Tereza Cristina Zabala - PUC-SP

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM DIREITO
TEREZA CRISTINA ZABALA
HUMANISMO INTEGRAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:
SOMOS MAIS DO QUE IGUAIS, SOMOS TODOS IRMÃOS.
MESTRADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2016
TEREZA CRISTINA ZABALA
HUMANISMO INTEGRAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:
SOMOS MAIS DO QUE IGUAIS, SOMOS TODOS IRMÃOS.
MESTRADO EM DIREITO
Dissertação
apresentada
à
Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para o título de Mestre em Direito,
sob orientação da Professora LivreDocente Carolina Alves de Souza Lima.
SÃO PAULO
2016
BANCA EXAMINADORA
_________________________________
_________________________________
_________________________________
Dedico esta obra aos meus pais, José (in memória) e Maria,
que me deram a vida e, também, ao meu esposo Régis (in
memória), que me trouxe a paixão do amor. José, apesar da
ausência física, sempre esteve presente nas lembranças de
meu espírito.
Maria, pelo amor caridoso e presença sólida, pelas orações
feitas, do começo ao fim, ao longo de toda minha criação,
sempre empreendeu todos os esforços para garantir que eu
tivesse as melhores oportunidades.
Régis, pela compreensão com minhas ausências, pela união
de pensamento e pelo amor incondicional, que sempre me
apoia nos projetos de minha vida em todas as horas, ao longo
dos 13 anos que estivemos juntos.
AGRADECIMENTOS
A Deus.
A todos que me acompanharam nesta instigante tarefa de analisar o
Humanismo Integral e o desenvolvimento sustentável e contribuíram, direta ou
indiretamente, para a elaboração deste trabalho.
À Professora Carolina Alves de Souza Lima, orientadora dedicada e
paciente, exemplo de professora, incansável incentivadora desta pesquisa, com
sugestões precisas e pontuais.
Ao Professor Wagner Balera, pelo fraterno acolhimento na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP, notável cultor de Direitos Humanos,
sempre incentivando-me nos caminhos instigantes do Direito e do Humanismo.
Ao Professor Willis Santiago Guerra Filho, por acolher-me de braços abertos
na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP, cujo vasto
conhecimento, com a reflexão filosófica do Direito, foi encorajamento e exemplo.
Ao Professor Luiz Alberto David Araujo, cuja sapiência do Direito
Constitucional foi estímulo e inspiração.
Ao Professor Eduardo Dias de Souza Ferreira, pelos ensinamentos
ministrados em sala de aula e valiosas contribuições no estudo dos Direitos
Humanos.
À Professora Roberta Soares da Silva, pela carinhosa amizade e impulso
nos estudos dos Direitos Humanos.
Ao CNPQ, pelo apoio financeiro para o desenvolvimento deste trabalho de
pesquisa.
Aos amigos, Rui e Rafael, da Secretaria da Pós-Graduação em Direito da
PUC-SP, por seu profissionalismo e paciência.
Cântico das Criaturas, de São Francisco de Assis
Altíssimo, Onipotente, Bom Senhor
Teus são o Louvor, a Glória,
a Honra e toda a Bênção.
Louvado sejas, meu Senhor,
com todas as Tuas criaturas,
especialmente o senhor irmão Sol,
que clareia o dia e que,
com a sua luz, nos ilumina.
Ele é belo e radiante,
com grande esplendor;
de Ti, Altíssimo, é a imagem.
Louvado sejas, meu Senhor,
pela irmã Lua e pelas estrelas,
que no céu formaste, claras.
preciosas e belas.
Louvado sejas, meu Senhor.
pelo irmão vento,
pelo ar e pelas nuvens,
pelo sereno
e por todo o tempo
em que dás sustento
às Tuas criaturas.
Louvado sejas, meu Senhor,
pela irmã água, útil e humilde,
preciosa e casta.
Louvado sejas, meu Senhor,
pelo irmão fogo,
com o qual iluminas a noite.
Ele é belo e alegre,
vigoroso e forte.
Louvado sejas, meu Senhor,
pela nossa irmã, a mãe terra,
que nos sustenta e governa,
produz frutos diversos,
flores e ervas.
Louvado sejas, meu Senhor,
pelos que perdoam pelo Teu amor
e suportam as enfermidades
e tribulações.
Louvado sejas, meu Senhor,
pela nossa irmã, a morte corporal,
da qual homem algum pode escapar.
Louvai todos e bendizei o meu Senhor!
Dai-Lhe graças e servi-O
com grande humildade!
RESUMO
A teoria do Humanismo Integral elaborada por Jacques Maritain e assumida pela
Doutrina Social da Igreja e pela ONU na Declaração Universal dos Direitos Humanos
como critério de dignidade da pessoa humana individual, coletiva e solidária destaca
o homem e suas responsabilidades numa relação sólida com o meio ambiente e a
natureza como eixo, finalidade e efetividade do desenvolvimento sustentável. No
cenário atual de crise ecológica, o tema e o problema do desenvolvimento, para
atingir o aspecto de sustentável, depende de uma verdadeira solidariedade entres os
seres humanos e a Terra. A mudança está em como Jacques Maritain, no
Humanismo Integral, reconhece e valoriza a pessoa partindo de sua criação à
imagem e semelhança de Deus, como projeto de amor e solidez, capaz de compor
uma nova estrutura social e ambiental. O ponto de partida é o conceito de
Humanismo Integral, segundo o plano de Jacques Maritain, cuja concepção de
pessoa humana lhe imprime um desenvolvimento integral e exige um
desenvolvimento sustentável.
Palavras-chave: Humanismo Integral. Pessoa Humana. Meio Ambiente. Natureza.
Solidariedade. Efetividade. Desenvolvimento Sustentável.
ABSTRACT
The theory of Integral Humanism developed by Jacques Maritain and assumed by
the Social Doctrine of the Church and the United Nations in the Universal Declaration
of Human Rights as a criterion for the dignity of the individual human person,
collective and solidarity highlights the human being and their responsibilities in a solid
relationship with the environment environment and nature as axis, purpose and
effectiveness of sustainable development. In the current scenario of ecological crisis
and the theme Development of the problem to achieve the aspect of Sustainable
depends only on true solidarity mid humans and the Earth. The change is in how
Jacques Maritain, in Integral Humanism recognizes and values the person starting
from its creation to image and likeness of God, as a project of love and strength, able
to compose a new social and environmental structure. The starting point is the
concept of Integral Humanism, according to Jacques Maritain plan, whose
conception of the human person gives it an Integral Development and calls for a
sustainable development.
Keywords: Integral Humanism. Human Person. Environment. Nature Solidarity.
Affectivity. Sustainable Development.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO……………………………………………………….....
1
HUMANISMO
INTEGRAL:
DESDOBRAMENTOS
JACQUES
HISTÓRICOS,
11
MARITAIN,
FILOSÓFICOS
E
NORMATIVOS................................................................................
14
1.1
Jacques Maritain...........................................................................
14
1.2
Humanismo....................................................................................
19
1.3
Humanismo Integral......................................................................
22
1.3.1
Pessoa e dignidade humana...........................................................
34
13.2
Sociedade e solidariedade..............................................................
40
1.4
O bem comum................................................................................
48
1.4.1
O Estado e o bem comum...............................................................
56
1.4.2
A propriedade privada e o bem comum..........................................
58
1.4.3
A criação e o meio ambiente, bens comuns universais..................
63
1.4.4
A filosofia da natureza para Jacques Maritain.................................
68
1.5
Humanismo e desenvolvimento...................................................
71
1.5.1
Desenvolvimento Integral................................................................
73
2
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: DESDOBRAMENTOS,
CONCEITOS FILOSÓFICOS E NORMATIVOS.............................
87
2.1
Crise ecológica e ação humana como raiz deste problema......
87
2.2
Historicidade e tendência.............................................................
94
2.3
O Humanismo Integral de Maritain contra a crise ecológica e
a favor da efetividade do desenvolvimento sustentável...........
102
Linhas de orientação e ação...........................................................
115
2.3.1.1 Laudato Si’.......................................................................................
115
2.3.1
2.3.1.2 Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (dos ODM aos
ODS)................................................................................................
3
CONCLUSÃO:
DESENVOLVIMENTO
INTEGRAL
120
E
SUSTENTÁVEL..............................................................................
126
REFERÊNCIAS...............................................................................
131
11
INTRODUÇÃO
No Humanismo Integral de Jacques Maritain, o homem é concebido a imagem
e semelhança de Deus, o que lhe garante uma dignidade humana especial, ou seja,
é uma pessoa humana.
Neste humanismo há o pressuposto de que o homem não é um ser
(animal) constituído somente de razão. É também pessoa. Pessoa como universo
de natureza espiritual dotada de liberdade e inteligência. Nele, o homem não se
constitui exclusivamente de matéria. Assim, não se compõe exclusivamente de
parte física. No Humanismo Integral ele é um ser feito de matéria e espírito.
Apenas as duas substâncias incompletas, unidas entre si tão fortemente são
capazes de compor uma única substância existente por conta própria, ou seja, a
pessoa humana.
Porém, para a plena dignificação do “homem todo e de todos os homens”1,
dele se espera o dever de cuidar do meio ambiente e da natureza. O respeito ao
planeta Terra igualmente impõe um dever solidário para com todos os pobres do
mundo e as futuras gerações, como exigência para o desenvolvimento sustentável.
Contudo, na atualidade estamos sofrendo uma crise ecológica e moral, já
anunciada por Jacques Maritain ao identificar como insatisfatória a frieza artificial do
conhecimento técnico-científico no trato da pessoa e do meio ambiente, o que torna
o desenvolvimento sustentável um desafio a ser superado.
Diante da análise desse contexto, segundo o conceito do Humanismo
Integral de Jacques Maritain, surge o tema central deste trabalho. Indaga-se se o
Humanismo de Jacques Maritain poderá ser um caminho efetivo para a conquista do
desenvolvimento sustentável.
1
PAULO VI. Populorum progressio. Ponto 42. 26 de março de 1967. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/paul-vi/pt/encyclicals/documents/hf_p-vi_enc_26031967_populorum.html.
Acesso em: 19 abr. 2016.
12
Para responder essa ideia central, o trabalho foi dividido em dois capítulos.
O primeiro intitulado Humanismo Integral: Jacques Maritain, Desdobramentos
Históricos, Filosóficos e Normativos, apresenta uma visão do pensamento de
Jacques Maritain, por meio dos conceitos fundamentais desenvolvidos pelo filósofo.
Trata primeiro de trazer referência, sob o olhar de Tristão Athayde, da pessoa e do
filósofo Jacques Maritain, como ainda do conceito de Humanismo Integral. Em
seguida, trata de alguns dos conceitos fundamentais desse Humanismo, tais como:
pessoa humana e dignidade, sociedade e solidariedade, bem comum e Humanismo
Integral, assim como o desenvolvimento.
O
segundo
capítulo
intitulado
Desenvolvimento
Sustentável:
desdobramentos, conceitos filosóficos e normativos, aborda a crise ecológica e a
ação humana como raiz deste problema. Na sequência, cuida da historicidade e da
tendência do desenvolvimento sustentável. Por fim, cuida do Humanismo Integral de
Jacques Maritain contra a crise ecológica e a favor da efetividade do
desenvolvimento sustentável, acrescido de duas linhas de orientação e ação, a partir
dos princípios do humanismo: a Encíclica Laudato Si’ e os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (dos ODM aos ODS).
A pesquisa bibliográfica foi desenvolvida em obras nacionais e estrangeiras,
tanto no campo jurídico, quanto em outras áreas do conhecimento. Com maior
enfoque a área de filosofia de Jacques Maritain.
Por último, serão apresentadas, de forma sintética, as considerações finais
acerca dos temas estudados ao longo do trabalho.
As conclusões aqui apresentadas, certamente, irão propiciar discussões,
críticas e reflexões acerca do tema tratado. Trata-se de um tema inovador, pois
parte do conceito de Humanismo Integral de Jacques Maritian, para se chegar à
efetividade do desenvolvimento sustentável. A escolha de um assunto mais voltado
à prática e a realidade do mundo é consequência da real necessidade de assegurar
efetividade ao Direito Humano do desenvolvimento sustentável.
13
De acordo com esta posição, afirma Norberto Bobbio: “Creio que uma
discussão sobre os direitos humanos deve hoje levar em conta, para não correr o
risco de se tornar acadêmica, todas as dificuldades procedimentais e substantivas”.2
Dessa forma, o objetivo do estudo é trazer não só para o meio acadêmico,
mas para toda a sociedade, a discussão sobre o tema tão instigante e importante,
visando sempre ao aperfeiçoamento e ao alcance do direito ao desenvolvimento
sustentável, como um direito humano.
2
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Elsevier,
2004, p. 44.
14
1
HUMANISMO
INTEGRAL:
JACQUES
MARITAIN,
DESDOBRAMENTOS HISTÓRICOS, FILOSÓFICOS E NORMATIVOS
1.1 Jacques Maritain
Descrever, friamente, a biografia3 de Jacques Maritain, apenas nos
acarretaria perder de vista à grandiosidade desde filósofo e de suas obras.
Adotaremos como referência, para contar brevemente a sua vida, com a
finalidade de imprimir um olhar mais caloroso sobre ela, o encontro dele com Alceu
Amoroso Lima4, para quem
Maritain veio mostrar a toda uma geração, a toda a inteligência moderna, a
toda a civilização secularizada de nossos dias, a necessidade
imprescindível desse novo e verdadeiro renascimento, que é da essência de
todo cristianismo. Veio dar, ao nosso paladar moderno, o gosto renovado
das verdades eternas5.
Lima nos conta que, em 1936 foi publicado o livro Humanismo Integral de
Maritain, pouco depois traduzido para o português por Afrânio Coutinho. Essa
publicação acarretou-lhe o epíteto de “marxista cristão”. Se bem que é destino de
todos os renovadores, diante dos demais correligionários enquadrados à rotina, que
menos facilmente lhes perdoam o esforço de renovar ou perecer. Assim, sua obra,
3
INSTITUTO MARITAIN CHILE. Jacques Maritain Biografía. Disponível em: http://www.maritain.cl/.
Acesso em: 17 abr. 2016.
Jacques Maritain foi um Filósofo francês. Ele nasceu em Paris, a 18 de novembro de 1882 e faleceu
em 28 de abril de 1973, em Touselouse. Estudou na Sorbonne, licença da filosofia (1900-1901).
Naquela Universidade conheceu Raíssa (imigrante Judia Russa), com quem casou-se em 26 de
novembro de 1904. Neste mesmo ano foi recepcionado no concurso de agregação de filosofia.
