Análise semiótica da interface do Learning Object (LO) Portal EduMusical e o conceito de conservantismo Semiotic Analysis of the interface of the Learning Object (LO) “Portal EduMusical” and the concept of conservatism Marta Cristina Goulart Braga1 Universidade Federal de Santa Catarina - EGC, SC Luciano Patrício Souza de Castro2 Universidade Federal de Santa Catarina - EGC, SC Ana de Ribamar Goulart Braga3 Universidade do Estado de Santa Catarina – CEART, SC Richard Perassi Luiz de Sousa4 Universidade Federal de Santa Catarina – EGC, SC Resumo: O objetivo deste artigo é uma análise de interface, de um ponto de vista semiótico, mais especificamente a partir da segunda tricotomia peirceana, os elementos expressivos, estéticos e simbólicos, que sustentam a proposição de que o Learning Object (LO), aqui identificado como “Portal Edu Musical”, é uma representação do conceito de conservantismo. O termo conservantismo é proposto como característica dos ambientes que guardam tradições, como locais cívicos e instituições tradicionais de ensino. O objeto em estudo é percebido como Learning Object (LO), porque foi projetado para promover o interesse e a aprendizagem de usuários/estudantes e, entre outros aspectos, mostra-se apoiado em teorias instrucionais e pesquisas sobre ensino/aprendizagem, envolvendo a teoria da comunicação e os estudos sobre atenção-percepção. Abstract: The purpose of this paper is an analysis of the interface from perspective semiotics, more specifically from the second trichotomy peirceana the elements expressive, aesthetic and symbolic, that support the proposition that the Learning Object (LO), here identified as "Portal Edu Musical " is a representation of the concept of conservatism. The term conservatism is proposed as characteristic of environments that keep traditions, and local civic and traditional institutions of education. The object under study is perceived as a Learning Object (LO), it was designed to promote interest and learning of users / students, and among other things, it is supported by instructional theories and research on teaching / learning, involving the theory of studies on communication and attention-perception. 1 2 3 4 [email protected] [email protected] [email protected] [email protected] 1. Os “Learning Objects” e o objeto de estudo Os Learning Objects (LO's) estão sendo utilizados atualmente como elementos centrais ou complementares no contexto do E-learning. A maneira como este recurso está sendo integrado a outros elementos formativos, embora seja muito diversa, compõe-se basicamente da seleção destes objetos, por parte de professores, instrutores e designers instrucionais, dos objetos considerados apropriados para a audiência de um curso. A escolha leva em consideração certas características do aluno como idade, conhecimento prévio, ou o nível da educação, entre outros. Os profissionais da educação acessam um ou vários repositórios de objeto de aprendizagem e selecionam certo número de objetos para exame e, em seguida, selecionam os mais convenientes para a integração com os materiais que serão postos à disposição dos estudantes (SANCHEZ-ALONSO; VOLVIDES, 2006). Diante disso, considera-se juntamente com Smith (2004, p.01, tradução nossa) que: [...] um objeto de aprendizagem é todo agrupamento dos materiais estruturados de maneira significativa e atrelado a um objetivo educacional (Johnson, 2003). Os “materiais” em um objeto de aprendizagem podem ser documentos, figuras, simulações, filmes, sons, e assim por diante. Estruturá-los de maneira significativa implica que os materiais estão relacionados e estão arranjados em uma ordem lógica. Mas sem um objetivo educacional claro e mensurável, permanece apenas como uma coleção. O Learning Object (LO) analisado neste estudo está disponível no “AVA UNIVERSIA”5, porque os objetos de aprendizagem podem ser distribuídos através de sistemas gestores de conteúdo, ou ROAs (Repositórios de Objetos de Aprendizagem), para serem compartilhados, por meio da Internet. Isso permite tanto a administração e catalogação dos objetos, quanto a sua distribuição