APONTAMENTOS CAPITULO I INVESTIGAÇÃO DE NOVOS FÁRMACOS FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 1 APONTAMENTOS 1 - INVESTIGAÇÃO DE NOVOS FÁRMACOS 1.1. Desenvolvimento e autorização de novos fármacos O desenvolvimento de novos fármacos constitui um dos principais motores revolucionários da prática clínica, diminuindo a morbilidade e mortalidade das populações em todo mundo. No entanto, os processos inerentes à descoberta, manipulação e autorização de novas substâncias farmacológicas são extremamente morosos e dispendiosos. Circuito interactivo do Medicamento de Uso Humano: Adaptado de www.infarmed.pt, 14 de Setembro de 2006 A investigação nesta área segue normalmente a seguinte ordem de acontecimentos: 1- Síntese de novas substâncias (realizado quase exclusivamente através de planeamento racional); 2- Obtenção de um grande número de moléculas (± 1000); 3- Triagem farmacológica; 4- Selecção do composto líder; 5- Início da bateria de ensaios (culturas celulares, membranas celulares, tecidos, entre outros); 2 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 6- Realização de ensaios em modelos animais adequados aos estudos (estudo da tolerância, toxicidade, selectividade do composto, mecanismo de acção, entre outros); 7- Ensaios clínicos que visam confirmar os efeitos farmacológicos, toxicológicos, entre outros, no Homem. Nota: Para cada 1000 moléculas sintetizadas, 1 chega a ensaios clínicos e apenas 1 em cada 100 chega a ser comercializada. Ensaios clínicos Fase I É seguro? Farmacocinética? Produtos Naturais Fase II Composto Leader Eficácia? Selectividade? É eficaz em Humanos? Fase III Mecanismo? É eficaz? Estudos duplamente cegos Sintese Química 0 anos Estudo da segurança e do metabolismo 2 anos 4 anos Marketing Produção de Genéricos Estudos em animais Farmacovigilância Estudos in vitro Fase IV 8-9 anos Descoberta de novas aplicações terapêuticas 20 anos Patente cai no domínio público 1.1.1. Objectivos dos ensaios clínicos • Confirmar os efeitos farmacológicos; • Avaliar se o efeito farmacológico determina efeitos terapêuticos úteis; • Demonstrar a segurança do fármaco. 1.1.2. Factores a considerar nos ensaios clínicos • História natural da doença; • Presença de outras doenças; o Ex.: Doentes com Alzeimer ou Parkinson são doentes que tipicamente apresentam outras patologias características da idade em que estas doenças se manifestam geralmente (ex.: hipertensão, hipercolesterolémia, diabetes, etc.). • Factores de risco para outras doenças; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 3 APONTAMENTOS • Influência do doente a observar; • A noção de que não existem doentes padrão; o Por regra, os ensaios clínicos são ensaios rigorosos, cujos critérios de selecção dos doentes envolvidos são bastante específicos. No entanto, devido às próprias características da patologia em estudo, das condições socio-económicas e variabilidade inerente a cada indivíduo, não existem doentes modelo/padrão. Isto é, os resultados obtidos nos ensaios clínicos nem sempre reflectem as características da população, devido ao grande número de variáveis não controláveis que podem interferir nos outcomes. Para além disso, o efeito placebo tem grande importância em várias áreas como na área da psicopatologia. Já na área da oncologia, este efeito não seguirá os mesmos «parâmetros» que o modelo anterior. Em todo o caso, é extremamente importante estudar o efeito placebo sempre que possível. 1.1.3. Ensaios clínicos de Fase I Estes estudos seguem uma metodologia de ensaios abertos, sendo realizados em centros de investigação sob orientação de Farmacologistas clínicos experientes que procuram estudar a segurança do fármaco, envolvendo a participação de um grupo pequeno de voluntários saudáveis (20-25 indivíduos). Caso seja prevista elevada toxicidade, os ensaios poderão ser realizados em doentes voluntários que não possuam outras opções terapêuticas. É administrada, por via parentérica, uma única dose de fármaco, calculada a partir dos resultados obtidos em estudos de toxicidade animal, estudando-se vários parâmetros farmacocinéticos do fármaco no Homem (ex.: absorção, semi-vida, metabolismo, intervalo toxicidade, entre outras). Inerente ao número de participantes neste estudo, a probabilidade de ocorrer e serem registados efeitos tóxicos é bastante reduzida. Como tal, o estudo da farmacocinética é essencial nesta fase de ensaios clínicos, aproveitando-se toda a informação que possa ser recolhida (alterações da função hepática, hematológica, renal, entre outras). 4 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 1.1.4. Ensaios clínicos de Fase II Nesta fase, os estudos seguem uma metodologia de ensaios cegos simples (placebo, controlo positivo, fármaco novo), sendo realizados em grandes centros clínicos especializados como hospitais universitários. Incidem sobre um grupo maior de voluntários (100 a 200) que sofrem da patologia para a qual o fármaco demonstrou potencial, pretendendo-se estudar a sua eficácia. Existem critérios rigorosos de selecção que avaliam os doentes com grande detalhe antes de entrarem nos ensaios. Está ainda presente um grupo controlo sujeito à administração de placebo ou da melhor medicação disponível no mercado até ao momento para a patologia em causa. Como o número de indivíduos implicados no estudo é maior, os investigadores estão também atentos à possível toxicidade do fármaco. Esta fase pode demorar vários anos e, caso seja demonstrada eficácia, o fármaco prossegue para estudos posteriores. 1.1.5. Ensaios clínicos de Fase III Estes estudos visam estabelecer a segurança e eficácia do fármaco em causa. Constituem a última grande fase de estudos antes da terapêutica ser aprovada pelas entidades competentes, envolvendo milhares de pacientes dispersos por vários centros hospitalares. Os estudos são realizados através da execução de ensaios duplamente cegos e cruzados. O operador desconhece o que está a administrar, assim como o paciente desconhece o que está a receber. Por outro lado são cruzados uma vez que todos os grupos recebem placebo, o fármaco em estudo e o melhor fármaco disponível no mercado para a patologia em causa. Semana 1 *Semana 2 Semana 3 Aspirina Placebo Fármaco em estudo Grupo 2 Placebo Fármaco em estudo Aspirina Grupo 3 Fármaco em estudo Aspirina Placebo Grupo 1 *Semana de washout – semana de lavagem necessária para remover o fármaco do organismo. Como nas fases anteriores, os investigadores estão atentos ao aparecimento de reacções adversas. Alguns efeitos tóxicos, como os mediados por processos imunológicos, tornam-se normalmente evidentes nesta fase. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 5 APONTAMENTOS O esquema posológico é escolhido de acordo com a informação obtida nas fases anteriores, seleccionando-se o mais semelhante ao esquema a ser utilizado no mercado. Os investigadores envolvidos nesta fase são, normalmente, especialistas nas doenças alvo do novo medicamento. 1.1.6. Ensaios clínicos de Fase IV O medicamento, após sujeito aos processos de aprovação, entra no mercado, sendo activados os mecanismos de farmacovigilância. Estes são constituídos por estudos que monitorizam a segurança do novo fármaco na população alvo, estando atentos às eventuais reacções adversas raras (1 para 10 000) não detectadas durante as fases anteriores. Ex.: A substância activa Tolcapone foi aprovada como fármaco administrado no tratamento de Doença de Parkinson. Detectou-se posteriormente efeitos hepatotóxicos em estudos de farmacovigilância tendo sido retirado do mercado. Actualmente apenas é utilizado como última opção em casos de resistência à terapêutica. Tabela Resumo Fase Fase I 1ª Administração em Humanos (ensaios abertos) Fase II Investigação clínica (ensaios cegos) Duração da amostra 3-6meses n=20-50 6-12 meses N= 60-300 Quem? Voluntários saudáveis; Por vezes doentes (ex.: oncológicos, HIV, etc.); Porquê? Tolerância, dosagem, cinética, metabolismo, segurança, efeitos farmacológicos; Voluntários doentes; Eficácia na patologia, gama de doses Necessário existir um adequadas, estimativa da magnitude e grupo controlo; variabilidade do efeito; Fase III Ensaios clínicos formais 1-3 anos (ensaios duplamente cegos e N= 250-1000 Voluntários doentes; Eficácia, taxa de ocorrência de efeitos adversos, análise farmacoeconómica; cruzados) Padrões de utilização, eficácia e toxicidade Fase IV Ensaios pós-mercado (Farmacovigilância) ∞ Doentes tratados com o fármaco; adicionais, procurar e investigar as possíveis diferenças farmacogenéticas entre as populações (ex.:diferentes graus de metabolismo); A indústria responsável pelo desenvolvimento destes novos medicamentos, pode explorar a título exclusivo a comercialização destes no mercado, sob a tutela de uma patente, durante um determinado período de tempo. Findado este prazo, a patente cai e outras indústrias podem 6 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS explorar a substância activa em causa. Existem no entanto excepções de fármacos em que estes prazos podem ser drasticamente encurtados, como no caso de medicamentos retrovíricos, entre outros. 1.1.7. Tipo de ensaios clínicos • Ensaios de ocultação simples ou ensaios cegos; o É uma metodologia de ensaios clínicos onde apenas os indivíduos participantes desconhecem o que lhes está a ser administrados • Ensaios com ocultação dupla ou duplamente cegos; o É uma metodologia de ensaios clínicos onde nem os indivíduos participantes nem o pessoal técnico sabem quais os participantes que estão a ser administrados com o fármaco experimental, nem os que estão a ser administrados com placebo ou outra terapêutica. Esta metodologia produz resultados objectivos, uma vez que as expectativas dos investigadores e dos participantes não afectam os resultados clínicos. • Ensaios abertos; o Metodologia de ensaios clínicos onde os indivíduos participantes e pessoal técnico sabem quais os participantes que estão a ser administrados com o fármaco experimental, placebo ou outra terapêutica. 1.1.8. Escolha dos controlos • Controlo activo ou placebo. • Estudos intra ou inter-pacientes. 1.1.9. Teste da Hipótese nula A hipótese nula é uma hipótese que se presume verdadeira até que provas estatísticas sob a forma de testes de hipóteses indiquem o contrário. Trata-se de uma hipótese em que se pretende confrontar com os factos. Por exemplo, podemos ter uma afirmação relativamente a um determinado parâmetro/característica da população. Uma vez que é impossível estudar toda a população, FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 7 APONTAMENTOS realiza-se um teste baseado na observação de uma amostra aleatória, procurando-se negar a afirmação através dos dados obtidos. 1.1.10. Testes e ensaios disponíveis Existe uma enorme bateria de ensaios disponíveis actualmente (ver tabela na pág.10). A - Ensaios in vitro Os ensaios moleculares (ensaios de binding) estudam a afinidade e selectividade dos compostos para os receptores celulares. Estes ensaios fornecem cada vez mais informação. Através da sua realização, o composto líder pode ser encontrado. As alterações que estes fármacos produzem eventualmente no sistema citocromo P450, encontram-se na base da criação de fármacos selectivos e que melhor se adaptam às características fisiológicas de cada indivíduo. É a partir deste conceito que tem sido desenvolvido a farmacogenómica. O metabolismo difere de indivíduo para indivíduo. Como tal, é errado falar de uma dose universal de um determinado fármaco para uma população afectada por uma determinada patologia. Existem indivíduos com metabolismo acelerado, normal e lento, produzindo respostas completamente diferentes aos fármacos e alterando os outcomes da terapêutica. B - Testes de segurança B1 - Toxicidade aguda Estuda os efeitos de uma dose elevada de fármaco administrada por duas vias diferentes, em pelo menos duas espécies animais, determinando-se a dose para a qual 50% dos animais morrem - DL50. Por razões óbvias, este tipo de estudos não podem ser realizado em seres Humanos, não existindo DL50 Humana. Se a DL50 e a dose terapêutica (DT50) forem semelhantes, então a evolução da investigação para fases posteriores estará comprometida. 8 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Normalmente, a DL50 é estudada em ratinhos, uma vez que estas cobaias são fáceis de criar e requerem uma menor concentração de fármaco (doses menores), o que em termos económicos é relevante para o laboratório. B2 - Toxicidade sub-aguda São ensaios executados num período de 4 semanas a 3 meses, que estudam as alterações de comportamento de pelo menos duas espécies animais (coelho, ratinho, rato, etc.), resultantes da administração de três doses diferentes de fármaco. Posteriormente, todos os órgãos são isolados e estudados. Quanto maior for o tempo de utilização previsto para o fármaco, maior será o tempo necessário para a realização destes ensaios. B3 – Toxicidade crónica Estes testes possuem a duração de cerca de 6 meses ou mais, sendo executados em roedores e não roedores. Estudam-se os eventuais efeitos sobre o aparelho reprodutor, efeitos carcinogénicos e mutagénicos (teste de Ames – estuda a estabilidade genética e as mutações de culturas bacterianas sobre as quais se inocula os compostos em estudo). FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 9 APONTAMENTOS Métodos experimentais ou órgãos alvo Tecidos ou espécies Administração Estudo Molecular Fracções de membrana celular Ligação ao receptor provenientes de órgãos ou culturas Ex.: β-adrenoceptores celulares; In vitro Selectividade e afinidade a receptores; Receptores clonados. Actividade enzimática Ex.: Tirosina hidroxilase, Nervos simpáticos; dopamina-3-hidroxilase, Glândula adrenal; monoaminoxidase Enzimas purificadas; Citocromo P450 In vitro Veias sanguíneas, coração, pulmões, ílio (rato e porquinhos da Índia); Selectividade e inibição de enzimas; Inibição enzimática; In vitro Efeitos no metabolismo do fármaco; Celular Evidencias de actividade no Função celular In vitro receptor - agonismo ou antagonismo; Efeitos na contracção e relaxamento vascular, Tecidos isolados In vitro selectividade para os receptores vasculares, efeitos noutros músculos lisos; Modelos de doenças/sistemas Pressão sanguínea Efeitos cardíacos Cães e gatos (anestesiados) Parentérica Alterações diastólicas e sistólicas; Ratos hipertensos (conscientes) Oral Efeitos antihipertensivos; Cães (conscientes) Oral Electrocardiografia; Efeitos inotrópicos, efeitos Cães (anestesiados) Parentérica cronotrópicos, output cardíaco, resistência periférica total; Efeitos na resposta de um Sistema nervoso autónomo periférico Cães (anestesiados) Parentérica fármaco conhecido, estimulação eléctrica dos nervos autonómicos centrais e periféricos; Efeitos na taxa de respiração, Efeitos respiratórios Cães e porquinhos da Índia Parentérica efeitos na amplitude do tónus bronquial; Natriurese, diurese de potássio, Actividade diurética Cães Parentérica e diurese de água, fluxo sanguíneo oral renal, taxa de filtração glomerular; Efeitos gastrointestinais Ratos Hormonas circulantes, colesterol, açúcar Ratos e cães sanguíneo Oral Parentérica e oral Secreção e mobilidade gastrointestinal; Concentração sérica; Tempo de coagulação, retracção Coagulação sanguínea Coelhos Oral do coágulo, tempo da protrombina; Sistema nervoso central 10 Ratos e ratinhos Parentérica e oral Grau de sedação, relaxamento muscula, actividade motora, estimulação; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Questionário 1. Complete o seguinte quadro: Fase Duração da amostra Quem? Porquê? Fase I Fase II Fase III Fase IV 2. O que entende por hipótese nula? 3. O que entende por ensaios clínicos duplamente cegos? 4. O que entende por ensaios clínicos abertos? 5. Onde são realizados os ensaios clínicos de fase II? FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 11 APONTAMENTOS 6. Onde são realizados os ensaios clínicos de fase IV? 7. Que tipo de testes de segurança conhece? Quais as suas características? 8. Quais os factores a considerar quando se realizam ensaios clínicos? 9. O que entende por semana washout? 10. O que entende por ensaios de ocultação simples ou ensaios cegos? 12 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Perturbações do humor Depressão no contexto da doença bipolar Perturbações da ansiedade Psicoses Epilepsia Doença de Parkinson Demência tipo Alzheimer CAPITULO II PATOLOGIAS DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 13 APONTAMENTOS 2 - PERTURBAÇÕES DO HUMOR A definição de humor abrange diferentes conceitos como a disposição vital, o estado de ânimo, passando pelo afecto fundamental e actividade holotímica de base. O humor é capaz de alterar todas as restantes funções do organismo humano. Normalmente existe uma variação de humor natural ao longo do dia, estação do ano, etc. No entanto, quando uma das fases se prolonga ou quando existe uma mudança brusca do humor, este comportamento é considerado anormal. Como tal, a intensidade e o tempo são dois aspectos extremamente importantes na avaliação do estado de humor. 2.1. Tipos de perturbações do humor • Depressão major; • Doença bipolar; • Desordens distímicas; • Desordens ciclotímicas; • Perturbações de humor desencadeadas por fármacos. o Bloqueadores β; o Reserpina – provoca depressão reactiva ao diminuir as reservas de aminas nas vesículas presentes nos terminais sinápticos; o Interferão α2b – utilizado na terapêutica da Hepatite C, podendo causar depressão e tendências suicidas nos doentes. Normalmente são prescritos a estes pacientes antidepressivos como profiláticos de possíveis episódios depressivos que possam insurgir; 14 o Corticóides; o Ribavirina; o Outros; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Depressão Persistente Recorrente (+) Mania Distímica Episódio único (-) Mania Unipolar Bipolar Episódio depressivo (diferentes graus de severidade) Doença depressiva recorrente Severa: desordem bipolar afectiva Pequenos episódios depressivos recorrentes Desordem afectiva sazonal Moderada: ciclotímica + Ansiedade Mistura de depressão com ansiedade 2.2. Etiologia 2.2.1. Hipóteses fisiopatológicas • Aminas biogénicas (serotonina, noradrenalina e dopamina) A teoria monoaminérgica [1968] estabelece uma relação entre a concentração de aminas no organismo e o humor. Esta teoria foi elaborada quando se registou que a administração de reserpina (um inibidor do armazenamento de aminas neurotransmissoras nas vesículas dos terminais neuronais pré-sinápticos) induzia diminuição do humor. Assim sendo, quando existe uma diminuição na concentração de aminas ocorre uma diminuição do humor e vice-versa. No entanto, foi registado posteriormente que esta relação não era linear. Em indivíduos deprimidos ocorre diminuição da percentagem dos metabolitos dos neurotransmissores excretados pela urina (ex.: diminuição do ácido 5hidroxiindolacético, metabolito da serotonina). • Regulação neuroendócrina Existe uma regulação neuroendócrina do humor. Verifica-se que indivíduos deprimidos possuem o eixo hipotálamo-hipófise-supra-renal muito excitado, resultando no aumento da concentração plasmática de cortisol. • Sono FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 15 APONTAMENTOS Existem várias fases durante o sono, das quais se sobressai a fase REM (rapid eye movement). Indivíduos que sofrem de depressão vêem o seu tempo de sono diminuído. Ocorre uma diminuição do período de tempo entre o início do sono e a entrada na fase REM. Estes doentes sofrem constantes interrupções do sono durante a noite. Consequentemente, este não é reparador. Ex.: Insónia do deprimido – insónia tardia. Insónia inicial – típica da ansiedade. Na doença bipolar, fase maníaca, encontra-se descrita redução do tempo de sono, consequência da própria doença. Esta redução não é semelhante ao que ocorre com os indivíduos depressivos. Isto porque os indivíduos com mania afirmam não precisar de dormir uma vez que não sentem falta. Na fase maníaca estes doentes chegam a dormir apenas 2 a 3 horas por dia. • Genética Existe uma relação directa das patologias, do foro psiquiátrico com factores hereditários. Verifica-se que filhos de pais com depressão apresentam 10-15% de probabilidades de a desenvolver. Nos gémeos unizigóticos e bizigóticos esta probabilidade sobe para 50% e 20% respectivamente. Alterações do Humor Probabilidade de desenvolvimento na criança Doenças depressivas • Um dos pais • Gémeo monozigótico • Gémeo dizigótico 10-13% 50% 10-25% Doenças bipolares • Um dos pais • Pais 50-75% 25% • Gémeo monozigótico 30-90% • Gémeo dizigótico 5-25% • Neuroanatomia Alterações anatómicas (ex.: cancro) do sistema límbico provocam alterações do humor. 16 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Kindling Termo que designa uma irritabilidade eléctrica neuronal. Ao sujeitar ratinhos a um estímulo eléctrico diário de baixa voltagem, gera-se uma perturbação no sistema nervoso por alteração da condutância das membranas. Esta é uma das formas, utilizadas pelos investigadores, para induzir epilepsia em cobaias. Na depressão parecem existir também alterações eléctricas muito subtis em pessoas facilmente irritáveis. Este fenómeno estará provavelmente relacionado com as alterações do humor e da personalidade. 2.2.2. Hipóteses ou teorias psicossociais • Teoria Psicanalítica (Psicanálise); • Teoria Psicodinâmica; • Teoria Cognitiva (Triad of Aaron Beck) – o negativismo do Próprio, o negativismo do Mundo e o negativismo do Futuro; • «Learned helplessness» – pessoas que aprendem a viver sem esperança e a não sonhar ou esperar algo de bom na vida. • «Stressfull life events» – situações de stress intenso como a morte de um pai ou mãe, representa um evento extremamente marcante, sobretudo quando ocorre na Sigmund Freud (1856 – 1939) Pai da Psicanálise infância (idade <11anos). A forma como os indivíduos lidam com eventos stressantes prepara-os para os problemas futuros. Assim como os eventos negativos contribuem para as alterações do humor, também o excesso de eventos positivos o pode perturbar. Alturas de grandes desafios sociais, mentais ou fisiológicos como os de transição entre estados de maturação (ex.: adolescência), podem levar à alteração do humor. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 17 APONTAMENTOS 2.3. Depressão Na União Europeia, as formas mais comuns de doença mental são os sindromas ansiosos e a depressão. Segundo alguns estudos, em 2020 a depressão constituirá a primeira causa de morbilidade no mundo desenvolvido. Contudo, existem variações importantes entre os estados membros. Como exemplo cita-se o número de suicídios por 100 000 habitantes, que vai de 44 na Lituânia para 3,6 na Grécia, enquanto que o número de internamentos não voluntários em estabelecimentos psiquiátricos é 40 vezes mais elevado na Finlândia que em Portugal. Tendo em consideração a sua elevada prevalência (cerca de 10% da população) e a sua gravidade, a depressão constitui um importante problema de saúde pública. O primeiro episódio ocorre normalmente entre os 30-40 anos de idade. O diagnóstico da depressão não é linear uma vez que existem doenças orgânicas que podem mimetizar sintomatologia depressiva. Torna-se então necessário excluir todas as possibilidades antes de iniciar a terapêutica antidepressiva. Existem guidelines que ajudam ao diagnóstico correcto. Estas referem que num intervalo de 2 semanas devem estar presentes 5 ou mais sintomas, existindo uma alteração do humor em relação ao passado (ver pág. 153). Uma depressão reactiva é uma depressão que se deve a algo perfeitamente identificável (ex.: morte de alguém querido). No entanto, na depressão major (endógena), o doente desconhece a causa dos sentimentos e sintomas que apresenta. A depressão pode ainda atingir determinados patamares “On the Threshold of Eternity” Vincent Van Gohg de gravidade, assumindo características psicóticas. 18 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Normalmente resolve-se espontaneamente, mas em 50% dos casos ocorre recorrência após um período de 2 anos. Como tal, o tratamento da depressão é extremamente importante, de forma a precaver recaídas. 2.3.1. Sintomatologia • Humor deprimido; • Anedonia – corresponde à perda da capacidade de sentir prazer, característica dos estados gravemente depressivos; • Redução do peso (se o indivíduo não estiver a praticar dieta) – pode também ocorrer aumento do peso, mas a primeira situação é a mais comum; • Insónia ou hipersónia durante o dia; • Alterações psicomotoras; • Perda de energia ou fadiga; • Sensação que “não vale nada”; • Dificuldade de concentração; • Pensamentos recorrentes de morte. Nota: 15% dos indivíduos com depressão major tentam o suicídio. O perfil das doenças mentais segue um de dois caminhos: • Doenças neuróticas ou neuroses – o doente identifica e sabe que está doente; • Doenças psicóticas ou psicoses – o doente não reconhece a sua doença; No entanto, este aspecto nem sempre é tão linear. Em certos casos, doentes neuróticos passam a ter sintomas de doenças psicóticas (ex.: delírios, alucinações). Tipo Características do diagnóstico Notas Perda (eventos marcantes), doença (enfarte do miocárdio, cancro), fármacos e outras Reactiva substâncias (antihipertensivos, álcool, hormonas), outras desordens psiquiátricas (doença senil). Depressão major (endógena) Corresponde a mais de 60% de todas as depressões. Sindrome queixas depressivo corporais, usual: tensão, depressão, culpa. Pode ansiedade, resolver-se espontaneamente ou após tratamento. Eventos adversos não adequados ao grau de Corresponde a cerca de 25% de todas as depressões. depressão. Autónomo (não responde às Sindrome depressivo usual mais sinais vitais: ritmos de mudanças na Pode ocorrer em sono, actividade motora, libido e apetite anormais. vida). qualquer idade (desde a infância até à 3ª Normalmente responde idade). Pode ser determinada biologicamente antidepressivos (história familiar). tendência a ocorrer recorrências durante a vida. ou a especificamente a electroconvulsoterapia. Tem FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 19 APONTAMENTOS Corresponde a cerca de 10-15% de todas as depressões. Bipolar afectiva (depressãomania) Caracterizado cíclicos. por Apenas episódios mania de (raro), mania Pode ser mal diagnosticado como endógena se os apenas episódios maníacos forem “ocultados”. O carbonato de depressão (ocasional), depressão e mania lítio estabiliza o humor. A mania pode também requerer (mais comum). fármacos antipsicóticos. A fase depressiva é tratada com antidepressivos. 2.3.2. O Suicídio - Existência de um plano já formulado, muitas vezes baseado em filmes; - As tentativas sérias anteriores de suicídio constituem um forte factor de risco; - Sintomas psicóticos; - Ingestão simultânea de medicamentos e álcool; - Mais frequente em indivíduos caucasianos do sexo masculino, em idade mais avançada; - Indivíduos com doenças graves; - Perda recente de alguém querido e/ou profundo desespero; - Isolamento social. Por vezes, a própria terapia pode ser uma faca de dois gumes. Os doentes com depressão avançada não possuem forças nem vontade para nada, nem mesmo para cometer suicídio. Quando o diagnóstico é realizado, iniciam normalmente uma terapêutica farmacológica com antidepressivos. Nas fases iniciais do tratamento estes pacientes tornam-se mais activos, mas mantêm os sintomas de depressão. Como tal, a terapêutica, se por um lado os ajuda a terem mais forças para seguir na vida, por outro pode constituir o impulso que o doente necessitava para cometer suicídio. Isto verifica-se em vários hospitais, onde existem doentes que concretizam o suicídio, geralmente 2 semanas após o início da terapêutica. 20 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 2.3.3. Caso Clínico M.J. é uma mulher de 38 anos que se dirigiu ao Centro de Saúde da sua área de residência com queixas de dores nas costas e fadiga, com 2 meses de duração. Um exame físico e laboratorial completo não demonstrou qualquer anormalidade. Um diálogo mais aprofundado revelou que M.J. começou a perder o interesse por quase todas as suas actividades usuais (igreja, lavores, jogos de bridge semanais, etc.) durante o mesmo período. O facto de ter ganho o último torneio de bridge não trouxe qualquer melhora para o seu espírito. M.J. também tem tido dificuldades em preparar diariamente o jantar para a sua família, por se sentir exausta e «de qualquer forma, nada sabe bem»; como resultado, M.J. perdeu cerca de 6 kg no último mês. A família comentou a sua irritabilidade crescente, que ela própria atribui ao facto de não dormir bem e acordar regularmente às 4h da manhã. M.J. sente-se mal por andar sempre tão irritada e não desempenhar as suas tarefas domésticas como era costume, dizendo mesmo que «não merece ser mãe». A paciente não tem ideação suicida, nem história de distúrbio emocional. A sua história clínica anterior não é significativa e não faz actualmente qualquer medicação. Diagnóstico: Depressão, episódio isolado, com melancolia. 2.3.4. Tratamento O tratamento tem como objectivo principal a redução dos sintomas, das recorrências e eventualmente do suicídio. Em todo o caso, a relação do doente com o seu médico, familiares e amigos é de extrema importância para o sucesso da terapêutica instituída. Apenas em casos muito severos se recorre à hospitalização destes doentes. O doente deve ser informado sobre todos os aspectos da sua doença e tratamento. Para além disso, deve ser feito um aconselhamento ao doente, no sentido de diminuir o stress, o consumo de álcool, entre outros. A escolha do tratamento deve ser baseada em vários aspectos. Experiência do doente Farmacogenética • História familiar de resposta aos antidepressivos Situação: • Depressão reaccional ligeira Psicoterapia de suporte; Farmacoterapia de curta duração; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 21 APONTAMENTOS Depressões graves, com grande inibição • psicomotora, risco de suicídio ou depressões Electroconvulsoterapia; resistentes à terapêutica • Predomínio da insónia, inquietação e ansiedade Fármacos sedativos; • Grande inibição psicomotora Fármacos mais desinibidores; • Características do doente Actividade anticolinérgica; • Depressões melancólicas Antidepressores tricíclicos (TCAs), inibidores selectivos da recaptação da serotonina (SSRIs) e electroconvulsoterapia; • Depressões atípicas • Depressões psicóticas Inibidores da monoaminoxidase (iMAOs); Electroconvulsoterapia ou combinação de antidepressivo com antipsicóticos ; Potencial de interacções medicamentosas Reacções adversas Custos Prioridades: • Rapidez do efeito • Eficácia Farmacoterapia e electroconvulsoterapia; A eficácia é sempre a longo prazo. Pode ser necessário combinar farmacoterapia com psicoterapia; • Toxicidade do tratamento • Custo Farmacoterapia e electroconvulsoterapia; 2.3.4.1. Tratamento farmacológico Os antidepressivos são fármacos com potencial de habituação e dependência praticamente nulos, que possuem várias indicações terapêuticas: • Depressão; • Ansiedade; • Neurose obcessiva-compulsiva; • Stress pós-traumático; • Fobias; • Ataques de pânico; • Distúrbios alimentares; • Dor crónica. Os seus efeitos (aumento dos níveis de noradrenalina, serotonina e dopamina em menor escala) apenas se fazem sentir ao fim de 2 a 3 semanas, devido à necessidade de ocorrer alterações adaptativas secundárias (ex.: dow-regulation e up-regulation). 22 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Os antidepressivos possuem uma taxa de eficácia na ordem dos 60%. No entanto, sabe-se que 30 a 40% dos resultados obtidos resultam de efeito placebo. A duração média do tratamento à base de antidepressivos depende da resposta e da história clínica anterior, devendo a terapêutica ser reavaliada ao fim de 2 meses. Normalmente é registada uma resposta favorável de 75%. O tratamento pode prolongar-se por 4 a 9 meses após o registo da remissão dos sintomas ou tornar-se crónico em doentes com dois ou mais episódios de depressão. Neste último caso, devido ao prolongamento da terapêutica, a dose de antidepressivo instituído deve ser diminuída. A) Antidepressivos tricíclicos (TCAs) Constituem fármacos eficazes em todos os tipos de depressão, sobretudo na depressão major severa com melancolia, actuando através da inibição não selectiva das bombas de recaptação das monoaminas (noradrenalina, serotonina e dopamina em menor escala). Antagonizam ainda os receptores adrenérgicos α1, histaminérgicos e muscarínicos pósjuncionais. ASSOCIAÇÃO Hipertensão, hiperpirexia, convulsões e coma iMAOs TCAs Etanol e outros depressores do SNC Sedação tóxica Dentro desta classe, as aminas secundárias (Nortriptilina, Doxepina) são as mais potentes inibidoras da recaptação de noradrenalina. Distinguem-se ainda pelas diferenças farmacocinéticas. Relativamente às aminas terciárias, estas são mais potentes na inibição da recaptação de serotonina. Como reacções adversas citam-se: sedação; efeitos anticolinérgicos (retenção urinária, quadros confusionais, aumento da pressão intra-ocular, mucosas secas, obstipação); efeitos simpaticomiméticos (tremor e insónia); hipotensão ortostática, alterações do ritmo cardíaco; agravamento de diabetes pré-existente, aumento de peso (devido ao bloqueio dos receptores histamínicos H1), sudação excessiva, disfunção sexual. As intoxicações agudas são frequentes e potencialmente fatais. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 23 APONTAMENTOS Como provocam sedação, devem ser administrados à noite. Quanto aos efeitos simpaticomiméticos, poderá ser administrado um Bloqueador β (ex.: Propranolol) ou Lorazepam. Para contrariar o aumento do peso, a alimentação deverá ser devidamente controlada. Já no que diz respeito à disfunção sexual, poderá ser negociado com o paciente a possibilidade de fazer uma pausa durante alguns dias (week end-holiday). Interacções: simpaticomiméticos, hormonas tiroideias, pimozida, antiarritmicos, antihistamínicos, anticolinérgicos, fenotiazinas, entre outros. Amitriptilina, Amoxapina, Clomipramida, Desipramina , Doxepina, Imipramina, Nortriptilina, Protriptilina, Trimipramina B) Inibidores selectivos da recaptação da serotonina (SSRIs) Estes fármacos possuem eficácia semelhante aos TCAs na depressão major. São mais seguros em casos de intoxicação, não antagonizando os receptores α1, histaminérgicos ou muscarínicos pós-juncionais. Possuem um tempo de semi-vida elevada, devendo decorrer pelo menos 5 semanas de washout para a fluoxetina (restantes: 2 semanas) entre a interrupção da terapêutica e o início da terapêutica com um iMAO. Dados sobre um elevado número de mulheres grávidas expostas não indicam um efeito teratogénico da fluoxetina. A fluoxetina pode ser utilizada durante a gravidez, mas com precaução, especialmente durante o final da gravidez ou imediatamente antes do início do trabalho de parto, visto terem sido notificados os seguintes efeitos no recémnascido: irritabilidade, tremor, hipotonia, choro persistente, dificuldade de sucção e em dormir. Os SSRIs possuem menos efeitos secundários que os TCAs e os iMAOs (ausência de efeitos colaterais de natureza anticolinérgica e cardiovascular). No entanto, podem causar alterações gastrointestinais e sexuais. Como reacções adversas citam-se então: alterações gastrointestinais, anorexia, perda de peso, reacções de hipersensibilidade (incluindo anafilaxia), xerostomia, ansiedade e irritabilidade, disfunção sexual (impotência); mais raramente convulsões, doenças do movimento (discinésia oromandibular com Paroxetina); 24 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS síndroma da serotonina (mioclonos, agitação, cãibras abdominais, hiperpirexia, hipertensão, potencialmente fatal) e prolongamento do tempo de protrombina. Estão descritas interacções com fármacos neurolépticos (ex.: Haloperidol), TCAs, alguns antagonistas β e antiarritmicos, devido à inibição do citocromo P450 pela fluoxetina. Citalopram, Escitalopram, Fluoxetina, Fluvoxamina, Paroxetina, Sertralina C) Inibidores selectivos da recaptação da noradrenalina Parecem ser mais eficazes no que diz respeito à reinserção social de doentes em remissão. Possui fraco efeito sobre a recaptação de 5-HT, moderada acção anticolinérgica e efeitos secundários menos graves. Pode constituir uma alternativa aos SSRIs. Maprotilina (antidepressivo de 2ªgeração), Reboxetina (Edronax®) D) Inibidores selectivos da recaptação da dopamina Estes fármacos possuem fraca acção sobre a recaptação de NA ou 5-HT e moderado efeito anticolinérgico. São estimulantes do SNC, utilizados na depressão e na desabituação tabágica. As reacções adversas aumentam com a dose, citando-se: enjoo, xerostomia, sudação, tremor, agravamento da psicose, Bupropiona (antidepressivo de 2ª geração) E) Inibidores selectivos da recaptação da noradrenalina e serotonina Possuem baixa afinidade para os receptores adrenérgicos, histaminérgicos e muscarínicos pós-juncionais. Como tal, apresentam um bom perfil para os casos de pacientes que não respondem à terapêutica com TCAs. Como reacções adversas citam-se: náuseas, vómitos, obstipação, xerostomia, insónia, tonturas, trémula, hipertensão e alterações sexuais. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 25 APONTAMENTOS Milnaciprano, Venlafaxina (antidepressivo de 3ª geração) F) Inibidores irreversíveis da MAO não selectivos Inibem os enzimas MAO (monoaminoxidase A e B), aumentando as reservas citosólicas de noradrenalina e serotonina nos terminais neuronais. Quando aplicados num quadro normal sem depressão não exercem os seus efeitos. Apenas são activos em estados de depressão séria, humor reactivo, irritabilidade, hiperinsónia, hiperfagia, agitação psicomotora, hipersensibilidade à rejeição, depressão atípica. As principais reacções adversas deste grupo prendem-se com a inibição da MAO hepática. Quando esta é bloqueada, as aminas da dieta não são metabolizadas, podendo atingir o SNC onde causam hipertensão aguda descontrolada grave, que pode culminar em morte por hemorragia cerebral. Esta reacção adversa é conhecida pela reacção do queijo, uma vez que este é rico em aminas simpaticomiméticas como a tiramina. Deve-se alertar os pacientes para adoptarem uma dieta que exclua alimentos ricos em aminas como queijo, enchidos, favas, entre outros. Para além disso, podem também ser incompatíveis com outros fármacos metabolizados pela MAO. Isto porque ao serem co-administrados existe risco de overdose (ex.: anfetaminas ou petidina) e por outro lado, pode ocorrer interacção com fármacos que possuam ou promovam a libertação de aminas simpaticomiméticas (ex.: Antidepressivos tricíclicos, antigripais). Por isso, os inibidores da MAO são raramente utilizados como 1ª opção no tratamento de quadros de depressão. Outras reacções adversas descritas incluem: perturbações do sono, aumento do peso, hipotensão postural e perturbações sexuais (Fenelzina). Clorgilina, Fenelzina, Iproniazida, Isocarboxazida, Tranilcipromina G) Inibidores reversíveis da MAO-A A inibição selectiva da MAOA permite aumentar os níveis de noradrenalina, serotonina e dopamina. É provável que apresentem melhor resposta em doentes com humor reactivo, irritabilidade, hiperinsónia, hiperfagia, agitação psicomotora, hipersensibilidade à rejeição, depressão atípica. 26 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Tal como os inibidores não selectivos da MAO, apresentam também risco de desencadear crises hipertensivas com a ingestão de alimentos ricos em tiramina, mas em menor grau, uma vez que a inibição é selectiva. Como reacções adversas citam-se: boca seca, vertigens, aumento de peso, insónia, hipotensão ortostática, disfunção sexual, agitação, estados confusionais, aumento das transaminases. Não devem ser co-administrados com SSRIs pelo risco de síndroma da serotonina (que pode assemelhar-se ao síndrome neuroléptico maligno e ser diagnosticado como tal), nem com TCAs pelo risco de efeitos hiperadrenérgicos. Moclobemida, Pirlindol H) Outros antidepressivos FÁRMACO Mirtazapina (antidepressivo de 3ª geração) CARACTERÍSTICAS - Antagonista dos auto- e hetero-receptores α2 pré-juncionais centrais e dos receptores 5-HT2 e 5HT3 e histaminérgicos; - Pode causar sonolência, aumento do apetite e do peso (devendo-se por isso fazer uma dieta alimentar) e enjoo. Trazodona - Inibe a recaptação de serotonina; (antidepressivo - Antagonista dos receptores 5-HT2A pós-juncionais e histamínicos; de 2ª geração) - Provoca sonolência, enjoo, insónia, náuseas e agitação. - Antagonista dos auto- e hetero-receptores α2 pré-juncionais centrais; Mianserina - Reacções adversas semelhantes às dos antidepressivos tricíclicos; - Podem surgir alterações hematológicas, principalmente nos idosos. Nefazodona - Antagonista da recaptação de noradrenalina e serotonina; (antidepressivo - Antagonista dos receptores 5-HT2A pós-juncionais; de 3ª geração) - Provoca sonolência, enjoo, insónia, náuseas e agitação. