AS REPRESENTAÇÕES MARIANAS NA CAPELA ARENA: ESTUDO SOBRE A DEVOÇÃO A MARIA NO MEDIEVO (APRESENTAÇÃO NO TEMPLO E LAMENTAÇÃO) Jacqueline Rodrigues Antonio (PROIC/UEL), Angelita Marques Visalli (Orientadora), e-mail: [email protected] Universidade Estadual de Londrina/Departamento de História/Londrina, PR. Ciências Humanas; História; História Antiga e Medieval Palavras-chave: Devoção Mariana, Giotto, Iconografia medieval Resumo: O objetivo deste é apresentar um estudo sobre as representações marianas da baixa Idade Média, em especial dos séculos XIII e XIV, período em que, particularmente, proliferaram. Para uma melhor compreensão sobre o assunto, foi dada a preferência para as obras de Giotto di Bondone (12671337), particularmente as que estão na Capela da Sagrada Virgem Maria da Caridade, mais conhecida como Capela Arena ou Capela Scrovegni, em Pádua. Giotto propôs outra visão sobre a arte medieval, tendo sido motivo de inspiração para artistas renascentistas. Este retratou aspectos da vida da mãe de Jesus baseando-se na literatura, seja ela da Antiguidade, como é o caso da Bíblia, ou medieval, apresentando uma narração sobre a origem humana de Jesus atrelada à divina. Introdução Este trabalho traz uma análise dos afrescos do pintor florentino Giotto di Bondone, situados na Capela Arena, que tratam de representações marianas. As obras selecionadas foram estas: A Anunciação a Ana, O Nascimento da Virgem, Apresentação da Virgem no Templo e Casamento da Virgem, que estão presentes em textos apócrifos; Anunciação a Virgem, Visitação a Isabel, O Nascimento de Jesus, Adoração dos Magos, Apresentação de Jesus no Templo, Fuga para o Egito, Bodas de Caná, Crucificação, Lamentação e Ascensão. Todos estes afrescos foram pintados entre 1302 e 1306 e seus temas estão presentes em textos canônicos. Maria foi retratada desde as comunidades primitivas cristãs. No século III temos uma representação mariana na catacumba de Santa Priscilla, em Roma, juntamente com os Magos, que vemos citados no evangelho Mateus, e Jesus. (Mt, 2,1-2) Na Capela da Sagrada Virgem Maria da Caridade, dedicada a Maria, encontramos um diferencial em relação às representações anteriores: vemo-las em diversas pinturas para serem vistas numa certa seqüência posta, contando uma história, revelando aos espectadores parte a parte da vida de Maria atrelada com a de Jesus. Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. O estudo de imagens na história exige mais que uma simples leitura do que é visto, sendo necessária análise da produção, nas quais são estudadas as condições sociais, políticas e econômicas da sociedade em que estas floresceram. Os traços de Giotto são marcantes e levam o espectador a se sentir como sujeito ativo da cena que observa. Isso permite que as consideremos como um protótipo da novela: cada quadro revela uma nova cena, em seqüência, formando uma narrativa. Estas ainda apresentam o imaginário daqueles que já tinham conhecimento sobre as histórias ali retratadas, seja através dos livros canônicos ou advindos da tradição e dos livros apócrifos. A representação da vida de Maria, mãe de Jesus, na Capela Arena, leva o espectador a se inteirar acerca dos eventos anteriores e posteriores ao nascimento de Jesus, afirmando a santidade da origem de Cristo, servindo como uma confirmação das fontes escritas cristãs. Materiais e métodos Como dissemos acima, fizemos uma análise de obras em que há representações de Maria, mãe de Jesus, situadas na Capela Arena, em Pádua. Percebemos que A apresentação da virgem no templo foi baseada numa cena de origem apócrifa, portanto uma fonte não-oficial, e Lamentação numa cena evangélica, portanto de uma fonte oficial. Ambas foram pintadas entre 1302/06, são