Unidade 6 - Obstetrícia Distócia CAPÍTULO 8 DISTÓCIA 1. DEfINIçÕES Trabalho de Parto Normal (Eutócico): Segundo Friedman (década de 50, a velocidade de dilatação esperada para a mulher que entra na fase ativa do trabalho de parto (após alcançar 3,0 – 4,0 cm de dilatação) é: » Nulíparas 1,2 cm/h » Multíparas 1,5 cm/h A descida mínima na fase ativa é: » Nulíparas 1,0 cm/h » Multíparas 2,0 cm/h » Período expulsivo (segundo período): Normalmente dura em torno de 40 minutos nas primíparas e 20 minutos nas multíparas. Atualmente os limites devem ser estabelecidos individualmente. Se a paciente estiver devidamente monitorada, se aceita na nulípara o limite de duas horas (sem analgesia) e três horas (sob analgesia) e nas multíparas o limite de uma hora (sem analgesia) e duas horas (sob analgesia). Trabalho de parto distócico: É a não ocorrência destes fenômenos de dilatação e descida, nos parâmetros anteriormente estipulados. 2. CLASSIfICAçãO 1. Fase ativa prolongada: Caracteriza-se por velocidade da dilatação inferior a 1,0 cm/h no primeiro período do parto. 2. Parada secundária de dilatação: Dilatação cervical permanece a mesma em dois ou mais toques sucessivos (intervalo entre os toques de duas horas ou mais). 561 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand 3. Parto precipitado: Caracteriza-se pela curva de dilatação muito rápida e excessivo padrão de contrações. 4. Período expulsivo prolongado: Quando a descida da apresentação acontece de maneira muito lenta. 5. Parada secundária da descida: Caracteriza-se pela ausência de descida da apresentação em dois toques sucessivos com intervalo de 1 hora. 3. CAUSAS » Alterações da Contratilidade (distócia de motor ou funcional): • Oligossistolia • Polissistolia • Segmento inferior hipertônico • Esforço muscular expulsivo deiciente (prensa abdominal insuiciente) » Alterações Fetais (distócia fetal): • Distócia de apresentação (occipito-posteriores persistentes, antero-posteriores altas, cabeça alta e móvel, occipito transversa baixa, apresentação pélvica, apresentação córmica e delexões de primeiro, segundo e terceiro graus) • Distócia de volume (macrossomia fetal) • Distócias de cordão (brevidade, nó verdadeiro, circular, procúbito, prolapso e inserção velamentosa) » Alterações Pélvicas: • Distócias ósseas: Vícios de estreito superior, médio e inferior • Distócias de partes moles: Edema de colo, estenoses cervicais por cirurgias prévias, câncer de colo uterino, miomas cervicais ou vaginais, cistos vaginais e condilomas volumosos » Termos Correlatos: • Parada de progressão (2-4h de franco trabalho de parto, sem mudanças na dilatação ou 1h de franco trabalho de parto sem descida) 562 Unidade 6 - Obstetrícia Distócia de Ombro • Desproporção céfalo-pélvica • Desordens de demora ou de parada (boletim ACOG, 1995) A importância da distócia é evidente por ser a causa de indicação de primeira cesárea em mais de 50% dos casos. fATORES fAvORECEDORES DE DISTóCIA: 1. Diagnóstico Incorreto do Trabalho de Parto Deve-se prestar especial atenção ao internamento das pacientes primíparas. Só devem ser internadas em fase ativa do TPa, ou seja: dilatação cervical mínima 3,0 – 4,0 cm; apagamento cervical avançado e franca atividade uterina. 2. Admissão Hospitalar Precoce Evitar o internamento de pacientes com dilatação cervical menor que 3,0 cm. Este grupo de mulheres irá receber mais ocitócitos, analgésicos e peridurais com consequente aumento de distócia e iatrogenia (categoria B). 3. Restrição ao Leito A limitação da mobilidade da parturiente torna o trabalho de parto mais lento. A deambulação e posição vertical encurtam o trabalho de parto, sendo medidas tão efetivas quanto o uso de ocitócitos (categoria B). 4. Monitorização Eletrônica Fetal Contínua Por limitar a parturiente ao leito aumenta a incidência de distócia e as taxas de cesárea (categoria A). 5. Analgesia Peridural Existem evidências de associação com prolongamento do segundo estágio do parto, maior uso de ocitocina, fórcipe e vácuo-extrator. ExISTE pREvENçãO pARA DISTóCIA? » Maior integração equipe (médicos e enfermeiras) » Indução por estágio do trabalho de parto (iniciar amadurecimento cervical com prostaglandinas e uso posterior de ocitocina) » Apoio emocional contínuo com doulas (redução de partos abdominais – categoria A) 563 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand » Amniotomia rotineira? (Realizar apenas em mulheres com progressão anormal do trabalho de parto - categoria A) » Uso de medidas alternativas no controle da dor (banhos mornos, deambulação, apoio físico e emocional devem ser preferidos à anestesia peridural) » Evitar posicionar parturiente muito cedo em posição de decúbito dorsal ou litotomia, bem como evitar solicitar às mesmas que realizem o puxo precocemente no segundo estágio do parto (medidas que só exaurem a paciente e contribuem para prolongar o período expulsivo) » Revisão em todos os prontuários de cesárea (avaliar indicação) 4. DIAGNóSTICO: 1. Anamnese: História prévia de tocurgia em partos anteriores (fórcipe, vácuo-extrator, cesárea), primiparidade, antecedentes de traumas ou cirurgias pélvicas. 