Ao trabalhar questões socioambientais e o conceito de natureza

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Ao trabalhar questões socioambientais e o conceito de natureza, podemos estar
investigando a noção de natureza que os alunos constroem ou construíram em suas
experiências e vivências.
Alguns alunos de EJA, ao observarem essa paisagem que retrata uma parte da
cidade de Brasília, a identificam e a relacionam com o conceito de natureza. Ao
explicitarem o motivo da escolha, estabelecem nexos e relação com esse conceito,
considerando a cor; e a partir dela, fazem algumas associações, tais como: a maioria das
plantas é verde, plantas fazem parte da natureza. Portanto, vêem e identificam a natureza
com essa imagem.
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Ao considerar e ao explicitar a representação feita, nota-se sua lógica e o que levou
o aluno a tal escolha. A partir dela, o professor pode chegar a algumas deduções ou
hipóteses, entre elas: por que ao procurar relacionar a imagem com o conceito, num
primeiro momento, alguns alunos relacionam e associam o conceito de natureza com a cor
e com o que aparece mais visível em primeiro plano na paisagem? Num segundo momento,
é preciso buscar novas explicações, tais como: por que esses alunos deixaram de observar
as formas geométricas lineares existentes na paisagem? Por que não foi observado o
conjunto de elementos construídos e modificados pelas pessoas que compõem a imagem e
aparecem em segundo plano (edifícios, calçadas, vias de circulação, guias, etc)? Por que
realizam apenas uma leitura parcial da paisagem? Que ações podem ser desenvolvidas para
que os alunos realizem uma leitura mais ampla dos elementos que aparecem representados
e distribuídos nessa paisagem? De que maneira o trabalho que realizo pode contribuir para
que os alunos relacionem alguns temas ou conceitos específicos da Geografia com o que
observam em imagens ou na paisagem?
O professor de EJA precisa conhecer muito bem o material que pode utilizar e suas
funções no processo de ensino-aprendizagem. Pode-se aplicar um mesmo recurso de várias
maneiras, para contextualizar diferentes temas ou conceitos, nas mais variadas situações.
Em outro projeto, tendo como recurso didático um mapa político do Brasil,
podemos estar levantando informações sobre o conhecimento prévio (noções) que os alunos
têm sobre os conceitos de território, territorialidade e espacialidade e ao mesmo tempo
possibilitar a análise e o estudo dessas diferentes categorias teóricas.
Antes de apresentar o mapa com os limites políticos, podemos solicitar que os
alunos elaborem uma lista com o nome do conjunto de Estados que formam o nosso país.
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Deve-se observar, logo no início, se há alunos com dúvidas e inseguros com relação
ao que estão listando. Para muitos, esses conceitos ainda não estão definidos. E, portanto,
não têm certeza se o que estão listando é realmente o nome de um Estado, se é o de uma
cidade qualquer ou de um município, se é nome de uma capital. Pode até mesmo aparecer
na listagem nome de bairros (distritos) ou do lugar onde moram.
Na primeira listagem, pode-se identificar que as cidades de Palmas (TO) e de Belém
(PA) aparecem listadas juntamente com o nome de alguns Estados mais conhecidos do qual
esses alunos têm alguma noção.
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Na segunda listagem, podemos identificar uma listagem com maior número de
Estados. Aparecem também os nomes de algumas cidades principais (capitais), tais como:
Aracaju (SE), Maceió (AL), Recife (PE) e novamente Belém (PA). Porém, o que chamou
mais a atenção foi a presença da cidade de Brasiléia, do Estado do Acre, aproximadamente
a 50 quilômetros de Xapuri. Isso demonstra a identidade que um dos alunos tem com esse
lugar, listando-o. Nesse exemplo, pode-se notar a noção de territorialidade, da importância
do lugar para esse aluno, que talvez tenha vivido naquela cidade e das representações que
ele faz sobre esse lugar, que, dentro do território brasileiro, tem para ele significado e
expressão, demonstrando também a percepção empírica que esse aluno construiu sobre o
território.
A leitura geográfica do espaço está sempre impregnada de significados que nascem
da percepção que se tem sobre um determinado lugar. A partir dessa representação ligada
ao senso comum, deve-se iniciar uma reflexão dialogada com os alunos para construir o
conceito de território e de territorialidade. Dessa forma, o professor está valorizando os
fatores culturais da vida cotidiana, permitindo compreender ao mesmo tempo a
singularidade e a pluralidade dos lugares no mundo.
A partir da primeira listagem, é fundamental que o professor comente sobre as
dificuldades comuns que apareceram nos diferentes grupos da classe, registre ou destaque
as dúvidas que os alunos levantavam no processo de elaboração da lista em relação às
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categorias trabalhadas, e aproveite para contextualizar esses conceitos junto com os alunos,
a partir da própria listagem elaborada por eles.