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 27 APONTAMENTOS Bloqueia a recaptação de: Acção Fármaco Sedação 5-HT NA Dopamina antimuscarinica AMITRIPTILINA +++ +++ +++ ++ 0 AMOXAPINA ++ ++ + ++ + BUPROPIONA 0 0 +,0 +,0 + CITALOPRAM 0 0 0 0 0 CLOMIPRAMINA +++ ++ +++ +++ 0 DESIPRAMINA + + +++ +++ 0 DOXEPINA +++ +++ + + 0 FLUOXETINA + + 0,+ 0,+ 0,+ FLUVOXAMINA 0 0 +++ 0,+ 0,+ IMIPRAMINA ++ ++ +++ ++ 0 MAPROTILINA ++ ++ 0 +++ 0 MIRTAZAPINA +++ 0 0 0 0 NEFAZODONA ++ +++ 0,+ 0 0 NORTRIPTILINA ++ ++ +++ ++ 0 PAROXETINA + 0 +++ 0 0 PROTRIPTILINA 0 ++ ? +++ ? SERTRALINA + 0 +++ 0 0 TRAZODONA +++ 0 ++ 0 0 VENLAFAXINA 0 0 ++ ++ 0,+ 28 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Fármaco BIO DISP (%) Ligação a Prot. Plasm. (%) T1/2 (H) Metabolitos activos AMITRIPTILINA 31-61 82-96 31-46 Nortriptilina 80-200 AMOXAPINA n.d. n.d. 8 7-,8-Hidroxi n.d. BUPROPIONA 60-80 85 14-37 CITALOPRAM 51-93 70-80 23-75 Desmetil n.d. CLOMIPRAMINA n.d. n.d. 22-84 Desmetil 240-700 DESIPRAMINA 60-70 73-90 14-62 DOXEPINA 13-45 n.d. Ago-24 Desmetil 30-150 ESCITALOPRAM 80 56 27-59 5-Desmetil n.d. FLUOXETINA 70 94 24-96 Norfluoxetina n.d. FLUVOXAMINA >90 77 Jul-63 Nenhum n.d. IMIPRAMINA 29-77 76-95 Set-24 Desipramina >180 MAPROTILINA 66-75 88 21-52 Desmetil 200-300 MIRTAZAPINA n.d. n.d. 20-40 Desmetil n.d. NEFAZODONA 15-23 98 02-Abr NORTRIPTILINA 32-79 93-95 18-93 10-hidroxi 50-150 PAROXETINA 50 95 24 Nenhum n.d. PROTRIPTILINA 77-93 90-95 54-198 n.d. 70-170 SERTRALINA n.d. 98 22-35 Desmetil n.d. TRAZODONA n.d. n.d. 04-Set VENLAFAXINA n.d. 23-30 04-Out Hidroxi, triohidro, eritrohidro [Terapêuticas] (ng/mL) plasmáticas 25-100 Hidroxi, >125 triohidro,eritrohidro Hidroxi, m-clorofenil, n.d. piperazina m-cloro-, fenil-, piperazina O-Desmetil n.d. n.d. 2.3.4.1.1. Riscos da utilização de antidepressivos na gravidez e lactação FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 29 APONTAMENTOS A – Teratogénese Nem os antidepressivos tricíclicos nem os inibidores selectivos da recaptação de serotonina são associados a efeitos teratogénicos sérios. A exposição à fluoxetina ou a TCAs não parece afectar o QI global, o desenvolvimento comportamental nem a linguagem das crianças. Existe pouca informação disponível acerca da segurança dos inibidores da monoaminoxidase, bupropiona, nefazodona, trazodona e outros antidepressivos mais novos na gravidez. Adaptado de http://virtualpsy.locaweb.com.br/destaque_janela.php?cod=537&cor=#D3E5D0, 30 de Outubro de 2006-10-30 B - Toxicidade neonatal Os neonatos expostos no útero a TCAs podem apresentar sintomas usualmente leves e transitórios. O tratamento com TCAs ao longo da gravidez pode ocasionar síndrome de retirada no neonato com mioclonias, convulsões transitórias, taquipnéia, taquicardia, irritabilidade e sudorese profusa. Pode ser ainda registado obstipação intestinal e retenção urinária como consequência de efeitos anticolinérgicos. Os SSRIs podem ocasionar hipotonia, dificuldade na alimentação, hipoglicémia, hipotermia e agitação. Adaptado de http://virtualpsy.locaweb.com.br/destaque_janela.php?cod=537&cor=#D3E5D0, 30 de Outubro de 2006-10-30 C – Lactação A paroxetina, sertralina e nortriptilina apresentam, normalmente, níveis plasmáticos no recém-nascido extremamente baixos ou indetectáveis. Não foram registadas reacções adversas nos lactentes com essas medicações. A fluoxetina pode atingir níveis plasmáticos altos no recém-nascido, causando vómitos, diarreia, cólicas e diminuição do sono. Existem evidências de que a fluoxetina que passa para o leite materno pode causar diminuição da curva peso-crescimento, com uma média de 392 gramas a menos no 6º. mês. Adaptado de http://virtualpsy.locaweb.com.br/destaque_janela.php?cod=537&cor=#D3E5D0, 30 de Outubro de 2006-10-30 2.3.4.1.2. Perda de eficácia com o tempo 30 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Avaliação da adesão à terapêutica; • Aumentar a dose do antidepressivo; • Descontinuação do fármaco escolhido, por outro; • Associar à terapêutica, fármacos que aumentem a eficácia da terapêutica farmacológica seleccionada: o Amantadina; o Buspirona; o Pindolol. 2.3.4.2. Tratamento não farmacológico A) Fototerapia Estudos demonstraram existir uma relação entre a exposição à luz solar e as variações do humor. Isto porque a luz estimula a produção de melatonina, uma substância que interfere no humor. Devido à localização geográfica, os países Nórdicos Fototerapia são abrangidos alternados com por períodos períodos longos sem noite, sem luz solar favorecendo o aparecimento de depressões sazonais. Estas condições parecem estar relacionadas com as elevadas taxas de depressão nestes países. A fototerapia é recomendada em indivíduos que possuem desordens afectivas sazonais, perturbações do ritmo-circadianas ou problemas oftalmológicos ligeiros. Electroconvulsoterapia B) Electroconvulsoterapia A electroconvulsoterapia é a melhor terapêutica disponível para doentes com depressão em fase muito avançada, quando existe necessidade de resposta rápida (risco de suicídio) ou quando existem riscos (gravidez) ou falha da resposta de outros tratamentos, possuindo eficácia e segurança comprovadas. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 31 APONTAMENTOS Os choques induzidos provocam libertação de aminas no organismo humano, melhorando o prognóstico da patologia. Indivíduos com pressão intracraneana elevada, lesões cerebrais, enfarte do miocárdio recente, hemorragia intracerebral recente ou condições vasculares instáveis não podem ser submetidos a esta terapêutica. As principais reacções adversas descritas são transitórias, citando-se entre elas: disfunções cognitivas (confusão e perturbações da memória), disfunções cardiovasculares, apneia prolongada, mania, cefaleia, náuseas e miopatia. Podem surgir recorrências frequentes na ausência de farmacoterapia de manutenção. C) Psicoterapia A psicoterapia é outra opção terapêutica que deve ser instituída sempre que exista possibilidade e motivação. Dependendo da fase e do tipo de depressão, nem sempre corresponde à terapêutica de primeira opção. Pode ser instituída em simultâneo com a farmacoterapia quando se registam respostas parciais às terapêuticas instituídas ou quando as alterações do humor são crónicas. D) Erva-de-São-João - Hipericum perforatum Tradicionalmente esta planta foi utilizada durante muitos séculos, por mulheres «sábias», para combater a melancolia e ansiedade. É considerado um suplemento dos antidepressivos na melhoria do humor, aumentando a disponibilidade da serotonina, noradrenalina e dopamina nas sinapses neuronais. É também popular no tratamento Hipericum perforatum Erva de S. João de insónia, fadiga e sintomatologia associada à menopausa. O hipericão é o composto natural presente nesta planta responsável pelas propriedades citadas. 32 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 3 - DEPRESSÃO NO CONTEXTO DA DOENÇA BIPOLAR A doença bipolar é uma patologia caracterizada pela existência de episódios de mania alternados com episódios de depressão. Esta desordem afecta cerca de 1% da população dos EUA. Normalmente surge por volta dos 20 a 30 anos. No entanto, podem existir sintomas que indiciam o inicio desta doença na adolescência. A prevalência é igual nos dois sexos. No entanto, uma vez diagnosticada a doença, homens e mulheres parecem sofrer mais de episódios maníacos e depressivos, respectivamente. Existem critérios de diagnóstico que permitem identificar esta patologia (ver anexos, pág. 154). No episódio maníaco o estado de humor é marcado por uma elevação anormal e sustentada, caracterizada por autoestima exacerbada, diminuição do sono, distracção, excessivo envolvimento em actividades, entre outros. O diagnóstico diferencial é extremamente importante para identificar e separar os efeitos tóxicos causados pela administração de estimulantes simpaticomiméticos e a mania secundária induzida por hipertiroidismo, SIDA, desordens neurológicas (doenças de Huntington e Wilson) e acidentes cerebrovasculares. 3.1. Sintomatologia (ver pág.154) • Elação do humor; • Irritabilidade; • Redução do sono (2h/dia); • Verborreicos – abundância de palavras com poucas ideias; • Fuga de ideias – referem não conseguir acompanhar a velocidade do pensamento; • Distractibilidade - não são capazes de manter uma tarefa; • Agitação psicomotora; • Desinibição; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 33 APONTAMENTOS • Indiscrição sexual; • Envolvimento excessivo em actividades que lhes dão prazer; 3.2. Caso clínico J. M., uma professora solteira de 30 anos de idade, natural de Inglaterra, foi arrastada pelos pais ao Hospital, cada um deles puxando por um braço. Quando o médico entra na sala da consulta, a doente anda sem parar, cantando alto o «We Are The Champions». A atenção da doente transfere-se rapidamente para outra coisa e fala sobre 8 assuntos diferentes durante os 2 primeiros minutos da consulta. Embora à primeira vista J.M. se mostre amistosa e atrevida, oferecendo-se para mostrar ao médico uma contusão no cimo da coxa, quando ele sugere a sua hospitalização, enfurecese e ameaça agredi-lo. Este episódio teve início súbito há 10 dias, pouco tempo depois de J.M. ter rompido com o seu “Starry Night”, pintado em 1889 por Vincent van Gogh, é um quadro bastante associado às fases maníacas deste pintor. namorado. Desde essa altura passou a dormir somente algumas horas por noite, perdeu cerca de 4 quilos, encomendou livros escolares na ordem de vários milhões de euros para os seus alunos e tem feito dúzias de telefonemas interurbanos. Faltou às reuniões escolares de preparação do novo ano lectivo e iria começar as aulas durante a semana seguinte. Contudo, na altura em que se realizou o exame inicial, tinha reservado um bilhete de avião para o Brasil, com partida marcada para algumas horas mais tarde. Diagnóstico: Doença bipolar, episódio de mania. 34 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 3.3. Tratamento 3.3.1. Lítio O tratamento da mania é realizado através da administração oral de um ião inorgânico na forma de carbonato de lítio. O mecanismo de acção não é totalmente compreendido, suspeitando-se que este possa interferir com a formação de inosiltrifosfato e AMPc. Trata-se de um fármaco importante, não só no tratamento mas também na profilaxia, apresentando uma taxa de eficácia de 70 a 80% em 1 a 2 semanas. Os efeitos terapêuticos podem ser observados ao fim de 7-10 dias de tratamento. Durante este período, poderá ser administrado Lorazepam (1 a 2mg a cada 4 horas) ou Clonazepam (0,5 a 1mg a cada 4 horas) para controlar a agitação. Esta terapêutica apresenta bastantes inconvenientes, obrigando à monitorização sanguínea semanal do fármaco, devido à estreita janela terapêutica, especialmente quando os doentes apresentam concomitantemente doença renal. As reacções adversas graves são raras. Como principais reacções adversas citam-se: náuseas, sede, poliúria, hipotiroidismo, hipercalcémia, tremor, fraqueza, confusão mental, dificuldades de concentração, incoordenação, ataxia e teratogénese. A dose excessiva aguda causa confusão, convulsões e disritmias cardíacas. Estão ainda descritas interacções com IECAS, analgésicos, anti-hipertensores, cisapride, diuréticos, agonistas 5-HT1, metoclopramida, domperidona, relaxantes musculares, parassimpático-miméticos e teofilina. 3.3.2. Outros fármacos Estas terapêuticas possuem bastantes efeitos adversos, como apatia excessiva, entre outros, pelo que os doentes tendem a rejeitar estes medicamentos. A - Carbamazepina A carbamazepina é um anticonvulsivante que apresenta um espectro de reacções adversas descritas relacionadas essencialmente com o tubo digestivo, a pele e o sistema nervoso central. Deve-se realizar controlo hematológico antes e durante o tratamento, uma vez que existe risco de estabelecimento de anemia aplástica e agranulocitose. A carbamazepina possui ainda acção FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 35 APONTAMENTOS anticolinérgica, podendo desencadear ou agravar situações de glaucoma e sindromas confusionais em doentes idosos. B – Valproato Fármaco utilizado em pacientes que não respondem, respondem pouco ou não toleram a terapêutica com lítio. Verificou-se que a sua administração é vantajosa em pacientes que experimentam ciclos rápidos (ex.: mais de 4 episódios por ano) ou em pacientes que apresentam mania disfórica. É hepatotóxico e como tal, a função hepática deve ser avaliada antes e depois do início da medicação, a intervalos curtos, durante os primeiros seis meses. Como reacções adversas comuns citam-se: náuseas, vómitos, tremor aumento do peso e trombocitopenia. Encontram-se descritas interacções com o álcool e outros depressores do SNC, que levam à potenciação do efeito depressor. Anticonvulsivantes e barbitúricos aumentam os seus níveis plasmáticos quando co-administrados com valproato. A co-administração com ácido acetilsalicílico, dipiridamol e varfarina pode elevar o risco de hemorragia. A associação com clonazepam pode precipitar-se crises de ausências. Os salicilatos e a cimetidina podem aumentar os níveis do valproato e a colestiramina reduz a sua absorção. C – Antipsicóticos típicos Os antipsicóticos atípicos podem ser importantes no tratamento da mania aguda (para mais informações consultar pág.73), para controlar a agitação em doentes refractários às benzodiazepinas. Como efeitos adversos indesejáveis citam-se: reacções extrapiramidais, Parkinsonismo induzido, distonia, acatísia e discinésias. Como tal, a utilização destes fármacos encontra-se limitada. Cloropromazina, Haloperidol 36 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS D – Antipsicóticos atípicos Os antipsicóticos atípicos podem ser importantes no tratamento da mania aguda (para mais informações consultar pág. 73), para controlar a agitação em doentes refractários às benzodiazepinas. Parece existir maior tolerância, relativamente aos sintomas extrapiramidais, registando-se melhorias na qualidade de vida destes doentes. São eficazes em doses baixas, não induzindo efeitos adversos neurotóxicos. Podem ser utilizados em monoterapia ou em combinação com estabilizadores do humor tradicionais (lítio, valproato de sódio) ou carbamazepina, registando-se um aumento da adesão à terapêutica por parte dos doentes bipolares. Clozapina, Olanzapina, Quetiapina, Risperidona e Ziprazidona 3.3.3. Terapêuticas experimentais • Outros anticonvulsivantes: levetiracetam, fenitoína; • Tamoxifeno; • Mexiletine (antiarrítmico, anticonvulsivante, analgésico); • Ácidos gordos W3 - constituintes naturais das gorduras animais e vegetais. • Calcitonina; Nota: Na mania podem ainda ser utilizados: a Lamotrigina, Gabapentina, Topiramato, Benzodiazepinas como adjuvante (causando sedação), antidepressivos nas fases de depressão severa, devendo ser evitados no tratamento de manutenção uma vez que existe risco de precipitarem mania ou acelerarem a frequência dos ciclos. A perda da eficácia com o tempo obriga a adopção de uma terapêutica combinada. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 37 APONTAMENTOS 4 - PERTURBAÇÕES DA ANSIEDADE 4.1. Ansiedade Trata-se de uma sensação benéfica e fundamental para a competência social e profissional. No entanto, quando esta sensação é constante e exagerada, podem-se gerar conflitos que perturbam gravemente o indivíduo, evoluindo para uma situação patológica. A ansiedade, enquanto estado patológico, corresponde a 15-20% das diferentes situações clínicas apresentadas em psiquiatria. É uma desordem com mais semelhanças às neuroses que às psicoses, uma vez que o indivíduo é capaz de identificar a causa. A ansiedade reactiva é uma ansiedade “The Scream” - Edvard Munch que se inicia devido a um acontecimento/situação perturbadora. Por exemplo, quando é diagnosticada uma doença os pacientes geram apreensão em relação ao prognóstico da mesma. Por outro lado, existem fármacos, como os antidepressivos (ex.: fluoxetina) que são altamente ansiogénicos durante as primeiras semanas de administração. É por este motivo que muitos clínicos optam por fazer uma associação entre ansiolíticos e antidepressivos. Caso a ansiedade seja focalizada em algo, pode evoluir para uma fobia. A fobia é algo muito subjectivo que se caracteriza por um medo intenso focalizado num objecto/situação/espaço. 4.2. Ataques de pânico Por definição, são imprevisíveis e recorrentes. Surgem instantaneamente e caracterizamse por um aumento progressivo e abrupto dos sintomas durante 10 minutos. Passado cerca de 60 minutos estes sintomas desaparecem. Podem ser facilmente confundidos com problemas 38 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS cardiovasculares, respiratórios, neurológicos e endócrinos sendo fundamental a realização de diagnóstico diferencial. Parece existir prevalência de ataques de pânico em determinados períodos da vida, nomeadamente após a adolescência e nos adultos jovens. No entanto, existem casos onde se registam vários ataques de pânico no mesmo ano. Com o aumento da frequência dos ataques, estes indivíduos referem conseguir prevê-los através da identificação do aumento da ansiedade. O doente estabelece uma ligação entre o local, situação ou acontecimento em que surgem os ataques de pânico, passando a evitá-los. Este comportamento é designado por comportamento de evitamento e, quando generalizado, pode conduzir à restrição severa dos estilos de vida destes indivíduos. 4.2.1. Sintomatologia (ver pág.154) - Palpitações; - Sensação de morte iminente; - Hipersudorese; - Tremor; - Sensação de falta de ar e asfixia; - Sensação de choque eminente; - Sintomatologia GI: náuseas, cólicas, entre outros; - Alteração no equilibro motor; - Parestesias – alteração da percepção táctil; - Arrepios; - O indivíduo sente-se impotente para controlar os sintomas; - Rubor; - Sensação de levitação – os doentes relatam que durante os ataques de pânico, parecem «sair do seu próprio corpo» e observar a situação de cima; - Tensão muscular; - Formigueiro nas mãos. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 39 APONTAMENTOS 4.2.2. Agorafobia Patologia frequente nos pacientes que sofrem de ataques de pânico, muito embora existam indivíduos com ataques de pânicos mas sem agorafobia. Corresponde a um aumento da ansiedade ou medo adquirido e irracional relacionado com locais ou situações onde o indivíduo se sente desprotegido e inseguro. Os doentes relatam a sensação de que não vão conseguir escapar com vida dessas situações. Tratam-se de medos agorafóbicos que envolvem, tipicamente, determinados grupos característicos de situações: estar fora de casa não acompanhado, estar no meio de uma multidão ou permanecer numa fila, estar numa ponte, viajar de autocarro, comboio ou automóvel. 4.2.3. Caso clínico B. é uma mulher de negócios com 27 anos de idade e uma história de 3 anos de ataques de pânico. O seu primeiro ataque de pânico ocorreu subitamente quando estava em casa a ver televisão. Este facto passou-se 3 meses após a morte do avô paterno e 1 mês depois de ela ter anunciado a sua intenção de se casar. O ataque começou por uma sensação de choque eléctrico que lhe subia pela coluna vertebral, acompanhada por sensação de terror. O coração começou a bater rapidamente, as mãos crisparam-se e mal podia respirar. A doente sentia-se quente, trémula e desorientada, convencida de que ia morrer rapidamente. Embora quase não conseguisse falar, chamou um médico. Cerca de 10 minutos depois, a sensação de terror tinha-se desvanecido e os outros sintomas estavam a desaparecer, mas ainda se sentia fraca e atemorizada. Um exame médico completo excluiu qualquer estado físico geral, não existindo evidência do uso de substâncias. Durante a semana seguinte, B. teve mais 5 episódios de pânico que ocorreram inesperadamente em diferentes situações. Os episódios caracterizavam-se por súbito aparecimento de sensações de choque eléctrico na coluna vertebral, palpitações cardíacas, tonturas, formigueiros nos dedos, medo de enlouquecer e sensação de irrealidade. B. Aceitou a prescrição de uma benzodiazepina, mas recusou-se a consultar o psiquiatra recomendado pelo médico de família. Determinada a não deixar que os sintomas interferissem com a sua vida, compeliu-se a continuar a trabalhar. Algumas semanas mais tarde, a frequência e a intensidade dos ataques começaram a diminuir, mas B. continuou a ter episódios de pânico intermitentes 40 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS várias vezes por mês, durante os 2 anos seguintes. Estes ocorriam normalmente quando estava no metro ou no autocarro superlotados, quando se estava a exercitar numa bicicleta estática, quando se encontrava na expectativa de uma confrontação ou quando estava relaxada na cama, durante a noite. Depois de uma promoção profissional recente, a frequência dos ataques de pânico aumentou para um ritmo de várias vezes por semana. Passou a ficar 14h/dia no emprego, embora sentisse que a sua ansiedade a estava a tornar indecisa e a diminuir a sua eficiência. Andava permanentemente preocupada com o facto de poder ser despedida. Embora se sinta muitas vezes desconfortável em lojas, no cinema e em restaurantes superlotados, B. continua a forçar-se a ir a estes lugares; todavia, evita andar de metro e conduzir em túneis. B. veio à consulta porque os seus sintomas pioraram e o noivo leu algures que existiam novos tratamentos para os sintomas de pânico. Não obstante, parece pouco empenhada no exame médico. Reservada e desconfiada, replica frequentemente às questões com “Para que interessa tudo isso?”. Parece sensível às críticas e confessa ter receio de que discutir os seus problemas com um terapeuta apenas sirva para lhe agravar a ansiedade. Diagnóstico: Perturbação de pânico sem agorafobia. 4.2.4. Etiologia A etiologia destas patologias é desconhecida, mas sabe-se que existe uma predisposição genética. Por outro lado, indivíduos que sofrem de ataques de pânico parecem dispor de alterações ao nível do sistema nervoso autónomo. Isto é, o limiar da estimulação do SN periférico encontra-se diminuído. Em cerca de 65% dos pacientes (≈2/3) é possível evocar ataques de pânico através da infusão de lactato de sódio, iombina e dióxido de carbono. A activação noradrenérgica no locus coeruleus e dos neurónios serotoninérgicos na “dorsal raphe” encontra-se também descrita nestes casos. 4.2.5. Tratamento Nas situações agudas deve-se proceder à administração de benzodiazepinas e outros ansiolíticos como definem as guidelines. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 41 APONTAMENTOS As benzodiazepinas não tratam a doença. Apenas aliviam os sintomas nas situações agudas. Isto porque quer a biodisponibilidade quer a lipossolubilidade são maiores nestes fármacos, atingindo rapidamente o SNC onde exercem os seus efeitos ao potenciar os efeitos inibitórios do GABA. O tratamento da patologia é realizado recorrendo à administração de SSRIs, isto é, inibidores selectivos da recaptação de serotonina (ex.: fluoxetina, paroxetina, entre outros). O tratamento tem como objectivo diminuir a frequência e intensidade dos ataques de pânico. Se o doente reconhece as situações ou sensações que antecedem os ataques de pânico, deve utilizar as benzodiazepinas como tratamento sintomático no ataque agudo. No entanto, nem todas as benzodiazepinas devem ser utilizadas no tratamento de situações agudas (ex.: Clonazepam – actua mais lentamente). A buspirona, ao contrário das benzodazepinas, não causa dependência nem sonolência, sendo também utilizada no tratamento desta desordem. É essencial a existência de pareceres especializados na área da psiquiatria, quando se registam estas patologias. Abordagem cognitiva Abordagem comportamental O doente deve conhecer Tentar expor o indivíduo ao medo de a sua patologia. forma a existir confrontamento e respectiva dessensibilização Fármacos Antidepressivos + Benzodiazepinas 42 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Fármaco Acção Estrutura molecular Outras características T ½ ,h Benzodiazepinas Diazepam (Valium®) Flurazepam (Dalmane®) Triazolam (Halcion®) Lorazepam (Ativan®) Rápida 20-70 Possui metabolitos activos; causa alguma sedação; Flurazepam Rápida 30-100 metabolitos é um pró-farmaco; activos; causa possui alguma sedação; Sem Intermédia 1.5-5 metabolitos confusão e activos; delírio pode induzir especialmente nos idosos; Intermédia 10-20 Sem metabolitos activos; conjugação directa com glucuronídos no fígado; Possui metabolitos activos; pouca sedação; Alprazolam (Xanax®) Intermédia 12-15 pode ter actividade antidepressiva e antipânico; causa dependência e tolerância facilmente; Clordiazepóxido (Librium®) Intermédia 5-30 Possui metabolitos activos; causa sedação moderada; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 43 APONTAMENTOS Sem Oxazepam Lenta (Serax®) 5-15 metabolitos activos; conjugação directa com glucuronídos; quase sem efeito sedativo; Temazepam Clonazepam (Klonopin®) Lenta 9-12 Lenta 18-50 Sem metabolitos activos; causa sedação moderada; Sem metabolitos activos; causa sedação moderada; Outros ansiolíticos Possui metabolitos activos dose 10-20mg Buspirona (BUSPAR®) 2 semanas 2-3 tid; não causa sedação; o álcool não potencia os seus efeitos; útil em pacientes com demência ou traumatismo craniano; 4.3. Desordem de ansiedade generalizada Corresponde a uma preocupação irreal, com grande incidência familiar, em que o paciente não consegue identificar a causa aparente dos seus sintomas. Crianças com muitos medos, em adultos tornam-se indivíduos particularmente afectados por estas desordens. Pode ser observado, em 80% dos casos, agregação a desordens como fobias sociais, depressão, entre outras, abuso de álcool ou de fármacos sedativos e ansiolíticos. Os sintomas característicos dos ataques de pânico como palpitações, taquicardia, falta de ar, entre outros, não estão presentes nesta patologia. O indivíduo identifica que tudo o perturba, mesmo as coisas mais insignificantes, gerando-se uma irritabilidade e preocupação excessiva não 44 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS controlável. Esta desordem pode constituir um factor predisponente para outras patologias como doenças cardiovasculares. Muitos dos indivíduos com desordens de ansiedade generalizada afirmam que sempre sofreram de ansiedade e nervosismo durante a sua vida. Embora mais de metade dos que se apresentam para tratamento relatem início na infância ou adolescência, não é raro o início dar-se após os 20 anos. O curso desta patologia é crónico, embora flutuante, piorando durante os períodos de stress. Os sintomas surgem e permanecem durante 6 meses. 4.3.1. Sintomatologia - Inquietação; - Humor; - Insónia inicial; - Tensão muscular; - Irritabilidade; - Dificuldade em concentrar-se numa - Distúrbios GI; actividade; - Cansaço, fadiga; 4.3.2. Caso clínico C.A., é uma mulher de 31 anos, empregada bancária há 5 anos. Tem desempenhado as suas funções de forma irrepreensível. Há 3 meses atrás começou a faltar ao emprego e a irritar-se facilmente com alguns clientes e colegas de trabalho. Durante a consulta no médico da empresa queixou-se de cansaço e tensão, problemas de estômago e diarreia frequentes. Não tem história anterior de doença mental; admite enervar-se com «pequenas coisas». Para contrariar este estado, a paciente diz tomar longos banhos de imersão. O exame físico revelou-se normal. Não tem história familiar de doença mental. O exame mental foi baseado na sua apresentação e comportamento, humor, componente sensorial e pensamentos: FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 45 APONTAMENTOS - Apresentação e comportamento: a paciente apresenta-se cuidadosamente vestida e com bom aspecto, fala com discurso coerente mas abana constantemente a perna direita, batendo com o pé direito, suavemente, na mesa. Refere que, ocasionalmente, tem dificuldade em adormecer, apesar de dormir bem durante o resto da noite. - Humor: ansiosa e preocupada com a avaliação clínica. - Exame sensorial: orientado em relação ao tempo, ao lugar e à sua pessoa. - Pensamentos: nega ter qualquer tipo de alucinações visuais ou auditivas. Declara ter, por vezes, dificuldade em falar, ser incapaz de relaxar e ficar agitada e irrequieta facilmente. Admite ser difícil para ela trabalhar, actualmente, e pretende melhorar a sua performance. Mostra boa capacidade de auto-análise e avaliação e está motivada para tratamento. Nega ter ideação suicida. Diagnóstico: Desordem de ansiedade generalizada. 4.3.3. Tratamento O tratamento de desordens de ansiedade é realizado através da administração de benzodiazepinas. Estas actuam em receptores específicos, localizados na estrutura do receptor GABAA, sendo ansiolíticas. Podem modificar o sono desde que se atinjam as doses eficazes. As benzodiazepinas distinguem-se essencialmente pelas propriedades farmacocinéticas. Nesta patologia, não existem preocupações que os fármacos actuem imediatamente. A dose deve ser a mínima necessária, não se recomendando a administração prolongada por mais de 1 mês (risco de dependência). Nota: o diazepam (Valium ®) é também utilizado como relaxante muscular, préanestésico, ansiolítico e anticonvulsivante, estando disponíveis formulações para administração rectal (útil quando se pretende administrar a crianças ou doentes cujas características impeçam a administração do fármaco por outras vias). 4.3.3.1. Benzodiazepinas A – Metabolismo • Oxidação hepática e conjugação com ácido glucorónico. Lorazepam, lormetazepam, oxazepam e temazepam apenas sofrem conjugação; clonazepam e nitrazepam sofrem nitroredução; 46 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • O compromisso da oxidação (idoso, doença hepática, inibidores metabólicos) favorece a elevação das concentrações plasmáticas de benzodiazepinas e/ou dos seus metabolitos; • Clobazepam (desmetilclobazepam), clorazepato, clordiazepóxido, diazepam e prazepam (desmetildiazepam), flunitrazepam (desmetilflunitrazepam), flurazepam (desalquilflurazepam) e quazepam (oxoquazepam e desalquilflurazepam) originam metabolitos activos com acção muito longa (T½ ≈ 100h); • O clorazepato é um pró-fármaco (DMDZ) activado em meio ácido. B – Acção/Distribuição • Quanto à velocidade de absorção as benzodiazepinas são lipofílicas sendo rapidamente absorvidas e distribuídas pelo SNC. Possuem um início de acção rápido (30-60 min) e intenso; •A distribuição é favorecida pela lipofilicidade, nomeadamente pelo tecido adiposo. Consequentemente o efeito é curto; • Quanto ao potencial de abuso, alguns doentes sentem rápido início de acção, ao passo que outros sentem tonturas ou perda de controlo e euforia; • Diazepam, clorazepato > lorazepam, oxazepam > clordiazepóxido • A via IM deve ser evitada para o diazepam e clordiazepóxido uma vez que pode provocar absorção variável (velocidade e extensão). C – Excreção renal • Tempo de semi-vida curto (alprazolam, lorazepam, oxazepam), atingindo rapidamente Css, sendo o risco de acumulação mínimo; • Devem ser administrados em várias tomas diárias de dose parcial; • As benzodiazepinas de tempo de semi-vida longo devem ser administradas 1x/dia ao deitar. D – Ligação a proteínas plasmáticas • Elevada ligação às proteínas plasmáticas, especialmente nas de tempo de semi-vida e tempo de eliminação longo. E – Reacções adversas • Depressão do SNC, tonturas, sedação, compromisso psicomotor, ataxia, desorientação, confusão, irritabilidade, agressão e excitação; • Compromisso da memória anterógrada (deficiente armazenamento da memória), sobretudo com benzodiazepinas de elevada afinidade para o receptor (midazolam, lorazepam). FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 47 APONTAMENTOS F – Abuso e dependência • O risco de abuso é maior em doentes com história de abuso de outros fármacos (álcool, sedativos); • O risco de dependência resulta da cronicidade da doença; • As benzodiazepinas de curta duração são as que têm maior potencial para induzir dependência; • Em casos de intoxicação está indicado o flumazenilo. G – Tolerância • Frequente para o efeito sedativo, relaxante muscular e anticonvulsivante; • Raro para o efeito ansiolítico. H – Doentes geriátricos/crianças • Reacções paradoxais – frequentes nas crianças e idosos. Caracteriza-se por irritabilidade, agressão, excitação, pesadelos, alucinações, ilusões, comportamento inadequado, ataques de raiva, entre outros. Quando isto ocorre o tratamento deve ser imediatamente suspenso. I – Gravidez e aleitamento • Contra-indicadas. No entanto o Midazolam é utilizado como pré-anestésico em cirurgias e partos. J – Doença hepática • Risco de acumulação e complicações subsequentes. L – Descontinuação da terapêutica • Sintomas rebound (efeito ricochete): regresso imediato mas transiente aos sintomas iniciais, com maior intensidade. Este fenómeno é mais frequente em benzodiazepinas de tempo de semi-vida curto; • Recorrência: regresso aos sintomas iniciais com igual intensidade; • Síndroma de abstinência: presença de novos sintomas acompanhados de agravamento dos sintomas pré-existentes; • Ansiedade, insónia, agitação, tensão muscular, irritabilidade. Náuseas, visão turva, diaforese, pesadelos, depressão, ataxia (menos frequente). Tinite, confusão, alucinações, convulsões, psicose (raro); 48 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Aparecimento mais precoce (24-48h vs 3-8 dias) e intenso com benzodiazepinas de tempo de semi-vida curto, doses elevadas e uso prolongado (>3-6 semanas); • Pode ser minimizado diminuindo progressivamente a dose (ex: 25%/semana até 50% e depois 1/8 cada 4-7 dias). Com benzodiazepinas de tempo de semi-vida curto pode trocarse por uma benzodiazepinas de tempo de semi-vida longo antes da suspensão da terapêutica. M – Interacções • Farmacodinâmicas: álcool e outros depressores do SNC; • Farmacocinéticas (ex.: a cimetidina diminui a metabolização hepática do diazepam potenciando a acção deste); • Fármacos de acção central (neurolépticos, tranquilizantes, antidepressivos, hipnóticos, analgésicos, narcóticos, álcool) quando co-administrados com benzodiazepinas provocam mútua intensificação de acção; • Relaxantes musculares: intensificação de acção; • Cimetidina: intensificação do efeito sedativo do diazepam; • Dissulfiram: atraso do catabolismo do diazepam; • Nos doentes sujeitos a tratamento permanente com outros fármacos como anti- hipertensores, Bloqueadores β, glicos ídeos cardíacos, anti -coagulantes, antidiabéticos e contraceptivos devem ser tomadas precauções aquando da co-administração de benzodiazepinas; • A co-administração com analgésicos narcóticos pode provocar aumento da euforia e da dependência psíquica; • Substâncias que inibem certas enzimas hepáticas (particularmente o citocromo P450) podem potenciar a actividade das benzodiazepinas. Este efeito, embora em menor grau, também é registado nas benzodiazepinas metabolizadas apenas por conjugação. N – Administração • A terapêutica deve ser monitorizada, devendo a administração ser inferior a 4 a 6 semanas (dependência vs recorrência); • A administração pode ser intermitente (3-4 semanas) quando os sintomas são recorrentes ou contínua quando os sintomas são persistentes; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 49 APONTAMENTOS O diazepam pode ser administrado por via oral, IV e IM (solução não-aquosa irritante) e • rectal (crianças, doentes agitados ou com convulsões). O midazolam pode ser administrado IV em solução aquosa. Ansiedade Acção intermédia Acção curta (tempo de semi-vida de 6-12h) • • Acção prolongada (tempo de semi-vida de 12-24h) Alprazolam (ataques de • Bromazepam; • Lorazepam (utilizado na pânico); insónia, como indutor da Oxazepam. anestesia e no mal epiléptico (tempo de semi-vida de >24h) • Clobazam; • Clorazepato dipotássico • Clorodiazepóxido (abstinência (epilepsia); alcoólica); • [i.v.]). muscular, anticonvulsivante); • Acção muito curta • Midazolam (meios de diagnóstico); • Triazolam; Acção curta • Brotizolam; • Estazolam; • Zoplicone* (possui • Flunitrazepam; • Lormetrazepam. • Zolpidem*. Prazepam. Insónia Acção intermédia • Temazepam; algumas propriedades Diazepam (relaxante Acção prolongada • Flurazepam; • Quazepam. aditivas). *Fármacos agonistas dos receptores das benzodiazepinas, mas que não são benzodiazepinas. Anticonvulsivante Pré-anestésico Diazepam Clonazepam Flunitrazepam Diazepam Midazolam Nitrazepam 4.3.3.2. Buspirona • É uma azopirona; • Não actua no receptor das benzodiazepinas; • Actua como agonista parcial dos receptores 5-HT1A; • Provável actividade agonista/antagonista dos receptores da dopamina; • Causa efeitos ansiolíticos que demoram algum tempo a surgir, acompanhados por poucos efeitos sedativos; • Não apresenta propriedades anticonvulsivantes, relaxantes musculares, hipnóticas ou compromisso motor; • 50 Não produz tolerância, dependência nem síndrome de abstinência; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Não interactua com o álcool; • Não tem potencial de abuso ou desinibitório; • Sofre extenso efeito de primeira passagem; • Demora algumas semanas a desenvolver efeito ansiolítico (4-6 semanas); • Fármaco de interesse na ansiedade crónica persistente ou casos de história de abuso de álcool ou outros fármacos; • Sem interesse nas situações que requerem efeito ansiolítico imediato ou “em SOS”; • Encontra-se contra-indicada na gravidez, lactação e nas crianças. Deve-se ter especial atenção nos casos de insuficiência renal ou hepática; • Reacções adversas: parestesias, tonturas, cefaleias, nervosismo, sonolência, alteração dos sonhos, diminuição da concentração, excitação, alterações do humor, taquicardia, palpitações, visão turva, náuseas, vómitos, boca seca, dor abdominal/gástrica, diarreia, obstipação, frequência e hesitação urinária, artralgias, hiperventilação, rash, edema, prurido, afrontamentos, queda do cabelo, pele seca, cefaleias, fadiga e astenia. 4.4. Doenças fóbicas Medo marcado e persistente de uma situação ou objecto. A exposição destes indivíduos ao objecto/situação em causa, resulta num aumento de ansiedade imediata, podendo alterar o comportamento do indivíduo. - Algumas resultando fobias do são “aprendidas”, processo sócio-cultural “Visage of War”, Salvador Dali onde os indivíduos se incluem; - Algumas possuem função protectora (ex.: medo de cobras), não alterando muito o comportamento social; - Surgem esporadicamente, uma vez que na maioria dos casos existe a possibilidade de evitar o estímulo fóbico. - Fobias comuns: claustrofobia, fobias sociais, entre outras; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 51 APONTAMENTOS Tipos de fobia Tipo animal Medo de animais ou insectos (ex.: aracnofobia). Normalmente estas fobias desenvolvem-se na infância. Tipo ambiente natural Medo de objectos do ambiente natural (ex.: tempestades, alturas, água). Normalmente estas fobias desenvolvem-se na infância. Tipo sangue-injecções-feridas Medo de ver sangue ou ferimentos, de receber injecções ou submeter-se a outros procedimentos médicos invasivos. Trata-se de uma fobia bastante comum. Tipo situacional Medo de situações especificas (ex.: andar de transportes públicos, túneis, pontes, elevadores aviões, permanecer em locais fechados, entre outros). Trata-se de uma fobia com distribuição bimodal de idade de início, com um pico na infância e outro aos 20 anos. Outro tipo Medo causado por outros estímulos: • Medo de situações que podem conduzir à asfixia, vómitos, infecção; • Medo de “espaço” – nesta fobia os indivíduos temem cair quando afastados de paredes ou outros meios de • Medo de sons altos; • Medo de personagens em trajes de fantasia (ex.: palhaços), muito comum entre as crianças; apoio físico; Ordem de frequência das fobias Tipo situacional > Tipo ambiente natural > Tipo sangue-injecção-ferimentos > Tipo animal Adaptado de http://www.psicologia.com.pt/instrumentos/dsm_cid/dsm.php, 30 de Outubro de 2006 A presença de uma fobia de um determinado subtipo aumenta a probabilidade de desenvolver outra fobia do mesmo subtipo (ex.: medo de gatos e de cobras). Ao contrário das restantes perturbações, estas situações não são muito frequentes. Mas em determinados casos, quando as fobias afectam o estilo de vida dos indivíduos, estes devem ser tratados. 4.4.1. Caso clínico D. é um interno geral de 26 anos. Tem uma história de vários anos de extremo mal-estar provocado pela ideia de ter de remover cirurgicamente uma unha de um dedo da mão ou do pé a um doente. Ouviu pela primeira vez a descrição deste processo quando se preparava para entrar na Faculdade. Recorda-se de ter tido náuseas, sensação de desmaio e aversão ao pensar em executar esta intervenção, embora não tivesse a mesma sensibilidade em relação a quaisquer outras intervenções. Afirma que preferia “extrair uma barata do ouvido de uma criança” a ter de extrair uma unha. D. foi uma criança activa que tinha frequentemente pequenos acidentes que exigiam consulta ao médico de família. Teve uma série de rupturas de ligamentos e fracturas e 52 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS recorda-se de ter ficado com um dedo entalado numa porta quando tinha 6 anos de idade. Lembra-se de ver o dedo inchado e com hematoma e de a unha acabar por cair quando o dedo ficou curado. Embora não se recorde de ter ficado excessivamente apreensivo com as visitas ao médico, lembra-se de ver a mãe empalidecer e parecer enjoada sempre que ele tinha de levar uma injecção ou ser suturado. Durante a Faculdade, D. conseguiu evitar ter de executar uma remoção de unha, mas, enquanto estudante do 4º ano, teve de observar este procedimento. Colocou-se tão distante quanto lhe era possível na sala de observações e viu o médico extrair uma unha do pé. Começou a sentir enjoo, suores, o coração descompassado, começando a sentir-se enfraquecer. Viu-se obrigado a sentar-se para não desmaiar. Ele explica que «as unhas são para estar no seu lugar» e que não pode deixar de pensar na «dor excruciante» que o doente poderia sentir caso não estivesse totalmente anestesiado. Durante os 2 primeiros anos de internato, D. tornou-se conhecido pelo seu desejo de executar intervenções cirúrgicas. Ofereceuse muitas vezes como voluntário para ajudar colegas e parecia apreciar intervenções como reduções, alinhamento de articulações e mesmo incisão e drenagem de quistos e queimaduras, e suturar lacerações. Nenhum dos seus colegas se apercebeu de que ele nunca tinha extraído uma unha – procedimento que era frequente no serviço em que estava. Durante um serviço de urgência em que era o único médico disponível, foi trazida à consulta uma doente jovem que necessitava que lhe removessem uma unha. Incapaz de executar esta intervenção, telefonou para casa de uma colega e persuadiu-a a vir ajudá-lo. Ela concordou, sob condição de que ele consultasse um terapeuta para resolver este problema. Diagnóstico: Fobia específica, tipo sangue-injecções-feridas. 