Durante a segunda guerra mundial, que durou de 1939 a 1945, ele e Raíssa se mudaram para os
Estados Unidos. Com a morte de sua esposa, em 04 de novembro de 1960, o filósofo retira-se do
mundo, e ingressa na Congregação Religiosa Católica fundada pelo Padre René Voillaume. Na
Congregação aos 88 anos de idade, professou os votos. Morreu em 28 de abril de 1973. (tradução
livre)
4
LIMA, Alceu Amoroso. Jacques Maritain, por Alceu Amoroso Lima. In: PUSSOLI, Lafaiete; LIMA,
Jorge da Cunha (coord.). Presença de Maritain (Testemunhos). São Paulo: LTr, 1995, p. 23-68.
5
LIMA, Alceu Amoroso. Jacques Maritain, por Alceu Amoroso Lima. In: PUSSOLI, Lafaiete; LIMA,
Jorge da Cunha (coord.). Presença de Maritain (Testemunhos). São Paulo: LTr, 1995, p. 23.
15
igualmente sua pessoa, é um exemplo vivo de independência de pensamento e de
liberdade de consciência. Todavia, isso em nada impediu sua imensa repercussão
universal. Esse “anti-moderno” toma o partido do futuro, conservando apenas do
passado o que tinha de eterno.
No início do século XX, Maritain tinha 18 anos, e iria ser um dos mais
modernos e, ao mesmo tempo, dos mais anti-modernos dos pensadores desse
momento da história da humanidade. Sua atuação sobre os modernos está
assentada nas fontes tomistas puras, aliada a uma modernidade de linguagem e de
atitude perante os acontecimentos da realidade da vida. Sua conversão ao
cristianismo católico no ano de 1906 fê-lo abandonar o racionalismo puro, para
encontrar na fonte autêntica da verdade, no próprio Coração do Cristo, o amor da
sabedoria, a filosofia, como vida completa de realidade cuja perspectiva é “um
projeto cristificável de sociedade humana secular e não sacral” 6.
Pois para Maritain
O tomismo não é somente algo histórico. Devemos, sem dúvida, estudá-lo
historicamente, como as outras doutrinas da Idade Média e de todas as
épocas. Mas como (em certo sentido) as outras grandes metafísicas da
Idade Média e de todas as épocas – em de modo absoluto, mais do que
todas elas, a título eminente, porque as reconcilia, ultrapassando-as, em
uma síntese absolutamente transcendente -, ele contém uma substância
que domina o tempo, por causa de seu alcance universal. Ele responde aos
problemas modernos, na ordem especulativa e na ordem prática, tem uma
virtude formativa e libertadora do ponto de vista das aspirações e
inquietudes do tempo presente. Assim, o que esperamos dele é, na ordem
especulativa, a salvação atual dos valores da inteligência; na ordem prática,
a salvação atual (na medida em que isto depender de uma filosofia) dos
valores humanos. Resumindo, é com um tomismo vivo e não com um
tomismo arqueológico que estamos lidando. Nosso dever é tomar
consciência da realidade e das exigências de tal filosofia
É preciso que mostremos que esta sabedoria é sempre jovem, inventiva e
traz em si uma necessidade profunda, consubstancial, de engrandecer-se e
renovar-se - isto contra os preconceitos daqueles que gostariam de fixá-la
em dado estado de seu desenvolvimento e desconhecem sua natureza
essencialmente progressiva7.
6
LEPARGNEUR, Hubert. Evocação da vida e da obra. In: PUSSOLI, Lafaiete; LIMA, Jorge da Cunha
(coord.). Presença de Maritain (Testemunhos). São Paulo: LTr, 1995, p. 144.
7
MARITAIN, Jacques. Sete lições sobre o ser e os primeiros princípios da razão especulativa.
Tradução Nicolás Nyimi Campanário. São Paulo: Loyola, 1996, p. 11 (introdução).
16
Abrir um parêntese sobre o tomismo vivo, a que se refere Maritain, é
oportuno.
Deste modo e segundo Araújo
Na filosofia tomista, viver para o homem é o mesmo que se realizar na
existência extramental. É vivenciar o outro. Nesta concepção possuímos a
capacidade cognoscente de além de o próprio Ser, possuir imaterialmente
outros seres que conhecemos. Portanto, inteligência é a vida.
Isso, no imprime a indagação: vivenciamos porque inteligimos ou inteligimos
porque vivenciamos? A resposta é inteligimos porque vivenciamos.
Segue Araújo, explicando o que é essa existência com base no fundamento
de Tomas de Aquino
Considerando a existência extramental. A existência, fundamentada na
concepção de Santo Tomás de Aquino, na Suma Teológica (I, q. 85, a. 2
rep), demonstra que as ‘espécies inteligíveis’ (ou ideias) abstraídas das
nossas ‘representações imaginárias se referem a nosso intelecto como
aquilo que é conhecido (coisa real).
Santo Tomas de Aquino considera que o que conhecemos é o mesmo que
trata as ciências:
“Se aquilo que conhecemos fosse somente as espécies inteligíveis
(limitadas às impressões sensíveis), todas as ciências não seriam de coisas
que estão fora do homem, mas somente das espécies inteligíveis que estão
no homem”. (I, q. 85).
“Se o gosto não sente senão a própria impressão, aquele que tem o gosto
sadio julga o mel doce, julgará com verdade; e igualmente julgará com
verdade aquele que tem o gosto imperfeito e que julga o mel amargo. Um e
outro julgam segundo é afetado o próprio gosto. Assim toda opinião será
verdadeira”; não havendo conformidade entre um e o outro. (I, q. 85).
Assim, a espécie inteligível (ideia) é a similitude da coisa real em nós.
Significa afirmar que a partir de uma existência dada pensamos. Continua Araújo
No tomismo nos debruçarmos sobre a realidade extramental, constatamos
como tal realidade material se torna a similitude imaterial em nós, isto é, nos
empenhamos em conhecer o processo construtivo do conhecimento
sensível e intelectual.
O conhecimento verdadeiro é sempre a semelhança da realidade atual ou
possível em nós; pois atuamos no real enquanto vivenciamos em
conformidade com ele. Sendo assim, o saber que provém da língua latina
17
sapere, e significa tanto "saber" como "saborear", é valorizado no seu
segundo sentido, pois saboreamos, vivenciamos a existência dada.
Deste modo, argumenta Araújo que, segundo o tomismo vivo, a
compreensão da realidade se dá quando a vivenciamos. E, assim, finaliza o autor
A realidade (existência extramental) é o ponto de partida de todo
conhecimento natural, não há possibilidades de conhecer sem existir; e se
negarmos a existência extramental por meio da dúvida; negamos a
ordenação essencial da inteligência ao ser existente; o que é equivalente a
viver na ilusão, na demência, e tornar-se escravo da própria imaginação.
Compreendemos a realidade (inteligir) a partir de nossas vivencias. Na
perspectiva tomista o realismo do conhecimento é eminente. Nele o homem
se realiza na certeza da sua apreensão
Na vivencia que o intelecto atualiza-se pensando as “espécies inteligíveis”
(ou idéias); assim, constata-se um processo de identificação intencional
gradativa com a existência extramental, e nunca como diriam alguns
filósofos, que apenas possuímos em nossas mentes retratos ou pinturas
das coisas reais. Portanto, fundamentando-se no realismo do
conhecimento8.
Fechamos nosso parêntese.
Para Lima, a personalidade e a obra de Jacques Maritain se ergueram como
uma mensagem de renovação após as trombetas apocalípticas de 1914, de 1917,
de 1921 e de 1933 da Guerra, do Comunismo e do Nazi-Fascismo. Desde 1933, o
filósofo engrenou no debate dos temas que se abriam ao mundo contemporâneo em
razão do surto do nazismo, na Alemanha e, que de modo particular o preocupava,
devido ter sido casado com uma moça russa judia (chamada Raíssa). Naquele
momento, a humanidade vivenciava uma grave crise social e moral diante dos
conflitos armados, e culturais hasteadas pela direita e pela esquerda radicais.
Segundo Lima, partiu de Maritain, a ideia de uma nova democracia apoiada
no conceito de comunidade e de direitos sociais, de que o capital é um elemento
puramente instrumental. Os direitos do homem amplamente analisados nos
8
ARAÚJO, Adriano. O realismo do conhecimento. Disponível em:
http://tomismovivo.blogspot.com.br/2006/08/o-realismo-do-conhecimento.html. Acesso em: 2 ago.
2016.
18
fundamentos no cristianismo católico, representava um caminho novo na solução da
crise política e social.
A ideia do filósofo cristão, Jacques Maritain, funda-se sobre um realismo.
Procura o ser e não o vir a ser. A primazia do espiritual (coloca sob o signo de Deus
e do Homem Deus, o Cristo Jesus). Ele tem a pretensão de revelar essa sua
verdade como uma totalidade, como uma integridade de todas as realidades
materiais e espirituais, não apenas ontológicas, mas sociológicas.
Nas palavras de Lima
Como se fosse seu destino passar de um extremo a outro na apreciação
dos homens apressados e dilacerados dos nossos dias, nesta sociedade
em estado de passagem e tensões extremadas, em que é difícil
compreender a riqueza imensa da verdade contida numa filosofia da
proporcionalidade e do equilíbrio dinâmico, como a filosofia perene (...) a
meditação do filósofo não o leva nem à ‘tentação de recusar a condição
humana’, nem a ‘aceitar pura e simplesmente a condição humana’, mas a
transcendê-la 9.
Deste modo, Lima conclui que recebemos de Maritain o ensinamento de
conciliação com a inteligência. Esse novo ensinamento veio revelar a inteligência
como que ultrapassando a razão, mas no seu próprio sentido e nos abrindo a todo
universo, desde a matéria bruta até o ato puro.
Toda a filosofia especulativa e prática de Maritain colocam-se sob o signo do
logos, cuja teologia cristã, no Evangelho de João, se refere a Jesus Cristo como o
logos, ou seja, a Palavra10. Deste modo, os movimentos de ideias de Maritain, na
década de 30-40, que recebeu o nome de “maritainismo”, preparou o terreno para a
9
LIMA, Alceu Amoroso. Jacques Maritain, por Alceu Amoroso Lima. In: PUSSOLI, Lafaiete; LIMA,
Jorge da Cunha (coord.). Presença de Maritain (Testemunhos). São Paulo: LTr, 1995, p. 41 - 44.
10
BIBLÍA. Mensagem de Deus. São Paulo: Loyola, 1983, p. 1573. "No princípio existia o Verbo, o
Verbo estava voltado para Deus, e o Verbo era Deus. O Verbo estava, pois, voltado para Deus no
começo. Tudo foi feito por ele, e sem ele nada se fez de tudo o que foi criado. Nele estava a vida,e a
vida era a luz dos homens" João 1:1-4.
19
revolução branca que João XXIII iria desencadear com suas Encíclicas Sociais e o
Concílio da Doutrina Social da Igreja Católica11.
Igualmente, alguns dos valores éticos desenvolvidos por Maritain, em
especial a dignidade da pessoa e solidariedade foram acolhidos nos sistemas de
proteção dos Direitos Humanos a nível internacional, como também nas várias
constituições de inúmeros países.
1.2 Humanismo
Conforme Brito12, na obra “O humanismo como categoria constitucional”,
que usaremos como referência para tratamos da presente temática, o Humanismo
consigna três significações: ilustração mental, doutrina de exaltação ou culto à
humanidade e expressão de vida coletiva civilizada.
Como ilustração mental, o Humanismo é vocábulo plurissignificativo. Um dos
sentidos do verbete é de importante conhecimento das línguas e literaturas antigas.
Assim, logo se percebe que humanista é a pessoa conhecedora nas referidas
línguas ou, então com capacidade para as ciências sociais. Outro aspecto do
vocábulo é a de vocação ou gosto pelas ciências ditas humanas.
Entende o autor, para quem o Humanismo como doutrina de exaltação ou
culto à humanidade consiste num conjunto de princípios que se juntam pelo culto ou
atenção a esse sujeito universal que é a humanidade inteira. O ser humano como
obra prima da Criação, na máxima teológica de que todos nós fomos feitos à
imagem e semelhança de Deus, nos assegura uma dignidade inata.
11
MARCOCCIA, Rafael Mahfoud. O humanismo integral e a centralidade da pessoa. In: SOUZA,
Carlos Aurélio Mota de; CAVALCANTI, Thais Novaes. Princípios humanistas constitucionais:
reflexões sobre o humanismo do século XXI. São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 303. Para Rafael
Mahfoud Marcoccia a expressão Doutrina Social da Igreja designa o conjunto de escritos e de
mensagens – cartas, encíclicas, exortações, pronunciamentos, declarações - que compõem o
pensamento do magistério católico a respeito da questão social. Não tem caráter dogmático nem
intraeclesial: são os problemas sociais, políticos e econômicos os seus objetos.
12
BRITO, Carlos Ayres. O humanismo como categoria constitucional. Belo Horizonte: Fórum,
2012, p. 15-29.
20
Conforme Brito, ser a pessoa humana portadora de uma dignidade inerente
é o próprio Direito a reconhecê-la com tal, ou seja, o Direito tem o papel de declarála e não o de constituí-la, porque a circunstância do humano em nós é que nos
confere uma dignidade primaz. Dignidade que o Direito reconhece como fator
legitimante dele próprio e fundamento do Estado e da sociedade.
Ainda no sentir de Brito “ao reconhecer por modo jurídico a inata dignidade
da pessoa humana a sociedade resulta por se autoconferir o título de civilizada” 13. O
que para o mesmo jurista significa o terceiro significado do Humanismo: “traduzir
uma vida em comum que mereça o reconhecimento de culturalmente avançada” 14.
Entre os domínios de interação humana como detentora de Humanismo
(sociedade culturalmente avançada), para Brito
E em se tratando de direitos ambientais, sociais e do tipo fraternal, a sua
efetividade se eleva à condição de dado conceitual de toda a economia do
País. É dizer, economia que já não restringe a sua noção de dinamismo à
abertura para as inovações tecnológicas e aos ganhos de produtividade;
tem que passar pelo atendimento às necessidades de preservação do meio
ambiente e às postulações de segurança social e de uma decidida
integração comunitária (logo, fraternal).
Convém repetir, com ligeiros acréscimos: focado pelo prisma dos interesses
do todo social, o desenvolvimento tem que ser mais do que um mecânico ou
linear crescimento econômico. Ele há de exibir uma dimensão política ou de
soberania nacional, pela exigência que se lhe faz de ser um
desenvolvimento do tipo autossustentado ou sem temerária dependência
externa. Como também há de exibir três outras dimensões: a) a dimensão
da pura justiça social, a se dar por um progressivo compartilhamento dos
seus frutos com todos os estratos de que a sociedade se compõe; b) a
dimensão do mesmo e respeitoso tratamento para os referidos grupos de
pessoas que até hoje experimentam o travo da discriminação social (por
isso que destinatárias da compensação em que se traduz a ferramenta das
ações afirmativa; c) a definitiva absorção da ideia de equilíbrio ecológico
enquanto elemento de sua própria definição15.
