ordenou que suas palavras fossem escritas (Êx 17.14; Jr 30.2). O Novo Testamento cita trechos dos livros do Antigo Testamento (Mateus 15.4; At 28.25). Jesus considerou os textos do Antigo Testamento como sagrados (Mateus 5.17; João 10.35). Várias vezes encontramos a expressão “está escrito” para se referir à autoridade da Escritura (Mateus 4.4,7,10). Com inspiração plenária, estamos dizendo que toda a Bíblia é inspirada, pois: 1. “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil...” (2Tm 3.16). No texto grego, não existe o verbo de ligação entre as palavras “Escritura” e “inpirada” (o verbo ser, neste caso, traduzido como “é”). Se, na tradução, o verbo de ligação for inserido depois da expresão “inspirada por Deus”, a tradução ficaria assim: “Toda a Escritura divinamente inspirada por Deus é útil”. Essa tradução tem uma implicação: nem toda a Escritura é útil, mas somente aquela que foi inspirada por Deus. Assim, somente algumas partes da Escritura é que teriam sido inspiradas. Entretanto, os termos “inspirada por Deus” e “útil” são adjetivos da “Escritura”. Entre esses dois adjetivos existe um conetivo “e” (grego kai), o que significa que “Paulo está afirmando duas verdades sobre a Escritura, a saber: que ela é inspirada e que ela é útil, não somente uma dessas duas coisas”.12 Portanto, o verbo de ligação pode ser colocado depois do termo “Escritura”: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil...” Isso significa que toda a Bíblia é inspirada por Deus e proveitosa “para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça”. 2. “Porquanto, tudo que dantes foi escrito, para nosso ensino foi escrito...” (Romanos 15.4). O “tudo” certamente é uma referência à totalidade da Escritura (Antigo Testamento). Portanto, não pode haver partes da Bíblia que são inspiradas e outras não. Também não pode haver partes mais inspiradas do que outras. Na verdade, “toda a Escritura é inspirada”. 11 12 Norman Geisler; William Nix, Introdução Bíblica, p. 20. John Stott, Tu, porém, p. 45. 02. REVELAÇÃO ESPECIAL A inspiração verbal e plenária não excluiu a participação humana no processo de escrita dos textos sagrados. O Espírito Santo supervisionou a escrita dos textos. Mas as palavras não foram ditadas mecanicamente. É verdade que em alguns momentos o autor tinha que registrar tudo exatamente como Deus tinha dito (Apocalipse 2.1,8,12). Mas na maioria das vezes, os textos sagrados foram produzidos pela reflexão e pesquisa do autor humano. Para a escrita do Pentateuco, Moisés certamente pesquisou antigas narrativas do Antigo Oriente Médio que falavam a respeito da criação e do dilúvio. Mas, é claro, o Espírito Santo o capacitou a escrever os acontecimentos exatos e verdadeiros. Para a escrita dos livros Históricos do Antigo Testamento, os autores usaram algumas fontes históricas (algumas dessas fontes são: Livro dos Justos: Josué 10.13; 2Samuel 1:18; Livro dos Atos de Salomão: 1Reis 11.41; Livro da História dos Reis de Judá: 1Reis 14.29; Livro doa História dos Reis de Israel: 1Reis 16.27; Livros de Natã e Gade: 1Crônicas 29.29). O evangelista Lucas pesquisou fontes orais (Lucas 1.1-4). O apóstolo João afirma que escreveu seus escritos a partir de sua observação pessoal (1João 1.1-4). Além disto, também precisamos notar que Deus usou as antigas línguas dos autores (hebraico, aramaico e grego), bem como suas culturas, personalidades e estilos pessoais. Ou seja, as palavras que os autores escreviam era uma extensão deles, contudo, essas palavras “eram também exatamente as palavras que Deus queria que escrevessem – exatamente as que Deus afirma serem