Na seqüência, podemos solicitar que os alunos representem espacialmente, num
mapa político do Brasil em branco, apenas com os limites territoriais representados, o
conjunto de Estados que foram listados.
As representações espaciais das informações listadas permitem novas reflexões e
outras hipóteses sobre as noções de espacialidade que os alunos elaboram ao longo de suas
vivências.
No primeiro mapeamento, apesar de apenas dois Estados (Minas Gerais e Bahia)
estarem corretamente localizados em seus respectivos territórios, é importante observar
algumas noções de espacialidade que estão presentes no mapeamento realizado por esse
grupo de alunos: os Estados de São Paulo e do Rio de Janeiro aparecem no território do
Amazonas e do Mato Grosso respectivamente, mas é interessante observar como os alunos
mantiveram a noção de vizinhança entre esses Estados. A noção de pertencer a um mesmo
território está presente quando localizam espacialmente a cidade de Recife e o estado de
Pernambuco. Eles têm conhecimento que existe uma relação entre o estado de Pernambuco
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e o município de Recife, apesar de representarem cada um num território, mantiveram a
proximidade entre eles.
No segundo mapeamento, apesar de nenhum Estado aparecer corretamente
localizado, a noção de região está presente, principalmente em relação ao conjunto de
Estados que formam a região Nordeste de nosso país. Podemos observar que os Estados da
Paraíba, da Bahia, do Rio Grande do Norte, do Ceará e de Pernambuco foram mantidos
próximos entre si, formando quase a região geográfica do Nordeste brasileiro. Algumas
noções de vizinhança e de proximidade foram mantidas, como na representação do Estado
do Ceará, que aparece centralizado, vizinho aos Estados da Paraíba, do Rio Grande do
Norte e de Pernambuco. O Estado da Bahia foi representado distante do Estado do Ceará;
na realidade, esses Estados não fazem limites entre si.
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No terceiro mapeamento, apesar de aparecer um número maior de Estados
corretamente localizados, podemos perceber que a noção de região ainda é parcial, ou seja,
nenhum Estado da região Sul foi representado espacialmente e nem localizado no mapa; a
Amazônia apareceu como um Estado da região Norte, indicando que eles têm uma noção
da palavra, mas não do conceito que ela representa. Novas situações devem ser criadas,
para que o grupo tenha oportunidade de rever os conceitos de território, de Estado e de
capitais ou cidades principais, e também de rever conceitos em relação à localização de
alguns Estados que não foram representados (Ceará, Espírito Santo, Santa Catarina, Paraná,
Rio Grande do Sul) ou dos Estados que foram inseridos em outros territórios (Amapá, Rio
Grande do Norte, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e Tocantins).
Considerando as diferentes etapas no processo desse trabalho, devemos reconhecer
a importância das atividades na construção de novos significados e da resignificação dos
conhecimentos que os alunos trazem para essas novas aprendizagens, a necessidade de boas
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interferências do professor e o papel dos conceitos e dos conteúdos, no processo de ensinoaprendizagem.
Atualmente, é possível observar as modificações que têm ocorrido, principalmente
no significado dos conceitos e dos conteúdos referentes à proposta dos PCN no ensino de
Geografia. Pelos PCN, percebemos que não basta tomar como referência apenas a
memorização de conceitos e promover atividades simples de localização ou pintura de
mapas e suas respectivas legendas, mas também incluir propostas contextualizadas e
dotadas de relevância social do ponto de vista dessa área de conhecimento, levando o aluno
de EJA a não ser apenas um mapeador, mas que se torne um mapeador consciente, leitor e
usuário de mapas, buscando construir novos significados em seu cotidiano.
O que esses questionamentos podem indicar ao professor? Para alcançar uma
compreensão mais ampla do que seja um território, ele deve aprofundar e construir o
conceito das diferentes categorias, tais como: Estado, município, cidade e área urbana,
campo e área rural, distrito e subdistrito, região, região metropolitana, país e nação.
Para ampliar as atividades e sistematizar os conceitos e conteúdos trabalhados, o
professor pode indicar uma pesquisa no atlas geográfico ou de um mapa político do Brasil e
criar oportunidades para os alunos completarem ou corrigirem a listagem inicial,
observarem a distribuição espacial e a localização dos diferentes Estados brasileiros e
realizarem um novo mapeamento. Além disso, o professor precisa dialogar, propor
pesquisas sobre o processo de formação territorial do país e sobre o significado das
diferentes categorias espaciais que estão relacionadas com o conceito de território.