13
BRITO, Carlos Ayres. O humanismo como categoria constitucional. Belo Horizonte: Fórum,
2012, p. 27.
14
BRITO, Carlos Ayres. O humanismo como categoria constitucional. Belo Horizonte: Fórum,
2012, p. 27.
15
BRITO, Carlos Ayres. O humanismo como categoria constitucional. Belo Horizonte: Fórum,
2012, p. 28-29.
21
Apesar das últimas considerações emprestadas de Brito, data vênia,
devemos nos questionar se uma sociedade pode autodeclarar-se civilizada em face
de reconhecer o valor da dignidade da pessoa humana em seu ordenamento,
quando por vezes não a efetiva.
Não nos custa lembrar o que diz Douzinas
Pessoas são assassinadas, torturadas e morrem de fome graças a
governos, leis e instituições nacionais. Os maiores crimes contra a
humanidade foram conduzidos em nome da nação, da ordem ou do bem
comum, e não há qualquer evidência convincente de que isso possa chegar
ao fim porque a humanidade foi declarada sacrossanta 16.
Ainda, Douzinas
O cinismo dos poderosos é bem conhecido e tem sido tratado com sorrisos
amarelos de escritores e poetas. Shakespeare, tanto quanto Brecht, era
fascinado pelo modo como os falcões da guerra vestiam a casaca do
moralismo e da pregação a fim de melhor persuadir soldados e cidadãos
quanto à importância de morrer e matar em nome de uma causa 17.
Assim, um Estado ao ser dotado de um conjunto de direitos humanos, cujo
maior pressuposto é o direito a vida, e com dignidade, requer a urgência das
liberdades e da participação política e social, como bem expôs Sen:
É preciso ver a democracia como criadora de um conjunto de
oportunidades, e o uso dessas oportunidades requer uma análise diferente,
que aborde a prática da democracia e direitos políticos. (...) A democracia
realmente cria oportunidades, que está relacionada tanto à sua ‘importância
instrumental’ como a seu ‘papel construtivo’. Mas a força com que as
oportunidades são aproveitadas depende de vários fatores, como o vigor da
16
DOUZINAS, Costas. O fim dos Direitos Humanos. Tradução Luzia Araújo. São Leopoldo - RS:
Editora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 2009, p. 140.
17
DOUZINAS, Costas. O fim dos Direitos Humanos. Tradução Luzia Araújo. São Leopoldo - RS:
Editora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 2009, p. 141.
22
política multipartidária e o dinamismo dos argumentos morais e da formação
de valores18.
1.3 Humanismo Integral
Hoje, ao se falar em Humanismo, é fundamental mencionar o nome de
Jacques Maritain e as principais ideias por ele desenvolvidas. Diante da realidade do
mundo, o seu “sistema de referência é aquele que bem se pode esperar de um
filósofo cuja vida inteira foi inspirada pelo pensamento de Tomás de Aquino” 19.
No prefácio da obra Humanismo Integral, das palavras do filósofo se extrai
Concernem as questões aqui tratadas a esta parte da filosofia que
Aristóteles e Santo Tomás chamam Filosofia pratica, porque envolve de
uma maneira geral toda filosofia o agir humano. (...) A filosofia pratica é
filosofia, é um conhecimento de modo especulativo; à diferença porem da
metafísica e da filosofia da natureza, é ordenada desde o princípio a um
objeto que é a ação, e tão grande seja nela a parte da comprovação,
qualquer atenção que deva dar aos condicionamentos e às fatalidades
históricas, é ela antes de tudo uma ciência da liberdade20.
Para Maritain, no domínio das afirmativas práticas, especialmente na ação
em direção a liberdade do homem, há o esforço coletivo de tornar os projetos
aceitáveis a todos, independentemente das divergências relativas às perspectivas
teóricas. Quando se trata
De uma ideologia básica prática e dos princípios básicos de ação,
implicitamente reconhecidos em nossos dias – de uma maneira vital, se
bem que não formulada, pela consciência dos povos livres – acontece que
isso constitui, grosso modo, uma espécie de resíduo comum, uma espécie
18
SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. Tradução Laura Teixeira Motta. São Paulo:
Companhia das Letras, 2010, p. 204-205.
19
MARITAIN, Jacques. A filosofia moral. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro: Agir, 1973,
p. 15.
20
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradução Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. prefácio.
23
de lei comum não escrita, no ponto de convergência prática de ideologias
teóricas e tradições espirituais extremamente diferentes21.
Pode-se dizer que, o Humanismo de Maritain exige a preservação e a
garantia da dignidade da pessoa humana no plano de uma ação prática, igualmente
nos direitos do homem e no ideal de liberdade, igualdade e fraternidade.
Contudo, ao proteger os direitos da pessoa ele não tem a pretensão de
idolatrá-lo como um ser acima dos outros seres da natureza. Ele contesta
expressamente o humanismo antropocêntrico individualista e burguês que colocou o
homem no centro das coisas. Deste modo, afirma: “Devemos ser advertidos em
qualquer caso em não definir o humanismo pela exclusão de toda ordenação ao
super-humano e pela abjuração de toda transcendência”22.
Segue Maritain
Digamos que o humanismo tende essencialmente a tornar o homem mais
verdadeiramente humano, e a manifestar sua grandeza original fazendo-o
participar de tudo o que o pode enriquecer na natureza e na história
(concentrando o mundo no homem, como dizia mais ou menos Scheler, e
dilatando o homem no mundo); ele exige ao mesmo tempo em que o
homem desenvolva as virtualidades nele contidas, suas forças criadoras e a
vida da razão, e trabalhe por fazer das forças do mundo físico instrumento
de sua liberdade.
Assim entendido, o humanismo é inseparável da civilização ou da cultura,
23
tornando-se estas duas palavras como sinônimas .
O Humanismo de Jacques Maritain restabelece a ideia de fraternidade
universal de Jesus Cristo, colhido no Direito Natural, cujos valores ele fez questão
de incorporar às suas obras.
21
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 93.
22
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradução Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 2.
23
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradução Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 2.
24
Anota Lopes, que foi Tomás de Aquino quem condensou e consolidou em
seu estudo a Lei Eterna e a Lei Natural. Eis que
No que diz respeito à lei natural, para o aquinate ela não é senão a
participação da lei eterna na criatura racional, ou seja, a lei eterna que é a
ordem divina, promulgada no homem por meio da razão natural. Deus ao
criar o homem e todo o universo colocou uma ordem em cada natureza,
através do que cada ser age de acordo com o fim da sua natureza e,
portanto, qualquer homem ao nascer está sujeito à lei e deve agir conforme
ela. Deus (...) concriou a lei natural aos seres que ele chamava à existência
e como o fato de existirem se dá por uma participação analógica com o ser
divino, assim também analogicamente participam da Sua lei eterna, pois a
regra da sua atividade está inscrita na própria essência e estrutura do seu
ser24.
Informa Lopes, que a preocupação com a dignidade e a liberdade humanas,
e os Direitos Humanos é tratada com grande destaque no trabalho de Aquino, pois:
“O valor da pessoa, sua liberdade, seus direitos, pertencem à ordem das coisas
naturalmente sagradas, marcadas pelo sinete do Pai dos seres, e que têm nele o
termo de seu movimento”25.
Assim, para Maritain, a ideia de que as pessoas humanas possuem uma
natureza comum, porque todas são frutos da obra de Deus, ajusta-se a ideia de que
há uma lei natural a indicar os propósitos de suas ações.
Portanto, segundo nosso filósofo cristão, há uma ordem superior das coisas,
que é prevalente até mesmo a formação social. Estas compõem regras de ouro da
natureza humana, verdadeiros dons para se fazer o bem e evitar o mal, capazes de
promover na sociedade a paz.
Como explica Maritain
24
LOPES, Jorge Filipe Teixeira. A filosofia jusnaturalista de São Tomás. Disponível em:
http://presbiteros.arautos.org/2013/09/a-filosofia-jusnaturalista-de-s-tomas/. Acesso em: 5 ago. 2016.
25
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed. Rio
de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. 1967, p. 17.
25
(...) há, uma virtude mesmo da natureza humana, uma ordem ou disposição
que a razão humana pode descobrir, e segundo a qual a vontade humana
deve agir a fim de se pôr de acordo com os fins necessários do ser humano.
A lei não escrita ou o direito natural não é outra coisa26.
E ele continua
A lei natural é uma lei não escrita. É uma lei não escrita no sentido mais
perfeito desta expressão. O conhecimento que dela temos não é obra de
uma livre conceptualização. Resulta de uma conceptualização ligada às
inclinações essenciais do ser, da natureza viva e da razão que se
encontram em ação no homem. É uma lei não escrita ainda porque se
desenvolve proporcionalmente ao grau da experiência moral e da reflexão
do homem sobre si mesmo, bem como da experiência social de que o
homem é capaz nas várias idades da sua história27.
Para Balera e Sayeg o cristianismo serve que como um auxílio para que a
humanidade progressivamente atinja maior consciência moral de sua conduta
comum, sendo que “ideia autentica da lei natural é uma herança do pensamento
greco-cristão”28.
Jesus Cristo vai além e, com sua mensagem de fraternidade universal,
instaura o humanismo antropofilíaco em face de todo o gênero humano, que
é decifrado para o direito em sua concepção de direito natural com os
ensinamentos aristotélicos de São Tomás de Aquino 29.
Na proposta do Humanismo Integral de Jacques Maritain, segundo um novo
humanismo solidário a ser concretizado num tipo original de cristandade secular e
não sacral, a ideia do Direito Natural a partir da cultura cristão tornou-se uma lei
impressa na essência da pessoa.
26
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução: Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. 1967, p. 59.
27
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 111.
28
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 100.
29
SAYEG, Ricardo; BALERA, Wagner. O capitalismo humanista. Filosofia humanista de Direito
Econômico. Petrópolis – RJ: KBR, 2011, p. 84.
26
Novamente Balera e Sayeg, a cosmovisão cultural apresentada pelo
cristianismo proclama que a dignidade humana abrange a igualdade de relações
entre os homens, pois esses não são apenas iguais, mas são irmãos entre si e todos
filhos do mesmo Deus 30.
Maritain adere esse humanismo antropofilíaco, ao mesmo tempo em que não
concorda com o absoluto individualismo da pessoa humana. Ele rebate
explicitamente as definições de humanismo individualista-burguês e antropocêntrico.
Afirmar que
Do ponto de vista do humanismo integral, está bem comprometido esse tipo
burguês de humanidade, e é merecida sua condenação (...) é preciso mudar
o homem burguês, sim; e por isto é mesmo também necessário mudar o
homem, sim, e é o que no fundo somente nos importa: quero dizer, no
sentido cristão, fazer desaparecer o homem velho e dar lugar ao homem
novo, que se forma lentamente – na história do gênero humano como em
cada um de nós – até a plenitude do tempo, e em quem se efetuam os
votos mais profundos de nossa essência. Exige, contudo essa
transformação, de um lado, que se respeitem as exigências da natureza
humana, e esta imagem de Deus, e este primado dos valores
transcendentes que permitem justamente e escorvam um renovamento; de
outro lado, que se compreenda que tal modificação não é obra do homem
sozinho, mas de Deus, em primeiro lugar, e do homem com ele. 31
Deste modo, ele se ocupa de tratar da Lei Universal da Fraternidade, ao
considerar
O amor é a plenitude da lei. É o amor que nos faz cumprir, verdadeira e
realmente, todos os outros mandamentos. Onde existe o amor, não há mais
servidão. Uni caritas et amor, ibi Deus est. O amor de caridade – o amor do
próximo, isto é, de todos os homens, amados em Deus e por Deus, e que
sendo por nós amados se tornam nossos próximos e como outros nós
mesmos (e este dois amores não são mais que um só e mesmo amor) – o
amor de caridade vai por si mesmo ao bem32.
30
SAYEG, Ricardo; BALERA, Wagner. O capitalismo humanista. Filosofia humanista de Direito
Econômico. Petrópolis – RJ: KBR, 2011, p. 84.
31
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradução Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 90-91.
32
PAULO, Santo. O pensamento vivo de São Paulo, apresentado por Jacques Maritain.
Tradução Oscar Mendes. São Paulo: Martins, Ed. da Universidade São Paulo, 1975, p. 69.
27
Destaca Balera e Sayeg
33
, ser o Humanismo Integral o mapa que decifra o
Direito Natural da fraternidade em favor do homem todo e de todos os homens, bem
como do planeta.
Como disse Maritain
A lei natural trata dos direitos e dos deveres que estão ligados de modo
necessário ao primeiro princípio: ‘faze o bem e evita o mal’. Eis o motivo por
que os preceitos da lei não escrita são, por si próprios ou pela natureza das
coisas (não me refiro ao conhecimento que os homens tenham deles),
universal e invariáveis. (...) Existe um dinamismo que impele a lei não
escrita a florescer na lei humana e a tornar essa última cada vez mais
perfeita e justa, no próprio campo das suas determinações contingentes.
Em concordância com esse dinamismo é que os direitos da pessoa humana
assumem forma política e social na comunidade34.
Ao explicar o pensamento de Maritain, diz Pozzoli
O cristianismo retoma o ensinamento judaico e grego, procurando aclimatar
no mundo, por meio da evangelização, a ideia de que cada pessoa humana
tem um valor absoluto no plano espiritual, pois Jesus chamou a todos para
a salvação. (...). Neste sentido, o ensinamento cristão é tido como um dos
elementos formadores da mentalidade que tornou possível o tema dos
direitos humanos.35
Ainda Balera e Sayeg
Inoculados dessa inspiração cristã, portanto, os direitos humanos
correspondem modernamente ao direito natural admitido pelos povos do
planeta, integrando a consciência universal que os afirma e não tem mais
dúvidas sobre sua existência e legitimidade36.
33
SAYEG, Ricardo; BALERA, Wagner. O capitalismo humanista. Filosofia humanista de Direito
Econômico. Petrópolis – RJ: KBR, 2011, p. 86.
34
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 114-118.
35
PAZZOLI, Lafayette. Humanismo - Dignidade da pessoa humana. Disponível em:
http://revista.univem.edu.br/index.php/emtempo/article/view/126/151. Acesso em: 21 abr. 2016.
36
SAYEG, Ricardo; BALERA, Wagner. O capitalismo humanista. Filosofia humanista de Direito
Econômico. Petrópolis – RJ: KBR, 2011, p. 94.
28
Assim, para Maritain os Direitos Humanos se referem à interpretação da Lei
Natural. Por conseqüência, a sociedade, ao promover e garantir as leis que
regularão as relações entre as pessoas deve atentar para que elas não estejam em
desacordo com o Direito Natural37.
Nesse contexto, em razão das exigências da vida política, há um apelo ao
ser humano para que se constitua conforme aquilo que a sua natureza lhe
indica, pelo que a lei natural pode ser determinada e precisada numa lei
positiva que cada circunstância social ou determinada época histórica
suscitam. Fica claro que essa contingência e precisão a que é sujeita a lei
natural não pode de forma alguma sujeitá-la a ponto de distorcer a razão do
seu fundamento. Uma lei positiva que não lhe seja conforme nunca poderá
ter o estatuto de lei38.
