Apresentação O Edital de seleção pública para provimento do cargo

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Apresentação
O Edital de seleção pública para provimento do cargo de Analista de Planejamento e
Orçamento – APO, de 2009, trouxe algumas inovações importantes. Em primeiro lugar,
foi lançado separadamente do Edital de seleção para o cargo de EPPGG, o que
costumeiramente ocorria de forma conjunta. Em segundo lugar, trouxe um conteúdo
programático muito mais completo, em relação aos anos anteriores, no que se refere aos
conhecimentos afetos à área de planejamento, tanto na prova objetiva, quanto na
discursiva. Pela primeira vez o conteúdo de Ciência Política foi incluído dentre as
disciplinas cobradas no concurso, bem como as disciplinas Administração Geral,
Planejamento e Desafios Contemporâneos ao Desenvolvimento Brasileiro.
Percebe-se, pelos programas das provas objetiva e discursiva reproduzidos nos quadros
1 e 2 abaixo, que o Ministério do Planejamento – MPOG espera dos novos Analistas de
Planejamento e Orçamento conhecimentos mais profundos nas áreas de ciência política
e planejamento, traços não determinantes em provas anteriores. Isso se explica talvez
pela tradição histórica do nosso Estado em dedicar mais energia às atividades
relacionadas à elaboração e execução do orçamento anual (LOA), do que às atividades
de planejamento temático, mais conectadas às ações de formulação de políticas públicas
implementáveis no médio e longo prazos. Essa tradição, contudo, vem se modificando.
O atual corpo dirigente do MPOG tem enfatizado a importância da participação do
órgão junto às esferas decisórias de ações e programas governamentais considerados
estratégicos e prioritários ao programa de governo em execução.
O atual secretário da Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos – SPI,
órgão competente do MPOG pela gestão das atividades de planejamento, tem a visão de
que os APOs lotados na secretaria devem apresentar conhecimentos consistentes em
políticas públicas, não apenas em processos de elaboração de orçamento e em finanças
públicas, já que os analistas deverão acompanhar os processos de formulação e
implementação de políticas públicas junto a órgãos finalísticos temáticos (como os
Ministérios da Educação, da Saúde, do Meio Ambiente, da Agricultura, etc.).
Anteriormente, esta integração entre o Ministério do Planejamento e os ministérios
finalísticos ocorria apenas uma vez ao ano, durante os processos de elaboração ou
revisão do Plano PluriAnual – PPA, que, entretanto, se assemelhava mais a um
procedimento meramente formal-burocrático, que a um processo efetivo de construção
coletiva dos programas e ações temáticas componentes do PPA.
A SPI entrava no processo decisório apenas em sua fase final, quando todas as decisões
já haviam sido tomadas pelos órgãos finalísticos. Estes informavam à SPI sobre suas
escolhas durante as rodadas de discussão de formulação ou revisão do PPA. Membros
da SPI sentavam-se na mesa de reuniões com representantes dos órgãos finalísticos para
ouvir suas demandas acerca da formatação do PPA, muitas vezes sem entender muitas
das questões por eles apresentadas; avaliavam a pertinência dos pleitos; e remetiam-nos
à apreciação da Secretaria de Orçamento Federal – SOF, que daria o parecer final sobre
a pertinência dos pedidos de inclusão ou exclusão de programas ou ações no PPA. Não
havia participação da SPI na construção dos programas e ações propostos pelos órgãos
finalísticos, apenas apreciação a posteriori.
Hoje, a pretensão do MPOG é que essa atuação seja substituída pela participação de
membros da SPI nos processos de formulação dos programas e ações prioritários, em
cada área temática de políticas públicas, a serem incluídos no PAA, e por sua
participação no monitoramento da implementação desses programas e ações junto aos
órgãos finalísticos competentes por sua gestão. Um dos principais motivos
justificadores de tal resolução é a necessidade de superação dos PPAs ‘frankinstein’,
cujos programas e ações não guardam coerência ou complementaridade entre si,
enquanto conjunto, ou dos PPAs ‘de fachada’, que não representam a realidade de
execução de políticas públicas pelos órgãos finalísticos, mas cumprem somente a função
burocrática de permitir alocação de recursos orçamentários a serem administrados pelos
mesmos.
É com olhar sobre essas novas diretrizes para as ações de planejamento exercidas pelo
MPOG, que o novo concurso de APO se enquadra. Mais foco em áreas temáticas e em
processos de formulação, implementação e avaliação de políticas públicas, por isso as
disciplinas Teoria Política Aplicada, Planejamento e Desafios Contemporâneos ao
Desenvolvimento Brasileiro (ver quadros 1 e 2).
Quadro 1 – Prova Objetiva
Quadro 2 – Prova Discursiva
Administração Geral e Pública apareceu em consonância com o programa do último
concurso de gestor, pois ao que parece o MPOG está querendo um APO mais próximo
do EPGG. Então, foco em políticas públicas! Vamos ao programa da disciplina Teoria
Política.
Análise da última prova de EPPGG por temas do edital e número de questões cobradas:
Gabarito:
4 questões letra ‘a’, 3 questões letra ‘b’, 3 questões letra ‘c’, 5 questões letra ‘d’ e 5
questões letra ‘e’.
1. Introdução
1.1. o que é Ciência Política?
O tema 1 do Edital apresenta aos candidatos os conceitos basilares do campo de
estudo da ciência política. Mas afinal o que significa ciência política?
política Que ciência é
esta? Será que é uma ciência mesmo? O que estuda e como se organiza o estudo da
ciência política? São questões introdutórias fundamentais para iniciarmos o estudo do
tópico 1.
A política perpassa muito das nossas preocupações. O tema é recorrente em
conversas, artigos acadêmicos, matérias jornalísticas e em discussões do dia a dia. Há
muito se estuda fenômenos políticos. Mas, afinal de contas, qual é o objeto da Ciência
Política? O que diferencia a Ciência Política das demais ciências? Qual é o
relacionamento da ciência política com o estudo das políticas públicas e da
administração pública?
Há diversas concepções iniciais sobre o objeto da ciência política. Duas delas são
consideradas marcantes:
– A ciência política = “Ciência do Poder”.
– A ciência política = “Ciência do Estado”.
A filosofia e o direito dedicaram grande parte dos seus trabalhos à discussão de temas
relacionados ao exercício de Poder e ao Estado. Desse estudo surgiram importantes
contribuições, mas a maioria delas feita de maneira isolada.
1.1.1. Histórico
Maurice Duverger (1981)1, professor da Ciência Política na Universidade de
Bordeaux na França, e um dos principais cientistas políticos do séc. XX classificou a
Ciência Política em três fases:
a) “A pré-história”: que vai até o início do séc. XIX, quando não se estudava
Ciência Política mediante métodos “rigorosamente científicos”.
b) “Período intermediário”: ao longo do séc. XIX, quando o termo começa a ser
utilizado de forma mais sistemática e os primeiros esforços surgem no estudo
da Ciência Política.
c) “O período contemporâneo”: Que vai até hoje em que se reafirma a Ciência
Política contemporânea.
Segundo Duverger (1981), ao longo do séc. XIX, problemas políticos eram
estudados fundamentalmente sob o ângulo moral. Com isso, buscava-se estudar as
formas de exercício de poder consideradas “boas” e criticar aquelas consideradas “más”.
O método de análise era o raciocínio dedutivo, partindo de especulações e pressupostos
firmados “à priori” e não da observação de fatos ou da indução fundada nesses fatos.
1
DUVERGER, M. “Ciência Política. Teoria e Método”. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981.
Com isso, ao início do século XX, o estudo de ciência política seguia,
fundamentalmente, essa linha, ou seja: a) era puramente descritivo, isso é, fundada
apenas na caracterização dos diferentes tipos de organizações e instituições políticas, ou
de eventos políticos específicos, mas com pouca preocupação interpretativa e
explicativa (o por quê dos eventos); b) era normativo ou filosófico, ou seja, havia uma
preocupação muito grande em prescrever o que era bom, ruim, justo, certo, ou errado.
Ao longo da primeira metade do séc. XX a Ciência Política evoluiu
consideravelmente, mas se concentrou bastante nos EUA. O primeiro grande impulso da
Ciência Política no séc. XX ocorreu com o advento do movimento chamado
“Behaviorista” (comportamentalista). Surgiu nos EUA – Univ. Chicago – onde os
estudos de ciência política eram comandados por Charles E. Merriam. Dentre seus
alunos importantes intelectuais surgiram Harrod Laswell , David Truman, Hebert Simon
e Gabriel Almond. Movimento similar surgia, mais ou menos, no mesmo momento, na
Univ. de Cornell. O objetivo desses movimentos era o Estudo do comportamento dos
vários atores políticos (eleitores, legisladores, burocratas, presidentes e etc).
O Movimento comportamentalista adotava técnicas consideradas ‘avançadas’ de
coleta e análise de informação, advindas da estatística (especialmente pesquisas por
amostragem), da psicologia, da sociologia e da economia. Foi nesse período que a
ciência política passou a importar modelos matemáticos de tomada de decisões
formulados no âmbito da teoria econômica de escolha racional individual – a microeconomia. Pode-se dizer que foi o primeiro momento da disciplina onde a preocupação
principal passou a ser a produção de generalizações, com a criação de ‘modelos’, teorias
e tipologias de comportamentos políticos de atores como eleitores, parlamentares,
presidentes, ministros, etc. Ao longo dos anos 30 e 40 a ciência política sofreu novo
impulso, com a migração de um grande número de intelectuais europeus para os EUA,
em decorrência da crise econômica e das guerras no continente europeu, instalando-se
uma crise no ambiente universitário.
Os europeus traziam consigo a abordagem das ciências sociais européias do
século XIX, especialmente a influência de Marx, Weber, Durkheim, Pareto, Mosca,
Michels e mesmo Freud. Além do impacto dos seus trabalhos e pesquisas, muitos desses
intelectuais passaram a ocupar lugar de destaque no ambiente universitário dos EUA,
influenciando a produção acadêmica na área. A produção acadêmica se multiplicava e
passava a assumir maior diversidade de abordagens e de posturas teóricas e
metodológicas. O comportamentalismo dominante passou a se mesclar com uma série
de outras diretrizes de pesquisa. Ao longo da 2ª Guerra Mundial, um grande número de
intelectuais da área de ciência política se envolveu no esforço de guerra e participou das
atividades governamentais. Ao retornar à universidade, no pós guerra, este intelectuais
passaram a se interessar mais intensamente pelo estudo do governo e das políticas
públicas, e também pelos sistemas políticos de outros países.
Esses estudos passam a receber apoio, mais ou menos sistemático de instituições
públicas e privadas (Fund. FORD, Fundação Rockfeller, Fundação Carnegie, etc.).
Vários Estudantes e pesquisadores nos EUA e na Europa são estimulados a estudar os
sistemas políticos da América Latina. Ao mesmo tempo, muitos estudantes brasileiros
são enviados aos EUA e à Europa para aprofundar seus estudos. Cria-se uma base
organizacional e recursos humanos para o desenvolvimento de pesquisas na área de
ciência política. Movimento similar ocorre em vários outros países da América latina.
Com a expansão do número de pesquisadores, a ciência política vai se consolidando
como disciplina no mundo inteiro. É neste impulso que o Brasil passa a desenvolver a
referida disciplina.
A área de ciência política teve no Brasil, historicamente, duas vertentes
(SCHWARTZMAN, 1977)2. A mais tradicional, vinculada ao Direito, emerge das Teorias
do Estado e se mistura ao objeto de preocupação de considerável número de juristas e
constitucionalistas, nas principais Faculdades de Direito do país. A segunda vertente,
mais ligada à sociologia e à economia, manifesta-se no país a partir da fundação da
Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1933, segundo Schwartzman (1977).
Entretanto, como aponta o autor, a conexão estreita entre a Ciência Política e o Direito,
de um lado, e a Sociologia, de outro, “fez com que a disciplina custasse a adquirir, no
Brasil, feição própria”, que a possibilitasse ser cunhada de ‘ciência’. É a partir da
década de 50, exatamente no período pós guerra, que a disciplina começa a trilhar seus
próprios rumos e adquirir especialização de ‘ciência’.
Na década de 50, a Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas
Gerais institui a primeira publicação universitária especializada em estudos políticos, a
Revista Brasileira de Estudos Políticos – RBEP, que também foi pioneira na publicação
de estudos eleitorais, que traziam pela primeira vez ao Brasil a análise de dados
quantitativos para o entendimento de fenômenos políticos, nos moldes da metodologia
comportamentalista americana. Com a criação do Departamento de Ciência Política da
2
SCHWARTZMAN, S. “Ciências Políticas no Brasil, Avaliação e Perspectivas”, CNPq, 1977.
Disponível em: http://www.schwartzman.org.br/simon/cpolitica.htm
Universidade Federal de Minas Gerais, em 1965, se forma o primeiro programa de pósgraduação e pesquisa em Ciência Política no Brasil, seguido dois anos depois pelo
Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ).
Mais tarde, uma série de centros de ensino e de pesquisa na área foram fundados
no Brasil, entre eles o Departamento de Ciência Política da Universidade de Brasília
(1989), que foi o primeiro no país a oferecer o curso de ciência política como curso de
graduação autônomo – separado do curso de ciências sociais. Hoje pode-se dizer que a
ciência política é uma disciplina diferenciada das demais ciências sociais e com grande
número de especializações e abordagens. Existem diferentes perspectivas metodológicas
e teóricas para os problemas relacionados ao estudo da política, que vão desde modelos
matemáticos do comportamento legislativo a leituras feministas de políticas públicas.
Apesar disso, segundo Duverger (1981), permanece o interesse pelo estudo da filosofia
e da história política, que deram início ao estudo do tema.
1.1.2. O objeto de estudo da Ciência Política
Ao longo do sec XX, em meio à expansão e diversidade de opiniões sobre o
objeto de estudo da CP, destacam-se, segundo Duverger (1981):
a) Como a sociedade aloca valores mediante o uso da autoridade
b) Formação e atuação do governo
c) Dinâmica do espaço público nas sociedades contemporâneas
Todas essas definições (e há muitas outras) têm seu mérito e devem ser levadas
em consideração. No entanto utilizaremos a definição do Prof. Paulo Calmon (UnB),
por questões de conveniência, que, com o intuito de proporcionar uma definição mínima
em sua disciplina Modelos de Análise de Políticas Públicas (Mestrado de Ciência
Política – UnB), propõe que:
“Sempre que indivíduos em grupo estejam interagindo, decidindo, cooperando,
disputando, barganhando, se agrupando, residem fenômenos relacionados ao estudo da
ciência política. Em outras palavras: a ciência política estuda, fundamentalmente, o
comportamento dos grupos, e da sociedade, na busca, definição e implementação dos
seus objetivos como grupo (ou sociedade)”.
Esta definição, apesar de cunhada de ‘limitada’ pelo próprio autor, é considerada
conveniente, pois “nos permite examinar aspectos fundamentais do comportamento e
das instituições políticas”.
1.2. O estudo de fenômenos políticos
Acordado o entendimento de que o objeto de estudo da ciência política é, em termos
gerais, o comportamento de grupos envolvidos em processos de tomada de decisões
sobre seus objetivos coletivos, passemos aos métodos adotados por pesquisadores da
área para o estudo de eventos dessa natureza.
Para o estudo de grupos de indivíduos envolvidos em processos de definição e
implementação de seus objetivos coletivos, cientistas políticos estabelecem modelos e
teorias. Como a realidade humana é muito complexa e afetada por inúmeras variáveis,
propõe-se a construção de modelos, que apresentam de forma matemática ou verbal as
principais relações entre variáveis que podem afetar os resultados obtidos por um grupo.
Muitos dos estudos e dos grandes autores da ciência política se valeram de modelos
teóricos pára explicar determinados fatos políticos experimentados pela sociedade de
seu tempo (Ex: Hobbes, Locke, Marx, Mosca, Pareto, etc.). Entretanto, modelos são
sempre simplificações da realidade. Têm a vantagem de explicar, de forma clara e
transparente o relacionamento entre causa e efeito de eventos analisados, o que facilita a
comunicação e competição entre teorias. (Ex: Marx – teoria sustentada por seu modelo
de sociedade organizada em classes: o capitalismo é fadado ao fracasso porque explora
a classe de trabalhadores, que é justamente a responsável pela sua existência, quando
esta classe tomar consciência de sua condição de explorados rebelar-se-á contra a classe
de capitalistas e não mais trabalharão, ocasionando a falência do sistema.)
Por outro lado, como simplificações da realidade, modelos e teorias estão sempre
sujeitos a uma série de limitações metodológicas, visto que o campo da ciência política,
e o das ciências sociais como um todo, é marcado por questões complexas que
envolvem a imprevisibilidade do comportamento humano3, diferentemente do
comportamento da gravidade, por exemplo, que é completamente previsível e imutável.
Assim, várias teorias são propostas são propostas para responder a perguntas como:
•
Por que países com sistemas eleitorais proporcionais tendem a gerar um número
grande partidos?
•
Por que propostas de candidatos a presidente da República tendem sempre a
convergir às vésperas da eleição?
3
Tal imprevisibilidade é fruto da reflexividade humana, que segundo Perez-Gomes (1999)*, é
característica do ser humano racional e configura a capacidade por meio da qual o homem, voltando-se
para si mesmo, para as construções sociais, intenções, representações, estratégias de intervenção,
simbologias e intencionalidades, realiza auto-análise, e análise dos grupos sociais aos quais pertence,
mobilizando o conhecimento construído para enriquecer e alterar a realidade na gama de papéis sociais
que, simultaneamente, desempenha.
• PEREZ GOMEZ, A. La cultura escolar em la sociedad neoliberal. Madrid: Morata, 1999
•
Por que a influência de lobbies tem crescido apesar dos seus interesses quase
sempre serem opostos aos do restante da população?
•
Por que países democráticos raramente entram em guerra?
•
Por que os chamados ‘Tigres Asiáticos’ se desenvolveram mais rapidamente que
os países da América Latina?
Enquanto perguntas como: ‘Porque um objeto quando jogado para cima cai?’,
encontra como resposta uma única teoria dominante, que pode inclusive ser chamada de
‘lei’ – a lei da gravidade, posto que é uma teoria de comprovada aplicabilidade. Nas
ciências sociais é praticamente impossível se estabelecer uma ‘lei’. Podem existir
diversas teorias que tentem explicar, por exemplo, por que pessoas aceitam dar seu voto
a candidatos notoriamente corruptos, e por em suas mãos poderes de decisão acerca de
decisões coletivas, mas devido à imprevisibilidade e à reflexividade do comportamento
humano será tarefa muito difícil transformar qualquer dessas teorias em lei, ou seja, em
teoria aplicável a todo e qualquer ser humano.
2. Tema 1: Conceitos Básicos da Ciência Política
Os conceitos básicos da ciência política incluídos no item 1 do edital são basilares
para a compreensão dos modelos e teorias da disciplina. São conceitos aplicáveis ao
relacionamento entre indivíduos organizados em grupos, de cuja organização e coesão
depende o sucesso de suas conquistas coletivas. Assim, a compreensão da dinâmica de
relacionamento intra e inter grupos envolve o conhecimento dos conceitos consenso,
conflito, política, poder, autoridade, dominação, legitimidade, soberania, ideologia e
hegemonia, que não coincidentemente foram incluídos no primeiro item do edital.
2.1. Consenso
2.2. Segundo Bobbio, Matteucci, e Pasquino4, o termo Consenso denota:
“a existência de um acordo entre os membros de uma dada unidade social sobre os
princípios, valores normas, bem como aos objetivos almejados pela comunidade e aos
meios para alcançá-los” (Bobbio, Matteucci, e Pasquino, 2007, 240)”.
Assim, em processos de negociação entre indivíduos de um grupo, ou de uma
comunidade, sobre decisões a serem tomadas em prol do interesse coletivo, a situação
de consenso é aquela na qual os membros são capazes alcançar um acordo geral entre si
sobre o quê e como fazer. Cabe ressaltar, contudo, que a situação de consenso é
4
BOBBIO, N., MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. ‘Dicionário de Política’. Brasília: Ed. da
Universidade de Brasília. 2007 – verbete: Consenso.
eminentemente um estado relativo, pois, a obtenção de uma decisão consensuada não
significa necessariamente que todos os membros do grupo dispunham da mesma
opinião a priori. Significa tão somente que no processo de negociação os diversos
atores expuseram suas opiniões e chegaram a um denominador comum, convencendo ou
sendo convencidos, nos pontos de eventuais discordâncias. Não significa também que o
coletivo atingiu, necessariamente, um ‘meio-termo’ que deu origem à solução final;
significa apenas que, após todos serem ouvidos, a decisão foi tomada e aceita por todos.
A obtenção de consenso em uma sociedade é importante como elemento
fundamental de solidariedade, pois quando há valores compartilhados entre membros de
uma coletividade há maior propensão à cooperação, o que fortalece o sistema político;
além de funcionar como fator de redução da utilização do poder coercitivo para a
indução de comportamentos aprovados pelos detentores do poder, embora isso não
torne dispensável a necessidade da utilização legítima da violência para a resolução
de casos controversos.
Cabe ressaltar ainda que, em uma dada unidade social, é praticamente impossível se
imaginar uma situação de consenso absoluto. Faz muito mais sentido se falar em graus
de consenso, acerca de questões determinadas, já que por mais coeso que seja um grupo,
sempre haverá diferenças de opiniões entre os indivíduos acerca de determinados temas,
em virtude de sua vivência, educação, origem familiar, etc. Assim, pode-se dizer que há
questões mais facilmente consensuáveis do que outras. Aspectos procedimentais das
decisões coletivas, ou as ‘regras do jogo’, essenciais para o funcionamento do sistema
político, são normalmente pontos de consenso entre membros de uma comunidade, ao
passo que ‘aspectos substantivos’ das decisões, referentes ao seu mérito, são mais
dificilmente objeto de consenso. Na hipótese de inviabilização de decisões consensuais,
uma coletividade pode sempre recorrer à realização de votações, que consiste no
estabelecimento de uma decisão na qual maioria concorde.
O nível de consenso é, ainda, variável de uma coletividade a outra, dependendo,
Segundo Bobbio, Matteucci, e Pasquino (2007: 241) dos seguintes aspectos: a) grau de
homogeneidade sócio-cultural; b) sucessão, em um mesmo país, de regimes políticos
fundamentalmente diversos no tocante às regras essenciais do funcionamento do
sistema político; c) grau de coesão dos meios de socialização; d) coexistência de
ideologias antagônicas; e) forma de interação das diversas forças políticas,
principalmente quando buscam o apoio das massas.
Afetam o nível de consenso, segundo Bobbio:
a) Transformações sócio-econômicas estruturais e inovações tecnológicas
circunstanciais, que aumentam a expectativa de ganhos e potenciais disputas
entre indivíduos ou grupos;
b) Grupos étnicos, lingüísticos ou religiosos, embora a existência destes não
impeça, per si, o alcance do consenso;
c) Regimes políticos repressivos, que tendem à superestimação do Consenso,
pois as divergências são mantidas na clandestinidade
2.3. Conflito
“Forma de interação entre indivíduos, grupos, organizações e coletividades que
implica em choques para o acesso e a distribuição de recursos escassos”. (Bobbio,
Matteucci, e Pasquino, 2007: 225)
O conflito é analisado na ciência política segundo duas vertentes teóricas, uma que o
entende como uma normalidade – o conflito faz parte da vida em sociedade;
enquadram-se nessa linha Marx, Stuart Mill e os pluralistas, como Robert Dahl; a outra
vertente entende o conflito como uma patologia – um acidente de percurso da sociedade
que deve ser corrigido, como visto por Comte, Durkheim e Pareto. Para Marx, ademais,
em toda sociedade o principal tipo de conflito e motor da mudança histórica é a luta de
classes.
Entre as duas vertentes mais extremas, pode-se considerar que há diversos graus de
conflito e que essa gradação pode variar de saudável a patogênico. Assim, como não é
possível eliminar o conflito, e nem sempre é possível alcançar o consenso, ou o bem
comum (Schumpeter), é freqüente a tentativa de regulamentá-lo, com base em regras
aceitas pelos participantes, que estabelecem limites para o conflito (regra da maioria,
por exemplo). Quando o conflito se desenvolve sob regras aceitas, sancionadas e
observadas, ocorre a sua institucionalização.
2.4. Política
Segundo Bobbio, Matteucci, e Pasquino (2007: 954) o termo ‘política’ surgiu como
a atividade ou conjunto de atividades que tem como referência a ‘polis’ grega, ou seja, o
Estado. Cientistas políticos contemporâneos, contudo, têm atribuído ao termo
significados mais substantivos, como Schmitter (1974)5, que aponta a política como a
solução pacífica dos conflitos, e Maria das Graças Rua, que a define como o conjunto
5 SCHMITTER, P. C. “Reflexões sobre o Conceito de Política”. Brasília: Ed. UnB, 1974.
de procedimentos e instrumentos formais e informais destinados à resolução pacífica de
conflitos no tocante ao usufruto privado de bens públicos.
2.5. Poder;
Poder, segundo Weber, em sua obra ‘Ensaios de Sociologia’, denota a “vontade do
dominador que faz com que os dominados ajam, em grau socialmente relevante, como
se eles próprios fossem portadores de tal vontade” (Campante, 2003: 155)6. É a
partícula fundamental da organização política, pois determina a assimetria nas relações
de mando e obediência segundo Ribeiro (1981)7. " Para, Campante (2003:155) o mais
relevante para observação de exercício de ‘poder’ não é, em si, a obediência real, e sim
“o sentido e o grau de sua aceitação como norma válida, tanto pelos dominadores, que
afirmam e acreditam ter autoridade para o mando, quanto pelos dominados, que crêem
nessa autoridade e interiorizam seu dever de obediência”
Em sentido mais geral, poder consiste na ‘capacidade ou possibilidade de agir, de
produzir efeitos’ (Bobbio, Matteucci, e Pasquino, 2007: 933); em sentido social,
consiste na capacidade de determinar o comportamento alheio, ou na capacidade de
imposição da própria vontade, a despeito da resistência do outro, visando um
objetivo/fim. (Idem). Assim, o ‘poder social’ é aquele do qual o homem é
simultaneamente sujeito e objeto, sendo relativo em essência pois é relacional; depende
do contexto e das pessoas envolvidas.
