Cercosporiose ataca o milho A cercosporiose causa severas perdas para a cultura do milho. Veja aqui dicas de especialista sobre os sintomas, o ciclo da doença, o manejo e a resistência genética. A ocorrência recente de severas epidemias da cercosporiose (Cercospora zeae-maydis) na safra normal e na safrinha na região Sudoeste do estado de Goiás mobilizou todos segmentos ligados direta e indiretamente à cultura do milho no Brasil. A doença causou severas perdas na produção de milho naquela região tendo sido constatada posteriormente na região de Paracatú em Minas Gerais e em Dourados no Mato Grosso do Sul. Esta doença tem sido também uma das mais importantes na cultura do milho nos Estados Unidos da América (EUA) e em vários países da África. A doença foi identificada pela primeira vez em Illinois nos EUA em 1924 (Tehon & Daniels, 1925) e tem aumentado a sua incidência e severidade a partir dos anos 1970, nas principais áreas de produção de milho do país, causando perdas significativas à produção na parte Leste e na região do “cornbelt” daquele país, estando este aumento associado à monocultura e ao aumento na área de plantio direto que contribui para aumentar o potencial de inóculo, através da preservação de restos culturais infectados (Latterell & Rossi, 1983; Ayers et al., 1985). A doença já havia sido relatada no Brasil, Peru, Colômbia, Trinidad, Costa Rica, México e Venezuela (Chupp, 1953; Boothryoid, 1964; Latterell & Rossi, 1983) e é considerada uma doença de importância econômica (Coates & White, 1995). Na África a cercosporiose foi observada pela primeira vez na parte Sul, Central e Oeste no final dos anos 1980 e 1990. O patógeno disseminou-se rapidamente no continente africano estando presente em Camarões, Quênia, Malawi, Moçambique, Nigéria, África do Sul, Suazilândia, Tanzânia, Uganda, Zaire, Zâmbia, e Zimbabwe (Nowell,1997; Smit & Ward, 1997; Ward & Nowell, 1998). Na África o milho constitui-se no principal alimento para pequenos produtores, mineiros e para a população urbana. Há uma grande preocupação com perdas que podem ser causadas pela doença, considerando-se que a África consume mais de um quarto da produção de milho no mundo, o que pode contribuir para o aumento da fome e desnutrição naquele continente. A doença no Brasil No Brasil., há uma grande preocupação tanto por parte dos produtores, como por parte de fitopatologistas e melhoristas com potencial destrutivo desta doença e com as perdas que ela pode vir a causar à cultura do milho no país, que podem ser bem maiores do que as causados na última safra de milho no Centro-Oeste. Uma ampla discussão sobre estratégias de manejo a serem adotadas no momento e sobre prioridades de pesquisa que visem o desenvolvimento de um programa de manejo que permita controlar a doença de forma sustentável é de suma importância. Conheça os sintomas Lesões desenvolvidas da cercosporiose apresentam um formato retangular e são delimitadas, na largura, pelas nervuras principais da folha. Esta é uma característica que todas as lesões causadas pelo gênero Cercospora em hospedeiros da família das gramíneas. As lesões apresentam uma coloração marron, até que, sob condições de alta umidade relativa, há a formação de densa esporulação que dá às lesões a coloração acinzentada característica da doença. As lesões apresentam um desenvolvimento mais lento, quando comparadas àquelas produzidas por outros patógenos causadores de doenças foliares em milho, requerendo de 2 a 3 semanas para atingirem o seu total desenvolvimento. O período latente de C. zeae-maydis é longo, quando comparado ao de outros patógenos foliares do milho, podendo variar de 14 a 28 dias desde a infecção até a produção de esporos. Lesões plenamente desenvolvidas apresentam um comprimento de 1 a 6cm com 2 a 4 mm de largura, a qual é determinada pelo espaço entre nervuras. Se áreas adjacentes são infectadas, duas ou mais lesões isoladas podem coalescer dando a aparência de uma única grande lesão. As lesões mais jovens podem ser confundidas com lesões causadas por outros patógenos, mas apresentam um halo amarelado característico quando observadas através da luz. Dentro de um período de 2 a 3 semanas estas lesões se alongam formando estrias antes de atingirem a sua forma retangular característica. Uma característica das lesões da cercosporiose que a distinguem de outras doenças em milho é que as lesões são tipicamente paralelas às nervuras da folha. Lesões no colmo são comuns em lavouras severamente infectadas, através da bainha da folha. Quando as lesões cobrem a maior parte da área fotossintética, a perda de água resultante, determina a deterioração do colmo e o acamamento. Isto pode ocorrer quando a infecção por C. zeae-maydis ocorre muito cedo e há formação de lesões foliares Ciclo da doença Cercospora zeae-maydis infecta apenas o milho e não há relatos de que o patógeno seja transmitido pela semente, sendo um pobre competidor no solo que, na ausência do hospedeiro, sobrevive melhor em restos de cultura presentes na superfície do solo. Seguindo-se um período de alta umidade, o fungo produz conídios nos restos culturais os quais são disseminados pelo vento indo infectar novas plantas de milho, sendo as folhas inferiores os sítios primários de infecção. Sob condições ambientais favoráveis as lesões resultantes da infecção inicial produzem esporos que são transportados pelo vento ou por respingos de chuva para as folhas superiores. O patógeno tem um alto potencial de esporulação e o número de lesões pode aumentar rapidamente indo atingir as folhas mais