afrescos, portanto, foram realizadas diretamente sobre a argamassa recém feita, em um só dia. Ambas possuem 200cm X 185cm. Neste presente trabalho, foram utilizados como métodos, os contidos em Peter Burke, Jean-Claude Schmitt e Michael Baxandall, com as análises de imagem proposta por Erwin Panofski. Os dois primeiros tratam do estudo de imagem pela história, as suas implicações, métodos e objetivos. Baxandall trata dos padrões de intenção dos quadros e Panofski fornece os métodos de iconografia, que são os estudos dos sentidos e significados das imagens. Resultados e Discussão A partir desses materiais e métodos, obtivemos algumas considerações. A Capela Arena, em sua confecção, já contava com uma intenção prévia: a dedicação da mesma a mãe de Jesus, Maria. O encomendador, no caso, Enrico Scrovegni, a construiu para se redimir do pecado de usura de seu pai, e também o seu. Este encomendou a Giotto as pinturas nas paredes e foi apresentado um histórico, considerado completo, deste a vida precedente de Jesus, em que localiza Maria, passando pela vida e Paixão de Jesus, e culminando no Juízo Final, tendo Jesus como juiz absoluto. Exatamente, no Juízo Final um elemento nos apresenta a intenção da imagem, a figura de Scrovegni oferecendo a Capela a Maria. Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. Figura 1 – Enrico degli Scrovegni apresenta à Virgem a Capela que fundou, 1302-1306. Detalhe do afresco Juízo Final. Na Apresentação da Virgem no Templo, Giotto mostra uma cena apócrifa, na qual reforça o aspecto de pureza e santidade da mãe de Jesus. Segundo o apócrifo Protoevangelho de Santiago, Maria tinha três anos quando foi mandada ao templo, mas ela não retornou a casa de seus pais, e ali permaneceu até o seu casamento com José. (Protoevangelho de Santiago, 7, 2) Figura 2 – A apresentação da Virgem no Templo, 1302-1306 A penúltima cena da Capela Arena que retrata Maria, Lamentação, é um tema que não se apresenta em referências diretas dos textos canônicos ou apócrifos, sendo oriundos possivelmente de uma tradição popular. Giotto deu um toque especial a este relato, que é a lamentação de sua mãe com Jesus em seu colo, cena que ficou conhecida como a Pietà. Não foi identificado, por esta pesquisa, este tipo de representação em nenhuma outra pintura anterior a Giotto, que posteriormente foi consagrada por artistas como Michelangelo. Figura 3 – Lamentação, 1302-1306 Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. Conclusões Este trabalho proporcionou uma compreensão a respeito do imaginário medieval acerca de Maria, mãe de Jesus. Percebemos o entrelaçamento do material literário na produção, de origem canônica e não-canônica, assim como de tradição oral. Nos afrescos da Capela Arena, Giotto faz uma narração sobre a origem humana de Jesus atrelada à divina, por espelhar na sua mãe o ideal de santidade. Essas representações em igrejas tornaram-se comuns, implicando numa relação mais íntima e familiar dos adeptos do cristianismo medieval com a Igreja e estão relacionadas à participação mais ativa dos leigos tanto como fiéis como promotores das imagens, como no caso de Enrico Scrovegni. Agradecimentos Agradeço pela concessão de bolsa por parte da UEL, a qual me auxiliou em meu trabalho, e também agradeço a minha orientadora, Angelita, por suas orientações que fundamentaram e direcionaram este presente trabalho. Referências Burke, Peter. Testemunha Ocular – História e Imagem. Bauru, SP: EDUSC, 2004. Carter, Joseph. Os Evangelhos Apócrifos. São Paulo:Editora Isis, 2003. Duby, Georges. O Tempo das Catedrais – a arte e a sociedade (980 – 1420). Lisboa: Editorial Estampa, 1978. Le Goff, Jacques. 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