Tribunal de Contas do Estado do Pará RESOL UÇÃO Nº. 17.424 (Processo nº. 2007/50433-7) Assunto: Consulta formulada pelo Sr. LUIZ ROBERTO DOS REIS JUNIOR, Analista de Controle Externo desta Corte de Contas Proposta de decisão: Auditor EDILSON OLIVEIRA E SILVA Lavratura da decisão: Conselheiro NELSON LUIZ TEIXEIRA CHAVES (§ 2º do art. 195 do Regimento) EMENTA: Consulta. Contrato de Terceirização de Serviços de Natureza Contínua. Possibilidade de prorrogação. Possibilidade da Administração Pública contratar com pessoa física para terceirização de serviços da mesma natureza. Aplicação dos artigos 24, incisos I e II, e 57, inciso II, da Lei 8.666/1993. Relatório do Exmº. Sr. Conselheiro EDILSON OLIVEIRA E SILVA: Processo nº. 2007/50433-7 O presente processo trata de CONSULTA formulada pela 3ª Controladoria de Controle Externo deste Tribunal de Contas, formulada por Analistas de Controle Externo, pelo então Chefe da Seção de Auditoria, em exercício, e pelo Controlador da 3ª CCE, que, conjuntamente firmam a consulta, como se verifica na fl. 1. A Consulta compreende duas questões relativamente a Contratos de Terceirização de Serviços de Natureza Contínua; se, advindos de dispensa de licitação, poderão ser prorrogadas após atingido o limite da dispensa respectiva, ou, se poderão ser celebrados com pessoas físicas. A Consultoria Jurídica, por solicitação do então Diretor do Departamento de Controle Externo, em exercício, manifestou-se sobre a matéria objeto da consulta, tecendo comentários nas fls. 04 a 08, que passo a ler como parte integrante deste. É o Relatório. Jurisprudência do TCE-Pará http://www.tce.pa.gov.br Pág. 1 Tribunal de Contas do Estado do Pará V O T O: Após abordagem da matéria, a Consultoria responde às questões, discriminadamente, nas fls. 09 a 14, nos seguintes termos : “De posse das informações ao norte elencadas, retornamos à consulta formulada, respondendo separadamente aos dois questionamentos, conforme abaixo se segue, ressaltando, ainda, que a matéria em análise pode suscitar opiniões diversas, o que é uma característica natural do direito. 1. Contratos de terceirização de serviços de natureza contínua advindos de dispensa de licitação nos termos do art. 24, I e II da Lei n° 8.666/93, poderão ser prorrogados após atingido o limite da dispensa respectiva? O art. 24, incisos I e II da supracitada lei assim prescreve: "Art. 24. É dispensável a licitação: I – para obras e serviços de engenharia de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a" do inciso I, do artigo anterior, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ao ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente; II – para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II, do artigo anterior, e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compras ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez. ...” Há primeiro que se destacar não haver impedimento legal à prorrogação dos contratos sobrevindos de dispensa de licitação nos moldes do art. 24, incisos I e II, da Lei n° 8.666/93. Jurisprudência do TCE-Pará http://www.tce.pa.gov.br Pág. 2 Tribunal de Contas do Estado do Pará Caso houvesse, viria ele expressamente previsto, como ocorre no caso de dispensa por emergência ou calamidade pública, disposto no inciso IV, do mesrno dispositivo legal. Devemos, ainda, considerar que o legislador, ao prescrever os incisos I e II do art. 24, fixou um limite tendo em vista a relevância econômica da contratação ser de tal monta que não justificaria gastos com uma licitação comum. No entanto, se o serviço se caracteriza como de natureza contínua, pressupõe-se a permanência da necessidade pública a ser satisfeita. Assim, a previsão de seqüência é evidente. A Administração tem conhecimento de que o serviço irá prolatar-se no tempo uma vez que é ele indispensável. Marçal Justen Filho, assim se posiciona sobre o tema: “...é perfeitamente válido (eventualmente obrigatório) promover fracionamentos de contratações. Não se admite, porém, que o fracionamento conduza à dispensa de licitação. É inadmissível que se promova dispensa de licitação fundando-se no valor da contratação que não é isolada. Existindo pluralidade de contratos homogêneos, de objeto similar, considera-se o seu valor global – tanto para fins de aplicação do art. 24, incs. l e II, como relativamente à determinação cabível de licitação... Significa que, sendo previsíveis diversas aquisições de objetos idênticos, deve considerar-se o valor global. A regra subordina a Administração a prever todas as contratações que realizará no curso do exercício. Não se vedam