4.4.2. Tratamento Os bloqueadores β (ex.: propranolol 20 a 40mg) evitam os sinais e sintomas de ansiedade. As benzodiazepinas podem ser úteis, mas há que ponderar todos efeitos adversos associadas à administração contínua destes fármacos. Estes indivíduos devem procurar desenhar estratégias cognitivas e comportamentais, que tentem orientá-los para aumentar o conhecimento das suas fobias. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 53 APONTAMENTOS Terapia de dessensibilização – corresponde a uma terapia de choque em que se expõe o doente à situação/objecto que lhe causa medo. Terapêutica de dessensibilização Abordagem cognitiva Abordagem comportamental O doente deve conhecer Tentar expor o indivíduo ao medo de a sua patologia. forma a existir confrontamento e respectiva dessensibilização Fármacos Bloqueadores β + Benzodiazepinas 4.5. OUTRAS PERTURBAÇÕES: - Stress pós traumático; - Perturbações obcessivo-compulsivas: Ex.: 54 Compulsão pela higiene. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Questionário 1. Relativamente ao caso clínico 2.3.3. (pág. 23): 1.1. Sublinhe os sinais e sintomas de depressão que a doente apresenta? 1.2. Quais seriam e porquê a(s) melhores opções terapêuticas no caso de M.J.? Explique as opções terapêuticas que escolheu. SSRIs. Quais?______________________________________________________ TCAs. Quais?_______________________________________________________ Benzodiazepinas. Quais?______________________________________________ Antipsicóticos típicos. Quais?__________________________________________ Antipsicóticos atípicos. Quais?_________________________________________ Lítio Carbamazepina Buspirona Valproato iMAOs. Quais?______________________________________________________ iMAOA. Quais?______________________________________________________ Inibidores selectivos da recaptação de dopamina. Quais?____________________ Inibidores selectivos da recaptação de noradrenalina. Quais?_________________ Outros antidepressivos. Quais?_________________________________________ Electroconvulsoterapia Psicoterapia Fototerapia Erva-de-S. João Internamente hospitalar Barbitúricos. Quais?__________________________________________________ Sedativos. Quais?____________________________________________________ Terapia de dessensibilização. Bloqueadores β. Quais?_______________________________________________ FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 55 APONTAMENTOS 1.3. Relativamente a cada uma das situações seguintes seleccione, no quadro, a(s) melhor opção terapêutica. A) Executiva com actividade profissional extremamente activa B) Vive na Noruega e estarmos actualmente no Inverno C) Homem de 75 anos com hipertrofia benigna da próstata D) Ideação suicida E) Diabético F) Homem de 80 anos com agitação psicomotora marcada G) Grávida A B C D E F G Electroconvulsoterapia TCAs SSRIs iMAOs iMAOA Barbitúricos Lítio Buspirona Carbamazepina Valproato Antipsicóticos típicos Antipsicóticos atipicos Fototerapia Erva-de-S. João Inibidores selectivos da recaptação de selectivos da recaptação de dopamina Inibidores noradrenalina Outros antidepressivos Sedativos Bloqueadores β Terapêutica de dessensibilização Internamento Hospitalar Psicoterapia 1.3.1. Caso tenha seleccionado terapêuticas farmacológicas, refira para cada uma das situações do quadro anterior, um exemplo e justifique. 56 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 2. Relativamente ao caso clínico 3.2. (pág. 34): 2.1. Sublinhe os sinais e sintomas de mania que a doente apresenta? 2.2. Quais seriam e porquê a(s) melhores opções terapêuticas no caso de J.M.? Explique as opções terapêuticas que escolheu. SSRIs. Quais?____________________________________________________ TCAs. Quais?_____________________________________________________ Benzodiazepinas. Quais?____________________________________________ Antipsicóticos típicos. Quais?_________________________________________ Antipsicóticos atípicos. Quais?________________________________________ Lítio Carbamazepina Buspirona Valproato iMAOs. Quais?______________________________________________________ iMAOA. Quais?______________________________________________________ Inibidores selectivos da recaptação de dopamina. Quais?____________________ Inibidores selectivos da recaptação de noradrenalina. Quais?_________________ Outros antidepressivos. Quais?_________________________________________ Electroconvulsoterapia Psicoterapia Fototerapia Erva-de-S. João Internamente hospitalar Barbituricos. Quais?__________________________________________________ Sedativos. Quais?____________________________________________________ Terapêuticas experimentais. Quais?______________________________________ Terapia de dessensibilização. Bloqueadores β. Quais?_______________________________________________ FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 57 APONTAMENTOS 3. Relativamente ao caso clínico 4.2.3. (pág. 40): 3.1. Sublinhe os sinais e sintomas de perturbação de pânico sem agorafobia que a doente apresenta? 3.2. Quais seriam e porquê a(s) melhores opções terapêuticas no caso de B.? Explique as opções terapêuticas que escolheu. SSRIs. Quais?____________________________________________________ TCAs. Quais?_____________________________________________________ Benzodiazepinas. Quais?____________________________________________ Antipsicóticos típicos. Quais?_________________________________________ Antipsicóticos atípicos. Quais?________________________________________ Lítio Carbamazepina Buspirona Valproato iMAOs. Quais?______________________________________________________ iMAOA. Quais?______________________________________________________ Inibidores selectivos da recaptação de dopamina. Quais?____________________ Inibidores selectivos da recaptação de noradrenalina. Quais?_________________ Outros antidepressivos. Quais?_________________________________________ Electroconvulsoterapia Psicoterapia Fototerapia Erva-de-S. João Internamente hospitalar Barbituricos. Quais?__________________________________________________ Sedativos. Quais?____________________________________________________ Terapêuticas experimentais. Quais?______________________________________ Terapia de dessensibilização. Bloqueadores β. Quais?________________________________________________ 58 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 4. Relativamente ao caso clínico 4.3.2. (pág. 45): 4.1. Sublinhe os sinais e sintomas da desordem de ansiedade generalizada que a doente apresenta? 4.2. Quais seriam e porquê a(s) melhores opções terapêuticas no caso de C.A.? Explique as opções terapêuticas que escolheu. SSRIs. Quais?____________________________________________________ TCAs. Quais?_____________________________________________________ Benzodiazepinas. Quais?____________________________________________ Antipsicóticos típicos. Quais?_________________________________________ Antipsicóticos atípicos. Quais?________________________________________ Lítio Carbamazepina Buspirona Valproato iMAOs. Quais?______________________________________________________ iMAOA. Quais?______________________________________________________ Inibidores selectivos da recaptação de dopamina. Quais?____________________ Inibidores selectivos da recaptação de noradrenalina. Quais?_________________ Outros antidepressivos. Quais?_________________________________________ Electroconvulsoterapia Psicoterapia Fototerapia Erva-de-S. João Internamente hospitalar Barbituricos. Quais?__________________________________________________ Sedativos. Quais?____________________________________________________ Terapêuticas experimentais. Quais?______________________________________ Terapia de dessensibilização. Bloqueadores β. Quais?________________________________________________ FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 59 APONTAMENTOS 4.3. Foi prescrito diazepam, 5mg/3x por dia, durante 30 dias. Após esse período, C.A. revelou que o diazepam tinha sido muito eficaz na redução da sua ansiedade. 4.3.1. Que factores foram importantes para selecção do Diazepam? 4.3.2. Qual a duração razoável do tratamento? 4.3.3. Que vias de administração alternativas à via oral existem para o diazepam e quais as vantagens/desvantagens? 4.4. C.A. admite tomar 6-8 cafés/dia e fumar 2 maços de tabaco/dia. Quando se sente mais ansiosa, ou fuma ou bebe mais um café. Foi-lhe prescrito Cimetidina. Quais as possíveis interacções que se podem verificar com o Diazepam? 4.5. Imagine-se que C.A. tem 51 anos, 80 kg e 1,62 m de altura. Foi-lhe prescrito diazepam 10 mg/2x ao dia. Entretanto, C.A. procurou uma clínica de estética para melhorar a sua aparência e perdeu 15 kg em 4 semanas. Os filhos começaram a reparar que C.A. se apresentava algo sonolenta, confusa e fatigada. Que factores poderão justificar estes sintomas? 60 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 5. Relativamente ao caso clínico 4.4.1. (pág. 52): 5.1. Sublinhe os sinais e sintomas de fobia que o doente apresenta? 5.2. Quais seriam e porquê a(s) melhores opções terapêuticas no caso de D.? Explique as opções terapêuticas que escolheu. SSRIs. Quais?____________________________________________________ TCAs. Quais?_____________________________________________________ Benzodiazepinas. Quais?____________________________________________ Antipsicóticos típicos. Quais?_________________________________________ Antipsicóticos atípicos. Quais?________________________________________ Lítio Carbamazepina Buspirona Valproato iMAOs. Quais?______________________________________________________ iMAOA. Quais?______________________________________________________ Inibidores selectivos da recaptação de dopamina. Quais?____________________ Inibidores selectivos da recaptação de noradrenalina. Quais?_________________ Outros antidepressivos. Quais?_________________________________________ Electroconvulsoterapia Psicoterapia Fototerapia Erva-de-S. João Internamente hospitalar Barbituricos. Quais?__________________________________________________ Sedativos. Quais?____________________________________________________ Terapêuticas experimentais. Quais?______________________________________ Terapia de dessensibilização. Bloqueadores β. Quais?________________________________________________ FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 61 APONTAMENTOS 6. Considere o seguinte caso: L. é uma mulher, 55 anos de idade, natural de Braga, com um filho formado em enfermagem e uma filha formada em medicina. L. apareceu recentemente, sem aviso prévio, no Hospital Universitário de Coimbra, onde a filha trabalha, com o intuito de lhe fazer uma visita surpresa. Apresentava-se irrequieta, desinibida e extremamente faladora. Interagiu de imediato com os doentes presentes na sala de espera, começando a distribuir gratuitamente cafés e bolos que comprava no bar do hospital. Contava incessantemente a todos, que a sua filha era médica naquele hospital. A filha, ao saber da presença da mãe e do seu estado, procurou-a imediatamente por todos os serviços, encontrando-a a falar interessada e aceleradamente com uma enfermeira acerca da cor e estado do seu cabelo. Ao ser questionada pela filha, L. assumiu que tinha interrompido a administração de lítio à duas semanas atrás, devido à apatia extrema que lhe causava, referindo que «parecia um zombie, mas que agora se sentia completamente curada». Apresentava-se super animada, contando de imediato à filha o seu plano para abrir uma cadeia de lojas de decoração que, segundo esta, iriam ter grande sucesso em Portugal. Apercebendo-se do estado da mãe, a filha levou-a imediatamente a um colega psiquiatra. Com uma história de 2 tentativas de suicídio, L. foi diagnosticada com doença bipolar acerca de 17 anos atrás. Passava por fases depressiva, nas quais se esquecia por completo dos filhos, trancando-se no quarto durante vários dias; e fases maníacas, onde era capaz de gastar exorbitâncias a comprar prendas para os filhos e respectiva vizinhança. O seu marido, não aguentando conviver com aquela situação, divorciou-se dela à alguns anos atrás. Esta situação levou L. a tentar engolir todos os medicamentos que tinha em casa, tendo sido salva a tempo pelo filho. Aquando da consulta com o psiquiatra, L. mostrou-se muito amistosa e atrevida, referindo que o médico vestia-se muito bem e era bastante atraente. No entanto, quando este lhe propôs para reiniciar a terapêutica, L. demonstrou-se extremamente agressiva tentando agredi-lo, tendo sido necessário a intervenção de dois seguranças para evitar problemas maiores. 62 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 6.1. Sublinhe no texto anterior os sinais e sintomas de mania que a doente apresenta? 6.2. Quais seriam e porquê a(s) melhores opções terapêuticas no caso de L.? Explique as opções terapêuticas que escolheu. SSRIs. Quais?____________________________________________________ TCAs. Quais?_____________________________________________________ Benzodiazepinas. Quais?____________________________________________ Antipsicóticos típicos. Quais?_________________________________________ Antipsicóticos atípicos. Quais?________________________________________ Lítio Carbamazepina Buspirona Valproato iMAOs. Quais?______________________________________________________ iMAOA. Quais?______________________________________________________ Inibidores selectivos da recaptação de dopamina. Quais?____________________ Inibidores selectivos da recaptação de noradrenalina. Quais?_________________ Outros antidepressivos. Quais?_________________________________________ Electroconvulsoterapia Psicoterapia Fototerapia Erva-de-S. João Internamente hospitalar Barbituricos. Quais?__________________________________________________ Sedativos. Quais?____________________________________________________ Terapêuticas experimentais. Quais?______________________________________ Terapia de dessensibilização. Bloqueadores β. Quais?_______________________________________________ FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 63 APONTAMENTOS 6.3. Comente as seguintes frases, justificando se concorda ou não com as mesmas: “ A administração de antidepressivos tricíclicos nesta fase constitui um auxílio importante à terapêutica da mania.” “ A ingestão de grandes quantidades de ácidos gordos w3, na dieta de indivíduos com doença bipolar, constitui uma opção de relevo e com grande eficácia no tratamento desta patologia.” 64 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 5 - PSICOSES As psicoses são patologias caracterizadas pela dificuldade de raciocínio, alteração da percepção, perturbações da linguagem, da actividade social e do afecto, podendo incluir a visualização e/ou audição de personagens imaginárias que correspondem a alucinações, ocorrendo uma alienação da própria realidade. Noutras situações de psicose, incluem-se as que se caracterizam por depressão, psicose tóxica causada por administração de substâncias como cocaína (gera uma alteração da percepção que cria a ilusão de infestação por parasitas subcutâneos), Cannabis sativa, anfetaminas em geral. A Cannabis sativa é uma das principais responsáveis pela incidência de esquizofrenia tóxica. Alguns estudos demonstraram que o consumo de Cannabis pode provocar ataques agudos de esquizofrenia. Para além disso, parece que indivíduos predispostos geneticamente a desenvolver esquizofrenia, e que consomem Cannabis, possuem maior probabilidade de virem a desenvolvê-la no futuro. Por outro lado, a administração de anti-parkinsonianos pode induzir psicose tóxica, embora esta situação seja rara. Determinados tumores no SNC podem também gerar psicoses. 5.1. Esquizofrenia Trata-se de uma patologia heterogénea de grande relevo na psiquiatria. Possui uma incidência de 1% na população mundial, o que é algo preocupante. Ambos os sexos são afectados, embora estudos demonstrem que no sexo masculino a doença se manifeste mais cedo. 30 a 40% dos sem abrigo sofrem desta patologia. A alienação da realidade, as alterações de pensamento, linguagem, comportamento e humor, que caracterizam esta patologia, limitam grandemente estes indivíduos. Pode surgir de forma abrupta, embora na maior parte dos casos este processo seja gradual, iniciando-se normalmente na adolescência. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 65 APONTAMENTOS Existe uma ignorância instituída na sociedade em relação a esta patologia, gerando-se estigmas e falsas esquizofrenia não personalidades, pacientes crenças nem iniciam é em seu sinónima de de um violência. programa redor. A múltiplas Quando os terapêutico adequado, a probabilidade destes cometerem um crime é a mesma que a do cidadão comum. O diagnóstico é difícil de ser executado, exigindo a monitorização contínua dos indivíduos por um período de 6 meses. Deve ser assegurado que os sintomas não se devem a perturbações do humor, condições médicas relevantes ou abuso de fármacos ou drogas. É importante ter em conta que certos sintomas psicóticos podem ser causados Vincent Van Gohg – Mania, psicose ou loucura? pela administração de fármacos (ex.: bloqueadores β, clonidina, cicloserina, quinacrina e derivados da procaina) ou consumo de drogas. As quatro principais formas de esquizofrenia são: esquizofrenia catatónica, esquizofrenia paranóica, esquizofrenia desorganizada e esquizofrenia residual, podendo os pacientes apresentar sintomas e sinais clínicos de mais de um tipo de esquizofrenia. Certas manifestações da esquizofrenia são características. Com frequência, ocorrem alucinações auditivas e/ou visuais e delírios, frequentemente paranóides. Podem ser observados distúrbios do pensamento (ex.: os pacientes acreditam que os seus pensamentos estão a ser influenciados ou alterados por forças externa, ou que os seus pensamentos estão ser inseridos, retirados ou transmitidos). O prognóstico depende da eficácia da terapêutica antipsicótica instituída e não da severidade dos sintomas. 5.1.1. Delírios - Paranóicos – os indivíduos convencem-se que estão a ser perseguidos, etc.; 66 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS - Grandeza – os indivíduos convencem-se que são personalidades históricas (ex.: Napoleão, etc.); - Somáticos; - Religiosos; - Bizarros. Um surto psicótico não é suficiente para diagnosticar esquizofrenia. 5.1.2. Alterações da percepção, pensamento e comportamento Os indivíduos podem tornar-se violentos, tentando eliminar a causa das alucinações. Por vezes podem existir alucinações visuais e auditivas (as mais comuns), estando presentes vozes de comando, que ordenam o indivíduo a cometer actos de extrema violência. Os indivíduos esquizofrénicos não demonstram afecto de forma coerente. Após o primeiro surto de psicose, os doentes estabilizam, aproximadamente, durante 5 anos. O problema que se impõem é a declinação e deterioração da actividade cognitiva registada com a evolução da patologia. A B A - John F. Nash, prémio Nobel da Economia 1994; B – Russel Crow interpretando o papel de John Nash no filme “Uma mente brilhante” realizado por Ron Howard em 2001 . No apogeu da sua carreira John Nash sofreu de esquizofrenia paranóica. A dependência pelo álcool e tabaco é muito característica nestes doentes, sendo praticamente impossível fazer com que estes larguem esses vícios. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 67 APONTAMENTOS 5.1.3. Patofisiologia • Predisposição genética; o A esquizofrenia possui uma forte componente hereditária associada. Gémeos monozigóticos são estudados com bastante interesse. Se um dos gémeos sofrer de esquizofrenia, existe 50% de probabilidade do outro a desenvolver também. Já nos gémeos bizigóticos, esta probabilidade desce para 10%. • No norte da Europa, estudos indicam a associação desta patologia ao gene neuregulina-1 na posição cromossomal 8p21. Existem ainda outros genes que podem estar relacionados com a esquizofrenia: disbindina na posição cromossomal 6p22.3, prolina desidrogenase na posição cromossomal 22q11 e gene g72 na posição cromossomal 13q34. No entanto os estudos actualmente publicados são inconclusivos; • A esquizofrenia encontra-se também associada a complicações gestacionais ou perinatais como hipoxia fetal, infecção pré-natal por vírus influenza durante o segundo trimestre, incompatibilidade do factor Rh e deficiência nutricional pré-natal; • Podem surgir zonas cor-de-rosa em determinadas áreas cerebrais como consequência das alterações desconectivas do sistema nervoso central. 68 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 5.1.3.1. Teoria dopaminérgica A teoria dopaminérgica defende a existência de associação entre esquizofrenia e hiperactividade dopaminérgica. Desta forma, os fármacos antipsicóticos exercem o seu efeito ao reduzirem a actividade dopaminérgica por bloqueio dos receptores D2 dopaminérgicos no SNC (tracto mesolimbico – córtex frontal), reduzindo os sintomas agudos e sinais de psicose como a agitação, ansiedade e alucinações. O ideal seria que os antipsicóticos apenas actuassem no tracto mesolimbico. No entanto, eles exercem também o seu efeito noutros tractos dopaminérgicos do SNC como o tracto nigrostriado (responsável pelos efeitos extrapiramidais com distúrbios de movimento), tracto mesocortal e tracto tuberoinfundibular (responsável pela regulação da prolactina, resultando num aumento da produção aquando da administração de antipsicóticos). Para corroborar esta hipótese, foram registadas quantidades superiores de receptores dopaminérgicos em indivíduos esquizofrénicos, relativamente aos indivíduos normais. A evolução tecnológica permitiu ainda visualizar a atrofia do SNC através de imagens obtidas por PET. Este desarranjo poderia então ser mais ou menos compensado através do controlo das vias dopaminérgicas. Actualmente sugere-se que o aumento da actividade do sistema mesolímbico e diminuição da actividade dos tractos mesocorticais, que enervam o cortéx préfrontal, é uma das causas desta patologia. No entanto, existem parâmetros que não podem ser controlados, sugerindo a existência de vias alternativas importantes que não as dopaminérgicas, incluindo outros neurotransmissores como a serotonina, acetilcolina, glutamato e GABA. Como tal, as terapias actualmente disponíveis não são totalmente eficazes. Com base no tratamento sugerido pela hipótese dopaminérgica, ao reduzirmos a actividade dopaminérgica, os indivíduos podem desenvolver reacções adversas caracterizadas pela alteração dos movimentos, surgindo um Parkinsonismo de natureza medicamentosa. No tratamento deste estado psiquiátrico complexo, a farmacoterapia, embora muito importante, constitui apenas uma parte da real abordagem terapêutica global. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 69 APONTAMENTOS 5.1.3.2. Teoria serotoninérgica Outras teorias sugerem o envolvimento do sistema serotoninérgico na esquizofrenia. Muitas substâncias antipsicóticas eficazes, além de bloquearem os receptores dopaminérgicos, também actuam como antagonistas dos receptores da serotonina. A serotonina parece ter um efeito modulador sobre as vias dopaminérgicas, não invalidando por isso a primeira teoria. A afinidade para os receptores 5-HT2A e 5-HT2C, é uma característica das várias substâncias antipsicóticas “atípicas” recentemente desenvolvidas, produzindo menos efeitos colaterais extrapiramidais que os compostos selectivos dopaminérgicos mais antigos. Existe porém controvérsia relativamente ao facto do bloqueio dos receptores 5-HT2A e 5-HT2C contribuir para o efeito antipsicótico ou meramente reduzir os efeitos colaterais indesejados associados à utilização dos antagonistas dos receptores D2. Por outro lado, como os antipsicóticos atípicos actuam sobre um grande número de receptores (receptores muscarínicos, serotoninérgicos, colinérgicos, dopaminérgicos), os efeitos adversos que apresentam classifica-os como fármacos “sujos”. 70 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Uma das vantagens dos novos fármacos antipsicóticos é o facto que, ao actuarem sobre os receptores serotoninérgicos, a terapêutica contraria os sintomas negativos. Isto porque o sistema serotoninérgico está envolvido na regulação do humor. 5.1.4. Sintomatologia Negativos: Positivos: - Alogia; - Formas anormais de pensamento; - Anergia; - Agitação, agressividade; - Anedonia; - Alterações nos processos associativos; - Comportamento anti-social; - Comportamentos bizarros; - Deficit de atenção; - Desorganização conceptual; - Dificuldades de comunicação; - Delusões/ilusões; - Dificuldades em abstrair-se; - Excitação; - Afastamento social passivo; - Sensação de perseguição; - Desleixo, com perda de hábitos de higiene; - Alucinações; - Pobreza na interacção; - Grandiosidade; - Pobreza de discurso; - Insónia; - Desconfiança; - Avolição – incapacidade de iniciar/persistir num objecto. Os sintomas negativos predominam em cerca de 1/3 dos indivíduos esquizofrénicos, prejudicando quer o estabelecimento do diagnóstico correcto, uma vez que estes sintomas podem mimetizar diversas patologias, quer o próprio resultado da terapêutica. Por exemplo, o embotamento afectivo (diminuição ou dificuldade em demonstrar reciprocidade social ou emocional) pode ser confundido com autismo. Por outro lado, os sintomas positivos atraem a atenção para a doença, contribuindo para a instituição do diagnóstico. A ideação suicida é muito comum nestes pacientes. Cerca de 10% dos esquizofrénicos cometem suicídio. 5.1.5. Caso clínico P.L., um homem de 19 anos solteiro e desempregado, deu entrada na urgência de psiquiatria depois de ter subido ao peitoril de uma janela, no 22º andar de um hotel, e ter ameaçado saltar. Dizia-se com medo e que “vozes diziam-me para saltar”. Situação clínica actual: o doente não consegue relatar com exactidão os factos que levaram à sua hospitalização. Ele quer protecção das “pessoas que me tentam baralhar”. Diz ter parado de fazer a medicação que fazia um mês após ter tido alta de um hospital em Guimarães. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 71 APONTAMENTOS Sentiu, então, um impulso para ser autónomo e mudou-se para o Porto. Alugou um quarto, arranjou emprego a distribuir panfletos e decidiu “viver a sua própria vida”. Há cerca de duas semanas, o paciente começou a ter insónias e a ouvir vozes “que me diziam para me preparar para a minha missão de salvar Portugal das forças extraterrestres”. Relata experiências estranhas, tais como, “a música da rádio contém mensagens codificadas”, “eles lêem a minha mente”, “as cores são mais claras e brilhantes”, “os sons são mais perceptíveis do que o habitual”. Exame físico na admissão: normal. Exame mental na admissão: - Aspecto e comportamento: magro, desgrenhado, voz monocórdica e agitação motora acentuada. Apesar da temperatura amena do gabinete médico, recusou-se a tirar o sobretudo e o chapéu. Calças e camisa vestidas do avesso. - Humor: muito ansioso e irritável; preocupado com o facto de ter falhado a sua missão e de forças externas andarem a persegui-lo para o matar. Ao falar dos extraterrestres, sorri e ri. - Exame sensorial: orientado em relação ao tempo, ao lugar e à sua pessoa. - Pensamentos: desconfiado, quer ver a carteira profissional do médico, pergunta se o gabinete está “sob escuta”. Associações de ideias soltas e indefinidas. “Porque estou aqui? Ainda não é hora do jantar?” Lamenta que a NASA o tenha desiludido e que agora tenha que terminar a missão por si mesmo. As vozes dizem-lhe o que deve fazer e ele “não pode desobedecer”. Sem capacidade de discernimento. Ausência de motivação para tratamento, ao mesmo tempo que nega qualquer doença mental. Parece ter ideação suicida. História clínica anterior: esteve hospitalizado 4 meses em Braga por um “esgotamento nervoso”. Afirma ter recebido electrochoques e cloropromazina, o que o fez sentir-se “um zombie”. Um ano depois foi operado a um braço após tentativa de suicídio, saltando de um carro em andamento. Depois disso, foi novamente hospitalizado, por 3 meses, após nova tentativa de suicídio, desta vez por ingestão de “pílulas dietéticas”. Três anos mais tarde, esteve hospitalizado 72 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS durante 4 meses devido a “problemas nervosos e vozes perturbadoras”. Durante este período, recebeu flupentixol 5 mg 2 vezes ao dia, que descreveu como “coisa boa”. História familiar: um irmão foi tratado “dos nervos” com flupentixol e “fez-lhe muito bem”. Diagnóstico: Esquizofrenia, tipo paranóico com desenvolvimento crónico e exacerbação aguda. 5.1.6. Tratamento Não existe tratamento para a patologia em si. Apenas estão disponibilizados fármacos utilizados no tratamento dos sintomas, não revertendo a deterioração das capacidades cognitivas. No passado estes doentes eram fechados em grandes hospitais (Sanatórios) com outros doentes que partilhavam a mesma patologia. Existem ainda, actualmente, unidades de internamento psiquiátrico disponíveis para o internamento de doentes esquizofrénicos que constituam uma ameaça. Para tal, deve ser activado o internamento compulsivo, pelo delegado de saúde (nos Centros de Saúde), a pedido dos familiares, ou outros. Diz a lei 36/98, de 24 de Junho, que se o doente mental grave, por força da doença criar uma "situação de perigo para bens jurídicos, de relevante valor, próprios ou alheios, de natureza pessoal ou patrimonial e recuse submeter-se ao necessário tratamento médico pode ser internado em estabelecimento adequado" e ainda, caso "não possua o discernimento para avaliar o sentido e alcance do consentimento, quando a ausência do tratamento deteriore de forma acentuada o seu estado.” Nos serviços de psiquiatria, é necessário a existência de salas de isolamento, que cumpram critérios específicos de segurança para os doentes (ex.: inexistência de janelas, saliências, entre outros). Num hospital psiquiátrico existem vários condicionalismos que visam a segurança dos pacientes, evitando-se a existência de objectos que por estes possam ser utilizados para autoinfligir-se ou cometer suicídio (ex.: inexistência de chuveiros normais). Nem todos os doentes podem ser devolvidos à sociedade devido ao seu estado particular. No entanto, mesmo indivíduos medicados, que saem destas unidades, são bastante discriminados, existindo um grande estigma social em relação a esta patologia. Por vezes, até a própria família os rejeita. Para aumentar este problema, não existem actualmente em Portugal locais que prestem apoio a estes doentes. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 73 APONTAMENTOS 5.1.6.1. Antipsicóticos típicos, clássicos ou de 1ª geração Existem 3 grandes famílias de antipsicóticos clássicos, agrupadas em função da potência, independentemente da classe química a que os diferentes compostos pertencem (fenotiazidas, butirofenonas e tioxantenos), com capacidade de bloquearem os receptores dopaminérgicos e 5HT2A. POTÊNCIA ELEVADA POTÊNCIA MODERADA BAIXA POTÊNCIA • Flufenazina • Loxapina • Cloropromazina • Haloperidol • Molindona • Tioridazina • Tiotixeno • Perfenazina • Trifluoperazina 5.1.6.1.1. Reacções adversas dos antipsicóticos clássicos Efeitos extrapiramidais: - Distonia aguda – movimentos descontrolados da face, pescoço e língua, com salivação excessiva; - Crise oculomotora – movimentos involuntários do olho; - Acatisia – hiperactividade e agitação; - Parkinsonismo – pobreza de movimentos, tremor; - Discinésias tardias – envolve movimentos involuntários da língua, face, podendo afectar todo o corpo. Existem guidelines que estabelecem opções a realizar quando estes efeitos adversos surgem. A – Distonia • Tónus muscular anormal; • Surge em 24-94 horas; • Podem ser graves. Distonia Intervenção: • 74 Diminuição da dose, descontinuação ou troca do antipsicótico instituído; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Administração de anti-parkinsoniano anticolinérgico (benzatropina, trihexifenidilo) – administra-se um anti-parkinsoniano anticolinérgico e não um que seja agonista dos receptores dopaminérgicos, para que não exista conflito com a terapêutica da esquizofrenia. No caso do doente sofrer insuficiência renal ou obstipação, a administração de anti-parkinsonianos anticolinérgicos encontra-se contra-indicada, uma vez que o antagonismo do sistema colinérgico, provoca diminuição da diurese e aumento da obstipação; • Administração de amantadina (anti-parkinsoniano); • Nota: por vezes os doentes esquizofrénicos apercebem-se desta estratégia e podem simular crises de distonia para que lhes sejam prescritos estes fármacos. B – Acatísia • Incapacidade de permanecer quieto; • Ocorre em 20 a 40% dos pacientes tratados com antipsicóticos atípicos. Intervenção: • Diminuição da dose, descontinuação ou troca Acatísia do antipsicótico instituído; • Administração de anti-parkinsoniano anticolinérgico (benzatropina, trihexifenidilo); • Administração de amantadina (anti-parkinsoniano); • Administração de sedativos: anti-histamínicos sedativos (ex.: difenidramina) ou benzodiazepinas (ex.: diazepam). C – Pseudoparkinsonismo • Acinésia (ausência de movimento) ou bradicinésia (diminuição da acção motora); • Tremor; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 75 APONTAMENTOS • Movimentos em roda dentada; • Alteração da postura. Intervenção: • Diminuição da dose do antipsicótico ou descontinuação/troca; • Administração de anti-parkinsoniano anticolinérgico (benzatropina, tri-hexifenidilo); • Administração de amantadina (anti- Pseudoparkinsonismo parkinsoniano); • Administração de sedativos: anti-histamínicos sedativos (ex.: difenidramina) ou benzodiazepinas (ex.: diazepam). D – Discinésias tardias • Surgem 2 a 4 anos após o inicio da terapêutica; • Instalação à taxa de 2-4%/ano de exposição; • Prevalência de 20-40% em tratamentos crónicos; • Protrusão da língua; • Movimentos mastigadores; • Envolvimento orofacial; • Movimentos anormais: vigorosos, bem organizados, que afectam unidades musculares bem definidas (boca-língua-mastigação). Intervenção: • Diminuição da dose do antipsicótico ou descontinuação/troca; • Suspensão da administração de fármacos com efeito anticolinérgico (ex.: anti-parkinsonianos, antidepressores); Discinésias tardias • Administração de diazepam 30-40mg/dia (dose elevada) como relaxante muscular. 76 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS E) Sindrome maligno dos neurolépticos Este sindroma constitui uma reacção adversa grave, não relacionada com os efeitos extrapiramidais. Surge como consequência da administração de antipsicóticos, embora seja considerada muito rara. Possivelmente resulta do antagonismo exercido sobre os receptores dopaminérgicos D2 ao nível do hipotálamo, tracto nigrostriado e gânglios basais da espinalmedula. • Rigidez muscular; • Alteração do estado mental; • Hipertensão; • Instabilidade do SN autónomo. Intervenção: • Suspensão imediata da terapêutica; • Abaixamento da temperatura corporal; • Administração de relaxantes musculares (ex.: Benzodiazepinas, Dantroleno, Bromocriptina); • Administração de anti-parkinsonianos. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 77 APONTAMENTOS FÁRMACO ESTRUTURA MOLECULAR FÁRMACO CLOROPROMAZINA PERFENAZINA DROPERIDOL PIMOZIDE FLUFENAZINA PROCLORPERAZINA ESTRUTURA MOLECULAR F N OH O HALOPERIDOL TIORIDAZINA Cl N N N N LOXAPINA TIOTIXENO N H O S Cl N O O S O N MOLINDONA O 78 TRIFLUOPERAZINA N FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Afinidade D2 Afinidade 5-HT2A Semi-vida (h) Flufenazina XXXXX XXX 13-56 Haloperidol XXXXX XXX 12-36 Tiotixeno XXXX XXX 34 Trifluoperazina XXXX XX 13 Loxapina XXXX XXXX 8-30 Molindona XXXX X 6,5 Perfenazina XXXX XXXX 9-21 Cloropromazina XXX XXXX 16-30 Tioridazina XXXXX XXX 9-30 Efeitos extrapiramidais Flufenazina Efeitos Efeitos Sedação anticolinérgicos ortostáticos (Receptores Aumento de peso histamínicos) ELEVADO BAIXO BAIXO BAIXO BAIXO Haloperidol ELEVADO BAIXO BAIXO BAIXO BAIXO Tiotixeno ELEVADO BAIXO BAIXO MODERADO MODERADO Trifluoperazina ELEVADO BAIXO MODERADO BAIXO BAIXA Loxapina ELEVADO MODERADO MODERADO ELEVADO BAIXO Molindona ELEVADO MODERADO BAIXO ELEVADO BAIXO Perfenazina ELEVADO BAIXO BAIXO MODERADO MUITO BAIXO ELEVADO ELEVADO ELEVADO ELEVADO ELEVADO ELEVADO Cloropromazin a Tioridazina MODERADO BAIXO ELEVADO ELEVADO 5.1.6.2. Antipsicóticos atípicos ou de 2ª geração Os antipsicóticos de 1ª geração eram bastante eficazes no controlo dos sintomas positivos, mas o mesmo não se passava em relação aos sintomas negativos. Surgiram então os antipsicóticos atípicos que bloqueiam não só os receptores dopaminérgicos D2 mas também receptores serotoninérgicos 5-HT2A e 5-HT2C. Aripripazole, Clozapina, Olanzepina, Quetiapina, Risperidina e Ziprasidona FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 79 APONTAMENTOS FÁRMACO CARACTERISTICAS ESTRUTURA MOLECULAR - Neurolético de nova geração recentemente aprovado; - Agonista parcial dos receptores D2; - Agonista parcial dos receptores 5-HT1A; ARIPRIPRAZOLE - Antagonista dos receptores 5-HT2A; - Provoca pequeno aumento de peso ou da prolactina; - Pode induzir ansiedade, náuseas e insónia; - Não possui afinidade para os receptores acetilcolinérgicos. - Eficácia superior aos antipsicóticos clássicos; - Antagonista dos receptores 5-HT2A; - Medicamento particular, quer pelo seu perfil de afinidade para os diferentes receptores (ex.: único antipsicótico que se liga com maior afinidade ao receptores D4 que ao D2), quer pelo facto de ser o antipsicótico com maior eficácia demonstrada no tratamento de doentes CLOZAPINA esquizofrénicos resistentes; - Menor incidência de reacções adversas motoras; - Risco de causar alterações sanguíneas graves (agranulocitose – 1%) e convulsões, exigindo controlos hematológicos frequentes; - Não aumenta a prolactina; - É utilizado em última opção, quando se verifica que os indivíduos são resistentes às restantes alternativas terapêuticas; - É utilizado, por exemplo, em situações de discinésias tardias. - Antagonista dos receptores 5-HT2A; OLANZAPINA - Melhor incidência de reacções extrapiramidais; - Maior probabilidade de causar aumento de peso. - Antagonista dos receptores 5-HT2A; - Apresenta menor incidência em causar alterações do movimento; - Foi utilizado inicialmente no tratamento da doença bipolar e esquizofrenia; QUETIAPINA - Elevada frequência do abandono da terapêutica; - Pode causar hipotensão ortostática, aumento do peso, tonturas, obstipação, xerostomia e dispepsia; - Pode determinar aumento das transaminases; - Provoca sonolência. - Neurolético de nova geração; - Antagonista dos receptores 5-HT2A; - Bloqueia o efeito agonista 5-HT2A de drogas como o LSD; - É bastante utilizado na esquizofrenia; RISPERIDONA - Apresenta menor incidência em causar alterações do movimento; - Menor tendência para causar sonolência; - Clama maior eficácia no controlo dos sintomas negativos; - Maior probabilidade de causar aumento de peso, relativamente aos clássicos. 80 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS - O seu mecanismo de acção não está completamente elucidado, sabendose que possui acção antagonista dos receptores 5-HT2A; - É capaz de inibir a recaptação de serotonina e de noradrenalina, embora ZIPRAZIDONA a importância deste efeito farmacológico seja desconhecido; - Aumenta o intervalo QT em alguns pacientes, podendo aumentar o risco para o surgimento de uma arritmia designada de torsades de pointes; - Pode ainda causar sedação, insónia, hipotensão ortostática, acatísia e outros efeitos extrapiramidais como discinésias tardias. Afinidade D2 Afinidade 5-HT2A Semi-vida (h) Flufenazina XXXXX XXX 13-56 Haloperidol XXXXX XXX 12-36 Tiotixeno XXXX XXX 34 Trifluoperazina XXXX XX 13 Loxapina XXXX XXXX 8-30 Molindona XXXX X 6,5 Perfenazina XXXX XXXX 9-21 Cloropromazina XXX XXXX 16-30 Tioridazina XXXXX XXX 9-30 Clozapina XX XXXX 2-12 Olanzepina XX XXXX 21-54 Quetiapina XXX XXXX 4-10 Risperidona XXXXX XXXXX 20-24 Ziprasidona XX XXXXX 5-10 Efeitos extrapiramidais Efeitos Efeitos Sedação anticolinérgicos ortostáticos (Receptores Aumento de peso histamínicos) Flufenazina ELEVADO BAIXO BAIXO BAIXO Haloperidol ELEVADO BAIXO BAIXO BAIXO BAIXO Tiotixeno ELEVADO BAIXO BAIXO MODERADO MODERADO Trifluoperazina ELEVADO BAIXO MODERADO BAIXO BAIXA Loxapina ELEVADO MODERADO MODERADO ELEVADO BAIXO BAIXO Molindona ELEVADO MODERADO BAIXO ELEVADO BAIXO Perfenazina ELEVADO BAIXO BAIXO MODERADO MUITO BAIXO Cloropromazina MODERADO ELEVADO ELEVADO ELEVADO ELEVADO Tioridazina BAIXO ELEVADO ELEVADO ELEVADO ELEVADO Clozapina BAIXO MODERADO ELEVADO ELEVADO ELEVADO Olanzapina BAIXO MODERADO ELEVADO ELEVADO MODERADO Quetiapina BAIXO BAIXO MODERADO MODERADO MODERADO Risperidona BAIXO BAIXO ELEVADO BAIXO MODERADO Ziprasidona BAIXO BAIXO BAIXO BAIXO BAIXO FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 81 APONTAMENTOS Por vezes, os antipsicóticos clássicos ou de 1ª geração, como o Haloperidol, são mais eficazes no inicio da terapêutica que os antipsicóticos atípicos. A via de administração é também uma das características utilizadas na classificação dos antipsicóticos. Segundo esta classificação temos: - Antipsicóticos de administração oral (onde se incluem a maior parte); - Antipsicóticos de administração intramuscular mensal, sob a forma de depósito (Haloperidol decanoato). Este modo de administração permite criar um depósito, no local de injecção, a partir do qual o fármaco vai difundindo para a corrente sanguínea, mantendo uma concentração plasmática de fármaco mais estável, por um período mais longo, possibilitando a diminuição das tomas necessárias. O único antipsicótico atípico existente administrado por via IM é a risperidona (administração de 15 em 15 dias). 