R ESUMOS DE C ADERNO WORKSHOP DO GRUPO DE ESTUDOS EM Semântica Formal Ana MÜLLER Distributividade: o caso dos numerais reduplicados em karitiana Lara FRUTOS Escalas de quantidade no Guarani Paraguaio Roberlei BERTUCCI A semântica das perífrases de início e interrupção Fernanda ROSA DA SILVA Estrutura informacional e inversão de escopo no português brasileiro Marcelo FERREIRA Predicação Plural com Sujeitos Singulares no Português Brasileiro Wânia MIRANDA O sintagma nominal do crioulo de Cabo Verde: uma investigação semântica Michel Assis NAVARRO Restrição aberta de domínio e quantificação universal em um dialeto da língua Kaingang Lídia LIMA-SILVA ‘Algum’ e nomes massivos no Português Brasileiro Ana MÜLLER USP Distributividade: o caso dos numerais reduplicados em karitiana Este trabalho investiga interpretações distributivas de sentenças com e sem operadores distributivos abertos em karitiana frente a duas teorias semânticas: uma que propõe que a fonte da distributividade é a existência de um operador distributivo (cf. Link 1983, 1987 e Lasersohn 1995, 1998, entre outros) e outra que propõe duas fontes possíveis para a distributividade – plural lexical e pluralização do sintagma verbal (cf. Kratzer 2003, 2005). Em particular, o trabalho investiga a semântica dos numerais distributivos em karitiana. Concluimos que interpretações distributivas são geradas pelo menos de duas maneiras nessa língua e possivelmente em todas as línguas humanas: cumulatividade (plural) lexical e pluralização do predicado. Em particular, para o karitiana, defendemos que os numerais distributivos pluralizam eventos e determinam a cardinalidade do argumento nominal interno do sintagma distribuído. Lara FRUTOS USP/CNPQ Escalas de quantidade no Guarani Paraguaio Este trabalho apresenta uma análise semântica dos verbos e adjetivos do Guarani Paraguaio baseada nos pressupostos da Semântica Formal. Mais especificamente, este trabalho se propõe a analisar a interação de verbos e adjetivos com um morfema de grau da língua, a partícula {-pa}. São analisados neste trabalho adjetivos, verbos e construções causativas com verbos deadjetivais e suas possíveis leituras com o morfema {-pa}. Demonstra-se aqui que o morfema {-pa} funciona como um modificador da relação de predicação entre o adjetivo ou o evento e um argumento nominal. Essa relação está dada em termos de uma estrutura de graus, de acordo com a semântica escalar proposta por Kennedy (1999b) e Kennedy & McNally (2005). Essas teorias partem do pressuposto de que o adjetivo contém uma variável de grau d em sua entrada lexical e que adjetivos possuem uma escala de uma determinada propriedade. Essa variável é quantificada através de um morfema de grau. Proponho aqui que além de modificador de grau que satura a variável de grau dada no léxico, o adjetivo também pode receber um modificador de grau quando possuir uma escala de quantidade, dada composicionalmente de acordo com o modelo de Bochnak (2010). Nesse sentido, {-pa} não atuaria sobre a variável de grau dada pelo léxico do adjetivo ou do verbo, mas sobre uma escala de quantidade construída na sintaxe. Uma das vantagens desta proposta é que isso permitiria que adjetivos fossem modificados simultaneamente por {-pa} e outros modificadores de grau que atuam sobre a escala de intensidade de adjetivos, o que de fato ocorre na língua. Para sustentar minha hipótese de análise, apresento alguns do Guarani Paraguaio em que o morfema {-pa} co-ocorre com outros intensificadores de grau. Em relação aos verbos deadjetivais, mostrarei que estes não possuem uma leitura atélica como os verbos deadjetivais do Inglês e do Português Brasileiro. Isso serve de evidência para concluir que {-pa} não predica sobre a escala de propriedade dada pelo adjetivo formador do verbo, mas que atua sobre a relação deste verbo com seu objeto-tema. Em suma, este trabalho mostra que {-pa} opera sempre sobre escalas de quantidade e nunca sobre a variável de grau do léxico de verbos e adjetivos. Roberlei BERTUCCI USP/CAPES A semântica da perífrases de início e interrupção Este trabalho tem como objetivo comparar as perífrases aspectuais com os verbos começar vs. passar e parar vs. deixar, apresentando semelhanças e diferenças semânticas entre os verbos que formam tais perífrases. (1) a. b. (2) a. b. Pedro começou a correr. Pedro passou a correr. Pedro parou de correr. Pedro deixou de correr. Mostraremos que esses verbos possuem diferenças importantes: começar e parar, por exemplo, são verbos que selecionam predicados que denotam eventos com estágios, enquanto passar e deixar não fazem tal requerimento na seleção de complementos. Vamos propor que essa diferença na seleção esteja relacionada com a contribuição semântica que esses verbos oferecem ao significado da sentença: enquanto começar a+infinitivo denota o subevento/estágio mínimo inicial de um evento maior, passar a+ infinitivo denota o início de um evento homogêneo (um hábito ou estado, por exemplo); e enquanto parar de+infinitivo