Verbos de controle e de alçamento em Xirhonga: ambiente

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III Conferência Internacional sobre Dinâmicas Sociais em África: rupturas e continuidades
Maputo (Moçambique), 19 a 20 de dezembro de 2014
Verbos de controle e de alçamento em Xirhonga:
ambiente sintático para o fenômeno da reestruturação1
Quesler Fagundes Camargos2 (UFMG)
Ernesto Mário Dimante3 (UEM)
Ricardo Campos Castro4 (UFMG)
1. Introdução
A proposta deste trabalho é analisar o fenômeno de reestruturação na língua Xirhonga
(Grupo Bantu), a partir dos trabalhos de Rizzi (1982), Aissen & Perlmutter (1976), Burzio
(1986), Wurmbrand (2003) e Cinque (2006). Esse fenômeno envolve a aplicação de regras
sintáticas que desencadeiam a formação de predicado complexo, produzindo, assim, uma
sequência verbal na estrutura de superfície. Submetemos os verbos de controle e os verbos de
alçamento a testes de aplicação das regras de reestruturação.
A escolha desses dois tipos de verbos deu-se devido ao seguinte fato: os verbos de
reestruturação abarcam tanto verbos de controle quanto de alçamento. Porém apenas um
subgrupo de verbos dessas classes permite a formação de predicados complexos. Nosso
objetivo, portanto, será verificar se a língua em análise apresenta condições sintáticas para a
realização da reestruturação.
1
O presente trabalho faz parte do Projeto “Descrição e Documentação de Línguas Moçambicanas”, o qual é
coordenado pelo Prof. Dr. Fábio Bonfim Duarte (UFMG-Brasil) e pelo Prof. Dr. Armindo Ngunga (UEMMoçambique). Esse projeto é financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(CAPES/Brasil), por meio do Edital no 33/2012 (Programa Internacional de Apoio à Pesquisa e ao Ensino por
meio da Mobilidade Docente e Discente Internacional – Pró-Mobilidade Internacional).
2
Quesler Fagundes Camargos é doutorando no Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos da
Universidade Federal de Minas Gerais/Brasil. E-mail para contato: [email protected].
3
Ernesto Mario Dimande é pesquisador no Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo
Mondlane/Moçambique. E-mail para contato: [email protected].
4
Ricardo Campos Castro é doutorando no Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos da
Universidade Federal de Minas Gerais/Brasil. E-mail para contato: [email protected].
1
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De acordo com Chomsky (1981, 1982, 1986), Manzini (1983), Culivover &
Jackendoff (2001) e Mioto et al. (2005), no âmbito da teoria gerativa, os verbos de controle
se caracterizam (i) por selecionar, como complemento, uma oração infinitiva e (ii) por
estabelecer na oração matriz um termo controlador que é responsável pela interpretação do
sujeito da oração encaixada. Os verbos de alçamento, por sua vez, envolvem o “alçamento” de
um DP, sujeito de uma predicação em que não pode receber Caso do seu predicador (um
infinitivo, por exemplo), para uma posição em que a atribuição de Caso seja possível (cf.
Haegeman 1994). Esse movimento, no entanto, só é admissível porque os verbos de
alçamento não selecionarem um argumento externo.
Este trabalho está dividido em três seções, além desta introdução. Na seção 2,
apresentamos descritivamente as construções que envolvem verbos de controle e verbos de
alçamento na língua Xirhonga. Na seção 3, investigamos o fenômeno de reestruturação a
partir de verbos de controle e de alçamento. Na seção 4, por fim, concluímos com as
considerações finais.
2. Verbos de controle e de alçamento
Analisando superficialmente, não é uma tarefa tão simples distinguir um verbo de
controle de um verbo de alçamento. Veja que não há aparentemente nenhuma distinção
significativa entre as sentenças5 (1) e (2) a seguir:
(1)
mufana
a-jul-ile
1.menino
MS1-querer-PAST
“O menino queria ver o gato”
ku-von-a
INF-ver-VF
xipixi
7.gato
5
Abreviaturas utilizadas neste trabalho: APPL: morfema aplicativo; INF: infinitivo; LOC: sufixo de locativo; MO:
marca de objeto; MS: marca de sujeito; PASS: morfema de passiva; PAST: marca de tempo passado; VF: vogal
final.