suas”13. Revelação, inspiração e iluminação Revelação, inspiração e iluminação são três termos que expressam conceitos diferentes, mas que estão inter-relacionados. Revelação: é a comunicação de Deus aos homens (1Coríntios 2.10). Deus revelou seu caráter e seus atributos, bem como sua vontade e seu plano de salvar a humanidade através de Cristo Jesus. Inspiração: é o registro da revelação. O Espírito Santo capacitou os autores bíblicos para a escrita perfeita e inerrante da Escritura. Iluminação: é a capacidade que o Espírito Santo concede ao leitor para compreender a Escritura (1Coríntios 2.12-15; Lucas 24.32,45; João 14.26). É o que Paulo fala em Efésios 1.18: “sendo iluminados os olhos do vosso coração, para que saibais qual seja a esperança da vossa vocação, e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos”. É necessário que Deus abra os nossos olhos, para que contemplemos as maravilhas da sua Palavra (Salmo 119.18). W. C. Taylor aborda a relação entre revelação, inspiração e iluminação da seguinte maneira: Três doutrinas vão sempre juntas, na inteligente apreciação do valor da Escritura: revelação, inspiração e iluminação. Para o autor (do texto bíblico) veio a EVELAÇÃO; para a Escritura que ele transmite veio a INSPIRAÇÃO; para o leitor que busca saber por meio dela a verdade e a vontade de Deus, virá, nas condições de espiritualidade, a ILUMINAÇÃO. O profeta e o apóstolo foram MOVIDOS. Suas Escrituras foram INSPIRADAS. Nós somos ILUMINADOS.14 13 Wayne Grudem, Entenda a fé cristã: um guia prático e acessível com 20 questões que todo cristão precisa conhecer, São Paulo: Vida Nova, 2010, p. 15. 14 W. C. Taylor, citado por Isaltino Gomes Coelho Filho, O Pentateuco e sua contemporaneidade (Rio de Janeiro: JUERP, 2000), p. 19. 6 Doutrinas Bíblicas / IBNC A autoridade da Bíblia Autoridade é o direito de ordenar. Considerando que a Bíblia é a verdade que procede do Deus verdadeiro, que ela é inspirada por Deus, segue-se que ela possui autoridade para estabelecer valores e padrões pelos quais os homens devem viver. “Com ‘autoridade da Bíblia’ queremos dizer que as Escrituras, como expressão da vontade de Deus para nós, têm o supremo direito de definir no que devemos crer e como devemos viver.”15 Segundo a Declaração da Convenção Batista Brasileira, “a Bíblia é a única autoridade em matéria de religião, fiel padrão pelo qual devem ser aferidas as doutrinas e a conduta do homem”16. Para Wayne Grudem, “a autoridade das Escrituras significa que todas as palavras nas Escrituras são palavras de Deus, de modo que não crer em alguma palavra da Bíblia ou desobedecer a ela é não crer em Deus ou desobedecer a ele”17. No Antigo Testamento, várias vezes encontramos a expressão “Assim diz o Senhor” (Êx 4.22; Josué 24.2; 1Samuel 10.18; Isaías 10.24; Amós 1.3). Isso significa que os autores do Antigo Testamento eram portadores da Palavra de Deus que não podia ser questionada ou desobedecida. Jesus reconheceu a autoridade do Antigo Testamento (Mateus 15.4; João 10.35). Os autores do Novo Testamento reconhecem a autoridade dos escritos uns dos outros: O próprio apóstolo Paulo considerava a autoridade dos seus escritos (Gálatas 1.6-12, Colossenses 1.25-26). Por exemplo, em 1Tessalonicenses 2.13, ele diz: “Também agradecemos a Deus sem cessar, pois, ao receberem de nossa parte a palavra de Deus, vocês a aceitaram não como palavra de homens, mas segundo verdadeiramente é, como palavra de Deus, que atua com eficácia em vocês, os que crêem.” (NVI). Mas não se trata de um autoreconhecimento de Paulo, somente. Pois outros também atribuíam autoridade divina