5º Domingo da Quaresma Homilias Meditadas Lectio Divina para a Família Salesiana P. J. Rocha Monteiro, sdb [email protected] www.adma.salesianos.pt V Domingo do Tempo da Quaresma - 2016 - Ano C 1. Introdução Estamos a duas semanas da Páscoa. Somos peregrinos nesta terra. Caminhamos em direção à Páscoa eterna. As leituras deste domingo, a do profeta Isaías, a de Paulo e a de S. João, falam-nos de tempos novos, renovação e conversão. Relatam-nos um Deus apaixonado pelo homem. A meta é Jesus Ressuscitado. 2. Is 43,16-21 2.1 Texto O Senhor abriu, outrora, caminhos através do mar, veredas por entre as torrentes das águas. (…) Eis o que diz o Senhor: “Não vos lembreis mais dos acontecimentos passados, não presteis atenção às coisas antigas. Olhai: vou realizar uma coisa nova que já começa a aparecer; não a vedes? Vou abrir um caminho no deserto, fazer brotar rios na terra árida. Os animais selvagens – chacais e avestruzes – proclamarão a minha glória, porque farei brotar água no deserto, rios na terra árida, para matar a sede ao meu povo escolhido, o povo que formei para Mim e que proclamará os meus louvores». 2.2 Estamos diante dum texto fabuloso, fascinante mesmo O tempo do exílio na Babilónia está a terminar. É um profeta anónimo, o “Segundo Isaías” que nos escreve o livro da consolação (Is 40-55). O nosso texto está na primeira parte deste livro. O profeta passa do vazio duma vida passada na escravidão e na aridez do deserto para a criação e proclamação dum futuro novo, indizível, de liberdade e fidelidade. Do aparente esquecimento de Deus passa para a manifestação do Deus libertador. Uma nova fé na aliança atinge com beleza e proximidade o Deus transcendente. 3.Salmo 125 (126) 3.1 Grandes maravilhas fez por nós o Senhor O salmo nasce entre a dor do exílio e a esperança do regresso. Passará o inverno, virá a primavera, chegará o tempo da colheita. Tudo mudará. O salmo está envolvido numa súplica de confiança em Javé que não abandonará o seu povo. Quando o Senhor terminar a sua obra brotarão cantos de júbilo e de alegria. 4. Fl 3,8-14 4.1 Texto Irmãos: Considero todas as coisas como prejuízo, comparando-as com o bem supremo, que é conhecer Jesus Cristo, meu Senhor. Por Ele renunciei a todas as coisas e considerei tudo como lixo, para ganhar a Cristo e n’Ele me encontrar, não com a minha justiça que vem da Lei, mas com a que se recebe pela fé em Cristo, a justiça que vem de Deus e se funda na fé. Assim poderei conhecer Cristo. (…) 4. 2 O amor de Cristo como identidade do cristão Paulo está na prisão e recorda os seus amigos de Filipos com esta carta, cheia de ternura. Enfrenta os argumentos dos judaizantes, desmontando a fundamentação na observância da lei quanto à circuncisão e às práticas rituais. Tudo isto nada vale.Só uma vida interior de comunhão plena com Jesus, de doação aos irmãos, na fidelidade à fraternidade cristã é geradora duma vida nova. É fundamento da fé e comunhão com o mistério da ressurreição de Jesus. 5. Jo 8,1-11 5.1 Texto. (…) Os escribas e os fariseus apresentaram a Jesus uma mulher surpreendida em adultério, colocaramna no meio dos presentes e disseram a Jesus: «Mestre, esta mulher foi surpreendida em flagrante adultério. Na Lei, Moisés mandou-nos apedrejar tais mulheres. Tu que dizes?». Falavam assim para Lhe armarem uma cilada e terem pretexto para O acusar. Mas Jesus inclinou-Se e começou a escrever com o dedo no chão. Como persistiam em interrogá-l’O, ergueu-Se e disse-lhes: «Quem de entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra». Inclinou-Se novamente e continuou a escrever no chão. Eles, porém, quando ouviram tais palavras, foram saindo um após outro, a começar pelos mais velhos, e ficou só Jesus e a mulher, que estava no meio. Jesus ergueu-Se e disse-lhe: «Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?». Ela respondeu: «Ninguém, Senhor». Disse então Jesus: «Nem Eu te condeno. Vai e não tornes a pecar». 