A Amazônia na ficção de José Veríssimo e Inglês de Sousa Juliano Fabrício de Oliveira Maltez e Ricardo Souza de Carvalho Universidade de São Paulo – FFLCH [email protected] Resumo Nascidos em Óbidos, Pará, José Veríssimo (1857-1916) e Herculano Marcos Inglês de Sousa (1853-1918), em sua literatura com fortes marcas naturalistas, ofereceram diversas imagens da Amazônia, uma região pouco conhecida para as demais regiões brasileiras nas últimas décadas do século XIX. Na primeira etapa de análise foi possível investigar os primeiros romances de Inglês de Sousa, o qual tem um número maior de obras ficcionais, deixando para a segunda etapa a comparação efetiva entre as obras de José Veríssimo e Inglês de Sousa. Em Cenas da Vida do Amazonas de Inglês de Sousa apresentam três contos que retratam uma região ainda pouco divulgada nos centros políticos do Império Brasileiro, por meio de sua população, sua vegetação e seus problemas sociais. Como última análise, optamos pela comparação entre os livros de contos de ambos os autores que tratam de assuntos pertinentes às populações do baixo Amazonas, cidades ribeirinhas que estiveram em muitos momentos submetidos a uma política desfavorável, confabulada pelos centros políticos da capital do Império Brasileiro. Introdução O imaginário amazônico é muito extenso bem como a diversidade cultural que representa a Amazônia, que toca não somente as fronteiras brasileiras. Neste espaço, no qual as vias fluviais são predominantes, tivemos a influência desde as primeiras produções escritas de um imaginário que provém, por uma parte, da Idade Média e do obscurantismo inquisitorial, e, por outra, de conteúdos míticos que o Renascimento resgatava das fantasias da Antiguidades grego-latina. (PIZARRO, Ana. p. 68) Os principais mitos que foram difundidos destas raízes são as Amazonas, o Eldorado e Do Maligno, diz Ana Pizarro. Conforme o tempo colonial passava, os mitos propriamente indígenas e a cultura em geral dos índios eram submetidos hierarquicamente à cultura do colonizador. Textos passavam a figurar personagens do mundo indígena pelas mãos dos conquistadores. Os autores odidenses tratam em seus contos do imaginário amazônico de formas divergentes. O narrador de José Veríssimo procura desmentir o que acredita ser um apanhado de histórias que serve para ocultar um problema de ordem social na região. Ao contrário, Inglês de Sousa, ao adotar uma voz propriamente ribeirinha, dá vazão ao imaginário que circula nestas regiões. Objetivos O trabalho teve como objetivo comparar dois autores nascidos no baixo Amazonas que produziram uma literatura sobre a região. Aparentemente, classificados próximos à estética naturalista, tivemos a preocupação em verificar procedimentos desta estética nas obras de ambos os autores, para que pudéssemos encontrar convergências e divergências na descrição do imaginário amazônico. Materiais e Métodos A análise tomou como corpus os três primeiros romances de Inglês de Sousa: O Cacaulista (1876), História de um Pescador (1876) e Coronel Sangrado (1877) que retratam os costumes e conflitos da população ribeirinha nas mediações do baixo Amazonas, relacionando-os com textos críticos e de historiografia política e literária relacionados ao tema geral. O texto de Lúcia Miguel Pereira, Escritos da Maturidade (19441959) retoma os primeiros romances de Inglês de Sousa, se a História de um Pescador é frouxa e tateante, O Cacaulista e O Coronel Sangrado devem, sem favor, sobretudo o último, figurar na primeira linha das obras de ficção de sua época, e em boa colocação na nossa literatura de todos os tempos. (MIGUEL-PEREIRA, Lúcia. p. 65) Além disso, consideramos os livros de contos de Inglês de Sousa, Contos Amazônicos (1893), e de José Veríssimo, Cenas da Vida Amazônica (1886), este último cuja primeira publicação tinha como parte integrante um estudo sobre As populações indígenas