Uma Imagem, Duas Cores, Três Dimensões: Registro e

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VI Seminário Latino-Americano de Geografia Física
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Universidade de Coimbra, Maio de 2010
Uma Imagem, Duas Cores, Três Dimensões: Registro e Visualização de
Imagens Georreferenciadas de Fachadas e Altares de Igrejas de Olinda
dos Séculos XVI a XIX.
Ludmilla Calado; Carlos Alberto B. Schuler.
Universidade Federal de Pernambuco – UFPE - Programa de Pós-Graduação em
Ciências Geodésicas e Tecnologias da Informação. Av. Acadêmico Hélio Ramos s/n,
Cidade Universitária - 50740-530. Recife, PE, Brasil.
[email protected]; [email protected]
Introdução
Segundo a tradição, o donatário português Duarte Coelho exclamou do alto de um
monte “Oh, Linda situação para uma vila” (FREYRE, 1968). Assim, o primeiro donatário
da Capitania de Pernambuco teria fundado, em 12 de março de 1537, a vila de Olinda,
sede oficial do governo (BARBOSA, 1983). Em 1630, a cidade foi tomada pelos
holandeses, tendo grande parte da vila devastada por um incêndio tendo apenas em
1654, com o retorno do domínio português, a sua recuperação.
O município de Olinda é considerado o berço da cultura brasileira abrigando
dezenas de igrejas, conventos e sobrados construídos desde o século XVII, período no
qual a cidade foi invadida pelos holandeses (BARBOSA, 1983). O traçado urbano local
foi configurado ainda no século XVI, recebendo uma forte influência religiosa
ocasionada pela chegada das ordens carmelitas, em 1580, jesuítas, em 1583,
franciscanos, em 1585, e beneditinos, em 1586. Em função disto, Olinda é privilegiada
pelo grande legado de bens patrimoniais, tendo recebido da UNESCO, em 1982, o
título de Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade e, em 2007, foi considerada a
primeira capital da cultura do Brasil.
O centro histórico de Olinda abriga centenas de edificações históricas,
remanescentes dos séculos em que holandeses e portugueses ainda disputavam suas
terras. Grande parte dessas edificações é formada por Igrejas, construídas ao longo
dos anos preservando um retrato da história da cidade, entretanto, com o passar do
tempo, estes templos passam por mudanças em suas características iniciais,
ocasionadas pela falta de monitoramento, conservação e preservação. Esta
problemática poder ser solucionada com intervenções em suas estruturas, porém
alterar edificações com mais de quatro séculos pode causar danos irreversíveis.
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Tema 5 - Geografia Física e Cultura: geopatrimónio e geoturismo
Seguindo neste contexto insere-se a fotogrametria, servindo de ferramenta para o
monitoramento das estruturas arquitetônicas dos bens patrimoniais. Com isto, é
possível o registro tridimensional dos objetos a serem analisados com uma visualização
e verificação das reais condições de uma edificação. O anaglifo insere-se neste
conjunto como uma técnica fotogramétrica que, através da observação
estereoscópica, permite a análise de objetos utilizando imagens tridimensionais.
Desta forma, o presente artigo tem como objetivo a exposição do projeto de
pesquisa, em elaboração, que tem como foco a utilização da técnica de observação,
por imagens anaglifo, de altares e fachadas de igrejas localizadas no município de
Olinda, Pernambuco. Somado a isto, o projeto também conta com a elaboração de um
Sistema de Informações Geográficas – SIG que armazenará, em um banco de dados
georreferenciados, as informações históricas e estéticas dos monumentos e as
imagens anaglifo dos altares e fachadas registradas.
EMBASAMENTO TEÓRICO
Fotogrametria
Derivada das palavras gregas photos (luz), grammas (algo desenhado ou escrito) e
metron (medir), a fotogrametria tem como significado a medição gráfica utilizando a
luz (TOMMASELLI et al, 1999). Para a American Society of Photogrammetry and
Remote Sensing, ASPRS, a fotogrametria é definida como “a arte, ciência e tecnologia
de obter informações confiáveis sobre objetos físicos e o meio ambiente através de
processos de registro, medições e interpretações das imagens fotográficas e padrões
de energia eletromagnética radiante e outros fenômenos” (ARAUJO, 2005).