jovens na parte superior da planta. Durante períodos de condições ambientais desfavoráveis o patógeno pode permanecer dormente e retornar rapidamente ao seu desenvolvimento tão logo as condições sejam novamente favoráveis. A taxa absoluta de aumento na severidade da cercosporiose em relação ao tempo é melhor descrita pelo modelo logístico em que a taxa absoluta de aumento da doença (dy/dt) é uma função de ry (1-x) ( 31, 43, 44). Assim a taxa de desenvolvimento da cercosporiose é determinada por três fatores que interagem no tempo e no espaço: 1.) a quantidade inicial de inóculo ou de doença, donde se conclui como é importante a sobrevivência do patógeno nos restos culturais, 2.) a taxa de reprodução do patógeno em um mesmo ciclo da cultura e 3.) A proporção de tecido sadio a ser infectado. Verifica-se claramente, por estes parâmetros, que o aumento na área de plantio direto ao contribuir para a sobrevivência do patógeno nos restos culturais sobre a superfície do solo, durante o período da ausência da cultura, contribui para o aumento na severidade da doença em uma mesma área. Normalmente os danos causados pela cercosporiose são pequenos quando a doença é introduzida pela primeira vez em uma determinada área. Contudo as perdas podem ser significativas mesmo no primeiro ano se a quantidade de restos culturais infectados transportada pelo vento de áreas vizinhas for muito grande e se as condições ambientais são altamente favoráveis ao desenvolvimento da doença. Ainda que as perdas na produção sejam pequenas no primeiro ano, os restos culturais infectados que permanecem na superfície do solo propiciam uma fonte de inóculo de grande importância para a produção de epidemias severas na cultura subsequente. Os componentes de produção mais afetados pela doença são: o número de grãos por espiga e o tamanho do grão. As oito ou nove folhas superiores da planta de milho contribuem com 75 a 90% dos nutrientes requeridos pela espiga durante o período de enchimento dos grãos (Allisson & Watson, 1966) Resistência genética A resistência genética é o meio mais eficiente de se manejar a cercosporiose. Contudo nenhum híbrido comercial atualmente disponível no mercado é totalmente resistente à doença. A obtenção de materiais geneticamente resistentes à cercosporiose tem sido difícil mesmo para os Estados Unidos onde se convive com a doença desde o início dos anos 1980. O mesmo ocorre em relação à África do Sul onde a doença foi constatada em 1990. A resistência a C. zeae-maydis é regulada por um pequeno número de loci quantitativos com 5 ou mais genes envolvidos, os quais são herdados de forma aditiva. Trabalhos realizados nos Estados Unidos da América e África do Sul, têm demonstrado que esta resistência apresenta uma alta estabilidade. A resistência oligogênica dominante, apesar de poder ser rapidamente incorporada em linhagens elites em programas de melhoramento através de retrocruzamentos, não tem apresentado uma grande estabilidade frente à população do patógeno. Nas América Central e na América do Sul o número de fontes de resistência à cercosporiose pode ser maior do aquele existente nos Estados Unidos devido à possibilidade de germoplasma material subtropical que tem um maior número de genótipos resistentes do que o germoplasma de clima temperado. Alguns destes germoplasmas poderão ter uma utilização imediata em híbridos, o que pode contribuir para, a médio prazo reduzir o impacto desta doença nos países tropicais como no caso do Brasil. Manejo da doença Informações sobre a epidemiologia do patógeno e os fatores que afetam o desenvolvimento da doença são importantes para que medidas de controle eficientes sejam aplicadas nos estádios mais vulneráveis do ciclo do patógeno e de desenvolvimento da doença. Um sistema de manejo integrado inclui todas as práticas que podem ser úteis no manejo de determinada doença através da prevenção e da redução da taxa de desenvolvimento da doença. Tais práticas podem incluir alternativas que contribuam para a redução da quantidade de inóculo inicial, como a rotação de culturas, ou para a redução da taxa de desenvolvimento da doença, como o uso de híbridos resistentes e aplicação de fungicidas. Para o manejo adequado da cercosporiose a curto prazo sugere-se a utilização da rotação de culturas com espécies como soja, sorgo, algodão, girassol, etc. Esta é uma prática de alta eficiência na redução da quantidade inicial de inóculo e relativamente fácil de ser implementada, considerando-se que o milho é o único hospedeiro de C. zeae-maydis. É também importante que o produtor diversifique a sua lavoura, plantando cultivares diferentes e, se possível, de empresas diferentes. Esta diversificação deve ser feita tanto no espaço, ou seja, em uma mesma área, quanto no tempo, ou seja, em épocas diferentes de plantio. Esta diversificação dificulta a adaptação do patógeno na medida em que o produtor estará utilizando genes de resistência diferentes. No que diz respeito ao plantio de cultivares resistentes, cabe a cada empresa produtora de sementes a indicação das cultivares com maior nível de resistência à doença e ao produtor, com base e sua experiência do ano anterior, cabe evitar o plantio daqueles híbridos reconhecidamente suscetíveis à doença. É importante frisar que estas práticas de manejo devem ser usadas de forma conjunta de acordo com as circunstâncias e condições de cada região. É pouco provável que práticas de manejo adotadas de forma isolada sejam eficientes no controle da doença. Carlos Roberto Casela, Embrapa Milho e Sorgo Fonte: Grupo Cultivar