O poder, por ser um dos componentes essenciais das organizações coletivas, é um
dos elementos básicos do objeto de estudo da Ciência Política. As relações de poder
existentes no seio da sociedade determinam a forma como as decisões afetas à
coletividade são tomadas. A questão central, segundo João Ubaldo Ribeiro (1981) é
descobrir “quem manda”, “como manda” e “por quê manda”.
Segundo Bobbio, as tradições clássica e moderna da política podem ser
diferenciadas pelas concepções de poder predominantes em cada uma delas
Tradição Antiga
6
Tradição Moderna
CAMPANTE, R., G. “O Patrimonialismo em Faoro e Weber e a Sociologia Brasileira”. Dados [online].
2003, v. 46, n. 1, pp. 153-193. ISSN 0011-5258. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/dados/v46n1/a05v46n1.pdf
7
RIBEIRO, J. U. “Política”. Nova Fronteira. 1981
Poder
O poder é exercido para Poder
O poder deriva da relação de
Paterno
benefício dos governados, Econômico necessidade e dependência que
que não possuem autono-mia
cidadãos mais pobres possuem
ou capacidade de participar
em relação aos mais ricos, que
das
possuem
decisões
políticas.
(natureza)
a
determinar
capacidade
suas
de
ações
e
decisões. (bens escassos)
Poder
O poder é exercido para Poder
O poder deriva de crenças e
Despótico
benefício
percepções do mundo produzi-
exclusivo
do Ideológico
governante. A relação entre
das por uma determinada ideo-
governante
governado
logia, disseminada pelo Estado,
relação
pelas tradições, pela religião,
assemelha-se
e
à
travada entre o senhor e seu
etc. (idéias)
escravo. (castigo)
Poder
O poder está assentado sobre Poder
O poder deriva da detenção dos
Político
o
instrumentos de violência e
consentimento
dos Político
governados, que enxergam
coerção. Possui o poder político
na relação de dominação
aquele
uma
monopólio do uso legítimo da
finalidade
que
o
favorece. (consenso)
que
possui
a
o
força. (monopólio da força)
2.6. Autoridade
‘Relação de poder estabilizado e institucionalizado em que os súditos prestam uma
obediência incondicional’, pois acreditam como normas válidas as relações de poder
estabelecidas entre si e o dominador (Bobbio, Matteucci, e Pasquino, 2007: 89). O
dominante que conta com a aceitação (legitimidade) por parte do dominado constitui-se
autoridade. É, assim, uma forma de expressão do poder, na qual o poder se pauta no
consentimento dos súditos e em sua aceitação do poder sobre eles exercidos como
legítimo. Produz a atitude da obediência incondicional (mais ou menos estável no
tempo), pois, na percepção de participarem de uma relação de poder legítima, os súditos
associam obediência a um dever a ser cumprido.
Ainda, segundo Bobbio e seus colaboradores, são atributos da autoridade:
a) o caráter hierárquico das organizações coletivas em que incide, não sendo
requerido, necessariamente, estrutura formal para garanti-lo;
b) estabilidade no exercício de poder de quem a possui, embora a obediência
incondicional, apesar de durável, não seja permanente, necessitando, de tempos em
tempos, reafirmação ostensiva da qualidade da fonte do poder;
c) o caráter gradativo com que é construída pelo detentor do poder que a desfruta,
envolvendo processos complexos de construção ao longo do tempo;
d) crença dos súditos na legitimidade do poder exercido pelo governante, que a ele
devotam obediência.
Tal legitimidade é capaz de transformar poder factual em poder estabilizado, gerar a
autoridade e conferir estabilidade à própria autoridade, que, constituída em bases
legítimas, confere ao poder maior eficácia. Entretanto, o titular da autoridade pode
perder sua legitimidade, quando seus subordinados perde a crença nos princípios que o
legitimavam como chefe político e fundamentavam sua autoridade. Nesses casos, há
alto potencial de conflito, tanto os superiores quanto os subordinados tendem a se sentir
traídos em suas expectativas e valores, diminuindo a relação de autoridade.
2.7. Dominação
“A dominação, ou seja, a probabilidade de encontrar obediência a um determinado
mandato, pode fundar-se em diversos motivos de submissão. Pode depender
diretamente de uma constelação de interesses, ou seja, de considerações utilitárias de
vantagens e inconvenientes por parte daquele que obedece. Pode também depender de
mero “costume”, do hábito cego de um comportamento inveterado. Ou pode fundar-se,
finalmente, no puro afeto, na mera inclinação pessoal do súdito. Não obstante, a
dominação que repousasse apenas nesses fundamentos seria relativamente instável”
Max Weber (1986)8.
‘Nas relações entre dominantes e dominados, por outro lado, a dominação costuma
apoiar-se internamente em bases jurídicas, nas quais se funda a legitimidade, e o abalo
dessa crença na legitimidade costuma acarretar conseqüências de grande alcance. Em
forma totalmente pura, as “bases de legitimidade” da dominação são somente três, cada
uma das quais se acha entrelaçada – no tipo puro – com uma estrutura sociológica
fundamentalmente diversa do quadro e dos meios administrativos” (Idem).
8
WEBER, M. Os três tipos puros de dominação legítima. In: COHN, G. (org.). Max Weber: sociologia.
3ª ed. Col. "Grandes Cientistas Sociais". São Paulo: Ática, 1986. p. 128-141. Disponível em:
http://www.ufrgs.br/tramse/pead/textos/weber.pdf
Nos ‘tipos puros’, ou ideais, weberianos, a dominação consiste no exercício
contínuo do poder estabilizado, baseado em algum tipo de legitimidade, que confere
autoridade ao dominador. O autor identifica três formas distintas de constituição da
autoridade e de conferência de legitimidade ao poder:
a) Dominação carismática: poder legitimado pela devoção afetiva dos súditos à
pessoa do senhor, a seus dotes sobrenaturais (carisma), ou faculdades mágicas,
revelações, ou heroísmo. Este tipo de dominador normalmente possui poder
intelectual ou de oratória, que fortalecem sua legitimidade e autoridade. Seus
tipos mais puros são a dominação do profeta, do herói guerreiro e do grande
demagogo.
b) Dominação tradicional: poder legitimado pela crença na validade das ordenações
e dos poderes senhoriais há muito existentes. Seu tipo mais puro é o da
dominação patriarcal. Obedece-se à pessoa em virtude de sua dignidade própria,
da honra e destaque de sua família, santificadas pela tradição e pelo nome. O
conteúdo das ordens está fixado pela tradição. Exemplo: direito divino dos reis.
c) Dominação racional-legal: o poder deriva de um estatuto jurídico-legal que
organiza e disciplina as funções e os limites do Estado, os direitos individuais e
os instrumentos de mitigação do conflito social, sendo esta a sua fonte de
legitimidade. É um indicador da modernização da política e da administração
pública, que busca forma de tornar-se mais. Tem forte relação com o conceito de
Estado de Direito. Obedece-se não à pessoa em virtude de seu próprio direito ou
qualidade, mas à regra instituída;
2.8. Legitimidade
Consiste, segundo Bobbio, Matteucci, e Pasquino (2007: 675), em ‘atributo do
Estado, que consiste na presença, em uma parcela significativa da população, de um
grau de consenso capaz de assegurar a obediência sem a necessidade de recorrer ao uso
da força, a não ser em casos esporádicos’. As relações de poder pressupõem duas partes
– uma dominante e outra dominada. Essa relação é dotada de legitimidade quando a
parte dominada reconhece o direito que o dominante possui de impor suas decisões;
consiste na base da aceitação da dominação pelos dominados e no pilar da autoridade.
2.9. Ideologia
Ideologia é um conceito bastante plural, entretanto, um dos mais precisos e
compreensíveis é o que trata o termo como forma de legitimação da dominação no meio
social. Segundo Eagleton (1997:16)9, a ideologia ‘legitima a dominação existente no
seio da sociedade, na medida em que ‘ naturaliza’ uma situação histórico-social dada’.
Assim, o autor entende por ideologia o processo de propagação de idéias pelo qual ‘a
vida social é convertida em uma realidade natural’.
No verbete ‘Ideologia’ do Dicionário de Política organizado por Bobbio são
apresentadas várias definições para o termo, que podem ser divididas em duas frentes de
significados. Uma que o define como ‘um corpo de idéias característico de um
determinado grupo ou classe social’ (Eagleton), que designa ‘o gênero ou espécie dos
sistemas de crenças políticas, compreendendo um conjunto de idéias e de valores
respeitantes à ordem pública e tendo como função orientar os comportamentos políticos
coletivos’ (Stoppino); e uma outra claramente alinhada ao entendimento marxista do
termo, que compreende a ideologia como ‘idéias falsas que ajudam a legitimar um
poder político dominante’ (Eagleton), ou como ‘a falsa consciência das relações de
domínio entre as classes’; a ideologia como uma crença falsa (Stoppino).
2.10. Hegemonia
No contexto das relações internacionais, hegemonia significa supremacia de um
Estado (ou comunidade de Estados/Região) em um sistema de poder, no qual ele
aparece como guia dos Estados/Regiões subordinados. Essa supremacia significa
preeminência militar, econômica e cultural (soft power). Assim, hegemonia pode ser
entendida como um tipo de influência muito forte entre países.
No marxismo o termo tem outra conotação, para Lênin hegemonia é a tradução da
coação dos capitalistas sobre os trabalhadores em domínio, por seu comando sobre a
infra-estrutura da sociedade – os meios de produção. Gramsci apresentou um leitura
mais elaborada, segundo a qual, hegemonia significa um tipo de liderança intelectual,
cultural e/ou moral no nível da super-estrutura da sociedade – os valores culturais,
educacionais e morais da sociedade. Não é necessário utilizar a força, bastam as
instituições super-estruturais da sociedade civil para reprodução da liderança da classe
hegemônica.
2.11 . Soberania
Representa a autoridade suprema. Forma de poder político exclusivo e não derivado,
que aparece como um conceito jurídico-político que denota não existência, em uma
sociedade, de outro poder semelhante. Pretende ser a racionalização jurídica do poder,
9
EAGLETON, Terry. Ideologia – Uma introdução. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista
e Editora Boitempo, 1997
ou a transformação da força em poder legítimo, do poder de fato em poder de direito.
Requer uma única fonte de administração do uso da violência. Quando guerrilhas
armadas, por exemplo, ameaçam o monopólio de uso da violência pelo Estado, ou
exercem coerção sobre indivíduos tutelados pelo Estado, pode-se dizer que há uma crise
de sua soberania
3. Tema 2: Estado: Conceito e evolução do Estado moderno. Estado, governo e
aparelho de Estado. O aparelho de Estado nas democracias liberais.
Tema 4: Burocracia
3.1 O Estado Moderno - conceito
Segundo a definição criada por Max Weber, a característica presente em todas as
manifestações do Estado é a detenção do monopólio do uso legítimo da força/
violência. A disputa pelo controle do Estado é a luta pela posse reconhecida da
capacidade de utilização de recursos de violência para fazer valer suas decisões.
organizações políticas tornam-se Estados quando dotam-se de aparato administrativo
capaz de requerer, com sucesso, o ‘monopólio legítimo do uso da violência (ou poder
coercitivo), em um dado território’. (Bobbio, N. Estado, Governo e Sociedade, 1999:
57). Este é o conceito mais unanimemente aplicável hoje e o mais cobrado em
concursos que cobram o tema.
O termo “Estado” se impôs através da difusão e pelo prestígio do Príncipe de
Maquiavel; Entretanto, para alguns, o conceito de Estado não é um conceito universal,
‘mas serve apenas para indicar e descrever uma forma de ordenamento político surgida
na Europa a partir do século XIII até início do sec. XIX. e, que, após esse período, se
estendeu - libertando-se, de certa maneira, das condições originais e concretas de
nascimento – a todo o mundo civilizado’10 (Bobbio, Matteucci, e Pasquino, 2007: 425).
Na concepção weberiana, o Estado moderno é definido por dois elementos
constitutivos: a presença de um aparato administrativo com a função de prover a
prestação de serviços e o monopólio legítimo da força.
Para Engels, o Estado nasce da dissolução da sociedade gentílica fundada sobre o
vínculo familiar (clãs); o nascimento do Estado assinala a passagem da barbárie à
civilização. Com o nascimento da propriedade individual nasce a divisão do trabalho e a
formação de classes, donde surge o poder político – o Estado, cuja função é
10 Ernst W.Boeckenfoerde in: BOBBIO, N., MATTEUCCI, N., PASQUINO, “Dicionário de Política,
Verbete: ‘Estado Moderno’, p. 425
essencialmente manter o domínio de uma classe sobre outra, recorrendo inclusive à
força, de modo a impedir que a sociedade de classes degenere-se em anarquia (Idem).
Na linguagem jurídica, o Estado tem sido definido através de três elementos
constitutivos: o povo, o território e a soberania. Para Bobbio, a condição necessária e
suficiente para que exista um Estado é que sobre um determinado território se tenha
formado um poder em condições de tomar decisões e emanar comandos, vinculatórios a
todos aqueles que vivem naquele território e efetivamente cumpridos pela grande
maioria dos destinatários quando a obediência é requisitada (Ibidem);
Para Bresser Pereira, o conceito de Estado é impreciso na ciência política. É comum
confundir-se Estado com governo, com estado-nação ou país, e mesmo com regime
político, ou com sistema econômico O autor relata que Sabino Cassese (1986)
encontrou 145 diferentes utilizações para o termo Estado, em estudo de 1931. Para
Pereira, o Estado é uma organização que se diferencia das demais organizações porque é
a única que dispõe do poder extroverso, um poder político que ultrapassa seus próprios
limites. Enquanto as organizações burocráticas possuem normas que apenas a regulam
internamente, o Estado é constituído por um conjunto de leis que regulam toda a
sociedade. (BRESSER PEREIRA11, 2001:5 ).
Na visão contratualista, o Estado é o resultado político-institucional de um contrato
social por meio do qual os homens 'cedem uma parte de sua liberdade a esse Estado
para que o mesmo possa manter a ordem ou garantir os direitos de propriedade e a
execução dos contratos' (BRESSER-PEREIRA, 2001:7). O Estado, sob esta perspectiva
não é o produto histórico da evolução e complexificação da sociedade, mas a
conseqüência lógica da necessidade de ordem.
Do ponto de vista da sociedade, o Estado corresponde ao espaço institucional
destinado ao tratamento das demandas apresentadas ao sistema político pela sociedade
civil, que o fornece os 'inputs' que orientarão as ações e os resultados a serem buscados
pelo Estado, que tem o dever de apresentar respostas aos pleitos dirigidos (outputs). O
contraste entre sociedade civil e Estado põe-se como contraste entre quantidade e
qualidade das demandas e capacidade das instituições em dar respostas adequadas e
tempestivas. (Bobbio ,1999: 35)
3.1.1 Elementos Constitutivos do Estado Moderno
a) povo
11
BRESSER PEREIRA11, L. C. “Estado, Aparelho de Estado e Sociedade Civil”, 2001
b) soberania
c) território demarcado, sobre o qual a soberania do Estado é exercida
d) um governo ( Bobbio et al. 2007, verbete Estado Moderno)
A estes elementos Bresser Pereira acrescenta a existência de:
e) uma burocracia ou tecnoburocracia pública, ou seja, um corpo de funcionários
hierarquicamente organizados, que se ocupa da administração;
f) uma força policial e militar, que se destina não apenas a defender o país contra o
inimigo externo, mas também a assegurar a soberania, a obediência âs leis e assim
manter a ordem interna
g) um ordenamento jurídico impositivo, que extravasa o aparelho do Estado e se
exerce sobre toda a sociedade. (BRESSER PEREIRA, 2001:8)
3.2 Estado Aparelho de Estado12 e Governo
O Estado se distingue do ‘aparelho de Estado’, chamado contemporaneamente de
Administração Pública, pois, enquanto as organizações burocráticas possuem normas
que apenas a regulam internamente, o Estado é adicionalmente constituído por um
grande conjunto de leis que regulam toda a sociedade. (BRESSER PEREIRA, 2001: 8)
O ‘aparelho de Estado’, ou a Administração Pública, regulada pelo direito
administrativo, e dividida em três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário), é uma
organização burocrática. Corresponde ao conjunto de agências e de servidores
profissionais, mantidos com recursos públicos, cujas atividades devem ser realizadas em
conformidade com que a lei estabelece, e que são encarregados da decisão e
implementação das normas necessárias ao bem estar social e das ações necessárias à
gestão da coisa pública. O corpo dirigente governamental, a burocracia e a força militar
e policial compõem o aparelho de Estado, ou a Administração Pública, bem como todo
o conjunto de órgãos, serviços e agentes do Estado dedicados a atividades envolvidas na
execução concreta das tarefas ou incumbências consideradas de interesse de público ou
comum numa coletividade, tais como a segurança, a cultura, a saúde e o bem estar das
populações. (Idem)
O Estado, porém, é mais do que seu aparelho, porque inclui todo o sistema
constitucional-legal que regula a população existente no território sob sua jurisdição. A
formação da Administração Pública, ou do aparelho de Estado, tende a ocorrer em
12 Podem aparecer também os seguintes termos como sinônimos: Estado-máquina; Estado-mecanismo;
Estado-Administração
momento imediatamente posterior à unificação do Estado. Mundaneidade, finalidade e
racionalidade fundem-se para dar ao Estado “imagem de autêntico aparelho da gestão
do poder, operacional em processos cada vez mais próprios e definidos”, justificados
pelos ideais de “paz interna do país, eliminação do conflito social”. Técnica e normas
gerais são necessárias para a resolução de casos controversos de disputas de direitos
entre indivíduos, que, com o Estado moderno, passa a ser o sujeito principal da ação do
Estado, diferentemente da organização social da Idade média que dialogava com
estamentos sociais.
O Governo, por sua vez, é a instância máxima de administração executiva, de um
Estado ou de uma nação. Governo é corpo decisório que exerce o poder de regrar uma
sociedade política. Uma nação sem Governo é classificada como anárquica. Pode
existir governo sem Estado, mas não Estado sem governo.
3.3 A formação do Estado Moderno
A formação do Estado Moderno foi um processo multissecular pelo qual o poder
político transferiu-se de uma ou várias pessoas para uma instituição, caracterizado pela
despersonificação das relações de mando político – o Estado. Foi um processo gradual
de centralização/concentração e institucionalização do poder, que resultou de um
ordenamento jurídico
imperativo, aplicável universalmente a todos os cidadãos
circunscritos no território sob sua jurisdição. A transição para a nova forma de
organização do poder expressamente político ocorreu de maneira conturbada, com
a eclosão de diversas lutas religiosas.
Dos conflitos não houve triunfo de uma fé sobre a outra, mas superaram-se as
pretensões de se criar um poder com base na fé. A religião deixa de ser parte integrante
da política. A política, por sua vez, se justifica a partir de dentro, para os fins que é
chamada a realizar, que são os fins terrenos, materiais e existenciais do homem: em
primeiro lugar a ordem e o bem-estar. (SCHIERA, P. “Estado moderno” e GOZZI,
Gustavo. “Estado Contemporâneo”. In: BOBBIO, et all. Dicionário de Política)
3.3.1 Antecedentes históricos
A formação do estado moderno foi precedida pela organização política e territorial
característica da Idade Média, em feudos, grandes unidades territoriais , de economia
agrária não monetarizada, transmitidos hereditariamente, governados por uma
aristocracia de proprietários guerreiros dotados de prerrogativas de extrair tributos,
estabelecer leis, aplicar a justiça e manter exércitos. Esta organização social era
caracterizada por um modelo piramidal de categorias ou estamentos sociais, sem
mobilidade possível: clero, nobres(senhores feudais) ocupavam o ápice e servos e
camponeses ocupavam a base, subordinados aos primeiros. Nos burgos concentravamse artesãos e comerciantes não enquadrados na estrutura tradicional da sociedade.
Este modelo de organização política era marcado pela multiplicidade dos centros de
poder; pela fragmentação da autoridade política; pela posse e uso privado dos
instrumentos de gestão pública: cunhar moedas, cobrar tributos, impor normas de
conduta, aplicar justiça, etc; pela economia agrária não monetarizada, realizada em
unidades auto-suficientes, voltadas para a subsistência; pelas relações de domínio
pessoais baseadas no pacto de suserania e vassalagem e em relações de dependência e
subordinação (servo/senhor); e pela subordinação do poder material ao poder espiritual
da Igreja Católica.
Neste período anterior à formação do Estado Moderno, a organização política
caracterizava-se pelo patrimonialismo. O poder político era exercido pelos senhores
feudais em seus territórios de jurisdição, que nada mais eram que suas propriedades,
terras herdadas ou adquiridas por títulos de nobreza. Nestas propriedades, contudo,
viviam muitas outras pessoas para além dos membros de sua família, servos e suas
famílias, que, pelo nascimento, não tinham direito a terras e precisavam pedir acolhida
aos nobres senhores de terras em troca de seu trabalho e subserviência. Assim, os
senhores administravam bens e necessidades coletivas; e tão maiores fossem seus
domínios, maior seria a coletividade sob sua tutela a demandar decisões e serviços, o
que requeria uma organização administrativa mínima.
Era necessário manter um exército, para defesa da propriedade contra ataques
externos, prover insumos à produção agro-pecuária, meios de transporte, meios de
estocagem de alimentos e outros produtos, construção de moradias, etc. Todos esses
serviços requeriam uma organização administrativa mínima por parte do senhor feudal,
que, entretanto, os desempenhavam como parte da administração de sua propriedade.
Todos os serviços de interesse coletivo eram providos tal como se fossem os interesses
privados do senhor. Não havia separação entre público e privado. A administração das
coisas públicas ocorriam em meio à administração privada da propriedade do senhor. É
nesses termos que Weber observa a forma mais primária de administração pública – a
administração patrimonialista, que precedeu a formação do Estado Moderno.
3.3.1.1 A Sociedade Patrimonialista
A organização social patrimonialista representa a forma mais primitiva de
administração pública, aonde a comunidade política expande-se a partir da comunidade
doméstica e do poder de ‘pater familia’. É expressão da forma ‘tradicional’ de
dominação13, segundo Weber (1986), cuja legitimação do poder é dada pela tradição e
pelas hierarquias de nobreza, que conferem ao nascimento a qualidade de rei, nobre ou
servo. Estruturou-se na sociedade medieval organizada em estamentos, na qual o
indivíduo não possuia presença política. A Interlocução do rei com os súditos, quando
existente, ocorria via categorias sociais, como a nobreza e clero que, para Monstesquieu
(1748, O Espírito das Leis, Cap IV), constituíam ‘poderes intermédiários’, ou ‘canais
médios por onde fluía o poder14:
Caracteriza-se por: a) ausência de direito formal; b) confusão entre o poder privado
e o poder público do governante e de seus auxiliares; c) ausência de estrutura de cargos
definida por áreas de competências; d) quadro administrativo cujas relações de
fidelidade caracterizam-se pela devoção pessoal dos servidores ao senhor, ao invés do
dever ou disciplina objetivamente ligados ao cargo.
A administração patrimonialista caracteriza-se também pela pessoalidade das
decisões do governante, que podem atingir altos graus de arbitrariedade, visto que todas
as decisões por ele tomadas são feitas tal como se fosse o chefe da família. Entretanto,
segundo Weber pode-se identificar dois tipos distintos de administração patrimonialista,
uma em que o governante dispõe de maior autonomia sobre suas decisões, o tipo
patriarcal, e aquela em que o governante dispõe de menor autonomia sobre suas
decisões, pois a divide com membros da nobreza e do clero cujo poder tenha sido
sacramentado por uma forte tradição, o tipo estamental. (Campante, 2003:156) Esses
dois tipos de governos patrimoniais correspondem à classificação de Montesquieu,
‘governos despóticos’ e ‘monarquias’. Sendo os governos despóticos aqueles regimes
patrimonialistas em que o senhor governa praticamente por si só e as monarquias os
regimes patrimonialistas em que o rei divide o poder de decisão com categorias sociais
tradicionais.
Nas formas de dominação carismática, aonde a liderança e o poder exercido pelo
chefe político baseiam-se plenamente em suas qualidades pessoais, ou ‘carismas’, a
tendência é que o poder político concentre-se inteiramente nas mãos do líder e que, em
sua forma mais pura, sejam estabelecidos ‘governos despóticos’, ou ‘patriarcais’ de
caráter autoritário e dominador, na classificação de Montesquieu. Para o autor este tipo
13
Ver página12.
O autor entendia que, na ausência desses poderes intermediários, existiria no Estado apenas a vontade
momentânea e caprichosa de um só (...), o que o qualificaria não como monarca, mas sim como déspota.
14
de governo é altamente perigoso, pois está altamente às vontades arbitráias do
governante, além de ser extremamente frágil, sujeito à grande instabilidade, pois a
devoção à pessoa do líder só é mantida enquanto o carisma subsistir. Tem dificuldades
em se organizar e se manter ao longo do tempo, e de incorporar os procedimentos
técnicos normais das grandes organizações. O que importa são sempre os fins, e nunca
os meios ou as formas de chegar até eles; a não ser quando as próprias formas e
procedimentos adquirem, elas mesmas, características ritualizadas e sagradas.