contratações isoladas ou fracionadas proíbese que cada contratação seja considerada isoladamente, para fim de determinação do cabimento de licitação ou da modalidade cabível. Se a contratação superveniente derivar de evento não previsível, porém, nenhum vício existirá em tratar-se os dois contratos como autônomos e dissociados. " Jurisprudência do TCE-Pará http://www.tce.pa.gov.br Pág. 3 Tribunal de Contas do Estado do Pará Desta forma, por todo o acima exposto, filiamo-nos ao entendimento de que a prorrogação dos Contratos de Terceirização de serviços de natureza contínua, advindos de dispensa de licitação nos termos do art. 24, incs. I e II, da Lei de Licitações é possível caso sejam respeitados os limites ali estabelecidos. Não há, portanto, possibilidade de prorrogação após atingidos esses limites justamente por estarem os contratos a eles adstritos. Superá-los, a nosso ver, configuraria burla aos princípios norteadores da licitação. Diferente seria se tais serviços tivessem decorrido de processo licitatório, onde houvesse ocorrido a previsão de superação do limite previsto para a modalidade; aí sim, entendemos ser perfeitamente viável a prorrogação, conforme já mencionado. 2. Contratos de terceirização de serviços de natureza contínua nos termos do art. 57, II, Lei n° 8.666/93, poderão ser celebrados com pessoas físicas? O supracitado dispositivo, assim dispõe: "Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos: II – à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a Administração, limitada a sessenta meses. ...” Quanto à celebração de contratos com pessoas físicas, acreditamos, a uma primeira análise, não haver óbice a sua formalização, uma vez que a Lei n°. 8.666/93, em vários dispositivos, prevê essa possibilidade. Assim é quando o art. 6°, da Lei n°. 8.666/93, ao definir a pessoa do contratado, em seu art. XV, o faz como sendo "a pessoa física ou jurídica signatária de contrato com a Administração Pública.” Jurisprudência do TCE-Pará http://www.tce.pa.gov.br Pág. 4 Tribunal de Contas do Estado do Pará O art. 28 do mesmo diploma legal, ao dispor sobre a habilitação jurídica, dispõe: "Art. 28. A documentação relativa à habilitação jurídica, conforme o caso, consistirá em: I – cédula de identidade... " Da mesma forma, o art. 29 da Lei de Licitações, prescreve: "Art. 29. A documentação relativa à regularidade fiscal, conforme o caso, consistirá em: I — prova de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Geral de Contribuintes (CGC) ... " Por fim, o art. 55, ao prever as cláusulas necessárias aos contrato, estabelece em seu parágrafo 2°, in verbis: Art. 55. São cláusulas necessárias cm todo contrato as que estabeleçam: ... § 2º Nos contratos celebrados pela Administração Pública com pessoas físicas ou jurídicas, inclusive aquelas domiciliadas no estrangeiro, deverá constar necessariamente cláusula que declare competente o foro da sede da Administração para dirimir qualquer questão contratual, salvo o disposto no § 6° do art. 32 desta Lei. Verifica-se, portanto, que plenamente viável a execução de prestações através de pessoa física. A consulta, no entanto, tem por finalidade obter um esclarecimento determinado acerca da celebração de contratos terceirizados de natureza contínua com pessoas físicas, nos termos do art. 57, II, da Lei n° 8.666/93. Define-se serviço como toda a atividade que se destina a obter determinada utilidade de interesse para a Administração. O contrato de prestação de serviço de forma contínua, caracteriza-se pela impossibilidade de sua interrupção ou suspensão, sob pena de acarretar prejuízos ou danos Jurisprudência do TCE-Pará http://www.tce.pa.gov.br Pág. 5 Tribunal de Contas do Estado do Pará insuperáveis. Desta forma, certos contratos, dada a necessidade de sua continuidade, podem ser prorrogados ou estendidos, para além do exercício do crédito orçamentário. Conforme anteriormente visto, a contratação de serviços de terceiros pelos órgãos e entidades da administração pública está subordinada ao disposto na Lei de Licitações e Contratos Administrativos, sendo que a ampla possibilidade de contratação desses serviços vem evidenciada no inciso II, do art. 6°, que contém lista de caráter exemplificativo dos serviços cuja administração publica deva, preferencialmente, transferir a terceiros, mediante contrato. Parece-nos que a princípio, em conseqüência da extensa lista de atividades cuja execução os órgãos públicos podem legalmente transferir à iniciativa privada, mediante contratação de serviços, e considerando, igualmente, a possibilidade de a administração exercer tal opção