aos escritos dele. Em 2Pedro 3.15-16, Pedro coloca as epístolas de Paulo no mesmo nível das “outras Escrituras.” Portanto, os escritos dele foram reconhecidos e declarados como Escritura tão logo que apareceram. Em 1Timóteo 5.18, o apóstolo Paulo coloca o Evangelho de Lucas (Lucas 10.7) no mesmo nível de Deuteronômio (Deuteronômio 25.4). Tanto o texto de Lucas como o de Deuteronômio são chamados de “Escritura”. Jesus disse, em João 4.26: “Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito.” Jesus prometeu que o Espírito Santo iria ensinar os seus discípulos e os faria lembrar tudo o que ele falou. Então, quando vários dos seus discípulos escreveram a respeito de Jesus (Mateus, João e Pedro), eles foram capacitados pelo Consolador para registrar com autoridade os ensinos que não derivava deles mesmos, mas do próprio Cristo. Portanto, visto que a Bíblia afirma ser a palavra do próprio Deus, nós devemos tentar entendê-la, pois ao fazê-lo estamos tentando entender o próprio Deus. Devemos tentar confiar nas palavras das Escrituras, pois ao fazê-lo estamos tentando confiar no próprio 15 Millard J. Erickson, Teologia Sistemática (São Paulo: Vida Nova, 2015), p. 232. Declaração da Convenção Batista Brasileira. 17 Wayne Grudem, Teologia Sistemática, p. 44. 16 02. REVELAÇÃO ESPECIAL Deus. E devemos tentar obedecer às palavras das Escrituras, pois ao fazê-lo estamos tentando obedecer ao próprio Deus.18 A preciosidade da Bíblia A intrução do Senhor “dá sabedoria aos simples” (Salmo 19.7). As “sagradas letras” apresentam o caminho para a sabedoria. É através das Escrituras que alcançamos a maturidade e sabedoria necessárias para uma vida autêntica. Quando ignoramos os valores da Palavra de Deus, nos enveredamos por um caminho de insensatez cujo fim certamente é a morte. Já vimos que em 2Timóteo 3.16 que Paulo apresenta dois adjetivos para a Escritura: “inspirada por Deus e útil”. Neste momento, vamos focalizar o segundo adjetivo: “útil”, tradução do grego ophelimos, “lucrativo”19. Este termo provém de opheleo, “proveitoso”, “benéfico”. “Um paralelo significativo é encontrado em Hebreus 4.2, onde as boas novas não ‘beneficiaram’ ou ‘foram proveitosas’ para os que as ouviram, porque a mensagem não encontrou fé por parte dos ouvintes.”20 Portanto, aqueles que leem com fé a Escritura são grandemente beneficiados. De fato, a Bíblia é preciosa, pois apresenta valores que orientam a vivência humana e consolam os abatidos. Em 2Timóteo 3.16, após os dois adjetivos (“inspirada por Deus e útil”), Paulo apresenta quatro objetivos da Escritura: 1) “para o ensino”. A Escritura tem autoridade divina para reger nosso ensino e doutrina. Ela é a nossa única regra de fé e prática. Nas epístolas pastorais, Paulo preocupava-se com a falsa doutrina que se infiltrava na Igreja (1Tm 1.3), e convocou tanto Timóteo como Tito a zelarem pelo ensino e pela sã doutrina (1Tm 1.10; 4.13; 5.17; Tt 2.1). 2) “para a repreensão”. A palavra grega elegchos, “repreensão”, alude à “verificação, pela qual algo é provado ou testado”21. Em Mateus 18.15 e 1Timoteo 5.20 o mesmo termo é usado, sugerindo arguição ou convencimento a respeito do pecado. Essa deveria ser nossa postura com a Bíblia: quando confrontados com a Palavra, somos provados e verificados a tal ponto que, caso haja em nós algo que desabone a vontade de Deus, somos convencidos do erro. 3) “para a correção”. O termo aqui (epanorthosis) denota “restauração a um estado correto”. “Se repreensão enfatiza o aspecto negativo da obra pastoral, a correção enfatiza o lado positivo. O pecador deve não só ser advertido a abandonar a