Conclui Maritain, ao dizer: “Estou plenamente convencido de que o meu
modo de justificar a crença nos direitos do homem e no ideal de liberdade, de
igualdade e de fraternidade é o único que se baseia na verdade”39.
Como assevera Amoroso Lima 40, no seu Preâmbulo41 a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, de 1948, está contida a filosofia política humanista
37
MOREIRA, Edson Fábio Garutti. Humanismo de Maritain e a burocracia. São Paulo: Loyola,
2001, p. 25.
38
LOPES, Jorge Filipe Teixeira. A filosofia jusnaturalista de São Tomás. Disponível em:
http://presbiteros.arautos.org/2013/09/a-filosofia-jusnaturalista-de-s-tomas/. Acesso em 5 ago. 2016.
39
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 93.
40
LIMA, Alceu Amoroso. Os direitos do homem e o homem sem direitos. Rio de Janeiro:
Francisco Alves, 1974, p. introdução.
41
Preâmbulo
Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e
seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.
Considerando que o desprezo e desrespeito pelos direitos do homem resultaram em atos bárbaros
que ultrajaram a consciência da Humanidade, e que o advento de um mundo em que os homens
gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da
necessidade,
Considerando ser essencial que os direitos do homem sejam protegidos pelo império da lei, para que
o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão,
Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos
fundamentais do homem, na dignidade e no valor de pessoa humana e na igualdade de direitos do
homem e da mulher, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em
uma liberdade mais ampla,
Considerando que os Estados Membros se comprometeram a promover, em cooperação com as
Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades fundamentais do homem e a
observância desses direitos e liberdades,
Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância
para o pleno cumprimento desse compromisso,
29
de Maritain que a inspirou e constitui a base de sua importância para a geração
presente e também para as gerações futuras.
Para Amoroso Lima, são sete os considerandos em que se baseia o
Preâmbulo. Primeiro informa que toda a filosofia deste Código, fundamental para
humanidade, é de base humanista, porque parte do reconhecimento da inerente
dignidade da pessoa humana e de que cada um em particular, com direitos iguais e
inalienáveis, acima de todas as distinções, constituem a unidade na diversidade,
(condição própria da humanidade). Essa unidade acima da pluralidade, mas sem
desprezo dessa, compõe a condição essencial para que as relações entre os
homens todos se realizem na base da liberdade, da justiça e da paz.
Da mesma forma, esse texto é a confirmação do regime democrático, ou
seja, da participação pessoal de cada membro de um povo na organização do seu
próprio regime político, como sendo aquele a que querer toda a humanidade. Ainda
como terceiro considerando, segundo Amoroso Lima o direito é redenção da força,
ao colocar a força sob seu domínio e a seu serviço, o que torna a coação um
elemento essencial do direito, quando este passa de sua formulação abstrata, como
justiça, para sua norma concreta e aplicada, como lei. Nesse sentido um Estado de
Direito espelha uma autoridade legal, baseada na justiça e nas leis.
Na sequencia o quarto ponto humanista refere-se ao espírito de
interdependia entre as nações do mundo. Em seguida exige-se mais que o mero
reconhecimento dos direitos fundamentais do homem, mas o efetivo respeito ao
progresso social e às condições de vida.
Agora, portanto,
A Assembleia Geral proclama a presente “Declaração Universal dos Direitos do Homem” como o ideal
comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e
cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e
da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas
progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua
observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados Membros, quanto entre
os povos dos territórios sob sua jurisdição.
30
O sexto considerando abordado por Amoroso Lima, revela-nos a Declaração
como “uma arma moral insubstituível e praticamente exequível” 42.
E por ser assim, um documento recheado por valores perenes e
inalienáveis, se mostra inteiramente capaz de iluminar e guiar os fatos, mas estes
não confundidos e nem mesmo confrontados com eles. Pois assim dialoga Amoroso
Lima com seu leitor ao dizer que “o plano das ideias é intrinsecamente superior ao
plano dos fatos. É esse um dos postulados, ou melhor, uma das conclusões do mais
sadio realismo. O mundo é uma realidade das ideias de Deus. Não de nossas
ideias” 43.
Nesta perspectiva autônoma do mundo dos valores, a Declaração, firmada a
10 de dezembro de 1948, não se dirige ao passado nem ao presente, mas
principalmente ao futuro. “O âmago e o sentido do profundo desse código de normas
de conduta individual e coletiva, em cada nacionalidade e nas relações entre elas,
visam a servir de roteiro para as perspectivas de uma nova era de civilização
universal e futura”44.
Desta forma, a Declaração de Direito não tem pretensão de ser encarada
como as “cartas do taro”, como que antecipando o futuro fictamente, pelo contrário,
ela tem sentido realista e mesmo imperativo, de um roteiro universal, baseado no
bom senso, na razão natural e na experiência histórica de todo o passado e o
presente da humanidade.
O espírito de universalidade e o reconhecimento da unidade da família
humana constituem a base de todo o documento, o que segundo o autor é sétimo
ponto prestigiado. Especialmente, no mundo moderno, que se encontra cada vez
mais uno em face do progresso da tecnologia. Fazer acontecer concomitantemente
o progresso tecnológico e o progresso moral e social é uma das finalidades
42
LIMA, Alceu Amoroso. Os direitos do homem e o homem sem direitos. Rio de Janeiro:
Francisco Alves, 1974, p. introdução.
43
LIMA, Alceu Amoroso. Os direitos do homem e o homem sem direitos. Rio de Janeiro: Livraria
Francisco Alves Editora, 1974, p. 22.
44
LIMA, Alceu Amoroso. Os direitos do homem e o homem sem direitos. Rio de Janeiro: Livraria
Francisco Alves Editora, 1974, p. 22.
31
precípuas do conjunto de normas de bem viver e conviver que a Declaração
representa.
Deste modo, todos os esforços para que todas as Nações, os povos e a
pessoas individualmente participem solidariamente, desse objetivo, é uma das
condições fundamentais para que essa Carta de Direitos não seja apenas uma
declaração, mas sim um compromisso de uma realidade existencial e natural da
humanidade.
Com a finalidade que esse código de normas se concretizasse os Estados
entenderam que era preciso dar efetividade aos valores reconhecidos na
Declaração, e então criaram três documentos: Pacto dos Direitos Civis e Políticos45,
Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais46 e Declaração e Programa de
Ação de Viena47.
A Declaração de Viena aponta como necessária a consciência global de ser
atingido um planeta de homens livres, iguais e fraternos, onde prospere a paz. Esse
planeta deve ser estruturado por uma ordem jurídica de Direitos Humanos que
prevalece sobre qualquer ordem jurídica nacional e internacional.
Proclama o item 8 da Declaração e Programa de Ação de Viena da
Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, de 1993: a democracia, o
desenvolvimento e o respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais são
conceitos interdependentes que se reforçam mutuamente.
45
Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Pacto internacional sobre Direitos Civis e Políticos.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm. Acesso em: 3 ago.
2016.
46
Decreto nº 591, de 6 de julho de 1992. Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0591.htm. Acesso
em: 3 ago. 2016.
47
Declaração e programa de ação de Viena, Conferência Mundial sobre Direitos Humanos
(AS/CONF. 157/12, de 12 de julho de 1993). Disponível em:
http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/viena.htm. Acesso em: 3 ago.
2016.
32
A Encíclica Pacem in terris, apesar ter tido sua publicação 15 anos
posteriores à Declaração, há concordância com esse documento internacional.
Segundo João XXIII, somente a dignidade do homem é capaz de desvendar a
ordem querida por Deus, que nos são revelados como: a verdade, a justiça, o amor
e a liberdade.
Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os
membros da família humana e seus direitos iguais e inalienáveis é o
fundamento da liberdade, da justiça e da paz do mundo. (1º preâmbulo da
Declaração Universal dos Direitos Humanos).
Neste sentido a filosofia da Declaração parte do reconhecimento da singular
dignidade de todos os homens e homem todo. Portanto o valor, ou seja, o fim
almejado como uma ação possível inserida neste documento é a dignidade da
pessoa humana.
Devemos, ainda, nos recordar que o Humanismo Integral traz a ideia de
solidariedade na fraternidade como centro de gravidade, elemento gravitacional de
união entre ela própria, a liberdade e a igualdade. Esse ideal está consagrado no
Artigo 1º da Declaração Universal de Direitos Humanos, 1948: “Art. I. Todos os
homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e
consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”.
Aliás, Balera, em texto sobre “Direitos de solidariedade configuram cidadania
mundial”, destaca
A solidariedade impõe atitudes de apoio, de atenção e de cuidados para
com os outros...exige abertura ao diálogo, à aceitação do outro e à
tolerância. (...) A dimensão da fraternidade (solidariedade) quer o diálogo
em torno de questões que são de interesse comum a todos os povos.
Assim, se coloca o direito à paz, pressuposto para o exercício dos demais
direitos humanos (...) Do mesmo modo se define o direito ao
desenvolvimento, que se caracteriza como a comum aspiração de todos a
um progresso econômico e social equitativo (...) Assim também se situa o
direito ao meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado (...) Por
fim, os direitos de solidariedade implicam na utilização do patrimônio
comum da humanidade mediante a configuração de novas bases de
33
convivência mundial, o que envolve a utilização moderada e adequada dos
recursos naturais48.
Como categoria jurídica constitucional, a fraternidade no Brasil é
reconhecida na Constituição Federal de 1988
49
, como valor, tal como consta no
Preâmbulo quanto nos objetivos de uma sociedade solidária. Ela também está
disposta como o objetivo de erradicação da pobreza e da marginalização, bem como
das desigualdades sociais e regionais. Igualmente esta positivada no capítulo do
meio ambiente ao prever a cooperação entre as gerações.
Assim, a ideia do Humanismo Integral, de Maritain, numa evidente referência
ao elemento central da solidariedade, se refere: ao reconhecimento da singular
dignidade do gênero humano e de cada pessoa; a consagração do regime
democrático mediante a participação de cada membro de um povo na organização
do seu próprio regime político; o direito como a redenção da força; a integração dos
homens e das Nações ligados segundo o espírito de interdependência; às boas
estruturas, instituições e leis para que o ser humano respeite e seja respeitado
quanto aos Direitos Humanos em todas as suas dimensões; o compromisso com os
interesses do coletivo, pois “o único conhecimento prático que os homens têm
natural e infalivelmente em comum é que é necessário fazer o bem e evitar o mal”
50
;
a universalidade e o reconhecimento da unidade da natureza humana.
48
BALERA, Wagner. Direitos de solidariedade configuram cidadania mundial. Disponível em:
http://www.conjur.com.br/2005-out-12/direitos_solidariedade_configuram_cidadania_mundial. Acesso
em: 28 jun. 2016.
49
Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988.
PREÂMBULO. Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte
para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como
valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias,
promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil,
de 5 de outubro de 1988.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras
formas de discriminação.
50
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed. Rio
de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. 1967, p. 60.
34
Concluímos, segundo Amoroso Lima, a síntese da Carta de Direito, de 1948,
ao mesmo tempo da ideia do Humanismo Integral, de que deve haver
Um esforço comum pela instalação de uma nova ordem moral e jurídica
internacional, efetivamente aplicada, que permita aos homens e às nações
conviverem pacificamente em regimes autônomos, mas substancialmente
unidos por normas impessoais, que garantam a liberdade e a justiça, no
respeito à dignidade de cada ser humano51.
1.3.1 Pessoa e dignidade humana
No humanismo, de Maritain, o homem é mais do que uma dimensão corpórea,
ele é uma presença espiritual sutil, que o torna insatisfeito de suas conquistas
puramente terrenas. Como escreveu Lima:
O nome pessoa é reservado às substancias que possuem essa coisa divina,
o espírito, e por isso constituem, cada uma por si só, um mundo, superior a
toda a ordem dos corpos, um mundo espiritual e moral que, propriamente,
não é uma parte desse universo e cujo segredo é inviolável, mesmo ao
olhar natural dos anjos (...). Ao passo que o nome de individuo é comum ao
homem, ao animal, à planta, ao micróbio, ao átomo. A pessoa existe para
Deus e a coletividade existe para a pessoa, isto é, para a sua cessão à vida
moral e espiritual e aos bens divinos52.
Mondin, ao compreender o homem como ser cultural, livre e espiritual, se
propõe a defini-lo como pessoa. Segundo suas palavras: “O nosso argumento se
propõe a definir a pessoa como ser subsistente na ordem do espírito. O homem,
como se viu, é espírito, mas é pessoa justamente porque subsiste do espírito”53.
51
LIMA, Alceu Amoroso. Os direitos do homem e o homem sem direitos. Rio de Janeiro:
Francisco Alves, 1974, p. introdução.
52
LIMA, Alceu Amoroso. Os direitos do homem e o homem sem direitos. Rio de Janeiro:
Francisco Alves, 1974, p. 14-15.
53
MONDIN, Battista. Definição filosófica da pessoa humana. Tradução Ir. Jacinta Turolo Garcia.
Bauru-SP: EDUSC, 1998, p. 26.
35
Na formulação de Jacques Maritain, em obra chamada “Os Direitos do
homem e a lei natural”, todo homem é pessoa humana.
Ao afirmar que o homem é uma pessoa, queremos significar que ele não é
somente uma porção de matéria, um elemento individual na natureza, como
um átomo, um galho de chá, uma mosca ou um elefante são elementos
individuais na natureza.54.
Ainda, seguindo a lição de Maritain
O homem é um animal e um indivíduo, porém diferente dos outros. O
homem é um individuo que se sustenta e se conduz pela inteligência e pela
vontade; não existe apenas de maneira física, há nele uma existência mais
rica e mais elevada, que o faz superexistir espiritualmente em conhecimento
e amor 55.
Ele completa: “Somos nascidos para tender à perfeição do amor, de um
amor que envolve realmente a universalidade dos homens, sem deixar lugar para o
ódio contra nenhum deles, e que transforma realmente nosso ser”56.
A partir do cristianismo se instaura a noção decisiva de pessoa humana, e
começa a ser defendido o seu valor como absoluto. Na Encíclica Mater et magistra,
de João XXIII, aliás, é conhecida a extrema relação do ser humano e a sua
realidade, a transcendência.
O cristianismo é, de fato, a realidade da união da Terra com o Céu, uma vez
que assume o homem, na sua verdade concreta de espírito e matéria,
inteligência e vontade, e o convida a elevar o pensamento, das condições
mutáveis da vida terrena até ás alturas da vida eterna, onde encontrará,
sem limites, a plenitude da felicidade e da paz (Ponto 2) 57.
54
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed. Rio
de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. 1967, p. 16.
55
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed. Rio
de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1967. p. 17.