Seu quadro administrativo é baseado na irracionalidade, não havendo, portanto,
regras estatuídas ou tradicionais. Falta o conceito racional da competência, assim como
o estamental dos privilégios. Possui um caráter extracotidiano e puramente pessoal. No
caso dela continuar subsistindo, passando a autoridade do senhor para seus sucessores,
ela se torna uma relação rotineira, cotidiana. Neste caso ocorre a mudança da ordenação
carismática para a tradicional, por transformação do sentido próprio do carisma, pela
passagem do quadro administrativo carismático a um estamental. Com o tempo, após
recorrentes gerações de sucessões, a organização inicialmente carsimática pode se
tornar um regime patrimonialista estamental, com constituída classe de famílias
tradicionalmente influentes, tornando-se a ‘nobreza’, ou ‘poderes intermédiários’ da
sociedade
Segundo Montesquieu, em monarquias aonde existe a figura intermediária da
nobreza ou do clero, bem constituída e sólida em legitimidade, por força da tradição, o
arbítrio do governante é ponderado e isso previne o povo contra o ‘despotismo’, ou
patriarcalismo15. Sendo assim, perecebe-se que se a administração pública
patrimonialista é a forma mais primitiva de organização social e política, sua forma
patriarcal, ou despótica (Montesquieu), é ainda mais primitiva que sua forma
estamental, ou monárquica (Montesquieu), onde o poder arbitrário do rei é mitigado
pela existência de fortes ‘poderes intermédiários’ (clero e nobreza).
As duas variações do patrimonialismo presumem, porém, em maior ou menor
grau, por força dos poderes intermediários: poder hereditário, arbitrário e
compassivo nas mãos de um governante, que se manifesta de modo pessoal e
instável e se sujeita aos caprichos e à subjetividade do dominador.
15
Alega Montequieu: “Assim como o poder do clero é perigoso numa república, ele é conveniente numa
monarquia; principalmente naquelas que tendem para o despotismo. Que seria da Espanha e de Portugal,
desde a perda de suas leis, sem este poder que sozinho freia o poder arbitrário? Barreira sempre boa,
quando não este outra, pois, como o despotismo causa na natureza humana males assustadores, até mesmo
o mal que o limita é um bem.” (Montesquieu, 1748)
Neste modelo de administração pública não se pode falar de uma ‘burocracia’
técnica e racional, o quadro administrativo formado era puramente pessoal do senhor,
formado por servidores, com exercício de funções públicas por particulares, sem
separação entre público e privado. Nobres armam seus camponeses para guerras, e
passam períodos regulares na corte a serviço dos reis. ‘Pessoas governam, cobram
impostos, desempenham funções jurídicas em interesse próprio: o coletor de impostos é
sócio do governo, o prefeito explora as terras de municipalidade e fica com parte dos
lucros, os funcionários são "donos" dos cargos que exercem, e estes cargos podem ser
comprados, cedidos pelo governo como parte de prêmios e honrarias, e mesmo
transmitidos hereditariamente’ (Campante, 2003:156).
Os cargos públicos, nesse tipo de administração são considerados ‘prebendas’, para
Brsser Pereira. ‘A res publica não é diferenciada das res privada. Em conseqüência, a
corrupção e o nepotismo são inerentes a esse tipo de administração’. (Bresser-Pereira Plano Diretor da Reforma do Estado,1995:16).
3.3.1.2 Decadência do Patrimonialismo
O modelo de administração pública patrimonialista vigorou durante toda a idade
média, mas, com a emergência da burguesia, a partir do desenvolvimento do comércio e
do capitalismo, sua fonte de legitimidade passou a ser contestada. A legitimação do
poder político pela tradição e pelos costumes passou a ser questionada pela emergente
classe, que reinvindicava participar do comando do poder do Estado, visto que
apresentava uma série de demandas não capazes de serem satisfeitas pelas estruturas
decisórias do Antigo Regime. Entretanto, não figurando dentre as famílias detentoras de
títulos de nobreza, os burgueses não tinham acesso ao poder político. Ganhavam
importância econômica e tornavam-se ricos, mas isso não se revertia, por exemplo em
posse de terras ou capacidade real de influenciar as decisões reais, tais prerrogativas
continuavam restritas à nobreza e ao clero.
A burguesia emergente apresentava uma série de demandas, tais como padronização
de pesos, medidas, moeda, redução e racionalização dos tributos pagos à coroa e acesso
à aquisição de terras16. Ademais, sendo seus interesses relacionados à ordem econômica,
que envolve altos graus de racionalidade na gestão dos recursos escassos e demandas
individuais infinitas, os burgueses não aceitavam o poder hereditário e arbitrário nas
mãos de um governante, que se manifesta de modo pessoal e instável e se sujeita à sua
16
As terras no Antigo Regime eram vinculadas aos títulos de nobreza e à igreja, quem estivesse fora
desses estratos não tinha direito à terra própria.
subjetividade e caprichos. Era necessário um governante com habilidade técnica para
tratamento da função, o nascimento não poderia determinar quem governaria, nem este
governante poderia tomar decisões com base apenas em suas opiniões pessoais e em sua
vontade. A gestão de recursos escassos e demandas infinitas envolve conhecimentos
especializados que devem embasar as decisões públicas; o governante deveria governar
sempre de forma a otimizar esta função, sob pena de fuga de finalidade.
Ademais, a burguesia requeria um regime em que pudesse se desenvolver
socialmente e economicamente. Os limites do regime feudal e da sociedade estamental
não possibilitavam tal ascenção. Era preciso um Estado que governasse para os
indivíduos, e não para estamentos sociais, aonde o valor individual pudesse ser
observado, o que passava desapercebido na estrutural estamental da idade média. Era
preciso um sistema meritocrático que recompensasse socialmente e economicamente os
indivíduos que demonstrassem melhor desempenho profissional/cultural na sociedade e
mais valor agregassem aos bens e valores coletivos. O antigo regime não dispunha de
tal racionalidade. O esquema de recompensas sociais e econômicas respeitava a lógica
tradicional da hereditariedade e da hierarquia da nobreza, dada pela honra, e do clero,
dada normalmente por antiguidade.
Na sociedade medieval, o indivíduo estava sujeito a uma estrutura social
determinista: o nascimento determinava que tipo de acesso teria às recompensas sociais
e econômicas distribuídas na sociedade. A burguesia, por não estar incluída dentre os
elegíveis pelo nascimento, passou a considerar os benefícios gozados pela nobreza
como ‘privilégios’, denotando que seu acesso à riqueza produzida pela coletividade não
era justo ou merecido. A parcela da riqueza que apropriada não correspondia à sua
contribuição para o resultado alcançado pelo esforço coletivo. Membros da nobreza
estariam se apropriando do fruto do trabalho alheio, por terem acesso à propriedade, ou
posse de terras, em detrimento de outros atores sociais, como a burguesia.
Assim, quanto mais a burguesia se desenvolvia como rico e poderoso estrato social,
mais o antigo regime e a administração patrimonialista tornavam-se insustentáveis. Era
necessário uma nova ordem social; um novo sistema político responsável pela defesa de
todo e qualquer cidadão contra as eventuais arbitrariedades de uns sobre os outros e do
governante sobre todos. Era necessário que a legitimidade do poder político exercido na
sociedade adviesse de outra fonte que não a tradição e a hereditariedade; era necessário
que o(s) titular(es) do poder político na sociedade estivesse(m) comprometido(s) com a
racionalização da equação recursos escassos/demandas infinitas; que a fonte da
legitimidade do poder político adiviesse da garantia dos direitos individuais e da
mitigação do conflito social, critérios mais objetivos e racionais do que a simples
tradição.
3.3.2 Emergência da Ordem Racional-Legal
Era necessário, portanto, uma nova forma de dominação; a dominação pela lei
aplicável a todos, por um estatuto social regulador da sociedade acordado e aceito pelos
inidvíduos como o ‘marco zero’ para a tomada de decisões e solução de conflitos pelo
governante, em especial no tocante à propriedade privada. Era preciso que a vassalagem
ao senhor de terras desse lugar à submissão às normas de convivência acordadas por
todos – o que os contratualistas chamaram de ‘pacto social’. Não apenas os servos
deveriam prestar obediência ao chefe político, que agia conforme seus caprichos, na
sociedade medieval, este último também deveria prestar obediência: ao estatuto social
de pacificação do conflito acordado entre os indivíduos da sociedade que representa – as
normas fundamentais de constituição da sociedade civil.
O chefe político deveria ser um representante dos interesses individuais, não um
senhor compassivo que tutela seus agregados conforme sua vontade. A vontade a ser
considerada é a dos representados; o chefe político seria, assim, apenas aquele
designado para executar a vontade do povo e encontrar os melhores meios de buscar
satisfazê-la. Não cumprindo esta finalidade o governante deveria ser substituído por
outro que o fizesse. Esta era, em linhas gerais, a forma de organização política clamada
pela burguesia. Sua formulação teórica mais sofisticada está em Locke, Rousseau e
Stuart Mill, tratados na seção seguinte17.
As condições propícias à instauração dessa nova ordem política surgiram a partir das
guerras religiosas, que incentivaram a formação de exércitos e a politização de parte da
nobreza, que até então repousava em uma sociedade há muito estabilizada, sem grandes
guerras ou disputas políticas (Bobbio, 2007: verbete ‘Estado Moderno’). A aliança de
príncipes guerreiros, com intensões de conquista de terras vizinhas e formação de
pequenos impérios, com a emergente burguesia, clamante pela substituição do regime
feudal/estamental, propiciou a materialização da nova ordem política e social: o Estado
Moderno.Esta nova ordem, entretanto, por nascer aliada à burguesia teve de absorver
17
Maquiavel e Hobbes escreveram ainda no momento inicial de consolidação da nova ordem, quando
a promoção da segurança e a manutenção da ordem eram a principal (e quase única) preocupação,
devendo o governante dispor de poder concentrado, absoluto e incontestável, não havendo espaço à
influência de outros atores, sob pena de disputas e instabilidade do poder.
novos conteúdos políticos. O príncipe, ao se aliar à emergente classe teve que abidicar
de sua visão tradicionalista do mundo, enquanto membro da nobreza; teve que afirmarse enquanto indivíduo e desagregar-se das concepções da categoria social a que
pertencia, regidas pela tradição do Antigo Regime.
A importância da burguesia foi fortalecida pelo crescimento populacional dos
feudos e burgos, que permitiu integração de interesses e relações entre grupos vizinhos,
além do incremento do comércio e da vida urbana. Ademais o desenvolvimento do
mercantilismo e das grandes navegações a partir do sec XIII, fortalece ainda mais o
papel da burguesia junto aos interesses do príncipe conquistador que carecia de
arrecadação financeira, além da unificação do poder político, para financiamento do
impulso econômico de conquista de novos mercados e da estrutura administrativa de
sustentação do novo Estado. A burguesia ascendente forneceria os recursos financeiros
necessários e o princípe proporcionaria o comando político adequado aos preceitos da
nova ordem; este foi fator determinante à formação do Estado Moderno.
Os Estados Nacionais nasceram portanto do plano arquitetado entre príncipe e
burguesia. Como consequência, a nobreza entra em decadência, assim como o sistema
político policêntrico e complexo da Era Feudal, visto que o príncipe passa a concentrar
o poder antes difuso nas mãos de diversos aristocratas. Os privilégios da nobreza e a
irracionalidade da distribuição do poder e da riqueza, na sociedade mediaval, sofrem
forte crítica com a emergência do novo Estado, que introduz, como novos valores
supremos da ordem social, a emancipação do indivíduo (da estrutura de categorias
sociais) e a dominação impessoal racional-legal, que iguala a todos pela lei.
Em Resumo: O Estado Moderno surge, então, como resultado da crise e
transformação da sociedade medieval e do surgimento do capitalismo/fortalecimento da
burguesia. Para Weber, a constituição do Estado Moderno significou a formação e
ampliação da esfera pública e sua separação da esfera privada, com exclusão do uso
privado de instrumentos de violência, gradual eliminação da administração particular
da Justiça, desprivatização dos assuntos de interesse geral, além dos seguintes atributos
trazidos por Bobbio: racionalização da gestão do poder; territorialidade; primazia da
política sobre a religião; neutralidade e impessoalidade do poder político; presença
política do indivíduo; normas, de cunho abstrato e universalista, como subsídio
essencial à tomada de decisões; concentração do poder em instância unitária e
exclusiva, que pretende compreender o âmbito completo das relações políticas
(BOBBIO, MATTEUCCI, PASQUINO, 2007: 426)
4. Tema 3 – Temas centrais da teoria política clássica: constituição e
manutenção da ordem política; contrato social; demarcação das esferas pública e
privada; repartição de poderes
4.1 A Constituição da Ordem Política
Apenas recapitulando, a formação do Estado foi, então, fruto de um movimento de
‘superação do policentrismo do poder, em favor de uma concentração do mesmo,
numa instância tendencialmente unitária e exclusiva’ (SCHIERA, in Bobbio et all,
verbete ‘Estado Moderno’). Daí Weber falar no “monopólio legítimo da força” por
parte do Estado. O sistema policêntrico dos senhorios de origem feudal deu lugar a
um Estado territorial concentrado e unitário. Este movimento foi também caracterizado
pela separação entre política e religião, tendo a primeira assumida a primazia sobre a
segunda, no campo dos desenvolvimentos terrenos.
Partiu-se do policentrismo para o
poder concentrado nas mãos do rei, que se
justificava como ordem externa necessária à garantia de segurança e tranqüilidade
dos súditos. O Estado, a quem cabe essas funções, tem por premissas a unidade
de comando, sua territorialidade, e exercício por meio de corpo qualificado de
auxiliares “técnicos”. Tais premissas são exigências para os estratos de população
(destacada a burguesia) que não conseguiriam desenvolver suas relações sociais e
econômicas nas antigas estruturas de organização política.
Defini-se, então, o caráter institucional e administrativo do novo Estado: uma
organização das
relações
sociais, que exerce poder por meio de
procedimentos
técnicos preestabelecidos (instituições e administração), úteis para a prevenção e
neutralização dos casos de conflito e ‘para o alcance de fins terrenos que as forças
dominadoras na estrutura social reconhecem como próprias e impõem como gerais a
todo o país’ (Idem).
A ordem estatal torna-se um projeto racional da humanidade. A passagem do
‘Estado de Natureza’ para o Estado Civil é a tomada de consciência por parte do homem
das condições naturais a que está sujeita sua vida em sociedade e das capacidades de
que dispõe para gerir e utilizar essas condições para sua sobrevivência e bem-estar.
Esta passagem é obejto da análise de vários autores clássicos, sempre cobrados em
concursos públicos:
•
Maquiavel (1469-1527): ‘O Príncipe’
•
T. Hobbes (1588-1679): ‘O Leviatã’
•
John Locke (1632-1704): ‘Segundo Tratado sobre o Governo Civil’
•
Barão de Montesquieu (1689-1750):
(1689
‘Do Espírito das Leis’
•
Jean-Jacques
Jacques Rousseau (1712-1778):
(1712
‘O Contrato Social’
•
John Stuart Mill (1806
1806 - 1873): Da Liberdade
4.1.2 Formas de Estado e de Governo
As formas de Governo são as soluções institucionais encontradas pela sociedade para
estruturar o Estado de forma que este dê resposta adequada às suas demandas. A tipologia
clássica, altamente difundida por Platão, Aristóteles e Políbio, e a tipologia moderna, trazida
por Maquiavel e Montesquieu,
Montesquieu as classificam da seguinte maneira:
Tipologia clássica:
Tipologia Moderna:
É importante ter as tipologias em mente, visto que a discussão dos teóricos clássicos
do Estado, exposta abaixo, requer conhecimento das mesmas.
4.1.3 Maquiavel e a constituição do Estado Moderno - O ‘Príncipe”, 1513
É o Primeiro autor a utilizar a palavra Estado com o significado atual. O traço mais
marcante de sua obra é a distinção entre a moral política e a moral cristã. Preocupa-se
Preocupa
com o que é necessário fazer para que a ordem seja mantida (verità
(verità effetuale),
effetuale não com
o que seria ideal do ponto de vista normativo (o dever ser). Verifica-se,
Verifica
no autor
renascentista, a preocupação de resolver o dilema objetividade X normatividade,
normatividade com
vantagem para a primeira forma de se encarar o trato da política. A moral cristã tem seu
valor, mas aplicada em âmbito adequado, quando aplicada à política traz resultados
desastrosos para a ordem pública. São conhecimentos especializados que estão
envolvidos em cada uma das esferas; a da política requer domínio da arte de conquista e
manutenção do poder, de que depende a manutenção da ordem social, fim que legitima
a utilização dos diversos meios ao alcance do governante; envolve altos graus de
racionalização; não pode ser conduzida por um rei que tenha obtido o poder por
qualquer sorte de direito divino.
Assim, o Estado, em Maquiavel tem a função essencial de impor a ordem, pois
entende que a desordem leva os homens à barbárie, situação que o incomodava na Itália
de seu tempo. A Itália dos séculos XV-XVI, época de Maquiavel (1469-1527), era
altamente fragmentada. Uma série de cidades-livres como Milão, Veneza, Gênova,
Florença, etc. conviviam com os Estados Pontifícios controlados diretamente pela
Igreja. Uma série de invasões estrangeiras se deram a partir de 1494, ocorrendo até o
terrível saque de Roma feito em 1527 por tropas do imperador Carlos V. Internamente,
a península italiana estava dividida em principados seculares e religiosos, em várias
tiranias e em regimes republicanos comunais-populares, além da histórica rivalidade
entre Guelfos e Gibelinos.
Havia múltiplos poderes: o da Igreja Católica, o dos nobres, o das cidades-livres, o
dos tiranos, e o dos reis estrangeiros, contribuindo isto tudo para um clima de
dilaceramento e perturbação geral, na visão de Maquiavel, trazendo muitos
padecimentos à Itália. No resto da Europa, entretanto, formavam-se monarquiasnacionais poderosas, nas quais os reis, ao contrário do que se passava na Itália,
concentravam cada vez mais poder e autoridade, sobrepondo-se à alta nobreza e à
influência da Igreja. Em meio a uma Itália perdida em constantes revoluções e
reviravolta dos governos, qual seria o Estado capaz de instaurar a ordem de maneira
estável? Para Maquiavel, apenas um Estado absolutista, com poder altamente
concentrado nas mãos do príncipe poderia restabelecer ordem.
Entretanto, a natureza da política nunca permitirá uma ordem definitiva.
A
manutenção do poder e da ordem sempre dependerá das qualidades de governo do
príncipe (virtú), combinadas com uma certa dose de ‘sorte’, a ‘fortuna’ de Maquiavel.
Assim, Maquiavel pretende em ‘O Príncipe’, ensinar aos príncipes da Itália técnicas
para incrementarem suas capacidades de conquista e manutenção do poder.
Os conceitos de ‘virtu’ (coragem, valor, capacidade, eficácia política) e de ‘fortuna’
(sorte, acaso, influência das circunstâncias) têm grande importância para a concepção
maquiaveliana da história. Por virtu Maquiavel entende a capacidade pessoal de
dominar os eventos, de alcançar um fim objetivado, por qualquer meio; por “fortuna”
entende o curso dos acontecimentos que não dependem da vontade humana. A diferença
entre os principados conquistados pela virtu e os conquistados pela “fortuna” é que os
primeiros são mais duradouros. O homem sem virtú de boa fortuna cai, mas o que tem
virtú pode seduzir a fortuna.
Para Maquiavel a distinção entre um bom e um mau governo é dada por sua
capacidade de manutenção do Estado em estabilidade. É bom, por exemplo, aquele
governo que, embora tenha conquistado o poder por meios criminosos consegue depois
mantê-lo. A manutenção do poder, por sua vez, passa pela compreensão profunda dos
acontecimentos históricos e pelo traçado de claras estratégias para a superação de
dificuldades que redundantemente se apresentam aos governos.
É fundamental o estudo do passado, porque a natureza humana é imutável (homens
de hoje iguais aos homens do passado) e porque esse estudo possibilita a compreensão
do que sucedeu a governantes do passado e de quais meios foram utilizados para
enfrentar as diversas situações. Dessa maneira, será possível encontrar, por analogia,
lições para o presente – visão cíclica da história.
“Quem estudar a história contemporânea e da antiguidade verá que os mesmos
desejos e as mesmas paixões reinaram e reinam em todos os governos, em todos os
povos. Por isso é fácil para quem estuda com profundidade os acontecimentos passados,
prever o que o futuro reserva a cada estado, propondo os remédios já utilizados pelos
antigos, ou, caso isso não seja possível, imaginando novos remédios, baseados na
semelhança dos novos acontecimentos”. (Maquiavel, O Príncipe)
Maquiavel foi ainda uma figura polêmica, notado por suas máximas de efeito,
totalmente contrárias a moral cristã dominante da época. Considerava a natureza
humana naturalmente má, os homens, em suas palavras são ‘ingratos, volúveis,
mentirosos, covardes e gananciosos’. Por isso a sociedade teria tendência tão forte para
a anarquia. Em suas afirmações sobre estratégias de conquista e manutenção do poder
alegou: ‘É melhor ser amado que odiado, não sendo possível, seja temido’; ‘Faça o mal
de uma única vez e de modo irreparável. O bem faça aos poucos’. E a mais famosa de
todas, ‘os fins justificam os meios’:
"Procure, pois, um príncipe, vencer e manter o Estado: os meios serão sempre
honrosos e por todos louvados, porque o vulgo sempre se deixa levar pelas aparências e
pelos resultados ( "O Príncipe", cap. XVIII)
4.2 Os contratualistas – o contrato social
4.2.1 Thomas Hobbes e formação do Estado: “ O Leviatã”, 1650
Thomas Hobbes, tal como Maquiavel, viveu o período da afirmação da monarquia
absolutista; período conturbado onde as forças feudais e populares acirravam a disputa
pelo controle sobre as monarquias nacionais, gerando permanente instabilidade, daí
ambos defenderem, de maneiras diversas, o reforço e concentração do poder do estado
nas mãos de um único governante de poder absoluto.
Sua Filosofia política foi fundada em uma construção racional da sociedade, que
permitisse explicar o porquê da legitimidade do poder absoluto dos soberanos –
Racionalização do absolutismo.
Grande parte da sua vida passou-se no contexto da Revolução Puritana e da
República de Cromwell, que constituíam a realidade sobre as quais Hobbes irá refletir,
fazendo com que possamos concluir que as teorias em torno do homem e do Estado
formuladas por este pensador estão profundamente ligadas à situação específica da
Inglaterra do século XVII. O Parlamento inglês, como representante da burguesia,
disputava o poder com o rei, negando-lhe o aumento de impostos e o comando do
exército, situação que acabaria resultando numa guerra civil entre os anos de 1642 e
1648. O século XVII foi marcado pelo antagonismo entre a Coroa e o Parlamento,
controlados, respectivamente, pela dinastia Stuart, defensora do absolutismo, e a
burguesia ascendente, partidária do liberalismo. O Conflito assumiu também conotações
religiosas e se mesclou com as lutas sectárias entre católicos, anglicanos, presbiterianos
e puritanos.
Tal situação gerou intensa crise político-religiosa na Inglaterra, ainda agravada pela
rivalidade econômica entre os beneficiários dos privilégios e monopólios mercantilistas
concedidos pelo Estado e os setores que advogavam a liberdade de comércio e de
produção. (Mello, 1989:80). Em 1640, o confronto entre o rei Carlos I e o Parlamento
envolveu o país numa sangrenta guerra civil, cunhada Revolução Puritana, que só
terminou em 1649, com a vitória das forças parlamentares, a execução de Carlos I e a
implantação da república na Inglaterra.
‘Foi após os horrores da guerra civil, da consumação do regicídio e da instauração
da férrea ditadura de Cromwell, que Thomas Hobbes, refugiado na França, publicou em
1651 o Leviatã: apologia ao Estado todo-poderoso que, monopolizando a força
concentrada da comunidade, torna-se fiador da vida, da paz e da segurança dos súditos’.
(Mello, 1989,80).
A justificação de Hobbes para o poder absoluto é estritamente racional e friamente
utilitária, completamente livre de qualquer tipo de religiosidade e sentimentalismo,
negando implicitamente a origem divina do poder. Baseada na superação do “Estado de
Natureza”, onde todos, na ânsia de satisfazer seus próprios desejos, tendem ao
aniquilamento mútuo – situação violenta que chamou de ‘guerra de todos contra todos’,
onde o ‘homem é o lobo do homem’. No Estado de natureza de Hobbes todos lutam
entre si pelo poder. Era o que Hobbes via na sociedade inglesa em que vivia, durante a
Revolução Puritana e a guerra civil, atestando a importância do fator histórico na
compreensão das teorias, (Macpherson, C.B. A teoria do individualismo possessivo: de
Hobbes até Locke. 1979). A partir das observações dos acontecimentos na Inglaterra
Hobbes traça concepções sobre a natureza humana.
Hobbes descreve o homem em seu Estado Natural como egoísta, egocêntrico e
inseguro. Não conhece leis e não tem conceito de justiça; somente segue os ditames de
suas paixões e desejos temperados com algumas sugestões de sua razão natural. Assim,
onde não existe governo ou lei, os homens naturalmente caem em discórdia. Desde que
os recursos sejam limitados, ali haverá competição, que levará ao medo, à inveja e a
disputa. Semeada a desconfiança, perde-se a segurança de confiar no próximo. Na busca
pela glória, derrubam-se os outros pelas costas, já que, para Hobbes, como os homens
são iguais nas capacidades e na expectativa de êxito, nenhuma pessoa ou nenhum grupo
pode, com segurança, reter o poder.
Assim sendo, o conflito é perpétuo, e "cada homem é inimigo de outro homem".
Nesse estado de guerra nada de bom pode surgir; concentrados na autodefesa e na
conquista, o trabalho produtivo é impossível. Não há tranqüilidade para a busca do
conhecimento, não existe motivação para construir ou explorar, não existe lugar para as
artes e letras, não existe espaço para a sociedade só ‘medo contínuo e perigo de morte
violenta’. Então a vida do homem nesse estado será ‘solitária, pobre, sórdida, brutal e
curta’. (Hobbes, O Leviatã).