2. Exame Fisico: Avaliar biótipo da paciente (altura, peso e IMC), altura do fundo uterino e realização das Manobras de Leopold (apresentação, situação e posição fetais), relação entre cabeça e pelve (insinuação e encaixamento), toque vaginal (variedade de posição, altura da apresentação, edema de colo e presença de bossa parietal). » Pelvimetria Clínica: Recurso barato, de grande utilidade e boa predição. Avaliam-se os seguintes parâmetros: ▪ Conjugata Obstétrica: Avalia o estreito superior e seus vícios. Tem cerca de 11,0 cm. Considerado reduzido quando menor que 10,0 cm. Avaliada pela medida manual da conjugata diagonal (que se estende do ângulo sub-púbico ao meio do promontório do sacro) subtraindo-se 1,5 cm. ▪ Diâmetro Bi-Isquiático (Bi-Tuberoso): Avalia o estreito médio e seus vícios. Mede cerca de 11,0 cm. Considerado reduzido quando menor que 10,0 cm. ▪ Arco Púbico (ângulo sub-púbico): Avalia o estreito inferior e seus vícios. Adequado se 90 graus, largo e arredondado. Inadequado quando menor que 70 graus, estreito e profundo. ▪ Inclinação e Comprimento do Sacro: Devem proporcionar bons diâmetros antero- posteriores. Na presença de vícios do estreito superior, o plano ósseo da cabeça 564 Unidade 6 - Obstetrícia Distócia de Ombro ultrapassa a borda superior da sínise púbica (sinal de Muller) e, à compressão cefálica, realizada pelo abdome, não conseguimos penetrar a apresentação no estreito superior (prova de Muller). Em vícios do estreito inferior, observamos as espinhas ciáticas salientes e a curvatura sacral reduzida. Promontório facilmente palpável ao toque vaginal e diâmetro biisquiático estreito (menor que 9,0 cm) são sinais de vício pélvico absoluto, estando a cesariana indicada. 3. Partograma. “É um verdadeiro retrato de corpo inteiro da evolução do parto. Sua importância conirma-se quando, em um momento deinido, avaliamos a evolução do parto como um todo: Dilataçâo cervical, descida da apresentação, posição fetal, variedade de posição, frequência cardíaca fetal, contrações uterinas, infusão de líquidos e analgesia. O exame completo de todas estas variáveis permite conhecer a evolução do parto e dos fatores etiológicos responsáveis por sua evolução normal ou anormal. Identiicada a distócia no partograma e reconhecida sua etiologia, a orientação terapêutica será lógica e eicaz.” Realização dos toques vaginais a cada 1-2 h. O mesmo examinador nos toques diminui a chance de erro por subjetividade. * Vale ressaltar novamente que o internamento correto, na fase ativa do parto, com abertura do partograma no tempo ideal, evitando-se internar pacientes em pródromos, diminuirá sobremaneira a ocorrência de falsos diagnósticos de distócia e de iatrogenia nas pacientes. 5. TRATAMENTO 1. Medidas Gerais Tão logo seja diagnosticada a distócia, devem-se tomar as seguintes medidas: » Orientar a paciente (informá-la da evolução deiciente do seu trabalho de parto e intimá-la a colaborar nas medidas que deverão ser tomadas) » Apoio emocional (doulas e enfermeiras) » Verticalizar e mobilizar paciente (deambulação, exercícios na bola de Bobath e nos balanços) » Instituir medidas não farmacológicas de controle da dor (massagens e banhos mornos) 565 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand 2. Amniotomia » Deve ser reservada a mulheres com evolução anormal do trabalho de parto (categoria A). Não realizar de rotina. » Abrevia o trabalho de parto em 1- 2 h, mas aumenta a incidência de desacelerações variáveis e traçados não tranquilizadores. » Quando combinada à ocitocina, mostrou aumento na dilatação e encurtamento no trabalho de parto, com resultados melhores que a amniotomia isolada ou a conduta expectante. 3. Correção da Posição Anômala O tratamento intra-parto das posições anômalas, principalmente a persistência das posições occipito-sacras, inclui: » Rotação Manual Da Cabeça para a posição occipito-púbica, com paciente sob analgesia. » Mudança de Posição Materna. Na teoria, qualquer posição que leve a mãe a se contrair sobre o quadril, estimula a rotação e descida da cabeça fetal. 