Para Araujo (2005), a fotogrametria tem como alvo a reconstrução de espaço
tridimensional (espaço-objeto) a partir de imagens bidimensionais (espaço-imagem),
possuindo duas áreas distintas de atuação: a fotogrametria métrica e a fotogrametria
interpretativa. A primeira relaciona-se a medição precisa a partir da fotografia
determinando distâncias, ângulos, volumes, entre outros. Já a fotogrametria
interpretativa foca-se no reconhecimento e interpretação do espaço através de
análise.
Em função do posicionamento espacial da câmara e a finalidade, adotou-se na
fotogrametria uma classificação para os tipos de obtenção das fotografias, que são a
fotogrametria orbital, uma técnica que abrange os casos de fotografias ou imagens
extraterrestres onde a câmara pode ser fixada em um satélite artificial; a
fotogrametria aérea (aerofotogrametria), onde as fotografias do terreno são tomadas
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por uma câmara de precisão acoplada a uma aeronave; e a fotogrametria terrestre na
qual as fotografias são tomadas de uma posição fixa no terreno (TOMMASELLI et al,
1999).
A fotogrametria à curta distncia encaixa-se na Fotogrametria Terrestre com o
conceito da proximidade entre a câmara e o objeto a ser fotografado (TOMMASELLI et
al, 1999). Segundo Cooper & Robson (1996), esta técnica foca na reconstrução de
superfícies de objetos cuja distância entre ele e a câmara seja inferior a 100 metros. É
uma técnica que vem sendo aplicada em diversas áreas como arquitetura, controle
industrial, engenharia civil, artes plásticas e medicina (BRITO & COELHO, 2002).
Anaglifo
A estereoscopia, segundo Amorim (2000), trata de um fenômeno natural resultante
do emprego dos princípios da visão binocular à visualização de duas fotografias de um
mesmo objeto, obtidas de pontos de vista diferentes, fazendo com que cada imagem
seja vista com um olho, resultando na percepção de profundidade ou terceira
dimensão. Existem diversos métodos de obtenção da visão estereoscópica como o
estereoscópio de lente, o estereoscópio de reflexão, luz polarizada, cintilamento,
holografia, lenticular e anaglifo, sendo este último o método utilizado nesta pesquisa
(ARAUJO, 2005).
O anaglifo consiste no uso de filtros de cores complementares, usualmente
vermelho e azul ou verde, no par de fotografias estereoscópicas para separar as
projeções da esquerda e direita. Admite-se que o filtro azul ou verde é colocado sobre
a fonte de luz do projetor esquerdo simultaneamente ao uso do filtro vermelho no
projetor direito, o que permite que o operador, utilizando os óculos com lentes
vermelha e azul ou verde, observe a imagem projetada em terceira dimensão
(SCHULER & ARAUJO, 2005). (Ver Figura 1)
Figura 1: óculos para visualização da imagem anaglifo.
O uso deste método pode ser aplicado nas fotografias aéreas com foco no
planejamento e estudo de áreas ocupadas, e também nas fotografias terrestres a curta
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distância com o uso nas áreas de medicina, engenharia civil e arquitetura. Existem
grandes vantagens no uso desta técnica como o baixo custo de sua tecnologia e a
visualização e análise do material por várias pessoas ao mesmo tempo e em um
mesmo local (ARAUJO, 2005). A Figura 2 exemplifica esse tipo de imagem.
Figura 2 – Anaglifo feito de fachada de edificação. (Disperatti e Filho, 2005)
Sistemas de Informação Geográfica
O Sistema de Informações Geográficas – SIG aplica-se em sistemas de
gerenciamento de informações processando dados gráficos e não gráficos
(alfanuméricos) enfocando-se em análises espaciais e modelagens de superfícies
(SPRING, 2003). Segundo Thomé (1998), o SIG realiza o tratamento computacional de
dados geográficos com grande flexibilidade para aplicação nas mais diversas temáticas.
As três formas mais comuns de utilização do SIG são: “como ferramenta de produção
de mapas, suporte para análise espacial de fenômenos e banco de dados geográficos,
com funções de armazenamento e recuperação de informação espacial” (CÂMARA;
CASANOVA, 1996 apud THOMÉ, 1998).
O SIG pertence a uma área recente de crescimento apresentando diversas
definições próprias citadas por diversos pesquisadores desta área. Desta forma, todas
as acepções convergem para uma mesma linha baseada na integração das informações
espaciais multidisciplinares em um banco de dados único e na manipulação das
informações através de métodos matemáticos de análises possibilitando o acesso ao
conteúdo da base de dados geográficos. A pesquisa em questão tratará da utilização
desta ferramenta como meio de localização e divulgação das informações levantadas e
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analisadas, armazenadas em um banco de dados com estrutura adequada para este
tipo de aplicação.