5.2. Um Deus que intercede pelo homem Olho para o cenário. Uma mulher arrastada é atirada para o chão. Está prestes a iniciar-se o suplício da lapidação. Escreve o grande teólogo Johann Baptist Metz: «O primeiro olhar de Jesus nunca se dirige para o pecado das pessoas, mas sempre para o sofrimento.» Todos baixam os olhos. É o momento do julgamento da lei. Uma pausa. Jesus escreve no chão. Depois levanta-se, interpela os perseguidores que se retiram em silêncio. Olha para a mulher e o seu olhar encontra o dela. Grande momento de consolação e de cura interior. Jesus volta a olhar. Já não estava ninguém. Só as pedras acusadoras jaziam frias e mudas na calçada. Chama-a de “mulher” como pouco tempo depois o fará com sua mãe no alto da cruz. Santo Agostinho diz luminosamente que só ficaram dois em cena: a miserável e a misericórdia! 6. Meditação Perdão que é amor. Quem estiver sem pecado atire a primeira pedra”. Expressão, simplicíssima e fabulosa que me fascina, como se o toque fatal estivesse para acontecer numa humanidade ferida. Abafa a vozearia, a chuva de razões para julgar. Campeia a solidão. Nasce o silêncio a toda a volta. A mulher, sozinha, ali no meio. O olhar do juiz e a balança não têm qualquer lugar naquela praça vazia e incómoda. Levanta-se Jesus. Com um simples gesto manda-a em paz. Jesus liberta-a não com a lei mas com o afeto, com o olhar, com a emoção. Todas as pedras se aninham num chão irrequieto que não as quer receber. Não pertencem a ninguém. Não são de ninguém. E a cena termina com um beijo de misericórdia: “Ninguém te condenou? Também eu não te condeno. Vai e doravante…” Exagero de amor. Festa do perdão. 7.Oração Noto, Senhor, que a Tua Palavra, neste domingo, mexe em mim. Convidasme a uma vida nova ao “abrires novos caminhos pelo deserto e ao fazeres passar rios pela terra árida para saciar o teu povo” (1ª Leitura). Não te reges pela Lei mas pela declaração de amor (2ª Leitura). Sem Ti as coisas aparecem-me vazias. A meio da Quaresma a vida cristã vai a caminho da cruz gloriosa, da Páscoa da Ressurreição. É uma humanidade ferida mas buscadora do amor. Leva-nos ao teu colo como nas pegadas da areia. 8. Contemplação 8.1 «Nem Eu te condeno. Vai e não tornes a pecar». Num mundo fragmentado com dificuldade em manter o seu ritmo quotidiano, o homem tem imensa dificuldade em encontrar a unificação do seu ser profundo. A vida é um caminho onde cada um tem o seu próprio ritmo, os seus ideais, os sonhos que deve seguir. A Páscoa não é só a festa da ressurreição do Senhor, mas é também a nossa ressurreição. A luz de Cristo é a manifestação do divino, plenitude de todas as coisas. A felicidade encontra-se nas palavras de vida eterna do Evangelho. 8.2 Poema O amor se faz perdão “Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou? Ninguém, Senhor” Jo 8, 10-11 Calçada em sobressalto Uma mulher Fugindo à morte Pedras ao alto Cortam o vento. Na estrada ardente Ruaça inclemente. Apareceu Jesus Precioso aroma nos ares Com Ele a primavera a cantar De amor perdão e luz: “Vai, não voltes a pecar”. Dorme em teus sonhos Parte em paz. Teus pecados medonhos Aqui jazem. És nova criatura Mulher pecadora, Rosa vermelha Sofredora. Voltarei à vida Açucena pura De brancura Imortal. Na minha barca da Páscoa Flutuarei. Sou tua verdade. Eu mesmo te levarei À eternidade. A bondade do coração humano Fala-lhe da bondade do coração de Deus Santa Teresa de Lisieux J. Rocha Monteiro in “Manhãs abertas”