4. Ocitócitos » Principal tratamento farmacológico para o trabalho de parto distócico. » Esquemas de alta e baixa dosagem mostram eicácia e segurança (categoria A) Baixa dosagem Cada 20-40 min Alta dosagem Cada 15-30 min Dose de ataque 0,5 a 2 mUI/min Manutenção 1a 2 mUI/min Dose máxima 20 a 40 mUI/min 6 mUI/min 1a 6 mUI/min 40 a 42 mUI/min » O tempo de indução mínimo é de 2 horas, com contrações efetivas diagnosticadas por monitoramento clínico ou cardiotocográico. A falta de alterações na dilatação do colo e/ou descida da apresentação, caracteriza a falha do método. Aumento do tempo mínimo de indução para 4 horas pode diminuir as taxas de cesariana de 26% para 8% 566 Unidade 6 - Obstetrícia Distócia de Ombro (categoria C). » Monitoramento fetal e materno constante durante induções com ocitocina. » Complicações: Sobrecarga de luidos, hiponatremia, taquissistolias, hiperestímulo, sofrimento fetal e ruptura uterina em casos de desproporção céfalo-pélvica. 5. Fórcipe e Vácuo-Extrator » Nas situações de segundo estágio prolongado (período expulsivo) e parada secundária da descida (desproporções céfalo-pélvicas relativas), se condições de aplicabilidade estiverem presentes, incluindo pólo cefálico em planos baixos de De Lee. 6. Cesariana » Nas falhas de tratamento, depois de instituídas as medidas anteriores, nos malogros de fórcipe e nas desproporções céfalo-pélvicas. 6. CONCLUSãO A distócia é um evento frequente durante o primeiro e segundo período do trabalho de parto, sendo uma das principais causas de indicação de parto abdominal, exigindo da equipe multidisciplinar que o conduz, atenção para seu diagnóstico precoce e presteza para condutas de correção. Desde a admissão, o proissional que examina a paciente, deve certiicarse que esta se encontra na fase ativa do trabalho de parto, evitando interná-la em período prodrômico, causando, mais adiante, ansiedade e intervenções desnecessárias, muito frequentes nestes casos. A instituição de conduta ativa tão logo seja detectada a distócia, diminui o tempo do trabalho de parto e pode minimizar a ocorrência de tocurgias. A orientação da paciente, informando da anormalidade de evolução no parto e da necessidade de colaboração da mesma, com atitudes como Deambulação, verticalização e banhos mornos, assim como o apoio emocional propiciado pelas doulas e enfermeiras mostraram-se eicazes (categoria A). A amniotomia associada ao uso de ocitócitos, sob rigorosa monitorização fetal, corrige a maioria das distócias detectadas ao partograma (distócias funcionais). Este valiosíssimo instrumento de acompanhamento do trabalho de parto deve ser nossa principal ferramenta na detecção e tratamento deste evento. A utilização do fórcipe ou vácuo-extrator deve ser reservada aos obstetras mais experientes, observando sempre as condições de aplicabilidade, 567 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand nas situações de segundo estágio prolongado e de parada secundária da descida. A cesariana é nosso último recurso, quando da falha dos métodos anteriores, ou nosso primeiro recurso, quando da detecção de desproproção céfalo-pélvica ou sofrimento fetal agudo, estando o parto distante de ultimar-se. Lembrar de nunca fazê-la apenas quando o feto e/ou a mãe estiverem em estado de exaustão ou sofrimento avançado. O bom resultado visa, ao inal, obter-se um binômio materno-fetal em perfeitas condições. CLASSIFICAÇÃO DISTÓCIA Fase ativa prolongada (período de dilatação) Fig. 6 SIGNIFICADO Distócia funcional: A velocidade da dilatação é inferior a 1,0 cm/h (contrações uterinas não eicientes) Parada secundária de dilatação (período de dilatação) Fig. 7 Desproporção céfalo-pélvica (DCP) absoluta; DCP relativa (delexões, variedades transversas ou posteriores) Parto precipitado (período de dilatação) Fig. 8 Parto taquitócito: A dilatação cervical, descida do pólo cefálico e expulsão fetal ocorrem em menos de 4 horas (taquissistolia e hipersistolia); Risco aumentado de sofrimento fetal e lacerações do trajeto Contrações uterinas ineicientes prolongando o período expulsivo Período pélvico prolongado (período expulsivo) Fig. 9 Parada secundária de descida (período expulsivo) Fig. 10 568 DCP absoluta; DCP relativa (delexões, variedades transversas ou posteriores) Unidade 6 - Obstetrícia Distócia de Ombro Figura 1 – Fase ativa prolongada Fonte:http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/parto_aborto_puerperio.pdf 569 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand Figura 2 – Parada secundária da dilatação Fonte:http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/parto_aborto_puerperio.pdf 570 Unidade 6 - Obstetrícia Distócia de Ombro Figura 3 – Parto precipitado Fonte:http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/parto_aborto_puerperio.pdf 571 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand Figura 4 – Período pélvico prolongado Fonte: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/parto_aborto_puerperio.pdf 572 Unidade 6 - Obstetrícia Distócia de Ombro Figura 5 - Parada secundária descida Fonte: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/parto_aborto_puerperio.pdf 573