e acesso pelo público6. O LO em estudo, "Portal Edu Musical"7, é um projeto realizado pelo Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), com colaboração da Coordenadoria de Programas Educacionais da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP). O Portal é gerenciado pela professora Irene Karaguilla Ficheman e apoiado pelo CNPq e foi testado em ONGs, escolas e, também, na Feira de Ciências e Engenharia (Febrace). Trata-se de um LO, autorado em Flash e aplicado a uma página html8 que só pode ser visualizada com a utilização de um navegador de internet, tal como o Internet Explorer. O conteúdo é apresentado em formato lúdico, porque os usuários encontram neste objeto diversos jogos de apreciação musical, de conhecimento de instrumentos musicais e de timbres, além de informações sobre músicos, peças musicais, bem como outras atividades que possibilitam um amplo acesso à educação musical, especialmente a crianças e adolescentes, seu público principal. Entretanto, o Portal também oferece dicas para professores, buscando sua integração com outros processos pedagógicos. 5 O Portal Edu Musical é parte integrante dos cursos do AVA UNIVERSIA. URL: http://cursos.universia.net/BR/index.jsp Podem ser citados como exemplos de repositórios internacionais o Merlot (http://www.merlot.org), o Wisc-online (http://www.wisc-online.com/) e o Learning-objects (http://www.learning-objects.net). Um ROA nacional é o Rived (http://rived.mec.gov.br/), mas os LO's também são disponibilizados em Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs). 7 O Portal Edu Musical encontra-se na URL: http://guarani.lsi.usp.br/edumusical/atual/index.html 8 A tradução para o português de HyperText Markup Language – HTML é Linguagem de Marcação de Hipertexto. 6 O objeto contempla a Educação on-line, oferecendo atividades individuais e colaborativas, desta forma oferece aplicações para trabalhar habilidades musicais, num sistema de aprendizagem interativo entre usuários e é uma aplicação livre9. Este material instrucional, dentro dos limites de suas possibilidades e competências, pretende substituir o professor, a sala de aula, a apresentação direta e/ou o uso de instrumentos musicais. A interação entre o aluno e o conteúdo a ser aprendido ocorre por meio da interface do objeto que apresenta aspectos estéticos e perceptivos, bem como, espera-se que permita o entendimento lógico de suas funções podendo facilitar a navegação nas atividades de aprendizagem. A estratégia escolhida para a análise semiótica do Portal Edu Musical toma por base a relação do signo com o seu referente ou objeto dinâmico, indicando-o como “ícone”, “índice” ou “símbolo”, como é apresentada na segunda tricotomia10 proposta por Charles Sanders Peirce (1839-1914). Desta forma, se pretende sustentar a proposição de que o “Portal Edu Musical” expressa o conceito de conservantismo11, porque apresenta uma estética conservadora e elementos simbólicos ligados à tradição, apesar de utilizar recursos tecnológico-digitais e mídia de última geração. A seguir, o detalhamento dessa proposição responde a seguinte pergunta de pesquisa: quais elementos expressam o conceito de conservantismo na interface do Learning Object (LO) “Portal Edu Musical”? Ressalta-se que o escopo deste estudo limitou-se à comprovação da hipótese relacionada ao conservantismo dos elementos que compõem uma interface de um produto midiático, para aprendizagem, elaborado por processo que utiliza tecnologia de ponta e portanto, moderno, mas não visa prescrever métodos ou técnicas para a usabilidade de interface. Bem como, a análise e opiniões emitidas neste trabalho são exclusivas dos autores, o grupo é composto por professores com experiências profissionais na área de: design (Marta Braga e Luciano de Castro), música (Ana Braga) e arte, comunicação e semiótica (Richard Perassi). A seguir o artigo apresenta em seu segundo capítulo a fundamentação teórica da abordagem semiótica escolhida ̶ a semiótica Peirceana ̶ , no terceiro capítulo realiza-se a análise semiótica da primeira página do Portal Edu Musical, traçam-se as relação triádica: signo, objeto e interpretante e considerações sobre a estética da imagem e finalmente no quarto capítulo apresentam-se as conclusões dos autores. 