denota a interrupção de um evento com estágios em desenvolvimento, deixar de+infinitivo denota o abandono de um evento homogêneo. Neste trabalho, mostraremos algumas consequências importantes dessa análise. Fernanda ROSA DA SILVA USP/CAPES Estrutura informacional e inversão de escopo no português brasileiro O presente trabalho tem como tema principal as relações de escopo entre quantificadores em sentenças do português brasileiro (PB). Mais especificamente, o objetivo desta pesquisa é investigar o efeito semântico do foco nas relações de escopo em sentenças declarativas do PB, buscando compreender de que maneira as noções semânticopragmáticas de tópico e foco interagem com a noção sintático-semântica de escopo atrelada a sintagmas quantificadores de diversos tipos como: universais (todo), cardinais (dois), cardinais modificados (mais de, menos de) e existenciais (algum(s)) e negação (nenhum). Nossa hipótese é de que, apesar do Português Brasileiro ser uma língua voltada para o discurso, conforme afirma Negrão (1999), e, em contextos neutros, priorizar interpretações das sentenças a partir da estrutura fornecida pela sintaxe aberta, em contextos marcados por foco, em que haja um contexto de contrastividade, poderá haver inversão de escopo (cf. Erterchik-Shir (2007)). Para verificação desta hipótese, foram testadas sentenças com quantificadores dos tipos citados acima nas posições de argumento externo e interno do verbo em contextos de foco. Essas sentenças foram examinadas a partir da criação de contextos específicos de focalização. Tal análise nos mostrou que uma das possibilidades de inversão de escopo no português brasileiro é em contextos em que haja uma marcação de foco contrastivo. No entanto, não são todos os sintagmas quantificados que permitem inversão de escopo. Sintagmas quantificados indefinidos (alguns), por exemplo, na posição de sujeito não permitem inversão de escopo, isto porque este tipo de quantificador assume uma posição sintática em LF mais alta que constituintes com marcação de foco. Se o mesmo tipo de sintagma estiver na posição de não é capaz de receber marcação de foco contrastivo por não apresentar força pragmática suficiente para contrastar com outros elementos do contexto. Marcelo FERREIRA USP Predicação Plural com Sujeitos Singulares no Português Brasileiro O trabalho investiga em que medida sujeitos singulares do ponto de vista morfossintático podem combinar com predicados ditos semanticamente plurais, desencadeando leituras recíprocas, coletivas, cumulativas e distributivas. Dentre as expressões singulares que serão analisadas, destacam-se NP quantificadores (“mais de um aluno”, “a maioria dos alunos”), NPs denotadores de grupo (“o grupo de meninos”, a turma”, “a comissão”, “a mulherada”), e nomes nus singulares (“menino”, “criança”). O comportamento dessas expressões nominais será contrastado com o de expressões plurais com singificado próximos (“pelo menos dois meninos”, “os membros desse grupo”, “as mulheres”, “crianças”, etc) . Já entre os predicados, serão investigados predicados recíprocos (“se abraçar”), coletivos (“se reunir”), e sintagmas verbais que podem dar margem a leituras cumulativas e distributivas (“comprar 10 livros”, “ler um conto” ). Como os sujeitos analisados são singulares e desencadeiam concordância singular nos predicados com que se combinam, coloca-se a questão da dependência de leituras plurais em relação a morfologia plural. Esse tema tem sido fonte de debate na literatura recente (ver Kratzer 2004, Winter 2001, dentre outros) e os dados do português podem contribuir para uma melhor compreensão dessa relação entre morfologia e semântica no domínio do número e na construção de uma tipologia de expressões nominais para esse domínio. Mostraremos que há discrepância de comportamento entre as classes delineadas acima (“mais de um” VS. “mulherada”) e também entre os membros internos dessas classes (“mais de um” VS. “a maioria de” ou “a turma” VS. “a mulherada”), e indicaremos possíveis razões para tais discrepâncias. Wânia MIRANDA USP/CNPQ O sintagma nominal do crioulo de Cabo Verde: uma investigação semântica Neste trabalho, será apresentado o projeto de mestrado O sintagma nominal do crioulo de Cabo Verde: uma investigação semântica, apontando as problematizações sobre a abordagem do nome no caboverdiano (CCV). O sistema de determinantes do sintagma nominal em CCV coloca questões que despertam interesse para os estudiosos da língua, pois apresenta fatos que não se atestam em outras línguas próximas, como o português. A partícula kel, por exemplo, é tida como um artigo definido, mas a definitude não é necessariamente marcada por ela, podendo os nomes sem determinantes também expressá-la em caboverdiano. Além disso, de acordo com grande parte dos estudiosos do CCV, o uso da partícula kel não é nem necessário, nem previsível. Entre as características de kel, observamos que ela pode ocorrer tanto com nomes específicos quanto com nãoo específicos; pode retomar