5.1.6.3. Farmacocinética geral dos antipsicóticos de 1ª e 2ª geração • Sofrem efeito de primeira passagem; • São altamente lipofílicos, estabelecendo extensa ligação a proteínas plasmáticas (tal como se regista nas benzodiazepinas); • São metabolizados por oxidação hepática, sem formação de metabolitos activos, com excepção da mesoridazina (o metabolito resultante, tioridazina, é mais potente que o fármaco em si); • Possuem tempos de semi-vida longos (20-40h), com excepção da quetiapina e ziprasidona; • Deve-se monitorizar as concentrações plasmáticas de forma a controlar a adesão à terapêutica. A taxa de abandono da terapêutica é bastante elevada, principalmente devido aos efeitos adversos que estas terapias englobam. 5.1.6.4. Reacções adversas dos antipsicóticos • 82 Bloqueio dos receptores muscarínicos: FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • • Xerostomia; Dificuldade na micção; Obstipação. Bloqueio nos receptores adrenérgicos: Dificuldades na ejaculação; Impotência; Hipotensão ortostática. Bloqueio dos receptores dopaminérgicos: Distonia aguda – movimentos descontrolados da face, pescoço e língua, com salivação excessiva; Crise oculomotora - movimentos involuntários do olho; Acatísia – hiperactividade e agitação; Parkinsonismo – pobreza de movimento, tremor (efeitos extrapiramidais); Discinésias tardias – sindroma muito grave, podendo ocorrer com a administração prolongada de antipsicóticos (meses a anos), particularmente em pacientes mais velhos e 15 a 20% dos pacientes hospitalizados. Traduzse por movimentos involuntários, estereotipados e repetidos da boca, lábios e língua. Caracteriza-se ainda pela adopção de posições estranhas, com contracções musculares prolongadas. Uma vez presentes, podem prolongarse durante muito tempo, mesmo após interrupção do tratamento. • Sistema endócrino: Ao interferirem com este sistema, os antipsicóticos aumentam a secreção de prolactina, ocorrendo galactorreia (secreção de leite pelas glândulas mamárias), ginecomastia (aumento das características sexuais secundárias, como crescimento dos seios), amenorreia (interrupção dos ciclos menstruais), agravação de tumores sensíveis às hormonas (como o cancro da mama), entre outros. Nota: A administração de antipsicóticos com substâncias que deprimem o SNC (ex.: álcool, barbitúricos, anti-histamínicos, ansiolíticos, opiáceos, etc.) pode potenciar o efeito depressor. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 83 APONTAMENTOS 5.1.6.5. Instituição e escolha da terapêutica 1ª FASE • Proceder ao acerto da dose. Para tal deve-se começar com várias tomas diárias e no final da semana titula-se a dose. Escolhe-se posteriormente a dose eficaz mínima; • Os antipsicóticos típicos constituem, normalmente, os fármacos de 1ª opção. A escolha do fármaco deve ser realizada de acordo com: • • • Perfil de efeitos secundários; • Custo do tratamento; • Experiência prévia pessoal ou familiar; • Eficácia. Os antipsicóticos típicos são fármacos: • Eficazes em 70% dos casos de 1º episódio; • Os efeitos fazem-se sentir passado horas ou dias; • Remissão total geralmente em 6 a 8 semanas; • Possuem elevada incidências de efeitos extrapiramidais. Os antipsicóticos atípicos são fármacos: • Com grande eficácia, sobretudo em relação aos sintomas negativos, melhorando a função cognitiva; • Efeitos mais negativos na regulação da glucose, devendo monitorizar-se a glucose plasmática assim como o perfil lípidico. o Ex.: A clozapina, olanzepina e quetiapina podem causar hiperglicemia, aumento do peso e hipertrigliceridemia. 2ª FASE • Procede-se posteriormente à diminuição da toma diária (noite), utilizando a menor dose eficaz, de forma a instituir uma farmacoterapia de manutenção; 84 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • As paragens repentinas de medicação, registam um retorno dos sintomas psicóticos num prazo de 6 meses em 60% dos indivíduos. Por outro lado, quando surgem perturbações de movimento, deve-se considerar a possibilidade da descontinuação da terapêutica, de forma a melhorar os sintomas; • Em situações de exacerbação dos sintomas psicóticos, é necessário aumentar a dose ou adicionar outro fármaco em situações de SOS. Em contrapartida, existe sempre a opção de adoptar um tratamento contínuo com doses terapêuticas apropriadas. • O ambiente em que estes doentes estão inseridos é de extrema importância, principalmente quando estes se encontram sob guarda familiar; • É necessária a instituição de tratamento crónico pelo menos uma vez por ano. 5.1.6.6. Não adesão à terapêutica A não adesão à terapêutica está directamente associado às características da patologia e às reacções adversas dos antipsicóticos. Para contornar este aspecto, pode-se recorrer a formas de libertação prolongada injectáveis (ver pág.82 Haloperidol decanoato administrado IM). 5.1.6.7. Desmame de antipsicóticos • Deve ser realizada de forma lenta; • Complicações: síndrome de abstinência, insónia, pesadelos, cefaleias, sintomas gastrointestinais, salivação excessiva, sudação, entre outros; • A paragem da administração do fármaco deve ser sempre ponderada com o tempo de semi-vida do antipsicótico em questão e as características do paciente (metabolização, entre outros). 5.1.6.8. Mudança de antipsicótico • O período entre o início da terapêutica com o segundo antipsicótico de desmame e a descontinuação do primeiro antipsicótico deve ser realizado em 1-2 semanas. Isto é, a troca do fármaco deve ser realizada iniciando-se a administração do 2º fármaco antes de se proceder à descontinuação do 1º fármaco; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 85 APONTAMENTOS • Quando os sintomas positivos e/ou negativos são persistentes, deve-se avaliar a necessidade de associar outro grupo de fármacos; • O limiar da adesão relacionada com as reacções adversas deve ser baixa; • Pode-se chegar a situações em que os doentes estão polimedicados para as várias reacções adversas, mas não exista uma resposta à terapêutica; • O relato do doente sobre a medicação é essencial na opção da substituição da terapêutica. 5.1.6.9. Associações de fármacos • A associação entre antipsicóticos deve ser evitada, pois tal contribuiria para aumentar os riscos e a confusão da avaliação da eficácia; • A associação com antidepressores pode ser vantajosa, sobretudo no caso dos sintomas negativos (ex.: antidepressivos tricíclicos e SSRIs); • Deve ser ponderada a administração de lítio e valproato de sódio, que estabilizam o humor, quando existe uma deficiente resposta aos antipsicóticos; • Sedativos (ex.: benzodiazepinas); • Administração de anti-parkinsonianos anticolinérgicos que corrigem os sintoma extrapiramidais. 5.1.7. Tratamentos não farmacológicos 5.1.7.1. Leucotomia ou lobotomia A lobotomia ou leucotomia, constitui uma intervenção cirúrgica ao cérebro, na qual são seccionadas as vias que ligam os lobos frontais ao tálamo e outras vias frontais associadas. Foi desenvolvida em 1935, pelo médico neurologista português António Egas Moniz (1874-1955), com o cirurgião Almeida Lima, na Universidade de Lisboa. Este trabalho conferiu a Egas Moniz o prémio António Egas Moniz (1874-1955) Nobel da Medicina e Fisiologia em 1949. Foi uma técnica pioneira na psicocirurgia, na qual se manipulava o cérebro com o objectivo de curar ou melhorar sintomas de uma patologia psiquiátrica (em contrapartida à neurocirurgia que 86 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS se ocupa de doentes com patologia orgânica directa ou neurológica). Sendo utilizada inicialmente para tratar casos de depressão severa, Egas Moniz defendeu o uso estrito desta técnica para casos graves em que o risco de violência ou suicídio fosse elevado. Contudo, e apesar de cerca de 6% dos pacientes não sobreviverem à operação, e das alterações de personalidade severas comuns, esta técnica foi executada excessivamente em muitos países, como o Japão e os Estados Unidos. Nos EUA, o cirurgião Walter Freeman popularizou descomedidamente este procedimento ao percorrer o país no seu «Lobotomobile», aplicando uma variante em que espetava um picador de gelo directamente no crânio do doente, desde um ponto logo acima do canal lacrimal com a ajuda de um martelo, rodando-se depois o mesmo para destruir as vias aí localizadas. Associado ao baixo custo do procedimento e desejo social de silenciar doentes psiquiátricos incómodos, esta técnica expandiu-se rapidamente. Existem registos que terá sido mesmo praticada em crianças com mau comportamento. Em consequência dos efeitos secundários adversos graves, a leucotomia tal como descrita por Egas Moniz, não é praticada actualmente. Existem, contudo, técnicas que derivaram da metodologia iniciada pela leucotomia, em que são seleccionadas regiões bem delimitada e específicas, nas quais se infligem lesões. Como resultado da selecção das áreas a operar, os efeitos secundários são menos graves. No entanto, devido à irreversibilidade do tratamento e às mudanças de personalidade inevitáveis, estas técnicas apenas são seleccionadas quando todos os outros tratamentos possíveis demonstrem ser ineficazes. Adaptado de http://pt.wikipedia.org/wiki/Lobotomia, consultado a 17 de Outubro de 2006 5.1.7.2. Programas de reabilitação psicossocial Estes programas de reabilitação são terapias ocupacionais que tem por objectivo melhorar a capacidade adaptativa dos indivíduos esquizofrénicos. Para além disso, fornece: • Competências básicas de vida; • Treino de competências sociais; • Educação básica. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 87 APONTAMENTOS Estas terapêuticas podem ser elaborados como programas de trabalho ou como apoio ao domicílio. Em todo o caso, o envolvimento familiar diminui a re-hospitalização, melhorando o desempenho na comunidade. 5.1.7.3. Electroconvulsoterapia Destinada a doentes em estado psicótico persistente resistente à clozapina. Não demonstra, no entanto, grande eficácia no controlo da esquizofrenia. 5.1.7.4. Fraca adesão à terapêutica versus adesão à terapêutica Fraca adesão à terapêutica • Negação da doença; • Desfasamento da realidade; • Grandiosidade ou paranóia; • Não compreender a necessidade de terapêutica. 88 Adesão à terapêutica • Educação progressiva do doente; • Envolvimento activo do doente e família; • Auto-administração (doentes hospitalizados); • Responsabilização (telefonemas, domicílio). FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Questionário 1. Relativamente ao caso clínico 5.1.5. (pág.71): 1.1. Quais os sinais e sintomas de esquizofrenia que B.F. apresenta e quais serão susceptíveis de responder à terapêutica? 1.2. Foi-lhe prescrito haloperidol i.m.. No dia seguinte (16 horas mais tarde), o paciente queixou-se de que o seu pescoço estava inclinado para o lado esquerdo, e de tal forma rígido que não lhe era possível endireitá-lo. Também referiu que sentia a língua tão grossa que tinha dificuldade em falar de forma clara e que os músculos das costas e do pescoço estavam doridos e rígidos. Qual poderá ser a causa destes sintomas? Como poderiam ser resolvidos? E se B.F. for insuficiente renal e sofrer de obstipação? 1.3. Seis semanas após tratamento com haloperidol 20 mg diários (sem benzatropina), B.F. começou com queixas de ansiedade persistente e dificuldade em adormecer. Encontrava-se visivelmente agitado e incapaz de permanecer sentado durante a consulta. Qual poderá ser a causa destes sintomas? FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 89 APONTAMENTOS 1.4. Pediu mais medicação. Foi-lhe perscrita benzatropina 6 mg/dia (dose mais elevada do que o habitual) mas as queixas não diminuíram. Uma vez que não exibe qualquer efeito anticolinérgico, será razoável continuar a aumentar as doses de benzatropina? Que alternativas poderiam ser sugeridas? 1.5. B.F. foi tratado com benzatropina 3 mg/2x por dia e amantadina 100 mg/2x por dia além do haloperidol. Uma semana mais tarde começou com queixas de um tremor rítmico em ambas as mãos e dificuldades em andar. Qual é o efeito extrapiramidal descrito e como pode ser tratado? 1.6. A história familiar de B.F. mostrava que um irmão teria sido tratado com sucesso com flupentixol. Será uma boa alteranativa ao haloperidol, no caso de B.F.? 90 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 1.7. B.F. passou a fazer flupentixol 12 mg ao deitar e tri-hexifenidil 2 mg/4x ao dia. Algum tempo depois, B.F. começou a apresentar movimentos anormais involuntários. Observava-se envolvimento orofacial, do tronco e das extremidade, manifestados por protrusão da língua, movimentos mastigadores. Qual poderá ser a causa destes sintomas e como poderão ser tratados? FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 91 APONTAMENTOS 6 - EPILEPSIA A epilepsia é uma doença neurológica crónica, polimórfica, em muitos casos progressiva. Caracteriza-se por distúrbios cognitivos, com frequência e gravidade variável, com ou sem convulsões. As crises epilépticas são recorrentes, afectando aproximadamente 1% da população mundial. A doença caracteriza-se por um estado de hiperactividade dos neurónios e circuitos cerebrais. Geram-se descargas eléctricas sincronizadas, não fisiológicas, manifestando-se de várias formas, com ou sem convulsões. Uma crise epiléptica não é sinónima de epilepsia. 6.1. Crises epilépticas Episódios de disfunção cerebral com uma determinada duração de acção resultante de uma descarga eléctrica anormal e excessiva, localizada no SNC. 6.1.1. Outras causas de crise epiléptica As crises epilépticas podem ocorrer como consequência de outras causas não relacionadas directamente com a patologia: - Doenças neurológicas; - Infecções (encefalites, meningites); - Febres altas (ex.: convulsões febris no recém nascido); - Neoplasias; - Álcool; - Infecções por parasitas; - Traumatismos cranianos; - Tumor no SNC, malformações vasculares, abcessos; - Alguns distúrbios metabólicos, ao nível dos electrólitos e glucose, podem desencadear crises epilépticas; - Fármacos (ex.: teofilina) ou droga de abuso (ex.: cocaína); Independentemente disto, há que proceder ao tratamento das condições clínicas associadas que possam causar ou contribuir para as convulsões. 92 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 6.2. Classificação - Ausência (pequeno mal); Generalizadas – ocorrem em - Crises tónico-clônicas (grande mal); todo o cérebro, normalmente - Crises tónicas; caracterizadas - Crises clônicas e mioclônicas – crises por perda da consciência. motoras, causadas por um aumento da actividade Crises epilépticas levando eléctrica a no córtex contracções motor, musculares involuntárias e espasmódicas. Parciais – ocorrem apenas Simples numa parte do cérebro, sem Complexas perda da consciência. Com evolução secundária para generalizadas 6.2.1. Crises generalizadas • Crises generalizadas primárias A - Crises tónico-clônicas (grande mal) – estas crises podem demorar alguns minutos, ocorrendo várias fases: 1ª Fase – Paragem respiratória e perda da consciência; 2ª Fase – Contracção muscular continua que provoca extensão (fase tónica); 3ª Fase – Contracção assíncrona dos músculos (fase clônica), incontinência dos esfíncteres, sensação de hipersalivação (não devido ao aumento da produção, mas devido à perda do controlo dos músculos bucais). Os indivíduos implicados, normalmente adultos jovens, ficam com amnésia do ataque. Consequência das lesões infligidas no SNC, quantas mais crises pior é o prognóstico. Existem crises que apenas possuem a fase clônica e outras que possuem apenas a fase tónica. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 93 APONTAMENTOS B - Crises de ausência (pequeno mal) – normalmente registam-se nas crianças (412 anos), sendo muito rara nos adultos. As crianças ficam como que “ausentes” da realidade durante cerca de 5 segundos, várias vezes ao dia, sendo impossível acordá-las desse estado. A designação de “pequeno mal” advém do facto do indivíduo manter todas as suas funções vitais. Estas crises podem mimetizar défice de atenção escolar, dificultando o diagnóstico. Para além disso, o tempo de ausência tende a aumentar; • Crises generalizadas sob a forma de convulsões acinéticas – perda generalizada da força muscular, sem que ocorra perda da consciência; • Crises generalizadas sob a forma de crises mioclônicas – múltiplas contracções musculares espasmódicas. 6.2.2. Crises parciais Nestas, os sintomas são muito variados, uma vez que o local da instabilidade eléctrica pode localizar-se em diferentes partes do SNC. • Crises parciais simples – sem perda de consciência; • Crises parciais complexas – com alteração da consciência. 6.2.3. Estado de mal epiléptico O estado de mal epiléptico é uma emergência médica em que o paciente corre perigo de morte. Caracteriza-se pela repetição sucessiva de crises epilépticas, surgindo sem que o doente tenha tempo de recuperar a consciência entre os ataques, acompanhadas de disfunção cardiorespiratória, hipertermia e distúrbios metabólicos. Trata-se de um estado extremamente grave que leva a uma considerável perda neuronial, requerendo tratamento imediato. 6.2.4. Casos clínicos A - A professora de T.D., uma rapariga de 7 anos, com 25 kg de peso, informou os pais que a aluna costumava ter 3 a 4 momentos por dia em que ficava com um olhar pasmado, durante 5-10 segundos. Foi referido que a aluna não tinha qualquer tipo de convulsões, apesar de as suas pálpebras se moverem durante os episódios. A professora passou a estar bastante 94 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS mais atenta em relação a T.D. e verificou que o rendimento escolar da aluna era algo inferior à média. Depois de relatados os factos ao médico e de terem sido realizados exames complementares de diagnóstico, foi feito o diagnóstico de epilepsia, ausências. B - B.S. é, um estudante universitário de 19 anos, 85 kg de peso, que sofreu recentemente a sua primeira convulsão. O colega com quem compartilha o quarto presenciou o episódio. Sem razão aparente, B.S. caiu no chão com um gemido intenso; ficou rígido durante alguns segundos e depois começou “a contorcer-se”, a “espumar pela boca” e “não conseguiu conter a urina”. Ficou completamente inconsciente durante 5-10 minutos depois que as convulsões terminaram. Mal recuperou consciência, o colega transportou B.S. ao hospital mais próximo, onde relatou ao médico que os recebeu o que tinha acontecido. Quando chegou ao hospital, B.S. estava tonto, cambaleante e algo confuso. O doente negou qualquer história de convulsões, traumatismo craniano ou ingestão recente de álcool ou drogas de abuso. Os exames físicos, laboratoriais e neurológicos estavam normais. No hospital, o doente sofreu nova convulsão. Uma enfermeira presenciou a nova crise (85 segundos de duração) e descreveu-a de forma semelhante à do colega de B.S.. Diagnóstico: Epilepsia, crises tónico-clónicas. C - Recentemente, foi feito o diagnóstico de epilepsia idiopática a P.S., um indivíduo de 22 anos de idade, 85 Kg de peso. Durante os últimos 3 meses, tem sido tratado com carbamazepina 600 mg/dia, que tem controlado desde então as suas crises tónico-clónicas generalizadas. Ontem, em casa dos seus pais, sofreu duas crises tónico-clónicas, cada uma com a duração de 3-4 minutos. Durante o caminho para o hospital sofreu uma terceira convulsão. Ao chegar ao hospital estava inconsciente e pouco tempo depois começou outra crise. Diagnóstico: Estado de mal epiléptico. 6.3. Diagnóstico É necessário que o indivíduo tenha registado duas ou mais crises, nos últimos 12 meses, sem evidências de insultos agudos (ex.: febre, ingestão de álcool ou intoxicação por drogas ou abstinência). Como avanço mais significativo da epileptologia moderna, cita-se o reconhecimento dos sindromas epilépticos, o qual possibilita a programação da terapêutica adequada, assim como FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 95 APONTAMENTOS o estabelecimento do prognóstico da epilepsia. A identificação de um sindroma de epilepsia é realizada recorrendo às características clínicas do ataque, como: • Tipo(s) de crise(s); • Distribuição circadiana; • Idade de início; • Etiologia; • Factores precipitantes; • Localização anatómica; • Gravidade; • Prognóstico e dados de exames como electroencefalogramas (EEG), estudos de neuroimagem estrutural como tomografia do crânio, ressonância magnética, tomografia por emissão de fotão único (SPECT) ou tomografia por emissão de positrões (PET); • Exames hematológicos e bioquímicos. 6.4. Incidência Varia com a idade, sexo, raça, tipo de síndrome epiléptico e condições socio-económicas. Nos países desenvolvidos estima-se que a prevalência da doença ronde os 0,5%. Para além disso, dados apontam que cerca de 5 a 7% da população regista pelo menos uma crise epiléptica ao longo da vida. Nos países em desenvolvimento, estima-se que a prevalência seja ainda maior. Por exemplo, na América Latina a prevalência de epilepsia é cerca de 1,5 a 2%. Por outro lado, países desenvolvidos apresentam uma curva de incidência específica em relação à idade, existindo um predomínio nas crianças e nos indivíduos idosos. O pico de incidência ocorre nos adultos jovens. Este facto reflectirá, provavelmente, diferenças etiológicas. Nos primeiros predominam distúrbios de desenvolvimento e epilepsias idiopáticas na infância (epilepsia provavelmente decorrente de susceptibilidade genética), bem como processos degenerativos e vasculares na terceira idade, nos países em desenvolvimento as causas infecciosas e parasitárias, assim como os traumatismos cranioencefálicos, contribuem significativamente para a percentagem dos casos. A epilepsia generalizada de ausência ou tónico-clônica, quando controlada possui um prognóstico de doença beningna. A não ser que estas crises estejam relacionadas com tumores 96 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS do SNC, as crises epilépticas raramente ocorrem nos adultos. A faixa etária e as circunstâncias são extremamente importantes. 6.5. Patogénese 6.5.1. Hipóteses com suporte experimental • Mutações em canais iónicos: o Mutações nos canais de sódio com consequente aumento do tempo de despolarização (hiperexcitabilidade); o Mutações nos canais de potássio, com consequente aumento do tempo de despolarização, devido ao atraso da repolarização; • Hipersensibilidade dos canais de cálcio tipo T, com consequente instabilidade eléctrica; • Hiperactividade glutaminérgica (ex.: encefalite de Rasmussen 1); • Lesões neuronais do hipocampo. 6.5.2. Modelos animais 6.5.2.1. Métodos eléctricos A – Electrochoque máximo (ECM) Aplica-se um choque eléctrico, suficientemente forte para provocar crises epilépticas, sem provocar a morte à cobaia. Este é o modelo experimental das crises de grande mal. O electrochoque é dado aos ratos através de um dispositivo adequado (em forma de T, onde em cada extremidade existem estruturas em «meia lua» que contactam com os olhos da cobaia). O animal não é anestesiado sobrevivendo à crise epiléptica. 1 Encefalite de Rasmussen é uma inflamação progressiva do córtex cerebral. A patologia inicia-se numa parte do hemisfério (direito ou esquerdo), expandindo-se para áreas adjacentes do mesmo lado. Curiosamente não se expande para outros hemisférios cerebrais. A inflamação conduz à perda de neurónios e formação de cicatrizes, resultando numa incapacidade severa dos indivíduos. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 97 APONTAMENTOS B – Kindling É provocada uma lesão crónica ao infligir-se, diariamente, choques eléctricos de baixa voltagem através da instalação de eléctrodos no SNC. Quando o estímulo é removido, a cobaia desenvolve crises epilépticas diárias, até morrer. 6.5.2.2. Métodos químicos Estes métodos caracterizam-se pela administração de substâncias que induzem ataques epilépticos. • Pentileno-tetrazol; • Picrotoxina (inibidor dos canais de cloro) • Bicuculina (antagonista dos receptores do GABAA) • Estricnina (antagonista da glicina). 98 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 6.5.2.3. Animais espontaneamente ou geneticamente epilépticos • Ratinho mutante letárgico (ausências); • Rato com epilepsia genética de Estrasburgo (ausências). 6.6. Tratamento 6.6.1. Tratamento farmacológico O tratamento farmacológico tem como objectivo diminuir a incidência dos ataques, diminuir os riscos de morte, melhorar a qualidade de vida e prevenir a morte neuronial. A medicação possibilita o controlo das crises em 70% dos casos de epilepsia. Os restantes 30% apresentam uma epilepsia refractária aos fármacos antiepilépticos. O tratamento da epilepsia requer uma abordagem multidisciplinar, exigindo a intervenção de um neurologista experiente nesta área. A terapêutica pode visar o tratamento de outras condições clínicas associadas que possam constituir a causa ou contribuírem para o agravamento das convulsões. Como exemplo, citam-se: os distúrbios metabólicos; administração de fármacos ou drogas de abuso; e lesões do SNC. 6.6.1.1. Quando começar o tratamento? O tratamento deve ser iniciado quando existem factores de risco associados à recorrência dos ataques. No entanto, quando uma convulsão ocorre isoladamente, há que ponderar a instituição ou não da terapêutica. Existem profissões de risco para as quais se deve optar pela profilaxia (ex.: motoristas de táxis). Para além disso, existem determinadas características que apoiam esta decisão clínica: • Alterações no exame neurológico; • Mal epiléptico; • Paralisia pósictial; • Forte história familiar de convulsões; • Alteração do EEG. Por outro lado, o tratamento pode não ser a primeira opção quando o paciente consegue evitar os factores precipitantes das crises de epilepsia: • Privação do sono; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 99 APONTAMENTOS • Consumo de álcool; • Luzes (jogos de vídeo, luz solar forte/sombras, luzes psicadélicas de discotecas); • Música, vozes, stress, entre outros. 6.6.1.2. Iniciação e monitorização do tratamento farmacológico A iniciação da terapêutica farmacológica deve ser realizada procedendo-se à titulação da dose do fármaco escolhido (5 x tempo de semi-vida) de forma minimizar as reacções adversas. Esta fase pode demorar vários meses para algumas reacções adversas. Pelo contrário, a sedação e alterações cognitivas ligeiras duram geralmente poucos dias. A monitorização das concentrações do fármaco no plasma é essencial não só para determinar a dose e esquema posológico ideal, mas também para avaliar a adesão à terapêutica. 6.6.1.3. Antiepilépticos 6.6.1.3.1. Classificação de acordo com o mecanismo de acção • Bloqueio dos canais de sódio dependentes de voltagem; o • Bloqueio dos canais de cálcio tipo T dependentes de voltagem; o • Fenitoina, Lamotrigina, Carbamazepina, Topiramato. Etosuccimida. Inibição da libertação de neurotransmissores excitatórios como o aspartato e do glutamato; o • Lamotrigina. Aumento da acção inibitória do GABA, por aumento da sua síntese ou diminuição do seu metabolismo; o • Topiramato, Vigabatrina, Fenobarbital, Benzopdiazepinas. Bloqueio do receptor N-metil D-aspartato; o Felbamato. 6.6.1.3.2. Classificação de acordo com as indicações terapêuticas A – Tratamento de crises parciais ou crises generalizadas do tipo tónicoclônicas (grande mal) 100 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Fenitoina; • Carbamazepina; • Valproato ou ácido valpróico; • Barbitúricos (ex.: fenobarbital); • Novos fármacos: Lamotrigina, Gabapentina, Oxcarbazepina, Topiramato, Felbamato, Vigabatrina e Levetiracetam. B – Tratamento de crises generalizadas de ausência Nestes casos, as opções terapêuticas são limitadas. • Etosuximida (não comercializada em Portugal); • Ácido valpróico e valproato de sódio – mais tóxico que a etosuximida; • Clonazepam (benzodiazepina) – não pode ser administrada de forma crónica a crianças, devido aos fenómenos de tolerância que obrigam ao aumento da dose. C – Tratamento dos estados de mal epiléptico Este tratamento terá de ser realizado por via parentérica. • Benzodiazepinas (Diazepam e Lorazepam); • Fenitoina; • Pentobarbital; • Paraldeido; • Propofol (anestésico); • Midazolam. 6.6.1.3.3. Selecção do fármaco antiepiléptico A selecção destes fármacos deve ser baseada em decisões racionais que abordem: • Eficácia; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 101 APONTAMENTOS o Nem todos são eficazes nas diferentes apresentações desta patologia. No entanto, alguns possuem um espectro de acção bastante alargado. • Reacções adversas; o Alguns antiepilépticos causam sedação, ataxia e diplopia; o Muitos podem causar toxicidade idiossincrática (rash, supressão da medula óssea, hepatotoxicidade), obrigando à monitorização das funções hepática e hematológicas. • Conveniência da posologia; o Deve ter-se sempre em conta que alguns antipsicóticos são fármacos com capacidades indutoras enzimáticas, podendo interferir com outras medicações eventualmente presentes; o Indutores enzimáticos: Carbamazepina, Fenitoina, Fenobarbital e Primidona. ESCOLHA DOS ANTIPSICÓTICOS Crises tónico-clónicas generalizadas primárias Crises parciais Ausências Carbamazepina Primeira Ácido valpróico Fenitoina Ácido valpróico escolha Lamotrigina Lamotrigina Etosuximida Ácido valpróico Fenitoina Carbamazepina Alternativas Topiramato Primidona Fenobarbital 102 Topiramato Levetiracetam Tiagabina Gabapentina Lamotrigina Clonazepam Primidona Fenobarbital FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS FÁRMACO CARACTERISTICAS ESTRUTURA MOLECULAR - O mecanismo de acção determinante é ainda desconhecido, actuando a vários níveis; - Consegue inibir os canais de sódio dependentes de voltagem; - Parece estimular a síntese, inibir a transaminase e intervir na metabolização do GABA, aumentando consequentemente o tempo de semi-vida deste; Ácido valpróico e valproato de sódio - Possui largo espectro de acção, actuando principalmente nas crises generalizadas de ausência, mas também nas restantes; - Pode induzir malformações fetais; - Apesar de tudo, pode ser administrado a crianças; - Pode causar hepatoxicidade, náuseas e vómitos frequentes, trombocitopenia; - A associação com clonazepam pode precipitar crises de ausências. - Bloqueia os canais de sódio dependentes de voltagem; - Pode também ser utilizada na nevralgia do trigémeo; - Muito utilizado um pouco por todo o mundo; - Apresenta uma cinética de 1ª ordem; Carbamazepina - Exige controlo hematológico (risco de anemia aplástica e agranulocitose); - Induz a actividade das CYPs hepáticas, interferindo com outros fármacos; - Espectro de reacções adversas descritas relacionadas essencialmente com o tubo digestivo, a pele e o sistema nervoso central; - Possui ainda acção anticolinérgica, podendo desencadear ou agravar situações de glaucoma e sindromas confusionais em doentes idosos. - Benzodiazepina; Diazepam - Estimula a acção inibitória do GABA no SNC. - Benzodiazepina; Lorazepam - Estimula a acção inibitória do GABA no SNC. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 103 APONTAMENTOS - Benzodiazepina; - Estimula a acção inibitória do GABA no SNC; - Tratamento das crises generalizadas de ausência; - Muito utilizado nas convulsões infantis; Clonazepam - Não pode ser administrada de forma crónica devido aos fenómenos de tolerância que obrigam ao aumento da dose; - Ao contrário das restantes benzodiazepinas, o seu efeito não é afectado pela presença de inibidores da CYP3A4 e sumo de toranja. - Inibe os canais de cálcio tipo T dependentes de voltagem; - Utilizado nas crises generalizadas de ausência; Etosuximida - Quando administrado nas crises generalizadas tónico-clônicas, pode exacerbar a situação patológica; - A função hematológica deve ser monitorizada. - Bloqueia os canais de sódio dependentes de voltagem; - Utilizada no tratamento do grande mal; - A administração nos casos de epilepsia generalizada de ausência pode levar à exacerbação da situação; - Encontra-se também indicada para a nevralgia do trigémeo; - Fármaco administrado de forma crónica aos pacientes com epilepsia; Fenitoina - Cinética irregular dificultando a titulação; - Tempo de semi-vida longo (administrado 1-2x/dia); - Exige monitorização da função hepática; - Como reacções adversas citam-se: hirsutismo, hiperplasia gengival, nistagmo, disfunção hepática, anemia megaloblástica, osteomalácia, hiperglicémia e glicosúria, síndroma semelhante ao lúpus eritematoso. - Barbitúrico; Pentobarbital* - Estimula a acção inibitória do GABA no SNC; - Utilizado no tratamento dos estados de mal epiléptico. - Barbitúrico; - Estimula a acção inibitória do GABA no SNC; O H N O - Tratamento das crises generalizadas tónico-clônicas; Fenobarbital* - Não se encontra indicado para as crises de ausência; - Pode surgir tolerância e/ou dependência física ou psicológica, assim como HN O transtornos psíquicos e neurológicos; - Estão ainda descritas: alterações sanguíneas, perturbações gastrointestinais, alergias, manifestações articulares, osteomalácia (responde a altas doses de 104 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS vitamina D), hipotensão ortostática, hipoprotrombinémia e hemorragia em recém-nascidos cujas mães tomaram fenobarbital durante a gravidez (pode ser tratada administrando vitamina K); - O álcool e outros depressores do SNC potenciam o seu efeito; - Aumenta o metabolismo dos corticosteróides, anticonceptivos orais, outros anticonvulsivantes e digitoxina. - Barbitúrico; - Estimula a acção inibitória do GABA no SNC, por efeito GABAérgico; - Provocam algum bloqueio dos canais de sódio dependentes de voltagem; - Tratamento das crises generalizadas tónico-clônicas; - Não se encontra indicado para as crises de ausência; H N - Normalmente é utilizado na terapêutica como adjuvante, embora possa também ser utilizado em monoterapia; - Pode induzir transtornos psíquicos e neurológicos; Primidona* O HN - Estão ainda descritas: alterações sanguíneas, perturbações gastrointestinais, alergias, manifestações articulares, osteomalácia (responde a altas doses de vitamina D), hipotensão ortostática, hipoprotrombinémia e hemorragia em O recém-nascidos cujas mães tomaram primidona durante a gravidez (pode ser tratada administrando vitamina K); - A metabolização dá origem a 2 metabolitos principais: fenobarbital e feniletilmalonamida; - Como todos os barbitúricos, reduz as concentrações plasmáticas de carbamazepina, clonazepam, lamotrigina, fenitoina, etosuximida e aumenta as concentrações de valproato. - Bloqueio dos canais de sódio dependentes de voltagem; - Inibição da libertação do aspartato e do glutamato; - Utilizado em monoterapia ou como adjuvante nas crises parciais e crises Lamotrigina generalizadas tónico-clônicas; - Em crianças com menos de 12 anos, a monoterapia não é recomendada; - Pode causar exantemas graves; - Deve-se monitorizar a função hepática, renal e hemostática. - Ao contrário do diazepam, não é depressor do sistema respiratório nas doses terapêuticas, sendo mais seguro quando não existem meios médicos próximos; Paraldeido - Esta característica faz deste fármaco a medicação ideal a ser administrada pelos pais que possuem crianças com epilepsia; - Como a relação da dose de efeito hipnótico e de efeito anticonvulsivante é pequena, a sonolência é uma das reacções adversas mais comuns. - Modula o transporte de aminoácidos para o cérebro, interferindo ainda com a recaptação do GABA; Gabapentina - Apenas pode ser utilizado como adjuvante nas crises parciais com ou sem generalização em adultos, mas nunca em monoterapia; - Encontra-se ainda indicado para a dor neuropática; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 105 APONTAMENTOS - Como reacções adversas regista-se sonolência, fadiga, ataxia, tonturas, diplopia, rinite, entre outras; - Estão descritas interacções com antiácidos, cimetidina e anticonceptivos orais; - O mecanismo de acção ainda não está completamente elucidado; - Pensa-se que inibirá o reuptake do GABA ao inibir o transportador; - Apenas pode ser utilizado como adjuvante nas crises epilépticas parciais e nunca em monoterapia; - Deve ser administrada com alimentos; Tiagabina - Parece existir interacção farmacodinâmica com substâncias com efeito depressor do SNC; - Como reacções adversas, encontram-se descritas: astenia, tonturas, sonolência, tremor, ansiedade, alteração da cognição, ataxia, insónia, confusão, amnésia, parestesias, depressão e agressividade, dificuldade de concentração, cefaleias, disartria, dor abdominal, náuseas, vómitos, diarreia, faringite. - Fármaco recente; - Bloqueia os canais de sódio dependentes de voltagem; - Potencia o efeito inibitório do GABA por agonismo GABAérgico e inibição da sua metabolização; - Inibe a actividade excitatoria da neurotransmissão, através da acção sobre os receptores AMPA (antagoniza os efeitos excitatórios do glutamato); Topiramato - Apenas pode ser utilizado como adjuvante e nunca em monoterapia; - Como reacções adversas citam-se: dores abdominais, anorexia, perda de peso, confusão, perturbação do humor, depressão, alterações do comportamento, ataxia, entre outros; - Interage com outros antiepilépticos, aumentando as concentrações de fenitoina e o metabolismo dos anticoncepcionais orais. - Foi introduzido recentemente na terapêutica da epilepsia; - Inibe a transaminase do GABA; Vigabatrina - Reduz as concentrações de fenitoina, podendo também reduzir as concentrações de primidona e fenobarbital; - Pode produzir alterações no campo visual. *Nota: Os barbitúricos podem ser administrados a crianças com epilepsia, devendo-se controlar a dose administrada devido ao risco de depressão respiratória. 6.6.1.3.4. Mudança do fármaco antiepiléptico A troca do fármaco deve ser realizada iniciando-se a administração do 2º fármaco antes de se proceder à descontinuação do 1º fármaco (tal como indicado nos antipsicóticos). 106 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 6.6.1.3.5. Descontinuação da terapêutica farmacológica A descontinuação da terapêutica farmacológica é possível em 70% das crianças e 60% dos adultos. Para que esta opção possa ser realizada, é necessário que o perfil do doente obedeça a certos requisitos, nomeadamente: • O paciente demonstra um controlo completo durante 1-5 anos (dependendo do tipo de crise); • O paciente apresenta apenas um tipo de crise; • O EEG apresenta-se normal; • O exame neurológico é normal. Com este perfil torna-se razoável descontinuar o tratamento ao fim de 2 anos da apresentação do perfil descrito, num paciente que: • Cumpra os principais critérios descritos anteriormente; • Esteja motivado para a descontinuação; • Entenda os riscos e benefícios inerentes à descontinuação do tratamento. Quando todos estes requisitos são cumpridos, a redução da dose pode ser realizada, executando-se uma diminuição da mesma ao longo de 2-3 meses. Durante este período o paciente, familiares e outros relativos, devem estar especialmente atentos a possíveis reacções adversas que possam surgir, devendo o doente evitar situações de perigo (ex.: conduzir, nadar, entre outras). 6.6.1.3.6. Tratamento do estado de mal epiléptico Nesta situação de emergência médica, deve-se procurar resolver qualquer problema cardio-respiratório (monitorização dos sinais vitais e ventilação) ou eventual hipertermia (administração de antipiréticos ou recorrer ao arrefecimento corporal dos indivíduos). Como a terapêutica instituída deve actuar rapidamente, estabelecem-se acessos venosos estáveis que permitam a sua administração. Deve-se ainda realizar um EEG, administrar soro glucosado e colher amostras para pesquisa de possíveis alterações metabólicas como acidose metabólica. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 107 APONTAMENTOS A ordem terapêutica anticonvulsivante, nesta situação, deve reger-se pela seguinte sequência: Benzodiazepinas (Diazepam ou Lorazepam); Fenitoina. Deve monitorizar-se a pressão sanguínea e o electrocardiograma devido ao risco de hipotensão marcada e arritmia, respectivamente; Fenobarbital. Deve monitorizar-se a pressão sanguínea e a função respiratória, podendo ser necessário instituir ventilação assistida; Anestesia conseguida pela administração de Midazolam, Propofol ou Pentobarbital. 6.6.1.3.7. Outras indicações terapêuticas dos antipsicóticos Ácido valpróico Doença bipolar Carbamazepina Carbamazepina Nevralgia do trigémio Fenitoína Gabapentina Dor neuropática Pregabalina Profilaxia da enxaqueca Ácido valpróico Ansiolítico / hipnótico / pré-anestésico Fenobarbital 6.6.2. Tratamento não farmacológico 6.6.2.1. Cirurgia A cirurgia na epilepsia é complexa, devendo existir um grande estudo e planificação da mesma, de forma a atingir os melhores resultados. O sucesso da cirurgia depende de vários factores como a correcta e cuidadosa selecção dos pacientes, dos conhecimentos médicos e respectiva equipa cirúrgica. A operação pode levar várias horas, uma vez que os cirurgiões têm de localizar e remover as áreas de instabilidade eléctrica identificadas nos testes anteriormente realizados. Durante a cirurgia, o registo do EEG auxilia o cirurgião a localizar a área exacta do cérebro a ser removida. A cirurgia poderá ser realizada apenas com anestesia local encontrando-se o paciente consciente durante todo o processo. Isto é possível porque o tecido cerebral não é sensível à dor. Este processo é mais frequente nas operações realizadas em adultos ou idosos, do que nas crianças. 