2. A teoria semiótica e a imagem visível A teoria semiótica, como uma teoria da significação, organiza os processos e os procedimentos de leitura de quaisquer representações. No caso de uma imagem observada, de acordo com Perassi (2007), a Semiótica procura identificar: 1. O modo de ser dela própria, suas características qualitativas, que são dela independente de qualquer relação de representação. 2. Os modos de relação entre essa imagem e seus objetos (entre a imagem e o que ela está apta a 9 O Portal Edu Musical encontra-se disponível em: http://guarani.lsi.usp.br/edumusical/atual/index.html “A segunda tricotomia, relativa às relações (ditas semânticas) entre o signo e seu objeto, propõe uma divisão dos signos em ícone, índice e símbolo” (COELHO NETO, 1980). 11 De acordo com o Dicionário Priberam ( www.priberam.pt),“conservantismo é “o sistema ou doutrina dos que se mostram avessos a reformas radicais e pugnam pela conservação das circunstâncias actuais”. 10 representar). 3. Os modos de relação entre essa imagem e seus interpretantes (interpretações de fato ou potenciais). Uma imagem externa à mente, como qualquer outro objeto perceptivo, apresenta uma materialidade própria. Essa materialidade é determinada e expressa pelas características do conjunto de materiais utilizados na sua composição, sejam tintas, luzes ou outras substâncias. Isso constitui a corporeidade da imagem que expressa as qualidades próprias de seus materiais constituintes, indicando formas, cores, tonalidades e texturas. Ao ser percebida, entretanto, além de expressar as qualidades de seus materiais componentes, uma imagem também é associada a outras coisas. Essas associações são determinadas por convenções, por hábitos ou por analogias. No caso das imagens, geralmente, é a analogia ou semelhança visual entre uma imagem e alguma outra coisa que estabelece as associações capacitando essa imagem a representar uma ou mais coisas. Assim, além de expressar suas próprias características, também, pode representar ou significar outras coisas materiais ou conceituais. De acordo com a teoria adotada, ao se capacitar como representação, a imagem passa a ser reconhecida como uma “representação”, um “signo” ou um “representamen”. Além disso, a coisa que pode ser representada ou significada pela imagem passa a ser seu “objeto” ou “referente”. A relação entre a imagem-signo e seu objeto-referente é mediada por um processo de codificação convencional, habitual ou analógico, que é estabelecido de maneira indireta ou por mediação de relações naturais ou culturais. Toda vez que essa relação é atualizada, de acordo com a teoria adotada, isso gera um “interpretante”. Assim, diante de uma imagem, como o retrato de alguém, uma mente ou consciência que a observa estabelece a relação entre essa imagem presente (retrato) e o objeto ausente (alguém), que é recuperado pela mente diante da observação da imagem. Essa recuperação ou aparição de outra presença na mente além da própria imagem é denominada como “interpretante”. Diante do exposto, um signo deve ser compreendido como um elemento triádico, composto pela interação de um “representamen”, de um “objeto” ou “referente” e de um “interpretante”. Desse modo, uma imagem percebida como o retrato de alguém reúne e faz interagir uma coisa (retrato/representamen), com uma pessoa (alguém/objeto/referente), com uma lembrança de alguém (interpretante). A maneira como um “representamen” ou “signo” se relaciona com seu “objeto” ou “referente” estabelece na teoria adotada um tipo particular de signo. Esses tipos particulares de signos de acordo com a relação signo/objeto são apresentados na segunda tricotomia peirceana, que designa os signos como ícones, índices e símbolos. Os signos icônicos são aqueles associados ao seu objeto por semelhança ou analogia na forma de expressão. Desse modo um signo icônico não tem nenhum vínculo direto com seu objeto, porque sua relação é mera semelhança: parece, mas