Patrimônio
Sendo utilizado como objeto de análise deste artigo, o Patrimônio, termo originado
da palavra pater que significa pai ou paterno, representa os bens de herança que são
transmitidos aos filhos, contudo ao longo do tempo, este significado foi estendido aos
bens de determinados grupos social passados para gerações futuras como forma de
transmissão de conhecimentos (MURGUIA & YASSUDA, 2007). Segundo Santos (2001),
apenas no final do século XVIII que o patrimônio detém a idéia de um item comum a
um grupo social, definidor de sua identidade. Um importante grupo que se destaca é a
Igreja que, durante a Idade Média, possuía objetos de altíssimo valor material que
representavam a fé cristã. Muitos desses objetos formavam parte dos tesouros da
Igreja e outros eram passados de geração a geração como verdadeiras relíquias. Além
dos objetos, observa-se que os cultos, as vestimentas, as cerimônias, foram
preservados pela Igreja, mantendo-se, dessa forma, o patrimônio da tradição cristã
(MURGUIA & YASSUDA, 2007).
Só a partir da segunda década do século XIX que o valor artístico dos bens
patrimoniais passou a ser reconhecido com o critério de preservação. Segundo Choay
(2001 apud MURGUIA & YASSUDA, 2007), essa mudança ocorreu durante a
Revolução Francesa quando os bens da nobreza e clero foram confiscados tendo
diversos destinos; bens móveis em museus e bens imóveis receberiam nova utilização.
A partir disto, foi necessário que existissem regras quanto a administração destes
monumentos, o que originou a Comissão “dos monumentos” responsável pelo
tombamento e inventariado destes bens. Desta forma, os bens foram preservados em
locais protegidos, garantindo assim a sua conservação.
Outro ponto de grande importância para a história do patrimônio refere-se à carta
de Veneza, resultado de um evento ocorrido em maio de 1964, o Congresso
Internacional de Arquitetos e Técnicos do Monumento Histórico. Baseada na defesa da
grande relevância de preservação mundial, a Carta de Veneza estabeleceu princípios
que guiavam à preservação e restauração de monumentos históricos tendo cada país a
responsabilidade de administrar sua cultura e tradição.
Em território brasileiro, a história de defesa do patrimônio surge na Constituição de
1934 cabendo a União e os Estados a proteção das belezas naturais e monumentos de
valor histórico e artístico. Alguns anos após, o Decreto-Lei nº 25 de 30.11.1937
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oficializou o resguardo dos bens naturais sendo a primeira lei nacional de proteção ao
patrimônio no Brasil.
Seguindo esta linha, a fotogrametria se encaixa como ferramenta de análise,
contribuindo na pesquisa e identificação de bens patrimoniais além de colaborar na
utilização adequada e sustentável de cada monumento, possibilitando a interação dos
usuários com um registro preciso e especializado.
Trabalhos Similares
Ao realizar uma análise acerca de publicações foi percebido que ainda é bastante
pequena a produção de artigos relacionados ao uso da técnica fotogramétrica do
anaglifo aplicado a bens patrimoniais. Dentro do que foi encontrado, dois artigos
tiveram maior proximidade ao assunto abordado, sendo a publicação de Schuler et al
(2008) e Habeyche e Mendéz (2007).
Em seu artigo, Schuler et al. utilizaram, como área de análise, o Convento de São
Francisco, formado pelo complexo arquitetônico constituído pela Igreja de Nossa
Senhora das Neves, Capela de São Roque e o Cruzeiro, instalado no pátio, em frente ao
convento. Esse complexo está localizado no município de Olinda, PE, integrado ao Sítio
Histórico. Nesta pesquisa os autores tiveram como foco o registro de imagens
empregando a técnica fotogramétrica do anaglifo nos altares principal e lateral e no
Cruzeiro. Utilizando uma câmara fotográfica analógica, foram obtidos pares de
fotografias à curta distância, pancromáticas coloridas e, posteriormente, digitalizadas.
As tomadas entre as fotografias da esquerda e da direita foram feitas com uma
distância de 20 cm entre elas para conduzir a um adequado recobrimento
estereoscópico. Além disto, foi realizado o georreferenciamento do conjunto
arquitetônico com fins de localização geral da área de análise.
Os autores afirmam ter obtido como resultado a verificação da riqueza dos aspectos
visuais do material analisado, comprovando a eficácia do anaglifo como método no
registro de patrimônios históricos. As figuras 3 e 4 mostram os resultados obtidos.