2
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(2)
mufana
a-gam-ile
1.menino
MS1-terminar-PAST
“O menino terminou de ver o gato”
ku-von-a
INF-ver-VF
xipixi
7.gato
No entanto, as duas sentenças acima apresentam distintas propriedades gramaticais no
interior de sua configuração, as quais serão exploradas neste trabalho. De modo geral, note
que a sentença em (1) envolve um verbo de controle de sujeito, ao passo que no exemplo em
(2) figura um verbo de alçamento.
Na teoria gerativa, um verbo de controle tem como característica o fato de selecionar
um argumento externo, o qual preenche a posição de sujeito superficial da sentença matriz.
Por esse motivo, não é possível mover nenhum outro constituinte para essa posição sintática.
Além do mais, verbos desse tipo estabelecem na oração matriz um termo controlador, o qual
corresponde ao DP sujeito mufana “o menino” no exemplo abaixo. Esse sujeito controlador é
o responsável pela interpretação do sujeito da oração encaixada, o qual é instanciado pela
categoria vazia PRO, conforme o exemplo a seguir:
(3)
mufana
a-jul-ile
1.meninok MS1-querer-PAST
“O menino queria ver o gato”
[ _____
PROk
ku-von-a
INF-ver-VF
xipixi
7.gato
]
No exemplo acima, estamos diante do verbo de controle kujula “querer”. Note que a
categoria vazia PRO é controlada pelo sujeito da oração principal, a saber: o DP mufana “o
menino”. Dessa forma, o PRO apresenta a mesma referência que o DP mufana “o menino”,
ou seja, são coindexados.
Em construções de alçamento, o argumento externo do verbo encaixado “alça” para a
posição de sujeito do verbo matriz. Esse movimento, de acordo com Mioto et al. (2005),
ocorre a fim de suprir a carência de Caso desse argumento, o qual não pode receber o Caso
nominativo da forma verbal infinitiva e nem Caso acusativo do verbo matriz, o qual não tem
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esse Caso disponível devido a suas propriedades inacusativas. É por esse motivo que o
argumento do verbo encaixado se torna o sujeito da sentença, conforme o exemplo abaixo:
(4)
mufana
a-gam-ile
[ ____ ku-von-a
1.meninok MS1-terminar-PAST
tk INF-ver-VF
“O menino terminou de ver o gato”
xipixi
7.gato
]
No exemplo acima, figura o verbo de alçamento kugama “terminar”. Veja que o DP
mufana “o menino”, o qual é o argumento externo do verbo kuvona “ver”, move-se para a
posição de sujeito da oração matriz, a fim de satisfazer o Princípio de Projeção Estendida
(EPP) e receber o Caso nominativo da oração principal.
Veja que os verbos de controle são muito parecidos com verbos de alçamento. No
entanto, apesar de esses dois tipos de verbos serem capazes de selecionar como complemento
orações infinitivas, apenas os verbos de controle selecionam como complemento um
predicado infinitivo, o qual projeta como argumento nuclear a categoria vazia PRO.
Diante dessas considerações, para que seja possível diferenciar um verbo de controle
de um verbo de alçamento, analisaremos suas matrizes sintático-semânticas nas próximas
subseções. Para isso, aplicaremos dois tipos de testes, a saber: (i) um semântico, que consiste
na atribuição de papel temático, e (ii) um sintático, que diz respeito a orações encaixadas
desenvolvidas.
2.1 Teste semântico
No âmbito da Teoria de Regência e Ligação (cf. Chomsky 1981, 1982), o PRO e o
vestígio t são analisados dentro do mesmo tópico, a saber: tipologia de categorias vazias. Tal
análise em conjunto se justifica porque esses dois DPs se assemelham já que não possuem
matriz fonética. Contudo, como vimos acima, o PRO ocorre em construções que envolvem
verbos de controle, ao passo que o vestígio t figura em estruturas que contêm verbos de
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alçamento. Isso acontece devido ao fato de que apenas os verbos de controle são capazes de
introduzir seu próprio sujeito, ao passo que a posição de sujeito dos verbos de alçamento deve
ser preenchida pelo argumento da oração encaixada, via movimento.