108 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS A intervenção cirúrgica parece reduzir a frequência das crises (90% em 15-25% dos doentes) ou controlo total (70%). Actualmente verificam-se avanços na avaliação pré-cirurgica e nas técnicas de microcirurgia. 6.6.2.2. Estimulação eléctrica do nervo vago A estimulação eléctrica do nervo vago é uma opção terapêutica utilizada quando não existem indicações para a realização de cirurgia. Consiste no posicionamento de um eléctrodo bipolar na porção medio-cervical do vago esquerdo, ligado a um gerador subcutâneo implantado na região subclávica. Uma vez implantado, Estimulação eléctrica do nervo vago o dispositivo emite pulsos eléctricos, estimulando o nervo vago. Deve-se alertar os pacientes para o facto dos efeitos terapêuticos levarem algum tempo até serem observados. O mecanismo de acção característico desta opção terapêutica não se encontra completamente elucidado, suspeitando-se que esta possa aumentar o limiar da convulsão. Estudos demonstraram que aproximadamente 50% dos pacientes tratados apresentavam diminuição do número de ataques. Como reacções adversas, estão descritas rouquidão transiente, tosse e dispneia. 6.6.2.3. Dieta cetogénica A dieta cetogénica pode ser efectiva em alguns casos de epilepsia, embora esta opção terapêutica esteja em desuso. Caracteriza-se pela riqueza em gordura e pobreza em hidratos de carbono, com ingestão de líquidos por vezes limitada. Este tratamento teve origem em 1920, no Hospital John Hopkins, tendo sido largamente abandonada com a descoberta dos fármacos antiepilépticos. O efeito terapêutico desta dieta sobre a epilepsia não é completamente entendido, relacionando-se provavelmente com o pH (cetoacidose metabólica) e alteração do metabolismo cerebral. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 109 APONTAMENTOS 6.7. Auxiliar os pacientes durante os ataques Como o clínico raramente presencia a crise epiléptica, torna-se fundamental educar não só o doente mas também os familiares e outras pessoas relacionadas com ele. Qualquer pessoa deve estar atenta a alguns aspectos relevantes que serão determinantes para o estabelecimento do diagnóstico. Alguns aspectos devem então ser considerados como: • Algum factor precipitou a crise? • Quanto tempo durou a crise? • Qual o comportamento do doente antes da crise? • Houve movimentos anormais dos olhos? • A convulsão foi localizada ou envolveu o corpo todo? • Verificou-se perda da consciência? • Observou-se incontinência urinária? • Qual o comportamento do doente depois da crise? Nas crises tónico-clônicas deve procurar afastarse todos os objectos que possam ferir o paciente durante o ataque. Este deve ser colocado em posição lateral de segurança de forma a evitar a acumulação de saliva na cavidade bucal. Esta operação pode ser difícil de realizar quando existem fortes crises convulsivas. Nunca introduzir qualquer tipo de objecto na boca do paciente com o intuito de impedir que este “engula a língua”. Este procedimento tem origem no Posição lateral de segurança folclore comum, bastante divulgado, mas que na realidade não faz qualquer tipo de sentido. No entanto, é possível que o paciente morda a língua durante o ataque de epilepsia. Os indivíduos epilépticos devem estar acompanhados quando em situações que os possam colocar em risco. Como exemplo, cita-se o perigo de afogamento destes doentes, em praias e piscinas, por eventuais crises de epilepsia que possam insurgir. 110 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 6.8. Epilepsia versus gravidez versus lactação Uma grávida que sofra de epilepsia não pode nem deve abandonar a terapêutica. Estão descritos efeitos teratogénicos para quase todos os fármacos utilizados no tratamento da epilepsia. No entanto, esta reacção adversa apresenta baixa probabilidade de ocorrer. Como tal, as vantagens terapêuticas quase sempre se sobrepõem aos riscos inerentes. Deve existir um acompanhamento clínico das pacientes, embora o parto ocorra normalmente sem problemas. Deve ter-se atenção ao facto de alguns antiepilépticos serem indutores enzimáticos, podendo causar deficiências transitórias de vitamina K no recém-nascido. Este problema é facilmente ultrapassado através da administração de suplementos de vitamina K. Por outro lado, fármacos como a Carbamazepina, Fenitoina, Fenobarbital e Topiramato, através da indução enzimática, conseguem antagonizar significativamente o efeito dos contraceptivos orais. Nestes casos deve proceder-se à alteração da medicação contraceptiva ou procurar instituir métodos anticoncepcionais alternativos. Na lactação, pode ocorrer passagem dos fármacos antiepilépticos ou seus metabolitos para o leite materno. No entanto, esta situação depende do fármaco e das próprias características inerentes de cada mulher, devendo-se realçar sempre a importância e os benefícios do aleitamento materno. Como tal, também aqui deve existir uma monitorização do lactente. 6.9. Aspectos psicológicos e sociais da epilepsia A epilepsia constitui ainda hoje, um estigma social para os doentes afectados por esta patologia. Actualmente, mesmo em países desenvolvidos, ainda se negam alguns direitos civis a pessoas que sofrem desta patologia (ex.:casamento). Existem várias culturas que associam esta patologia a crenças religiosas e possessões demoníacas. A epilepsia era designada por «doença sagrada» uma vez que os doentes epilépticos atravessavam crises que aparentavam ser ataques demoníacos. Por outro lado, as visões que estes doentes experimentam eram entendidas no passado como mensagens enviadas pelos Deuses. Na Tanzânia, assim como noutros locais de África, a epilepsia é ainda associada a FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 111 APONTAMENTOS possessões por demónios malignos, bruxaria ou envenenamento, existindo plena convicção popular que esta é contagiosa. "People believe that this disease is sacred simply because they don't know what causes it? But some day I believe they will, and the moment they figure out why people have epilepsy, it will cease to be considered divine.” Hipocrates (460 AC - 377 AC) 6.10. Convulsões febris nos lactentes Os recém-nascidos estão mais predispostos a desenvolver convulsões quando a temperatura corporal se eleva para além dos 38,5ºC. Estudos demonstram existir uma relação entre o número de convulsões febris no recém-nascido (6-9 meses) com a maior predisposição para desenvolver epilepsia em adulto. 6.10.1. Tratamento de convulsões febris nos lactentes Deve dar-se um banho com água tépida ao bebé, de forma a reduzir a temperatura corporal. De 8 em 8 horas pode ser administrado Ben-u-ron® (paracetamol) sob a forma de supositórios. Pode intercalar-se esta administração com Brufen® (ibuprofeno), com a desvantagem de apenas existir a forma de xarope. Assim, administrar-se-ia Ben-u-ron® e passado 8 horas Brufen®, repetindo-se o ciclo. 112 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 7 – DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL As doenças neurodegenerativas do SNC são, actualmente, cada vez mais comuns nas sociedades, consequência do envelhecimento populacional e do estilo de vida característico dos países desenvolvidos. Entre as diversas patologias já descritas, citam-se: • Doença de Parkinson; o Patologia caracterizada pela degeneração dos neurónios dopaminérgicos presentes na substância nigra, com consequente descoordenação motora, rigidez, tremor, entre outros sintomas. • Doença de Huntington; o Patologia caracterizada pela perda e atrofia de neurónios do núcleo da base e corpo estriado, com consequente descoordenação do pensamento, do estado psicológico e do movimento. Em indivíduos com doença de Huntington avançada, a atrofia é tal que pode ser registada uma redução de 25-30% da massa cérebral. Possui uma forte componente hereditária, estando bem descrita e documentada um pouco por todo o mundo. • Doença de Alzheimer; o Patologia caracterizada pela perda de neurónios do córtex e hipocampo, e consequente alteração grave da memória e capacidade cognitiva. • Esclerose Lateral Amiotrófica; o Patologia caracterizada pela degeneração selectiva dos neurónios motores do córtex cerebral (neurónios motores superiores) e da medula (neurónios motores inferiores) e consequente perda da força muscular. É uma doença progressivamente fatal para a qual não existem, actualmente, terapêuticas. É considerada uma das patologias O conhecido cientista Stephen Hawking sofre de esclerose lateral amiotrófica neurodegenerativas mais assoladoras. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 113 APONTAMENTOS 8 – DOENÇA DE PARKINSON Foi descrita e caracterizada pela primeira vez por James Parkinson em 1817, que a designou por paralysis agitans. É uma patologia caracterizada pela perda e atrofia dos neurónios dopaminérgicos localizados na parte compacta da substância nigra. A perda destas células tem como consequência a instalação de descoordenação motora, rigidez muscular, bradicinésia, tremor rítmico em repouso, entre outros sintomas. É uma das patologias neurodegenerativas mais comuns, sendo ultrapassada apenas pela doença de Alzheimer. É característica de determinadas faixas etárias, nomeadamente a faixa dos 60-80 anos, sendo muito raramente diagnosticada em indivíduos com menos de 40 anos. No entanto, quando tal se verifica, as consequências são mais graves, uma vez que os tratamentos, actualmente disponíveis, não são eficazes a longo prazo para controlar a sintomatologia associada. O sexo masculino parece estar mais predisposto a desenvolver esta patologia que o sexo feminino. O prognóstico da doença de Parkinson tem evoluído paralelamente com o desenvolvimento da medicina e descoberta de novas terapêuticas. Actualmente, os doentes com Parkinson dispõem de um período maior de controlo dos sintomas (10 a 15 anos) ao mesmo tempo que surgem outras opções terapêuticas não farmacológicas como o DBS (Deep Brain Stimulation). 8.1. Sintomatologia Os sintomas apenas se fazem sentir quando existe uma perda neuronal de 70 a 80% dos neurónios. Existe um conjunto de arquivos de vídeo, disponíveis na internet, que demonstram a sintomatologia característica desta patologia. Aqui ficam algumas sugestões: 114 • http://www.youtube.com/watch?v=iaguKRfEqe4; • http://www.youtube.com/watch?v=doyk20-Qpss; • http://www.youtube.com/watch?v=qQ3VwgXoPTc; • http://www.youtube.com/watch?v=1L15wsLWquc; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • http://www.youtube.com/watch?v=XCa4-vGQQLs; • http://www.youtube.com/watch?v=wvLsm5vmVXA; • http://www.youtube.com/watch?v=aQgaNMI30YU; • http://www.youtube.com/watch?v=xhtYk5crxVY; • http://www.youtube.com/watch?v=gnDHMveS9_M; • http://www.youtube.com/watch?v=N5vm4ZoCmUA; Os sintomas podem ser divididos em sintomas motores e sintomas não motores. 8.1.1. Sintomas motores • Tremor em repouso (presente em 85% dos pacientes com Parkinson, com inicio unilateral, progredindo para distal) particularmente proeminente nas mãos, pernas, lábios, língua e músculos do pescoço; • Rigidez muscular. Este sintoma pode alternar com tremor subclínico caracterizados por movimentos do braço em «roda dentada» (em solavancos); • Dificuldades respiratórias que induzem o desenvolvimento doutras patologias como pneumonias e tromboembolismo pulmonar, quando estes pacientes estão acamados; • Bradicinésia. Estado altamente incapacitante caracterizado pela diminuição dos movimentos e da capacidade de coordenação motora; • Perda da agilidade motora; • Dificuldade em executar tarefas tão simples como abotoar um botão; • Micrografia – letra pequena e tremida; • Expressão facial apática e focalizada; • Desequilíbrio motor e instabilidade corporal que evoluem para estados altamente debilitantes associados à morbilidade e mortalidade desta patologia; • Sialorreia – secreção anormal e excessiva de saliva; • Hipofonia – suavidade do discurso; • Cãibras; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 115 APONTAMENTOS • Uma vez iniciada a marcha, estes doentes sentem dificuldade em mudar de direcção; • Inclinação/prostração – estes doentes podem apresentar-se curvados e contraídos. 8.1.2. Sintomas não motores • Impotência sexual masculina; • Diminuição da capacidade sensitiva visual para distinguir contrastes e cores; • Anósmia (diminuição ou perda do olfacto); • Depressão, quer seja intrínseca da doença, induzida ou agravada pela terapêutica, quer devido a outras causas; • Ansiedade. Pode apresentar-se isolada ou acompanhada de depressão e compromisso cognitivo, sendo consequência das flutuações motoras associadas à terapêutica; • Alterações cognitivas. Como consequência da doença, do tratamento, ou de outras causas, estes pacientes podem apresentar dificuldade em completar tarefas, planos a longo prazo e memorizar; • Alterações comportamentais. A depressão, a demência e a própria terapêutica são factores de risco importantes para o desenvolvimento de sintomas psicóticos (delírios, alucinações visuais, entre outros); • Ataques de pânico; • Perturbações do sono. Os pacientes relatam insónia inicial, intermédia ou tardia, sonolência diurna e apneia do sono. As desordens nocturnas devem-se aos sintomas motores como rigidez, bradicinésia, movimentos involuntários e tremor. A terapêutica influência a percepção dos sonhos, podendo registar-se alucinações. 116 • Obstipação; • Sudação excessiva; • Hipotensão ortostática; • Dermatite seborreica; • Incontinência urinária; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Perda de peso corporal; • Demência. 8.1.3. Parkinsonismo Trata-se de uma síndrome que parece mimetizar os sinais e sintoma da doença de Parkinson idiopática, (bradicinésia, tremor em repouso, desequilíbrio motor, rigidez muscular intensa) sem que no entanto corresponda à mesma patologia. Este síndrome pode surgir como consequência de várias situações, das quais se citam: • Administração de fármacos antipsicóticos e antieméticos (fármacos que bloqueiam os receptores dopaminérgicos); • Doença de Wilson (patologia hereditária que resulta da acumulação de cobre); • Tremor essencial; • Tumores; • Infecções (cisticercoses, SIDA, entre outros); • Intoxicações (monóxido de carbono, manganésio, entre outros); • Traumatismo craniano; • Entre outros. 8.2. Etiologia Como já referido anteriormente, existe uma perda e atrofia dos neurónios dopaminérgicos localizados na parte compacta da substância nigra, resposta à vulnerabilidade genética, stress oxidativo, disfunção proteossomal e factores ambientais dos quais a maior parte ainda estão por descobrir (pesticidas, herbicidas, exposição e manipulação de manganésio, entre outros). O stress oxidativo parece ser particularmente importante no Corpos de Lewis Coloração HE (1000x) que se refere às formas esporádicas de doença de Parkinson. Como tal, as fontes de stress oxidativo endógeno (espécies reactivas de oxigénio derivadas do metabolismo da dopamina e melanina; prováveis deficiências dos complexos I mitocondriais presente nas plaquetas e músculos de indivíduos com doença de Parkinson) e fontes exógenas FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 117 APONTAMENTOS (MPTP 2 e outros derivados meperidinicos, rotenona, paraquato, [insecticidas]) podem levar à acumulação e agregação da α-sinucleina (proteína que quando não clivada acumula-se dentro das células causando lesão celular através da formação de inclusões citoplasmáticas, designadas por corpos de Lewis) e disfunção proteossomal. 8.3. Caso clínico A - L.M. é um homem de 65 anos, destro, artista, que procurou um neurologista por ter dificuldade em pintar os seus quadros devido à instabilidade da sua mão direita. Também se queixa de uma dificuldade cada vez maior em se levantar das cadeiras e de uma certa rigidez dos braços e das pernas. A sua mulher refere que L.M. tem andado algo esquecido; ele próprio admite não ter a capacidade de memória de outros tempos. A sua história clínica anterior inclui depressão durante o ano anterior, gota (actualmente não necessitando de medicação), obstipação e hipertrofia prostática benigna. O exame físico revelou um paciente bem desenvolvido, bem nutrido, aparentemente ansioso. Mostrava uma notável falta de expressão facial e falava em tom monocórdico. Era notório um forte odor corporal. O exame das extremidades revelou uma rigidez do tipo “roda dentada” em ambos os braços. A sua caminhada era lenta mas normal, com uma postura ligeiramente inclinada. O exame genitourinário mostrou apenas hipertrofia prostática. Os exames laboratoriais encontravam-se dentro dos limites normais. Diagnóstico: Doença de Parkinson. B – C. S. R., 70 anos, é portador da síndrome de Parkinson há 4 anos, apresenta dificuldades ao andar e ao mudar de posições. Tem tremores (predominantes nos membros superiores) e uma postura corporal em flexão. O seu discurso é realizado de forma lenta, fraco e cansado. Apresenta xerostomia e uma ligeira rigidez muscular. 2 MPTP - 1-metil 4-fenyl 1,2,3,6-tetrahidropíridina. Este composto é utilizado em investigações para induzir Parkinson em modelos animais. 118 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 8.4. Tratamento A opção terapêutica escolhida tem como objectivo manter a amplitude dos movimentos, prevenindo a rigidez e contracções musculares, diminuir os tremores, orientar ao treino de marcha e equilíbrio, estimular a expressão facial e as actividades motoras que impliquem precisão É imperativo ter em conta que a doença de Parkinson, à luz dos conhecimentos actuais, não possui tratamento. As opções terapêuticas existentes apenas actuam sobre os sintomas, evitando a progressão rápida da doença. No entanto, se estas terapêuticas não forem adoptadas, a patologia evolui num período de 5 a 10 anos, para um estado de rigidez e acinésia. Algumas personalidades conhecidas que sofreram/sofrem da doença de Parkinson. Salvador Dali, Michael J. Fox, Adolf Hitler e João Paulo II. Para além das opções, apresentadas de seguida, é essencial que os doentes de Parkinson mantenham uma boa actividade física e mental, sendo ideal a implementação de terapêuticas ocupacionais para evitar as alterações do humor que normalmente decorrem nestes indivíduos, resultantes das condições físicas inerentes. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 119 APONTAMENTOS O tratamento instituído deve ser ponderado, resultante de uma abordagem multidisciplinar, envolvendo a actuação de neurologistas, psiquiatras e clínicos gerais. 8.4.1 Selecção do tratamento Na selecção da melhor opção terapêutica deve ter-se em conta determinados parâmetros como: • Idade em que é detectada a doença nos indivíduos; • Estado cognitivo do doente (existem anti-parkinsonianos que podem agravar o estado cognitivo); • Sintomatologia; • Custos da terapêutica. Normal: Neurónio dopaminergico Substância nigra Sistema Motor Neurónio GABAminergico Neurónio acetilcolinérgico Parkinson: Neurónio dopaminergico Substância nigra Sistema Motor Neurónio GABAminergico Neurónio acetilcolinérgico 8.4.2. Tratamento farmacológico O tratamento farmacológico tem como objectivos a manutenção das funções cognitivas e motoras, melhorar a qualidade de vida e evitar o surgimento de reacções adversas resultantes da própria farmacoterapia. O tratamento farmacológico segue as seguintes estratégias: • Administração de percursores da dopamina associados a inibidores descarboxilase periférica; 120 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I da APONTAMENTOS o • L-Dopa associada a Carbidopa ou Benserazida. Agonistas dos receptores dopaminérgicos; o Bromocriptina, Pergolide, Pramipexole, Ropinirole, Cabergolina, Apomorfina e Lisuride. • Inibidores do metabolismo da dopamina; o Inibidores da COMT (catecol orto-metil transferase); o Inibidores selectivos da MAOB (monoaminoxidase B); • Selegilina e Rasagilina. Antagonistas dos receptores muscarínicos; o • Entacapona e Tolcapona. Tri-hexifenidilo, Benzatropina e Biperideno. Amantadina. 8.4.2.1. L-Dopa • É considerado, actualmente, o tratamento mais eficaz no controlo dos sintomas da doença; • Administração realizada por via oral; • Boa biodisponibilidade (pico plasmático é atingido L-Dopa em 1 a 2 horas); • Deve ser administrado antes das refeições. Como aminoácido que é, a L-Dopa tem de ser transportada por proteínas especializadas no transporte de aminoácidos aromáticos, de forma a passar para a barreira hematoencefálica. Se este fármaco for ingerido durante ou após as refeições, os aminoácidos presentes na dieta competem directamente com ele para o transporte. Consequentemente, menos fármaco é absorvido pelo organismo; • A taxa de absorção intestinal encontra-se ainda dependente da velocidade de esvaziamento gástrico, do tempo de exposição às enzimas digestivas presentes no estômago e intestino, e do pH do suco gástrico; • Possui um tempo de semi-vida muito curto (1-3 horas); FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 121 APONTAMENTOS • Atravessa a barreira hematoencefálica através de transportadores específicos (transporte activo de aminoácidos aromáticos); • É convertida a dopamina, nos neurónios dopaminérgicos presentes no SNC, pela descarboxilase de L-aminoácidos (dopa-descarboxilase); • Apenas 1 a 5% da L-Dopa entra nos neurónios dopaminérgicos e é convertida a dopamina; • A L-Dopa é associada a um de dois inibidores da descarboxilase periférica actualmente disponíveis (Carbidopa ou Benserazida), impedindo assim a metabolização da L-Dopa fora do sistema nervoso central; o Esta associação permite diminuir a dosagem de L-Dopa em 75% (distribuição central 1-3% Vs 10%); o Antes da associação destes fármacos, a administração da L-Dopa devia ser realizada com algumas restrições alimentares. Entre elas citava-se a restrição de vitamina B6 (piridoxina), presente em determinados géneros alimentícios (peixe, fígado, ovos, porco, frango, amendoins, e soja) que aumenta o metabolismo extracelular da L-Dopa; o Outra vantagem desta associação é o aumento do tempo de semi-vida da LDopa, permitindo aumentar os intervalos entre as tomas diárias (3 a 4 tomas diárias); • o Carbidopa + Levodopa [co-careldopa] (ex.: Sinemet®, Parcopa®) o Benserazide + Levodopa [co-beneldopa] (ex.: Madopar®); Apresenta um efeito dramático sobre a sintomatologia característica desta patologia. Os doentes respondem ao tratamento denunciando imediatamente as melhoras; • Regista-se também uma melhoria do humor deprimido destes pacientes e perda da apatia; • No entanto, esta farmacoterapia induz o aparecimento de complicações/flutuações motoras a longo prazo (ao fim de 2 anos após inicio da terapêutica). O mecanismo pelo qual estes sintomas são induzidos ainda não se encontra completamente 122 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS elucidado, implicando possivelmente a interferência doutras vias, presentes no sistema nervoso central, importantes na fisiopatologia e farmacoterapia da patologia; • Induz o aparecimento de fenómenos OFF (apatia e acinésia) e fenómenos ON (movimentos involuntários e descontrolados); • As flutuações motoras e movimentos involuntários podem ser retardados pela utilização inicial de agonistas da dopamina, embora com pequeno impacto na incapacidade; • Existem formulações de libertação prolongada, importantes em doentes com flutuações motoras de fim de dose ou com problemas de mobilidade nocturna. No entanto, quando se optam por estas formas farmacêuticas, a titulação da dose é difícil, devendo ser realizada por um clínico experiente; • Como tal, a instituição da terapêutica com L-Dopa só é realizada como última opção farmacológica; • Existem contudo excepções. A L-Dopa é considerada a 1ª opção terapêutica quando: o Os doentes apresentam sintomas psicóticos ou distúrbios diurnos do sono severos; • o Idosos; o Doentes com fenótipos acinétios-rígidos; Complicações motoras relacionadas com a administração de L-Dopa: o Ocorrem em 5 a 10% dos pacientes; o Deterioração de fim de dose (wearing off): Corresponde à diminuição da capacidade de armazenamento de dopamina a nível neuronal. Como consequência, os efeitos terapêuticos da L-Dopa desaparecem mais rápido, sendo necessário aumentar a frequência das doses; Pode recorrer-se às formulações de libertação controlada (podendo estar associado ou não, com as formulações de libertação imediata); FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 123 APONTAMENTOS Pode utilizar-se concomitantemente agonistas da dopamina, Selegilina, iCOMT e Amantadina. o Períodos OFF: Podem dever-se ao atraso no esvaziamento gástrico ou absorção deficiente do fármaco; Para contornar a absorção deficiente, deve-se: administrar a L-Dopa antes das refeições; chupar ou mastigar o comprimido; e diminuir o conteúdo proteico das refeições; Pode ainda ponderar-se a administração de agonistas da dopamina e formulações de libertação imediata. o Fenómenos on-off: Períodos imprevisíveis em que o doente apresenta hipocinésia e rigidez (períodos off), alternados com períodos em que a terapêutica consegue controlar os sintomas. Nesta situação, os doentes podem estar a caminhar normalmente e, de um momento para o outro, sentem-se presos ao local, não conseguindo deslocar-se; Poderá ser uma consequência da extensão do efeito de deterioração de fim de dose; Registam-se alterações farmacodinâmicas que vão-se agravando com o prolongar da doença e do défice motor; Para contornar esta complicação, deve-se ponderar a administração de agonistas da dopamina, formulações de libertação prolongada, Selegilina e iCOMT. o Discinésias: São complicações associadas ao pico do efeito terapêutico ou bifásicas (relacionadas com o inicio ou fim de dose); Pode resultar do excesso de estimulação estriatal pela dopamina; Para contornar estas reacções, deve-se aumentar o intervalo entre doses menores; 124 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Deve-se ponderar a administração de formulações de libertação prolongada, agonistas da dopamina, Amantadina, Propranolol, fluoxetina, Buspirona e Clozapina; Deve-se reduzir a administração de anticolinérgicos caso se registem discinésias bifásicas. o Distonia, mioclonos, acatísia: Complicações típicas das primeiras horas da manhã; As distonias podem ser resolvidas através da administração de formulações de libertação prolongada ao deitar, alternadas com a administração de formulações de libertação imediata ao acordar. Pode ainda ponderar-se a administração de agonistas da dopamina e anticolinérgicos; Os mioclonos (movimentos involuntários, súbitos, rápidos produzido por contracção muscular) podem ser atenuados através redução da dose de L-Dopa ao deitar e administração de clonazepam; A acatísia pode ser resolvida ou atenuada através da administração de benzodiazepinas e antagonistas β (Propranolol, Inderal®). • Outras complicações relacionadas com a administração de L-Dopa: o Psicose: Este distúrbio resulta da acção da L-Dopa ou agonistas da dopamina sobre o sistema límbico; Esta reacção ocorre mais frequentemente em doentes idosos, confusos ou com demência; Deve-se procurar simplificar a terapêutica anti-parkinsoniana o máximo possível, seguindo ordens específicas pré-estabelecidas de remoção terapêutica; Ponderar a utilização de antipsicóticos atípicos: Quetiapina, Risperidona, Olanzepina ou Clozapina, ao deitar; • Estão descritas as seguintes reacções adversas: FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 125 APONTAMENTOS o Efeitos Gastrointestinais: Anorexia – para contornar este efeito adverso, administra-se a LDopa durante as refeições. No entanto há que ter em conta que esta opção fará diminuir a biodisponibilidade do fármaco, como explicado anteriormente; Náuseas e vómitos (<20%) – para contornar estes efeitos adversos, pode administrar-se antieméticos (ex.: Domperidona, Motilium®). o o o Efeitos Cardiovasculares: Arritmias (baixa incidência); Hipotensão postural (comum); Hipertensão. Discinésias: Este efeito depende 80% da dose; Pode surgir associado à face, tronco ou membros. Alterações do humor ou da personalidade Podem ser precipitados quer pela doença quer por cirurgias; Podem responder à terapêutica com antipsicóticos atípicos; Caracteriza-se por: depressão, ansiedade, agitação, sonolência, insónia, confusão, delírio, alucinações, pesadelos e euforia. o Flutuações motoras: São o resultado da deterioração de fim de dose e fenómenos on-off; A frequência destas reacções adversas, aumenta com a duração da terapêutica; Existe maior probabilidade de afectarem doentes que apresentem boa resposta inicial à terapêutica. o 126 Outras: Midríase; Glaucoma agudo; Discrasias sanguíneas (empobrecimento sanguíneo); FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Agravamento ou precipitação de crises de gota; Alterações do olfacto ou do gosto; Escurecimento da saliva, urina e secreções vaginais; Priapismo (erecção forte, persistente, anormal do pénis, muitas vezes dolorosa, por motivo patológico); Elevação da ureia, transaminases, fosfatase alcalina e bilirrubina plasmática (moderadas e transientes); • Para atenuar as reacções adversas neurológicas, comportamentais e efeitos on-off, poderia ser ponderado a aplicação de férias farmacológicas (3 a 21 dias). No entanto, estas encontram-se actualmente desaconselhadas. Isto porque perigo grave de ocorrer pneumonia por aspiração, trombose venosa, embolismo pulmonar e depressão; • Sinemet 25/100 (25mg Carbidopa + 100 mg L-DOPA); • Sinemet 50/200 (50mg Carbidopa + 200 mg L-DOPA); • Madopar 25/100 (25mg Benserazide + 100 mg L-DOPA); • Madopar 50/200 (50mg Benserazide + 200 mg L-DOPA). FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 127 APONTAMENTOS 8.4.2.2. Agonistas dos receptores dopaminérgicos • Actuam nos receptores dopaminérgicos centrais; • Possuem afinidades diferentes para os cinco receptores dopaminérgicos actualmente descritos: D1, D2, D3, D4 e D5. Contudo, parece que todos eles actuam sobre o receptor D2; • Esta variabilidade na afinidade poderá contribuir para a existência de diferentes perfis de acção clínica; • Apresentam um efeito terapêutico mais prolongado e uniforme que o observado para a L-Dopa; • Em fases precoces da doença são bem tolerados; • O risco de desenvolver complicações tardias, relacionadas com o tratamento prolongado com L-Dopa, é praticamente nulo. Como tal, equaciona-se que estes possam constituir os fármacos de primeira linha no tratamento dos sintomas parkinsonianos nos doentes com Parkinson; • São fármacos mais caros que a L-Dopa; • As doses usadas em monoterapia são maiores que as usadas em associação, devendo ser tituladas lentamente (dose inicial baixa); • No entanto, regista-se que num período de 1 a 3 anos, a maioria dos doentes necessita de associar L-Dopa ou outro fármaco à terapêutica iniciada; • Quando utilizados como agentes adjuvantes em associação à L-Dopa, podem agravar as discinésias caso a dose destes não seja ajustada; • Demonstraram maior incidência de efeitos secundários não-motores e incapacidade motora; • Estudos indicam que estes fármacos provocam uma dessensibilização dos receptores dopaminérgicos, aumentando eventualmente os sintomas; • Podem ser combinados com anticolinérgicos ou Amantadina; • São fármacos pouco eficazes no tratamento do tremor, mas particularmente eficazes na bradicinésia e perturbações da marcha; • 128 Como reacções adversas estão descritas: FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS o Dor abdominal; o Náuseas e vómitos. Os casos severos requerem a administração de antagonistas da dopamina periférica, como a Domperidona 3 (antiemético); o Cefaleias; o Astenia (fraqueza); o Dor torácica; o Síndrome gripal; o Anorexia; o Obstipação; o Diarreia; o Xerostomia; o Alucinações; o Confusão; o Ataques de sono e sonolência diurna, mais frequentes com a Pergolida e administração de Ropinirol e Pramipexol; o Dispneia; o Rash; o Doença vascular cardíaca, mais frequente com a Pergolida; o Fibrose pulmonar, associada à administração de Bromocriptina (ergolínicos); • o Alterações da visão; o Edema periférico; Os agonistas da dopamina interagem com os antagonistas da dopamina como a Metoclopramida; • O Pramipexol apresenta metabolismo renal, ao passo que o Ropinirol sofre metabolismo hepático; • A Bromocriptina deve ser administrada 2 a 3 vezes por dia; 3 A Domperidona é um fármaco com indicações semelhantes às da Metoclopramida. Não é capaz de passar a barreira hematoencefálica e, como tal, não provoca efeitos extrapiramidais. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 129 APONTAMENTOS • Os restantes agonistas dopaminérgicos devem ser administrados 3 vezes por dia. Bromocriptina (Parlodel®), Pergolide (Permax®), Pramipexole (Mirapex®), Ropinirole (Requip®), Cabergolina, Apomorfina e Lisuride 8.4.2.3. Inibidores da COMT • Estes fármacos inibem a catecol-O-metiltransferase (COMT), prolongando o tempo de permanência da dopamina na fenda sináptica; • Não são eficazes quando aplicados em monoterapia; • Requerem a administração de L-Dopa; • Provaram aliviar a deterioração de fim de dose e aumentar o tempo em «on» 1 a 2 horas; • Está por isso indicada como adjuvante da terapêutica com L-Dopa e inibidores da descarboxilase periférica, em doentes com doença de Parkinson e flutuações motoras «wearing off»; • Devido à hepatotoxicidade grave, a Tolcapona encontra-se actualmente suspensa na Europa; • Quando administrados, podem agravar as discinésias, obrigando ao ajuste da dose de L-Dopa (redução de 20 a 30%); • Apresenta possiveis interacções adversas com antidepressores tricíclicos, maprotilina, iMAO e venlafaxina; • O ferro reduz a absorção da entacapona; • Está contra-indicada: o Gravidez; o Aleitamento; o Disfunção hepática; o Feocromocitoma; o História de síndroma maligno dos neurolépticos; o Rabdomiólise não traumática; Entacapona (COMTAN®) e Tolcapona 130 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 8.4.2.4. Inibidores selectivos da MAOB • Constituem fármacos inibidores selectivos e irreversíveis do enzima monoaminoxidase B; • Ao inibir a metabolização da dopamina, permitem prolongar o período durante o qual a dopamina permanece na fenda sináptica, aumentando a probabilidade de esta interagir com os receptores dopaminérgicos; • Apresentam efeitos terapêuticos caracterizados por alívio sintomático fraco, quer em monoterapia, quer como adjuvante; • São normalmente utilizados no início da terapêutica ou para no alívio dos seguintes sintomas: o Tremor; o Deterioração de fim de dose; o Efeitos on-off ligeiros; • Estes fármacos permitem reduzir a dose de L-Dopa administrada em 50%; • Podem provocar insónia. Como tal devem ser administrados ao pequeno-almoço e ao almoço; • Podem exacerbar as discinésias ou os sintomas psicóticos pré-existentes resultantes da administração de L-Dopa. Como tal, pode ser necessário reduzir a dose de L-Dopa em determinados casos; • São os primeiros fármacos a ser retirados da estratégia terapêutica, quando surgem complicações motoras; • Apresentam risco de desenvolver síndroma da serotonina quando co-administrados com antidepressores tricíclicos ou SSRIs. • Estão contra-indicados em indivíduos com: o Úlcera duodenal e gástrica; o Hipertensão descontrolada; o Angina do peito; o Psicose; o Gravidez; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 131 APONTAMENTOS o Aleitamento. Selegilina (Eldepryl®) e Rasagilina (Azilect® - para mais informações consultar o seguinte endereço: http://www.emea.eu.int/humandocs/PDFs/EPAR/Azilect/5289705pt1.pdf) 8.4.2.5. Antagonistas muscarínicos • Foram os primeiros fármacos a demonstrar utilidade na terapêutica sintomática da doença de Parkinson; • Devido ao seu perfil de segurança, estes fármacos não são muito utilizados. Interferem nos processos mnésicos, podendo induzir quadros confusionais; • São fármacos particularmente importantes no controlo do tremor e das distonias; • Como reacções adversas estão descritos: • o Confusão mental; o Xerostomia; o Desorientação; o Halucinações; o Alterações da memória; o Taquicardia, palpitações e hipotensão; o Obstipação; o Vómitos e náuseas; o Fraqueza muscular e cãibras; o Diminuição da sudação; o Pode surgir efeito inibitório da lactação. Estão contra-indicados: o Indivíduos com mais de 60 anos de idade; o Hipertrofia prostática ou outra situação que provoquem retenção urinária. • Interage com: o Amantadina que potencia os efeitos anticolinérgicos; o Levodopa, Fenotiazinas e Haloperidol, que reduzem os efeitos terapêuticos anticolinérgicos; 132 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS o Digoxina. Tri-hexifenidilo (Artane®), Benzatropina (Cogentin®) e Biperideno (Akineton®) 8.4.2.6. Amantadina (Parkadina®) • Agente antivirico, utilizado na profilaxia e tratamento do vírus influenza A; • Em 1969, podia ter descobriu-se efeitos acidentalmente benéficos no que tratamento sintomatológico da doença de Parkinson; • O mecanismo de acção não está completamente elucidado; o Acção anticolinérgica (?); o Acção dopaminomimética (?); o Livedo reticularis Acção antiglutamatérgica (?); • Consegue aliviar os sintomas da doença ligeira, incluindo o tremor; • Quando administrada em doses elevadas, consegue reduzir as discinésias em 70%; • É utilizada na terapêutica inicial da doença de Parkinson moderada; • O efeito terapêutico desaparece ao fim de 6 a 8 meses; • Sofre metabolização renal; • Potencia os efeitos dos fármacos anticolinérgicos; • Como efeitos adversos, estão descritas: o Náuseas; o Letargia; o Perturbações do sono; o Enjoos e vómitos; o Edema; o Eritema; o Livedo reticularis (descoloração benigna da pele), reacção frequente mas reversível; o Agravamento dos estados confusionais e psicóticos no idoso. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 133 APONTAMENTOS 8.4.2.7. Instituição das opções terapêuticas Sintomas motores - Anticolinérgicos (úteis no tratamento do tremor); - Dopaminomiméticos: Precursores da dopamina; Agonistas da dopamina; iMAOB; iCOMT; Amantadina. - Acinésia ou tremores nocturnos; Administração de L-Dopa mais carbidopa à noite. - “Restless leg symptom” e noctúria; Administração de agonistas dopaminérgicos à noite. Sintomas não motores - Depressão; Administração de antidepressivos tricíclicos, SSRIs; Ponderar o recurso à electroconvulsoterapia. - Sintomas psicóticos ou confusão – Quando isto ocorre deve simplificar-se a terapêutica o máximo possível. Para tal, existem normas que estabelecem qual a ordem pelo qual os fármacos devem ser removidos: 1º - Remoção dos fármacos anticolinérgicos e Amantadina; 2º - Diminuição ou remoção dos agentes Dopaminomiméticos; 3º - Diminuição da dose administrada de Selegilina; 4º - Diminuição da dose de agonistas da dopamina administrados à noite; 5º - Diminuição da dose de L-Dopa nas formulações de libertação controlada; 6º - Diminuição da dose de agonistas da dopamina administrados de dia; 7º - Diminuição da dose de L-Dopa administrados à noite; 8º - Administração de antipsicóticos atípicos ao deitar. Neuroprotecção No futuro, existiram fármacos que conferirão neuroprotecção. Esta poderá reverter ou diminuir a evolução da doença de Parkinson. No entanto, actualmente é muito difícil provar estes efeitos no Homem. Existem estudos que apontam para a possível reversão da doença, através da: - Administração crónica de AINEs; - Implementação de terapêuticas hormonais de substituição; - Administração de Selegilina e desmetilselegilina; - Administração de coenzima Q (antioxidante), Acetil-levo-carnitina, Creatina monohidrato, Agonistas dopaminérgicos, iNOS, Agentes antiapoptóticos e factores neurotróficos. 8.4.3. Terapêuticas não farmacológicas 8.4.3.1. Terapias cirúrgicas Esta opção requer a abordagem da patologia por uma equipa multidisciplinar experiente nas seguintes áreas: Neurologia (distúrbios de movimento), Neurocirúrgia (funcional), Psiquiatria e Neuropsicologia. A terapêutica cirúrgica constitui uma opção terapêutica utilizada quando os indivíduos apresentam o seguinte perfil: 134 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Doença de Parkinson idiopática; • Boa resposta à L-Dopa; • Sintomas não controláveis consideráveis; • Discinésias e flutuações motoras; Por outro lado, indivíduos que possuam as seguintes caracteristicas, são à partida excluidos da terapeutica cirurgica: • Doença de Parkinson atípica; • Apresentam compromisso cognitivo; • Doença psiquiátrica major; • Apresentam concomitantemente outras patologias; • No passado, Idade avançada; a cirurgia era um procedimento relativamente comum em doentes com Parkinson. No DBS - Deep Brain Stimulation entanto, as terapêuticas sintomáticas farmacológicas descobertas, deixaram para segundo plano esta opção terapêutica. Actualmente, a área da cirurgia na doença de Parkinson regista uma grande evolução, desenvolvendo-se novas técnicas e procedimentos, mais precisos e seguros. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 135 APONTAMENTOS Existem duas técnicas cirúrgicas comuns: ablação de determinadas áreas cerebrais envolvidas na patologia e estimulação profunda cerebral (DBS – Deep brain stimulation). A DBS é uma técnica menos invasiva, reversível e ajustável, que tem revolucionado os procedimentos e resultados cirúrgicos obtidos para esta patologia. Consequentemente, o recurso à ablação tem diminuído, sendo aplicada a indivíduos que não possam ser sujeitos ao DBS. Curiosamente, ambos os procedimentos cirúrgicos demonstram efeitos semelhantes. Isto poderá dever-se ao bloqueio funcional, à reposição da actividade neuronal anormal ou a uma compensação mais efectiva realizada pelos restantes sistemas motores. Em ambas as técnicas, o paciente encontra-se acordado. Sistema estereotatico de Leksell É realizada a localização do núcleo alvo e, recorrendo a aparelhos de posicionamento (sistema estereotatico de Leksell), é introduzido o eléctrodo. É necessário realizar um acompanhamento permanente dos sintomas e efeitos secundários. Consoante a opção cirúrgica escolhida, é realizada a destruição do núcleo alvo ou implante de um eléctrodo permanente acoplado a um dispositivo médico implantável activo. 8.4.3.2. Neurotransplante e outras abordagens cirúrgicas Actualmente, equaciona-se a possibilidade de utilizar outros métodos no tratamento da doença de Parkinson: • Transplante de células fetais; • Infusão directa de factor neurotrófico glial; • Terapêutica génica através da introdução de genes; • Transferência de factores tróficos; 136 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 137 APONTAMENTOS 9 – DEMÊNCIA TIPO ALZHEIMER A demência é um estado caracterizado DEMÊNCIAS: • Demência Tipo Alzheimer por uma deterioração adquirida das • Demência Vascular • Demência Devido à Doença do HIV • Demência Devido a Traumatismo Craniano • Demência Devido à Doença de Parkinson • Demência Devido à Doença de Huntington • Demência Devido à Doença de Pick • Demência Devido à Doença de Creutzfeldt-Jakob • Demência Devido a Outras Condições Médicas Gerais • Demência Devido a Múltiplas Etiologias • Demência Persistente Induzida por Substâncias capacidades cognitivas, com desenvolvimento de múltiplos défices cognitivos (incluindo comprometimento da memória) que dificultam a execução de actividades diárias simples. Pode surgir devido aos efeitos fisiológicos directos de uma condição patológica (ex.: AVC isquémico, meningite, entre outras), aos efeitos da administração persistente de uma substância ou a múltiplas etiologias. A doença de Alzheimer é a forma de demência mais comum encontrada nos países ocidentais. 9.1. Diagnóstico O diagnóstico da demência tipo Alzheimer é difícil de realizar, uma vez que existem poucas evidências patológicas directas da sua presença. Normalmente, ao descartar as restantes possibilidades de demência, é realizado o diagnóstico de doença de Alzheimer. Torna-se assim necessário verificar que o sintoma de défice cognitivo não se deve a outros estados patológicos como doenças cerebrovasculares, doença de Hungtington, doença de Parkinson, entre outras. Por outro lado, deve-se ponderar a existência de condições sistémicas que provoquem sintomas de demência como o hipotiroidismo, deficiência em vitamina B12 (cianocobalamina) e infecção por HIV. O abuso de determinadas substância, como o álcool, pode também induzir sintomas característicos desta patologia. Estudos apontam para uma prevalência populacional de 2-4% em indivíduos com mais de 65 anos. Este valor parece aumentar com a idade, especialmente após os 75 anos. A doença de Alzheimer é caracterizada por perda gradual da memória seguida de demência com instalação gradual e não abrupta. Patologicamente ocorre atrofia do córtex cerebral com hipertrofia secundária do sistema ventricular. Em termos clínicos são extremamente 138 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS importantes as alterações cognitivas, défices de memória e de organização tempo-espacial, o esquecimento sistemático das coisas simples e incapacidade para reter a informação. A duração típica da doença de Parkinson é de 8 a 10 anos, mas o curso pode variar de 1 a 25 anos. 9.1.1. Diagnóstico diferencial da demência: 9.1.1.1. Causas mais comuns de demência: • Doença de Alzheimer; • Demência Vascular; o Consequência da hipertensão e hipercolesterolémia. Estes pacientes, podem sofrer mini-enfartes no SNC, acumulando lesões que podem culminar em demência; • Doença difusa da matéria branca (Binswanger); • Alcoolismo; • Doença de Parkinson; • Intoxicação por medicamentos ou outros compostos. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 139 APONTAMENTOS 9.1.1.2. Causas menos comuns de demência: • Deficiência em vitaminas: o Tiamina (vitamina B1); Pode provocar encefalopatia de Wernicke (beriberi cerebral). Esta patologia provoca muitas alterações motoras. o Cianocobalamina (vitamina B12); Pode provocar anemia perniciosa. Isto pode ocorrer em indivíduos sujeitos a gastrectomia que não repõem os níveis de vitamina B12. o Nicotinamida (vitamina PP); Pode provocar pelagra. Esta é caracterizada por um eritema generalizado, perturbações de sensibilidade e da motricidade, e nos casos graves, por perturbações mentais (estado de depressão, alucinações). • • Falência endócrina ou dos órgãos: o Hipotiroidismo; o Insuficiência adrenal e sindroma de Cushing; o Hipo e Hiperparatiroidismo; o Falência renal; o Falência hepática; o Falência pulmonar. Infecções crónicas: o HIV; o Neurosífilis; Patologia causada pela infecção no SNC por Treponema pallidum. Infelizmente esta infecção ainda é bastante frequente no nosso país. 140 o Papovavírus (leucoencefalopatia multifocal progressiva); o Priões (doenças de Gerstmann-Sträussler-Scheinker e Creutzfeldt-Jacob); o Tuberculose; o Sarcoidose; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Doença crónica, de causa desconhecida, que provoca lesões especiais na pele e em vários outros órgãos. o • • • Doença de Whipple. Desordens tóxicas: o Envenenamento por fármacos, narcóticos ou outros compostos; o Intoxicação por metais pesados; o Demência na diálise por acumulação de alumínio no SNC; o Toxinas orgânicas. Psiquiatria: o Depressão; o Esquizofrenia; o Reacção de conversão. Patologias neurodegenerativas: o Doença de Huntington; o Doença de Pick; o Demência com corpos de Lewis; o Sindroma de Steel-Richardson (paralisia supra-núclear progressiva); o Degeneração multisistémica (sindroma Shy-Drager); o Algumas formas de ataxia hereditária; o Algumas formas de esclerose amiotrofica lateral; o Demência fronto-temporal; o Degeneração cortico-basal; o Esclerose múltipla; o Sindrome de Down em adultos com Alzheimer; o • Esta condição apresenta uma incidência elevada de demência. Complexo de Gusan (esclerose amiotrofica lateral + Parkinson + Demência). Traumatismo craniano e dano cerebral difuso: o Demência pugilística; o Hematoma subdural crónico; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 141 APONTAMENTOS • • o Pós-anóxia; o Pós-encefalite; o Hidrocefalia com pressão normal. Neoplásica: o Tumor cerebral primário; o Tumor cerebral metastático; o Encefalite límbica paraneoplastica. Outras: o Vasculite; o CADASIL (Arteriopatia Cerebral Autossómica Dominante com enfartes Subcorticais e Leucoencefalopatia); o Porfiria intermitente aguda; A porfiria aguda intermitente é uma doença autossômica dominante, decorrente de um distúrbio na via biossintética do heme, causado pela redução dos níveis da enzima uroporfirinogênio-I-sintetase. o • Ataques epilépticos recorrentes sem convulsões. Condições adicionais nas crianças e adolescentes: o Panencefalite esclerosante subaguda; Infecção vírica oportunista do SNC, associada a condições que conduzem a um prejuízo da imunidade mediada por células. O agente responsável é o JC Polyomavirus (Polyomavirus hominis 2) que afecta primariamente oligodendrócitos, resultando em múltiplas áreas de desmielinização. o 142 Desordens metabólicas: Doença de Wilson e Leigh; Leucodistrofias; Doença de armazenamento de lípidos; Mutações mitocondriais. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Avaliação dos pacientes com demência Avaliação de rotina Testes opcionais focados Testes auxiliares História Examinação física Testes laboratoriais Função adrenal Punção lombar Vitamina B12 Velocidade de sedimentação dos eritrócitos Função renal Electrólitos VDRL - Venereal Diseases Research Laboratory Computerized Metais pesados na urina Função hepática Contagem sanguínea completa - Função da paratiróide Raio X ao toráx Função da tiróide (TSH) CT/MRI EEG HIV Axial Angiograma Detecção de toxinas na urina Biopsia cerebral Teste psicométrico SPECT - Single photon emission computed Apolipoproteina E tomography Tomography / Magnetic Resonance Imaging Categorias do diagnóstico Causas reversíveis Demências irreversíveis/degenerativas Desordens psiquiátricas Exemplos: Exemplos: Alzheimer Hipotiroidismo Demência fronto-temporal Deficiência em tiamina Deficiência em vitamina B12 Hidrocefalia com pressão normal Tumor cerebral Intoxicação por substâncias Depressão Huntington Esquizofrenia Demência com corpos de Lewis Reacção de Conversão Múltiplos enfartes Leucoencefalopatias Parkinson Condições associadas tratáveis Depressão Agitação Ataques epilépticos Efeitos adversos de fármacos Insónia Síndroma do «trabalhador queimado» A doença de Alzheimer apresenta perda episódica da memória como sintoma inicial. A avaliação psiquiátrica e neurológica é inicialmente normal. Regista-se uma atrofia do córtex entorrinal e hipocampo. Na doença Vascular a rapidez de instalação da demência é mais rápida. Ao contrário do registado na doença de Alzheimer, nesta patologia podem já existir alterações psiquiátricas (apatia, ilusões, anxiedade) e neurológicas (diminuição das capacidades motoras). 9.1.1.3. Avaliação da memória Mini-exame ao estado mental Orientação Nome: estação/data/dia/mês/ano 5 pontos (1 por cada nome) Nome: hospital/chão/cidade/estado/país 5 pontos (1 por cada nome) Registo Identificar três objectos pelo nome e perguntar ao paciente para 3 pontos (1 por cada objecto) repetir Calculo e atenção FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 143 APONTAMENTOS Série de 7; subtrair de 100 (ex.: 93-86-79-72-65) 5 pontos (1 por cada subtracção) Relembrar Relembrar os três objectos anteriormente apresentados 3 pontos (1 por cada objecto) Linguagem Dar nome ao lápis e relógio 2 pontos (1 por cada objecto) Repetir “Sem se, e ou mas” 1 ponto Seguir uma ordem de comando em 3 passos (ex.:“Segure este 3 pontos (1 por cada comando) papel, dobre-o ao meio e coloque-o na mesa”) Escreva “feche os olhos” e diga ao paciente para obedecer ao 1 ponto comando escrito Peça ao paciente para escrever uma frase 1 ponto Peça ao paciente para copiar um desenho (ex.: pentágonos que se 1 ponto intersectam) Total 30 Adaptado de Wilson, J. et al - Harrison’s Principles of Internal Medicine – McGraw-Hill, International edition, 16th edition, (2004); 9.2. Sintomatologia (ver pág.155) As principais faculdades mentais alteradas são: • Memória recente (a primeira a ser detectada); • Linguagem; • Capacidade de visão espacial (incapacidade de enfiar uma agulha, entre outras actividades que requerem precisão); • Cálculo; • Realização de juízos; • Resolução de problemas diários. Estes défices conduzem ao desenvolvimento de patologias do foro psiquiátrico como: • Depressão; • Isolamento; • Alucinações; • Apresentação de quadros psicóticos; • Quadros de agitação; • Desinibição; • Alteração do sono. Estes doentes não reconhecem a sua patologia, sendo este aspecto designado por anognosia. 144 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Consequência do quadro apresentado, os doentes de Alzheimer apresentam afasia (alteração do discurso), apraxia (disfunção motora na realização de certas tarefas como comer utilizando talheres, por exemplo), apatia, delírios comuns (10% são sindromas de Copgras, isto é, o doente acredita que os seus familiares, profissionais de saúde, amigos, entre outros, lhes querem fazer mal, tornando o tratamento destes doentes muito difícil), perda da inibição e agressão alternada com insónia, passividade e vagueação nocturna. A fase terminal desta patologia caracteriza-se pela rigidez, incontinência, mudez, perda do discernimento e da razão. A morte é frequente por mal-nutrição, infecções secundárias, embolismo pulmonar e doença cardíaca. 9.3. Anatomia funcional das demências As áreas mais afectadas do SNC são as implicadas no armazenamento da memória. A memória episódica requer o bom funcionamento do núcleo dorso-medial do tálamo e do lóbulo temporal médio. As lesões unilaterais do lóbulo temporal são responsáveis pela instalação de amnésia moderada no que diz respeito aos aspectos verbais e não verbais, ao passo que as lesões bilaterais produzem uma desordem severa na aprendizagem e capacidade para armazenar memórias de acontecimentos recentes. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 145 APONTAMENTOS Os componentes do sistema de memória do lóbulo temporal médio envolvem o hipocampo e córtex adjacente, incluindo as regiões perirrinal, entorrinal e parahipocampo. Isto inclui uma via circular de neurónios existentes desde o córtex entorrinal até ao giro dentado, neurónios CA3 e CA1 do hipocampo até ao subículo, retornando ao córtex entorrinal. Esta via encontra-se extremamente danificada na doença de Alzheimer. Este sistema é rápido, possui capacidades limitadas e realiza uma função crucial na aprendizagem e estabelecimento da memória declarativa e na compreensão do significado das palavras. Posteriormente, a memória presente no SNC é reorganizada e consolidada, sendo armazenada no neocórtex. Esta vai ficando independente do sistema de memória do lóbulo temporal médio, transformando-se em memória a longo prazo. Desta forma, o lóbulo temporal médio fica disponível para a aquisição de nova informação. Existem regiões corticais no lóbulo temporal anterior, nas quais o conhecimento dos objectos encontrasse devidamente organizado (associação das palavras com as cores, acções, ferramentas, entre outros). Os atributos dos objectos são armazenados junto de regiões do córtex que medeiam a sua percepção. A memória implícita parece envolver zonas fora do hipocampo como a amígdala, gânglios da base, córtex sensorial e cerebelo. Diferentes regiões frontais são estimuladas para diferentes formas de armazenamento de memória. As lesões na via especifica cortical-subcortical implicam alterações importantes no comportamento. O córtex pré-frontal dorsolateral estabelece ligação com o tálamo, glóbulo pálido e caudado dorsolateral. Lesões nesta via resultam em má organização e planeamento, diminuição da capacidade cognitiva e fraco discernimento. O córtex frontal orbital lateral estabelece ligação com o caudado ventromedial, glóbulo pálido e tálamo. As lesões nestas ligações implicam irritabilidade, distracção e impulsividade. O córtex circundado anterior estabelece ligação com o núcleo accumbens, glóbulo pálido e tálamo. As lesões nestas ligações implicam apatia, empobrecimento do discurso e mutismo. 146 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Na doença de Alzheimer, as áreas do SNC mais afectadas são o hipocampo, o córtex temporal e o septo lateral do núcleo basal de Meynert (zona com maior número de neurónios produtores de acetilcolina). B A D C A e B - Imagens de RM de um indivíduo normal e de um indivíduo com doença de Alzheimer, respectivamente. Ambos apresentam dilatação dos ventrículos laterais. No entanto, o individuo com Alzheimer (B) apresenta uma redução do volume do hipocampo (setas). C e D – Imagem de PET de um indivíduo normal e de um indivíduo com doença de Alzheimer, respectivamente. O doente com Alzheimer (D) apresenta redução da actividade do lóbulo bilateral parietal (setas), uma característica bastante comum nesta patologia. Adaptado de Wilson, J. et al - Harrison’s Principles of Internal Medicine – McGraw-Hill, International edition, 16th edition, (2004); 9.4. Epidemiologia Os factores de risco identificados para o desenvolvimento de doença de Alzheimer são: • Idade avançada (20 a 40% dos idosos com mais de 85 anos, sofrem desta patologia); • História familiar; • O sexo feminino parece ser mais afectado. 9.5 Características microscópicas Microscopicamente estão presentes placas neuríticas constituídas pela proteína β-amilóide (Aβ), que se vão acumulando nas paredes dos vasos cerebrais. Encontram-se ainda presentes, no citoplasma das células neuronais, enredos neurofibrilhares corados pela prata (NFT - silver-staining neurofibrillary tangles). FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 147 APONTAMENTOS 9.5.1. Placas senis neuríticas São constituídas por um núcleo central constituído por β-amilóide, proteoglicanos, Apoε4, α1-antiquimotripsina e outras proteínas. Os núcleos das placas são rodeados por restos de neurónios que degeneraram, microglia e macrófagos. 9.5.2. Neurofilamentos (NFT) Neurofilamentos em espiral, corados pela prata, presentes no citoplasma neuronal. São o resultado da fosforilação anormal da proteína tau (proteína associada a microtúbulos), caracterizando-se a sua estrutura pela presença de dois filamentos dispostos em hélice, observáveis ao microscópio electrónico. 9.5.3. Outras características Os níveis de acetilcolina encontram-se diminuídos nos indivíduos com doença de Alzheimer. Para além disso, a concentração de serotonina, noradrenalina e somatostatina estão também reduzidas. Por outro lado, os níveis de glutamato estão, normalmente, mais elevados. 9.6. Factores genéticos na doença de Alzheimer Estão descritos pelo menos 4 genes com função importante na patogénese de alguns casos de doença de Alzheimer: • Gene APP no cromossoma 21 (indivíduos com desenvolvimento rápido de Alzheimer, doença de Alzheimer autossómica dominante); • Presenilina-1 no cromossoma 14 (proteína S182) (indivíduos com desenvolvimento e progressão muito rápidos de Alzheimer, doença de Alzheimer autossómica dominante); • Presenilina-2 no cromossoma 1 (proteína STM2) (indivíduos com desenvolvimento rápido de Alzheimer, doença de Alzheimer autossómica dominante); • Gene Apoε no cromossoma 19 (Apoε alelo 9 e 8) (indivíduos com desenvolvimento lento de formas familiares e esporádicas de doença de Alzheimer) – forma mais frequente. 148 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 9.7. Teorias que explicam o mecanismo fisiopatológico da doença de Alzheimer Existem actualmente 3 hipóteses que tentam explicar o mecanismo fisiopatológico inerente à doença de Alzheimer. 9.7.1. Hipótese colinérgica A hipótese colinérgica foi a primeira hipótese a ser formulada na descrição dos mecanismos fisiopatológicos do Alzheimer. Esta sugere que a doença de Alzheimer se desenvolve como consequência da deficiente produção de acetilcolina no organismo. A maioria das terapêuticas farmacológicas actualmente existentes baseia-se neste pressuposto. No entanto, estas terapêuticas apenas melhoram os sintomas, não revertendo o estado patológico. Em virtude destes resultados, esta hipótese foi considerada incompleta. 9.7.2. Hipótese amilóide Esta hipótese foi formulada em virtude de estudos publicados referirem Passo 1: Clivagem pela α- ou β-secretase que o gene do proteína percursora da α β APP Membrana celular γ proteína β-amilóide, APP (associada ao crescimento e neuronal), está cromossoma 21. trissomia 21 desenvolvimento localizado Os pacientes (síndrome de normalmente uma Produto da α-secretase Passo 2: Clivagem pela γ-secretase no com Down) possuem uma cópia extra deste gene, exibindo Produto da β-secretase desordem Aβ42 Tóxico Aβ40 Não tóxico P3 Não tóxico Numa primeira etapa, a proteína amilóide é clivada em duas proteínas pelas secretases. Uma destas secretases, a γ-secretase, pode clivar a proteína em 3 lugares opcionais. A taxa de clivagem em cada local varia de acordo com a idade e, consequentemente, mais Aβ42 é produzido no cérebro dos idosos. Quando existe excesso de produção de β A 42, ocorre agregação, formando placas senis. semelhante à doença de Alzheimer por volta dos 40 anos de idade. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 149 APONTAMENTOS Esta hipótese defende que os efeitos citotóxicos inerentes da agregação das fibrilhas amilóides, tem como consequência a criação de instabilidade na homeostase do cálcio celular, induzindo apoptose das células neuronais, criando as condições necessárias para o desenvolvimento da doença de Alzheimer. Por outro lado, existem evidências que as formas oligoméricas da proteína β-amilóide, terão também um importante papel, senão o mais importante, neste mecanismo de toxicidade. Desta forma, a inibição da formação destes agregados proteicos assim como a inibição da formação de proteína β-amilóide a partir de APP, constituem esperanças para o desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas. Existem várias evidências que suportam esta hipótese. Como exemplo cita-se: • O Apoε4, o maior risco genético inerente à doença de Alzheimer, leva à acumulação excessiva da proteína amilóide no cérebro, antes dos sintomas da patologia se manifestarem. Desta forma, pode-se pressupor que a formação de placas senis precede a patologia. 150 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Nas doenças amilóides em humanos, designadas genericamente por Amilóidoses, a inibição da produção da proteína amilóide responsável pela patologia, constitui um tratamento de sucesso. 9.7.3. Hipótese da proteína tau Esta hipótese defende que as alterações registadas nesta proteína, e consequente formação de neurofilamentos (NFT), são responsáveis pela indução do mecanismo da doença de Alzheimer. Esta teoria é suportada por determinados estudos, os quais concluíram que as placas amilóides não estão directamente implicadas com a perda neuronal. No entanto, a maioria dos investigadores apoia a hipótese amilóide como sendo a principal causa da patologia. 9.8. Terapêuticas farmacológicas Há luz dos conhecimentos actuais, não existe cura para a doença de Alzheimer. As terapêuticas disponíveis oferecem apenas poucos benefícios sintomáticos para alguns pacientes, não diminuindo a progressão da patologia. Para além da terapêutica farmacológica, é fundamental e imperativo existir apoio social a estes doentes. • Fármacos inibidores da colinesterase; o Tacrina (hepatotóxica, tendo sido retirada da terapêutica), Donepezil, Rivastigmina e Galantamina (agonista M1, nicotínico). • Fármacos antagonistas dos receptores NMDA; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 151 APONTAMENTOS o • Memantina. Imunoterapia. o Encontra-se em desenvolvimento uma vacina contra a proteína Aβ. Esta vacina seria utilizada preferencialmente em indivíduos já diagnosticados com a patologia, estimulando a resposta imunológica para o desenvolvimento de mecanismos que removam os agregados proteicos de amilóide β. Os ensaios clínicos do fármaco NA1792 demonstraram resultados positivos em 20% dos indivíduos. No entanto, num estudo envolvendo 300 participantes, 6% desenvolveram encefalite. Actualmente, estudos estão a ser desenvolvidos no sentido de diminuir a toxicidade desta vacina. Para além disso, as terapias baseadas no DNA demonstraram ser promissoras no desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas para a doença de Alzheimer. 152 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 153 APONTAMENTOS ANEXOS Critérios de diagnóstico de episódios de depressão major A. Os sintomas seguintes devem estar presentes pelo menos durante 2 semanas, representando uma mudança no comportamento anterior; pelo menos um dos sintomas é humor deprimido (1) ou perda de interesse ou prazer (2). (Não inclui sintomas consequentes de condições físicas, alucinações ou ilusões incongruentes com o humor, incoerência ou marcada perda de associação). 1. Humor deprimido (ou humor irritável na criança e adolescente) durante a maior parte do dia, quase todos os dias, indicado pelo próprio ou através de indicação de outros. 2. Marcada diminuição do interesse ou prazer em todas, ou quase todas, actividades do dia, quase todos os dias (indicado pelo próprio ou através da observação de outros da constante apatia). 3. Perda significativa de peso ou aumento de peso, sem que exista dieta (ex.: mais de 5% de peso corporal num mês) ou diminuição ou aumento do apetite quase todos os dias (nas crianças, não se deve considerar o aumento do peso uma vez que isso é característico da sua idade). 4. Insónia ou hipersónia quase todos os dias. 5. Agitação psicomotora ou atraso quase todos os dias (observado por outros indivíduos e não apenas por sentimento do sujeito de desassossego e enfadonho). 6. Fadiga ou perda de energia quase todos os dias. 7. Sentimentos de indignidade, falta de valor ou culpa excessiva e inapropriada (não apenas o facto do sujeito estar constantemente a autocriticar sobre a sua culpa e doença). 8. Capacidade diminuída de pensar e concentração ou hesitação presentes quase todos os 9. Pensamentos recorrentes de morte (não apenas medo de morrer), ideação suicida dias (indicado pelo próprio ou através de indicação de outros). recorrente sem plano específico, tentativa de suicídio ou existência de um plano específico para cometer suicídio. B. 1 Não pode ser estabelecido que um factor orgânico iniciou ou manteve a perturbação. C. Em nenhum momento durante a perturbação existiram ilusões ou alucinações por mais de 2 2 A perturbação não é uma reacção normal à morte de alguém querido. semanas na falta de sintomas proeminentes de humor (ex.: antes do desenvolvimento dos sintomas de humor ou depois de ocorrer remissão). D. Sem sobreposição na esquizofrenia ou esquizofreniforma, ilusão ou desordens psicóticas. Adaptado de Wilson, J. et al - Harrison’s Principles of Internal Medicine – McGraw-Hill, International edition, 12th edition, (1991), vol.2, pp.2124 154 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Critérios de diagnóstico de episódios maníacos A. Período distinto de elevação persistente, anormal, irritável, expandido do humor. B. Durante o período da perturbação de humor, pelo menos 3 dos seguintes sintomas persistiram (4 se o humor for apenas irritável) e estiveram presentes em grau significativo: 1. 2. Aumento da autoestima ou grandiosidade. Diminuição da necessidade de dormir (ex.: o individuo sente-se descançado após 3h de sono). 3. Mais tagarela que o usual ou com maior pressão para falar. 4. Fuga de ideias ou experiência subjectiva de que os pensamentos estão acelerados. 5. Distractibilidade. 6. Aumentado da actividade dirigida para um objectivo (social, no trabalho ou na escola, ou 7. Envolvimento excessivo em actividades que lhes dão prazer e que possuem elevada sexual) ou agitação psicomotora. probabilidade de causar consequências dolorosas (ex.: os indivíduos começam a comprar sem limites coisas para se divertir, indiscrição sexual ou investimentos financeiros disparatados). C. Perturbações do humor suficientemente severas para causar: enfraquecimento marcado no trabalho, nas actividades sociais, nas relações com outras pessoas; ou para causar hospitalização de forma a prevenir que este se magoe ou que prejudique outras pessoas. D. Em nenhum momento durante a perturbação existiram ilusões ou alucinações por mais de 2 semanas na falta de sintomas proeminentes de humor (ex.: antes do desenvolvimento dos sintomas de humor ou depois de ocorrer remissão). E. Sem sobreposição na esquizofrenia ou esquizofreniforma, ilusão ou desordens psicóticas. F. Não pode ser estabelecido que um factor orgânico iniciou ou manteve a perturbação. Adaptado de Wilson, J. et al - Harrison’s Principles of Internal Medicine – McGraw-Hill, International edition, 12th edition, (1991), vol.2, pp.2124 Critérios de diagnóstico de ataques de pânico A. Em algum momento durante a perturbação, um ou mais ataques de pânico (períodos de medo e desconforto intenso) ocorreram e foram inesperados (1) (ex.: não ocorreram imediatamente antes ou durante a exposição a uma situação que causa normalmente ansiedade) e não foram despoletadas (2) por situações nas quais a pessoa foi o foco da atenção. B. Qualquer um de 4 ataques, como definido no critério A, ocorreu dentro de um período de 4 semanas ou, 1 ou mais ataques foram seguidos de um período de pelo menos 1 mês de medo persistente de desenvolver outro ataque. C. Pelo menos 4 dos seguintes sintomas estiveram presentes, pelo menos durante 1 dos ataques: 1. Falta de ar (dispneia) ou sensação de sufocação. 2. Vertigens, tonturas, sentimentos inseguros ou mal-estar. 3. Palpitações ou ritmo cardíaco acelerado (taquicardia). 4. Tremor. 5. Sudação. 6. Sufocação. 7. Náuseas ou aflição intestinal. 8. Perda da realidade. 9. Entorpecimento e sensação de formigueiro (parestesias). 10. Arrepios ou rubor. 11. Dores no peito ou desconforto. 12. Medo de morrer. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 155 APONTAMENTOS 13. Medo de enlouquecer ou de fazer algo não controlado. D. Durante alguns dos ataques, pelo menos 4 dos sintomas apresentados em C aparecem subitamente e aumentam de intensidade durante 10 minutos desde o aparecimento do primeiro sintoma notificado no ataque. E. Não pode ser estabelecido que um factor orgânico iniciou ou manteve a perturbação (ex.: anfetaminas, intoxicação por cafeína ou hipertiroidismo) Adaptado de Wilson, J. et al - Harrison’s Principles of Internal Medicine – McGraw-Hill, International edition, 12th edition, (1991), vol.2, pp.2131 Critérios de diagnóstico da Demência tipo Alzheimer A. Desenvolvimento de múltiplos deficits cognitivos manifestados tanto por (1) quanto por (2): (1) Comprometimento da memória (capacidade prejudicada de aprender novas informações ou recordar informações anteriormente aprendidas) (2) Uma (ou mais) das seguintes perturbações cognitivas: (a) Afasia (perturbação da linguagem); (b) Apraxia (capacidade prejudicada de executar actividades motoras, apesar de um funcionamento motor intacto); (c) Agnosia (incapacidade de reconhecer ou identificar objectos, apesar de um funcionamento sensorial intacto); (d) Perturbação do funcionamento executivo (isto é, planeamento, organização, abstracção) B. O curso caracteriza-se por um início gradual e um declínio cognitivo contínuo. C. Os deficits cognitivos nos Critérios A1 e A2 não se devem a quaisquer dos seguintes factores: (1) Outras condições do sistema nervoso central que causam deficits progressivos na memória e cognição (por ex., doença cerebrovascular, doença de Parkinson, doença de Huntington, hematoma subdural, hidrocefalia de pressão normal, tumor cerebral) (2) Condições sistémicas que comprovadamente causam demência (por ex., hipotiroidismo, deficiência de vitamina B12 ou ácido fólico, deficiência de niacina, hipercalcémia, neurossífilis, infecção com HIV) (3) Condições induzidas por substâncias D. Os deficits não ocorrem exclusivamente durante o curso de um delírio. E. A perturbação não é explicada melhor por um outro transtorno do Eixo I (por ex., Transtorno Depressivo Maior, Esquizofrenia). Codificar com base no tipo de início e características predominantes: Com Início Precoce: se o início ocorre aos 65 anos ou antes. 290.11 Com Delírio: se delírio está sobreposto à demência. F00.01 - 290.12 Com Delírios: se delírios são a característica predominante. F00.03 - 290.13 Com Humor Deprimido: se humor deprimido (incluindo apresentações que satisfazem todos os critérios de sintomas para um Episódio Depressivo Maior) é uma característica predominante. Um diagnóstico separado de Transtorno do Humor Devido a Uma Condição Médica Geral não é dado. F00.00 - 290.10 Sem Complicações: se nenhuma das características acima predomina na apresentação clínica actual. Com Início Tardio: se o início ocorre após os 65 anos de idade. 290.3 Com Delírio: se delírio está sobreposto à demência. F00.11 - 290.20 Com Delírios: se delírios são a característica predominante. F00.13 - 290.21 Com Humor Deprimido: se humor deprimido (incluindo apresentações que 156 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS satisfazem todos os critérios de sintomas para um Episódio Depressivo Maior) é uma característica predominante. Um diagnóstico separado de Transtorno do Humor Devido a uma Condição Médica Geral não é dado. F00.10 - 290.0 Sem Complicações: se nenhuma das características acima predomina na apresentação clínica actual. Especificar se: Com Perturbação do Comportamento Nota para a codificação: Codificar também 331.0 doença de Alzheimer no Eixo III. Adaptado de http://www.psicologia.com.pt/instrumentos/dsm_cid/dsm.php, a 13 de Novembro de 2006 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 157 APONTAMENTOS Asma Doença pulmonar obstrutiva crónica CAPITULO III PATOLOGIAS DO SISTEMA RESPIRATÓRIO 158 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 10 – ASMA A asma é uma doença inflamatória crónica das vias aéreas, caracterizada por hiperreactividade da área traqueobrônquica a estímulos inespecíficos. Esta patologia caracteriza-se, a nível fisiológico, pela redução do calibre das vias aéreas, facilmente revertido pela instituição do tratamento adequado. Clinicamente, são registados paroxismos (maior intensidade de um acesso, de uma dor), opressão torácica, dispneia, tosse (com agravamento nocturno), pieira (ruído expiratório agudo). Trata-se de uma doença episódica, constituída por fases agudas intercaladas por períodos assintomáticos. A maior parte dos ataques são pequenos, demorando alguns minutos ou horas e os pacientes parecem recuperar inteiramente dos ataques. Raramente os ataques de asma agudos terminam com a morte do paciente. No entanto, pode registar-se em alguns indivíduos, o desenvolvimento de um quadro patológico grave, conhecido por estado asmático, caracterizado pela persistente obstrução das vias respiratórias durante dias ou semanas. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 159 APONTAMENTOS 10.1. Prevalência Estudos apontam para a existência de 4-6% de asmáticos entre a população de países desenvolvidos. Este valor está a aumentar nos meios desenvolvidos, consequência de vários factores (factores alimentares, factores ambientais, stress, entre outros). Trata-se de uma patologia identificada normalmente na infância (>50% dos casos são diagnosticas antes dos 10 anos de idade – idade escolar). Embora possa ser registado o primeiro ataque de asma após a infância (1/3 dos casos), clinicamente a asma alérgica surge na criança. Existem outros quadros de asma, asma idiopática, característicos dos adultos, cujas causas são difíceis de identificar. Verifica-se uma prevalência de 2:1 do sexo masculino em relação ao sexo feminino. Esta relação equilibra pelos 30 anos de idade. 10.2. Etiologia A asma é uma doença muito heterogénea. Existem vários factores que podem estar relacionado com a incidência. 10.2.1. Factores genéticos Os factores genéticos (atopia) parecem estar relacionados com a asma alérgica. Este é o maior factor de risco para o desenvolvimento da asma. Estudos concluíram que os descendentes de pais com doenças alérgicas (ex.: eczema, conjuntivite alérgica, rinite alérgica, urticária, asma, entre outras), parecem estar mais predispostos para desenvolver doenças alérgicas, incluindo asma. 10.2.2. Factores ambientais Como exemplo de factores ambientais citam-se os vírus (ex.: vírus da gripe e vírus respiratório sincicial), a exposição ocupacional (exposição a fibras têxteis, tintas, trabalhos que 160 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS envolvam o contacto com animais, entre outros) e os alergenos (ácaros, pó, pelos de animais, pólen, entre outros). Estes contribuem não só para o inicio, mas também para o desenvolvimento e progressão da patologia. 10.3. Asma alérgica ou atópica∗ Na asma alérgica, durante os testes térmicos, quando se injectam extractos antigénicos ambientais (ex.: ácaros, pólen, entre outros) a reacção cutânea é positiva. É registado ainda um aumento na concentração de IgE sérica e uma reacção positiva nos testes que provocam ataques de asma através da inalação de antigénios específicos. Deve-se ter especial atenção que existem Teste cutâneo aos alergenos outras condições patológicas que causam aumento da concentração sérica de IgE (ex.: infecções parasitárias). Por outro lado, como a asma é uma doença episódica, o diagnóstico pode ser realizado no período assintomático, apresentando resultados normais nos testes respiratórios, não se conseguindo estabelecer uma identificação correcta da patologia. Para realizar um diagnóstico diferencial é necessário induzir a asma através da administração de alergenos que provocam uma resposta aguda. Esta reacção típica só é registada em indivíduos asmáticos. Posteriormente, para reverter os sintomas asmáticos induzidos, administra-se um agonista β2 (efeito broncodilatador). 10.4. Asma idiossincrática ou não-atópica* A asma idiossincrática está associada às seguintes características: não existência de história familiar de alergias, valores normais de IgE sérica e testes cutâneos negativos. Como tal, este quadro patológico não pode ser explicado segundo os mecanismos imunológicos inerentes à asma alérgica. É um quadro difícil de diagnosticar que tem aumentado a sua incidência. ∗ NOTA: Nem sempre os indivíduos asmáticos recaem nestas duas categorias. Existem quadros patológicos mistos. Geralmente, a asma que surge na infância é uma asma do tipo alérgico, ao passo que a asma que surge na idade adulta é uma asma idiossincrática. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 161 APONTAMENTOS 10.5. Fisiopatologia A asma é uma patologia que pode estar assintomática durante bastante tempo. No entanto, durante este período, existem alterações na árvore traqueobrônquica características, que contribuem para a instalação, desenvolvimento e progressão de uma inflamação crónica no sistema respiratório. • Hipercelularidade; o Regista-se um recrutamento anormal de células de defesa (eosinófilos, neutrófilos e linfócitos), do sistema imunitário, no trato respiratório. • Edema; • Aumento do conteúdo de colagéneo na membrana basal; • Aumento da densidade capilar, dificultando as trocas gasosas; • Hipertrofia glandular; • Erosão do epitélio. Estas alterações podem permanecer mesmo após a adopção de uma terapêutica adequada. As características clínicas e fisiopatológicas da asma devem-se à interacção entre as células inflamatórias na superfície epitelial das vias aéreas, os mediadores inflamatórios e as citoquinas. As células que desempenham um importante papel na resposta inflamatória são os mastócitos, eosinófilos, linfócitos e células epiteliais presentes nas vias aéreas. O papel dos neutrófilos, macrófagos e outras células presentes no sistema respiratório não está bem definido. Células - Mastócitos - Macrófagos - Eosinófilos - Linfócitos T - Células epiteliais - Fibroblastos - Neurónios - Neutrófilos - Plaquetas? - Basófilos? Mediadores - Histamina - Leucotrienos - Prostaglandinas - Tromboxanos - PAF - Bradicininas - Taquicininas - ROS - Adenosina - Anafilotoxinas - Endotelinas - NO - Citoquinas - Factores de crescimento Efeitos - Broncoconstrição - Exsudados de plasma - Hipersecreção de muco - AHR - Mudanças estruturais Fibrose Hiperplasia do músculo liso Angiogenese Hiperplasia do muco PAF – platelet-activating factor; AHR – antihyaluronidase reaction. Adaptado de Wilson, J. et al - Harrison’s Principles of Internal Medicine – McGraw-Hill, International edition, 16th edition, (2004); 162 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Os mediadores celulares libertados neste quadro patológico, induzem e estimulam: a actividade de várias células envolvidas no sistema imunitário; reacção inflamatória imediata com broncoconstrição, aumento na produção de muco, formação de edema, congestão vascular e alteração da motilidade ciliar com consequente descoordenação no transporte do muco na árvore traqueobrônquica. A presença de factores quimiotáticos atrai outras células ao local, como eosinófilos, plaquetas e polimorfonucleares. Os eosinófilos parecem ser especialmente importantes na infiltração celular característica neste quadro. A presença de IL-5 estimula a libertação das células, anteriormente referidas, na corrente circulatório, prolongando simultaneamente o tempo de vida das mesmas. Desta activação celular resulta a produção e libertação de leucotrienos, proteínas granulares e radicais livres de oxigénio, capazes de danificar o epitélio respiratório. As lesões provocadas exacerbam a produção de citoquinas quimiotáticas, aumentando a inflamação local. Através da sensibilização de terminais sensitivos presentes nestes locais, ocorre evolução de uma resposta local para uma mais generalizada com activação de mecanismos reflexos. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 163 APONTAMENTOS Neste quadro, os linfócitos T possuem uma importante função na modulação da resposta inflamatória. Na asma alérgica é registado uma activação da resposta mediada pelas células Th2. Consequentemente, ocorre a produção de várias interleuquinas, como a IL-4 que estimula a activação e desgranulação dos mastócitos, eosinófilos, linfócitos B e consequente formação de IgE. Resultado da activação de uma resposta imunológica tipo Th2, regista-se um desequilíbrio no balanço existente entre a resposta imunológica tipo Th1 e Th2. Isto porque quando uma delas é activada, ocorre produção de mediadores que inibem ou diminuem a activação do outro. Estimulo luminal/inalado (ex.: alergenos, poluentes, citoquinas) Mediadores Endotelina 1 NO PGE2 1,5-HETE Citoquinas: - GM-CFS - IL8 - RANTES - Eolaxina Broncoconstrição Inflamação Factores de crescimento: - EGF - IGF-1 - PDGF Fibrose Hiperplasia do músculo liso Vasodilatação RANTES - regulated on activation, T cell expressed and secreted; EGF - epidermal growth factor; IGF – insulin-like growth factor; PDGF – plateletderived growth factor; NO – nitrous oxide; PGE – prostaglandin E2; GM-CSF – granulocyte-macrophage colony-stimulating factor. Adaptado de Wilson, J. et al - Harrison’s Principles of Internal Medicine – McGraw-Hill, International edition, 16th edition, (2004); 164 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 10.6. Estímulos que incitam a asma Existem sete grandes grupos de estímulos que podem incitar episódios asmáticos: • Alergenos; o A asma alérgica está dependente da presença de resposta controlada pelos linfócitos B e T, com produção de IgE. O epitélio característico das vias aéreas apresenta células específicas, designadas por células dendríticas, responsáveis pela captura e processamento de antigénios (APCs – antigen presenting cells). Posteriormente, estas células migram para os nódulos linfáticos apresentando os antigénios processados aos receptores presentes nos linfócitos T. Desta interacção, e na presença de IL-4, resulta a diferenciação de linfócitos Th0 em linfócitos Th2. A partir deste ponto desenvolve-se uma resposta imunológica característica, já descrita anteriormente. Estes mecanismos imunológicos parecem estar relacionados com o desenvolvimento da asma em cerca de 25-35% da totalidade de casos. • Estimulo farmacológico; o Os agentes com acção farmacológica frequentemente associados à indução de episódios asmáticos são: a aspirina, corantes (tartrazina), antagonistas adrenérgicos β e agentes sulfito (agentes conservantes muito utilizados pela indústria alimentar, entre os quais se citam o metabissulfito de potássio, o bissulfito de potássio e sódio, o sulfito de sódio e o dióxido de enxofre). É essencial reconhecer episódios de broncoconstrição induzidos por estes compostos, pois constituem condições associadas a grande morbilidade. o A aspirina e outros AINEs parecem exercer esta acção através de um mecanismo inespecífico que envolve a hiperexpressão crónica de cisteínaleucotrienos que conduzem à activação de mastócitos. A exposição de indivíduos predispostos a baixas quantidades de aspirina é o suficiente para provocar o desenvolvimento de congestão nasal e ocular, e episódios agudos de obstrução das vias respiratórias. A administração de aspirina ou FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 165 APONTAMENTOS outros AINEs e antagonistas β adrenérgicos pode causar a morte em indivíduos susceptíveis de sofrer ataques de asma. Mesmo os antagonistas β1 selectivos são capazes de potenciar esta reacção, especialmente quando utilizados em grandes concentrações. o Existe uma grande reactividade entre a aspirina e outros AINEs (indometacina, naproxeno, ibuprofeno, fenilbutazona, entre outros) que inibem a cicloxigenase do tipo 1 (COX-1). No entanto, estes pacientes parecem tolerar bem o acetaminofeno (paracetamol), salicilato de sódio, salicilamida e ácido mefenámico. o Os pacientes com sensibilidade à aspirina podem ser sujeitos a uma terapêutica de dessensibilização através da administração diária controlada deste fármaco. Quando se regista tolerância à aspirina, verifica-se também tolerância cruzada com os outros AINEs. A reacção adversa à aspirina pode ser inibida através da administração de inibidores da síntese de leucotrienos ou antagonistas dos receptores dos leucotrienos. o Registos apontam que a asma pode também ser exacerbada aquando da utilização de: soluções de uso oftálmico que contêm sulfitos; glucocorticóides de administração intravenosa; e determinadas soluções broncodilatadoras para inalação. • Estimulo ambiental; o A asma parece sofrer com as condições climáticas que promovem a concentração de antigénios e poluentes atmosféricos (ozono, dióxido de azoto e dióxido de enxofre). Áreas muito industrializadas, zonas urbanos com alta taxa populacional, assim como mudanças bruscas das condições climatéricas e outras condições que contribuem para a formação de massas de ar estagnadas. • Estimulo ocupacional; o Muitas indústrias utilizam compostos capazes de obstruir aguda ou cronicamente as vias respiratórias. Estão identificados compostos de alto 166 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS peso molecular (compostos provenientes de poeira vegetal ou da madeira; agentes farmacológicos como antibióticos, piperazina e cimetidina; enzimas biológicas como as enzimas pancreáticas, detergentes utilizados na lavagem da roupa; secreções e pó libertados por insectos e animais), capazes de induzir asma através da activação de mecanismos imunológicos; e compostos de baixo peso molecular (sais metálicos como os sais de platina, cromo, vanádio e níquel; químicos e plásticos industriais como os persulfatos, etilenodiaminas, ácido ftálico, entre outros) que podem induzir asma ao funcionar como haptenos ou através da libertação de substâncias com acção broncoconstritora. A exposição diária continua a estes compostos é capaz de induzir respostas asmáticas nos indivíduos. • Infecções; o A infecção respiratória constitui o estímulo respiratório mais comum responsável pela exacerbação dos episódios de asma aguda. Estas infecções são decorrentes da presença de vírus (vírus parainfluenza e vírus respiratório sincicial nas crianças, rinovírus e vírus influenza nas crianças mais crescidas e nos adultos) e nunca de bactérias. A infecção vírica é, provavelmente, o único estímulo capaz de evocar e manter um quadro sintomático asmático constante durante semanas. O mecanismo pelo qual os vírus conseguem aumentar os sintomas asmáticos estará relacionado com a produção de citoquinas pelos linfócitos T. • Exercício físico; o O exercício físico pode precipitar episódios asmáticos agudos designados comumente por asma induzida pelo exercício. Este estímulo difere dos restantes estímulos pois não provoca lesões ou sequelas a longo prazo, nem aumenta a reactividade das vias aéreas. Normalmente, o ataque ocorre após o exercício e não durante a sua execução. Verifica-se que quanto maior for a ventilação e quanto menor a temperatura atmosférica (ar seco e frio, vento), maior será a resposta desenvolvida. Nestas condições, a FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 167 APONTAMENTOS marcha parece ser uma actividade física com menor capacidade para desencadear ataques asmáticos, do que a corrida, uma vez que esta última requer maior ventilação. Condições climatéricas caracterizadas por temperatura ambiental quente e humidade são ideais para a prática desportiva dos indivíduos asmáticos. • Estímulo emocional/stress. o As situações de stress e choque emocional pioram os quadros de asma. 10.7. Diagnóstico A tríada composta por dispneia, tosse e pieira constituem os sintomas característicos da asma. Na forma mais típica de asma estes sintomas coexistem. A asma é sempre reversível ao contrário do que sucede com a Doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC). Quando um paciente com asma se apresenta para iniciar a terapêutica, normalmente apresenta o valor de FEV1 (volume expiratório forçado no 1º segundo) e valor de DEMI (débito expiratório máximo instantâneo) inferiores a 40% do previsto para indivíduos sem asma. O diagnóstico é realizado através da demonstração da reversibilidade da obstrução das vias respiratórias. A reversibilidade é definida como um aumento igual a 15% no FEV1 após administração de dois puffs de um agonista β adren érgico. Quando os resultados obtidos com o espirómetro são normais, o diagnóstico pode ser estabelecido através da demonstração da exacerbação da resposta das vias respiratórias à administração de histamina, metacolina ou hiperventilação isocápnica de ar frio. Uma vez estabelecido o diagnóstico, o curso da doença pode ser monitorizado pela medição do DEMI através da utilização do debitómetro em casa e/ou da medição do FEV1 no laboratório. Existem outros testes que podem ser utilizados como auxiliares do diagnóstico, como os testes cutâneos aos alergenos na asma alérgica, embora os resultados obtidos não possam ser directamente relacionados com os eventos intrapulmonares. A expectoração, a eosinófilia e a concentração sérica de IgE são também parâmetros úteis, embora não sejam específicos desta patologia. 168 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Debitómetro (“Peak flow meter”) 10.7.1. Como utilizar o debitómetro? O debitómetro constitui um auxiliar de diagnóstico bastante importante, auxiliando na avaliação da gravidade e identificação de potenciais situações de crise. Isto porque devido à simplicidade com que são apresentados os resultados, o indivíduo pode monitorizar o seu estado de situação. Esta monitorização é sobretudo útil em indivíduos que tem má percepção dos sintomas. Para utilizar o debitómetro, devem ser seguidos os seguintes passos: 1.º - O marcador deve estar no zero antes de se realizar a determinação; 2.º - O doente pode estar sentado ou em pé, desde que o corpo esteja na vertical; 3.º - Com o debitómetro na mão (dedos afastados da escala numérica) inspirar o mais profundamente possível pela boca; 4.º - Colocar o tubo na boca entre os dentes e apertar os lábios nele; 5.º - A língua não pode ficar a tapar o orifício do tubo; 6.º - Soprar de uma só vez da forma mais rápida e forte possível; 7.º - Retirar o debitómetro da boca e observar a escala numérica; 8.º - Fazer a leitura de acordo com a posição do marcador; 9.º - Repetir duas vezes o procedimento e registar o valor mais elevado das determinações. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 169 APONTAMENTOS Valores Zona verde 80-100% Características Os valores que recaem sobre esta zona indicam um bom controlo da asma. O paciente deve continuar com a terapêutica caso esta exista. Os valores que recaem nesta zona alertam para a possibilidade do indivíduo estar a Zona amarela 50-80% desenvolver uma crise. O doente asmático deve tomar a medicação adicional prescrita, evitando o contacto/desencadeamento de factores precipitantes. Zona vermelha <50% Os valores que recaem nesta zona indicam que o paciente está em crise. Deve iniciar-se a medicação de recurso e contactar o médico. 10.8. Tratamento O tratamento da asma tem como objectivos minimizar ou anular os sintomas associados a este quadro patológico, normalizar a função pulmonar, manter a actividade física normal, prevenir as crises agudas, diminuir a necessidade da administração de agonistas β 2, diminuir a necessidade de recorrer aos serviços de urgência, minimizar as reacções adversas e aumentar a satisfação do doente ao promover comportamentos que visam melhorar a sua qualidade de vida. Resumindo, o tratamento da asma visa a diminuição e prevenção do aumento da hiperreactividade brônquica, assim como a diminuição da probabilidade de evolução para outras patologias como a doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC). Através dos programas de auto-cuidados, o doente é educado e informado sobre os aspectos da fisiopatologia e farmacoterapia relacionados com a sua patologia. Este deve ser alertado sobre a importância da evicção de agentes/situações precipitantes da exacerbação. Este comportamento permite diminuir o uso dos fármacos e a hiperreactividade brônquica. O paciente deve ainda estar atento aos factores desencadeantes da exacerbação e dos sinais precoces de deterioração, de forma a conseguir identificar eventuais situações de crise. Para além disso, estes conhecimentos, quando veiculados na forma oral e escrita ao doente, permite que este saiba adoptar comportamentos adequados nas crises de asma. Todos estes aspectos melhoram não só a adesão à terapêutica e as competências do paciente, como também permitem melhorar a utilização e racionalização dos serviços de saúde. 170 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 10.8.1. Educação do doente • • Factos sobre a asma o Diferenças entre as vias respiratórias normais e do asmático; o O que acontece às vias respiratórias durante a crise aguda. Papel dos fármacos o Mecanismo de acção; o Controlo a longo prazo: prevenção de sintomas, geralmente por controlo da inflamação; o Alívio rápido: broncodilatadores de curta acção relaxam o músculo liso brônquico; o Reforçar a importância do tratamento de manutenção e não esperar alívio rápido com ele. • Competências o Uso de inaladores (demonstração); o Uso de câmaras expansoras; o Monitorização dos sintomas e do DEMI e reconhecimento de sinais precoces de exacerbação. • Medidas de controlo ambiental o • Identificar e evitar factores precipitantes da crise aguda. Medidas de SOS o Saber quando e como actua. O paciente deve ter não só um plano de autocuidados mas também um plano de acção (oral e escrito). 10.8.2. Estratégias terapêuticas As principais estratégias terapêuticas adoptadas no tratamento dos quadros de asma são: • Identificar os factores desencadeantes; • Seleccionar a terapêutica adequada; • Programar o tratamento a longo prazo através da instituição de um plano de tratamento adequado, baseado e centrado num modelo de acção proactivo; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 171 APONTAMENTOS • Tratar as crises; • Monitorizar e adaptar a terapêutica à clínica. 10.8.3. Tratamento farmacológico 10.8.3.1. Formas de veicular o tratamento Estão actualmente comercializados 3 dispositivos que permitem veicular a terapêutica adoptada no tratamento da asma: inaladores de pó seco, inaladores pressurizados de dose calibrada (com ou sem câmara expansora) e nebulizadores. Os sistemas inaladores permitem aumentar a eficácia, aumentar a rapidez de acção e diminuir os efeitos sistémicos da terapêutica. O sistema de inalação ideal seria aquele que detivesse todas as seguintes características reunidas: 172 • Fácil de utilizar; • Máximo de eficácia possível; • Portátil; • Barato; • Resistente; • Recarregável; • Libertação de doses constantes; • Dispositivo de alarme; • Mecanismo de percepção da inalação; • Independente do débito inspiratório; • Perdas nulas de fármaco no dispositivo; • Administração uniforme pelas vias aéreas; • Deposição nula de fármaco na orofaringe; • Deposição pulmonar máxima; • Sem excipientes ou aditivos; • Libertação de doses múltiplas; • Com contador de doses; • Possa ser utilizado quer na prevenção quer em SOS. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS A – Nebulizadores Os nebulizadores são dispositivos médicos activos que geram um aerossol do fármaco. Existem pelo menos dois tipos de nebulizadores que se distinguem pela forma como geram o aerossol. Assim sendo, temos os nebulizadores de pressão, muito utilizados em meio hospitalar, que geram aerossol a partir de uma solução ou suspensão, através da utilização de ar comprimido ou oxigénio para arrastar o líquido. Por outro lado, temos também nebulizadores de ultra-som que geram aerossol por vibração da solução, e não de suspensão, que se encontra sobre um transdutor (± 1mHz). Em ambos, o paciente necessita de utilizar uma máscara facial ou outro dispositivo, de forma a inalar o vapor. A nebulização é realizada sobre uma solução do fármaco, devendo esta ser sujeita a uma diluição adequada com soro fisiológico. Como já referido, estes nebulizadores são utilizados principalmente em meio hospitalar como intervenção nos ataques mais severos, permitindo utilizar doses maiores de fármacos. Vantagens • Não requer a coordenação entre a activação do dispositivo e a inspiração por parte do paciente; • Possível veicular doses mais elevadas de fármaco; • Possível modificar as doses; • Não ocorrem perdas do fármaco durante a exalação; • Apresenta um grau de deposição pulmonar elevado (5-15% da dose) e semelhante entre os dois modelos; • O dispositivo bucal é preferível à máscara por evitar a filtração nasal; • Não requerem cooperação pelo doente, podendo ser facilmente utilizados em qualquer idade, possibilitando a administração de doses elevadas; • Constituem uma alternativa à via parentérica; • Não liberta CFC’s; • Podem ser utilizados com suplementos de oxigénio; • Podem veicular terapias combinadas; • Os novos modelos são mais pequenos e portáveis; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 173 APONTAMENTOS • O nebulizador de ultra-sons permitem realizar uma administração mais rápida do(s) fármaco(s) que o nebulizador de pressão. Desvantagens • Caros, complicados, ruidosos e demorados. Para veicular 4 a 6 mL são necessários 10 a 15 minutos; • São geralmente menos eficientes que os inaladores pressurizados com câmara expansora; • Não são portáveis; • Necessitam de uma fonte de gás (nebulizadores de pressão) ou uma fonte de energia (nebulizadores de ultrasom); • Necessita de uma limpeza e preparação adequada antes de serem utilizados; • Pode ocorrer contaminação; • Nem todos os medicamentos disponíveis estão comercializados na forma de solução; • Não permite ou produz mal aerossóis de suspensões. B – Inaladores pressurizados de dose calibrada Este tipo de dispositivo é utilizado à mais de 40 anos, veiculando diferentes fármacos. Consiste num tubo pressurizado, fechado, com uma válvula doseadora que, quando activada, liberta partículas respiráveis. O fármaco encontra-se em solução ou em pó micronizado misturado com um gás inactivo designado por propelente (triclorofluormetano), com surfactante. Pode também existir um cosolvente destinado a melhorar a capacidade de solubilização do Inaladores pressurizados de dose calibrada fármaco (álcool de cadeia curta) e/ou um emulgente que evita a adesão das partículas entre si ou com as paredes do contentor (lecitina, ácido oleico, éster de sorbitano). É o dispositivo mais utilizado actualmente. Vantagens • Portáteis; • Eficazes; • Económicos; • Requerem baixo fluxo inspiratório (lento ou profundo), a tecnologia é simples; • Não querem a preparação do fármaco; 174 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Não existe contaminação da formulação; • A reprodutibilidade de dose para dose é elevada; • Podem ser acoplados a câmaras expansoras. Estas são compartimentos colocados entre o bucal do dispositivo e a boca do paciente. Ao activar-se o dispositivo, o fármaco é dispensado para dentro da câmara onde fica retido, formando-se uma nuvem que permite a completa vaporização do propelente. A utilização deste dispositivo médico permite ultrapassar o efeito «fréon 4» e a coordenação da libertação da dose com a inalação. Proporciona um alívio rápido dos sintomas, diminui a deposição orofaríngea aumentando a deposição pulmonar e consequente diminuição dos efeitos adversos resultantes da absorção sistémica. É útil para a administração em crianças e recém-nascidos. Como desvantagens deste dispositivo, refere-se o facto destes serem grandes e pouco portáveis e exigirem a execução de um procedimento de lavagem correcto de forma a evitar a formação de electricidade estática que pode atrair partículas do fármaco, reduzindo assim a dose administrada. Desvantagens • Não podem ser administradas doses múltiplas; • Requerem uma boa coordenação entre a activação do dispositivo e a inalação; • Considerável deposição orofaríngea; • Induzem frequentemente a interrupção involuntária da inspiração devido ao efeito «fréon4»; • Incluem CFC’s como propulsores; • Não apresenta contador de doses; Os problemas mais frequentes inerentes à sua utilização são: • Esquecer a agitação antes de administrar; • Posicionamento incorrecto através da adopção de outras posições que não a vertical do dispositivo; • Expiração parcial antes da inspiração profunda; • Inalação rápida; • Inspirar o fármaco pelo nariz; • Pressionar o inalador mais que uma vez; • Não direccionar correctamente o inalador para a boca; • Não suster a respiração após a inalação; • Má coordenação entre a activação do dispositivo e a inalação; 4 Efeito fréon – reacção reflexa do organismo para eliminar ou parar a inalação do aerossol, resultante do contacto das partículas do gás propulsor, frio, com a mucosa orofaríngea. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 175 APONTAMENTOS Nota: Quando usados pela primeira vez ou após algum tempo de inutilização devem ser activados uma vez antes da administração. Câmara expansora C – Inaladores de pó seco São dispositivos que não utilizam gás propelente para veicular os fármacos. Cada dose contém uma pequena quantidade de fármaco na forma de pó seco, geralmente veiculado pela lactose, que é inalado em consequência da inspiração do doente. Existem vários inaladores de pó seco comercializados (Diskhaler®, Rotahaler®, Spinhaler®, Aerolizer®, Turbohaler®, Diskus®), cada qual com as suas características mas todos respeitam este modelo. Os de dose unitária usam cápsulas de gelatina dura com o pó, que são furadas pelo dispositivo na altura da utilização. Já os de dose múltipla têm o pó numa câmara que, por n rotações do dispositivo, fica disponível para inalar uma quantidade de pó correspondente a n doses. Em todo o caso, é importante o paciente bochechar e cuspir após a administração, de forma a eliminar a eventual presença de fármaco que ai tenha ficado e que possa causar efeitos adversos. 176 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Vantagens • São mais fáceis de utilizar que os inaladores pressurizados; • Não requerem coordenação entre a libertação da dose pelo dispositivo e a inalação do paciente; • Alguns apresentam contador; Desvantagens • Requerem fluxo inspiratório mais elevado e energético que os dispositivos pressurizados (forçado e profundo); • São caros; • Não são recomendados nos ataques agudos; • A estabilidade da formulação está mais condicionada; • Origina deposição orofaríngea; • Não são recomendados para crianças com menos de 6 anos de idade, uma vez que estas não conseguem executar fluxos inspiratórios energéticos e correctos. 1 2 3 Inalador de pó seco - Diskus® Inalador de pó seco - Turbohaler® FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 177 APONTAMENTOS Inalador de pó seco - Diskhaler® Inalador de pó seco – Aerolizer® A B Inaladores de pó seco: (A) Spinhaler® e (B) Rotahaler® 178 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 10.8.3.2. Agonistas β2 São os broncodilatadores mais eficazes disponíveis actualmente. Exercem o seu mecanismo de acção ao promoverem: • Relaxamento do músculo liso (independentemente do mecanismo de constrição); • Estabilização da membrana dos mastócitos (previne a libertação de histamina e outros compostos); • Estimulação do músculo esquelético. Exercem ainda outras acções, como a promoção da gluconeogénese e aumento da secreção de insulina, produzindo diminuição ligeira a moderada do potássio sérico devido à activação da ATPase Na+/K+). Como consequência do relaxamento muscular liso vascular, os mecanismos reflexos dos baroreceptores são activados, resultando num efeito cronotrópico positivo. Quando administrados em doses elevadas ocorre ainda a estimulação dos receptores β2 cardíacos e β1, exacerbando o efeito cronotrópico. Acção curta Acção longa Salbutamol Formoterol Terbutalina Salmeterol Estes fármacos apresentam uma curva dinâmica de dose-resposta. Consequentemente a broncodilatação diminui com o aumento da broncoconstrição. Procaterol Clenbuterol Fenoterol Estão divididos em duas categorias: os de acção curta utilizados no tratamento de situações agudas; e os de acção longa, utilizados na terapêutica de manutenção. Como reacções adversas estão descritos: • Tremor, agitação, nervosismo; • Palpitações, cefaleias; • Taquicardia e arritmias; • Reacções de hipersensibilidade incluindo broncospasmo paradoxal, urticária e angioedema. Hipocalemia (doses elevadas); A adrenalina é um agonista β, apenas utilizado nos estados de mal asmático. Para além do efeito broncodilatador, causa vasoconstrição e consequente redução do edema FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I e da 179 APONTAMENTOS permeabilidade capilar da mucosa brônquica. Possui ainda efeitos directos sobre o coração e circulação periférica. A Isoprenalina e a efedrina eram utilizadas como broncodilatadores, antes do aparecimento dos agonistas selectivos β2. Salbutamol, Terbutalina, Formoterol, Salmeterol, Procaterol, Clenbuterol e Fenoterol 10.8.3.3. Metilxantinas O seu mecanismo de acção passa por: inibição da fosfodiesterase, antagonismo da acção da adenosina, diminuição da permeabilidade vascular e aumento da clearance mucociliar, fortalecendo as contracções do diafragma e diminuindo a fadiga dos músculos respiratórios. São broncodilatadores de potência média com uso limitado, devido à sua estreita margem terapêutica, apresentando uma curva dose-resposta dinâmica. O uso regular de teofilina parece diminuir os sintomas e a necessidade da administração de agonistas β2 inalados e/ou corticosteróides. A formulação oral de teofilina é a preferida. A aminofilina, composta pela associação de teofilina com etilenodiamina, é utilizada como injectável de perfusão lenta, não apresentando vantagens clínicas, mesmo quando coadministrada com agonistas β2, existindo risco de efeitos adversos. Atenuam o broncoespasmo da resposta tardia, não tendo qualquer efeito no aumento posterior da hiperreactividade brônquica. Ao estimularem o SNC produzem vasoconstrição cerebral potenciando o aparecimento de convulsões. Apresentam um efeito agudo diurético, desenvolvendo-se rapidamente tolerância. Devido ao tempo de semi-vida curto, são utilizadas formas sólidas de libertação prolongada. Aminofilina, Diprofilina (melhor tolerada a nível GI mas menor eficácia, ajuste de dose na IR), Teofilina 10.8.3.4. Anticolinérgicos Constituem fármacos broncodilatadores de potência moderada de utilização limitada devido aos efeitos secundários, sobretudo aos centrais. Atenuam a asma induzida pelo exercício físico ou por alergenos, não apresentando efeitos sobre a resposta alérgica tardia ou sobre a hiperreactividade brônquica. 180 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Pode ser registado, broncospasmo paradoxal em alguns pacientes, em virtude da sua administração. Os derivados da amónia quaternária têm a vantagem de serem pouco absorvidos, o que minimiza a ocorrência de efeitos secundários e prolonga a acção terapêutica. O início de acção é lento (2h) durando cerca de 4-6h, pelo que não constituem os fármacos de primeira linha no tratamento dos ataques agudos. Quando utilizados em nebulizador devem ser usadas máscaras faciais ou distribuidores orais de forma a evitar contacto com os olhos (risco de dilatação da pupila e dificuldade de acomodação da visão). A associação de brometo de ipratrópio inalado a agonistas β2 apresenta vantagens em 1015% dos doentes, registando-se uma diminuição da taxa de hospitalização de crianças com FEV1 < 30%. Existem algumas associações de anticolinérgicos com agonistas β2, não estando contudo recomendadas. Brometo de ipratrópio e Brometo de tiotrópio 10.8.3.5. Cromolinas O seu mecanismo de acção passa pela estabilização das membranas dos mastócitos, inibindo não só o broncospasmo induzido pelo exercício, mas também a resposta asmática imediata e tardia, com consequente prevenção do aumento da hiperreactividade brônquica. A utilização destes fármacos em terapêuticas prolongadas previne o aumento da hiperreactividade brônquica em resposta à presença de alergenos como o pólen sazonal. Por outro lado, a inalação regular parece reduzir a incidência de crises agudas e permitir a diminuição gradual das doses de broncodilatadores/corticosteróides utilizados. Apenas são activos por via tópica, sendo extremamente bem tolerados. Como reacções adversas, encontram-se descritos: • Broncoespasmo passageiro (efeito evitado pela inalação prévia de agonistas β2); • Tosse; • Irritação da garganta após inalação oral; • Gosto amargo-metálico após inalação oral; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 181 APONTAMENTOS • Após tratamento prolongado por várias semanas e/ou meses, pode ser registado agravamento da asma, urticária, «rashes», infiltrados pulmonares com eosinofilia, obrigando à descontinuação da terapêutica. Apesar de tudo, estas reacções são extremamente raras. As cromolinas estão contra-indicadas para o tratamento da asma aguda. A descontinuação do tratamento deve ser realizada com precaução, especialmente nos doentes em que foram reduzidas as doses terapêuticas de corticosteróides, após o início do tratamento. Cromoglicato de sódio e Nedocromil (mais potente) 10.8.3.6. Cetotifeno O cetotifeno é um anti-histamínico com acção estabilizadora das células mastocitárias e outras células inflamatórias, parecendo neutralizar a taquifilaxia adrenérgica. É absorvido por via oral, estando contra-indicado no tratamento do ataque de asma agudo. 10.8.3.7. Corticosteróides Os corticosteróides são os anti-inflamatórios mais eficazes no tratamento da asma. Estudos demonstraram que a administração de corticosteróides promove o aumento do número de receptores β2, melhorando a resposta dos respectivos agonistas. Diminuem não só a produção e hipersecreção de muco, mas também a hiperreactividade brônquica, prevenindo e revertendo o remodeling das vias respiratórias. Não apresentam efeitos imediatos e como tal, não estão indicados para o tratamento da asma aguda. Como a resposta inflamatória asmática inibe a afinidade para o receptor esteróide, inicia-se normalmente o tratamento com doses mais elevadas e mais frequentes, reduzindo-se posteriormente quando é atingido controlo. Por vezes a própria toxicidade destes fármacos obriga a sacrificar a eficácia dos mesmos. Nestes casos, pondera-se a administração em dias alternados ou a administração de elevadas doses por via inalatória. A via IV não apresenta vantagens sobre a oral e a fragmentação da dose diária em várias tomas é mais segura, parecendo existir mais vantagens deste protocolo, uma vez que a distribuição das tomas parece aumentar a afinidade para o receptor esteróide. 182 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Estudos de cronobiologia, isto é, estudos baseados na resposta-fármaco em relação à hora de administração, sugerem que a administração deveria ocorrer entre as 3:00h e as 5:00h para melhorar a eficácia e minimizar a toxicidade. Estes resultados estão relacionados com os ritmos circadianos característicos do organismo humano. Na administração por via inalatória estão descritas as seguintes reacções adversas: faringite; disfonia; candidíase oral associada geralmente com a administração de doses elevadas; e ligeiro aumento de risco de glaucoma e cataratas. Beclometasona, Budesonida e Fluticasona 10.8.3.8. Antagonistas dos leucotrienos São fármacos antagonistas competitivos e selectivos dos receptores do leucotrieno D4, uma substância broncoconstritora potente, com funções importantes nos processos inflamatório e alérgicos. São bem tolerados e eficazes na asma persistente em adultos e crianças, que melhoram a função pulmonar, diminuem o acordar nocturno e a necessidade da administração de agonistas β2, melhorando os sintomas asmáticos. Reduzem a asma induzida por: exercício, alergenos, ar frio, substâncias irritantes e aspirina. Não apresentam contudo, actividade broncodilatadora, sendo utilizados mais como profiláticos da asma. São eficazes por via oral (Montelucaste administrado 1x/dia à noite; Zafirlucaste: 2x/dia, 1h antes ou 2h após as refeições). Existem formas farmacêuticas orais sólidas destinadas a serem mastigadas, ideais para a administração em crianças. São menos eficazes do que os corticosteróides inalados, existindo no entanto doentes que apresentam boa resposta. Como reacções adversas estão descritas: infecções do tracto respiratório superior, febre, artralgias, mialgias, perturbações do sistema gastrointestinal, cefaleias, astenia, sonolência, insónia, irritabilidade, tonturas, xerostomia e reacções de hipersensibilidade. Montelucaste e Zafirlucaste FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 183 APONTAMENTOS 10.8.3.9. Selecção do fármaco ou combinação adequada A – Fármaco utilizados no alívio rápido dos sintomas, que inibem a contracção do músculo liso • Agonistas β2 adrenérgicos; • Metilxantinas; • Anticolinérgicos. B – Fármacos que previnem e/ou revertem a inflamação a longo termo • Glucocorticóides; • Agonistas β2 de longa acção; • Agentes estabilizadores das células mastocitárias; • Antagonistas dos leucotrienos; • Metilxantinas. Fármacos Agonistas β2 de curta acção Situação clínica • Broncoespasmo intermitente; • Asma aguda severa; • Asma induzida pelo exercício; • Não devem ser utilizados regularmente. Usados Agonistas β2 de longa acção em associação com corticosteróides ou como tratamento regular em doentes com asma de grau ligeiro a moderado e com sintomas nocturnos. • Prevenção das crises e tratamento do ataque agudo; • A teofilina é utilizada como coadjuvante dos agonistas β2 e corticosteróides constituindo Xantinas a primeira na asma opção crónica, não terapêutica no tratamento da asma; • Existem formulações constituídas pela associação de teofilina e agonistas β2 (sistémicos) ou teofilina e cromoglicato; • A associação de teofilina a corticosteróides inalados é menos eficaz que a associação de agonistas β2. Anticolinérgicos • Não devem ser usados nas crises agudas; • São segunda linha terapêutica em casos que não respondem aos agonistas β2 ou em associação com estes. 184 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • A profilaxia é menos eficaz no adulto do que a corticoterapia inalatória, mas as crianças parecem responder melhor; • São utilizados na prevenção da asma induzida pelo exercício Cromolinas (2ª escolha) ou por desencadeantes específicos; • Não estão indicadas no tratamento do ataque agudo, mas parecem eficazes nas situações sazonais; • A eficácia é semelhante à teofilina e antagonistas dos leucotrienos, mas menor que os corticosteróides. • Podem ser utilizados em todos os doentes com asma, excepto na asma com acessos intermitentes muito espaçados; • Via inalatória: base do tratamento de manutenção na asma moderada ± agonistas β2; Corticosteróides • Via sistémica: asma crónica grave ou na exacerbação aguda (recurso); • Sempre que possível, usados em ciclos de curta duração; • Única terapêutica que reduz o risco de morte, mesmo em doses baixas. • Antagonistas dos receptores dos leucotrienos Asma ligeira a moderada, nos doentes refractários aos corticosteróides e aos agonistas β2; • Parecem benéficos na asma induzida pelo exercício nos doentes com rinite. 10.8.3.10. Tratamento das crises agudas A – Objectivos • Reverter a obstrução (poucos minutos); • Corrigir a hipoxemia (12-24h); • Restaurar função pulmonar (3-7 dias); • Diminuir a taxa de recorrência dos sintomas; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 185 APONTAMENTOS o • Corticosteróides sistémicos e DEMI. Desenvolver um plano de acção (escrito e oral). B – Estratégia • Reconhecimento precoce da obstrução; • Tratamento agressivo (agonistas β2 inalados e corticosteróides sistémicos); • Educação e auto-cuidados; C – Terapia geral de suporte • Administração de oxigénio, uma vez que os agonistas β2 podem induzir diminuição transitória da saturação de oxigénio; • Hidratação, caso exista desidratação; • O exercício físico da cavidade torácica e mucolíticos não estão indicados; • Os sedativos podem mascarar a ansiedade causada pela hipoxémia; • Não devem ser utilizados antibióticos em rotina (infecções virais). 10.8.3.11. Tratamento crónico Para que o tratamento crónico seja realizado de forma correcta, o doente deve ter um acompanhamento regular, devendo ser educado e informado sobre todos os aspectos da sua patologia. Deve ainda destacar-se a importância da evicção dos factores precipitantes das crises. Por outro lado, devem existir planos de acção para a manutenção e exacerbação. Os sintomas raros da asma podem ser tratados com agonistas β2 apenas em SOS. Quando ocorre agravamento desta patologia, com acordar nocturno e sintomas presentes durante o dia, pode optar-se pela administração de corticosteróides por inalação e/ou administração de estabilizadores da membrana dos mastócitos. Quando nestas situações a terapêutica com cortocosteróides já estiver implementada, pode ponderar-se o aumento da dose. Os sintomas permanentes devem ser tratados com a administração de agonistas de longa acção inalados, teofilina veiculada em formas farmacêuticas de libertação prolongada e/ou anticolinérgicos. Os doentes com sintomas recorrentes e função pulmonar instável devem realizar uma terapêutica à base de corticosteróides de administração oral. 186 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS É aconselhada a existência de avaliação da técnica utilizada pelos pacientes para manusear e administrar os fármacos através da utilização de inaladores, a aderência às recomendações terapêuticas e o controlo ambiental. 10.8.3.12. Situações de emergência As situações de emergência requerem inalações múltiplas com agonistas β2 de curta acção. Para tentar acelerar a resolução das crises asmáticas deve também ponderar-se a administração de aminofilina ou brometo de ipatrópio, após 1 hora. Os anticolinérgicos não constituem os fármacos de primeira escolha, uma vez que para além de terem acção lenta (pico plasmático após 30-40min da administração), apresentam propriedades broncodilatadoras fracas. Caso se registe um valor de DEMI ou FEV1 inferior ou igual a 20% e este não duplique na primeira hora, recomenda-se a associação de corticosteróides. Esta situação clínica constitui 20% dos casos em que os pacientes com asma necessitam de intervenção emergente. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 187 APONTAMENTOS 11 – DPOC - DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÓNICA A doença pulmonar obstrutiva crónica é um estado patológico caracterizado pela limitação do fluxo aéreo na árvore traqueobrônquica, não reversível na totalidade, devido ao dano estrutural existente. Ao contrário da asma, os sintomas associados a esta doença acompanham o paciente ao longo do dia. Este estado patológico inclui: • Enfisema; o Estado anatómico definido e caracterizado pela destruição e aumento dos alvéolos pulmonares, com consequente redução da área de superfície necessária para a realização das trocas gasosas. • Bronquite crónica; o Condição clínica bem definida caracterizada pela presença constante de tosse e muco. Existem casos de bronquite crónica, nos quais existe possibilidade da DPOC não se desenvolver, uma vez que as lesões ainda não estão presentes. • Doença pequena das vias aéreas. o Condição clínica caracterizada pelo estreitamento dos bronquíolos pequenos, em consequência da hipercelularidade local. Esta patologia afecta mais de 16 milhões de pessoas nos EUA, constituindo a quarta principal causa de morte nesse país. Estimativas sugerem que em 2020 a DPOC constituirá não a sexta, mas sim a terceira principal causa de morte no mundo. 188 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 11.1. Factores de risco 1.º Fumo do tabaco; 2.º Hiperreactividade das vias aéreas; 3.º Infecções respiratórias (bacterianas e víricas); 4.º Exposição ocupacional (trabalhadores de minas de carvão e ouro, exposição ao cádmio, exposição a resíduos têxteis); 5.º Poluição ambiental do ar (ex.: dióxido de enxofre, entre outros); 6.º Exposição passiva ao fumo. 11.2. Factores genéticos A deficiência severa em α1-antitripsina constitui um factor de risco para o desenvolvimento de DPOC, existindo evidências que esta deficiência seja hereditária. Existem provavelmente outros factores genéticos relacionados, muito embora ainda não tenham sido ainda identificados. 11.3. Patofisiologia A DPOC é caracterizada por: • Obstrução das vias aéreas; • Hiperinsuflação; • Diminuição da área de trocas gasosas. o Hipoxemia – diminuição da quantidade de oxigénio no sangue, característico das situações agudas; o Hipercapnia – aumento da quantidade de dióxido de carbono no sangue, característico das situações crónicas, mas não das agudas. 11.4. Patogénese • Inflamação; o Com activação especifica de macrófagos e neutrófilos e consequente destruição das paredes alveolares pelas enzimas líticas (elastases, colagenases, entre outras). A activação destas células pode dever-se ao FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 189 APONTAMENTOS fumo do tabaco que, ao contactar com os macrófagos presentes nos alvéolos, promove a libertação de citoquinas e quimiocinas que recrutam outras células como os neutrófilos; o A perda dos cílios promovida pelo contacto com o fumo do tabaco, aumenta a predisposição para as infecções bacterianas com neutrofilia. • Proteolise da matriz extracelular; o A elastina, principal componente das fibras elásticas, é um componente da matriz extracelular muito estável e essencial para a manutenção da integridade das vias respiratórias. A elastase presente nos neutrófilos é uma potente serina proteínase que destrói a elastina, contribuindo para a instalação de enfisema pulmonar. • Morte celular; o Foi demonstrado um aumento de morte celular associada à diminuição da expressão de VEGF (vascular endothelial growth factor) e do seu receptor VEGFR-2 (KDR/Flk-1) nos pulmões humanos com enfisema. • Reparação ineficaz. o Devido ao elevado número de neutrófilos e fibroblastos presentes, ocorre frequentemente fibrose pulmonar. 