Calendário de 2006

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Dilemas Gramaticais
Dificuldades enfrentadas pelos usuários de língua materna concernentes ao emprego de
determinadas formas verbais consideradas próprias da língua viva causam dores na cabeça - e/ou de
cabeça - de qualquer cidadão.
Quem nunca tropeçou no uso de expressões verbais como estas: Se você ver o candidato ou se você
vir?
E então, caro leitor, qual a forma correta? Claro que é a segunda. Trata-se do futuro do subjuntivo
do verbo ver, e não do verbo vir, como muita gente imagina. Em se tratando do verbo vir, no futuro
do subjuntivo a forma correta é se você vier.
Cheguei em casa cedo. A secretária interviu nas negociações. Telefone pra mim, urgente.
Percebemos nos enunciados ocorrências verbais com usos que ferem a norma padrão.
No primeiro, o verbo em destaque é chegar, que ao indicar lugar exige o uso da preposição a e não
em, como se usa no dia a dia. já a segunda, traz o verbo intervir no pretérito perfeito, cuja forma é
interveio, igual a sobreveio de sobrevir e veio de vir. E a terceira? O que comentar? Às vezes, para
falantes nativos de Língua, o uso de certas expressões causam "arrepios". Quem não fala ou
escreve, quase sempre, telefone pra mim, do alfabetizado ao letrado? Claro que estou me referindo a
um número considerável de usuários.
Então, qual a forma correta? O verbo telefonar exige a preposição a e não a preposição para. Daí, o
correto é mesmo telefone a mim ou telefone-me.
Você, caro leitor, já entreteu em alguma balada ou já entreteve em alguma balada? Já reteu
algum documento ou já reteve algum documento? Já deteu alguém ou já deteve alguém?
Tais formas verbais estão muito presentes no português do Brasil. Elas constituem desvios da
norma padrão e merecem esclarecimentos.
Vejamos as formas corretas:
Em vez de entreteu, use entreteve.
Em vez de reteu, use reteve.
Em vez de deteu, use deteve.
Vamos às explicações de caráter normativo: O verbo ter e seus derivados como nos exemplos
entreter, reter, deter, etc fazem o pretérito perfeito - 3ª pessoa / singular em entreve, reteve, deteve.
E agora, como agir diante de uma forma verbal tão usada entre os falantes? Qual, de fato, a forma
correta que não é logicamente a mais usada? Mesmo os leitores experientes, às vezes, se atrapalham
com formas verbais dessa natureza. Então, a forma correta de acordo com o principio normativo é a
segunda.
O verbo deparar não é pronominal. Dispensa, pois, o uso do pronome átono se.
Tinha
falo
Tinha pego ou tinha pegado?
ou
tinha
falado?
Falantes há que ainda usam no momento dos atos de fala a primeira forma verbal do primeiro
exemplo. Ainda ouvimos com certa frequência o "tinha falo".
Estamos diante de casos, segundo a visão normativa, de formas verbais no particípio.
No primeiro exemplo, a forma correta é a segunda tinha falado. O verbo falar só admite a forma
falado para o particípio. Não existe, pois, a forma falo. A forma verbal falo refere-se à primeira do
singular do presente do indicativo.
Já no segundo exemplo temos o verbo pegar que admite as duas formas verbais para o particípio.
Admite também as pronúncias para o uso da forma pego (é ou ê).
Aí
varia
Eu negocio ou negoceio?
ou
aí
vareia?
Muita gente ainda usa negoceia. Entretanto, a forma correta para o português
padrão é negocia
Estamos diante, caro leitor, de ocorrências verbais muito comuns na oralidade. Mas será que estão
corretas de acordo com a norma padrão? Qualquer falante que conheça os mecanismos de
funcionamento da língua percebe que existem inadequações que impedem o emprego de tais
ocorrências verbais. Então, vejamos as explicações segundo a norma padrão:
No primeiro exemplo, estamos relembrando um ditado popular que perdurou por muito tempo na
fala dos cidadãos que usavam a segunda forma verbal como sendo a correta. Porém, segundo a
norma padrão, a forma verbal é a primeira: varia.
Já no segundo exemplo temos outro caso, típico do português falado no Brasil. Continua uma certa
dúvida no tocante ao uso do verbo negociar na primeira pessoa do singular do presente do
indicativo. Muita gente ainda usa negoceia. Entretanto, a forma correta para o português padrão é
negocia.