Nos exemplos a seguir, veja que um verbo de controle como kujula “querer”, por
exemplo, exige um sujeito animado. Isso demonstra que verbos desse tipo impõe uma
restrição semântica própria, por meio da atribuição de papel temático, independente dos
condicionamentos do verbo da oração encaixada. Observe que o verbo kungirimela “descer”
aceita sujeitos tanto animados quanto inanimados.
(5)
mufana
a-jul-ile
ku-ngirim-el-a
nhav-eni
1.menino
MS1-querer-PAST
INF-descer-APPL-VF 9.montanha-LOC
“O menino queria descer a montanha”
(6)
*rhidzi
dri-jul-ile
ku-ngirim-el-a
nhav-eni
5.pedra
MS5-querer-PAST
INF-descer-APPL-VF 9.montanha-LOC
“A pedra queria descer (rolar por) a montanha”
No entanto, um verbo de alçamento como kugama “terminar”, por exemplo, não
impõe qualquer restrição semântica própria ao DP que irá ocupar a posição de sujeito. O fato
de esse verbo não atribuir papel temático para o seu sujeito superficial, mostra que esse
argumento não faz parte da grade temática do verbo de alçamento. Logo, deve ser gerado
como argumento da predicação encaixada, posição na qual recebe sua interpretação
semântica. Por esse motivo, este argumento movido para a posição de sujeito da sentença
principal não sofre qualquer condicionamento semântico do verbo da oração matriz, conforme
os exemplos abaixo:
(7)
mufana
a-gam-ile
ku-ngirim-el-a
nhav-eni
1.menino
MS1-terminar-PAST INF-descer-APPL-VF 9.montanha-LOC
“O menino terminou de descer pela montanha”
5
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(8)
rhidzi
dri-gam-ile
ku-ngirim-el-a
nhav-eni
5.pedra
MS5-terminar-PAST INF-descer-APPL-VF 9.montanha-LOC
“A pedra terminou de descer (rolar por) a montanha”
De modo geral, a sentença (6) é agramatical porque o verbo auxiliar kujula “querer”
atribui papel temático ao argumento que ocupa a posição sintática de sujeito. Isto demonstra
que este sujeito é um argumento próprio do verbo da oração principal. Logo esse verbo deve
ser de controle porque introduz um argumento externo. Entretanto, na sentença (8), o
argumento que ocupa a posição de sujeito da sentença é na verdade um argumento
pertencente a grade temática do verbo da oração encaixada, razão pela qual o auxiliar não
impõe qualquer tipo de restrição semântica.
Na próxima seção, apresentamos o segundo teste capaz de distinguir verbos de
controle dos verbos de alçamento.
2.2 Teste sintático
Como observamos nos exemplos da seção anterior, os verbos de controle licenciam
um argumento externo que exerce a função sintática de sujeito da sentença. Caso contrário,
ocorreriam sentenças agramaticais. Os verbos de alçamento, por sua vez, não introduzem
argumento externo. Logo, a posição de sujeito deve ser ocupada por um argumento gerado
dentro da predicação encaixada.
Com base nesses pressupostos sintáticos, temos o segundo teste que pode ser aplicado
a fim de se distinguir os verbos de controle dos verbos de alçamento. Esse diagnóstico
consiste no desdobramento das orações infinitivas em orações desenvolvidas. Como verbos de
controle introduzem seu próprio sujeito, é possível que haja dois sujeitos (um principal e
outro encaixado) quando a oração encaixada for desenvolvida. Como verbos de alçamento são
incapazes de introduzir um argumento externo, é impossível que haja dois sujeitos (um
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principal e outro encaixado), mesmo que a oração encaixada pudesse ser desenvolvida. Veja
os exemplos abaixo que ilustram esses pressupostos:
(9)
mufana
a-jul-ile
rhidzi
dri-ngirim-el-a
1.menino MS1-querer-PAST 5.pedra
MS5-descer-APPL-VF
“O menino queria que a pedra rolasse pela montanha”
nhav-eni
9.montanha-LOC
(10)
*mufana a-gam-ile
rhidzi
dri-ngirim-el-a
1.menino MS1-terminar-PST 5.pedra
MS5-descer-APPL-VF
“*O menino terminou que a pedra rolasse pela montanha”
nhav-eni
9.montanha-LOC
Note que a sentença em (9) é gramatical porque (i) o verbo da oração principal, que é
um verbo de controle, pode selecionar como complemento uma oração desenvolvida e (ii) o
verbo da oração principal e o verbo da oração encaixada podem introduzir argumento externo.