não é. Desta forma, um retrato desenhado não apresenta nenhum vínculo direto com a pessoa retratada exceto um maior ou menor grau de semelhança que associa um ao outro. Os signos indiciais são diretamente vinculados ao seu objeto devido a uma relação de contigüidade física entre a parte e o todo. Nesse sentido, o risco representa o giz e a fumaça representa o fogo porque são elementos diretamente vinculados entre si, do mesmo modo um retrato fotografado é produto da luz refletida por alguém e essa mesma luz foi captada de maneira mecânica ou eletrônica estabelecendo um vínculo direto entre o signo e seu objeto. Os signos simbólicos dispensam os vínculos diretos ou indiretos e são relacionados com seus objetos por pura convenção. A palavra “cavalo” é um símbolo do animal cavalo porque foi assim convencionado. A palavra não se assemelha ao animal, como um desenho, tão pouco está diretamente vinculada ao animal, como quando as marcas de suas ferraduras são gravadas no solo (PERASSI, 2007). 3 Análise semiótica da primeira página do portal A primeira página é a página principal do Learning Object Portal Edu Musical (figura1) e apresenta uma imagem composta por manchas luminosas coloridas, projetadas na tela do computador, representando uma cena urbana. Essa representação é configurada por um conjunto de signos para apresentar um ambiente onde é possível interagir com representações de instrumentos e efeitos musicais e aprender dados e conceitos sobre música, um conservatório12 ou escola de música virtual. Figura 1: Primeira página do Portal Edu Musical. Fonte: Portal Edu Musical disponível em: http://guarani.lsi.usp.br/edumusical/atual/index.html Além dos elementos gráfico-visuais, o objeto em estudo também é composto com possibilidades de emissão de sons que, no processo de interação com o usuário, reforçam a metáfora dinâmica, multimídia e hipertextual de que há um prédio com diversas salas de aula presenciais de um conservatório de música. Entretanto, a análise aqui apresentada se restringe aos aspectos e elementos 12 De acordo com o Dicionário Priberam ( www.priberam.pt), conservatório é um “estabelecimento público onde se ministra o ensino da música, canto, declamação e arte dramática”. gráficos que são percebidos visualmente na primeira página do Learning Object. 3.1 Relação triádica: Signo, Objeto, Interpretante. A imagem da figura 2 é um signo, porque além de expressar a si mesma, como um conjunto de manchas luminosas coloridas, também, representa uma cena urbana. Na imagem é representado um trecho de rua, com um telefone público, um edifício ladeado por construções, as quais ostentam signos que representam e indicam café e banca de revistas. Há também representações de uma árvore, de um poste de luz e de outros elementos. Do lado esquerdo de quem observa a imagem, na representação de um suporte de anúncios está escrito em letras amarelas e vermelhas a seguinte expressão: “Portal Edu Musical”, sendo que a letra “d” do nome Edu é representada por uma nota musical, devido à analogia possível entre as configurações desses dois signos. Figura 2: Imagem da primeira página do Portal Edu Musical. Fonte: Portal Edu Musical disponível em: http://guarani.lsi.usp.br/edumusical/atual/index.html Diante do exposto, fica indicado que a imagem é um signo, cujo objeto ou referente é a cena urbana de um trecho de rua, em que se destaca, entre outras representações, a representação de um edifício. É possível saber que esse é o referente/objeto da imagem, porque os interpretantes que a imagem provoca na mente do observador são associados a lembranças de trechos de rua, edifícios e outros elementos pertinentes à cena urbana. A imagem, contudo, é um conjunto de signos visuais que reúne também palavras e outros signos específicos como um elemento musical e a bandeira brasileira, além de signos puramente figurativos. Assim, quando o observador se coloca na posição de leitor, ele percebe e é informado de que, a despeito de não haver na imagem quase que nenhuma figura relacionada especificamente à música, exceto o desenho de uma harpa, a palavra “musical” é citada duas vezes. Uma vez no texto “Portal Edu Musical” e outra no texto “Banca Musical”, por essas citações a imagem passa também a fazer referência ao ambiente musical e é simbolicamente relacionada à música. Tal referência pode levar o leitor a considerar que o prédio representado na imagem é um prédio dedicado às atividades musicais, como um conservatório musical ou uma escola de música. Isso será confirmado na prática quando o leitor/usuário na frente de um computador ligado pela internet ao Portal Edu Musical acionar os links que lhe darão acesso ao conteúdo interativo do Learning Object. Assim, o leitor/usuário toma conhecimento de que o Portal é quase integralmente referente às atividades musicais. Diante da imagem, o observador/leitor também é informado pela palavra “Portal” e pelo ambiente no qual a imagem está inserida, considerando se tratar da tela do vídeo de um computador, que o título “Portal Edu Musical” não se refere especificamente a um dos elementos da imagem em tela e tão pouco à imagem em si. Atualmente, a palavra “portal”, como foi dito, também faz referência a um tipo de hipermídia13 que dispõe de entradas para diversos ambientes virtuais disposto no ambiente da internet. Assim, o termo “portal” indica que o título “Edu Musical” faz referência a algo maior e mais complexo que a imagem proposta na primeira página, estabelecendo, para os observadores acostumados à “navegação” na internet, que a imagem ali apresentada ilustra a página inicial de uma hipermídia cujo tema é a música. Essa relação com a música é reforçada pelo recurso estético/semântico determinado pelo uso de um símbolo musical que, como foi dito, ocupa o lugar da letra “d” do nome “Edu” e pelo desenho de uma harpa na parte superior da representação do edifício que ocupa o centro da imagem. Em resumo, o conjunto visual que compõe a primeira página do Portal Edu Musical é o representamen ou signo que tem por objeto ou referente um Learning Object de iniciação musical. Há uma imagem apresentada na primeira página que, a despeito de suas fragilidades estético-semânticas, é uma metáfora visual. Pois é um representamen ou signo cujo objeto ou referente é uma cena urbana composta por um trecho de rua no qual se destaca um edifício. Assim, a partir da observação da imagem e da interação com a hipermídia, em que o link principal é localizado na entrada do edifício, faz-se uma associação entre o “Portal Edu Musical” e aquela representação de edifício, mesmo não havendo forte indicação visual que relacione o edifício ao Portal ou à música, exceto o desenho da harpa na parte superior do prédio. As relações entre a imagem e os signos nela apresentados com um Portal na internet e com uma escola de música ou conservatório musical, ou seja, as relações entre os signos e seus referentes são estabelecidas pelas características dos interpretantes gerados nas mentes dos observadores/leitores no momento em que percebem e interpretam o conjunto visual que lhe aparece diante dos olhos. 3.2 Relação Ícone, Índice e Símbolo 3.2.1. Os signos icônicos ou ícones. Na imagem da primeira página do Portal (Figura 2) predominam os signos icônicos, nos quais a representação se dá por semelhança com as coisas representadas. Assim, os desenhos da árvore, do telefone público e da xícara de café, entre muitos outros, são primeiramente associados simbolicamente aos seus referentes por analogia ou semelhança visual. 13 De acordo com Gosciola, (2003, p. 34), hipermídia é “[...] um conjunto de meios que permite acesso simultâneo a textos, imagens e sons de modo interativo e não-linear, possibilitando fazer links entre elementos de mídia, controlar a própria navegação e, até, extrair textos, imagens e sons cuja seqüência constituirá uma versão pessoal desenvolvida pelo usuário”. Os signos icônico-figurativos, como as representações do telefone público, da cafeteria, da banca de revistas, do trabalhador que dá manutenção ao edifício e outros, dão sentidos de realidade e civilidade ao ambiente urbano proposto como metáfora ao ambiente virtual do Portal, configurando-lhe um contexto mais humanizado e amigável. Portanto, esse conjunto de elementos propõe sensações, sentimentos e significações, representando coisas materiais e funcionais, mas também simbolizam coisas intangíveis como apreciações, sentimentos e idéias. 