um referente, contudo, este pode ser retomado sem a presença de qualquer determinante; parece não poder ser utilizada de modo atributivo sem qualquer familiaridade com o referente e também não poder se referir a entidades hipotéticas ou não existentes. Kel expressa especificidade no CCV, entretanto, sua presença, assim como a presença de qualquer outro determinante, não é necessária para que os nomes em caboverdiano sejam específicos. Os nomes com a presença de determinante, assim como os próprios determinantes do caboverdiano, possuem uma variabilidade interpretativa. A interpretação relevante, de acordo com Baptista (2002), é capturada pelo contexto (no próprio texto ou fora dele) ou pragmaticamente, com restrições de usos “familiares aos falantes da língua”. Neste trabalho, além da partícula kel, apresentaremos brevemente as características do sistema de determinantes do crioulo de Cabo Verde. Michel Assis NAVARRO USP/CNPQ Restrição aberta de domínio e quantificação universal em um dialeto da língua Kaingang Nesta apresentação, sugeriremos, num primeiro momento, que o determinante definido D no Kaingang Paranaense dialeto da língua Kaingang, do tronco Macro-Jê, falada nas regiões sul e sudeste do Brasil - pode ter por função restringir o domínio do quantificador universal. Em Giannakidou 2003, Etxeberria 2005 e Etxeberria & Giannakidou 2009, são apresentadas evidências de que em Grego e Basco a restrição de domínio é realizada abertamente. A restrição de domínio para os quantificadores nessas línguas ocorre via aplicação de D sobre um Qdet. Do mesmo modo, há evidências de que a restrição contextual de domínio no Kaingang Paranaense também ocorreria quando D se encontra em uma posição sintática em que ele é forçado a tomar um quantificador como seu argumento. De maneira que no Kaingang Paranaense, como no Grego e no Basco, a restrição de domínio não se aplicaria somente a um argumento nominal, mas também a Q, fornecendo uma variável contextual C cujo valor seria um conjunto saliente no discurso. Contudo, num segundo momento da apresentação, mostraremos algumas contra-evidências que parecem sugerir que no Kaingang Paranaense o universal kar (todos) se comporta mais como um modificador, à la proposta de Lasersohn (1999) para all do Inglês, i.e., não tem uma força quantificacional própria e sua única função é de controlar o quanto de desvio da verdade é pragmaticamente permissível. Assim, no Kaingang Paranaense D não operaria sobre um Q-det, como em Basco e Grego, mas sim sobre um NP. O que sugere que o determinante definido D no Kaingang Paranaense, em contextos em que ele co-ocorre com kar, não perderia a sua função iota ou max para funcionar meramente como um operador preservador de tipo e restritor de domínio adjungido a uma projeção Q-det, como proposto por Giannakidou 2003, Etxeberria 2005 e Etxeberria & Giannakidou 2009 para o Basco e o Grego. D continuaria sendo um artigo definido clássico ocupando o núcleo de uma projeção DP e kar um modificador que veicula a ideia de totalidade/completude. Lídia LIMA-SILVA USP/FAPESP ‘Algum’ e nomes massivos no Português Brasileiro Neste trabalho discutimos construções do português brasileiro (PB) em que ‘algum’ combina-se com nomes massivos. O uso de ‘algum’, contrastando com ‘um’, está associado à implicatura de ignorância (Lima-Silva, 2007). Ao proferir uma sentença com o indefinido ‘algum’, o falante implica que não pode apontar o referente, por isso (2) é estranha, se comparada a (1). O uso de um sintagma ‘algum + nome contável singular’ pode implicar ignorância de identidade e de quantidade; ‘algum + nome massivo’ também pode implicar ignorância de quantidade (ex. (3)) e de identidade (se ‘leite’ for interpretado como ‘tipo de leite’.) Alonso-Ovalle & Menéndez-Benito (2009) discutiram o contraste entre ‘un’ e ‘algún’ no espanhol. Para eles, o efeito de ignorância é uma implicatura devida à interação entre modalidade e o fato de ‘algún’ ser um indefinido cujo domínio não pode ser unitário. A questão colocada aqui é se a proposta de Alonso-Ovalle & Menéndez-Benito (2010) para explicar dados com ‘algún+ nome contável singular’ pode ser aplicada também a dados do PB em que ‘algum + nome massivo’ implicam ignorância. Para explicar como o uso de ‘algunos’ não implica ignorância (fato semelhante ao PB; ver contraste entre sentenças (2) e (4)), os autores propõem que a restrição sobre o domínio feita por ‘algunos’ e pluralidade bloqueiam o efeito de ignorância. Grosso modo, a ausência de tal implicatura pode ser associada à natureza cumulativa do plural. Se assumirmos a natureza cumulativa de nomes massivos, é preciso rever a aplicação da proposta dos autores para dados como (3). Ao analisar dados com indefinidos no PB em interação com nomes massivos, contribuímos para o estudo da semântica dos indefinidos de modo geral. (1) Um aluno, João, entrou. (2) #Algum aluno, João, entrou. (3) A Maria tem algum leite na geladeira. (4) Alguns alunos, João, Pedro e Maria, entraram.