N.º 43 Jan-Mar 2017 Pág. 68-69 Pedro Abreu Loureiro Cardiologista Clínico Insuficiência cardíaca – reduzir a taxa de reinternamento hospitalar Escolhi o tema da insuficiência cardíaca (IC) crónica por se tratar de uma das epidemias do século XXI. As descompensações da insuficiência cardíaca crónica têm elevados custos em mortalidade e cuidados de saúde prestados pelo sistema de saúde nacional, nomeadamente no que concerne aos (re)internamentos hospitalares. A necessidade de rever os algoritmos de diagnóstico e tratamento da insuficiência cardíaca de forma a minimizar o impacto negativo desta entidade, levou à recente publicação das novas recomendações da Sociedade Europeia de Cardiologia (2016)1, que entre 68 as principais alterações, introduzem uma nova classe de IC com base na determinação da fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) – insuficiência cardíaca com fração de ejeção moderadamente comprometida (FEVE 40-49%) e destacam o papel fundamental dos biomarcadores no diagnóstico, estratificação de risco e prognóstico da IC. Caberá sempre aos médicos de família e cardiologistas acompanhar e orientar o doente no ambulatório, mas estes estão muitas vezes limitados por dificuldades na realização dos exames complementares preconizados pelas guidelines. Assim, enquanto não houver prémios para a redução das taxas de reinternamento, ao primeiro mês e primeiro ano após alta hospitalar por IC, provavelmente muitos doentes sofrerão com a não aplicação dos mais atualizados critérios de orientação diagnóstica e terapêutica. Com base numa larga experiência de prática clínica em ambulatório, proponho que seja facilitado o acesso a um conjunto de exames complementares aos doentes com queixas compatíveis com IC, muito particularmente se tiverem hipertensão arterial, diabetes mellitus, dislipidemia, doença coronária, fibrilhação auricular, valvulopatia ou outra miocardiopatia, para citar as situa- cardíaca), que o próprio doente ou cuidador podem monitorizar e transmitir regularmente ao seu médico (hoje com recurso às novas tecnologias), que o médico, coadjuvado pela determinação dos parâmetros laboratoriais e ecográficos acima mencionados, terá meios de decisão para seguimento dos doentes e ajustamentos terapêuticos atempados e eficientes, melhorando a qualidade de vida e reduzindo os reinternamentos hospitalares. É este o caminho para uma terapêutica que possa incluir, seguindo as guidelines, mas de forma adaptada a cada doente, os fármacos que têm mostrado evidência cien- Enquanto não houver prémios para a redução das taxas de reinternamento, ao primeiro mês e primeiro ano após alta hospitalar por insuficiência cardíaca, provavelmente muitos doentes sofrerão com a não aplicação dos mais atualizados critérios de orientação diagnóstica e terapêutica ções mais frequentes de risco de IC. Neste grupo de exames básicos importantes para o diagnóstico, estratificação e orientação terapêutica dos doentes com IC, incluemse, para além de análises laboratoriais de rotina (como hemograma, função reanal, ionograma...), a determinação de biomarcadores em particular a concentração plasmática de péptidos natriuréticos do tipo B (BNP) ou da fração terminal do tipo pró-B (NT-proBNP) e o ecocardiograma transtorácico que deve incluir a determinação do índice de volume auricular esquerdo, índice de massa ventricular esquerda e da FEVE. Será com base em dados clínicos, nomeadamente os sintomas (dispneia, edemas...) e sinais (peso, pressão arterial, frequência Referência 1. Ponikowski P, Voors A, Anker S, et al. 2016 ESC Guidelines for the diagnosis and treatment of acute and chronic heart failure. The Task Force tífica de benefícios na insuficiência cardíaca, como os inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA)/ antagonistas dos recetores da angiotensina (ARAII), beta-bloqueadores, diuréticos (de ansa, antagonistas dos receptores mineralocorticóides), ivabradina ou, mais recentemente, os inibidores da neprilisina; e também a apropriada seleção de doentes que podem beneficiar da implantação de dispositivos como o cardioversor desfibrilhador (ICD) ou terapêutica de ressincronização cardíaca (CRT). Penso que com estas medidas poderemos vir a ter indicadores nacionais de reinternamento por IC crónica idênticos aos melhores, como já acontece com outras patologias do foro cardiovascular. for the diagnosis and treatment of acute and chronic heart failure of the European Society of Cardiology (ESC). European Heart Journal. 2016; doi:10.1093/eurheartj/ehw128 69