3.2.2 Os signos indiciais ou índices Os índices indicam direções, como a seta vermelha desenhada na árvore representada na cena (Figura 2), ou se estabelecem por conexões, como a que é determinada pela relação entre a placa com a xícara de café e a parede da construção (Figura 2), a qual passa a ser identificada como a representação de uma cafeteria. Além disso, os signos icônicos que emolduram a imagem (Figura 1) e são característicos dos ambientes de navegação na internet indicam uma relação entre o que se vê e o ambiente digital. Assim, esses elementos icônicos passam a atuar como índices de que, além desses, todos os outros ícones que aparecem na primeira página do Portal estão inseridos no ambiente digital de um computador, indicando também a conexão real ou potencial desse computador com a internet. Outros ícones ainda são propostos como índices no contexto da representação, por exemplo, a uniformidade, a cor e a tonalidade das formas que representam o céu e as nuvens na imagem (Figura 2) indicam um dia claro com tempo firme, sem ocorrência de chuva. 3.2.3 Os signos simbólicos ou símbolos Há os signos nitidamente convencionais que são percebidos imediatamente como símbolos, tais como os textos escritos, a nota musical, as cores e formas convencionais da bandeira brasileira reapresentadas na bandeira desenhada na imagem. O desenho da bandeira ligado ao desenho do edifício indica o caráter institucional do mesmo e simboliza essa instituição como brasileira. Assim, os ícones da primeira página simbolizam aquilo que representam, árvore, telefone público, bandeira e, também, passam a simbolizar outras coisas tangíveis e intangíveis, instaurando uma semiose continuada que gera diversos interpretantes sobrepostos. Os interpretantes são relacionados com novos objetos ou referentes gerando mais interpretantes que tornam complexa e profunda a interpretação da representação como um todo. A partir da semelhança que relaciona os ícones aos seus objetos ou referentes, tornando-os simbólicos, esses signos vão propondo outras associações que também lhes promovem à condição de símbolos. Por exemplo, há o desenho de uma xícara fumegando, dentro da representação de uma placa na parede de uma construção, simbolizando uma cafeteria. A associação entre o desenho de uma xícara e uma cafeteria requer muito mais do que semelhança visual, porque uma xícara fumegando poderia ser relacionada a outros líquidos além da infusão de café. Além disso, o desenho está na placa representada fora da construção e poderia ser a propaganda de uma bebida e não a indicação de um lugar que serve café. Para que haja a associação de um desenho de uma xícara com uma cafeteria é necessário o conhecimento de várias convenções. Duas dessas convenções foram estabelecidas por hábitos que determinaram, na cultura brasileira, o café como a mais popular bebida quente servida em xícara e, também, que locais que servem café sejam identificados com desenhos de xícaras fumegantes. Essas duas convenções, entre outras, estabelecem o desenho da xícara de café como símbolo de cafeteria. A relação indicial entre a placa e a construção, que é manifesta no desenho, estabelece que a placa se refere à construção e determina sua função simbólica de identificação daquela construção como cafeteria. 