11.5. Apresentação clínica • Tosse produtiva (expectoração); o A expectoração facilita a instalação de infecções respiratórias. Como medida preventiva da evolução das infecções pulmonares, muitos indivíduos com DPOC iniciam terapêuticas com antibióticos. • Dispneia do exercício; • Os dados obtidos por espirometria evidenciam diminuição do FVC (forced vital capacity - volume total de ar expirado durante a realização da técnica) e do FEV1 (FEV1<80% após broncodilatador) verificando-se que a relação FEV1/FVC é inferior a 70% na DPOC. 190 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 11.6. Tratamento A terapêutica da DPOC têm por objectivo prevenir a progressão da doença, aliviar os sintomas, melhorar a tolerância ao exercício, melhorar o estado de saúde, prevenir e tratar as complicações e exacerbações, reduzindo a mortalidade associada a esta patologia. Apenas dois tipos de intervenção demonstraram influenciar o prognóstico clínico dos pacientes com DPOC: 1. Cessão tabágica; o Permite normalizar a taxa de decaimento da função pulmonar; o Pode ser necessário a combinação de terapêuticas farmacológicas com terapêuticas não farmacológicas; o A bupropiona e a nicotina são dois fármacos utilizados na cessação tabágica; o 80% dos fumadores desenvolvem DPOC. 2. Terapia com oxigénio o A terapia com oxigénio permite diminuir a mortalidade associada a esta patologia; o Deve ser aplicada a doentes com hipoxemia em repouso, em que a saturação sanguínea de oxigénio seja inferior a 88% ou 90%, com sinais de hipertensão pulmonar ou insuficiência cardíaca direita; o A administração de oxigénio durante 19 horas por dia demonstrou ter mais vantagens que a administração de oxigénio durante 12 horas por dia. 11.7. Tratamento da fase estável da DPOC Na fase estável da patologia, pode ponderar-se a administração de: • Broncodilatadores o Administrados por inalação; o Aliviam os sintomas associados; o Podem ser anticolinérgicos, agonistas β ou xantinas. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 191 APONTAMENTOS Anticolinérgicos Xantinas Agonistas β (Brometo de ipatrópio) (Teofilina) - São utilizados os agonistasβ de longa - Melhora aguda do FEV1; - Não influencia a taxa decaimento da função pulmonar; de acção como o Salmeterol; - Quando administrados provocam - Apresentam eficácia semelhante aos uma melhoria ligeira do FVC, FEV1, anticolinérgicos; PO2 e PCO2; - A associação com anticolinérgicos é benéfica. • Corticosteróides o Administrados preferencialmente por via inalatória; o Diminuem a frequência de exacerbações em 25 a 30%; o Constituem uma opção para os doentes com exacerbações frequentes (2 ou mais por ano) ou com reversibilidade aguda a broncodilatadores inalados (componente asmática); • N-acetil-cisteína o Actua como mucolítico e anti-oxidante. Encontra-se ainda em ensaios clínicos. • α1-Antitripsina o Poderá ser administrada, por via intra venosa, em indivíduos com deficiência acentuada desta proteína. 11.8. Tratamento da exacerbação aguda A exacerbação aguda da DPOC é caracterizada pelo agravamento dos sintomas (tosse e dispneia), febre, mialgias, rouquidão, entre outros, que diminuem substancialmente a qualidade de vida dos doentes. Para prevenir a exacerbação da DPOC, deve-se: • Evitar os factores precipitantes; o Infecções bacterianas; 192 Deve instituir-se a administração de antibióticos quando: FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS o Existe aumento da dispneia, volume e purulência da expectoração; o Existe exacerbação que requer ventilação mecânica invasiva. o • Infecções virais – presentes em 1/3 dos casos de exacerbação da DPOC. Instituir terapêuticas anti-inflamatórias; o Administração de corticosteróides por inalação e não per os (30 a 40mg de Prednisolona durante 10 a 14 dias); • Instituir terapêuticas broncodilatadoras; o • Agonistas β, anticolin érgicos, xantinas. Administrar oxigénio; o Deve ser administrado de forma a manter a saturação arterial de oxigénio na ordem dos 90%. • Ponderar a instituição de suporte ventilatório mecânico. o Doentes com insuficiência respiratória (PCO2 > 45mmHg); o Este procedimento encontra-se contra-indicado em casos de instabilidade cardiovascular, estado mental alterado, obesidade extrema, queimaduras extensas, entre outros estados; o Pode ser realizado segundo dois procedimentos: Invasivos; Não invasivo (pressão positiva) – associada à diminuição da: mortalidade, necessidade de entubação, complicações terapêuticas e duração da hospitalização. 11.9. Tratamento não farmacológico 11.9.1. Cuidados médicos gerais • Vacinação anual contra influenza; • Vacinação contra pneumococus realizada de cinco em cinco anos; 11.9.2. Programas de reabilitação pulmonar FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 193 APONTAMENTOS A educação e informação dos pacientes sobre a sua patologia, associada ao treino cardiovascular contribui para aumentar a qualidade de vida, diminuir a dispneia e melhorar a capacidade de exercício, reduzindo a taxa de hospitalização. 11.9.3. Cirurgia de redução do volume pulmonar Este procedimento cirúrgico é realizado em doentes com enfisema, apresentando benefícios sintomáticos e funcionais pulmonares, associados à diminuição da mortalidade. 11.9.4. Transplante pulmonar A doença pulmonar obstrutiva crónica constitui a primeira indicação para a realização de transplante pulmonar. 194 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Refluxo gastroesofágico Úlcera péptica CAPITULO IV PATOLOGIAS DO SISTEMA DIGESTIVO FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 195 APONTAMENTOS 12 –REFLUXO GASTROESOFÁGICO No passado, a úlcera gástrica e a úlcera duodenal constituíam as patologias mais comuns do sistema gastrointestinal, nos países industrializados. Actualmente é o refluxo gastroesofágico que assume esta posição. Estudos demonstraram que mais de 15% da população sofre de azia e/ou de regurgitação pelo menos uma vez por semana e 7% apresentam estes sintomas todos os dias. O refluxo gastroesofágico é causado pela passagem de ácido gástrico e outros componentes do suco digestivo para o esófago, devido ao mau funcionamento das barreiras da junção gastroesofágica. Os mecanismos que evitam o refluxo do conteúdo gástrico para o esófago são: o Esfíncter esofágico inferior; o Pressão exercida pelo diafragma; o Localização anatómica da junção gastroesofágica, inferior ao hiato do diafragma. O refluxo ocorre quando ocorre perda do gradiente de pressão entre o esfíncter esofágico inferior e o estômago. Isto pode ser causado pela perda transitória ou sustentada do tónus do esfíncter esofágico inferior, fenómeno que ocorre com maior frequência à noite. A hipotensão sustentada do esfíncter esofágico inferior pode ser consequência de fraqueza muscular, sem que 196 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS exista causa aparente para tal 5. Nas causas secundárias da perda da função do esfíncter esofágico inferior estão incluídas a miopatia associada à obstrução intestinal pseudo-crónica, doenças semelhantes a esclerodermia (deposição de colagéneo no esófago com diminuição da motilidade esofágica), gravidez, tabaco, fármacos anticolinérgicos6, relaxantes dos músculos lisos (agonistas β, aminofilina, nitratos, fosfodiesterase que aumentam bloqueadores dos canais álcio, deinibidores c da o AMPc ou GMPc [incluindo o sildenafil]), dano cirúrgico nao esfíncter esofágico inferior e esofagite. Por outro lado, a probabilidade de ocorrer refluxo do conteúdo gástrico aumenta quando: • Ocorre aumento do volume gástrico; • O conteúdo do estômago está mais perto da junção gastroesofágica: o Quando os indivíduos estão deitados ou dobrados; o Nos casos de hérnia do hiato. Consiste na entrada de uma porção do estômago para dentro do tórax, através de uma passagem naturalmente fechada do diafragma; O relaxamento transitório do esfíncter ocorre mais frequentemente nos indivíduos com hérnia. • Nos casos em que a pressão gástrica está aumentada: o 5 Obesidade; O NO (oxido nítrico) actua como relaxante muscular, podendo exercer os seus efeitos no esfíncter esofágico inferior, aumentando a probabilidade de ocorrer refluxo. 6 A acetilcolina, libertada pelo nervo vago, actua sobre o esfíncter esofágico inferior estimulando a sua contracção. Os fármacos anticolinérgicos podem bloquear este efeito, causando hipotensão sustentada deste esfíncter. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 197 APONTAMENTOS o Gravidez; o Ascites (hidropisia abdominal); o Utilização de roupas muito apertadas; o Atraso do esvaziamento gástrico. A exposição do epitélio estratificado esofágico ao conteúdo ácido do refluxo, encontrasse directamente relacionado com o dano infligido à mucosa esofágica. Isto porque as características epiteliais esofágicas não o preparam para suportar valores de pH inferior a 4, ao contrário do epitélio cilíndrico característico da mucosa gástrica, embora as células do epitélio esofágico, através da presença das tight junctions (junções apertadas) o proteja do refluxo. Por outro lado, no esófago ocorre produção de bicarbonato na porção basolateral das células, que neutraliza o pH ácido gástrico que possa eventualmente atingir a mucosa esofágica a esse nível, constituindo outro mecanismo de defesa. Quando existe comprometimento das contracções peristálticas, a clearance esofágica encontra-se também comprometida. Para além disso, o refluxo ácido para o esófago é neutralizado pela saliva. Como tal, o comprometimento da salivação também aumenta o tempo de exposição esofágica à acidez gástrica. 198 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 12.1. Esofágite de refluxo A esofagite de refluxo é uma complicação do refluxo. Desenvolve-se quando as barreiras naturais da mucosa esofágica não são capazes de contrariar as lesões causadas pela exposição ao ácido, pepsina e bílis. A esofagite moderada é caracterizada pela ocorrência de mudanças microscópicas da mucosa, com infiltração de granulócitos ou eosinófilos, com hiperplasia das células basais e elongação das pregas dérmicas. Na doença de refluxo não erosiva, as características visualizadas por endoscopia podem ser normais ou apresentar eritema. Já a esofagite erosiva, apresenta uma mucosa danificada, visualizada por endoscopia, com vermelhidão, a sangrar, friável, com úlcera linear à superfície e exsudados. A análise histológica revela infiltrados polimórficos e granulação dos tecidos. A estenose péptica é consequência da fibrose que leva à constrição do lúmen do esófago. Por outro lado, a estenose péptica tubular longa pode também ser resultado da entubação nasogástrica prolongada ou vómito persistente. A esofagite erosiva pode cicatrizar através da formação de metaplasia intestinal, produzindo uma condição designada por esófago de Barrett, constituindo um factor de risco para o desenvolvimento de adenocarcinoma (substituição de epitélio estratificado por epitélio cilíndrico). FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 199 APONTAMENTOS Factores que aumentam a pressão esofágica inferior Factores que diminuem a pressão esofágica superior - Secreção de glucagon; - Gastrina 7; - VIP – péptido intestinal vasoactivo; - Motilina; - Progesterona; - SP; - CKK - colecistonina; - Compostos resultantes da digestão de proteínas - Secretina; (alimentação). - Péptido inibidor gástrico; - Gorduras, chocolate, etanol. Mediadores que aumentam a pressão esofágica inferior Mediadores que diminuem a pressão esofágica superior - Agonistas α; - Antagonistas α; - Antagonistas β; - Agonistas β; - Simpaticomiméticos. - Serotonina. Fármacos que aumentam a pressão esofágica inferior Fármacos que diminuem a pressão esofágica superior Metoclopramida 8 (Primperan®), Domperidona 9 (Motilium®), Nitratos, Teofilina, Morfina, Meperidina, Diazepam, 10 Cisapride . Barbitúricos, Sildenafil, Nifedipina. 12.2. Sintomatologia • Regurgitamento de material ácido na boca; • Azia. A azia é produzida pelo contacto do refluxo com a mucosa esofágica ulcerada sensibilizada. Podem surgir sintomas semelhantes aos da angina ou dor no tórax atípica em alguns pacientes, causada pela estimulação do nervo vago. A disfagia (dificuldade a deglutir) persistente sugere o desenvolvimento de constrição péptica. A perda de peso rápido associado a disfagia, pode indicar o desenvolvimento de adenocarcinoma e esófago de Barrett. O sangramento ocorre como consequência da erosão da mucosa ou da presença de úlcera de Barrett. Quando ocorre refluxo para a faringe, laringe e árvore traqueobrônquica pode surgir tosse crónica, broncoconstrição, faringite, laringite, bronquite ou pneumonia. Muitos pacientes com refluxo gastroesofágico permanecem assintomáticos durante muito tempo, apenas procurando auxílio clínico quando as complicações severas ocorrem. 7 A hipercalcémia pode aumentar a produção de gastrina. 8 Aumenta a motilidade gastrointestinal ao inibir os receptores da dopamina (D2) libertada por neurónios inibidores localizados nos plexos murais. 9 Análogo da metoclopramida, desprovido de efeitos extrapiramidais, uma vez que não consegue atravessar a barreira hematoencefálica. 10 Parassimpaticomimético. Actua como agonista 5-HT4. Estimula os receptores serotoninérgicos, aumentando a libertação de serotonina no sistema nervosa entérico. 200 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 12.3. Diagnóstico Normalmente, diz-se que o doente tem uma doença de refluxo quando apresenta pirose, isto é, uma dor retroesternal, dispepsia com sensação de calor e ardor na parte inicial do aparelho digestivo, acompanhada de excessiva secreção salivar. Independentemente desta sintomatologia estar presente, existem técnicas que auxiliam o diagnóstico desta patologia. • Radiografia com ingestão de bário (fornece contraste); pHmetria • Manometria esofágica (registo da pressão); • pHmetria durante 24 horas; Colocação de um eléctrodo 2 a 3cm antes do esfíncter esofágico inferior. Ocorre depois a emissão dos dados relativos ao pH, permitindo o registo em gráfico durante 24h; Quanto maior for o período em que o pH é superior a 4, menor será a probabilidade de ocorrer refluxo esofágico. • Esofagogastroduodenoscopia (EGD): Realizado quando o paciente não responde bem ao tratamento ou apresenta sintomas alarmantes como: disfagia, anemia, sangue fecal, respiração asmática, perda de peso ou mudanças vocais. • Endoscopia; FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 201 APONTAMENTOS o • Avalia a presença de esófago de Barrett. Biopsias. 12.4. Tratamento 12.4.1. Tratamento não farmacológico Os principais objectivos do tratamento passam pelo alívio sintomático e cicatrização da esofagite erosiva, prevenindo desta forma as complicações. Existem algumas alterações comportamentais que devem ser adoptadas que beneficiam a evolução desta patologia. Nos casos de menor gravidade, deve proceder-se à redução do peso, dormir com a cabeceira da cama elevada cerca de 4 a 6cm, evitar deitar nas 2-3H subsequentes às refeições e eliminar os factores que aumentam a pressão abdominal (ex.: usar roupa apertada, etc.). Os pacientes devem evitar fumar e consumir alimentos ricos em gorduras, café, chocolate, álcool, hortelã, tomate, sumo de laranja e alguns medicamentos (ex.: fármacos anticolinérgicos, bloqueadores dos canais de cálcio e outros relaxantes dos músculos lisos). Deve ainda evitar-se a ingestão de grandes quantidades de alimentos e líquidos. 12.4.2. Tratamento farmacológico A existência de um pH baixo é a condição Grau de esofagite ideal para o desenvolvimento de refluxo. Quanto mais baixo for o pH, maior a gravidade do refluxo. O tratamento farmacológico passa essencialmente pela utilização diminuem gástrica. a A de fármacos produção eficácia de que ácido terapêutica inibem pela está ou mucosa então directamente relacionada com: o grau de supressão da acidez; duração da supressão durante 24h; e o tempo de tratamento em semanas. O fármaco ideal manterá o pH a valores superiores a 4, o máximo tempo possível. 202 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS A - Antiácidos • Foram os primeiros fármacos a ser utilizados na terapêutica do refluxo gastroesofágico; • Não constituem, actualmente, os fármacos de primeira escolha na terapêutica; • O seu mecanismo de acção passa pela neutralização do ácido secretado pelas células parietais para o lúmen gástrico, e inibição da pepsina, uma vez que esta é inactivada para valores de pH 7-8; • Devem ser administrados 1-3H após as refeições e ao deitar, ou de acordo com os sintomas; • Apresentam um início de acção rápido mas transitório, comprometendo a sua eficácia no tratamento desta patologia; • Pode ocorrer «efeito rebound11», isto é, aumento da produção de ácido com exacerbação da patologia; • Podem agravar ou desencadear lítiase renal; • Podem provocar hipercalcémia com consequente aumento da produção de gastrina e ácido gástrico; • A administração de sódio pode exacerbar os estados de insuficiência renal, insuficiência cardíaca congestiva e hipertensão; • As preparações líquidas ou em pó são mais eficazes que os comprimidos (os comprimidos podem ser mastigados); • A sua administração diminui a absorção de tetraciclinas, anticolinérgicos, cloropromazina e fósforo, podendo provocar osteomalácia; • Poderá eventualmente existir vantagem em pacientes que apresentem sintomas intermitentes, embora ainda não existem dados que comprovem isto; • As formulações cujo princípio activo é o bicarbonato de cálcio apresentam como reacção adversa obstipação. Já as formulações com hidróxido de alumínio ou hidróxido de magnésio causam obstipação ou efeitos laxativos, respectivamente. Estas reacções adversas levaram à produção de fórmulas 11 Efeito ricochete. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 203 APONTAMENTOS compostas por uma proporção adequada de hidróxido de magnésio com hidróxido de alumínio. No entanto, os efeitos transitórios mantêm-se, podendo mesmo ocorrer efeitos neurotóxicos e hipermagnesemia na insuficiência renal; • O tratamento com antiácidos é apenas sintomático e apenas recomendado para as situações de menor gravidade; • A administração de carbonato de cálcio pode induzir síndrome lactoalcalino12; • A administração de hidrogenocarbonato de sódio pode induzir alcalose sistémica, alterando a ligação às proteínas plasmáticas. Carbonato de cálcio, Hidrogenocarbonato de sódio, Hidróxido de alumínio + Hidróxido de magnésio B – Anti-histamínicos H2 • São análogos estruturais da histamina; • Inibem competitivamente os receptores H2 presentes nas células parietais do estômago, inibindo a secreção hidrogeniónica e consequente diminuição do pH gástrico; • Inibem não só a produção de histamina, mas também a produção de gastrina e acetilcolina; • Devem ser administrados ao deitar e se necessário ao pequeno-almoço; • São fármacos eficazes, mas que provocam fenómenos de tolerância acentuada que obrigam a aumentos sucessivos da dose, podendo ocorrer «efeito rebound», isto é, aumento da produção de ácido com exacerbação da patologia; • A cimetidina interage com o citocromo P450, inibindo a sua actividade. Consequentemente, este fármaco apresenta várias interacções com fármacos (ex.: anticoagulantes orais, benzodiazepinas, fenitoina, teofilina, propranolol); • Apresenta reversíveis), ainda efeitos podendo antiandrogénios provocar confusão (ginecomastia mental, e agitação e impotência coma insuficientes renais; 12 Sindrome lactoalcalino: cefaleia, anorexia, náuseas e vómitos, astenia, obstipação, dores abdominais, sede, poliúria. 204 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I em APONTAMENTOS • Estão descritos aumentos dos níveis de aminotransferases, creatinina e prolactina aquando da administração de cimetidina, para além de outros efeitos como: pancitopenia, neutropenia, anemia e trombocitopenia (raro, reversível); • A ranitidina, famotidina e nizatidina não inibem o citocromo P450 e, como tal, não apresentam interacções relevantes; • A ranitidina apresenta maior actividade que a cimetidina. Consequentemente o seu efeito inibidor da secreção gástrica é mais prolongado. Cimetidina (400mg 2 i.d.), Ranitidina (150mg 2 i.d.), Famotidina (20mg 2 i.d.), Nizatidina (150mg 2 i.d.) C – Inibidores das bombas de protões (PPI’s) • São os fármacos inibidores das secreções gástricas mais potentes actualmente existentes; • Actuam por inibição irreversível da bomba de protões, também designada por H+/K+ ATPase, presentes nas células parietais gástricas. • A bomba de protões corresponde à fase final da secreção gástrica ácida, sendo directamente responsável pela secreção de protões para o lúmen gástrico, tornando-se assim um alvo ideal para a inibição da secreção gástrica; • As refeições aumentam o n.º de bombas protões à superfície da membrana das células parietais; • Apresentam um rápido inicio de acção e um efeito terapêutico que se prolonga ao longo de 24 horas, devido à acumulação canalícular destes fármacos no FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 205 APONTAMENTOS interior das células parietais (quanto maior for a lipofília, maior será também a facilidade com que atravessam a membrana plasmática); • Promovem uma cicatrização mais rápida que os antagonistas H2. No entanto, como não existe uma ligação directa entre a cicatrização e a dor, esta diferença não apresenta grande significado clínico; • O risco de ocorrer recidivas é igual tanto nos PPI’s como nos antagonistas H2; • A inibição máxima da secreção ácida ocorre após 3 a 4 dias de administração (steady state); • Não apresentam fenómenos de tolerância; • São mais potentes que os anti-histamínicos H2; ACUMULAÇÃO CANALICULAR Plasma PPI’s Canalículos das células parietais PPI + H+ [PPI]H+ Sulfenamida H+, K+-ATPase + sulfenamida Estabelecimento de ligação dupla à bomba de protões! H+, K+-ATPase-S-S-sulfenamida • Ao aumentar o pH gástrico, estes fármacos diminuem a absorção de ferro e cetoconazol (antifúngico), promovendo a absorção de digoxina; • O Omeprazole aumenta os níveis de diazepam, carbamazepina, metotrexato, nifedipina, fenitoina e varfarina; • O Esomeprazol não interfere com a fenitoina e varfarina, podendo acelerar o metabolismo dos contraceptivos orais; • O Lansoprazol pode acelerar a metabolização dos contraceptivos orais; • O Rabeprazole não interfere com a fenitoina, varfarina, teofilina e diazepam, aumentando as concentrações plasmáticas de digoxina; 206 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS • Todos apresentam ligação extensiva às proteínas plasmáticas; Esomeprazol Lansoprazol Omeprazol Pantoprazol Rabeprazol 64-90 >80 40 77 52 Biodisponibilidade (%) Ligação às proteínas (%) 97 97 95 98 96 Semivida 1-1,5 1,5 0,5-1 1 1-2 Metabolização hepática + + + + + 50-70% 25% = = Cmáx Tmáx AUC Recomendação • 43-53% 50-70% = = = 1H antes da Antes da Antes da Independente da Independente refeição 13 refeição refeição refeição da refeição Deve ponderar-se a administração de omeprazole de libertação imediata ou de libertação retardada (ainda não está comercializado em Portugal). A concentração máxima atingida é maior na formulação de libertação imediata que na de libertação retardada. No entanto, nesta última é possível a manutenção de uma concentração mais regular ao longo do tempo; • O esomeprazol (enantiómero S do omeprazol) apresenta um perfil farmacocinético claramente superior ao obtido com o omeprazol. Esta diferença condiciona diferentes eficácias terapêuticas. Para além disso, estudos (pHmetria 24H) indicam que o esomeprazol permite manter o pH superior a 4 por um período de tempo mais longo. Durante a noite (2-4H da manhã) a 13 As refeições interferem bastante com a biodisponibilidade do Esomeprazole. O n.º de bombas de protões aumenta com as refeições, mas a alimentação dificulta a absorção destes fármacos, devendo optar-se pela administração antes das mesmas. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 207 APONTAMENTOS administração de omeprazol 20mg não consegue contrariar a descida do pH registada, podendo ocorrer refluxo. No entanto, este processo pode ser atenuado através da administração de esomeprazol, que impede a descida pronunciada do pH durante a noite; • O omeprazol e o esomeprazol atingem, normalmente, o steady state (inibição máxima) ao 5º dia. O rabeprazol e o lansoprazol actuam mais rapidamente, atingindo o steady state praticamente ao fim de três administrações; • Ao comparar os diferentes grupos de fármacos utilizados no tratamento desta patologia (antiácidos, anti-histamínicos H2 e PPI’s), verifica-se que os inibidores das bombas de protões são os mais eficazes; • Em indivíduos jovens, a instituição da administração de omeprazol no tratamento do refluxo gastroesofágico, constitui uma boa opção. No entanto, 208 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS em indivíduos idosos polimedicados, a melhor opção terapêutica passa pela administração de rabeprazol e esomeprazol, uma vez que estes apresentam menos interferências com outros fármacos. Omeprazol (20mg i.d.), Lansoprazole (30mg i.d.), Pantoprazole (40mg i.d.), Esomeprazole (40mg i.d.), Rabeprazole (20mg i.d.) 12.4.2. Optimização do tratamento do refluxo • Administração de dose matinal, 15 a 60 min antes da refeição; • Optar pela administração de dose dupla, antes do pequeno-almoço e antes do jantar; • Caso persistam os sintomas nocturnos, acrescentar anti-histamínicos H2 (em doentes refractários ao tratamento); • Existem casos de doentes refractários que tomam 80mg/dia de omeprazol; • O refluxo gastroesofágico pode tornar-se uma doença crónica incapacitante que quando não tratada, diminui consideravelmente a qualidade de vida; • Alguns pacientes podem ficar “dependentes” da administração de PPI’s, requerendo uma terapêutica de manutenção. Nestes casos, a melhor estratégia de manutenção é a utilização de um PPI em monoterapia14; 14 A dose recomendada de manutenção (20mg) é normalmente inferior à dose recomendada para o tratamento das fases agudas (40mg). FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 209 APONTAMENTOS • Por outro lado, existem pacientes que estabelecem uma terapêutica “on demand”, isto é, apenas iniciam a terapêutica quando surgem os sintomas. 210 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 13 – ÚLCERA PÉPTICA A úlcera péptica é definida como uma rotura na integridade da mucosa do estômago e/ou duodeno, tendo como consequência a instalação de uma lesão, normalmente de natureza crónica com inflamação activa. Trata-se de uma patologia caracterizada por uma fisiopatologia multifactorial não totalmente elucidada. Antes da descoberta da influência da infecção por Helicobacter pylori, insistiu-se durante muito tempo no esquema, apresentado abaixo, para definir possíveis estratégias terapêuticas da úlcera péptica. A máxima «sem ácido, não há úlcera» de Schwartz sintetiza a orientação que era dada à terapêutica desta patologia. Sabe-se, actualmente, que o efeito placebo exerce um papel importante na melhoria sintomática. Célula Parietal Produção e secreção de ácido Alvo dos PPI Ca2+ ATPase Gastrina cAMP M3 Acetilcolina H2 Histamina Endócrina Somatostatina Parácrina M1 neutro Somatostatina Gastrina Ca2+ PACAP – estimulação vagal (pituitary adenylate cyclase activating peptide) Célula enterocromafim FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 211 APONTAMENTOS Os receptores histamínicos H2 estão localizados na parte basolateral das membranas das células parietais localizadas no estômago. Estas células apresentam ainda receptores para a gastrina e acetilcolina (M3). No passado acreditava-se que os receptores da gastrina e da acetilcolina eram particularmente importantes para a secreção ácida. No entanto, há luz dos conhecimentos actuais, os receptores da gastrina presentes nas células parietais, estão mais relacionados com o crescimento destas células que com a secreção ácida. Os receptores da gastrina relacionados com a secreção gástrica encontram-se presentes nas células enterocromafins, localizadas nas glândulas gástricas da mucosa gástrica. Estas células podem ainda ser estimuladas por um neurotransmissor, PACAP, libertado em resposta à estimulação vagal. H. pylori A B J. Robin Warren (A) e Barry, J. Marshall (B), prémios Nobel da Medicina do ano 2005, pela descoberta da bactéria H. pylori e o seu papel na úlcera péptica e gastrites. Só recentemente foi descoberta a influência da infecção por H. pylori sobre os mecanismos protectores da mucosa contra a acidez gástrica. Sabe-se actualmente que 90% e 70% dos casos de úlceras duodenais e gástricas, respectivamente, são H. pylori positivas. O restante universo de casos de úlceras gástricas e duodenais devem-se, provavelmente, às lesões causadas pela administração de AINEs. A H. pylori estimula a produção de citoquinas e enzimas específicas que lesam o epitélio gástrico, registando-se uma desregulação dos mecanismos que controlam a produção de gastrina. Como consequência do aumento da produção de gastrina, a produção de ácido gástrico pelas células parietais é estimulada. Por outro lado, a administração de AINEs agride a mucosa 212 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS gástrica ao inibir a COX-1, com consequente diminuição da prostaglandina E2 (gastroprotectora) 15. As prostaglandinas possuem um papel central na defesa e reparação do epitélio gástrico, estando presentes em grandes quantidades na mucosa gástrica. Regulam a libertação de bicarbonato e muco, inibindo a secreção celular parietal, sendo importantes na manutenção do fluxo sanguíneo e reparação epitelial. A transmissão da H. pylori ocorre via oral-oral ou fecal-oral. A infecção encontra-se virtualmente associada a gastrites crónicas activas, mas apenas 10 a 15% dos indivíduos infectados desenvolvem ulceração péptica. Factores protectores Factores protectores Factores agressores H. pylori Ácido gástrico Pepsina AINEs Bicarbonato Prostaglandinas Produção de muco Fluxo de sangue para a mucosa NORMAL Factores agressores H. pylori Ácido gástrico Pepsina AINEs Bicarbonato Prostaglandinas Produção de muco Fluxo de sangue para a mucosa ÚLCERA 13.1. Sintomatologia Úlcera gástrica Úlcera duodenal Dor epigástrica que pode agravar com as refeições; Dor epigástrica 90min a 3h após as refeições; Anorexia, perda de peso, náuseas; Frequentemente nocturna; Aversão aos alimentos. Alivia com os alimentos ou antiácidos. A úlcera duodenal normalmente não evolui para um estado de neoplasía, ao contrário do que sucede com a úlcera gástrica. 13.2. Tratamento Actualmente, a estratégia terapêutica utilizada no tratamento das úlceras pépticas são: a erradicação da H. pylori, com diminuição da taxa de recidivas; e a evicção do contacto da mucosa com ácido e pepsina, acelerando os processos de cicatrização e diminuindo os sintomas. 13.2.1. Erradicação da H. pylori A terapêutica da úlcera péptica passa pelo controlo e erradicação da infecção por H. pylori. A erradicação da infecção conduz normalmente ao desaparecimento dos sintomas e eventual cura 15 O Misoprostol (CYTOTEC®) é um derivado metilado das prostaglandinas, absorvível por via oral, que apresenta efeitos antisecretores e preventivos da hemorragia gastrointestinal, diminuindo o tempo de cicatrização da úlcera duodenal e gástrica. No entanto, a sua administração está associada a efeitos adversos graves, entre os quais se destaca as suas propriedades abortivas. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 213 APONTAMENTOS da úlcera. Por outro lado permite diminuir dramaticamente o número de recidivas para 4% (contra 59% quando não existe erradicação) na úlcera gástrica e 6% (contra 67% quando não existe erradicação) na úlcera duodenal. Colocar-se-á então a questão: “Deverá ser realizada a erradicação da infecção por H. pylori na população em geral?”. Não. Apenas deve optar-se pela erradicação deste agente nos indivíduos com: infecção por H. pylori, úlcera péptica (gástrica ou duodenal), linfoma gástrico de MALT (mucosal-associated lymphoid tissue) e história familiar de carcinoma gástrico. A erradicação dos indivíduos com dispepsia sem úlcera com o intuito de prevenir o desenvolvimento de cancro gástrico ou a erradicação nos indivíduos com refluxo gastroesofágico permanece controversa16. O diagnóstico da infecção pode ser realizado através da execução de uma biopsia ou através do «teste de exalação da ureia», que se baseia na ocorrência de uma reacção catalizada por uma enzima bacteriana designada de urease. O teste segue os seguintes moldes: administração oral de ureia com carbono marcado (13C ou 14 C); caso a H. pylori esteja presente, dá-se uma reacção enzimática, catalizada pela urease, com hidrólise da molécula de ureia e libertação de CO2 marcado; posteriormente, o paciente sopra para um tubo sendo detectada a presença desta molécula. Encontra-se também disponível, para o diagnóstico, o teste de detecção de antigénios de H. pylori nas fezes, sendo rápido de executar e mais barato que o anterior, embora menos preciso. Não existem actualmente fármacos que quando administrados em monoterapia consigam eliminar a infecção. Como tal, é difícil de realizar a erradicação deste agente, uma vez que as terapêuticas actuais requerem o seguimento cuidadoso e rigoroso do tratamento, caracterizado pela administração de pelo menos três fármacos durante um período de 10 a 14 dias. A H. pylori consegue adaptar-se facilmente ao meio, dai a necessidade de cumprir escrupulosamente a terapêutica, evitando o aparecimento de resistências. O elevado número de tomas aumenta a probabilidade de ocorrer esquecimento e não adesão à terapêutica. 16 Existem estudos que defendem que a erradicação da H. pylori em indivíduos com refluxo poderá mesmo agravar a patologia. No entanto, ainda não existem dados concretos que permitam estabelecer conclusões. 214 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS Terapêutica tripla (10-14 dias) PPI(2x/dia) + Claritromicina + Amoxicilina PPI(2x/dia + Claritromicina + Metronidazol A terapêutica tripla permite erradicações na ordem dos 70 a 90%, existindo um ganho de 7 a 9% nas terapêuticas de 10 a 14 dias. As terapêuticas com amoxicilina são aconselhadas pois estão associadas ao desenvolvimento de menos resistências. Não administrar formulações que conjugam amoxicilina com ácido clavulânico, devido aos efeitos adversos associados (náuseas, vómitos, diarreia, entre outros) que aumentam a probabilidade de abandono da terapêutica por parte do paciente. É possível estabelecer uma terapêutica quádrupla como esquema inicial, sendo esta mais eficaz, mas mais difícil de ser cumprida devido ao elevado número de tomas durante o dia. Terapêutica quádrupla (10-14 dias) PPI + Bismuto 17 (4x/dia) + Metronidazol (3x/dia) + Tetraciclina (4x/dia) Para determinar a erradicação do agente, deve ser realizado uma monitorização serológica com determinação e quantificação dos níveis de anticorpos anti-H. pylori (IgG) presentes no organismo. Um aspecto de extrema importância no tratamento prende-se com a probabilidade de ocorrer desenvolvimento de estirpes resistentes aos antibióticos utilizados na terapêutica. Encontram-se descritas estirpes resistentes ao metronidazol, claritromicina, amoxicilina e tetraciclina. O aparecimento de resistências é a principal causa da falência da terapêutica, não sendo actualmente possível prever a resposta dos pacientes através da realização de análises de susceptibilidade dos agentes aos antibióticos in vitro. A percentagem de resistências é de 2-30% para a claritromicina e 15-66% para o metronidazol. A resistência a este último fármaco é mais comum nas mulheres, para as quais é comumente utilizado no tratamento de infecções vaginais. Recentemente surgiu um novo fármaco, a levofloxacina, uma quinolona eficaz na erradicação da H. pylori. 13.2.2. Bloqueadores da bomba de protões (PPIs) 17 Não estão comercializadas formulações medicamentosas de bismuto em Portugal. FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 215 APONTAMENTOS Os PPIs estão também indicados no tratamento da úlcera péptica. Para mais informações ver página 204. Omeprazol (20mg i.d.), Lansoprazole (30mg i.d.), Pantoprazole (40mg i.d.), Esomeprazole (40mg i.d.), Rabeprazole (20mg i.d.) A – Influência da metabolização nas terapêuticas com PPI A metabolização hepática dos PPIs segue vias diferentes conforme o fármaco em causa. O Omeprazol e o Esomeprazol são metabolizados principalmente pela CYP3A4, ao passo que o Pantoprazol é metabolizado principalmente pela CYP2C19. Já o Rabeprazol não é metabolizado enzimaticamente, ao passo que o Lansoprazol sofre metabolização quer com a CYP3A4 quer com a CYP2C19. As variações da actividade destas enzimas na população, condicionam muitas vezes os efeitos terapêuticos desejados. Como exemplo cita-se a existência de indivíduos com perfis de metabolização lenta ou rápida. Os «metabolizadores rápidos» apresentam perfis de concentração de fármaco ao longo do tempo inferiores aos «metabolizadores lentos». Desta forma, a erradicação da H. pylori estará comprometida, uma vez que não existe concentração sanguínea de fármaco suficiente para a instituição de uma terapêutica adequada. Nestes casos, a utilização de Rabeprazol seria ideal, uma vez que este fármaco não é metabolizado por via enzimática, não sofrendo com a variabilidade genética. 216 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS A existência de polimorfismos constitui, como tal, uma causa da falha da terapêutica nesta patologia. O polimorfismo da CYP2C19 condiciona também a cicatrização nos casos de esofagite. 13.2.3. Antiácidos Os antiácidos estão indicados no tratamento da úlcera péptica. Para mais informações ver página 202. Carbonato de cálcio, Hidrogenocarbonato de sódio, Hidróxido de alumínio + Hidróxido de magnésio 13.2.4. Anti-histamínicos H2 Os antiácidos estão indicados no tratamento da úlcera péptica. Para mais informações ver página 203. Cimetidina (400mg 2 i.d.), Ranitidina (150mg 2 i.d.), Famotidina (20mg 2 i.d.), Nizatidina (150mg 2 i.d.) 13.2.5. Citoprotectores 13.2.5.1. Sucralfato (Ulcermin®) O sulcralfato é um sal complexo de sacarose, Al(OH)3 e Al2(SO4)3. Uma vez no estômago/duodeno forma uma pasta viscosa que reveste as mucosas, protegendo-as das secreções ácidas, embora não apresente capacidade inibitória FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I 217 APONTAMENTOS ou neutralizadora da acidez gástrica. Como tal, o seu mecanismo de acção passa pela criação de uma barreira físico-química, ocorrendo ligação do anião sulfato às proteínas presentes na cratera ulcerosa. Apresenta ainda um efeito trópico ao estabelecer ligação com factores de crescimento, promovendo o aumento da síntese de prostaglandinas, aumento da secreção de muco e bicarbonato, e aumento da defesa e reparação da mucosa. Trata-se de um fármaco eficaz no tratamento da úlcera duodenal, administrado 1H antes de cada refeição e ao deitar (4x/dia), não devendo ser associado a antiácidos na meia-hora que antecede e na que se segue à sua administração. O efeito adverso mais frequente é o aparecimento de obstipação, devendo ter-se em atenção o risco de neurotoxicidade pelo alumínio nos casos de insuficiência renal. Para além disso, parece interferir com a absorção de anticoagulantes orais, cimetidina, digoxina, tetraciclinas e difenilhidantoína. 13.2.5.2. Análogos das prostaglandinas Estes fármacos permitem manter a integridade da mucosa e a sua reparação. O mecanismo de acção passa pela prevenção das lesões erosivas induzidas pelos AINEs, aumento do fluxo sanguíneo local, efeito anti-secretor, e aumento da secreção do muco e bicarbonato. O efeito adverso mais frequente é a indução de diarreia. No entanto, estes fármacos podem induzir hemorragias e contracções uterinas existindo risco de abortamento. Como tal, a sua utilização está contra-indicado na gravidez. Misoprostol (200μg 4 i.d., durante 4 a 6 semanas, no tratamento daúlcera péptica; ou 200μg 2-4 i.d. na prevenção de lesão causada pela administração de AINEs) 13.2.6. Anticolinérgicos São antagonistas selectivos dos receptores muscarínicos (M1) presentes nas células parietais da mucosa gástrica. Apresentam um interesse limitado devido aos efeitos secundários (secura dos olhos e da boca, visão enevoada, retenção urinária) associados à sua administração. Pirenzepina e Telenzepina (Não estão disponíveis em Farmácia Comunitária) 218 FISIOPATOLOGIA E FARMACOTERAPIA I APONTAMENTOS 13.2.7. Úlcera, AINEs e hemorragias gastrointestinais Dose Risco associado <300mg 2,4 (1,8-3,3) 300mg 3,3 (1,2-9,0) 1200mg 6,4 (2,5-16,5) A utilização dos AINEs encontra-se actualmente muito difundida. Dados apontam que a prescrição deste grupo de fármacos está a aumentar, consequência provável do envelhecimento populacional associado ao aumento do número de casos de patologias ósseas e cardiovasculares. Estudos indicam, que mesmo as terapêuticas que utilizam AINEs em doses inferiores a 100mg, apresentam risco de hemorragia. Como tal, podemos então definir os riscos de úlcera inerentes à utilização de AINEs: idade, doenças cardiovasculares, utilização de AINEs em doses elevadas ou múltiplas, coadministração de aspirina em baixas doses, como anti-agregante plaquetário, com outros fármacos anti-agregantes, e utilização concomitante de corticosteróides e varfarina. As estratégias definidas no tratamento das lesões gástricas ou duodenais, induzidas por AINES, são apresentadas na tabela abaixo. Grupo Estratégia Baixo risco AINEs de menor risco para o tubo digestivo na mais baixa dose Risco intermédio Risco elevado Risco muito elevado AINEs + PPI ou Misoprostol Inibidor da COX-2 Inibidor da COX-2 + PPI Evitar AINEs Inibidor da COX-2 + PPI Indivíduos com sangramento, vasos visíveis, coágulos, entre outras características (detectadas por endoscopia), devem ser sujeitos a monitorização do pH durante 24H. Este grupo de pacientes deve ser tratado através da administração endovenosa continua (2-3 dias) de infusão de PPIs em soro fisiológico (ex.: administração endovenosa de 80mg de PPIs em 30 minutos e posterior infusão de 40mg de omeprazol em 100mL de soro fisiológico à razão de 20mL/H). Esta estratégia permite manter o pH superior a 6, diminuindo o risco de recidivas. 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