56
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradução Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 88.
57
JOÃO XXIII. Mater et magistra. 15 de maio de 1961. Ponto 2. 13 ed. São Paulo: Paulinas, 2010.
36
Com isso, porque o homem possui um espírito, ele é um valor absoluto,
digno do mais profundo respeito. Ele compreende um elemento incorruptível, imortal,
que lhe assegura uma dignidade valorativa incondicional. Se ele fosse formado só
de carne e osso seria um valor instrumental, ou seja, somente um meio.
Essa posição foi defendida por Lafer ao escreve sobre este princípio
fundamental
O homem, e apenas ele, não pode ser empregado como um meio para a
realização de um fim, pois é fim de si mesmo, uma vez que, apesar do
caráter profano de cada indivíduo, ele é sagrado, já que na sua pessoa
pulsa a humanidade58.
Contudo a pessoa humana não é o Absoluto, o Ser Supremo, o Infinito, o
Imortal. “Ele é absoluto na ordem axiológica, não na ordem ontológica”
59
. Assim,
retomando Maritain, apesar de um ser mortal o homem é dotado de valor absoluto
porque deriva de Deus, por isto descobre o fundamento do próprio valor.
Como diz Marcoccia, por que: “O homem é filho de Deus. Sendo Deus um
valor absoluto, fundamento de todos os valores, consequentemente também quem
se torna participante de sua natureza divina goza de sua mesma dignidade, de seu
absoluto valor”60.
Com a argumentação de que o entendimento atual da dignidade da pessoa
humana possui origens religiosas e filosóficas, Barroso conceitua: “A dignidade
humana, como atualmente compreendida, se assenta sobre o pressuposto de que
58
LAFER, Celso. A reconstrução dos Direitos Humanos: um diálogo com o pensamento de
Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p. 117.
59
MARCOCCIA, Rafael Mahfoud. O humanismo integral e a centralidade da pessoa. In: SOUZA,
Carlos Aurélio Mota; CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas constitucionais:
reflexões sobre o humanismo do século XXI. São Paulo: Letras jurídicas, 2010, p. 307.
60
MARCOCCIA, Rafael Mahfoud. O humanismo integral e a centralidade da pessoa. In: SOUZA,
Carlos Aurélio Mota; CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas constitucionais:
reflexões sobre o humanismo do século XXI. São Paulo: Letras jurídicas, 2010, p. 308.
37
cada ser humano possui um valor intrínseco e desfruta de uma posição especial no
universo”61.
A dignidade da pessoa é fundada sobre aquilo que ela é enquanto tal. Deste
modo o valor da vida humana ou da pessoa humana é incomensurável: o seu valor
intrínseco não depende e não é acrescido por outra qualidade. De fato, toda a
grandeza do homem lhe provém do fato de ser pessoa.
Deste modo, a natureza humana é composta de matéria, corpo, razão e
transcendência. O Humanismo Integral exige esse humanismo inteiro, sem que haja
qualquer redução. É necessário compreender o homem a partir do princípio do
Criador, sendo Deus o ato puro, o Absoluto, aquilo que não se pode definir.
Numa concepção tomista, natureza pode designar a essência humana.
Segundo Lopes
A palavra natureza designa a essência humana, o que quer dizer que não
se refere somente à percepção sensorial, num sentido empírico da
observação, mas a uma certa essência inteligível destacada da experiência.
A natureza humana tem uma capacidade própria da sua natureza de
conhecer o mundo que a rodeia, transcendendo-o, entretanto, pela sua
inteligibilidade e abstração. Por outro lado, as exigências da natureza têm
uma força de lei em razão da lei eterna, pois é a razão divina a única
criadora da lei natural e reguladora dessa lei na razão humana, donde se
pode compreender o caráter sagrado dessa mesma lei.
Os preceitos da lei natural (...) são lhe conhecidos através de uma
inclinação ou conaturalidade. E por lhe serem assim conhecidos, a razão
humana não intervém na sua idealização, pois ela, a lei natural, tem por sua
única razão de existência a razão divina 62.
Dentro
do
contexto
da
dignidade
da pessoa
e
sua relação
de
interdependência com o mundo criado por Deus, a natureza também está associada
à emergência da vida. Com Landim, pode-se dizer
61
BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no direito constitucional
contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. Tradução
Humberto Laport de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 14.
62
LOPES, Jorge Filipe Teixeira. A filosofia jusnaturalista de São Tomás. Disponível em:
http://presbiteros.arautos.org/2013/09/a-filosofia-jusnaturalista-de-s-tomas/. Acesso em: 5 ago. 2016.
38
A natureza é a mãe de todos os entes finitos. Cada ente recebe uma
natureza própria e individual. As naturezas são organizadas segundo uma
ordem de dignidade, formando a ‘scala rerum’. Diz Tomás de Aquino:
‘Nenhuma coisa natural, nem os elementos que naturalmente pertencem às
coisas, podem existir fora da ordem’. Portanto, a ordem surge da
constituição ontológica de cada ente: ‘A natureza é a causa da ordem’. Por
isso, o lugar de cada ente na scala rerum é estabelecido a partir da menor
para a maior perfeição ontológica. Assim escreve São Tomás: “As coisas
que só têm vida, como as plantas, existem em função dos animais e estes
existem para o homem’, ‘No universo, só o homem como criatura inteligente
existe para si mesmo; todas as outras coisas existem para ele’. Ademais,
todos os seres possuem uma natureza análoga à dos outros e todos se
referem ao princeps analogatus, Deus, criador de tudo.
A ordem natural e hierárquica funda e cria uma solidariedade cósmica, da
qual o homem, como o único ser inteligente e livre, é o principal
responsável. Ele é o ser ético por excelência e o líder da criação. Ele,
porém, não pode destinar as coisas segundo sua vontade; pelo contrário, é
a ordem hierárquica das coisas, estabelecida por Deus, que determina ao
homem os comportamentos e as atitudes básicos que ele deve adotar face
aos seres naturais. Isto é, o homem deve ter uma atitude justa e condizente
com a natureza de cada ente. Por isso, segundo Santo Tomás, toda a ética
poderia ser organizada a partir do conceito de justiça, tomado como o
esforço do homem de respeitar cada coisa em seu nível ontológico,
segundo a ordem natural, criada por Deus63.
Em comunhão com essa colocação, nos propõe Francisco
Nós e todos os seres do universo, sendo criados pelo mesmo Pai,
estamos unidos por laços invisíveis e formamos uma espécie de família
universal, uma comunhão sublime que nos impele a um respeito sagrado,
amoroso e humilde (Ponto 89) 64.
Dentro da noção de dignidade própria e diferenciada da pessoa encontra-se
alinhada a proteção da natureza. Sarlet sustenta
Sempre haverá como sustentar a dignidade da própria vida de um modo
geral, ainda mais numa época em que o reconhecimento da proteção do
meio ambiente como valor fundamental indicia que não mais está em causa
apenas a vida humana, mas a preservação de todos os recursos naturais,
incluindo todas as formas de vida existentes no planeta, ainda que se possa
argumentar que tal proteção da vida em geral constitua, em última análise,
exigência da vida humana e de uma vida humana com dignidade, tudo a
63
LANDIM, Maria Luiza P.F. A relação homem-natureza em Tomás de Aquino e na modernidade. In:
STEIN, Ernildo. (org.) A cidade dos homens e a cidade de Deus. Porto Alegre: EST, 2007, p. 79.
64
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 89. São Paulo: Paulus, 2015.
39
apontar para o reconhecimento do que se poderia designar de uma
dimensão ecológica ou ambiental da dignidade da pessoa humana65.
Segue Sarlet
Verifica-se, portanto, que também nessa perspectiva a dignidade da pessoa
humana (independentemente, no nosso sentir, de se aceitar, ou não, a tese
da dignidade da vida não humana) há de ser compreendida como um
conceito inclusivo, no sentido de que a sua aceitação não significa
privilegiar a espécie humana acima de outras espécies, mas sim, aceitar
que do reconhecimento da dignidade da pessoa humana resultam
obrigações para com outros seres e correspondentes deveres mínimos e
análogos de proteção66.
Não perdendo de vista, a proposta de Maritain, de que o homem é um ser
espiritual encarnado. Nele há uma conjunção, uma dupla perspectiva: a matéria e o
espiritual. O corpo é necessário para o espírito, porque é através dele que o homem
ocupa um lugar no espaço e no tempo, e pode desenvolver as mais diversas
atividades em prol de seu desenvolvimento, a vista de que “o progresso não é o
resultado de uma simples concatenação de causa e efeito, mas é, sobretudo, um
esforço de liberdade”67.
Matéria e espírito são substâncias incompletas, que sozinhas não são
capazes de ser pessoa. Apenas as duas substâncias incompletas, unidas entre si
tão fortemente são capazes de compor uma única substância existente por conta
própria, ou seja, a pessoa. Dessa complexidade, derivam algumas características,
enumeradas
num
rol
não
taxativo:
a
inalienabilidade,
a
completude,
a
intencionalidade e relacionalidade.
A primeira característica é a inalienabilidade. A pessoa não pode ser
anulada por nada. Disto decorre a sua irrepetibilidade, ou seja, uma pessoa é única
65
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade (da pessoa) humana e direitos fundamentais na
Constituição Federal de 1988. 10. ed. Porto Alegre: 2015, p. 42.
66
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade (da pessoa) humana e direitos fundamentais na
Constituição Federal de 1988. 10. ed. Porto Alegre: 2015, p. 43.
67
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros,
2015, p. 61.
40
na sua singularidade. Em seguida, o segundo aspecto é a completude, e, portanto,
“é assim de algum modo um todo, e não somente uma parte, é em si mesmo um
universo, um microcosmo”68.
A terceira e a quarta características são a intencionalidade e a
relacionalidade, que apontam, respectivamente, a abertura para o mundo e para os
outros no qual o homem “pelo amor pode dar-se livremente a seres que são como
outras tantas encarnações de si próprias” 69.
Como escreveu Maritain, “a pessoa é um todo, mas não um todo fechado. É
um todo aberto (...) que por sua própria natureza tende para a vida social e para a
comunhão”
70
. Há, portanto, verdadeira compatibilidade entre a pessoa humana e a
sociedade. Daí que, João XXIII, assinalou
Em uma convivência humana bem constituída e eficiente, é fundamental o
princípio de que cada ser humano é pessoa; isto é, natureza dotada de
inteligência e vontade livre. Por essa razão, possui em si mesmo direitos e
deveres, que emanam direta e simultaneamente de sua própria natureza.
Trata-se, por conseguinte, de direitos e deveres universais, invioláveis e
inalienáveis. 71 (Ponto 9)
1.3.2 Sociedade e solidariedade
No Humanismo de Maritain a dignidade não é atribuía a pessoa, apenas no
seu individualismo, mas inserida na sua vocação de ser social, para encarnar-se no
ideal de uma sociedade fraterna e solidária.
68
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a Lei Natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1967, p. 17.
69
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a Lei Natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1967, p. 17.
70
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a Lei Natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1967. p. 19.
71
JOÃO XXIII. Pacem in Terris. 11 de abril de 1963. Ponto 9. 6. ed. São Paulo: Paulinas, 2004.
41
Este novo humanismo, sem medida comum com o humanismo burguês, e
tanto mais humano quanto menos adora o homem, mas respeita realmente
e efetivamente a dignidade humana e dá direito às exigências integrais da
pessoa, nós o concebemos como que orientado para uma realização socialtemporal desta atenção evangélica ao humano, a qual não deve existir
somente na ordem espiritual, mas incarnar-se, e também para o ideal de
uma comunidade fraterna.72
Passos significativos nesse sentido foram dados anteriormente na doutrina
do Período Clássico, na Grécia Antiga, como na obra “Política”, Aristóteles conclui
que “o homem é por natureza, um animal social”73 e, posteriormente Cícero, ao
escrever “Da república” afirma que “a primeira causa de agregação de uns homens a
outros é menos a sua debilidade do que um certo instinto de sociabilidade a outros
em todos inatos”74 a vista de que “a espécie humana não nasceu para o isolamento
e para a vida errante, mas com uma disposição que, mesmo na abundancia de
todos os bens, a leva a procurar o apoio comum”
75
.
Mais adiante, na Idade Moderna, esse modo de entender a essência dos
homens também foi partilhado por Locke, para quem Deus os criou como seres
sociáveis, inclinados naturalmente a viver em paz e assistência mútua 76.
Não muito distante, no século XX, a visão sociável da natureza humana foi
também abordada por Chevallier, ao testemunhar que a ampla liberdade de
disporem de si mesmos e de seus bens, nela não está incluído o direito de atacar ou
destruir outra criatura, a não ser para se defender, dado que não há hierarquia,
assim todos são iguais e ninguém deve lesar o outro em sua vida, sua saúde, sua
liberdade ou seus bens, pois todos são obra de um único Criador77.
72
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradução Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 6.
73
ARISTÓTELES. Política. 3. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1985, par. 1253a.
74
CÍCERO, Marco Tulio. Da república. São Paulo: Abril Cultural, 1973, Livro I, par. XXV.
75
CÍCERO, Marco Tulio. Da república. São Paulo: Abril Cultural, 1973, Livro I, par. XXV.
76
LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo civil e outros escritos: ensaios sobre a
origem, os limites e os fins verdadeiros do governo civil. 3. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2001, p. 84.
77
CHEVALLIER, Jean-Jacques. História do pensamento político: o declínio do Estado-Nação
Monárquico. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 1983, p. 42-43.
42
Ao que parece, segundo os filósofos ora citados, o homem está fundado na
fraternidade e proximidade como uma relação pela qual o outro é trato como nós
mesmo. Convence seus argumentos, que a pessoa sente uma necessidade de
encontrar-se em relação com as outras pessoas para satisfação de sua vida
material, intelectual e moral. Igualmente esta relação tem como causa a
generosidade radical inscrita no próprio ser da pessoa, como universo aberto às
comunicações da inteligência e do amor, que não pode estar só.
A sociabilidade é a consequência imediata das faculdades mais ligadas ao
homem, que são o conhecimento, a corporeidade, a linguagem, a liberdade e o
amor. Portanto, a estrutura social é um dado original da natureza da pessoa
humana.
Como
prolongamento
necessário
desse
estado
natural,
observa
Sevegnani
A natureza humana está biológica e sensitivamente impregnada por valores
de solidariedade, de forma a conduzir o homem, não para uma vida egoísta
e voltada unicamente ao bem próprio, mas para uma compreensão da sua
dimensão universal, que compreende a sua individualidade única e a sua
sociabilidade inata 78.
No campo da biologia, na obra “A origem do homem e a seleção sexual”,
segundo as observações de Darwin, as emoções mais complexas são comuns aos
animais superiores e aos homens, e que os animais amam e compartilham
sofrimento de seus semelhantes, como também estendem sua compaixão a outras
espécies, o que confere a capacidade de sobrevivência ao mais apto como aquele
capaz de estabelecer cooperação, reciprocidade e simbiose79.