3.3 Considerações sobre a estética da Imagem. Anteriormente, foi dita a proposição que sustenta esta análise, considerando que o Learning Object Portal Edu Musical representa, além de outros significados, o conceito de conservantismo. Isso é intuído, inclusive, porque sua observação propõe como interpretante a idéia de conservatório musical, a despeito do termo “Portal” ter sido renovado, por sua adoção no ambiente da internet, e do nome “EduMusical” que soa como algo informal e moderno. Em parte, essa intuição decorre das sensações propostas pela estética gráfico-visual da imagem expressa na página inicial (Figura 3). Essa imagem apresenta cores chapadas e formas planas delimitadas por linhas pretas. Esses recursos remetem aos desenhos animados mais antigos e, também, a histórias em quadrinhos e a ilustrações de livros didáticos, anteriores à utilização dos recursos de computação gráfica. Há um anacronismo estabelecido no contraste entre expressão de atualidade, decorrente do suporte digital eletrônico do vídeo do computador, e a estética gráfico-visual da imagem, recusando o uso de efeitos tridimensionais e recursos luminosos da linguagem gráfica que simula no plano do vídeo as três dimensões. Figura 3: Detalhe ampliado da imagem da primeira página do Portal Edu Musical. Fonte: Portal Edu Musical disponível em: http://guarani.lsi.usp.br/edumusical/atual/index.html Há um excesso de elementos na imagem, especialmente linhas, que dificultam sua leitura. Além disso, a imagem é pequena com relação à área do vídeo, ocupando pouco espaço, apesar de estar situada no centro da tela (Figura 1). Há um reforço do sentido de austeridade, que é determinado pelo uso de linhas ortogonais, de formas quadrangulares e de cores fechadas com tons de cinza, preto, marrom e ocre (Figura 2). A profusão de elementos, a pequena dimensão da área da imagem, a representação bidimensional, austeridade das formas e tonalidades expressam uma estética conservadora, mais próxima das antigas ilustrações de livros didáticos do que das estéticas gráficas pós-digitais. Os ícones figurativos, como já foi dito, provocam sensações, sentimentos e promovem associações simbólicas. Uma mancha de luz multicolorida provoca no observador sensações visuais e, também, sentimentos de agrado ou desagrado, de acordo com suas cores, sua luminosidade, sua uniformidade ou variabilidade, entre outras características. Além disso, o observador pode associar o formato e as outras características da mancha de luz a um determinado ser vivo, animal ou vegetal, ou a um determinado objeto de uso ou instrumento e assim por diante. Quando há associação, o observador se transforma em um leitor capaz de atribuir significado ao que vê. Mas o observador pode ser um leitor ainda mais sofisticado e relacionar o que vê não somente com figuras de seres e objetos, mas também com temas, de modo que uma mancha multicolorida possa ser associada à paz ou à violência, adquirindo um simbolismo complexo. Portanto, a partir de associações entre sensações, sentimentos e idéias, os elementos sensíveis ou estéticos vão sendo considerados e interpretados como signos icônicos, indiciais e simbólicos. Retomando os elementos figurativos da imagem em estudo (Figura 2) e a proposição de que essa imagem pode ser associada ao conceito de conservantismo, que caracteriza a primeira página do “Portal Edu Musical”, alguns elementos são destacados devido ao seu valor simbólico: 1. O fundo da imagem configura o céu predominantemente uniforme em azul e branco, indicando como foi dito um dia claro, luminoso. Isso remete primeiramente a sensações específicas, sentimentos agradáveis e conservadores e, posteriormente, aos tradicionais conceitos de limpeza, beleza e tranqüilidade. 2. O desenho das edificações se mostra uma representação visual estilizada, com cores planas, formas quadrangulares e contornos em preto. O edifício central também ocupa a maior parte da composição, o que indica sua importância na ilustração da metáfora que identifica e representa o Portal. A estrutura simétrica e rigorosa do desenho, juntamente com as cores e os tons sóbrios o faz simbolizar um edifício institucional, tradicional e conservador. 3. Os desenhos da bandeira brasileira e do trabalhador ladeiam a parte de cima da representação do edifício central. Além da representação das figuras, o caráter institucional do edifício é reforçado pela presença da bandeira, que atua como índice institucional. A pátria e o trabalho são também simbolizados, impondo o caráter cívico, patriota, de ordem e disciplina. O ato do trabalhador indica conservação e também reforça o conceito de conservantismo. 