Em contrapartida ao estado de guerra descrito acima, os próprios homens
almejariam uma ordem, ansiando a paz, ou um Estado que garantisse essa paz, essa vida
acordada. O indivíduo se vê diante de duas opções: a) a liberdade, que leva ao medo e à
morte e b) a renúncia de seu poder individual em favor de um soberano (leviatã = ente
fictício) e da segurança e (preocupação central). B é a escolha racional, consubstanciada
no Pacto Social, indissolúvel e celebrado uma única vez entre todos os indivíduos da
sociedade.
Para controle do “Estado de Natureza” caótico, anti-social, irracional e não-político
o pacto social é instituído. Este será garantido e executado pelo Leviatã, ente artificial (e
em tese imparcial), com poderes ilimitados – o Estado Hobbeisano. O poder deste ente
se constituirá do somatório do poder individual de cada membro da sociedade e
monopolizará o recurso à violência em nome da segurança da sociedade civil.
“Dos poderes humanos o maior é aquele composto pelos poderes de vários homens,
unidos por consentimento numa só pessoa, natural ou civil, que tem o uso de todos os
seus poderes na dependência de sua vontade. É o caso do poder de um Estado."
(Hobbes, O Leviatã).
Para Hobbes, o Estado dever conter governo monárquico absoluto, como única
forma de estabilização do conflito. Os parlamentos são desacreditados por ele, considera
que ‘não há qualquer grande Estado cuja soberania resida numa grande assembléia que
não se encontre, quanto às consultas da paz e da guerra e quanto à feitura das leis, na
mesma situação de um governo pertencente a uma criança’. (Idem)
"A única forma de constituir um poder comum, capaz de defender a comunidade das
invasões dos estrangeiros e das injúrias dos próprios comuneiros, garantindo-lhes assim
uma segurança suficiente para que, mediante seu próprio trabalho e graças aos frutos da
terra, possam alimentar-se e viver satisfeitos, é conferir toda a força e poder a um
homem, ou a uma assembléia de homens, que possa reduzir suas diversas vontades, por
pluralidade de votos, a uma só vontade. (...) Esta é a geração daquele enorme Leviatã,
ou antes - com toda reverência - daquele deus mortal, ao qual devemos, abaixo do Deus
Imortal, nossa paz e defesa." (Ibidem)
Após o pacto, a renúncia é completa, o soberano torna-se o titular dos direitos e do
poder político, o que denota a desvantagem da fixação do contrato social Hobbesiano: a
impossibilidade de desfazê-lo: "... portanto nenhum dos súditos pode se libertar da
sujeição, sob qualquer pretexto de infração." Entretanto, Hobbes abre uma pequena
brecha para que o súdito rompa o contrato social, na hipótese o Estado não ser capaz de
prover a segurança e proteção dos súditos:
"A obrigação dos súditos para com o soberano dura enquanto e apenas enquanto
dura também o poder mediante o qual ele é capaz de protegê-los. O direito que por
natureza os homens têm de defender-se a si mesmos não pode ser abandonado através
de pacto algum". (O Leviatã, Cap 21). A
4.2.2. Locke e a formação do Estado Moderno: ‘Segundo Tratado sobre o
Governo Civil’ (1632-1704)
Locke foi praticamente contemporâneo a Hobbes e observou também de perto os
percalços da Revolução Puritana, a ditadura Cromwell e a posterior Revolução
Gloriosa. Contudo, o contexto em que viveu permitiu leitura dos fatos distinta da de
Hobbes, com o traçado de uma teoria essencialmente diferente sobre a natureza do
governo, para a superação do conflito e alcance da paz social.
John Locke passa vários anos na França e na Holanda, voltando à Inglaterra em
1688, ano da Revolução Gloriosa. Assim como Hobbes, suas teorias estavam
profundamente ligadas ao contexto em que viveu, mas suas percepções serão diferentes.
Em 1660, enquanto Locke morava no exterior, Cromwell, então ditador desde 1649,
morre e sua morte de envolve o país numa crise política cuja solução, para se evitar
nova guerra civil, foi a restauração da monarquia, com o retorno da dinastia Stuart ao
trono inglês, então deposta, com o regicídio de Carlos I. O filho de Carlos I, Carlos II,
aluno de Hobbes, assume a coroa e o controle político do Estado inglês.
Durante a Restauração (1660-88), no reinado de Carlos II, reativou-se o conflito
entre Coroa e Parlamento, que se opunha à política pró-católica e pró-francesa dos
Stuart. Em 1680, o Parlamento cindiu-se em dois partidos, os Tories e os Whigs,
representando conservadores e liberais. A crise chega ao auge quando abusos reais
levam à união dos Tories e Whigs, que se aliam Guilherme de Orange, chefe de Estado
da Holanda e genro de Carlos II, e organizam uma conspiração contra o monarca
"papista". Em 1688, Orange aportou no país à frente de um exército e, após a deposição
de Carlos II, recebeu a coroa do Parlamento.
A Revolução Gloriosa, como ficou conhecida, assinalou o triunfo do liberalismo
político sobre o absolutismo e, com a aprovação do Bill of Rights em 1689, assegurou a
supremacia legal do Parlamento sobre a realeza e instituiu na Inglaterra uma monarquia
limitada. John Locke, exilado na Holanda, c/Shaftesbury, opositor da coroa e seu
mentor político retorna à Inglaterra após o triunfo da Revolução Gloriosa e publica suas
idéias. Seu trabalho, na visão de Mello (1989,82), ‘é uma justificação ex post facto da
Revolução Gloriosa, onde Locke fundamenta a legitimidade da deposição de Carlos II
por Guilherme de Orange e pelo Parlamento com base na doutrina do direito de
resistência’. Trata da origem, extensão e objetivo do governo civil, cuja tese principal é
de que nem a tradição nem a força, mas apenas o consentimento expresso dos
governados é a única fonte do poder político legítimo.
Juntamente com Hobbes e Rousseau, Locke é um dos principais representantes do
jusnaturalismo ou teoria dos direitos naturais. O modelo jusnaturalista de Locke é, em
suas linhas gerais, semelhante ao de Hobbes: ambos partem do estado de natureza que,
pela mediação do contrato social, realiza a passagem para o estado civil. Existe,
contudo, grande diferença na forma como Locke concebe especificamente cada um dos
termos do trinômio estado natural/contrato social /e estado civil.
Para Locke,a existência do indivíduo é anterior ao surgimento da sociedade e do
Estado. Na sua concepção individualista, os homens viviam originalmente num estágio
pré-social e pré-político, caracterizado pela mais perfeita liberdade e igualdade,
denominado estado de natureza. A liberdade, porém, não é absoluta, pois “onde não há
leis, não há liberdade”. Esse estado de natureza diferia do estado de guerra hobbesiano,
baseado na insegurança e na violência, por ser guiado por relativa paz, por força de leis
naturais (razão), presentes na percepção de cada homem, não devendo estes abusar de
sua liberdade para prejudicar os outros.
A lei natural delimita, no modelo Lockeano, a liberdade natural. Essa lei é uma
expressão da vontade de Deus, que é conhecida pelos homens por meio da razão – ’voz
de deus no homem’. Logo, A razão promulga a lei de natureza e, também, faz dos
homens livres, ao mesmo tempo em que razão, ou a lei natural, tem soberania sobre as
ações humanas. A razão na visão Lockeana é o modo de cooperação entre os homens,
que os permite viver junto em sociedade e em solidariedade. O indivíduo que age
irracionalmente é como um animal e, como tal, deve ser tratado. Agir irracionalmente
inclui dizer que está acima de alguém, sem ser Deus (neste caso o animal é selvagem e
nocivo).
O estado de natureza de Locke, por serem todos iguais, livres e racionais, é
inicialmente bom. Nessa situação o poder executivo da lei natural (da razão) ainda está
exclusivamente nas mãos dos indivíduos, não se fez comunal. Se alguém transgredi-la,
qualquer pessoa pode puni-lo. O estado de natureza já é social e político. Nesse estado
pacífico os homens já eram dotados de razão e desfrutavam da propriedade que, numa
primeira acepção genérica utilizada por Locke, designava simultaneamente a vida, a
liberdade e os bens como direitos naturais do ser humano. Como e porquê, então, a
sociedade passa do estado de natureza ao estado civil, se já havia paz e liberdade?
O direito de governar, no estado de natureza de Locke, é um direito natural e
individual, além disso, é “judicial” porque envolve capacidade de todos em executar a
lei natural. Porém, no estado de natureza, não há nada que diga quais os pesos e
medidas para aplicação da lei, de forma que ela seja feita adequadamente e de forma
proporcionalmente correta. Tudo está nas mentes dos indivíduos, os quais são, mais ou
menos, legisladores. Assim, torna-se difícil convencer uma pessoa errada de que esta
fere a lei natural. O erro pode vir das paixões ou de interesses pessoais que geram
incidentes indesejáveis, daí a necessidade do Estado.
Quem agride o outro está indo contra as leis naturais, renunciando à razão e dando
aos outros o direito de castigá-lo, ocasionando em lutas entre os indivíduos. Não se trata
mais de uma “guerra de todos contra todos” como teorizava Hobbes, mas de uma guerra
dos ‘seguidores da lei da natureza contra os transgressores da lei da natureza’. Neste
estado de guerra, a única forma de obter a paz é através da eliminação de todos os
transgressores e a reparação de todo os danos causados, o que acabava perpetuando a
guerra. Para resolver esta questão e assegurar o uso da razão, ou seja, o cumprimento da
lei da natureza, os homens devem ceder seu direito de executar a lei por si e entregá-lo a
um corpo político representativo, o governo, já que na interpretação individualizada é
impossível manter imparcialidade no julgamento de eventuais transgressores.
O governo pode ser um único indivíduo ou vários, o que importa é que sua
finalidade é a de julgar e castigar os transgressores e assegurar a paz na comunidade.
Para isso o governo desdobra-se em vários poderes, sendo que o principal deles é o
Legislativo, que estabelece as leis fixas para que todos possam segui-las. Para não
legislar em causa própria o Legislativo não pode executar as leis, o que ficaria a cargo
do chamado poder Executivo. Ao poder Federativo fica a incumbência de se relacionar
com outras comunidades ou homens que não aderiram ao pacto, decretando paz ou
guerra. Nenhum desses poderes têm poder ilimitado, estando o Federativo e o Executivo
subordinados ao Legislativo e este às leis da natureza, o que resulta numa idéia contrária
ao absolutismo, porque o monarca absoluto não estaria inserido na sociedade, mas sim
deliberando de fora dela, tendo em suas mãos a prerrogativa de causar a desordem, na
visão de Locke, e a quebra da lei da natureza.
A constituição do corpo político é feita pela união consensual dos homens, o que é a
fonte de sua legitimidade. Assim a monarquia absoluta não pode ser legítima, pois não
faz sentido homens iguais e livres se colocarem em situação pior que aquela do estado
de natureza, estarem submissos a um regime cujas ações não podem ser previstas nem
reclamadas. Para instituir o governo civil, os homens precisam abrir mãos de dois
podere: o de legislar e o de executar a lei natural.
O supremo poder é o legislativo, o que torna o parlamento soberano. Contudo, o
legislador não pode prever nem prover todas as situações, logo, é necessário deixar
algumas resoluções para a discrição de quem tem o poder executivo, i.e., a prerrogativa
real. Alem disso, o legislativo não precisa estar sempre reunido. Todavia, tanto o poder
do legislativo quanto o executivo não podem ultrapassar os limites do bem público e os
estabelecidos pela lei natural, em vigor mesmo após a instituição do governo civil. Os
detentores do poder são depositários da confiança do povo, caso não cumpram seus
mandatos adequadamente, cabe ao povo julgá-los e propor sua substituição, se assim
desejar. Contra a força ‘sem autoridade’, e legitimidade, o povo pode empregar a força
(direito de insurreição) – o povo jamais perde seus direitos e poderes, apenas delega-os
a outro.s O direito à insurreição não pode, entretanto, gerar perpétua anarquia. Mover-se
apenas quando a situação se tornar insuportável.
A relação entre as suas teorias e o contexto histórico específico da Revolução
Gloriosa é, portanto, clara. Já não há mais um contexto de conflitos e de guerra civil,
mas de um controle da desordem social diante da confirmação do Parlamento como
instituição suprema do governo
4.2.3 Rousseau e a formação do Estado Moderno: O Contrato Social (17121778)
Rousseau, tal como Hobbes e Locke descreve a passagem do estado natural (estado
de natureza) ao estado civil. Entretanto, sua visão é bastante diferente dos demais
contratualistas. Rousseau rejeita todo o modelo de representação política estabelecido
por Hobbes e Locke. Não acreditava que um, poucos ou muitos pudessem representar a
totalidade dos indivíduos que compõem a coletividade e trabalhar para alcance daquilo
que chamou ‘a vontade geral’. Apenas a participação direta de indivíduos nas decisões
públicas, tal como nas democracias gregas, poderia salvaguardar a prevalência do bem
comum sobre os interesses individuais, ou de grupos.
Ademais criticava intensamente o pacto social formador do governo representativo
de Locke, que, para ele, consistiu em golpe dos detentores de propriedade sobre os não
detentores. O Governo civil e o pacto social de Locke, para Rousseau, beneficiava
exclusivamente a burguesia, que mascarava seus interesses como sendo de todos para
que os demais indivíduos embarcassem em seu discurso e se tornassem aliados, ao invés
de adversários. Mas a substância do pacto para ele era extremamente excludente.
Para Rousseau o homem em seu estado de natureza é bom e pacífico – mito do ‘bom
selvagem’. É um estado amoral, onde não há nem bem nem mal definidos – figura do
Jardim Éden. A paz natural, entretanto, passa ser perturbada quando o primeiro homem
cerca um feixo de terra e o afirma como sua propriedade. A posse da propriedade
privada degenera o estado de natureza para a sociedade civil corrupta, aquela fundada
com o Estado criado pelo pacto social lockeano, que, como presume que os homens
dispõem de senso natural de razão, suas conquistas materiais não foram contestadas no
momento de firmação do pacto.
Entretanto, segundo Rousseau, um verdadeiro contrato social não poderia se furtar à
revisão da distribuição de todos os bens e terras públicas apropriados por indivíduos no
momento de conflito, antes da firmação do pacto, para restabelecimento da condição de
indivíduos iguais. Um verdadeiro pacto social iniciaria do zero a distribuição dos bens
entre os indivíduos, na base do consenso, visando o ‘bem comum’. A propriedade não
regulada gera desigualdade. O primeiro contrato social é feito entre desiguais e,
portanto, reforça e institucionaliza a exploração de um grupo pelo outro.
A sociedade civil estabelecida no tempo de Rousseau não representava, conforme sua
visão, um acordo entre iguais, mas, ao contrário, um golpe dos ricos e poderosos para
lhes garantir: proteção, legitimidade e ordem, para gozarem tranquilamente de sua
propriedade. Portanto, o Estado moderno, para Rousseau, corresponde a um arranjo
institucional arquitetado para a promover a à perpetuação pacífica da desigualdade.
Torna-se necessário, em sua visão, um novo contrato social.
Um novo contrato social seria oportunidade de construir um Estado justo e igualitário.
A fonte do poder residiria no povo, tal como em Locke, mas que renuncia à sua
liberdade em favor de um estado que seja guiado pela ‘vontade geral’ e não pela ‘razão
natural’. Passaria a fonte de legitimação e maior objetivo do Estado, a promoção da
vontade geral, que para Rousseau é diferente da soma das vontades individuais. Supõe o
tratamento de todos como iguais e a consideração de necessidades da sociedade
enquanto corpo coletivo, não apenas a consideração de necessidades individuais, para o
estabelecimento da paz social. O novo contrato traria a substituição da liberdade natural
pela liberdade civil, calcada na limitação e na consideração do coletivo antes do
individual;
4.3 Autores clássicos que propuseram reformas ou ajustes institucionais à
estrutura do Estado Moderno
4.3.1 Montesquieu e o Estado Moderno “Do Espírito das Leis” (1689-1750)
Montesquieu foi um iluminista francês preocupado com as razões da decadência das
monarquias e os mecanismos que garantiriam sua estabilidade. Ao observar a
contestação de alguns pilares estruturais do Estado Moderno, ao longo da primeira
metade do sec. XVIII, que pouco mais tarde observaria a revolução francesa e a
deposição da monarquia de França, Montesquieu se preocupava com a estabilidade do
Estado e com a manutenção da ordem política, tal como Maquiavel. Assim, sua obra se
apresenta tal como um ‘Príncipe’ revisitado. Analisa possíveis causas do fracasso de
algumas monarquias, para o que encontra a explicação do ‘Espírito das Leis’, e traça
possíveis soluções para que os governos monárquicos ou aristocráticos trilhem sucesso.
Segundo o autor as coisas têm natureza própria e as leis devem refletir exatamente a
natureza intrínseca das coisas. As leis, ou melhor, o espírito das leis, deve advir de
traços sociais absolutamente arraigados na sociedade para que as mesmas produzam
efeitos esperáveis ou minimante previsíveis. O ‘espírito das leis’, ou os fatores sociais
inspiradores das Leis, é o composto das condições materiais, culturais, sociais e físicas
que uma sociedade experimenta. Assim as leis de uma sociedade são resultado de suas
realidades complexas e sua essência deve ser buscada na natureza das coisas que cercam
essa sociedade e que influenciam seus fatos sociais, sob pena de sofrerem irremediável
fragilidade.
Para Montesquieu esse é um dos principais fatores que influenciam a falência de
monarquias e aristocracias que degeneram em tiranias. As leis criadas não
correspondem às necessidades sociais, o que acarreta conflito e desestabilização. Como
remédio, Montesquieu propõe uma estrutura de freios e contrapesos, que sustenta a idéia
de que o poder, em um sistema político-social, deve ser dividido entre as instituições e
que estas devem controlar umas às outras, para que as Leis a serem promulgadas
estejam de acordo com realidade local e promovam o avanço da sociedade. Assim,
propõe a clássica divisão de poderes abaixo relacionada:
a) Poder legislativo: responsável pela elaboração e correção das leis;
b) Poder executivo das coisas que dependem do direito das gentes: faz paz ou
guerra, envia e recebe embaixadas, estabelece a ordem, prevê invasões, etc. (seria o
nosso Executivo);
c) Poder executivo das coisas que dependem do direito civil: pune crimes e julga
dissídios dos particulares – detém o poder de julgar e de dizer o direito (seria o nosso
judiciário).
4.3.2 Stuart Mill e o Estado Moderno: 1806-1873
Contemporâneo do apogeu da Revolução Industrial inglesa, do avanço da burguesia
industrial e financeira, das primeiras reformas eleitorais na Inglaterra, dos movimentos
operário e democrático e influenciado pelos utilitaristas, seu pai, James Mill e Jeremy
Bentham, Stuart Mill defenderá a participação dos trabalhadores e excluídos nos
espaços de representação política, como forma de promoção do desenvolvimento e do
bem estar humano.
A liberdade individual, em sua acepção, refere-se à capacidade do ser humano em
desenvolver suas potencialidades, de acordo com suas próprias escolhas e preferências.
O Estado liberal de Mill, só tem razão de existir se for para buscar incessantemente a
melhora da condição de cada vez mais indivíduos, sem prejuízo da condição de
nenhum. Justifica-se como meio institucional para a obtenção de uma sociedade justa e
equitativa, por meio do aumento da soma das boas qualidades coletivas e individuais.
Seu principal propósito e fonte de legitimação é a promoção do desenvolvimento
humano, por meio da promoção da verdadeira liberdade individual, não apenas a
liberdade negativa, que denota a proteção do indivíduo contra ações abusivas e danosas
do Estado à sua esfera privada, mas principalmente da constante expansão das
liberdades individuais positivas.
Essas liberdades referem-se à ampliação de direitos concedidos pelo Estado aos
indivíduos, que os capacitem a incrementar sua habilidade em implementar seus planos
individuais de bem estar e realização. São exemplos os direitos políticos, os sociais e os
de propriedade, que quando expandidos propiciam maiores oportunidades de sucesso
individual na busca por bem estar e, portanto maior liberdade. O Estado liberal de Mill,
almeja, assim, a promoção do desenvolvimento coletivo, a partir do desenvolvimento
individual, ou humano, pela ampliação da liberdade individual, já que, para ele, é da
natureza humana a busca do desenvolvimento.
Não caberia, ao Estado, contudo, promover a igualdade pura e simplesmente. Os
indivíduos devem ter capacidade de criar, de se diferenciar dos outros e devem ser
estimulados a se desenvolverem e desempenharem suas funções de forma cada vez
melhor. Isto gera o desenvolvimento. A ditadura da maioria, por outro lado, como
apontou Toqueville em ‘A Democracia na América’, é das situações mais detestáveis,
onde pela uniformização, os indivíduos perdem suas qualidades distintivas e nivelam-se
por baixo. O conflito, neste ponto, é positivo, pois permite que as sociedades
experimentem a divergência de opiniões e assim cresçam intelectualmente e
moralmente, no embate das idéias conflitantes.
Assim, o combate à desigualdade não pode ser um dado absoluto de justiça. O
Estado, para Mill, não pode querer gerar, necessariamente, igualdade de resultados, tal
como o queria a doutrina marxista. O Estado deve se preocupar, sim, com a promoção
de ‘igualdade de condições’. Os indivíduos devem receber da sociedade civil as mesmas
condições para se desenvolverem e buscarem seus próprios resultados, de acordo com o
mérito. A desigualdade de resultados, cunhada no mérito, é essencial ao
desenvolvimento humano, pois a recompensa diferenciada incentiva a maior dedicação.
Em suporte a esta idéia, Mill analisa dados da economia de seu tempo e verifica que o
capitalismo,
ao
contrário
do
defendido
pelos
marxistas,
estava
reduzindo
progressivamente a desigualdade entre os indivíduos; ou seja, o sistema era capaz de
redistribuir riqueza, em função do desempenho individual.
A desigualdade pré-capitalista não permitia que todos participassem. No capitalismo
isto vem sendo corrigido, para Mill, por força do desenvolvimento das instituições de
representação dos indivíduos na ordem política; razão pela qual advoga como fator
essencial para o desenvolvimento coletivo e individual a participação política dos mais
amplos segmentos da sociedade. Entretanto, Mill, tinha um certo temor em relação ao
sufrágio universal: as massas poderiam não saber fazer as melhores escolhas para a
coletividade, visto que muitas vezes estariam presas a questões meramente materiais de
subsistência, ou poderiam desacreditar no sistema e tender à revolução . Como inseri-las
no sistema de representação, sem levá-lo à falência? Uma das soluções que imaginou foi
o voto com pesos diferentes, sendo a elite cultural mais valorizada no voto, para ser o
fiel da balança na luta de classes. Na sua maturidade intelectual, contudo, defende o
liberalismo democrático, incluindo sufrágio universal e políticas sociais para reduzir
mazelas da industrialização e o voto proporcional para garantia de representação de
minorias. Por suas propostas é considerado um dos precursores do pluralismo.
5. A Evolução do Estado Moderno (Parte do Tema 2 do Edital)
5.1 A Administração Racional-Legal
Nos moldes tradicionais, a apropriação de excedentes produtivos, bem como de bens
públicos, era concedida apenas a membros da nobreza, em forma de privilégios,
desconsiderados critérios de mérito. O Estado Moderno, ao contrário, nasce dotado de
finalidade redistributiva da riqueza produzida pela sociedade e, como passa a derivar
sua legitimação da afirmação política do indivíduo, em contraposição ao modelo de
estamentos tradicional, necessita de regras claras e universais que o confiram
neutralidade na resolução de conflitos entre indivíduos, que, por intermédio da esfera
pública, disputam constantemente a apropriação privada de bens públicos e da riqueza
disponível na sociedade.
Como mediador da apropriação privada dos excedentes produtivos e de bens
públicos pelos indivíduos, o Estado necessitava desenvolver, e adotar, critérios técnicos
e racionais que capturassem o mérito, ou merecimento, de cada indivíduo que
representava, em situação de disputa de interesses, sobre a qual fosse chamado a
intervir. Locke desenvolveu o conceito de “função social da terra”, que buscava
claramente atribuir à detenção de propriedade privada critérios de mérito – o direito de
posse de terras limitava-se à capacidade individual de produção nas mesmas; terras não
produtivas deviam ser redistribuídas a indíviduos que as podessem trabalhar; cabia ao
Estado definir e salvaguardar a execução de regras dessa natureza, visando a promoção
dos direitos civis individuais, sob pena de fuga de finalidade.
O Estado, nesta acepção, gozava de neutralidade. Era o juízo imparcial que arbitrava
as disputas individuais em favor do mérito de seus pleitos. Mérito que devia ser
avaliado exclusivamente sob o ponto de vista técnico e legal. Para que isso fosse
possível era necessário também uma burocracia técnica, neutra e regida
exclusivamente por normas aceitas pela sociedade. Os trâmites e regras adotados pelo
Estado, em seu processo de formulação e implementação de decisões, deviam obedecer
estritamente a normas formais pré-estabelecidas, segundo rigorosos critérios técnicos e
sob rigoroso controle de processos. O repúdio à possibilidade de re-captura do Estado
por interesses privados de notáveis influentes (nobreza) confere aos ‘meios’
administrativos importância fundamental à salvaguarda do interesse público.
Se a sociedade relegou ao ente artificial ‘Estado’ a tarefa de tomada de decisões e
solução de conflitos distributivos, este devia ser capaz de render contas, àquela, de
como suas decisões foram tomadas, com argumentos e justificativas precisos,
convincentes, e com amparo legal, sob pena de perda de legitimidade, por isso o rigor
dos processos. Além do amparo legal, decisões governamentais deviam contar sempre
com sucessivos mecanismos de ‘checks and balances’ (freios e contrapesos), dentro da
própria administração, para garantia da maior aferição possível da procedência das
decisões tomadas em diferentes instâncias.