Maritain aceita o evolucionismo biológico, ao acreditar na integração entre o
tempo e a eternidade. Amoroso Lima exprimiu com muita propriedade esse
entendimento do filósofo ao dizer que “seu Hino à Matéria é uma página maravilhosa
78
SEVEGNANI, Joacir. A solidariedade social no estado constitucional de direito no Brasil. Rio
de Janeiro: Lúmen Juris, 2014, p. 15.
79
DARWIN, Charles. A origem do homem e a seleção sexual. São Paulo: Hemus, 1974, p. 123142.
43
sobre a presença de Deus no tempo e nas criaturas, sem qualquer espécie de
imanentismo” 80.
A concepção da sociabilidade da pessoa está presente no Artigo 1º da
Declaração Universal dos Direitos Humanos, segundo Sanfelice
O homem não pode considerar apenas a sua existência individual. Deve
sempre perceber que, enquanto homem, permanece em contínua com seus
semelhantes, e tais relacionamentos devem se desenvolver fraternalmente.
Ou seja: o reconhecimento e o respeito à alteridade devem imperar nas
relações humanas81.
Nesse viés, o homem é uma espécie social e solidária, no qual sua
coexistência é uma condição primária, porque o “significado da vida é formar
relações com outros para sentir, de maneira mais profunda possível, a realidade da
existência”
82
. Ao integrar-se na convivência social, ele deixa de adotar uma atitude
passiva, para assumir deveres para com todos e tudo, porque “a comunidade com o
próximo começa nas minhas obrigações com a sua segurança, seu resguardo. O
próximo é irmão” 83.
A pessoa nasce livre e igual em dignidade. A vida em sociedade é uma
expansão natural do seu ser para a solidariedade e para maior garantia dos seus
direitos e cumprimento de seus deveres, pela existência de um regime institucional e
jurídico. Assim, a pessoa constitui a sociedade como protetora dos seus direitos e
palco de seus deveres, para a crescente expansão de sua personalidade, de sua
essência.
80
LIMA, Alceu Amoroso. Jacques Maritain, por Alceu Amoroso Lima. In: PUSSOLI, Lafaiete; LIMA,
Jorge da Cunha (coord.). Presença de Maritain (Testemunhos). São Paulo: LTr, 1995, p. 42-43.
81
SANFELICE, Patrícia de Mello. Artigo I. In: BALERA, Wagner (coord.). Comentários à Declaração
Universal dos Direitos Humanos. 2 ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 17.
82
SEVEGNANI, Joacir. A solidariedade social no estado constitucional de direito no Brasil. Rio
de Janeiro: Lúmen Juris, 2014, p. 14.
83
MONDIN, Battista. Definição filosófica da pessoa humana. Tradução Ir. Jacinta Turolo Garcia.
Bauru-SP: EDUSC, 1998, p. 33.
44
Acredita Sevegnani, que Jacques Maritain é um pensador que contribui para
a formulação de um solidarismo conformado à realidade atual com seu Humanismo
Integral, vez que esse edifica sobre as bases da pessoa humana, conferir-lhe a
dignidade, partindo de uma proposta integradora que reúne, especialmente, a
liberdade da pessoa e o bem comum.
Do que se entende
O solidarismo configura-se hodiernamente como o sistema social e político
que erigido sobre os princípios da solidariedade social, do bem comum, da
liberdade, da subsidiariedade e da dignidade da pessoa humana, tem por
objetivo proporcionar uma convivência humana que, respeitando a
individualidade da pessoa, atribui-lhe, juntamente com o Estado, a
responsabilidade pelo bem-estar da coletividade84.
Daí decorre, de que a acepção de solidariedade não se confunde com a
caridade e o assistencialismo. A solidariedade somente poderá ocorrer numa
relação de equilíbrio e partilha que une as pessoas umas as outras. Num diálogo
entre o Papa Francisco, o Rabino Abraham Skorka e Marcelo Figueroa, fica clara a
sua dimensão de corresponsabilidade
A finalidade da solidariedade é a inclusão, que pode ser comparada a um
abraço real, pois “em toda a sociedade no qual existem indigentes de toda
espécie (...) esse ser que está jogado com a mão estendida, em essência,
tem um problema enorme de afeto (...). Quando alguém está totalmente
jogado e quebrado, é difícil dar-lhe o abraço, é difícil ele aceitar o carinho. É
preciso dar uma estrutura muito mais complexa. (...) Eu tenho que começar
a lhe dar carinho, dar-lhe força, dar-lhe oportunidades, incluí-lo no sistema,
e depois dizer: ‘Agora estamos iguais, eu não estou em pé nem você jogado
no chão’. Agora o abraço é uma coisa diferente, meu coração já está na
mesma frequência que o seu, não é um coração desesperado 85.
84
SEVEGNANI, Joacir. A solidariedade social no estado constitucional de direito no Brasil. Rio
de Janeiro: Lúmen Juris, 2014, p. 132.
85
BERGOGLIO, Jorge Mario, SKORK, Abraham, FIGUEROA, Marcelo. A solidariedade. Tradução
Sandra Martha Dolinsky. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 8.
45
No mesmo sentido, a solidariedade possui uma estreita relação com a
fraternidade, mas não se confunde com esta.
Defende Balera
A expressão fraternidade originalmente inscrita na terminologia dos
revolucionários, não naturalmente carregada com o sentido moral de que se
acha revestida foi, a pouco e pouco, adquirindo expressão jurídica, trata-se
agora da solidariedade, modo de ser jurídico da fraternidade 86.
Na lição de Sevegnani a fraternidade poder ser entendida como um valor,
enquanto a solidariedade como um princípio:
A fraternidade pode ser concebida como a razão primeira e mais profunda a
motivar as relações sociais. Nesta perspectiva, afigura-se como um valor
que guia toda a convivência humana. Os documentos constitucionais têmlhe atribuído, com frequência, uma configuração valorativa, como forma de
servir de base antropológica a todo o ordenamento jurídico, mas sem um
caráter normativo. Por outro, lado como uma derivação da fraternidade, a
solidariedade social consolidou-se como norma jurídica diretiva,
fundamentadora de princípios e regras ou de eficácia normativa imediata 87.
Conforme Machado a fraternidade não pode ser compreendida nos
apertados limites de uma solidariedade vertical, baseada exclusivamente na
intervenção direta dos Estados para somente socorrer determinadas necessidade de
setores menos favorecidos da sociedade, mas o que se prende é uma dimensão
horizontal da solidariedade, que consiste na responsabilidade de socorro mútuo
entre membros de uma mesma família, geradas pelos mesmo Criador – Deus 88.
86
BALERA, Wagner. Direito ao desenvolvimento. Disponível em:
<http://www.cjlp.org/direito_ao_desenvolvimento.html>. Acesso em: 10 abr. 2016.
87
SEVEGNANI, Joacir. A solidariedade social no estado constitucional de direito no Brasil. Rio
de Janeiro: Lúmen Juris, 2014, p. 59.
88
MACHADO, Carlos Augusto Alcântara. A fraternidade como categoria constitucional. In: SOUZA,
Carlos Aurélio Mota de; CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas
constitucionais: reflexões sobre o humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p.
106.
46
Ao cogitar sobre a fraternidade, convém abrir necessário parêntese sobre as
dimensões dos Direitos Humanos.
Das distintas dimensões dos Direitos Humanos é consenso identificá-las
com a tríade da Revolução Francesa – liberdade, igualdade e fraternidade. Esses
três valores condensam o que pode ser chamado de bem comum. Conforme, Guerra
Filho é melhor se falar em dimensões por que
Os direitos ‘gestados’ em uma geração, quando aparecem em uma ordem
jurídica que já trás direitos da geração sucessiva, assumem uma outra
dimensão, pois os direitos de geração mais recente tornam-se um
pressuposto para entendê-los de forma mais adequada – e,
consequentemente, também melhor realizá-los89.
Em combinação com essa noção, Sidney Guerra explica
Os direitos humanos são apresentados, por grande parte da doutrina, por
gerações ou dimensões. Essa abordagem é interessante para demonstrar
como se desenvolveram os direitos humanos e a necessidade de serem
todos observados (não apenas os direitos civis e políticos) para o
reconhecimento da dignidade. (...) podem ser apresentados os direitos
humanos de primeira, segunda e terceira gerações90.
Prossegue o autor
Quanto aos direitos de terceira geração, também denominados diretos dos
povos, direitos de solidariedade ou direitos de fraternidade, surgem como
resposta à dominação cultural e como reação ao alarmante grau de
exploração não mais da classe trabalhadora dos países industrializados,
mas das nações em desenvolvimento e por aquelas já desenvolvidas, bem
como pelos quadros de injustiça e opressão no próprio ambiente interno
dessas e de outras nações revelados mais agudamente pelas revoluções de
descolonização ocorridas após a Segunda Guerra Mundial. Atuam ainda
como afirmação contemporânea de interesses que desconhecem limitações
de fronteiras, classe ou posição social e se definem como direitos globais ou
89
GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais. 6. ed. São
Paulo: SRS Editora, 2009, p, 43.
90
GUERRA, Sidney. Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 63-64.
47
de toda a Humanidade. Fala-se também do direito à
autodeterminação dos povos e ao meio ambiente equilibrado 91.
paz,
à
Fechamos, com a citação acima, nossa observação.
Como deve ter ficado evidente, pelo exposto até aqui, a solidariedade é o
que move a prosperidade material e riqueza espiritual das vidas individuais e
coletivas de todos os membros da sociedade humana, ou seja, é ela quem move o
bem comum. Sem a solidariedade, na comunidade, na família, na sociedade política,
no Estado não se chega a esse objetivo.
A família é o primeiro círculo de sociedade natural da pessoa. No convívio
caseiro as experiências e os conhecimentos são transmitidos por vontade livre de
geração em geração.
O segundo círculo é o da sociedade política. A sociedade é fruto do trabalho
da razão e da vontade, e livremente consentida pela pessoa, por isto não lhe é
externa, nem lhe é superior. Assim acontece porque a “sociedade é um todo cujas
partes são em si mesmas outros todos, e é um organismo feito de liberdades, não
de simples células vegetativas” 92, como igualmente forma-se como algo exigido pela
natureza93.
Na perspectiva da construção de uma sociedade justa e fraterna, segundo
Garutti Moreira “o fim da pessoa humana, ao menos durante a vida terrena, é utilizar
sua liberdade, respeitando os outros, e desenvolver, assim, cada vez mais, seu
espírito” 94.
91
GUERRA, Sidney. Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 68.
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed. Rio
de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1967, p. 19.
93
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed. Rio
de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. 1967, p. 18.
94
MOREIRA, Edson Fábio Garutti. Humanismo de Maritain e a burocracia. São Paulo: Loyola,
2001, p. 28.
92
48
Contudo, para Maritain, a rigor dos seus princípios de Filosofia Política,
distingue a noção de comunidade e sociedade, para atribuí-las a duas espécies de
grupos sociais. Neste sentido ele afirma
Tanto a comunidade como a sociedade são realidades éticos-sociais,
verdadeiramente humanas, e não apenas realidades biológicas. Uma
comunidade, porém, é mais uma obra da natureza, estando assim mais
próxima do plano biológico; uma sociedade é, antes, uma obra da razão,
relacionando-se mais estreitamente com as propriedades intelectuais e
espirituais do homem. Para compreender essa distinção, devemos recordar
que a vida social, como tal, reúne os homens por motivo de certo objeto
comum. (...). Em uma comunidade, o objeto é um fato que precede as
determinações da inteligência humana e da vontade, objeto esse que atua
independente delas, para criar uma psique inconsciente comum, estruturas
psicológicas e sentimentos comuns, assim como costumes comuns. Mas,
em uma sociedade, o objeto é uma tarefa a ser feita ou um fim a ser
atingido, que dependem das determinações da inteligência e da vontade
humanas e são precedidas pela atividade, seja uma decisão, seja pelo
menos um consentimento da razão dos indivíduos95.
A sociedade política existe para o homem, e não o contrário. Ela visa uma
finalidade própria, diferente da soma dos interesses individuais, que consiste no bem
comum de seus membros.
1.4 O bem comum
Segundo exposto por Balera96, na aula ministra sobre “Bem comum,
humanismo e direitos humanos”, o bem nos Direitos Humanos não é uma coisa. Ele
é na verdade algo que pertence ao homem. É uma virtude inerente a pessoa
humana, que nasce e morre com ela. Assim, tirar o bem do homem é retirar o
próprio homem, é aniquilá-lo.
95
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 11-12.
96
BALERA, Wagner. Bem comum, humanismo e direitos humanos. Aula ministrada na Pontifícia
Universidade católica de São Paulo (PUC-SP), 19 de agosto de 2015, Pós Graduação de Direito,
área de Direitos Humanos.
49
Sobre a virtude, vale lembrar as palavras de Aristóteles
Costuma-se dizer que nada há que acrescentar nem tirar nas coisas bemfeitas, considerando-se que o excesso ou a falta destrói a perfeição e a
justa medida a conserva (...). E a virtude que é mais perfeita e melhor que
toda a arte, do mesmo modo que a natureza, tenderá para o meio. (...).
Chamo meio da coisa o igualmente distante dos extremos, que é um e
idêntico para todos, meio a respeito de nós, o que não é excesso nem falta.
E este não é único nem idêntico para todos97. (ARISTÓTELES, III)
Ainda, para Aristóteles
A virtude é uma disposição adquirida voluntariamente, consistindo, em
relação a nós, em uma medida, definida pela razão conforme a conduta de
um homem que age refletidamente. Ela consiste na medida justa entre dois
extremos, um pelo excesso, outro pela falta.98 (ARISTÓTELES, VI)
Segundo Aristóteles, existe uma categoria que é a virtude. Essa virtude está
em nível ético, e por excelência é a justiça. Por conseguinte, a justiça é a equidade,
a moderação, e o afastamento do excedente. Assim, o ser humano dotado de
prudência e habituado ao exercício de tal, encontra no justo meio entre os extremos
de seus atos e decisões a virtude.
Em um sentido ético, a virtude é uma qualidade positiva do indivíduo que
faz com que este aja de forma a fazer o bem para si e para os outros. [...]
Na filosofia moderna, a palavra "virtude" passou a designar a força da alma
ou do caráter. Neste sentido moral, designa uma disposição moral para o
99
bem. [...] a coragem, a justiça, a lealdade .
97
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução Edson Bini. 3. ed. Bauru-SP: Edipro, 2013,
Aristóteles, III.
98
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução Edson Bini. 3. ed. Bauru-SP: Edipro, 2013,
Aristóteles, VI.
99
JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. Rio de Janeira: Zabar,
1996, p. 271.