Logo, a construção apresenta dois sujeitos. Essa evidência mostra que o verbo da oração
principal é um verbo de controle. Entretanto, a sentença em (10) é agramatical, porque o
verbo da oração principal, que é um verbo de alçamento, não pode selecionar como
complemento uma oração desenvolvida, uma vez que o sujeito da oração encaixada deve se
mover para a posição de sujeito da oração matriz.
3. Verbos de reestruturação
Dentro da linguística teórica e descritiva, muitos trabalhos têm dedicado atenção
especial a contextos em que sentenças, as quais possuem verbos com complemento infinitivo,
podem se tornar transparentes para determinados fenômenos sintáticos locais. Nas línguas
românicas (cf. Aissen & Perlmutter 1976; Rizzi 1982; Burzio 1986; Cinque 2006), esse
fenômeno tem sido evidenciado principalmente por meio de alçamento de clítico e por meio
de movimento longo do objeto. Observe os exemplos abaixo:
7
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(11a) João não quer trazê-los
(11b) João não os quer trazer
(12a) João não decidiu trazê-los
(12b) *João não os decidiu trazer
Note que, nos exemplos em (11) e (12), os verbos querer e decidir distinguem-se
quanto à possibilidade de o pronome clítico os poder ser extraído do domínio da predicação
encaixada. Observe que, apesar de esse pronome clítico exercer a função sintática de objeto
nos dois contextos, ele pode mover-se para o domínio da predicação matriz em (11b), mas
não pode mover-se em (12b). A gramaticalidade da sentença (11b) mostra que a oração
encaixada “trazê-los” é transparente para a extração de seu argumento objeto. No entanto,
essa mesma oração encaixada não é transparente em contextos como (12b) – diz-se que há
uma barreira entre a oração principal e a oração encaixada. Dessa forma, o comportamento da
sentença infinitiva diante dessas propriedades é que determinará se essa sentença constitui um
domínio independente da sentença matriz ou se foi desencadeado o processo de
reestruturação.
Alguns trabalhos que investigam as construções infinitivas, tais como Rizzi (1982),
Aissen & Perlmutter (1976), Burzio (1986), Wurmbrand (2003), Cinque (2006), entre muitos
outros, mostram que construções como (11) e (12), apesar de superficialmente serem muito
semelhantes, apresentam diferenças significativas no nível sintático e no plano semântico.
Conforme esses autores, nem todos os complementos infinitivos apresentam a mesma
estrutura subjacente. Essa distinção, assim, proporciona diferentes interpretações semânticas.
O grande desafio certamente é propor uma representação formal dessas construções a fim de
que seja possível predizer a manifestação de propriedades tais como o alçamento do clítico,
como foi mostrado nos exemplos acima.
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Nas próximas duas subseções, veremos que alguns verbos de controle e de alçamento
na língua Xirhonga têm apresentado um comportamento de predicado funcional, formando
uma unidade sintática com o verbo de seu complemento. O complemento infinitivo apresenta
efeitos de transparência para determinados fenômenos sintáticos. Assim, a sequência verbal,
formada pelo verbo principal e pelo verbo encaixado, torna-se um único domínio funcional,
manifestando propriedades de um predicado verbal complexo.