Além disso, era necessário a constituição da ‘burocracia’ profissional, sob a
concepção de formação técnica de carreiras, com rígida hierarquia funcional,
impessoalidade e formalismo nas relações entre seus membros. A mesma formalidade e
racionalidade preconizada na construção de normas externas e internas, trâmites e
fluxos processuais decisórios, se aplicava à construção do quadro de pessoal
responsável por seu manuseio rotineiro. A este aparato administrativo pautado na
racionalidade, trazido pelo Estado Moderno, Max Weber deu o nome de ‘administração
pública burocrática’.
5.1.2 Vantagens da Administração Burocrática
Subordina tanto dominantes quanto dominados ao mesmo estatuto, o que dificulta os
abusos de poder.
Supera a obediência tradicional (de cunho aristocrático) e a subordinação
personalística (típica do líder carismático) por promover menor probabilidade de
decisões arbitrárias. Acarreta maior estabilidade na relação dominante/dominado,
uma vez que os direitos deste, como, por exemplo, o da queixa, já estão previamente
garantidos (todavia, o exercício legal-racional de dominação também envolve uma
certa dose de força).
Arrefece o impacto político-social do ‘carisma’ pessoal no poder político, que, para
Weber,
‘desestabiliza’
a
‘ordem’,
pois
é
‘repleto
de
impositivos
não
institucionalizados nem rotinizáveis’ . O carisma se opõe à disciplina, por seu
caráter de “poder mágico” e por configurar-se como atributo único e transitório de
um indivíduo. É extremamente perigosa, para Weber, a possibilidade de elementos
emocionais virem a predominar na política. A massa, que só pensa em curto prazo,
está sempre exposta a influências diretas puramente emocionais e irracionais.
Possui regras claras e definidas: uma dominação que não possui regras claras e bem
definidas tende, certamente a prejudicar aquele que é mais fraco economicamente
e/ou politicamente. (MARE, 1995: 15)18
5.2 A Burocracia (Tema 4 do Edital)
‘Burocracia’ é o termo normalmente utilizado para designar o conjunto de normas,
procedimentos e cargos funcionais destinados à organização racional dos processos de
tomada de decisões conduzidos no seio do Estado Moderno, caracterizado pela forma de
dominação racional-legal, cujo poder se legitima por um estatuto jurídico racional e
universal – aplicável a todos os cidadãos. Este é o sentido que Max Weber deu ao
termo. O conceito ‘burocracia’ foi criado por Max Weber para indicar funções da
administração pública, guiada por normas, atribuições específicas, esferas de
competência bem delimitadas e critérios de seleção de funcionários. A burocracia,
então, podia ser definida como o aparato técnico-administrativo, formado por
profissionais especializados, selecionados segundo critérios racionais e que se
encarregavam de diversas tarefas importantes dentro das organizações públicas.
18
BRASIL. Ministério da Administração e Reforma do Estado. ‘Plano Diretor da Reforma do Estado’,
1995.
A análise de Weber também aponta que a burocracia, da maneira como foi definida
acima, existiu em todas as formas de Estado, desde o antigo até o moderno. Contudo,
foi no contexto do Estado moderno e da ordem legal que a burocracia atingiu seu mais
alto grau de racionalidade. O Estado moderno passa a requerer um autêntico aparelho da
gestão do poder, operacional em processos cada vez mais próprios e definidos,
justificados pelos ideais de paz interna do país e eliminação do conflito social. Análise
técnica e normas gerais são necessárias para a resolução de casos controversos de
disputas de direitos entre indivíduos, que, com o Estado moderno, passa a ser o sujeito
principal da ação do Estado, diferentemente da organização social piramidal da Idade
média que dialogava com estamentos sociais19.
O ‘Estado Moderno’, enquanto organização social que institucionalizou a forma de
dominação ‘racional-legal’, em substituição à ‘dominação tradicional’, legitima-se por
um estatuto jurídico-legal, que organiza e disciplina as funções e os limites do Estado e
os direitos individuais, na sociedade, o que configura a base da autoridade do chefe de
Estado perante seus membros. O poder se exerce por meio de um conjunto de normas e
de uma organização formal operada por quadro técnico de funcionários, ao que é dado o
nome de ‘burocracia’, cujos procedimentos e rotinas servem para salvaguardar a
racionalidade e a justiça das decisões públicas tomadas por qualquer governante que
venham a ocupar o comando do Estado, tendo como base as leis fundamentais da
sociedade. Assim, as decisões emanadas de organizações burocráticas têm como traços
marcantes, a racionalidade e a impessoalidade.
No Estado Moderno, aquele que governa, e ‘domina’ os demais, o faz como fiel
depositário das normas fundamentais da sociedade e do bem estar individual, para isso,
necessita de uma ‘burocracia’ e de uma administração pública capazes de lhe
proporcionar a execução concreta das tarefas ou incumbências consideradas de interesse
de público ou comum numa coletividade (BRESSER PEREIRA, 2001: 8). Assim
procedendo, o governante recebe da sociedade o poder e o consentimento para
comandar seus rumos.
Qualquer governante que venha a comandar o Estado já encontra a burocracia e a
administração pública instaladas por estatutos racionais impositivos, de forma que seu
mandato para tomar e executar decisões não é absoluto. Quaisquer decisões precisam
19
Casos controversos, naquele tempo, eram resolvidos em favor do ator social mais bem posicionado na
pirâmide social ou daquele mais próximo ao Rei, que decidia conforme sua percepção pessoal dos
eventos. Não era necessário técnica e normas gerais. As decisões eram feitas caso a caso e muitas vezes
de forma arbitrária.
percorrer o caminho institucional da burocracia e da administração pública para se
concretizar e assim passam pelo crivo da análise técnica e jurídica. O combate à
arbitrariedade das decisões governamentais é a principal missão da burocracia moderna.
Se o mandato do governante cumpre uma finalidade específica – a pacificação do
conflito, o bem estar individual e o interesse público –, a burocracia é a instituição da
sociedade, e do Estado, que cria condições para a materialização dessa finalidade em
ações concretas e barreiras à fuga de finalidade pelo governante.
Ainda assim, o governante pode encontrar meios para executar ações contrárias ao
interesse público e às normas fundamentais da sociedade, a depender do grau de
profissionalização e desenvolvimento técnico da burocracia. Nestes casos, pode ocorrer
a perda de legitimidade do poder exercido pelo chefe de Estado e, consequentemente, a
perda de sua ‘autoridade’ perante os cidadãos, caso as arbitrariedades cometidas
venham a público, que podem requerer sua substituição, sob pena de instabilidade do
Estado.
A ‘burocracia’ pode assumir diversos graus de profissionalização e desenvolvimento
técnico. No incipiente Estado, a burocracia muito mais se aproximava a um corpo de
conselheiros reais pautados em costumes baseados na tradição. A burocracia apenas
avançou rumo à racionalidade técnica e à profissionalização à medida que o Estado
Moderno foi se consolidando e se desenvolvendo. É importante ter em mente que o
processo de formação do Estado Moderno, e de sua burocracia, foi um processo lento e
gradual que se estendeu por mais de seis séculos. Portanto, no início, o ‘Estado
Moderno’ ainda tinha muito o semblante de um ‘estado feudal’, porém com algumas
pontuais inovações, assim o era a sua burocracia.
A burocracia surgia como requisito essencial do nascimento do Estado. Entretanto,
um Estado menos complexo requeria uma burocracia menos complexa. Não foi de uma
hora para a outra que o tipo de poder dominante no mundo feudal, baseado na tradição
do nome e em títulos de nobreza deixou de existir, para dar lugar à imperatividade dos
estatutos jurídicos abstratos e universais. A dominação tradicional foi sendo
gradativamente substituída pela dominação racional-legal, de forma que os Estados
formados na era moderna, e sua burocracia, foram gradativamente perdendo suas
características patrimoniais, típicas da forma de dominação tradicional que vigorava no
período feudal.
Assim, o desenvolvimento da burocracia acompanhou a evolução do Estado e o
desenvolvimento da administração pública, que, em suas diferentes fases de evolução,
encontra três classificações: patrimonialista, burocrática e gerencial. Esta última
representa uma revisão crítica da administração burocrática, em função da evolução e
novas funções agregadas ao Estado na era contemporânea. Os modelos patrimonialista e
burocrático de administração pública incluem-se nas discussões sobre formação do
Estado Moderno, por isso já foram tratados em seções anteriores. O modelo gerencial
relaciona-se às discussões contemporâneas de reforma do Estado, do Estado
contemporâneo, por isso será abordado na seção destinada ao tratamento do tema 5 do
edital, referente às transformações do Estado contemporâeno.
Alguns dos principais atributos da burocracia:
Profissionalização
Concepção de carreira
Hierarquia funcional
Impessoalidade
Formalismo
5.3 Do Estado Absoluto ao Representativo
Conforme observou Bobbio (2007:426) no processo de formação do Estado
moderno destacam-se quatro fases distintas, cada uma com implicações específicas para
o desenvolvimento da burocracia. Duas delas antecedem sua formação: o ‘Proto-Estado
feudal’ – cuja comunidade política era policêntrica(feudos) e onde o poder local do
senhor feudal era combinado com o poder universal da Igreja, que monopolizava o
conhecimento; e o ‘Estado Estamental’ – cuja organização política era baseada em
órgãos colegiados formados por pessoas da mesma categoria social(estamentos),
portadores de prerrogativas e deveres específicos juridicamente delimitados e
socialmente diferenciados, que se opõem ao detentor do poder soberano através de
assembléias deliberantes.
As outras duas fases do processo de formação do Estado Moderno, segundo Bobbio,
são:
1) o ‘Estado Absoluto’, primeira forma de expressão do Estado moderno – fase em
que gradualmente se completou o processo de concentração e centralização do poder
político, com o controle dos instrumentos de gestão pelo soberano, a eliminação ou
subordinação dos ordenamentos jurídicos inferiores (poderes locais) e a passagem das
relações de comando e obediência entre pessoas para relações entre instituições. É a fase
onde ocorre a consolidação do conceito de indivíduo e de mercado e onde a terra se
torna mercadoria. Suas funções essenciais eram: a) estabelecer leis (sem depender de
consentimento); b) declarar guerra e fazer a paz; c) admitir e demitir servidores; d)
julgar em última instância; e) conceder graça aos condenados; f) cunhar moeda; g)
cobrar impostos; h) impor ou suspender derramas; e
2) o ‘Estado Representativo’ – constituído a partir da Revolução Gloriosa (1688), da
Independência Americana (1786) e da Revolução Francesa(1789) expressa o
compromisso entre o poder do soberano (baseado na tradição) e o poder dos
representantes da sociedade (baseado na soberania popular). A representação por
categorias (estamentos) é substituída pela representação dos indivíduos singulares
dotados de direitos (cidadãos). Este momento do Estado Moderno corresponde à
transição dos regimes absolutistas à instauração das democracias liberais, que do ponto
de vista teórico, corresponde à passagem do referencial teórico do Estado proposto por
Maquiavel e Hobbes ao referencial de Locke, Rousseau e Stuart Mill, expostos na seção
seguinte.
O ‘Estado Representativo’ representa para Bobbio o estágio do Estado Moderno em
que os indivíduos tomam consciência da identidade e das características comuns de seus
interesses privados, compartilhados por seus pares. Este aspecto, em particular, favorece
o pleito por expansão dos direitos fundamentais individuais tutelados pelo Estado. A
maior organização dos interesses individuais, com grande engajamento da burguesia,
impõe reivindicações mais variadas e complexas ao aparelho de Estado, em termos de
bens e serviços a serem oferecidos à coletividade.
A Passagem do ‘Estado Absoluto’ ao ‘Estado Representativo’
ocasionou a
complexificação das demandas sociais imputadas ao Estado. Os trabalhos de Rousseau
e de Stuart Mill inauguram no plano teórico, nos séculos XVIII e XIX, o pleito por
direitos políticos e sociais como direitos também fundamentais dos indivíduos, a serem
providos pelo Estado, para que pudessem ser livres, de fato, na busca de seu bem estar.
As competências do Estado Moderno, em seus primeiros contornos, restringiam-se às
atividades de defesa externa, segurança pública, garantia dos direitos de propriedade,
administração da Justiça, cunhagem de moeda, cobrança de tributos e a relações com
outros Estados/diplomacia.
5.4. Transformações do Papel do Estado nas Sociedades Contemporâneas e os
Direitos Civis, Políticos e Sociais (parte do tema 5 do edital)
O Estado Moderno nasce desde o princípio vinculado à promoção da segurança e do
direitos individuais. Que direitos eram esses, contudo, foi uma questão variável ao
longo da evolução do Estado Moderno. Em seu estado mais primário pode-se dizer que
esses direitos restrigiam-se aos direitos de primeira geração – os direitos civis. Com o
passar do tempo e com a evolução do Estado, a gama de direitos objeto de sua ação
amplia-se gradativamente, passando a incluir direitos de 2ª e 3ª gerações, direitos
políticos e sociais. Em seu estado originário os direitos individuais tutelados pelo
Estado referiam-se eminentemente ao direito à vida, aos direitos de propriedade, à
liberdade do indíviduo de ir e vir e de expressão e à liberdade para conduzir sua vida
conforme suas convicções, sem interferência do Estado. A garantia destes direitos civis
constituía a base da legitimidade do poder no Estado Moderno em sua fundação.
O Estado moderno, com sua unidade de comando, sua territorialiadade, seu corpo
qualificado de auxiliares técnicos, sua mundaneidade (separação da religião),
racionalidade e finalidade de promoção da satisfação individual, torna-se a instituição
capaz de dar resposta a ‘exigências de segurança e eficiência para os estratos20 de
população que não conseguiam desenvolver suas relações sociais e econômicas no
esquema das antigas estruturas organizacionais’ – a estrutura piramidal de estamentos
sociais21. Ademais, o Estado não basearia suas decisões em critérios subjetivos e
arbitrários, que pudessem denotar abuso de poder. Executaria com rigor as normas
fundamentais da sociedade aceita por todos. Este foi o primeiro gurpo de direitos
garatidos pelo Estado, os direitos civis. A este Estado é dado o nome de Estado Liberal.
Com o passar do tempo, eminentemente a partir das últimas décadas do século
XVIII, e durante todo o século XIX, a ascensão meteórica da burguesia, em função do
desenvolvimento do capitalismo e do advento da revolução industrial, aumentou a tal
ponto a pressão de seus interesses sobre o Estado, que sua própria estrutura passou a ser
questionada. O príncipe, antes aliado, e representante legítimo da nova ordem política
estabelecida com o Estado moderno, passa a ser visto como um déspota pela burguesia,
segundo Bobbio. Esta, no gozo do prestígio econômico que passava a desfrutar, se põe a
mobilizar estratos de camponeses e de trabalhadores filhos da revolução industrial, para
incitação de movimentos pela república – forma de governo em que os membros da
própria burguesia poderiam ascender ao comando do Estado.
Como aponta Bobbio:
‘O profundo enraizamento social dos indivíduos na sociedade civil, agora
plenamente organizada, faz com que (...) a própria ordem se finja pessoa e assuma para
20
Estes estratos referem-se à burguesia – aqueles que habitavam os burgos e não os feudos e que
encontravam na estrutura de castas e o maior obstáculo à sua própria afirmação.
21
BOBBIO, MATTEUCCI, PASQUINO, 2007, verbete: ‘Estado Moderno: 426.
si os elementos de legitimação do poder e de explicação dele que até então tocavam ao
príncipe (...). Isto se torna tanto mais plausível quanto mais são os próprios indivíduos
que detêm os instrumentos diretos de determinação de tal ordem, o que foi possível por
meio da conquista fatigante do poder de decisão, por parte da força hegemônica da
sociedade organizada: a burguesia”. (BOBBIO, N., MATTEUCCI, N., PASQUINO,
“Dicionário de Política, Verbete: ‘Estado Moderno)
Assim, o Estado moderno começa com o referencial teórico de Hobbes e Maquiavel,
nos séculos XVI e XVII, com a monarquia absolutista e incontestável, que marcou sua
inauguração; evoluiu para Locke, no final sec. XVII, onde encontra sua formulação
liberal inicial, com afirmação dos direitos civis22 e separação de poderes – executivo
exercido pelo monarca e legislativo com representação popular (burguesia), sendo este
preponderante em relação ao executivo, com poder de decisão sobre as ações a serem
executadas pelo monarca. Este pressuposto representava franca evolução em relação ao
modelo inicial de Estado de Hobbes e Maquiavel, para quem o Estado absoluto
representava a única forma de mautençao da odem e da estabilidade política, não
podendo haver contestação em relação às decisões e ao poder do príncipe. Em Locke, ao
final do século XVII, registra-se um novo momento do Estado Moderno, quando sua
finalidade específica deixa de ser eminentemente a promoção da segurança e da
proteção dos indivíduos contra si mesmos e passa a ser a promoção dos direitos
individuais civis, sua fonte de legitimidade.
No século XVIII, em Rousseau, o Estado recebe novas formulações. Para alcance do
bem estar individual e coletivo não era suficiente apenas a garantia de direitos civis pelo
Estado. Era necessário também que houvesse garantia de participação política a todos
os indivíduos sem execessão. Sem participar das decisões políticas os indivíduos não
podiam expressar suas opiniões e desejos, nem se podia chegar a algum consenso sobre
a ‘vontade geral’, ou o bem comum, que era diferente da soma das vontades individuais.
Os direitos políticos23 tinham que ser garantidos pelo Estado sob pena de apenas alguns,
os que tinham acesso ao poder, poderem influenciar as decisões e o fazerem em favor
próprio, em detrimento do bem coletivo. Rousseau rejeita todo o modelo de
representação política estabelecido no Estado Moderno, por alegar que seu
funcionamento beneficiava exclusivamente a burguesia, e propõe um modelo de
22
23
Direitos de 1ª geração.
Direitos de 2ª geração.
democracia direta, onde o Estado seria governado diretamente pelos próprios cidadãos
e, não por representantes, em esquema de rodízio de funções.
Embora essa formulação tenha sido assaz radical, ela representa um pensamento da
época: as formas de participação política e de difusão dos direitos políticos no Estado
Moderno passavam a ser fortemente questionadas a ponto de se propor sua extinção.
Stuart Mill, no sec. XIX, também propõe mudanças ao regime representativo e a
ampliação dos direitos políticos, embora não de forma tão radical como o fez Rousseau.
Não rejeita as instituições representativas, apenas propõe mudanças no acesso dos
indivíduos às mesmas, embora proponha também mecanismos de participação direta
dos cidadãos nas organizações decisórias do Estado (ver na seção seguinte). Inaugura a
militância intelectual pela inclusão dos trabalhadores nos espaços de representação
política e nas instâncias decisórias da administração pública, por meio de sorteios e
rodízios de funções. Defendia que não apenas a burguesia poderia representar os
interesses da sociedade como um todo.
Observava várias desigualdades sociais na sociedade de seu tempo que não
permitiam que todos os indivíduos pudessem exercer a escolha sobre seus destinos. A
falta de oprotunidades relegava os desfortunados à miséria. Para corrigir este problema,
Mill propunha agregação dos direitos sociais básicos24 dentre os direitos individuais
assegurados obrigatoriamente pelo Estado, entendendo ser este o responsável pela
provisão da igualdade de condições a todos os indivíduos, para que estes pudesses se
desenvolver de acordo com sua vontade. Os direitos sociais a serem tutelados pelo
Estado relacionavam-se às condições básicas de sobrevivência e desenvolvimento
humanos, saúde e educação, por exemplo, sem os quais, nenhum homem seria capaz de
traçar rumos com liberdade de escolha. Era essencial, ademais, que os trabalhadores
tivessem acesso ao poder político, para exporem suas carências e necessidades perante o
Estado, que até então possuía representação apenas da burguesia.
O resultado esperado com essas mudanças era a ampliação do bem-estar econômico
individual a mais amplos estratos sociais – circunscrito, na idade média ,à nobreza e ao
clero, e, na época de Stuart Mill, à burguesia. Seu diagnóstivo era que o Estado, tal
como posto, apresentava um falso caráter redistributivo, migrando apenas os privilégios
da nobreza para a burguesia, permanecendo, os trabalhadores, sem acesso à apropriação
da riqueza produzida coletivamente. As reformas propostas por Mill tinham a pretensão
24
Os Direitos de 3ª geração.
de permitir que os indivíduos excluídos do usufruto da riqueza produzida pela
sociedade, nos moldes do Estado Liberal excludente do século XIX, encontrassem, com
o apoio do Estado, em forma de políticas sociais, oportunidades para também se
apropriarem dos frutos do desenvolvimento econômico, pelo desenvolvimento das
próprias capacidades.
O mesmo diagnóstico, observado por outro teórico marcante do século XIX, que
influenciou todo o século XX, Marx, gerou conclusões totalmente diferentes sobre as
providências políticas a serem tomadas. Enquanto Mill propunha reformas da estrutura
do Estado, Marx e seus seguidores defendiam que a única solução para a correção da
desigualdade posta entre burguesia e trabalhadores seria a refundação da sociedade e
frimação de um novo ‘pacto social’, para fazer analogia às idéia de Rousseau. O Estado
Moderno já naseceu corrompido, defenderia os marxistas, sendoincompatível com os
propósitos de igualdade e justiça, por isso o autor propunha a substituíção do Estado
Moderno pelo Estado Socialista, comandado por uma ditadura dos trabalhadores, e
posteriormente pelo comunista, no qual os indivíduos fariam sua auto-gestão. Modelo
que se avaliarmos bem, não diverge muito da idéia de ‘sociedade civil’ de Rousseau,
estabeleciada com o verdadeiro ‘contrato social’.
5.4.1 O Estado de Bem-Estar Social (integra o tema 5 do Edital)
Mais tarde, já no século XX, os ‘revisionistas’ da obra de Marx, como ficaram
conhecidos, proporão um novo modelo de Estado, o Estado de Bem-Estar Social cuja
finalidade essencial será promover a redistribuição da riqueza nas sociedades
contemporâneas, porém sem a extinção da instituição Estado e do capitalismo, apenas
com a reforma de suas estruturas, nos moldes da proposta de Stuart Mill, com a adoção
de políticas sociais. Seja qual for o método, entretanto, a observação comum que se
pode fazer dos diferentes pensadores do Estado contemporâneo é que a participação do
maior número de indivíduos no usufruto do desenvolvimento econômico torna-se a
principal demanda da sociedade.
Tão marcante foi esse aspecto da sociedade contemporânea na primeira metade do
século XX, que o modelo de Estado de ‘Bem-Estar Social’, proposto pelo movimento
revisionista marxista – a social democracia, passou a ser adotado no mundo inteiro no
período pós 2ª Guerra Mundial, como o novo paradigma de Estado. Seus fundamentos
econômicos agregavam valores substantivos da economia keynesiana e, por isso, o
período marcado por sua proeminência no mundo (1945 - 1973) ficou conhecido como
o ‘consenso keynesiano’. Sua base essencial: intervenção do Estado na economia em
situações de falhas de mercado; manutenção constante de políticas de combate ao
desemprego e de concessões de benefícios sociais capazes de manter estáveis os níveis
de demanda agregada da sociedade por bens e serviços.
O objetivo desse novo arranjo do Estado era a promoção do desenvolvimento
econômico, com a manutenção do consumo das famílias sempre em níveis mais altos do
que apresentariam sem a intervenção do Estado, pois tenderiam a poupar parte maior de
sua renda em função de insegurança quanto à arrecadação futura. Tendo a segurança de
benefícios sociais concedidos pelo Estado, o nível de insegurança quanto à provisão
futura diminui e os indivíduos se sentem mais seguros para gastar maior parte da sua
renda em consumo, o que movimenta a economia como um todo e, em função do efeito
multiplicador de renda, gera seu desenvolvimento.
O resultado esperado era o aumento da redistribuição e da riqueza produzida em
uma sociedade, de modo geral, além da capacidade para evitar crises econômicas e o
esfacelamento do poder de compra e da qualidade de vida individual.
Percebe-se, portanto, que o fator essencial de legitimação do Estado foi se
complexificando com sua evolução. Inicialmente referia-se à proteção de todos contra
todos e foi abraçado pela forma de governo de um só, com poder absoluto concentrado
nas mãos do governante. Posteriormente referia-se à afirmação de direitos civis e foi
abraçado pela forma de governo nas mãos de poucos (aristocracia) – um monarca com
poder controlado por um parlamento, composto eminentemente pela burguesia a
sociedade civil organizada, segundo Bobbio. A partir do sec. XVIII, e especialmente
durante o XIX, entretanto, a promoção de direitos políticos e sociais passou também a
constituir a fonte de legitimação do Estado, creditada aos governos de muitos – as
democracias liberais.
As mais diversas formas de representação política são utilizadas para informar
constantemente à burocracia as necessidades e preferências do povo. Para cumprir com
tão complexo dever, os aparelhos do Estado contemporâneo necessitaram enfrentar um
longo e profundo processo de transformação de suas estruturas administrativas,
passando pela superação do patrimonialismo, das limitações impostas pelo ‘modelo
burocrático’ de administração pública, e pelo desenvolvimento de técnicas inovadoras
de gestão e de participação social, caracterizadoras da ‘Nova Gestão Pública’.
A seguir trataremos dos desafios impostos ao Estado contemporâneo.
6. Tema 5 – As crises do Estado contemporâneo. O Estado de Bem-estar social,
o Estado Regulador. Transformações do papel do Estado nas sociedades
contemporâneas e os direitos civis, políticos e sociais.
6.1. A Crise Estado de Bem-estar social
Como exposto na seção anterior, a era contemporânea assistiu à agregação dos
direitos políticos e sociais aos diretos individuais tuteladospelo Estado, que, em seu
início, incluiam apenas os direitos civis. No século XX concretizaram-se os movimentos
pelo sufrágio universal – até este momento o voto era essencialmente censitário e
masculino – e pela ampliação dos direitos sociais dos indivíduos, especialmente com a
implantação do Estado de Bem-estar social, explicado na seção anteior.