50
Novamente, com o apoio em Balera100, o bem está numa dimensão
individual. Contudo numa relação humanista é imprescindível saber qual é o bem do
outro, e assim não impor aquilo que é apenas o meu bem como uma medida.
Portanto, nessa forma de relação social é objetivo do Estado o bem comum, ou seja,
promover o bem de todos.
O bem comum é definido como um pensamento político católico, base da
Doutrina Social da Igreja. Do ponto de vista filosófico, os seus maiores teóricos são
Tomás de Aquino e Maritain.
Tomás de Aquino101 nasceu no castelo de Roccasecca, perto de Aquino
(Reino das Duas Sicílias), em 1225. Estudou teológica inicialmente sob a orientação
dos monges beneditinos da Abadia de Montecassino e, em 1244, ingressou na
Ordem dos Dominicanos. No ano de 1259, tornou-se doutor em teologia, e lecionou
em várias cidades da Itália. Neste país faleceu em 07 de março de 1274, no
convento dos Cistercienses de Fossanova, com 49 anos de idade.
Nos seus estudos se empenhou em ordenar o saber teológico e moral
acumulado na Idade Média. Foi influenciado pelos filósofos gregos Platão e
Aristóteles, os árabes e judeus, escolásticos e especialmente por Santo Agostinho e
mais ainda, por Alberto Magno, seu mestre.
Em 1231, com maior relevo em Paris, houve intensos conflitos intelectuais,
que opunha o conhecimento pela fé ao conhecimento pela razão. Esses se
intensificam com a divulgação da filosofia aristotélica, isto porque à primeira vista,
Aristóteles ignorava as noções de Deus criador e providente, bem como as de alma
imortal, queda e redenção do homem, todas fundamentais à doutrina cristã.
Em face da aparente distancia dos dogmas cristãos, a filosofia aristotélica
ganhou adeptos. Desde então, e segundo as ordens do Papa Gregório IX, as obras
100
BALERA, Wagner. Bem comum, humanismo e direitos humanos. Aula ministrada na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), 19 de agosto de 2015, Pós-Graduação de Direito,
área de Direitos Humanos.
101
STO. TOMÁS DE AQUINO. Sto. Tomás de Aquino – vida e obra. Bauru-SP: Nova Cultura, 1996,
p, 5-13.
51
do filósofo grego passariam por aquilo que foi chamado cristianização da filosofia
aristotélica, realizado por Tomás de Aquino. Este foi o ponto de partido para o
tomismo, cuja obra consistiu, graças à capacidade de ordenação metódica e
habilidade dialética do teólogo, a revelação cristã do pensamento de Aristóteles.
O termo bem comum é de origem medieval. Tomás de Aquino contribuiu
para o seu entendimento à medida que afirmou
Há muitas coisas na vida da sociedade em que é necessário que todos
procedam segundo a mesma norma, sendo que lei civil, que deve assegurar
a ordem, estabelecer a concordância entre os esforços de todos, e criar um
ambiente favorável para que cada um exerça a sua actividade em vista do
seu fim último 102.
Ao transmitir seu pensamento Aquino nos indica que a lei civil tem como
fundamento a Lei Natural, e por isso seu papel é auxiliar àqueles que compõem a
sociedade na obtenção do seu fim último (bem comum), não se esquecendo de que
a pessoa não pode privar os outros do bem que por natureza lhes pertence, como
ainda nenhuma sociedade pode desprezar os direitos de outras sociedades.
Maritain é o defensor da dignidade da pessoa humana enquanto construtora
de um sistema social e político fundado no ideal do bem comum efetivamente
participado por todos os homens e mulheres que compões a sociedade 103.
Por sua vez, o bem comum numa relação humanista encarna a ideia do
Humanismo Integral, de Maritain
O bem comum da cidade não é nem a simples coleção dos bens privados,
nem o bem próprio de um todo (...) que somente diz respeito a si próprio e
sacrifica as partes em seu proveito; é a boa vida humana da multidão, de
uma multidão de pessoas, isto é, de totalidade a um tempo carnais e
espirituais. (...) O bem comum da cidade é sua comunhão no bem-viver; é,
pois, comum ao todo e às partes, quero dizer às partes como todas elas
102
BARROS, Manuel Corrêa. Lições de filosofia tomista. Porto: Livraria Figueirinhas, 1945, p. 378.
SANTOS. Francisco de Araujo. Humanismo de Maritain no Brasil de hoje. Ciência, arte e
sociedade. São Paulo: Loyola, 2000, p. 16.
103
52
próprias, porquanto a noção mesma de pessoa significa totalidade; é
comum ao todo e às partes, sobre as quais ele transborda e as quais devem
tirar proveito dele 104.
Segue Maritain
Ele implica e exige o reconhecimento dos direitos fundamentais da pessoa;
e comporta como valor principal a mais larga possibilidade de acesso (isto
é, compatível com o bem do todo) das pessoas à sua vida de pessoa e à
sua liberdade de expansão.
Assim aparece um primeiro caráter essencial do bem comum: ele implica
uma redistribuição, deve ser redistribuído às pessoas e ajudar o seu
desenvolvimento.
O segundo caráter diz respeito à autoridade na sociedade. O bem comum é
o fundamento da autoridade, pois, a fim de conduzir uma comunidade de
pessoas humanas para seu bem comum, para o bem do todo como tal, é
mister que alguns em particular sejam encarregados dessa tarefa, e que as
direções que eles imprimem, as decisões que tomem a este sejam seguidas
ou obedecidas pelos outros membros da comunidade. Tal autoridade,
visando o bem do todo, dirige-se a homens livres.
Um terceiro caráter diz respeito à moralidade intrínseca do bem comum, (...)
essencialmente retidão de vida, boa e íntegra vida humana da multidão. A
justiça e a retidão moral são assim essências do bem comum. É por isso
que o bem comum exige o desenvolvimento das virtudes na massa dos
cidadãos105.
Da mesma forma, como assevera, Galvão de Souza “referindo-se ao fim do
Estado ou á prosperidade pública”106
O bem comum resulta das condições exteriores que a sociedade deve
proporcionar aos seus membros. (...). Podemos dizer que o bem comum é a
organização de todos estes bens particulares. Não a simples soma dos
bens individuais, como ensina o liberalismo, nem a absorção dos bens
particulares pelo Estado, como prega o socialismo. A missão do Estado
reside nessa tarefa organizada ou coordenadora107.
104
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 20.
105
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. 1967, p. 20-22.
106
SOUZA, José Pedro Galvão de. Iniciação à teoria do estado. 2. ed. São Paulo: Ed. Revista dos
Tribunais, 1976, p. 14.
107
SOUZA, José Pedro Galvão de. Iniciação à teoria do estado. 2. ed. São Paulo: Ed. Revista dos
Tribunais, 1976, p. 15-16.
53
Segue Galvão de Souza, ao se referir sobre o conteúdo do bem comum,
esse dividido na ordem pública e nos bens espirituais e materiais
Entre as condições da felicidade social está em primeiro lugar a ordem
jurídica, isto é, o reconhecimento dos direitos de cada um e sua tutela eficaz
pelo Poder Público. (...) O Direito é, pois, condição sine qua non de ordem e
paz na sociedade. Sem o respeito à vida e aos bens de cada um, nem
sequer a coexistência humana seria possível. Eis por que se destaca, num
plano de importância vital, a ordem jurídica entre os elementos que
constituem o bem comum.
Não basta assegurar a existência do todo social e a convivência pacífica
dos seus membros. Os homens querem naturalmente viver bem. A
tendência para a perfeição é inata nos homens, e essa tendência,
transporta para o plano social, gera o progresso. (...) O bem comum exige
que se distribuam também, entre todos, os bens espirituais, sobretudo os
que decorre, da instrução e principalmente da educação108.
O bem comum é evocado explicitamente por João XXIII na Encíclica Mater
et Magistra de 15 de maio de 1961: “O Supremo Pastor indica, como princípios
fundamentais, o regresso do mundo econômico à ordem moral e a subordinação da
busca dos lucros, individuais e de grupos, às exigências do bem comum (Ponto 34)”
109
.
Na Encíclica Pacem in Terris, ao alertar que “todo o cidadão e todos os
grupos intermediários devem contribuir para o bem comum110” (Ponto 53). Disto
deriva que devem ajustar os próprios interesses às necessidades dos outros. Como
reafirma sua definição, anteriormente proposta na Encíclica Mater et Magistra: “o
bem comum consiste no conjunto de todas as condições de vida sociais que
consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana 111. “
(Ponto 58).
108
SOUZA, José Pedro Galvão de. Iniciação à teoria do estado. 2. ed. São Paulo: Ed. Revista dos
Tribunais, 1976, p. 14.
109
JOÃO XXIII. Mater et Magistra. 15 de maio de 1961. Ponto 34. 13. ed. São Paulo: Paulinas, 2010,
p. 12.
110
JOÃO XXIII. Pacem in Terris. 11 de abril de 1963. Ponto 53. 6. ed. São Paulo: Paulinas, 2004, p.
31.
111
JOÃO XXIII. Pacem in Terris. 11 de abril de 1963. Ponto 53. 6. ed. São Paulo: Paulinas, 2004, p.
33.
54
João Paulo II, na Mensagem da Paz de 1999, afirmou
Gostaria de partilhar convosco esta minha convicção: quando a promoção
da dignidade da pessoa é o princípio orientador que nos inspira, quando a
busca do bem comum constitui o empenho predominante, estão a ser
colocados alicerces sólidos e duradouros para a edificação da paz. Ao
contrário, quando os direitos humanos são ignorados ou desprezados,
quando a procura de interesses particulares prevalece injustamente sobre o
bem comum, então inevitavelmente está-se a semear os germes da
instabilidade, da revolta e da violência (Ponto 1) 112.
Antes, em 1990, também para a celebração do Dia Mundial da Paz, João
Paulo II, considera
A terra é essencialmente uma herança comum, cujos frutos devem reverter
em benefício de todos. Deus destinou a terra e tudo o que ela contém para
uso de todos os homens e de todos os povos, reafirmou o Concílio Vaticano
II (Const. Gaudium et spes, n. 69) (Ponto 8) 113
O mesmo Pontífice quanto à questão ecológica e o meio ambiente, como um
bem comum de direito e responsabilidade de todos, enfatizou:
Mesmo os homens e mulheres que não têm particulares convicções
religiosas, também eles, levados pelo sentido das próprias
responsabilidades em relação ao bem comum, reconhecem o dever de
114
contribuir para o saneamento do ambiente. (Ponto 15) .
112
JOÃO PAULO II. Mensagem da paz, de 1999. No respeito dos Direitos Humanos, o segredo da
verdadeira paz. Ponto 1. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/messages/peace/documents/hf_jp-ii_mes_14121998_xxxiiworld-day-for-peace.html. Acesso em: 08 fev. 2016.
113
JOÃO PAULO II. Mensagem da paz, de 1990. Paz com Deus criador, paz com toda a criação.
Ponto 8. Disponível em:
<https://w2.vatican.va/content/john-paulii/pt/messages/peace/documents/hf_jpii_mes_19891208_xxiiiworld-day-for-peace.html>. Acesso em: 08 fev. 2016.
114
JOÃO PAULO II. Mensagem da paz, de 1990. Paz com Deus criador, paz com toda a criação.
Ponto 15. Disponível em:
<https://w2.vatican.va/content/john-paulii/pt/messages/peace/documents/hf_jpii_mes_19891208_xxiiiworld-day-for-peace.html>. Acesso em: 08 fev. 2016.
55
Por fim é importante ressaltar, a Constituição Federal de 1988 apresenta em
diversos preceitos o princípio do bem comum. Constitui objetivo fundamental da
República Federativa do Brasil promover o bem de todos115. Como anota Maradiaga
A opção pela justiça e a superação da pobreza exigem uma revisão dos
deveres do Estado e da Política. Não adianta muita teoria para identificar a
direção para qual caminhar. É preciso agir em função da realização das
necessidades fundamentais, ‘ativas’ e ‘passivas’, que constituem o que
chamamos de ‘bem comum’116.
Da mesma forma a ordem econômica brasileira tende para a satisfação do
bem de todos. Segundo nossa Constituição Federal de 1988, a ordem econômica e
financeira, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por
fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
observados os princípios da função social da propriedade
117
e a defesa do meio
ambiente118.
115
Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Art. 3º, inciso IV.
MARADIAGA, Óscar. Sem ética não há desenvolvimento. Tradução Carlos Alberto Dastoli.
Petrópolis-RJ: Vozes, 2015, p.38.
117
Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXII - é garantido o direito de
propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem
por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os
seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante
tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos
de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno
emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis
brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica,
independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.
118
Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Art. 170, incisos II,
III e VI.
116
56
1.4.1 O Estado e o bem comum
O Estado pertence à ordem da sociedade. O corpo político ou a sociedade
política é o todo. O Estado é uma parte – a parte principal desse todo, e como tal
inserido a esse corpo.
No que diz respeito à obra comum a ser realizado pelo Estado para uma
civilização solidária, na posição de Maritain
Seria a ideia – não estóica nem kantiana, mas evangélica – da dignidade da
pessoa e de sua vocação espiritual, e do amor fraternal que lhe é devido. A
obra da cidade seria realizar uma vida comum terrena, um regime temporal
verdadeiramente conforme a esta dignidade, a esta vocação e a este
amor119.
Talvez um Estado pautado na amizade fraternal seria utópico, visto que ele
não é capaz de torna os homens, tomados individualmente, bons e irmãos uns aos
outros. Entretanto, pode-se e deve-se exigir-lhe que tenha estruturas sociais,
instituições e leis boas inspiradas do espírito de amizade fraterna, capazes de
permitir a adesão consciente e não simples aderência obtida pela força ou por um
conformismo público.
O papel do Estado, em face da pessoa humana, é a concretização do bem
comum. Esta é a posição adotada por João XXIII, Pacem in Terris
Essa realização do bem comum constitui a própria razão de ser dos
poderes públicos, os quais devem promovê-lo de tal modo que, ao mesmo
tempo, respeitem os seus elementos essenciais e adaptem as suas
exigências às atuais condições históricas (Ponto 54)120.
119
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradução Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 195.
120
JOÃO XXIII. Pacem in Terris. 11 de abril de 1963. Ponto 54. 6. ed. São Paulo: Paulinas, 2004.
57
Na atual lição de Maritain
O Estado é unicamente a parte do corpo político que se refere
especialmente à manutenção da lei, ao fomento do bem comum e da ordem
pública e à administração dos negócios públicos. O Estado é uma parte que
se especializa no interesse do todo. Não é um homem ou um grupo de
homens; é um conjunto de instituições combinadas em uma máquina
altamente aperfeiçoada. Tal obra de arte foi construída pelo homem e
serve-se dos cérebros e das energias humanas e nada é sem o homem;
constituída, todavia, uma encarnação superior da razão, uma superestrutura
impessoal e duradoura, cujo funcionamento pode ser considerado como
racional em segundo grau, na medida em que a atividade racional nele
envolvida, articulada pela lei e por um sistema de normas universais 121.