4. O desenho da harpa, que é um instrumento musical antigo14, apresentado como símbolo clássico da música, também, é proposto como elemento símbolo do edifício que representa a escola de música, reforçando o sentido de conservatório e o conceito de conservantismo. Os ícones apresentados acima, além de símbolos figurativos de objetos como céu, edifícios, bandeira, trabalhador e instrumento musical, também se apresentam como símbolos morais de institucionalização, de civismo, de tradição, de trabalho e conservação que evidenciam, juntamente com as características estéticas da representação, o sentido de tradição e conservantismo. 14 De acordo com a Wikipédia (2007) “A harpa, juntamente com a flauta, é um dos instrumentos mais antigos. Teria se originado dos arcos de caça que faziam barulho ao roçarem na corda. Ela é sempre triangular, lembrando um arco de caça. Tem-se conhecimento através de fábulas épicas, poesias e trabalhos de arte, que as harpas existiam séculos antes de Cristo, na Babilônia e Mesopotâmia. Foram encontrados desenhos de harpas na tumba do Faraó Egípcio Ramsés III (1198-1166 a.C.), em esculturas da Grécia antiga e em cavernas do Iraque que datam desde 2900 a.C.”. 4 Conclusão O trabalho de construção de um Learning Object como o “Portal Edu Musical” requer a utilização de conhecimentos, tecnologias e recursos modernos e sofisticados. A partir da primeira página aqui apresentada, o usuário tem acesso, por meio dos diversos links, a várias outras páginas ou ambientes interativos. A interatividade se estabelece pelo toque do cursor que aciona sons musicais, comandos de jogos e atividades. Entretanto, seguindo as evidências visuais levantadas na primeira página aqui analisada, o conteúdo e a dinâmica de todo o “Portal Edu Musical” é marcado pelo conservantismo, que identifica esse Learning Object com um conservatório musical, como propõe a metáfora visual apresentada na primeira página. Os ícones figurativos se apresentam como índices e símbolos que indicam e representam o conservantismo de uma proposta tradicional composta como hipermídia interativa por meio da internet. O que leva a pensar essa escola de música como um conservatório, local em que se conservam tradições, as quais são encerradas no ambiente cívico e disciplinado. Não cabe aqui uma crítica ao conteúdo, porque a tradição não é um demérito por si mesma, podendo ser defendida, inclusive como um valor. Todavia, no modo como a imagem metafórica foi técnica e esteticamente composta, há comprometimentos com relação ao seu potencial significativo e comunicativo. A imagem é pequena com relação ao espaço que poderia ser ocupado, porque reúne em si muitos elementos necessários que poderiam ser apresentados com mais clareza. A falta de clareza se deve também ao excesso de linhas na definição das formas, às cores e aos tons escolhidos e, ainda, ao modo como essas cores e tons foram combinados na imagem. Pode-se aceitar a evidência que o tratamento dado às formas e às cores da imagem também segue a tradição da ilustração de livros e história em quadrinhos. Mas, é preciso considerar também que as tecnologias gráfico-digitais permitem soluções estéticas mais apropriadas para reunir a tradição com a comunicação visual na mídia eletrônico-digital. A maneira como a imagem foi composta não contribui para o sentido de clareza proposto por seu conteúdo: um dia límpido e tranqüilo, uma rua calma, sem trânsito de automóveis ou pedestres. Referências. COELHO NETTO, J. Teixeira. Semiótica, informação e comunicação. São Paulo: Perspectiva, 1983. GOSCIOLA, Vicente. Roteiro para as Novas Mídias: Do Game a TV Interativa. São Paulo: Senac, 2003. PERASSI, Richard L. S.. Semiótica, estética e Conhecimento. Florianópolis, SC: UFSC, 2007 (reprografia). SANCHEZ-ALONSO, S.; VOVIDES, Y.. Computers in Human Behavior, 23 (6), p.2585-2595, Nov 2007 SMITH, Rachel S. Guidelines for Authors of Learning Objects. The New Media Consortium, 2004. Disponível em: < archive.nmc.org/guidelines/ > Acesso em: 08 ago 2007. WIKIPÉDIA. A enciclopédia livre. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Harpa >. Acesso em: 08 nov 2007.