pela execução indireta também em relação a outras atividades-meio não expressamente elencadas, seria de bom alvitre indagar que parâmetros podem servir à identificação de áreas ou atividades não transferíveis à iniciativa privada. Tal distinção merece apreciação uma vez que sem ela chegaríamos ao entendimento de que todas as atividades da administração poderiam ser terceirizadas por completo, o que, certamente, caracterizaria fraude à disciplina constitucional para o provimento de cargos na administração pública, assentada na livre acessibilidade e na seleção mediante concurso. Assim, devemos levar em consideração alguns pontos para a fixação de limites à terceirização na administração pública. O primeiro deles reside na exclusão da possibilidade de terceirização da própria atividade-fim do órgão da administração. Excetuados os serviços públicos objeto de concessão, os órgãos públicos não podem delegar a terceiros a execução integral de atividades que constituem sua própria razão de ser. No que diz respeito às atividades-meio, entendemos que a contratação deve obedecer a algumas limitações, posto que a existência de cargos permanentes no quadro Jurisprudência do TCE-Pará http://www.tce.pa.gov.br Pág. 6 Tribunal de Contas do Estado do Pará funcional do órgão ou entidade excluiria, a um primeiro momento, a viabilidade de execução indireta de algumas atividades. Um terceiro ponto impeditivo de execução indireta de atividades próprias dos órgãos e entidades públicas reside no exercício do poder de polícia e na prática de atos administrativos em geral. No dizer de Maria Sylvia Zanella di Pietro, o poder de polícia é "a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em beneficio do interesse público". No exercício do poder de polícia, cabe ao agente promover tal limitação exclusivamente em virtude da lei, cumprindo o poder-dever de assegurar o respeito à mesma, fiscalizar a sua observância pelos cidadãos, impedir sua transgressão e, quando for o caso, aplicar as sanções cabíveis. Ato administrativo, ainda nas palavras de Maria Sylvia Zanella di Pietro, consiste na "declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle do Poder Judiciário". A representação do Estado, nesse caso, depende de capacidade e competência. Desta forma, a prática de atos administrativos demanda seja o sujeito do ato competente para tal. Esta competência, via regra outorgada mediante lei formal, não admite a transferência contratual a pessoas estranhas à administração pública, sendo insuscetíveis de execução indireta, ainda que sejam tidas como atividade-meio em relação às finalidades do órgão público. Delimitadas, portanto, as atividades que não podem ser objeto de transferência a terceiros, fica mais fácil analisar a questão específica dos contratos de prestação de serviços realizados pela administração pública e pessoas físicas. Nenhum impedimento existe, conforme já visto, de a administração pública celebrar contratos com pessoas físicas. A Lei assim o permite. Nesse diapasão, entendemos igualmente não haver fato impeditivo de a administração realizar contratos de prestação Jurisprudência do TCE-Pará http://www.tce.pa.gov.br Pág. 7 Tribunal de Contas do Estado do Pará de serviços de natureza contínua com pessoas físicas nos termos do art. 57, II, da Lei de Licitações. Aqui também não há vedação expressa a esse respeito. No entanto, os órgãos e entidades da administração pública devem considerar os aspectos acima declinados quanto à possibilidade de tais serviços poderem ser transferidos a terceiros sem que se constituam em atos irregulares. Deve, portanto, a administração cercar-se de cuidados no que concerne à determinação de serviços a serem terceirizados, posto que, a nosso ver, não poderão ser ele relacionados às atividades-fim dos órgãos e entidades públicas, bem como, não poderão ser adotados para o exercício de atividades pertinentes a atribuições de cargos efetivos próprios de seus quadros, nem para funções que impliquem no poder de polícia ou na prática de atos administrativos. E o parecer. S.M.J.” Ante o exposto, acolho a manifestação da Consultoria Jurídica como resposta deste Plenário às questões objeto deste processo. R E S O L V E M os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Pará, unanimemente, com fundamento no art. 26, inciso IX, da Lei Complementar nº. 12, de 09 de fevereiro de 1993, responder a presente consulta nos termos da proposta de decisão do Auditor, transcrito na íntegra. Plenário “Conselheiro Emílio Martins”, em 25 de setembro de 2007. Jurisprudência do TCE-Pará http://www.tce.pa.gov.br Pág. 8