Vale ressaltar que os diagnósticos que têm sido utilizados para evidenciar os efeitos de
transparência nas línguas românicas não se aplicam à língua em análise. Isso se deve ao fato
de não haver nas línguas Bantu pronomes clíticos livres, por exemplo, como há nas línguas
românicas. Diante disso, propusemos novos testes com a finalidade de verificar se
determinados processos locais podem ser engatilhados em outro domínio de localidade.
Comecemos com o teste de concordância à distância.
3.1 Teste de concordância à distância
O primeiro teste se fundamenta no sistema de concordância verbal da língua Xirhonga.
Os verbos nessa língua, além de concordarem com seu sujeito, podem apresentar morfologia
de concordância com seu objeto, a fim de codificar aparentemente informações do domínio da
especificidade e da topicalidade. Veja nos dois exemplos abaixo que o verbo kuba “bater”, da
oração encaixada, engatilha o prefixo de concordância de objeto, codificando o DP xipixi “o
gato”.
(13)
mufana
a-jul-ile
1.menino
MS1-querer-PAST
“O menino queria bater no gato”
ku-xi-ba
INF-MO7-bater-VF
xipixi
7.gato
(14)
mufana
a-gam-ile
ku-xi-ba
1.menino
MS1-terminar-PAST
INF-MO7-bater-VF
“O menino terminou de bater no gato”
xipixi
7.gato
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Curiosamente a língua Xirhonga permite que, em alguns contextos, o verbo da oração
principal concorde com o objeto da oração encaixada, conforme o exemplo a seguir:
(15)
mufana
a-xi-jul-ile
1.menino MS1-MO7-querer-PAST
“O menino queria bater no gato”
ku-xi-ba
INF-MO7-bater-VF
xipixi
7.gato
Veja que essa concordância do verbo da oração principal com o objeto da predicação
encaixada demonstra que de fato não há uma barreira entre as duas orações. Em outras
palavras, o predicado encaixado é transparente de forma que o verbo da oração principal é
capaz de visualizar o elementos internos da predicação encaixada. Contudo, em outros
contextos, a concordância do verbo da oração matriz com o objeto da oração encaixada não é
possível, conforme o exemplo abaixo:
(16)
*mufana a-xi-gam-ile
ku-xi-ba
1.menino MS1-MO7-terminar-PAST INF-MO7-bater-VF
“O menino terminou de bater no gato”
xipixi
7.gato
Observe que o contraste entre (15) e (16) pode ser explicado em termos de fenômeno
de reestruturação. O verbo de controle kujula “querer” em (15) comporta-se como um verbo
de reestruturação, uma vez que a concordância, que é um processo sintático local, pode
ocorrer entre o verbo da oração matriz e o argumento interno da predicação encaixada. Isso só
é possível porque não há uma barreira sintática que bloqueie essa concordância. No exemplo
(16), no entanto, essa concordância não é permitida, o que demonstra que o verbo de
alçamento kugama “terminar” não apresenta propriedades de verbos de reestruturação. Na
próxima seção, aplicaremos o teste denominado como passiva longa.
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3.2 Teste de passiva longa
Observe que, nos dois exemplos abaixo, o verbo kuba “bater”, da oração encaixada,
recebe a morfologia de passiva {-iw}, a qual apaga o sujeito agente e promove o objeto à
posição sintática de sujeito. Note que (17) e (18) se distinguem quanto ao fato de que, no
primeiro, o sujeito da oração encaixada é um PRO, que é controlado pelo sujeito da oração
principal, e, no segundo, o argumento nuclear da oração encaixada se move para a posição de
sujeito da oração principal.