e mestiças da Amazônia: sua Linguagem, suas crenças e seus costumes. Nossa pretensão também foi relacionar os textos ficcionais com textos críticos e de historiografia política e literária congruentes ao tema geral. O trabalho de Ana Pizarro, Amazônia: as vozes do rio: imaginário e modernização (2012), visita as figuras míticas que fazem parte da região amazônica em uma perspectiva mais ampla do espaço, ultrapassando os limites de fronteira dos países que compartilham de um mesmo imaginário: As “culturas da selva tropical”, como são conhecidas, compartilham formas de relação com o mundo. É o caso, por exemplo, de personagens tão vivos como o Curupira, o Boto, a Boiuba, a Cobra Grande, o Lobisomem, que são encontrados em várias línguas e em versões diferentes entre os diversos grupos, não apenas indígenas, mas também caboclos, afrodescendentes e outros. (PIZARRO, Ana. p. 26) O ensaio de Pizarro também oferece elementos para abordar os procedimentos do Naturalismo em José Veríssimo. Além disso, o prefácio de Amarílis Tupiassu à edição dos Contos amazônicos permitiu uma visão sobre a presença romântica na obra de Inglês de Sousa. Quanto à contextualização política do final do Segundo Império, foi fundamental para a pesquisa o livro O Norte Agrário e o Império do historiador Evaldo Cabral de Mello. Resultados Na primeira parte do projeto procuramos estudar três aspectos que configuram a Amazônia na ficção inicial de Inglês de Sousa: tipos humanos e suas respectivas características, confronto entre cidade e selva, e por fim, questões políticas. O enfoque deste trabalho foi tecer três fios que perpassam as obras do autor. Ao dar continuidade ao projeto estudamos os três aspectos que configuram a Amazônia na ficção de José Veríssimo e Inglês de Sousa e também analisamos a questão de como ambos os autores posicionam-se frente ao imaginário amazônico. Conclusões Os aspectos que procuramos analisar como a construção de personagens, o jogo entre cidade - civilidade em contraste com selva – barbárie e o sentimento de desprezo do Império Brasileiro para com as províncias do Norte estão presentes em ambas as obras, ainda que seja necessário ressaltar a visão politizada de Inglês de Sousa a respeito do fracasso da criação do novo estado com a independência sem conquistas sociais. A questão da abordagem do imaginário das populações do baixo Amazonas é que são distintas em ambos os autores. José Veríssimo tem um narrador que não declina da voz que projeta aquilo que pode ser, pela visão cientificista, a Amazônia de ontem e hoje; já Inglês de Sousa acaba permitindo na voz do homem ribeirinho o imaginário corrente naquelas comunidades. Referências Bibliográficas LEITE, Marcus Vinnicius Cavalcante, Cenas da vida amazônica: Ensaio sobre a narrativa de Inglês de Sousa. Belém: UNAMA, 2002. (tese de mestrado apresentado em 1998) MELLO, Evaldo Cabral de. O Norte Agrário e o Império: 1871-1889. Topbook. MIGUEL-PEREIRA, Lúcia. Escritos da Maturidade. Rio de Janeiro: Editora Graphia, 1994. PIZARRO, Ana. AMAZÔNIA: As vozes do rio: imaginário e modernização. Rômulo Monte Alto (trad.) Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012. SOUSA, Inglês. O Coronel Sangrado (Cenas da Vida do Amazonas). Belém: UFPA, 1968. ____. O Cacaulista (Cenas da Vida do Amazonas). Belém: UFPA, 2004. ____. História de um Pescador (Cenas da Vida do Amazonas). Belém: UFPA, 2007. ____. Contos Amazônicos. Belém: UFPA, 2005. ____. O Missionário. São Paulo: Martin Claret, 2010. TUPIASSU, Amarílis. Prefácio: Inglês de Sousa e a Consciência de ser Amazônico. Em SOUSA, Inglês. Contos Amazônicos. Belém: UFPA, 2005. ____. As populações indígenas e mestiças da Amazônia: sua linguagem, suas crenças e seus costumes. EM Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Período: 1876 a 1900, p. 299. (busca: 1887/tomo L – primeira parte). http://www.ihgb.org.br/rihgb.php .