O ‘sucesso’ deste modelo de Estado foi tão grande munidalmente, que, durante
quase 20 anos no período pós-guerra, integrou o que se convencionou chamar de
‘consenso keynesiano’, uma onda de consenso internacional sobre os novos rumos do
Estado, em um sistema capitalista em desenvolvimento. Sua fórmula era composta,
segundo Abrúcio (1997)25, na dimensão social, pela produção de políticas sociais, nas
áreas de educação, saúde, habitação previdência e seguridade social; na dimensão
econômica, pela política econômica keynesiana, com intervenção estatal na economia,
procurando garantia do pleno emprego e atuação em setores considerados estratégicos
para o desenvolvimento nacional, com a correção de falhas de mercado; e, na dimensão
administrativa, pelo modelo burocrático weberiano, marcado pela impessoalidade,
neutralidade e a racionalidade do aparato governamental.
Esse modelo de atuação estatal permaneceu em vigência e desenvolvimento desde o
período pós guerra até a década de 1970, quando duas graves crises econômicas
afetaram o mundo inteiro em função do crescimento meteórico do preço do petróleo
internacionalmente, eventos que ficaram conhecidos os ‘choques internacionais do
petróleo’ (1973 e 1979). Um dos maiores efeitos da crise foi o desemprego e o
esgotamento de recursos para empréstimos internacionais. O problema era que o Estado
de Bem-Estar Social implantado mundialmente vinha sendo financiado em grande parte
com recursos de empréstimos internacionais.
Até o momento da crise, cria-se que o ‘aparelho de Estado’ podia ser usado para
acelerar a industrialização, modernizar a agricultura e fornercer a infra-estrutura
25
ABRUCIO, F. L. “O impacto do modelo gerencial na Administração Pública: Um breve estudo sobre a
experiência internacional recente”. Cadernos ENAP. No. 10. 55 p. Brasília: ENAP, 1997. Disponível em:
http://www.enap.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=1614
necessária à urbanização, além de manter densas política sociais. O Estado era visto
como solução ao desenvolvimento econômico, o que foi denominado por Evans e outros
de a ‘primeira onda desenolvimentista’ (Evans, 1993). Nas décadas subsequentes as
expectativas tomaram rumos opostos: o Estado torna-se o principal obstáculo ao
desenvolvimento. Passa a ser visto como o principal problema a ser enfrentado nos
esforços de ajuste econômico e a raiz essencial da estagnação e crises econômicas das
décadas de 70 e 80.
O Estado passa a ser enxergado como problema devido, em parte, a seu fracasso em
realizar as tarefas estabelecidas pela agenda anterior (promover industrialização, etc. );
e, principalmente, devido à necessidade de os países em desenvolvimento se ajustarem
às restições impostas pela conjuntura internacional do períodos que apresentava
decréscimo no crescimento do comércio mundial, expressiva elevação das taxas de
juros, e enxugamento dos empréstimos comerciais (Evans, 1993)26
O Estado de Bem-Estar, interventor, que atuava como agente econômico e adotava
medidas anticíclicas, para ‘temperar’ o desempenho da economia, passa a ser visto
como o vilão da crise, para muitos, como Milton Friedman e Hayeck, que o
consideravam um Estado caro, com uma estrutura administrativa inchada, pela
quantidade de serviços que assumiu para si; lenta e auto-referenciada, pela forma
burocrática de administração pública que assumia, com rígidos controles de processos.
O crescimento da economia não era capaz de retornar, ao Estado, em arrecadação fiscal,
o volume de recursos financeiros correspondente ao subisídio concedido, caracterizando
a situação de insolvência estatal, que, para continuar fornecendo os serviços que
oferecia, necessitava recorrer a sucessivos empréstimos.
Na situação de esgotamento do crédito esses Estados se viram estrangulados, sem
condições de manter seus serviços e estrutura. Ademais, para a crítica ‘neo-liberal’,
como ficou conhecida essa vertente, as políticas anticíclicas do Estado de Bem Estar
geravam inflação e se tornavam inócuas, no médio e no longo prazos, pois os agentes do
mercado se adaptariam ao crescimento da demanda por bens de consumo gerado por
elas, elevando seus preços na medida dos benefícios concedidos pelo Estado às famílias
consumidoras.
6.2. Transformações do papel do Estado – O Estado Regulador
26
EVANS, P. O Estado como problema e solução. Lua Nova, n.º 28/29, p. 107-156, 1993
Com as transformações do papel do Estado nas sociedades contemporâneas, o
modelo de administração pública burocrática sofre intenso processo de revisão. O
modelo burocrático weberiano se mostra limitado para tratar as crescentemente
complexas atribuições do Estado. A partir da década de 1980, em decorrência das crises
do Estado contemporâneo experimentadas internacionalmente, inicia-se um movimento
intelectual e político rumo a reformas administrativas e implantação do ‘Estado
gerencial’. Este novo modelo de Estado requer também um novo modelo de burocracia.
Sob essa perspectiva e sob a incapacidade de manter os mesmos serviços e estrutura
nos tempos de crise, países como os Estados Unidos e a Inglaterra adotam reformas de
ajuste fiscal, como ficaram conhecidas, implantadas respectivamente sob o comando de
Ronald Regan e de Margaret Tatcher, que propunham o modelo de Estado ‘gerencial’.
Emerge, desta crítica, o modelo de Estado que não atua diretamente no mercado; apenas
define as regras do jogo econômico e zela por seu cumprimento, preservação,
credibilidade, estabilidade e adequação, o que confere ao mercado confiança e
previsibilidade: o Estado Regulador.
O Estado, nessa perspectiva, não pode (não tem capacidade), e não deve, definir
sozinho, do alto de sua tecnocracia, que problemas sociais solucionar e como solucionálos para gerar desenvolvimento. O Estado não tem capacidade técnica, para
desempenhar funções tão complexas como a provisão de serviços de telecomunicações,
por exemplo. É um tipo de atividade super especializada, que envolve altos graus de
racionalidade e conhecimento técnico que o Estado, por ter que se concentrar em uma
série de outras funções, não tem capacidade de desenvolver. O resultado era a oferta de
serviços de má qualidade. Ademais, a burocracia estatal não deveria se envolver na
solução de problema complexos da sociedade de forma ‘top-down’, de ‘cima para
baixo’, era necessário participação social na solução de problemas coletivos.
O Estado deveria passar da condição de provedor de serviços à de regulador e
garantidor dos mesmos.
6.2.1. A Lógica do ‘Estado Mínimo’
Os advogados do Estado mínimo basearam-se essencialmente em princípios da
micro-economia para explicar o porque deve-se reduzir ao máximo o Estado.
A relação de troca entre ocupantes de cargos e seus apoiadores é a essência da ação
do Estado. Os primeiros precisam de suporte político para sobreviver e os últimos
devem receber incentivos suficientes para manter seu apoio e não desviá-lo a outros.
Ocupantes podem distribuir recursos diretamente a apoiadores (subsídios, empréstimos,
empregos, contratos e fornecimento de serviços), ou indiretamente, por sua autoridade
regulamentadora para criar benefícios (profit) a grupos privilegiados, como controle
sobre o câmbio, taxas de juros, restrições a entrada no mercado por cadastro de
produtores, tarifas sobre importações, por exemplo. Esta prática de busca de satisfação
de interesses individuais por meio da estrutura estatal foi denominada ‘rent-seeking’, ou
‘caça às rendas’.
Ocupantes podem também cobrar rendas para si próprios: a “competição pelo
ingresso no governo é, em parte, uma competição por rendas”(Evans, 1993)
Na economia altos retornos originados de atividades ‘lucrativas diretamente
improdutivas’ desestimulam o investimento em atividades produtivas. Era o caso dos
retornos empresariais obtidos a partir de subsídios do Estado, ou os retornos obtidos por
muitos indíviduos da sociedade empregados no Estado ineficiente. Esses retornos
eeclinam a eficiência e o dinamismo econômico. Para se minimizar os efeitos nocivos
da ação do Estado, sua esfera devia ser reduzida a um mínimo e o controle burocrático,
sempre que possível, substituído por mecanismos de mercado. O âmbito das funções do
Estado conversíveis ao mercado era variável, mas diversos instrumentos foram
pensados para incentivar privatistas a financiarem pelo menos parte das políticas
públicas. (Evans, 1993)
Essa concepção de fato capta aspecto significativo da maioria dos Estados
cotemporâneos e até dominante em muitos casos. A ‘orientação para a renda’, ou ‘rent
seeking’, conceituada em termos mais primários como ‘corrupção’, tem sido
característica marcante em Estados do então chamado ‘Terceiro Mundo’. Alguns
estados consomiam o excedente que extraiam e acabavam por incentivar atores privados
a se mudarem de atividades produtivas a improdutivas de ‘rent seeking’, fracassando em
fornecer bens coletivos – chamados ‘Estados predatórios’. (Idem)
Essa linha é considerada por Evans um aperfeiçoamento da concepção neo-clássica
tradicional, que entendia o Estado como arbítrio neutro. Recupera parcialmente alguns
pensamentos originais de Marx, sobre os vieses que caracterizam a política de Estado –
a instituição utilizada pelos poderosos (burguesia), para se perpetuarem como os
apropriadores da riqueza coletiva. Representa uma contribuição valiosa enquanto
explicação de um padrão de comportamento do ocupantes de cargos, que pode ou não
ser dominante em um Estado. Porém enquanto teoria aplicável genericamente a todos os
Estados é problemática.
6.2.2 A administração gerencial – o ‘gerencialismo puro’ - managerialism
A onda gerencial nasceu nos EUA, quando Woodrom Wilson escreveu seu célebre
artigo The study of administration, em 1887, defendendo a separação entre a política e a
administração. Permaneceu adormecida durante os períodos das guerras mundiais e o
consenso keynesiano e renasceu nos Estados Unidos a partir da década de 60, quando
difundiu-se também para países como Canadá e o Reino Unido, tomando vigor na
década de 70, com a crise econômica mundial. Sua difusão se deu em meio à
propagação das idéias ‘neo-liberais’, que surgiam em reação ao keynesianismo.
Sob inspiração da administração de empresas, propunha-se a reforma do Estado e a
readequação de suas estruturas e funções, com base no princípio da eficiência. Em sua
primeira fase – o ‘gerencialismo puro’ ou ‘managerialism’, seus fundamentos se
confundiam com os pilares neo-liberais; seus apelos eram pelo enxugamento do Estado
a níveis quase mínimos, o que incitou a formulação do conceito ‘Estado mínimo’.
Sob esse conceito, o desenvolvimento econômico seria consequência direta da
desregulamentação da economia. Quanto mais ‘livre’ estivesse o mercado de quaisquer
intervenções estatais no curso normal de suas atividades, maiores condições teria de se
desenvolver. É uma posição diametralmente oposta à do desenvolvimentismo de 1ª onda
de inspiração keynesiana. A esta vertente, Evans (1993) e outros atribuiram o apelido de
‘segunda onda’ de desenvolvimentismo, abraçada pelos governos Tatcher e Reagan, no
RU e nos EUA, respectivamente, e posteriormente por governos da America Latina e de
outros países em desenvolvimento, após o Consenso de Washington.
Na verdade, o movimento ‘neo-liberal’ como ficou conhecido o grupo da 2ª aonda
se apresentou como um posição teórica contrária ao keyneisianismo. Friedman,um de
seus principais agitadores desenvolveu uma teoria macroeconômica de bases
monetárias, para tentar demonstrar exatamente o contrário de Keynes: que a intervenção
do Estado na economia não modifica seus resultados no médio e no longo prazos.
Sob esse prisma teórico foi formulado o modelo ‘gerencial puro’, cujo objetivo
principal era o corte de atividades não típicas de Estado a seu cargo. Objetivava-se com
isso a economicidade, com a redução de gastos; a eficácia da ação estatal, com a
redução do rol de suas tarefas a somente aquelas que tinha realmente capacidade de
executar; e ganhos de eficiência, com a otimização de processos e o aumento de
produtividade. O resultado final esperado era a redução dos custos de manutenção da
administração e liberealização do mercado, principal objetivo dessa fase do
gerencialismo.
O managerialism seria utilizado no setor público para diminuir os gastos em uma era
de escassez e para aumentar a eficiência governamental. Em suma, o gerencialismo puro
tinha como eixo central o conceito de produtividade (POLLITT, 1990: 2)27. Não por
acaso um dos livros fundamentais àquela época chamava-se “Fazendo mais com
menos” (Doing more with less) — UKELES, 1982.
Nessa visão, muitas das funções desempenhadas até então pelo Estado deveriam
estar sendo executadas apenas pela sociedade. A estrutura do Estado deveria estar
preparada apenas para desempenhar as funções tipicamente estatais – que, no Estado
Mínimo restringem-se à segurança, diplomacia, administração da justiça, arrecadação
mínima de tributos e garantia de direitos de propriedade, tal como o Estado liberal de
Locke, por isso o termo ‘neo-liberal’. A provisão de bens para o mercado devia ser
deixada aos agentes de mercado e os serviços de interesse público, descentralizados ao
máximo aos agentes privados, que dispõem de maior capacidade de especialização para
sua oferta com qualidade que o Estado.
Entretanto, essa visão radical da administração subestimava o conteúdo político da
administração pública, resgistrariam estudiosos em momento de amadurecimento do
modelo gerencial. Em sua perspectiva inicial, o modelo gerencial era proposto como
uma tecnologia neutra destinada a modificar o funcionamento e a cultura do setor
público (GRAY & JENKINS, 1995: 81)28. Desta maneira, alguns gerencialistas mais
radicais afirmavam que não existe diferença conceitual entre a administração da
empresa privada e a administração pública (MURRAY, 1975)29. Outros aceitavam que
há determinadas diferenças entre ambas; contudo, propunham reformas ao setor público
como se ele fosse uma organização homogênea — a burocracia vista caricaturalmente.
O fato é que a administração pública se constitui num sistema organizacional em que,
internamente, há diferentes tarefas e valores pertencentes a um contexto complexo de
relações com a esfera política.
O objetivo ‘corte de gastos’, significava muitas vezes corte de tarefas postas ao
Estado pela própria sociedade. A reforma do aparelho de Estado não podia prescindir de
conquistas importantes da sociedade quanto aos serviços por ele ofertados,
especialmente na área social. O modelo ‘gerencial puro’, na verdade, tinha como base a
27
POLLITT, C. (1990), Managerialism and the public services — the angloamerican experience.
Oxford/Massachusetts: Basil Blackwell.
28
GRAY, A. & JENKINS, B. (1995), “From public administration to public management: ressessing a
revolution?”, Public Administration, vol 73, n.1.
29
MURRAY, M. (1975), “Comparing public and private management: an exploratory essay”. Public
Administrative Review, vol 34, n.4.
separação entre a política e a administração. Assim, caberia aos reformadores implantar
o managerialism na administração pública independentemente, do que ocorria no
âmbito político da sociedade. (ABRÚCIO, 1997: 18). Isto, porém, não se mostrou
possível. Segundo Abrúcio, nem os Estados Unidos nem o Reino Unido conseguiram
cortar parte considerável de seus gastos, especialmente aqueles vinculados à prestação
de serviços sociais. O governo de Tatcher ainda conseguiu maior êxito do que o
americano em cortar gastos com pessoal no governo central e em empresas estatais,
entretanto, nos governos locais e nos serviços sociais que ocupavam espaço vultuoso do
orçamento não foi possível a redução de gastos.
Um problema geral da aplicabilidade do modelo gerencial puro, mundialmente, era
que a maioria dos serviços ofertados pelo Estado não poderiam ser delegados à
sociedade, pois resultavam de conquistas e demandas históricas da sociedade em relação
ao Estado. Assim também o eram algumas empresas estatais, em alguns países, que não
poderiam ser radicalmente privatizadas, sob pena de discordância da opinião pública.
Não era possível a separação das decisões administrativas de questões políticas
altamente enraizadas na sociedade. Este foi o principal problema do modelo gerencial
puro, que passou a reformulações a partir da década de 80.
6.2.3 As transformações do modelo gerencial de Estado
Com o avanço do modelo gerencial, contudo, seus defensores passaram a considerar
que a lógica da eficiência e da economicidade não era suficiente para pautar a
administração pública, que ao fim das contas, presta serviços ao cidadão e não tem o
lucro como fim, diferentemente da administração de empresas privadas. Não bastava
eficácia na execução de um serviço e alcance de baixos custos na sua oferta. Era
também indispensável o alcance de efetifividade, a oferta de serviços de qualidade, que
realmente fizessem a diferença na vida dos cidadãos.
Abrúcio (1997:19) observa que, no princípio da década de 1980, passou-se ao
entendimento de que as reformas administrativas apoiadas em técnicas gerenciais não
servem apenas ao aumento per se do desempenho organizacional. As reformas devem
melhorar a performance do setor público de acordo com objetivos públicos, ou seja,
politicamente definidos (CAIDEN, 1991: 30). Os gerencialistas puros, por fim, não
consideraram que a especificidade do setor público dificulta a mensuração da eficiência
e a avaliação do desempenho tal qual ocorre na iniciativa privada. Na gestão pública,
estão em jogo valores como eqüidade e justiça que não podem ser medidos ou avaliados
por intermédio dos conceitos do managerialism puro (MAYORDOMO, 1990: 278280)30.
Essa “despolitização” da administração pública, aliada à ênfase no conceito de
eficiência governamental, fez com que Christopher Pollitt (1990), um dos maiores
críticos do modelo gerencial inglês, classificasse o managerialism como um
“neotaylorismo”, isto é, uma proposta calcada na busca da produtividade e na
implantação do modelo de gestão da empresa privada no setor público.
Pollitt reconhece, no entanto, que o modelo gerencial puro obteve alguns êxitos. O
principal deles é que a ênfase na questão financeira de fato elevou a consciência da
burocracia inglesa sobre os custos das políticas públicas (POLLITT, 1990: 85). Este
valor foi incorporado por todos os governos que têm realizado reformas administrativas
nos últimos anos.
Isso mostra que a busca da eficiência governamental, embora em si não resolva
todos os problemas da burocracia, é um legado positivo do modelo gerencial puro. Este
aspecto entre tanto não suficiente em si mesmo para garantir o bom funcionamento do
Estado; era necessária a adoção de formas de flexibilizição da programação de gastos e
de conceitos de promoção de serviços públicos voltados aos anseios dos cidadãosclientes/consumidores.
As críticas mais pertinentes feitas ao modelo gerencial puro na Grã-Bretanha
buscavam, segundo Abrúcio, não a volta ao modelo burocrático weberiano, mas sim a
correção do managerialism no sentido de incorporar novos significados. A ênfase na
flexibilidade da gestão foi uma das mudanças introduzidas. A estratégia da eficiência, se
levada às últimas conseqüências, pode petrificar a ação do gerente público, tal como
mostramos no item anterior. O caso do Orçamento público é paradigmático. O estrito
enfoque no controle orçamentário dificulta a adaptação a alterações que impliquem um
redirecionamento do gasto público. No limite, a ótica da eficiência acredita que há uma
solução racional única para os problemas orçamentários. No entanto, como bem
observam METCALFE e RICHARDS (1989: 303)31, “o orçamento público é um
problema contínuo sem uma solução permanente”.
30
MAYORDOMO, X. M. (1990), “Técnicas gerenciales y modernización de la Administração Pública en
España”, Documentación Administrativa, n.223, Madri.
31
METCALFE, L. & RICHARDS, S. (1989), La modernization de la gestion pública. Madri: INAP.
No caminho da flexibilização da gestão pública, também podemos citar a passagem
da lógica do planejamento para a lógica da estratégia (CROZIER, 1992: 93)32. Na
primeira, prevalece o conceito de plano, o qual estabelece, a partir de uma racionalidade
técnica, o melhor programa a ser cumprido. Já na lógica de estratégia, são levadas em
conta as relações entre os atores envolvidos em cada política, de modo a montar
cenários que permitam a flexibilidade necessária para eventuais alterações nos
programas governamentais.
A utilidade da lógica de estratégia vai além da confecção dos programas
governamentais. O contexto maior da reforma administrativa se beneficia igualmente do
conceito de estratégia, sobretudo porque a maioria dos Estados contemporâneos passa
por três grandes crises: a fiscal; a decisória, uma vez que o quadro institucional mais
atrapalha do que favorece a implementação de reformas; e, por fim, a de confiança, pois
a população desconfia, cada vez mais, dos governos e de suas políticas. É neste
ambiente que Michel Crozier propõe a utilização da estratégia, que não leva só em conta
os objetivos dos programas e das reformas propostas, mas principalmente requer um
acompanhamento das reações da sociedade e dos funcionários públicos frente às ações
do governo (CROZIER, idem: 93-94).
A busca da qualidade dos serviços públicos é outro conceito que o modelo gerencial
vem incorporando. Desde a metade da década de 80, o governo britânico vem se
utilizando do referencial da qualidade na avaliação de resultados das agências e dos
programas. Isto ocorreu, em primeiro lugar, por causa das críticas contra a ênfase dada
inicialmente à mensuração da eficiência e não da efetividade dos serviços públicos.
Neste sentido, Norman Flynn afirma que “a imposição arbitrária da diminuição dos
custos pode conduzir mais à redução do nível (de qualidade) dos serviços do que a um
aumento de produtividade” (FLYNN, 1990:113).
É neste ponto que o modelo gerencial traz à tona o aspecto público da administração
pública, sem no entanto abandonar o conceitual empresarial vinculado à eficiência e à
busca da qualidade dos serviços – nasce o consumerism.
6.2.3.1 o ‘Consumerism’
O ‘consumerism’ representa a segunda fase do Estado gerencial, focado na
satisfação do cidadão tal como se fosse o cliente atendido pela empresa privada. Este
modelo baseou-se nos programas de ‘qualidade total’que emergiam da administração de
32
CROZIER, M. (1992), Cómo reformar al Estado. Tres países, tres estrategias: Suecia, Japón y Estados
Unidos. Cidade do México: Fondo de Cultura Econômica.
empresas e se utilizava de técnicas de ‘competição adminstrada’ para a repartição de
recursos entre as diferentes agências governamentai prestadoras de serviços públicos.
O ‘cidadão-cliente’ avaliaria constantemente os serviços públicos oferecidos pelo
Estado, por meio dos instrumentos de avaliação desenvolvidos por funcionários
especializados, e a performance das diferentes agências governamentais influenciaria o
volume de recursos percebido pelas mesmas no exercício posterior. A intenção do
modelo era gerar estímulo às agências governamentais aumentarem sua eficiência e a
qualidade dos serviços ofertados. Entretanto, o mecanismo de competição
organizacional acabou por gerar efeitos de ‘seleção adversa’, que significa que apenas
as agências que já eram boas conseguiam ser bem avaliadas constantemente e assim
acabavam por receber maior volume de recursos, o que acarretaria um novo exercício
bem avaliado, com correspondente vultuoso volume de recursos e assim
sucessivamente.
Desse modo, ao final, as agências que haviam sido inicialmente mal avaliadas e
precisariam de maior volume de recursos para melhorar seus serviços, mas receberam
poucos recursos, por haver sido mal avaliadas, só iam de mal a pior de um exercício a
outro. Isto acarretava perpetuação do mal atendimento para algumas comunidades que
dependiam das agências mal avaliadas. Neste ciclo vicioso, a equidade ficava
prejudicada, pois apenas um grupo de cidadãos, aquele atendido pelas agências bem
avaliadas, teria acesso a bons serviços, podendo ocasionar migração da população
incialmente atendida pelas agências mal avaliadas para as bem avaliadas.
Esse movimento por sua vez, pode gerar o congestionamento das agências bem
avaliadas, a médio prazo, pelo execesso do contingente nos atendimentos, e causar
também a perda da qualidade. Enquanto isso, as unidades do serviço público que
tiveram inicialmente uma má avaliação, ficarão abandonadas e com uma subutilização
que por si só já resultará em desperdício de recursos públicos.
Outra crítica normalmente imputada ao modelo relacionava-se ao conceito de
consumidor de serviços públicos. Para vários autores, o conceito de consumidor deve
ser substituído pelo de cidadão. Isto porque o conceito de cidadão é mais amplo do que
o de cliente/ consumidor, uma vez que a cidadania implica direitos e deveres e não só
liberdade de escolher os serviços públicos (STEWART & WALSH, 1992: 507).
Na verdade, a cidadania está relacionada com o valor de accountability, que requer
uma participação ativa na escolha dos dirigentes, no momento da elaboração das
políticas e na avaliação dos serviços públicos. Desta forma, mecanismos de participação
social restritos à avaliação de serviços só enfatizam um aspecto da cidadania, o de
controlar as políticas públicas. O consumidor é, no mais das vezes, um cidadão passivo.
Ademais, O conceito de consumidor também não responde adequadamente ao
problema da eqüidade, valor fundamental na administração pública. A primeira
pergunta não respondida pelo consumerism é quem são os consumidores/clientes? Em
grande medida, são aqueles que se organizam para atuar onde os serviços são prestados
— o que, no limite, pode se constituir num grupo de interesse. Os que se organizarem
mais podem se tornar ‘mais consumidores do que os outros’. Assim, os consumidores
mais fortes podem se constituir em ‘clientes preferenciais do serviço público’.
Os burocratas, por sua vez, poderão fazer de tudo, inclusive atos discricionários,
para atender ao grupo organizado de consumidores, já que os funcionários públicos
dependem, no modelo consumerism, da avaliação dos clientes para obter avanço
profissional, melhoria de salários e até, em último caso, para manter o próprio emprego.
Para tentar introduzir os conceitos de accountability e eqüidade na prestação de
serviços públicos, alguns autores do gerencialismo criaram a variação ‘Public Service
Orientation’ (PSO), considerada a terceira e atual fase do modelo gerencial, que
encontra-se em constante processo de reformulação.