Verbos como os citados com a terminação em iar são classificados pela visão normativa como
regulares, logo quando a sílaba tônica iniciar no i, permanece: premio, crio, aprecio, arrepio, guio
etc. tais usos sempre na primeira pessoa do singular do presente do indicativo.
O
taxista
freou
bruscamente
A jovem penteou o cabelo ou pentiou?
o
veículo
ou
freiou?
Complicado, não é mesmo? Costumamos usar, sobretudo na oralidade, as formas freiou e pentiou.
Mas a norma nos orienta a usar as primeiras formas freou e penteou.
Então, caro leitor, como agir diante de enunciados dessa natureza? É possível perceber que no texto
falado acrescentamos o i à pronúncia. Mas será a forma correta? Claro que não. O verbo no
infinitivo, isto é, o nome dele é frear sem i. Daí a forma correta segundo a norma padrão é a
primeira.
Explicações normativas para clarear nossa mente:
Os verbos terminados em "ear" como arrear, cear, frear, passear, pentear, recear, recrear,
saborear etc são irregulares: fazem um ditongo "ei" nas formas rizotônicas das 1ª, 2ª, 3ª pessoas do
singular e 3ª pessoa do plural, nos tempos do presente.
Nestes exemplos os verbos frear e pentear aparecem no pretérito perfeito do indicativo. Já no
presente do indicativo empregam-se desse modo: freio, freias, freia, freamos, freais, freiam.
Penteio, penteias, penteia, penteamos, penteais, penteiam. Observemos a ausência do i somente na
primeira do plural.
Ela se maquia ou se maqueia?
O correto segundo a norma padrão é: "Ela se maquia todos os dias". O verbo maquiar (maquilar) é
regular (termina em "iar" e não pertence ao grupo do MARIO - ver a seguir).
Quantos dilemas, não, caro leitor? A norma padrão nos orienta por um caminho e a prática, por
outros.
Como tornar esses dilemas em lemas? Convém estar a par dos mecanismos de funcionamento da
língua e uma das estratégias é a prática de leituras de textos diversos. A concepção interativa da
leitura e discussões de textos nos familiariza com a visão dialógica da linguagem, contribuindo,
dessa forma, para o uso adequado da linguagem oral e escrita em situações reais de comunicação.
Como exemplificação de língua, conhecemos outros verbos que podem causar "dores na cabeça" no
momento dos atos de expressão. São apenas cinco terminados em iar que formam o anagrama
MARIO. O nome MARIO é formado com as iniciais destes verbos: mediar, ansiar, remediar,
incendiar, odiar.
Assim, devemos empregá-los no presente do indicativo:
Mediar: medeio, medeias, medeia, mediamos, mediais, medeiam.
Ansiar: anseio, anseias, anseia, ansiamos, ansiais, anseiam.
Remediar: remedeio, remedeias, remedeia, remediamos, remediais, remedeiam.
Incendiar: incendeio, incendeias, incendeia, incendiamos, incendiais, incendeiam.
Odiar: odeio, odeias, odeia, odiamos, odiais, odeiam.
O juiz intermedeia na decisão ou intermedia?
A frase que está de acordo com a norma padrão é a primeira. O verbo intermediar está empregado
na terceira pessoa do singular do indicativo.
É correto observar que, nos verbos mediar, ansiar, remediar, incendiar e odiar, as três primeiras
pessoas do singular e a terceira pessoa do plural do indicativo, como é no caso dos exemplos
citados, têm o i transformado em ei nas formas rizotônicas (aquelas em que o acento tônico recai no
radical a parte invariável do verbo: med (iar), ans (iar), remed (iar), incend (iar), od (iar).
Esclarecendo melhor: quando a tonicidade recai sobre o i, unindo à consoante do radical, ele recebe
a presença de um e, transformando em ei.
Só para ativar a memória: intermedeio, intermedeias, intermedeia (intermediamos, intermedias),
intermedeiam.
Tentamos tornar mais claros alguns dilemas que nos vêm à mente quanto ao uso de certas formas
verbais. Esperamos ter contribuindo para que você, caro leitor, possa ampliar sua competência
linguística e comunicativa, esclarecer possíveis dúvidas sobre tais "dilemas" que podem ser
transformados em "lemas" a depender da nossa educação linguística. Sempre lembrando que nada
na língua funciona sozinho, se não através do processo de interação.
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