Frente pioneira e comunidade tradicional em Narradores de Javé Camila dos Santos Paulo, Júlio César Suzuki Departamento de Geografia/FFLCH/USP seus membros. As pessoas se conhecem e Introdução Javé é uma pequena cidade que está à beira da dissolução devido à construção de barragens no rio próximo para o desenvolvimento de uma hidrelétrica. Os habitantes do povoado decidem então escrever as histórias passadas na cidade, as quais até então eram orais, como uma única saída para manutenção do povoado. A hidrelétrica representa a chegada de uma frente pioneira, do modo capitalista de produção, que acaba atingindo a comunidade de Javé, interferindo no modo de vida daquela população, ameaçando a existência das atividades econômicas, da cultura e da história do povoado. Objetivos O objetivo foi analisar o filme Narradores de Javé pela perspectiva da Geografia Agrária, utilizando-se das diversas temáticas que essa disciplina aborda, como a chegada da lógica capitalista à Javé, simbolizada pela hidrelétrica; as relações de compadrio e de vizinhança entre os habitantes; o conflito entre o erudito e o popular e a história oral como elemento de identidade da cidade. Metodologia A análise foi realizada com o intuito de relacionar os conteúdos e discussões da Geografia Agrária com a trama do filme por meio de um levantamento bibliográfico cuja discussão é o modo de vida das comunidades tradicionais (MARQUES,1994) e as consequências, para estas, da expansão das relações de produção capitalistas. Diversos recortes foram feitos no filme, com o sentido de compreender os liames finos que recuperam o significado da narração para os moradores de Javé em seu modo de vida tradicional. Resultados Percebe-se, no filme, a chegada do que MARTINS (1997) denomina de frente de expansão. Esta fora composta por pessoas que desbravaram a região e que começaram a desenvolver ali uma economia local. Posteriormente, a construção da hidrelétrica representa a chegada da frente pioneira, composta por elementos característicos da produção capitalista. É presente também, na pequena comunidade, a relação de proximidade e de ajuda mútua entre os conhecem também o passado e ancestralidade umas das outras, sendo então a relação de compadrio um dos elementos caracterizantes do povoado. Dentro desta perspectiva, percebe-se que o conhecimento dominante em Javé é o mítico, das crenças populares em detrimento do conhecimento científico. Na comunidade, é presente outro tempo e outras relações, distintas das relações travadas em uma sociedade totalmente inserida nos moldes capitalistas. O filme trabalha também com a identidade histórica daqueles moradores, sendo que a história oralmente passada de pai para filho é o que construía o sentimento de pertencimento daquele povo à terra. Não era apenas um pedaço de terra, era Javé, a mesma de seus pais e avós. Considerações finais O cinema mostra-se como uma importante ferramenta no sentido de trabalhar com realidades diversas, sendo capaz, portanto, de desenvolver temáticas da Geografia Agrária e de comunicá-las de modo significativo a públicos, que, muitas vezes, estão distantes dessa realidade. No filme em questão, a conclusão última é a de que a terra e as histórias orais eram o que definiam e identificavam Javé e os seus habitantes. Referências MARTINS, José de Souza. A reprodução do capital na frente pioneira e o renascimento da escravidão. In: Fronteira: a degradação do Outro nos confins do humano. S. Paulo: Hucitec, 1997. Cap.2, p. 79-112. MARQUES, Marta Inez M. O modo de vida camponês sertanejo e sua territorialidade no tempo das grandes fazendas e nos dias de hoje em Ribeira-PB. Dissertação (Mestrado em Geografia Humana) – FFLCH, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1994. Pesquisa realizada com apoio da PróReitoria de Graduação da Universidade de São Paulo, junto ao projeto “Geografia e Cinema”.