Uma resposta agnóstica ao sentido da vida Susan Wolf (Excerto do artigo “Os sentidos das vidas” [2007]) Faz realmente sentido pensar que pode haver vidas significativas num mundo que não é significativo? À luz desta discussão, podemos ver como a resposta a essa pergunta pode ser "sim" apesar de se manter a ideia de que a semelhança de vocabulário das duas expressões não é uma mera coincidência. Se eu tiver razão quanto ao que está envolvido em ter uma vida significativa — isto é, se ter uma vida significativa é uma questão de uma entrega pelo menos parcialmente bem-sucedida a projetos de valor positivo — então pode-se ver que a possibilidade de ter vidas significativas apesar da ausência de um sentido abrangente para a vida depende do facto de as distinções de valor (isto é, de valor objetivo) não dependerem da existência de Deus ou de qualquer propósito abrangente para o género humano como um todo. Quer Deus exista quer não, o facto permanece: alguns objetos, atividades e ideias são melhores do que outras. Quer Deus exista quer não, algumas maneiras de viver valem mais a pena do que outras. Algumas atividades são uma perda de tempo. As pessoas são por vezes tentadas a pensar que se Deus não existe, então nada tem importância. São tentadas a pensar que se todos vamos morrer, acabando todos os traços da nossa existência por desaparecer de toda a consciência, não vale a pena fazer seja o que for; nada faz qualquer diferença. É evidente que Tolstói pensava por vezes isto, emprestando uma voz eloquente a tal perspetiva. Mas o raciocínio é ridículo. Se uma atividade vale a pena e outra é um desperdício, então temos razão para preferir a primeira, mesmo que não exista qualquer deus para nos olhar de cima aprovadoramente. Mais genericamente, parece que temos razão para nos entregarmos a projetos de valor, quer Deus exista e atribua propósito à vida quer não. […] Só se alguma sugestão como a minha estiver correta é que podemos dar sentido às intuições sobre o que é significativo para as quais chamei já a atenção. Segundo essas intuições, a diferença entre uma vida significativa e uma vida que não o é não é uma diferença entre uma vida que faz muito bem, e uma vida que faz pouco bem. (Nem é uma diferença entre uma vida que deixa marcas profundas e uma que, digamos, deixa apenas umas linhas.) Trata-se antes de uma diferença entre uma vida que faz o bem ou é boa ou realiza valor e uma vida que é essencialmente um desperdício. Segundo estas intuições, há um contraste tão nítido entre o Paspalho1 e uma vida dedicada ao cuidado de um só indivíduo necessitado, como há entre o Paspalho e alguém que consegue mudar o mundo para melhor em grande escala. Na verdade, pode haver um contraste igualmente nítido entre o Paspalho e o monge de uma ordem contemplativa cuja existência não confere qualquer benefício ou mudança na vida de qualquer outra pessoa. Tradução de Desidério Murcho Guião de leitura | Questões 1. De acordo com Susan Wolf, em que consiste ter uma vida com sentido (ou significativa)? 2. Explica a crítica que Susan Wolf faz a Tolstói. Achas que esta crítica se pode aplicar também a William Craig? Justifica. 3. «A vida tem sentido quer Deus exista e atribua propósito à vida quer não». Concordas? Porquê? 1 Para Susan Wolf, o Paspalho é a imagem de uma pessoa cuja vida é passada numa passividade vaga, que não tem conexões seja com quem for ou com o que for, uma vida que não vai a lado algum, e que nada alcança. Por exemplo, uma pessoa que passa dia após dia, ou noite após noite, frente à televisão, bebendo cerveja e vendo séries americanas.