6.2.3.2 O ‘Public Service Orientation’ (PSO)
Surgida em meados da década de 1990, esta é a formulação mais avançada do
modelo gerencial de administração pública e está altamente ligada à reação teóricoacadêmica ao movimento ‘neo-liberal’ das décadas de 70 e 80, que introduziu o
gerencialismo puro como modelo de Estado. Evans (1993) denominou essa reação
teórica de a ‘terceira onda’ de desenvolvimentismo, a qual ‘surfamos’ no atual
momento.
6.2.3.2.1 A ‘Terceira Onda’ desenvolvimentista e o papel do Estado
contemporâneo na sociedade
As conclusões dos teóricos da ‘terceira onda’ partiram da observação da
performance de países em desenvolvimento, na década de 1990, e sua relação com a
implantação do pacote de ajustes proposto pelas reformas gerenciais receitadas
internacionalmente pelo FMI e o Banco Mundial, após o Consenso de Washington33 de
1989. O conteúdo das reformas era eminentemente ‘gerencial puro’ e incluía os
seguintes dez mandamentos: disciplina fiscal; redução dos gastos públicos; reforma
33
Para quem tiver interesse, ver na wikipedia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Consenso_de_Washington
tributária; juros de mercado; câmbio de mercado; abertura comercial; investimento
estrangeiro direto, com eliminação de restrições; privatização das estatais;
desregulamentação (afrouxamento das leis econômicas e trabalhistas) e direito à
propriedade intelectual.
A preocupação era basicamente uma só: redução de gastos e desregulamentação,
propunha-se ao mundo inteiro o modelo ‘gerencial puro’ de Estado, quando o modelo já
vinha sofrendo revisões e críticas internacionalmente. Assim, as perguntas postas pelos
teóricos da ‘terceira onda’ tinham o mesmo fundo das questões apresentadas pelos
revisores do modelo gerencial puro. Seria o ajuste, em si, suficiente para assegurar
crescimento futuro? Não haveria serviços prestados pelo estado que não deveriam ser
cortados, para o bem da economia?
Evans (1993) cita o paradoxo do ajuste, idéia de alguns autores da terceira onda, que
questionava como poderia ser o Estado (a raiz do problema para os reformistas
gerenciais) o agente populsor e executor de programas de ajuste. Para estes o Estado
permanece central ao processo de mudança estrutural da sociedade, mesmo quando
mudança ‘da vez’ é o ajuste estrutural.O reconhecimento da centralidade do Estado
inevitavelmente remete de novo a questões sobre a capacidade de ação do Estado.Não
somente capacidade de identificar políticas corretas, mas também da institucionalização
permanente de um conjunto complexo de mecanismos político-deciórios.
Até o ortodoxo Banco Mundial passa a considerar a possibilidade de problemas
enfrentados por Estados estarem concentrados em deficiências institucionais corrigíveis
apenas no longo prazo, não apenas em más políticas A resposta não estaria no
desmantelamento do Estado, mas sim em sua reconstrução.
Não bastaria, para teórico da 3ª onda, uma rede ‘eficiente’ de relações de
propriedade. A operação fluente da troca exige clima denso e profundamente
desenvolvido de confiança e entendimentos culturalmente partilhados – ‘elementos nãocontratuais do contrato’ (Durkheim). Mercados estão sempre inseridos em uma matriz
social que abrange entendimentos culturais e sistemas sociais compostos de laços
individuais polivalentes. Assim em certos casos o apoio às relações de troca pode ser
gerado por instituições formais, fornecidas pelo Estado.
Se os mercados devem estar envolvidos por outros tipos de estruturas sociais a fim
de funcionar, então as tentativas ‘neo-liberais’ de ‘liberar’ o mercado do Estado
poderiam terminar por destruir os apoios institucionais que possibilitavam o
funcionamento do mercado.Assim, não se tratava de estabelecer um ‘Estado mínimo,
mas sim um Estado adequadamente voltado à solução de problemas enfrentados pela
sociedade e pelo mercado.
Observando os países em desenvolvimento, os teóricos de ‘terceira onda’
perceberam que os bem sucedidos na promoção do desenvolvimento econômico foram
aqueles que não seguiram as prescrições gerenciais puras ao pé da letra. Países como
Coréia do Sul e Japão não ‘reduziram’ seus Estados, apenas profissionalizaram-no.
Investiram na valorização e no desenvolvimento técnico da burocracia Estatal, ao passo
que desenvolveram mecanismos poderosos de diálogo entre burocratas e agentes de
mercado, o que Evans qualificou como ‘autonomia inserida’.
No ritmo da ‘terceira onda’ desenvolvimentista, o modelo gerencial de
administração pública também se desenvolveu. Não se tratava de extinguir funções do
Estado, historicamente sob sua competência. Tratava-se de profissionalizar o Estado
para tal. Não se tratava de demitir funcionários pura e simplesmente e nem de rejeitar o
modelo de burocracia weberiana. Tratava-se, ao contrário, de reforçar parte de seus
pressupostos, como a admissão segundo rígidos critérios de mérito, existência de um
sistema estruturado e universal de remuneração, a concepção de carreiras, avaliação
sistemática e capacitação permanente; e de rever algumas de suas limitações à
capacidade de ação estatal, como o formalismo excessivo e controle de processos, que
deviam dar lugar a controles de resultados.
O problema identificado pelos estudiosos da 3ª onda, em países em
desenvolvimento, foi geralmente a ausência de uma burocracia profissional, nos moldes
weberianos, não seus excessos. Muitos desses países nunca sequer chegaram a instituir
a burocracia weberiana, muitos o conseguiram em apenas alguns setores do Estado,
restritos a alguns temas de políticas públicas. O que estava pesando para os maus
resultados do desempenho estatalo era justamente a parcela do aparelho Estado em a
burocracia não estava devidamente implantada, aonde normalmente se observava
marcantes traços de patrimonialismo e clientelismo.
Era necessário, portanto, antes de qualquer providência de reforma, identificar
dentro do aparelho do Estado aqueles setores em que o quadro de funcionários não
havia sido composto conforme os pressupostos da burocracia weberiana, para que se
fossem realizadas as devidas providências rumo à profissionalização. A demissão de
srvidores em massa e a simples extinção de serviços não resolveria o problema do
Estado.
6.2.3.2.2 Elementos do PSO
Em virtude das limitações do consumeirsm, em meados da década de 1990, e do
impacto da ‘terceira onda desenvolvimentista’, o modelo gerencial de Estado encontra
no PSO sua formulação mais ponderada entre o Estado de Bem-Estar Social e o Estado
Mínimo. O conceito de consumidor/cliente de políticas públicas é substituído pelo de
cidadão, sujeito de direitos e mais importante, sujeito de opinião política e demandas
que devem encontrar meios institucionais de serem capturadas. Assim, toda a reflexão
realizada pelos teóricos do PSO leva aos temas do republicanismo e da democracia.
Revendo o problema da eqüidade deixado pelo consumerism, o PSO é proposto sob
os conceitos de accountability, transparência, participação política eqüidade e justiça,
questões praticamente ausentes do debate sobre o modelo gerencial. Para tanto, é
preciso que no processo de aprendizado social na esfera pública se consiga criar uma
nova cultura cívica, que congregue políticos, funcionários e cidadãos. Os mecanismos
de particpação social e descentralização são essenciais nesse processo. Requer formas
flexíveis de gestão, com incentivos à criatividade individual e organizacional e maior
participação de agentes privados, ou de organizações da sociedade civil, no processo
decisório.
A gestão de políticas públicas e o controle da ação estatal passam a ser feitos por
instâncias com crescente participação social. Proliferam-se as instituições de consulta
pública (audiências, conselhos, etc) para validação de decisões governamentais.
Entidades privadas passam a dividir com organizações públicas a competência de
construção e execução de políticas públicas. Emergem as parcerias público-privadas e
organizações públicas não-estatais (Ex. OSCIPs, Sistema S)
Não basta apenas, ao Estado, gastar pouco (economicidade), fazer ‘mais com
menos’ (eficiência), conseguir executar tarefas a seu cargo (eficácia), com qualidade
suficiente para fazer efeito na vida dos cidadãos (efetividade), é necessário também que
haja equidade na provisão de serviços, de modo que os mais necessitados tenham
também maior atenção do Estado.
Fundamenta-se nos princípios da confiança e da descentralização de decisões e
funções, com redução dos níveis hierárquicos da administração e horizontalização de
estruturas A qualidade da gestão é medida pela capacidade de o Estado atender às
necessidades de seus cidadãos.
Assim, a estratégia volta-se para: (1) definição precisa dos objetivos a serem
atingidos pelo administrador público em sua unidade; (2) garantia de autonomia ao
administrador na gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros, à sua
disposição, para alcance dos objetivos contratados, e (3) controle a posteriori dos
resultados.
Outro conceito caro ao modelo gerencial, o de competição entre agências públicas, é
repensado pelo Public Service Orientation (PSO). Não que a competição seja negada
como princípio utilizável no setor público; mas o que é mais ressaltado pela PSO é a
possibilidade de cooperação entre as agências de modo a obter um melhor resultado
global na oferta de serviços públicos. Desta forma, o princípio da eqüidade,
fundamental dentro do PSO, pode ser garantido.
6.2.4 Principais tendências práticas do Modelo Gerencial – o que pegou?
Segundo Abrúcio (1997:38), os principais atributos das reformas gerenciais
implementadas a partir da década de 1980 incluíram:
a) incentivo à adoção de parcerias com o setor privado e com as organizações não
governamentais (ongs);
b) ampla introdução de mecanismos de avaliação de desempenho individual e de
resultados organizacionais, atrelados uns aos outros, e baseados em indicadores de
qualidade e produtividade;
c) maior autonomia às agências governamentais e, dentro delas, aos vários setores,
horizontalizando a estrutura hierárquica;
d) descentralização política, apoiada no princípio de que quanto mais perto estiver
do cidadão o poder de decisão com relação às políticas públicas, melhor será a
qualidade da prestação do serviço e, de fundamental importância, maior será o grau de
accountability. os governos também têm atuado no sentido de implantar políticas de
coordenação entre as várias esferas administrativas;
e) estabelecimento do conceito de planejamento estratégico, adequado às mudanças
no mundo contemporâneo e capaz de pensar, também, as políticas de médio e longo
prazo;
f) flexibilização das regras que regem a burocracia pública, principalmente o direito
administrativo: negociação coletiva, introdução de ganhos de produtividade e novos
critérios de promoção têm flexibilizado a administração de pessoal no setor público”
g) mesmo com a flexibilização da política de pessoal, a profissionalização do
servidor público continua sendo prioridade”; “políticas de motivação e desenvolvimento
têm também recebido grande atenção”, assim como questões relacionadas à etica;
h) desenvolvimento das habilidades gerenciais dos funcionários, em particular os de
nível médio e os do alto escalão burocrático. Neste sentido, os funcionários precisam
possuir uma grande versatilidade, atuando em vários funções. As principais funções são
a de administrador, vinculada à capacidade de trabalhar com os regulamentos rotineiros;
a de produtor, ligada ao aumento da produtividade com qualidade; a de inovador, capaz
de encontrar novas respostas e modernizar o fluxo de decisões; e a de integrador,
habilitado à congregar seu grupo a atuar em conjunto na busca de um objetivo.
A implantação dessas inovações nos Estados contemporâneos inspirou a formulação
do conceito ‘A Nova Gestão Pública’, denotando o novo modelo de funcionamento do
aparelho de Estado, cuja burocracia deixa de ser regida prioritariamente pelos princípios
de neutralidade e formalismo e passa a ser regida pelos 6 (seis) ‘E’s da Administração
Pública – eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, equidade e ética, conforme
observado por Abrúcio.
Essa nova orientação baseia-se na descentralização decisória e confere aos
‘empowerment’ aos burocratas, que são chamados também a tomar decisões, não
apenas implementar aquelas tomadas em âmbito político. Aliás, o âmbito político passa
a estar mais diluído nas mãos de agentes públicos nas diversas instâncias setoriais, em
razão da descentralização administrativa. A separação entre âmbito político e
burocrático fica mais fluida. O Poder político passa ser exercido de forma mais difusa,
ou seja, pela constelação de poderes de mais diversos atores protagonistas do processo
decisório, o que é típico da evolução de instituições democráticas.
7. Exercícios do Tema 1
1. (STN - Prova de 2000, ESAF, 49) - Max Weber, em sua clássica descrição dos três
tipos puros de dominação
legítima,
discorre sobre a dominação
burocrática,
elucidando suas principais características.
Assinale a opção que descreve corretamente a concepção weberiana de autoridade
burocrática.
a) Trata-se de um tipo de dominação que se baseia no estatuto, isto é, na lei, podendo
ser também chamada de dominação legal.
b) Trata-se de um tipo de dominação em que a obediência decorre do prestígio e
respeitabilidade conquistados por seus detentores.
c) Trata-se de um tipo de dominação em que o talento e o poder intelectual de seu
possuidor sobrepujam outros tipos de poderes.
d) Trata-se de um tipo de dominação ancorada na obediência à norma estatuída e na
autoridade tradicional.
e) Trata-se de um tipo de dominação comum em sociedades tradicionais, baseada no
estatuto jurídico.
2.
(STN, Prova de 2005, ESAF, 61)- Um dos componentes mais decisivos nas
relações situadas nas esferas da política e da administração é o poder. Sobre esse tema,
indique
qual(is)
item(ns)
abaixo
está(ão)
correto(s),
assinalando
a
opção
correspondente.
1 - O poder é um atributo possuído pelos homens, consistindo na posse dos meios para
satisfazer seus desejos e necessidades e na possibilidade de dispor livremente desses
meios.
2 - O poder é uma relação entre homens e entre estruturas organizacionais simples ou
complexas e compreende um ou mais sujeitos, um ou mais objetos e uma esfera de
atividades na qual esse poder se exerce.
3 - O poder institucionalizado, próprio das organizações, compreende um conjunto de
relações de comando e obediência objetivamente definidas, articuladas numa
pluralidade de funções hierarquizadas e estavelmente coordenadas entre si.
4 - A conflitualidade é inerente ao poder, mas depende igualmente do modo de exercer
o poder, do antagonismo das vontades, do ressentimento devido à desigualdade de
recursos e da cultura organizacional.
a) Somente o item 2 está correto.
b) Somente os itens 1 e 3 estão corretos.
c) Somente o item 4 está correto.
d) Somente os itens 2 e 3 estão corretos.
e) Somente os itens 3 e 4 estão corretos.
3. (EPPGG 2003/39) Entre as assertivas abaixo, sobre o fenômeno da dominação,
indique a única incorreta.
a) Dominação é o poder autoritário de comando do(s) governante(s), que se exerce
como se o(s) governado(s) tivesse(m) feito do conteúdo da ordem a máxima da sua
conduta por si mesma.
b) Nas sociedades modernas, onde a base da legitimidade é a lei, a administração
dispensa a dominação, no sentido de um poder de comando que precisa estar nas mãos
de um indivíduo ou de um grupo de indivíduos.
c) A dominação tradicional refere-se ao comando exercido por senhores que gozam de
autoridade pessoal em virtude do status herdado, e cujas ordens são legítimas tanto por
se conformarem aos costumes como por expressarem a arbitrariedade pessoal.
d) A dominação carismática ocorre quando o poder de comando é proveniente da crença
dos seguidores nos poderes extraordinários, mágicos ou heróicos de um chefe ou líder,
sendo as ordens deste estritamente fundadas na sua capacidade especial de julgamento.
e) A dominação legal ocorre quando os governados obedecem às normas legais e não às
pessoas que as formulam ou as implementam; e estas aplicam-se e são reconhecidas
como universais por todos os membros do grupo associado, inclusive o(s)
governante(s).
4.
(CGU/2008/3)
- Segundo Max Weber, um dos mais importantes conceitos
relacionados ao poder é o de legitimidade, que pode ser de três tipos, conforme as
crenças e atitudes em que se fundamenta. Examine os enunciados abaixo, sobre o poder
carismático, e assinale a opção correta.
1 - O poder carismático está fundado na dedicação pessoal e afetiva ao chefe
carismático.
2 - Quem verdadeiramente exerce o comando é o líder ou chefe carismático, cujo valor
exemplar, força heróica, poder de espírito ou de palavra o distinguem de modo especial.
3 - O poder carismático requer um corpo administrativo dotado de competência
específica, porém selecionado com base na dedicação pessoal e no carisma.
4 - A fonte do poder carismático se conecta com o que é novo, com o que nunca existiu,
e rejeita a rotina e os vínculos pré-determinados.
a) Todos os enunciados estão corretos.
b) Todos os enunciados estão incorretos.
c) Somente o enunciado de número 3 está incorreto.
d) Somente o enunciado de número 4 está incorreto.
e) Somente os enunciados 3 e 4 estão incorretos.
5. (EPPGG/2008/ESAF- 51)- Poder e dominação são alguns conceitos centrais da
Ciência Política. Analise os enunciados abaixo sobre tais conceitos e assinale a resposta
correta.
1. Todas as qualidades imagináveis de uma pessoa e todas as espécies de constelações
possíveis podem pôr alguém em condições de impor sua vontade, em uma dada
situação.
2. Dominação é a probabilidade de encontrar obediência a uma ordem de determinado
conteúdo entre determinadas pessoas indicáveis.
3. A situação de dominação está ligada à presença efetiva de alguém mandando
eficazmente em outros, mas não necessariamente à existência de um quadro
administrativo nem à de uma associação.
4. Uma associação de dominação política ocorre quando a sua subsistência e a vigência
de suas ordens, dentro de determinado território, estão garantidas de modo contínuo
mediante ameaça e aplicação de coação física por parte do seu quadro administrativo.
a) Todos os enunciados estão corretos.
b) Estão incorretos os enunciados 1 e 3.
c) Estão incorretos os enunciados 1, 3 e 4.
d) Somente o enunciado 1 está incorreto.
e) Todos os enunciados estão incorretos.
6. (EPPGG 2005/61). O uso do termo “Consenso” em relação a uma determinada
sociedade
significa afirmar que existe um acordo mínimo entre seus membros quanto a princípios,
a valores, a normas, a objetivos comuns e aos meios para os atingir. Indique qual das
afirmações abaixo está incorreta.
a) O Consenso favorece a cooperação e contribui para que a comunidade supere
situações adversas, tais como catástrofes e guerras
b) O Consenso torna dispensável o uso legítimo da violência pelo Estado em situações
controversas.
c) A existência de grupos étnicos, lingüísticos ou religiosos, portadores de cultura
própria dificulta mas não impede o estabelecimento de Consenso em uma comunidade
d) Transformações sócio-econômicas estruturais e inovações tecnológicas, que criam
necessidades e expectativas para os diversos segmentos sociais, acentuam os limites das
instituições e envolvem a possibilidade de afetar o Consenso pré-existente
e) Nos regimes autoritários, as divergências são mantidas na clandestinidade, levando o
observador a superestimar o Consenso em relação a valores e princípios
7. EPPGG 2009/31- O termo Política diz respeito ao funcionamento do Estado e ao
exercício do poder. Quanto à sua origem, está correto afirmar que:
a) foi criado por Maquiavel.
b) tem sua origem na Revolução Francesa.
c) deriva da palavra grega pólis.
d) surgiu com a formação dos partidos políticos.
e) resultou das disputas dinásticas na antiguidade.
8. EPPGG 2009/32 O monopólio do uso da força pelo Estado e seus agentes é uma
característica do poder político. Identifique o enunciado correto.
a) Somente em países onde existe uma constituição escrita o Estado tem legitimidade
para impor o monopólio do uso da força.
b) Todo grupo organizado e com uma liderança constituída tem legitimidade para usar a
força.
c) É preciso que exista um sistema legal para que a violência seja usada legitimamente
pelos agentes do Estado.
d) A legitimidade do monopólio da força exclui a dominação ideológica.
e) O Estado que abre mão de manter forças armadas deixa de ter o monopólio da força.
GABARITO
1- A
2- E
3- B
4- C
5- E
6- B
7- C
8- E
8. Exercícios do Temas 2
1 - (STN - Prova de 2000, ESAF, 57) - A proposta de Reforma de Estado no Brasil
sugere a mudança do papel do Estado, de forma que este teria de lidar com quatro
setores principais, a saber:
a) Núcleo Estratégico, Serviços Não-exclusivos, Atividades Exclusivas, Produção de
Bens e Serviços para o Mercado
b) Produção de Mercadorias exclusivamente pelo Estado, Produção de Serviços pelo
Mercado; Atividades Exclusivas, Núcleo Estratégico
c) Núcleo Estratégico; Atividades Exclusivas, Produção de Bens e Serviços para o
Estado; Serviços Exclusivos
d) Produção de Mercadorias exclusivamente pelo Estado, Serviços para o Mercado;
Atividades Exclusivas, Núcleo Estratégico
e) Núcleo Estratégico, Serviços Exclusivos, Atividades Exclusivas, Produção de Bens e
Serviços para o Mercado
2- (STN, Prova de 2005, ESAF,63) - Um dos mais notáveis aspectos no processo de
evolução do Estado são as estruturas institucionais que aos poucos se formaram e
passaram a caracterizar o aparelho do Estado nas democracias liberais modernas.
Assinale, entre as opções que se seguem, a única que não corresponde ao enunciado
acima.
a) Exercício do poder político segundo ordenamentos jurídicos que se impõem não
somente àqueles que prestam obediência, como os cidadãos, mas também àqueles que
mandam.
b) Formação de exércitos profissionais permanentes, subordinados ao chefe de
Estado,
cuja presença e potencial atuação é um dos elementos indispensáveis à
caracterização do monopólio do uso da violência.
c) Separação e independência dos Poderes que, não obstante, se fazem presentes uns na
órbita dos demais mediante as faculdades de estatuir e de impedir.
d) Formação do Estado Federativo, organizado segundo os princípios da
autonomia e da participação, cujas unidades se relacionam politicamente com a União
por meio da representação parlamentar.
e) Formação de burocracias públicas e separação entre a atividade política e a
administração pública, sendo esta última formalmente regida pelo critério do
conhecimento técnico e pela ética da obediência.
3. (EPPGG 2000/24) Assinale, nas proposições abaixo, aquela que não expressa
corretamente o pensamento de Max Weber.
a) No Estado moderno, a legitimidade do poder depende da sua legalidade.
b) O poder se apresenta como derivado de um ordenamento normativo constituído e
aceito e se exerce segundo normas preestabelecidas.
c) À grande dicotomia histórica entre sociedade natural e sociedade civil, Weber
interpõe a dicotomia entre poder legal e poder tradicional.
d) Weber não identifica o Direito como um ordenamento coercitivo, mas como uma
manifestação do poder tradicional (direito consuetudinário).
e) Para Weber, o Estado é uma associação política que ocupa determinado território e
reivindica o monopólio legítimo do uso da violência.
4. (EPPGG 2000/31) Entre os enunciados abaixo, assinale o único que não caracteriza
o Estado moderno.
a) A instauração de uma ordem social não mais baseada em estamentos
b) A delimitação de uma esfera rigidamente separada de relações sociais,
gerenciada exclusivamente de forma política
c) O desenvolvimento do conceito de cidadania, baseado na garantia de direitos e
liberdades individuais
d) A transformação do Estado em entidade monopolista na esfera política, que lida com
indivíduos e não mais com categorias sociais
e) A prevalência de uma articulação policêntrica, baseada no exercício pessoal do poder.
5. (EPPGG 2002/56) Indique qual das características abaixo não está relacionada
com o surgimento do Estado moderno.
a) Desenvolve-se uma autoridade central, exercida em âmbito nacional.
b) A aplicação da justiça e a extração de tributos transferem-se gradualmente da esfera
local para o poder central.
c) Formam-se exércitos profissionais permanentes, cuja lealdade se orienta estritamente
para o poder central.
d) Forma-se um corpo profissional encarregado da administração dos recursos do poder
central.
e) As políticas nacionais são caracterizadas pelo contínuo exercício da autoridade
central
e garantidas pela personalização e responsabilização da administração
governamental.
6. (EPPGG 2000/21) Uma das principais contribuições de Maquiavel ao pensamento
político foi:
a) Sugerir a idéia de um Príncipe moderno, ciente de seus poderes e de sua soberania.
b) A separação entre política e moral.
c) A idéia de soberania limitada, absoluta e arbitrária.
d) A separação entre Igreja e mercado.
e) A idéia de interesse estatal.
7. (EPPGG 2005/64) Sob a denominação “Contratualismo” abrigam-se diversas teorias
políticas que identificam um contrato tácito ou expresso como o fundamento do poder
político de uma dada sociedade. São contratualistas autores como Hobbes, Locke,
Rousseau
e Kant.
As
seguintes afirmações referem-se a características do
contratualismo:
1- Para os contratualistas, o momento do contrato corresponde ao momento
historicamente determinado em que a humanidade supera o estado de natureza.
2- Por entender que se trata de um contrato, os contratualistas admitem que se trata de
um arranjo que pode ser denunciado pelas partes envolvidas.
3- Tendo por fundamento a premissa do contrato, o contratualismo é essencialmente
democrático e incompatível com o absolutismo.