vereda errada, mas ser também guiado na vereda certa ou reta (Daniel 12.3). Isto também ‘toda Escritua’ é capaz de fazer.”22 4) “para a educação na justiça”. O termo paideia, “educação”, tem um sentido muito rico. Pode ser traduzido por “instrução” ou “disciplina” (2Timóteo 2.25; Efésios 6.4). Em Tito 2.11-14, paideia tem o sentido de treinamento para uma vida santa que se dispõe para o serviço de Deus. A “justiça”, pois, teria o sentido de “boa obra”, como em 2Timóteo 2.21-22. Assim, a Escritura nos santifica e nos capacita para o desempenho de boas obras para Deus, conforme o verso 17 18 Wayne Grudem, Entenda a fé cristã: um guia prático e acessível com 20 questões que todo cristão precisa conhecer, São Paulo: Vida Nova, 2010, p. 16. 19 J. Strong & Sociedade Bíblica do Brasil. 2002; 2005. Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil. 20 Carl Spain, Epístolas de Paulo a Timóteo e Tito (São Paulo: Editora Vida Cristã, 1980), p. 166. 21 J. Strong & Sociedade Bíblica do Brasil. 2002; 2005. Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong. Sociedade Bíblica do Brasil. 22 William Hendriksen, 1 Timóteo, 2 Timóteo e Tito (São Paulo: Cultura Cristã, 2001), p. 373. 8 Doutrinas Bíblicas / IBNC explica: “para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente preparado para toda boa obra”. Portanto, as Escrituas são o nosso manual de doutrina (“para o ensino”); Ela examina se há em nossa vida algum pecado (“para repreender”), nos dirige a um caminho reto (“para a correção”), e nos prepara para vivermos uma vida caracterizada pela integridade que agrada a Deus (“para a educação na justiça”). Conclusão Seguem duas aplicações para nossas vidas, considerando o que estudamos: A Bíblia é o nosso fundamento sólido Vivemos dias em que as pessoas estão cada vez mais desorientadas. Estão construindo suas vidas sobre areias movediças, e estão afundando cada vez mais. Alguns dizem não crer em nada. São céticos. Outros, diante do crescimento de tantas seitas e religiões, não sabem em que crer. Outros creem em tudo: duendes, astrologia, misticismo, etc. Mas crer em tudo é a mesma coisa que não crer em nada. Diante deste cenário, precisamos reconhecer emergencialmente o fundamento sólido da Escritura. Ela é a nossa única regra de fé e prática. Ela é a verdade de Deus. Podemos confiar nela, e ela é capaz de orientar nossa vida. Necessitamos de um fundamento sólido sobre o qual possamos construir nossa existência. E aqueles que creem na Palavra de Deus sabem que estão edificando suas vidas sobre um alicerce sólido, que é a própria verdade de Deus que permanece para todo o sempre (Isaías 40.8). Em oração, eles dizem: “Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras da vida eterna” (João 6.68). A Bíblia é o nosso alimento sólido “Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mateus 4.4). A Palavra é o nosso alimento, e precisamos nos alimentar dela todos os dias. Por isso, é necessário ler a Palavra de Deus todos os dias. Podemos lê-la em um ano. Há duas formas de se fazer isso. Uma, é lendo três capítulos por dia, sendo que em um dia da semana precisamos ler cinco capítulos. Outra é lendo quatro capítulos por dia. Mas não pode ser uma leitura superficial. É importante meditarmos nela, e estudá-la com profundidade, para que as verdades de Deus sejam cada vez mais claras para as nossas vidas. Que, a partir da leitura e do estudo das Escrituras, sejamos motivados a amar ainda mais o Senhor e servi-lo com mais vigor. Que essa seja a nossa oração ao Senhor: “Abre os meus olhos, para que eu veja as maravilhas da tua lei” (Salmo 119.18).