Ao trabalhar com o atlas geográfico, o professor deve aproveitar a oportunidade
para trabalhar com diferentes procedimentos: uso do índice (diferenças do tamanho e cor
das palavras – itens e subitens, coleção de mapas em diferentes escalas, seqüências, mapas
gerais e de detalhes), utilizar o índice alfabético para procurar o nome de uma cidade,
Estado ou país e como encontrar a página e o mapa onde fica o lugar que se quer localizar,
com as divisões e subdivisões das áreas continentais, reconhecer os elementos principais de
um mapa (título, legendas simples e complexas, escala – proporções distintas, toponímia –
associar tamanho e forma de letras às diferentes classes de territórios, reconhecer limites e
divisões do território, identificar os elementos naturais representados), entre outros.
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Antes ou depois do projeto de trabalho com a representação espacial e com as diferentes
categorias de território, pode-se trabalhar com um projeto sobre o lugar de origem dos
alunos e desenvolver um conjunto de atividades significativas tais como: elaboração de um
quadro para organizar informações sobre o lugar de origem dos alunos da classe; a partir
dos dados obtidos pode-se realizar a representação gráfica dessas informações e fazer uma
interpretação coletiva do gráfico; pode ser feita uma classificação do lugar de origem, ou
seja, se era de uma área rural ou urbana; em seguida podem ser levantados alguns os
motivos dos deslocamentos realizados (campo – cidade, cidade – cidade), os fluxos de
pessoas e os meios de transportes para esses deslocamentos. O conjunto de informações
levantadas sobre as diferentes realidades existentes na sala de aula pode ser representado
espacialmente através de um mapa de fluxos.
Percebemos que existem diversas possibilidades e formas para elaborar um projeto,
porém, ao se encaminhar um projeto de trabalho, é importante refletir sobre os vários
aspectos da organização desses projetos junto com os alunos.
Como um projeto de Geografia surge dentro da sala de aula? Trata-se de um assunto
polêmico entre os educadores. Alguns acham que o tema deve partir do interesse dos
alunos, enquanto outros acreditam que o professor deve propô-lo. Essa polêmica muita
vezes não leva em conta que a principal característica do trabalho com projetos não é a
origem do tema, mas o tratamento que se dá a ele.
O trabalho com projetos de Geografia deve ficar reduzido a um só tema? Pelo
processo de trabalho, percebemos que a discussão sobre o projeto não deve se restringir ao
estudo de um só tema, pois o elemento central desse processo é a resolução de problemas, a
qual deve possibilitar diferentes formas de análise dos problemas: a reflexão sobre eles e
sua interpretação, assim como a crítica e a avaliação dos alunos. Vê-se que os problemas,
ou a temática, podem surgir do professor, do grupo de alunos ou do próprio contexto social.
O trabalho com um projeto em Geografia deve durar quanto tempo? Como podemos
perceber, existem várias propostas de projetos com diferentes ritmos e etapas de duração
(curta, média ou longa). Enfim, o trabalho deve ser dinâmico, repensado e reconstruído
continuamente. Num projeto deve haver flexibilidade no uso do tempo e dos espaços
escolares e momentos de redimensionamento do trabalho e das atividades. É importante
levar em conta a atuação e um conjunto de intenções do professor com relação:
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§
ao planejamento do que pretende trabalhar e objetivos que pretende alcançar;
§
à antecipação de problemas que podem aparecer durante a realização das atividades
(grupos que terminam primeiro, dúvidas sobre procedimentos, entre outros aspectos);
§
aos desafios e questões polêmicas que irá propor no começo, durante e no fim das
etapas do processo de trabalho junto com os alunos;
§
à melhor forma de trabalho, os momentos que devem ser individuais, os que devem ser
realizados em pequenos grupos e os momentos coletivos, de socialização com todos os
alunos;
§
a fazer uma previsão quanto ao tempo de trabalho; se, para realizar um conjunto de
atividades seqüenciadas, são necessárias duas ou mais aulas, quais serão os momentos de
interrupção e socialização do trabalho, em que momentos os alunos vão reelaborar as
atividades etc.;
§
à seqüência, que deve ser pensada em termos de nível de abordagem e de
aprofundamento em relação ás possibilidades dos alunos.
Todas as áreas de conhecimento devem aparecer em um projeto ou apenas a Geografia
deve realizar o seu próprio projeto?
É necessário compreender que um projeto busca estabelecer ligações entre vários
pontos de vista, contemplando uma pluralidade de dimensões. Há várias formas de se
chegar a um conhecimento, e o projeto de Geografia deve garantir a flexibilidade e a
diversidade da experiência educativa, compartilhado e construído conjuntamente com as
outras áreas de conhecimento presentes no espaço escolar.
Uma escola, ao refletir sobre gestão do espaço e dos mitos presentes nos discursos e
ações referentes aos problemas ambientais e as falsas representações existentes sobre a
relação sociedade-natureza, elaborou um projeto de trabalho que integrou diferentes áreas
de conhecimento.
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