4- O contratualismo contemporâneo fundamenta-se na Teoria da Justiça, de John Rawls,
segundo o qual o monopólio da violência passa a ser exercido por uma Corte
Internacional de Justiça. Em relação às afirmativas acima, assinale a opção correta.
a) Estão todas corretas
b) Estão todas incorretas.
c) Apenas a nº 1 está correta
d) Apenas a nº 2 está correta
e) Apenas a nº 3 está correta
8 – (STN - Prova de 2000, ESAF, 54)- Assinale a opção que descreve corretamente
tanto o modelo burocrático como o modelo gerencial de administração pública,
implantado no Brasil na década de 30.
a) Visava profissionalizar o serviço público adotando o concurso público para ingresso
na carreira. Já o modelo gerencial da década de 90 buscava flexibilizar a isonomia do
funcionalismo público, adotando a demissão por falta grave, insuficiência de
desempenho e por excesso de quadros.
b) Pautava-se na racionalização dos processos administrativos nas áreas de material,
pessoal e orçamento. Já o modelo gerencial da década de 90 buscava a transferência de
atividades para autarquias e empresas estatais.
c) Visava combater o nepotismo herdado do modelo patrimonialista vigente no país. Já
o modelo gerencial da década de
90 buscava romper com centralismo e rigidez
hierárquica presente na burocracia.
d) Visava a qualidade dos serviços prestados pelo governo. Já o modelo gerencial da
década de 90 buscava a eficiência no uso do dinheiro público.
e) Pautava-se na descentralização e no rigor técnico dos procedimentos. Já o modelo
gerencial da década de 90 teve como princípios o controle de procedimentos e a
descentralização da decisão.
9. (EPPGG 2003/41) Uma das mais consolidadas matrizes de análise da constituição da
ordem política é a teoria contratualista. Examine as assertivas abaixo sobre o
contratualismo e indique a única incorreta.
a) Como regra, o contrato ou pacto social é um instrumento de emancipação política do
indivíduo, que altera essencialmente a estrutura social, além de estabelecer uma clara
distinção entre o governo e a sociedade civil.
b) O Estado nascido de um contrato não acrescenta nada à racionalidade e à
sociabilidade da sociedade civil, sendo um instrumento coativo cuja função é executar o
direito que a sociedade estabeleceu.
c) A maioria dos contratualistas concebe, entre o estado natural puro e o estado político,
um estado social, onde os homens convivem livremente segundo a razão.
d) A maioria dos contratualistas entende a constituição da ordem a partir de dois tipos
de contrato: o pacto de associação, que institui a comunidade política; e o pacto de
submissão, que instaura o monopólio do uso da força.
e) Enquanto relação entre as partes, o contrato estabelece sanções para os que o
violarem, sendo estas expressas por alguns autores, no que tange aos governantes, como
direito de resistência e deposição
10. (EPPGG 2000/31) Entre os enunciados abaixo, assinale o único que não caracteriza
o Estado moderno.
a) A instauração de uma ordem social não mais baseada em estamentos.
b) A delimitação de uma esfera rigidamente separada de relações sociais,
gerenciada exclusivamente de forma política.
c) O desenvolvimento do conceito de cidadania, baseado na garantia de direitos e
liberdades individuais.
d) A transformação do Estado em entidade monopolista na esfera política, que lida com
indivíduos e não mais com categorias sociais.
e) A prevalência de uma articulação “policêntrica”, baseada no exercício pessoal do
poder.
11. (ESAF-EPPGG 2002). No que se refere ao aparelho do Estado no surgimento das
democracias liberais, assinale o aspecto que Weber não menciona.
a) Modelo monocrático: um “chefe” exerce autoridade suprema sobre todo o quadro
administrativo, com base em um sistema de normas legais, cuja legitimidade é
reconhecida pela sociedade.
b) A obediência baseia-se numa ética profissional que, por definição, deve
assegurar a implementação fiel dos comandos recebidos das autoridades superiores.
c) A separação entre administração e política implica o isolamento dos funcionários
frente às influências externas capazes de interferir na execução de ordens.
d) O funcionário deve possuir os meios de administração, para dispor de
condições de independência profissional no exercício das suas funções.
e) As relações de parentesco são substituídas por critérios de mérito e expertise no
recrutamento dos funcionários, visando assegurar a impessoalidade no exercício da
função pública.
12. (EPPGG/2008/ESAF 52)- Embora não seja a única abordagem sobre a origem do
Estado moderno, o contratualismo tem destacada importância para a reflexão sobre a
ordem democrática. Examine os enunciados abaixo sobre essa corrente da ciência
política e marque a resposta correta.
1. Todos os contratualistas vêem no pacto um instrumento de emancipação do indivíduo
e de sua transformação de súdito em cidadão.
2. Todos os contratualistas apontam a obediência como elemento central para a
manutenção da ordem política, mas também reconhecem o direito de rebelião contra o
poder tirânico.
3. Do mesmo modo que consideram o contrato uma relação obrigatória entre as partes,
todos o contratualistas também indicam as sanções para quem o infringe.
4. Para os contratualistas, a constituição da ordem política não altera a estrutura social,
nem a racionalidade individual, nem a sociabilidade da sociedade civil.
a) Todos os enunciados estão corretos.
b) Somente o enunciado 4 está correto.
c) Somente o enunciado 1 está correto.
d) Somente o enunciado 2 está correto.
e) Estão corretos os enunciados 1, 3 e 4.
13. (EPPGG/2008/ESAF- 53) Um dos objetos de grande atenção do pensamento e da
teoria política moderna é a constituição da ordem política. Sobre essa temática, uma das
tradições de reflexão mais destacadas sustenta que a ordem tem origem contratual.
Todos os elementos abaixo são comuns a todos os pensadores da matriz contratualista
da ordem política, exceto:
a) o estado de natureza.
b) a existência de direitos previamente à ordem política.
c) a presença de sujeitos capazes de fazer escolhas racionais.
d) um pacto de associação.
e) um pacto de subordinação.
14. (EPPGG/2008/ESAF 61)- A formação do Estado moderno, entre os séculos XII/
XIII e XVIII/XIX, consistiu em um longo e complexo processo que levou à
normatização das relações de força por meio do exercício monopolístico do poder pelo
soberano. Todos os enunciados abaixo sobre a formação do Estado estão corretos,
exceto:
a) além do desenvolvimento do Estado territorial institucional, a formação do Estado
moderno envolveu a passagem do poder personificado do príncipe para o primado
dos esquemas universalistas e abstratos da norma jurídica, que mais tarde daria origem
ao Estado de Direito.
b) o processo de formação do Estado foi marcado pela tensão entre, de um lado, a
expropriação dos poderes privados locais; e, de outro, a necessidade do soberano de
recorrer às categorias ou camadas sociais para dispor de fundos para criar e manter seu
quadro administrativo e um exército permanente.
c) além da distinção entre o espaço público e o privado, a formação do Estado implicou
em substituir gradualmente a supremacia da dimensão individual do senhor feudal e do
príncipe pelo princípio das categorias sociais como núcleos da sociedade civil, novos
interlocutores do soberano.
d) a delimitação de um espaço das relações sociais, gerenciado de forma exclusivamente
política, tornou-se possível graças à conquista, pelo príncipe, do apoio da esfera
financeira à luta contra os privilégios, inclusive fiscais, da aristocracia.
e) a distinção entre o mundo espiritual e o mundano, sobre a qual se assentava o
primado da Igreja e de sua concepção universalista da república cristã, acabou por
fundamentar a supremacia da política.
15. (EPPGG/2008/ESAF 62) Os tipos primários de dominação tradicional são os casos
em que falta um quadro administrativo pessoal do senhor. Quando esse quadro
administrativo puramente pessoal do senhor surge, a dominação tradicional tende ao
patrimonialismo, a partir de cujas características formulou-se o modelo de
administração patrimonialista.
Examine os enunciados a seguir, sobre tal modelo de administração, e marque a
resposta correta.
1. O modelo de administração patrimonialista caracteriza-se pela ausência de salários ou
prebendas, vivendo os “servidores” em camaradagem com o senhor a partir de meios
obtidos de fontes mecânicas.
2. Entre as fontes de sustento dos “servidores” no modelo de administração
patrimonialista incluemse tanto a apropriação individual privada de bens e
oportunidades quanto a degeneração do direito a taxas não regulamentado.
3. O modelo caracteriza-se pela ausência de uma clara demarcação entre as esferas
pública e privada e entre política e administração; e pelo amplo espaço à arbitrariedade
material e vontade puramente pessoal do senhor.
4. Os “servidores” não possuem formação profissional especializada, mas, por serem
selecionados segundo critérios de dependência doméstica e pessoal, obedecem a formas
específicas de hierarquia patrimonial
a) Estão corretos os enunciados 2, 3 e 4.
b) Estão corretos os enunciados 1, 2 e 3.
c) Estão corretos somente os enunciados 2 e 3.
d) Estão corretos somente os enunciados 1 e 3.
e) Todos os enunciados estão corretos.
16. (EPPGG 2002/54). Assinale a única opção que não corresponde ao pensamento de
Max Weber.
a) Conjuntos complexos de causas variadas interagem competitivamente para produzir
os fenômenos sociais, o que exclui a possibilidade de determinação causal dos mesmos.
b) Existe na sociedade uma hierarquia de valores, ficando em segundo plano a política e
a cultura. Os políticos, por exemplo, agem movidos por valores éticos e pela
racionalidade instrumental com relação a fins últimos.
c) No protestantismo inscrevem-se valores que transformam a atitude mística,
substituindo-a por uma nova atitude, ascética e intramundana.
d) A revolução que chamamos de liberal ou capitalista se manifesta numa mudança
econômica, mas não se origina aí. Inicia-se por uma mudança nos espíritos, nas
consciências dos homens.
e) Os indivíduos podem agir conforme duas diferentes orientações racionais: a
racionalidade instrumental que se refere à adequação entre meios e fins e a
racionalidade com relação a valores, que antepõe os interesses ideais aos interesses
materiais
17. (EPPGG 2002/57). No que se refere ao aparelho do Estado no surgimento das
democracias liberais, assinale o aspecto que Weber não menciona.
a) Modelo monocrático: um “chefe” exerce autoridade suprema sobre todo o quadro
administrativo, com base em um sistema de normas legais, cuja legitimidade é
reconhecida pela sociedade.
b) A obediência baseia-se numa ética profissional que, por definição, deve assegurar a
implementação fiel dos comandos recebidos das autoridades superiores.
c) A separação entre administração e política implica o isolamento dos funcionários
frente às influências externas capazes de interferir na execução de ordens.
d) O funcionário deve possuir os meios de administração, para dispor de condições de
independência profissional no exercício das suas funções.
e) As relações de parentesco são substituídas por critérios de mérito e expertise no
recrutamento dos funcionários, visando assegurar a impessoalidade no exercício da
função pública.
18. EPPGG 2009/33. O surgimento do Estado Moderno foi acompanhado do
surgimento da noção de cidadania, que teve como condição um dos seguintes
fenômenos sociais:
a) o fim dos regimes despóticos.
b) a emergência da noção de indivíduo.
c) a abolição da escravidão.
d) a revolução industrial e surgimento do proletariado.
e) a escolha direta dos governos locais.
19. EPPGG 2009/34. Segundo o filósofo Norberto Bobbio, “A superioridade do
governo das leis sobre o governo dos homens é uma das grandes idéias que retornam
toda vez que é discutido
o problema dos limites do poder”. São características inerentes ao governo das leis...
O único enunciado incorreto é:
a) a lei distingue-se do comando pessoal do soberano por sua generalidade.
b) ao se estipular que a lei deve ser seguida também pelo governante impede que este
faça valer sua vontade pessoal.
c) a lei, por sua origem, não está submetida à evolução.
d) as leis podem ser derivadas da natureza, mediadas pela tradição ou pela sabedoria do
legislador.
e) as normas estão sujeitas a sofrer mudanças bruscas em decorrência do saber popular.
6. Exercícios Tópico 3
20. EPPGG 2000/21. Uma das principais contribuições de Maquiavel ao pensamento
político foi:
a) Sugerir a idéia de um Príncipe moderno, ciente de seus poderes e de sua soberania.
b) A separação entre política e moral..
c) A idéia de soberania limitada, absoluta e arbitrária.
d) A separação entre Igreja e mercado.
e) A idéia de interesse estatal.
21. EPPGG 2002/43. Todas as frases abaixo são partes integrantes e consistentes do
pensamento de Maquiavel, exceto:
a) A segurança do Estado é uma necessidade de tal importância que, diante dela,
quaisquer meios de ação tornam-se legítimos, mesmo aqueles que impliquem a violação
de normas jurídicas, morais, políticas ou econômicas, que seriam imperativas caso essa
necessidade não estivesse em risco.
b) Dentre os principados os hereditários são aqueles em que a estirpe do senhor teve
domínio por muito tempo; os outros são novos. Nesses últimos, o príncipe deve
conquistar sua legitimidade, fazendo-se amado; jamais deve tornar-se temido, pois o
medo alimenta a revolta dos súditos.
c) A audácia, que permite ao príncipe afrontar a fortuna, é o meio pelo qual muitas
vezes se conquista aquilo que não se obteria pelos procedimentos ordinários.
d) A primeira obrigação de um príncipe é preparar-se para a guerra. Porém, há duas
maneiras de combater: uma, segundo as leis; a outra, pela força.
e) Um príncipe, especialmente quando novo, nem sempre pode de boa mente observar
todas aquelas condições pelas quais se é considerado homem de bem, pois muitas vezes,
para manter os seus Estados é forçado a agir contra a sua palavra, contra a caridade ou
contra a humanidade.
22. EPPGG 2005/62. Maquiavel inicia “O Príncipe” com a seguinte afirmação: “Todos
os Estados, todos os governos que tiveram e têm autoridade sobre os homens foram e
são ou repúblicas ou principados. Os principados são: ou hereditários, quando seu
sangue senhorial é nobre há já longo tempo, ou novos. Os novos podem ser totalmente
novos, como foi Milão com Francisco Sforza, ou o são como membros acrescidos ao
Estado hereditário do príncipe que os adquire, como é o reino de Nápoles em relação
ao rei da Espanha.”
Indique qual das afirmações abaixo está correta.
a) O Termo “Estado” foi criado por Maquiavel.
b) O Estado surgiu com as repúblicas ou principados da Itália.
c) A originalidade de Maquiavel consiste em estabelecer prescrições sobre como o
detentor do poder deve exercer o poder.
d) O que se inicia com o uso que dá Maquiavel ao termo Estado é a reflexão sobre as
formações políticas surgidas da decomposição da sociedade medieval.
e) Maquiavel demonstrou, em Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio, que o
Estado surgiu em Roma ao tratar da História de Roma. licitação, prevista na Lei de
Licitações (nº 8.666/93), que foi acrescida mais recentemente.
23. EPPGG 2005/64. Sob a denominação “Contratualismo” abrigam-se diversas teorias
políticas que identificam um contrato tácito ou expresso como o fundamento do poder
político de uma dada sociedade. São contratualistas autores como Hobbes, Locke,
Rousseau e Kant. As seguintes afirmações referem-se a características do
contratualismo:
1- Para os contratualistas, o momento do contrato corresponde ao momento
historicamente determinado em que a humanidade supera o estado de natureza.
2- Por entender que se trata de um contrato, os contratualistas admitem que se trata de
um arranjo que pode ser denunciado pelas partes envolvidas.
3- Tendo por fundamento a premissa do contrato, o contratualismo é essencialmente
democrático e incompatível com o absolutismo.
4- O contratualismo contemporâneo fundamenta-se na Teoria da Justiça, de John Rawls,
segundo o qual o monopólio da violência passa a ser exercido por uma Corte
Internacional de Justiça. Em relação às afirmativas acima, assinale a opção correta.
a) Estão todas corretas.
b) Estão todas incorretas..
c) Apenas a nº 1 está correta.
d) Apenas a nº 2 está correta.
e) Apenas a nº 3 está correta.
24. EPPGG 2000/22. Para Rousseau, o estado de natureza seria dominado pela
a) razão, abundância e paz
b) paixão, discórdia e guerra
c) liberdade, sossego e ócio
d) lógica, ética e democracia
e) liberdade, consenso e paz
25. EPPGG 2002/41. Montesquieu é amplamente conhecido por seu livro clássico “O
Espírito das Leis”. Para este pensador, a verdadeira origem das leis deve ser buscada:
a) no costume
b) na natureza das coisas
c) na moral
d) na economia
e) nas instituições
26. EPPGG 2002/42. Acerca do pensamento de Locke, assinale a opção correta.
a) O poder político tem origem em Deus, por isso nada autoriza a rebelião dos homens
contra o Estado, seja qual for a justificativa da sua revolta.
b) No estado de natureza, ou na sociedade pré-estatal, reina a anarquia, a desordem, a
violência: há total liberdade e total terror.
c) O contrato que dá origem à comunidade política é feito por homens racionais, livres e
soberanos, e dá origem a um poder limitado, não arbitrário.
d) A liberdade consiste em que cada homem dependa da vontade dos outros homens
formando um contrato, que pode ser rompido por qualquer parte.
e) No estado de natureza, o encarregado de velar pelo cumprimento da lei é o Estado,
onde o governo é livremente eleito.
27. EPPGG 2002/44. Acerca do pensamento de Hobbes, assinale a opção correta.
a) O Estado foi instituído quando, a fim de viverem em paz uns com os outros e serem
protegidos dos agressores, todos os homens pactuaram, cada um com todos os outros,
que renunciariam ao uso privado da força, transferindo-o para uma pessoa artificial.
b) O pacto que institui a sociedade política baseia-se na crença acerca da soberania
popular, da qual derivam todos os direitos e faculdades do Estado, cabendo ao povo
soberano opção de seguir ou não as decisões deste.
c) No estado de natureza, caracterizado como um estado de guerra de todos contra
todos, os homens viviam em perfeita liberdade, podendo livremente se dedicar ao
comércio, às artes e à ciência.
d) Pelo pacto, o direito de representar a pessoa de todos é conferido ao soberano, cujos
atos e decisões são autorizados tal como se fossem praticados e tomados por cada um
dos homens, desde que não impliquem violação do direito à propriedade e aos frutos do
trabalho.
e) Os súditos podem libertar-se do pacto com o seu soberano. Assim, basta que um
indivíduo decida desfazer o pacto com o soberano para que esse deixe de existir.
28. EPPGG 2002/45. Focalizando o pensamento de Rousseau, assinale a única
assertiva incorreta.
a) Os males dos quais os homens sofrem não derivam da natureza humana, mas sim de
cursos errôneos de evolução da sociedade.
b) O homem que pensa é um animal degenerado; o homem natural era um ser préracional, um selvagem errante, dotado apenas de necessidades naturais e do sentimento
de compaixão.
c) Numa sociedade que tenha repudiado o contrato iníquo, constitui-se uma vontade – a
vontade geral – que pertence imediatamente à ordem cívica, posto que representa mais
que a soma das vontades particulares.
d) O contrato social é o único meio pelo qual os direitos se tornam possíveis,
repousando estes sobre o abandono por cada um de sua soberania, sua transferência para
o corpo da coletividade e sobre a recusa de submeter-se a uma outra pessoa.
e) Devido à necessidade de distinguir o ato pelo qual um povo faz a escolha de um
governo e o ato pelo qual ele se constitui em soberano é indispensável admitir a
existência do direito natural e do pacto de sujeição.
29. EPPGG 2002/47. No pensamento político do século XIX destaca-se Stuart Mill,
que distingue dois tipos de obrigações morais: as perfeitas e as imperfeitas. Indique a
relação correta entre tais obrigações morais e a justiça para Stuart Mill.
(Mill → obrigações morais prefeitas = são aquelas que enceram direitos de outros /
imperfeitas = derivam do que as pessoas esperam que o indivíduo faça)
(Kant→ obrigações morais perfeitas = dever e poder juntos)
a) As obrigações morais perfeitas não são exigíveis por meio da justiça, mas as
imperfeitas sim.
b) Ambas as obrigações morais perfeitas e as imperfeitas são exigíveis por meio da
justiça.
c) Nem as obrigações morais perfeitas nem as imperfeitas são exigíveis por meio da
justiça.
d) As obrigações morais perfeitas são exigíveis por meio da justiça, mas as imperfeitas
não.
e) Algumas obrigações morais imperfeitas são exigíveis por meio da justiça, mas as
perfeitas não.
30. EPPGG 2003/41. Uma das mais consolidadas matrizes de análise da constituição da
ordem política é a teoria contratualista. Examine as assertivas abaixo sobre o
contratualismo e indique a única incorreta.
a) Como regra, o contrato ou pacto social é um instrumento de emancipação política do
indivíduo, que altera essencialmente a estrutura social, além de estabelecer uma clara
distinção entre o governo (sociedade política) e a sociedade civil.
b) O Estado nascido de um contrato não acrescenta nada à racionalidade e à
sociabilidade da sociedade civil, sendo um instrumento coativo cuja função é executar
o direito que a sociedade estabeleceu..
c) A maioria dos contratualistas concebe, entre o estado natural puro e o estado político,
um estado social, onde os homens convivem livremente segundo a razão.
d) A maioria dos contratualistas entende a constituição da ordem a partir de dois tipos
de contrato: o pacto de associação, que institui a comunidade política; e o pacto de
submissão, que instaura o monopólio do uso da força.
e) Enquanto relação entre as partes, o contrato estabelece sanções para os que o
violarem, sendo estas expressas por alguns autores, no que tange aos governantes, como
direito de resistência e deposição.
31. EPPGG 2005/63. A primazia do público sobre o privado, como assinalam Bobbio e
outros autores, se manifestou, sobretudo no século XX, como reação à concepção liberal
do Estado e como derrota histórica, ainda que não definitiva, do “Estado Mínimo”. Em
relação às afirmativas abaixo, assinale a opção correta.
1- Essa primazia baseia-se na contraposição entre interesse coletivo e privado com a
necessária subordinação do segundo ao primeiro.
2- Essa primazia admite a eventual supressão do interesse privado em benefício do
interesse coletivo.
3- Essa primazia implica irredutibilidade do bem comum à soma dos bens individuais.
4- A primazia do público significa o aumento da intervenção estatal na regulação
coativa do comportamento dos indivíduos e dos grupos infra-estatais.
a) Estão todas corretas.
b) Estão todas incorretas.
c) Apenas a nº 1 está correta.
d) Apenas a nº 2 está correta.
e) Apenas a nº 3 está correta
Gabarito Temas 2 e 3
1–a
9–a
17 – d
25 – b
2–d
10 – e
18 – b
26 – c
3–d
11 – d
19 – c
27 – a
4–e
12 – b
20 – b
28 – e
5–e
13 – e
21 – b
29 – d
6–b
14 – c
22 – d
30 – a
7–b
15 – c
23 – b
31 – a
8–c
16 – b
24 – b
9. Exercícios Tema 4 e 5
32. EPPGG 2009/38 Ao identificar três tipos puros de dominação legítima, Max Weber
afirmou que o tipo mais puro de dominação legal é aquele que se exerce por meio de um
quadro administrativo burocrático. A seguir, são relacionadas algumas características da
administração burocrática weberiana. Identifique a opção falsa.
a) A totalidade dos integrantes do quadro administrativo é composta por funcionários
escolhidos de forma impessoal.
b) Existe uma hierarquia administrativa rigorosa.
c) A remuneração é em dinheiro, com salários fixos e em geral com direito a pensão.
d) As condições de trabalho são definidas mediante convenção coletiva entre os
funcionários e a administração.
e) Os funcionários estão submetidos a disciplina rigorosa e a vigilância administrativa.
33. EPPGG 2009/39. A maioria dos autores que analisaram os processos de reforma do
Estado o dividem em duas fases ou gerações. De um modo geral, a primeira geração
ocorreu na década de 1980 e início da década de 1990 e teve por objetivo reduzir o
Estado. A seguir, é apresentada uma série de medidas típicas das reformas do Estado
empreendidas por países latino-americanos como Brasil, Argentina e Chile. Aponte a
opção falsa.
a) Criação de bancos centrais.
b) Privatização de empresas estatais.
c) Diminuição da estrutura administrativa.
d) Redução do controle estatal sobre a atividade econômica (desregulação).
e) Ajuste fiscal no sentido de reduzir os gastos públicos.
34. EPPGG 2009/40 A maior parte dos países ocidentais enfrentou uma crise do Estado
nos anos 80 do século XX. Algumas características estiveram presentes tanto nos países
desenvolvidos quanto na América Latina. Outras foram características apenas dos países
latino-americanos. A seguir são relacionados alguns elementos dessa crise:
1. crise fiscal;
2. esgotamento dos efeitos internos do ciclo de expansão mundial posterior à II Guerra
Mundial;
3. esgotamento do modelo de industrialização por substituição de importações;
4. redemocratização;
5. crise da dívida externa.
Que elementos estiveram presentes em países latinoamericanos como Brasil, Argentina
e Peru?
a) Nenhum.
b) Apenas 1, 2 e 4.
c) Todos.
d) Apenas 3, 4 e 5.
e) Apenas 2 e 4.
35. EPPGG 2009/41 Estado de Bem-Estar (welfare state), conforme o Dicionário de
Política organizado por Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino,
pode ser definido como o “Estado que garante tipos mínimos de renda, alimentação,
saúde, habitação, educação, assegurados a todo cidadão, não como caridade, mas como
direito político”. Os enunciados a seguir se referem a essa questão:
1. há uma relação direta entre desenvolvimento econômico e os Estados de Bem-Estar
tal como se desenvolveram a partir da Segunda Guerra Mundial.
2. o Brasil se tornou um Estado de Bem-Estar ao inserir direitos sociais na Constituição
de 1988.
3 . regimes totalitários como o fascismo e o nazismo podem ser considerados de BemEstar porque em seu apogeu eliminaram a fome e o desemprego.
4. pode-se dizer que entre os indígenas brasileiros estão presentes as características do
Estado de Bem-Estar, porque todos os seus membros têm direito aos mesmos níveis de
alimentação, saúde e educação.
5. os processos de reforma do Estado, ao incluírem privatizações e reformas dos
sistemas de Previdência, acabaram com os Estados de Bem-Estar surgidos após a
Segunda Guerra Mundial.
Em relação aos enunciados acima:
a) nenhum está correto.
b) todos estão corretos.
c) apenas o 2 está correto.
d) apenas o 1 está correto.
e) apenas o 5 está correto.
Gabarito
32 – D
33 – A
34 – C
35 - D
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