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Figura 3 – Registro fotográfico do par estereoscópico do Convento de São Roque, Olinda / PE
(Schuler et al., 2008)
Figura 4 – Anaglifo do altar principal do Convento de São Roque – Olinda/PE, (Schuler et al.,
2008)
A pesquisa efetuada por Habeyche e Méndez (2007) utilizou, como área de análise,
um importante patrimônio histórico do Rio Grande do Sul, a Catedral de São Francisco
de Paula. Os autores também utilizaram a técnica fotogramétrica do anaglifo, mas com
aplicações e equipamentos diferenciados. Para a realização do trabalho, foram
utilizadas duas câmaras separadas por um pequeno suporte metálico que simulava a
distância dos dois olhos. No registro fotográfico panorâmico do local, foi realizada uma
seqüência de tomadas de pares estereoscópicos feitos com a câmara apoiada em um
tripé. Na Figura 5 é possível visualizar o equipamento e, nas Figuras 6 e 7 os resultados
obtidos.
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Figura 5- Equipamento utilizado por Habeyche e Méndez (2007).
Figura 6 – Conjunto de fotos utilizado no registro panorâmico de Habeyeche e Méndez (2007)
Figura 7 – Resultado do anaglifo realizado por Habeyeche e Méndez (2007)
O foco dado e alcançado nessa pesquisa foi a obtenção de fotografias
estereoscópicas panorâmicas de todo o salão da Catedral, observando a questão da
profundidade e, com isso, percebendo a melhoria na observação dos detalhes
arquitetônicos do local.
Analisando os artigos destacados, percebe-se que a técnica do anaglifo tem atingido
bons resultados na identificação dos elementos arquitetônicos dos bens patrimoniais,
evidenciando os seus aspectos tridimensionais com grande riqueza de detalhamento.
MATERIAIS E MÉTODOS
A presente pesquisa tem como metodologia o fluxograma apresentado abaixo:
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Figura 8 – Fluxograma da metodologia empregada.
Para que a metodologia seja empregada com eficácia, é importante que os
recursos tecnológicos de apoio estejam aptos a realização da pesquisa, sejam estes
equipamentos como câmara fotográfica digital, computadores, receptores GPS e
programas computacionais específicos para o tema abordado (ArcGIS, Adobe
Photoshop, Trackmaker, etc.).
CONCLUSÕES
Conforme foi levantado, a elaboração de pesquisas que utilizem a técnica
fotogramétrica do anaglifo associadas a bens patrimoniais ainda é muito pequena no
Brasil. Com este projeto, buscam-se realizar o registro e catalogação de parte do
patrimônio de Olinda, mais especificamente fachadas e altares de Igrejas localizadas
no Sítio Histórico da cidade.
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Como o projeto de pesquisa ainda encontra-se em desenvolvimento, é válido expor
as conclusões iniciais acerca do que foi levantando. Uma das principais observações
encontra-se na etapa de planejamento estratégico e levantamento de dados, onde se
evidencia que a busca por materiais disponíveis é bastante complicada devido à falta
e/ou inacessibilidade dos dados. Problemas como sistema de armazenamento e
controle dos materiais bibliográficos defasados ou inexistentes, má conservação,
descontrole e falta de atualização das documentações prejudicam a pesquisa de forma
intensa, pois serão dados de grande importância para o banco de dados
georreferenciados, parte fundamental do Sistema de Informações Geográficas.
A escolha das igrejas que comporão o projeto é outro ponto de grande importância,
tendo critérios para avaliação que seguem aspectos diferenciados como a observação
da disposição dos elementos que interferem no registro fotográfico, avaliação do
período no qual o monumento foi construído e o acervo histórico encontrado. A
seleção dos bens patrimoniais define todo o armazenamento de dados e
detalhamento da pesquisa, favorecendo o registro, aplicação da técnica do anaglifo e o
georreferenciamento das fachadas e altares.
A conexão entre os elementos obtidos é o ponto chave do projeto, pois por se
tratar de uma propriedade inovadora, a forma como as imagens serão apresentadas
contribuirá bastante para profissionais de áreas afins. Pretende-se que a exposição do
registro fotográfico com a técnica do anaglifo implantado aliado ao banco de dados
georreferenciado com as informações históricas e estéticas das fachadas e altares das
igrejas seja considerado uma documentação permanente acrescentando, desta forma,
informações digitalizadas atualizadas e de qualidade ao acervo literário existente.
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