(17)
mufana
a-jul-ile
1.menino
MS1-querer-PAST
“O menino queria ser batido”
ku-b-iw-a
INF-bater-PASS-VF
(18)
mufana
a-gam-ile
1.menino
MS1-terminou-PAST
“O menino terminou de ser batido”
ku-b-iw-a
INF-bater-PASS-VF
O segundo teste capaz de demonstrar a existência do fenômeno de reestruturação em
Xirhonga consiste no processo de passivização apresentado acima. Para sermos mais precisos,
em contexto de reestruturação, é possível que ocorra uma construção de passiva longa,
quando não há barreira sintática entre a oração principal e a oração encaixada. Veja que, no
exemplo abaixo, tanto o predicado encaixado quanto o predicado matriz recebe a morfologia
passiva, apesar de haver apenas um processo de passivização:
(19)
mufana
a-jul-iw-ile
1.menino
MS1-querer-PASS-PAST
“O menino queria ser batido”
ku-b-iw-a
INF-bater-PASS-VF
Veja que o fato de o predicado da oração matriz receber a morfologia de passiva que
se refere ao processo de passivização da oração encaixada demonstra que de fato não há uma
barreira entre as duas orações. Logo, essa evidência fortalece nossa proposta de que o verbo
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kujula “querer” em Xirhonga realmente é um verbo de reestruturação. Veja no exemplo
abaixo que a passiva longa não é permitida quando o verbo da oração matriz é o verbo de
alçamento kugama “terminar”.
(20)
*mufana
a-gam-iw-ile
1.menino
MS1-terminou-PASS-PAST
“O menino terminou de ser batido”
ku-b-iw-a
INF-bater-PASS-VF
De modo geral, o que os exemplos apresentados nessa seção mostram é que o verbo
kugama “terminar” permite o encaixe de uma construção passiva, conforme o exemplo (18).
Contudo, não é possível que a oração encaixada seja passivizada, como em (20). Portanto, o
verbo kugama “terminar” não se comporta com verbos de reestruturação. Verbos como kujula
“querer”, no entanto, permitem o encaixamento de uma predicação passivizada, como em
(17), e uma passivização da oração encaixada, como em (19). Logo, esse verbo apresenta
características de fenômeno de reestruturação, uma vez que o verbo principal e o encaixado
comportam-se como uma configuração funcional única.
4. Considerações finais
Tomando por base a investigação desenvolvida até aqui, concluímos que a língua
Xirhonga permite o fenômeno de reestruturação. Este mecanismo mostra que determinados
verbos selecionam como complemento orações infinitivas. Além disso, entre essas duas
predicações, não há nenhuma barreira que impeça a realização de processos morfossintáticos
locais. A primeira evidência empírica diz respeito à concordância verbal de objeto, que
consiste no fato de que o verbo da oração principal pode concordar com o objeto da oração
encaixada. A segunda evidência empírica corresponde às construções de passiva longa, em
que os verbos, tanto da oração principal quando da predicação encaixada, engatilham a
morfologia de construção passiva.
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Em suma, se houvesse uma barreira entre a predicação principal e a encaixada,
certamente a concordância à distância e a passiva longa não seriam possíveis em Xirhonga.
Trabalhos futuros deverão verificar ainda quais são os demais verbos de reestruturação na
língua em análise. Uma investigação desse tipo certamente terá como objetivo checar quais
são os tipos de verbos que pertencem a essa classe.
Bibliografia
Aissen, J. & Perlmutter, D. (1976). “Clause reduction in Spanish”. In Proceedings of the
second annual meeting of the Berkeley Linguistics Society. Califórnia: Berkeley. Pp. 1-30.
Burzio, L. (1986). Italian syntax. Dordrecht: Reidel.
Chomsky, N. (1981). Lectures on government and binding. Dordrecht: Foris.
Chomsky, N. (1982). Some concepts and consequences of the theory of government and
binding. Cambridge: MIT Press.
Chomsky, N. (1986). Knowledge of language, its nature, origin and use. New York: Praeger.
Cinque, G. (2006). Restructuring and functional heads: the cartography of syntactic
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Culivover, P. & Jackendoff, R. (2001). “Control is not movement”. In Linguistic Inquiry 32:
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Haegman, L. (1994). Introduction to Government and Binding Theory (Second Edition).
Blackwell.
Manzini, M. R. (1983). On control and control theory. In Linguistic Inquiry 14: 421-446.
Mioto, C. & Figueiredo, M. C. F. & Lopes, R. E. V. (2005). Novo Manual de Sintaxe.
Florianópolis: Insular.
Rizzi, L. (1982). Issues in italian syntax. Dordrecht: Foris.
Wurmbrand, S. (2003). Infinitives: reestructuring and clause structure. Berlin, New York:
Mouton de Gruyter.
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