No campo político, Maritain revela a adequação natural entre a liberdade e o
bem comum, segundo uma teoria instrumentalista que estabelece a noção política
do Estado. Para se atingir o que é bom para o corpo político, é preciso ter como
valência máxima a dignidade da pessoa humana. O Estado como uma parte desse
corpo, a este subordinado e dotado de autoridade devido às exigências do bem
comum e dentro dos seus limites, é “um instrumento a serviço do homem” 122.
Deste modo, o bem comum tende a atingir a felicidade de todos,
preservando os direitos humanos e a liberdade das pessoas, e para tanto exige a
formação do Estado dotado de um poder superior para a realização primacial da
justiça e a efetividade da lei.
Contudo, como o Estado não é nem o todo, nem um sujeito de direito, nem
uma pessoa, mas uma criação humana ele não tem dignidade, é apenas um meio
do homem alcançar seu fim como pessoa, através do bem comum. Assim, segundo
um dos fundamentos do humanismo integral, não é o fim último da pessoa satisfazer
o Estado, mas ao contrário123.
121
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p, 22.
122
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p, 23.
123
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 35.
58
Buscar o bem comum é a tarefa fundamental do Estado, mas isto só poderá
ser realizado com a colaboração de todas as pessoas, pois
Só então poderá essa suprema instituição, que a civilização moderna tornou
cada vez mais necessária à pessoa humana no seu progresso político,
social, moral e mesmo intelectual e científico, deixar de ser, ao mesmo
tempo, uma ameaça não só às liberdades da pessoa humana, mas também
às da inteligência e da ciência. Somente então poderão as mais altas
funções do Estado – garantir a lei e facilitar o desenvolvimento livre do
corpo político – ser restauradas e readquirido pelos cidadãos o sentido do
Estado124.
1.4.2 A propriedade privada e o bem comum
Maritain propõe o ideal de um novo regime temporal de concepção profana
cristão, ou seja, de um estado laico e solidário.
Resume Chehoud
A cidadania que hoje se requer numa sociedade plural, pois constituída por
diversos grupos sociais e raciais, não é mais aquela constituída nos moldes
do tradicional Estado Nacional, mas sem aquela que procura combinar
125
igualdade com respeito à diferença .
E continua Chehoud, referindo-se que, aquilo que podemos chamar de um
Estado Constitucional Cooperativo cujo caminho é a solidariedade, apresenta três
características: a primeira é a abertura global dos Direitos Humanos e de sua
realização cooperativa, a segunda é o potencial constitucional ativo, voltado ao
objeto de realização internacional conjunta das tarefas como sendo da comunidade
dos Estados, de forma processual e material, e a terceira é a solidariedade estatal
124
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 29.
125
CHEHOUD, Heloisa Sanches Querino. Liberdade religiosa e laicidade: evolução histórica e
análise constitucional. Dissertação de Mestrado apresentada perante a Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. São Paulo: Boblioteca NGK – PUC/SP, 2010, p. 45.
59
de cooperação para além de suas fronteiras, como por exemplo, assistência ao
desenvolvimento e na proteção do meio ambiente126.
Junto a Maritain, sua proposta apresenta notas características que são ao
mesmo tempo oposta à do liberalismo inumano e inversa ao ideal histórico medieval
sacral cristã temporal. A sua ideia evidenciada no mundo sobrenatural é a da
liberdade da pessoa humana que a graça une a Deus. O Ser, o Eterno orienta do
alto como que uma estrela iluminada os caminhos da humanidade.
Uma das características dessa nova sociedade profana cristã é a conquista
ou realização da liberdade.
Ora, de que liberdade se pode tratar antes de tudo para uma civilização?
Não, segundo a concepção liberal, da simples liberdade de escolha do
individuo (não é esta mais do que o começo ou raiz da liberdade); e não,
segundo a concepção imperialista ou ditatorial, da liberdade de grandeza e
de poder do Estado; mas sim, antes de tudo, da liberdade de autonomia das
pessoas, que se confunde com sua perfeição espiritual127.
Para a humanidade cumprir esse papel libertador na sociedade deve seguir
a lei do uso comum, com especial atenção à propriedade dos materiais, por que
No que diz respeito à propriedade dos bens materiais, ensina S. Tomás,
como se sabe, que, de um lado, em razão antes de tudo das exigências da
personalidade humana, considerada como força que elabora e trabalha a
matéria e a submete às formas da razão, deve ser privada a apropriação
dos bens, sem o que se exerceria mal a atividade trabalhadora da pessoa,
mas que, doutro lado, em razão da destinação primitiva dos bens materiais
à espécie humana, e da necessidade que tem cada pessoa destes meios
para poder dirigir-se ao seu fim último, o uso dos bens individualmente
128
apropriados deve ele próprio servir ao bem comum de todos .
126
CHEHOUD, Heloisa Sanches Querino. Liberdade religiosa e laicidade: evolução histórica e
análise constitucional. Dissertação de Mestrado apresentada perante a Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. São Paulo: Boblioteca NGK – PUC/SP, 2010, p. 45-46.
127
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 171.
128
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 171.
60
Assim, dentro dessa proposta de Maritain, as coisas da Terra foram
entregues aos homens para dela cuidarem, prosperem e bem viverem. Tudo que há
no planeta e ele mesmo é uma herança comum, cujos frutos devem abastecer a
todos.
Conforme compreendeu Maritain: “O direito à propriedade privada dos bens
materiais pertence à lei natural, na medida em que a humanidade tem o direito de
possuir, para o seu próprio uso comum, os bens materiais da natureza”129.
O direito à propriedade é um atributo intrínseco à pessoa, pois se situa na
órbita dos direitos da dignidade da pessoa humana e da necessidade de titularizar
bens para prouver sua subsistência. Contudo, esse mesmo direito natural comporta
o dever de exercê-lo com responsabilidade; como um fator de estabilidade e
prosperidade social.
Contudo, por mais territórios que já conquistaram, nações poderosas brigam
por mais posses, e o planeta é retalhado em face de inúmeras guerras e formas
egoístas de apropriar-se da terra. O remédio para esses abusos do individualismo
no uso da propriedade não é a supressão do interesse privado, mas o purificar ao
prendê-lo em estruturas sociais orientadas para o bem comum, e também
transformá-lo interiormente pelo senso da comunhão e da amizade fraternal.
Na fórmula de Maritain, segundo um Humanismo Integral
A questão é dar a cada pessoa humana a possibilidade real e concreta de
aceder (sob modos que podem ademais variar muito, e que não excluem,
quando são necessárias certas coletivizações), às vantagens da
propriedade privada dos bens terrestres130.
129
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 177.
130
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p.178.
61
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 reconhece o direito à
propriedade, ao declarar “Art. XVII – 1. Todo homem tem direito à propriedade, só ou
em sociedade com outros. 2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua
propriedade”.
Amoroso estabelece com precisão o sentido desse instituto para a
humanidade. Ela é assumida como um instrumento para a liberdade, todavia sem
adquirir um caráter absoluto. Eis, sua conclusão
A propriedade é uma instituição consequente às exigências da pessoa
humana, a primeira das quais é precisamente a sua expansão. A
propriedade é a expansão da pessoa em direção às coisas, no sentido de
as transformar em meios de realização de suas próprias potencialidades.
Logo, a propriedade existe para a liberdade. E está naturalmente submetida
às limitações naturais desta última. Assim como não há liberdade absoluta,
também não deve haver propriedade absoluta. Logo, a propriedade é um
direito essencial à plena expansão da vida humana desde que exista em
função de sua finalidade131.
Deste modo, o privatismo ou o coletivismo da propriedade privada não
correspondem à expansão da pessoa completa. É assim, que a propósito o
considera João XXIII
O direito de propriedade privada, mesmo sobre bens produtivos, tem valor
permanente, pela simples razão de ser um direito natural fundado sobre a
prioridade ontológica e finalista de cada ser humano em relação à
sociedade (Ponto 109). (...) o direito de propriedade privada sobre os bens,
possui intrinsecamente uma função social. (Ponto 118) 132.
Paulo VI, também aborda a questão da propriedade
131
LIMA, Alceu Amoroso. Os direitos do homem e o homem sem direitos. Rio de Janeiro:
Francisco Alves, 1974, p. 96.
132
JOÃO XXIII. Mater et Magistra. 15 de maio de 1961 Pontos 109 e 118. 13. ed. São Paulo:
Paulinas, 2010.
62
Deus destinou a terra com tudo o que ela contém para uso de todos os
homens e povos; de modo que os bens criados devem chegar
equitativamente às mãos de todos, segundo a justiça, secundada pela
caridade. Sejam quais forem as formas de propriedade, conforme as
legítimas instituições dos povos e segundo as diferentes e mutáveis
circunstâncias, deve-se sempre atender a este destino universal dos bens.
Por esta razão, quem usa desses bens, não deve considerar as coisas
exteriores que legitimamente possui só como próprias, mas também como
comuns, no sentido de que possam beneficiar não só a si, mas também aos
outros. (...). De resto, todos têm o direito de ter uma parte de bens
suficientes para si e suas famílias (Ponto 69) 133.
Como anota Silveira e Silva, nossa atual Constituição Federal dispõe o
direito à propriedade à luz da dignidade da pessoa humana.
Não bastasse a expressa previsão da Carta Constitucional, o fundamento
teleológico que atribui função social à propriedade seria estabelecido pela
própria condição humana. Jungida à condição humana encontra-se a
dignidade. A dignidade está a impedir que o fato de ter propriedade seja um
fim em si mesmo. Impõe-se, aí, a função social da propriedade. (...). Com
intuito meramente elucidativo, pode-se afirmar que a função social da
propriedade é a imposição normativa que limita o exercício arbitrário da
propriedade134.
A Constituição Federal expressamente impõe limitações a propriedade
privada em face de seu uso exigir uma destinação social, nos termos dos artigos 5 º,
incisos XXII e XXIII135 e 170.
Instituída o seu fim social aplica-se a todos os tipos de propriedade. A
responsabilidade de bom uso e de preservação do meio ambiente está incluída
nesta finalidade. São alguns modelos típicos de propriedades as empresas, onde se
desenvolvem agronegócios, construção de imóveis para moradia e comércio.
133
PAULO VI. Gaudium et spes. Sobre a Igreja no mundo atual. 7 de dezembro de 1965. Ponto 69.
Disponível
em:
http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vatii_const_19651207_gaudium-et-spes_po.html. Acesso em: 9 mai. 2016.
134
SILVA, Frederico Silveira e. Artigo XVII. In: BALERA, Wagner. Comentários à Declaração
Universal dos Direitos Humanos. 2 ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 121.
135
Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
63
Quanto aos princípios do art. 170 e seus incisos da Constituição Federal,
esses vinculam a ordem econômica a fins sociais, visando o bem comum acima de
finalidades meramente lucrativas. A atividade econômica só se legitima quando
cumpre a finalidade maior de assegurar a todos existência digna das pessoas, de
acordo com os ditames da justiça social.
Por fim, pontua Derani que o princípio da função social, como princípio da
ordem econômica,
positivado
no
Art.
170
da
Constituição
Federal
está
imediatamente conectado ao meio ambiente, por que
O capítulo do meio ambiente da Constituição brasileira trata de um fator
básico da produção econômica: o fator natureza. Ao mesmo tempo, dispõe
sobre sua proteção e limites de sua apropriação. Outrossim, seu objetivo
não difere, fundamentalmente, daquele previsto no art. 170. Pois, como
venho pretendendo demonstrar, o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, é um dos elementos que
compõem a dignidade da existência, princípio-essência apresentado no art.
170136.
1.4.3 A criação e o meio ambiente, bens comuns universais
O Gênesis relata que Deus criou o mundo e “viu que era bom” (Gênesis
1,31)137. Em seguido Deus formou o homem e a mulher da própria terra e colocou-os
como os agentes históricos para ordenar a criação. “No plano da criação, os bens da
terra são primordialmente destinados à subsistência digna de todos os seres
humanos (Ponto 118)” 138.
Entenda-se por criação, o que é falado por Francisco
136
DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 237.
BIBLÍA. Mensagem de Deus. São Paulo: Loyola, 1983, p. 24.
138
JOÃO XXIII. Mater et Magistra. 15 de maio de 1961. Ponto 118. 13. ed. São Paulo: Paulinas,
2010.
137
64
Na tradição judaico-cristã, dizer ‘criação’ é mais do que dizer natureza,
porque tem a ver com um projeto de amor de Deus, em que cada criatura
tem um valor e um significado. A natureza entende-se habitualmente como
um sistema que se analisa, compreende e gere, mas a criação só se pode
conceber como um dom que vem das mãos abertas do Pai de todos, como
uma realidade iluminada pelo amor que nos chama a uma comunhão
universal139.
Já o meio ambiente, podemos acompanhar o contorno que lhe dá a Lei n.
6938/81, “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física,
química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” 140.
Ainda, a definição de Coimbra é bem-vinda: “Meio Ambiente é a realidade complexa
resultante da interação da sociedade humana com os demais componentes do
mundo natural, no contexto do ecossistema planetário da Terra”141.
As narrações sobre a criação, na sua linguagem simbólica e narrativa,
trazem ensinamentos importantes sobre a existência humana, e que está se baseia
sobre três relações fundamentais intimamente ligadas: com Deus, com o próximo e
com a Terra. Juntamente ela se assenta na indissolúvel união entre a ação
responsável da humanidade e sua unidade com tudo que foi criado neste planeta.
Neste sentido Francisco, na Laudato Si’, observa que a Terra é nossa irmã
porque todos somos irmãos nascidos da obra de Deus criador. Ao mesmo tempo a
Terra nos foi dada como uma mãe zelosa e cuidadora que tudo dá a seus filhos.
Cabe a cada um de nós através de gestos individuais e coletivos cuidarmos com
amor de nossa irmã Terra que nos acompanha durante a jornada da vida e
especialmente tratar com respeito e dedicação da nossa Mãe Terra142.
139
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 76. São Paulo: Paulus, 2015.
140
MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor,
patrimônio cultural, patrimônio público e outros interesses. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 182.
141
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente: uma incursão humanista na
questão ambiental. Campinas-SP: Millennium, 2002, p. 33.
142
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 1. São Paulo: Paulus, 2015.
65
O respeito à criação revela-se pela preservação dos Direitos Humanos e dos
bens naturais. Ora, fica aqui, suficientemente estabelecida a aliança dos Direitos da
Natureza aos Direitos Humanos.
Entre o Uno e o Múltiplo não pode haver contradições: o Homem é superior
à Natureza, ontologicamente, devido à dignidade de sua pessoa, mas é
parte inafastável da ordem natural, devendo conviver pacífica e
construtivamente com os “não humanos”, para poder usufruir e gozar de
seus bens, sem, contudo, exauri-los, para si ou para as gerações
vindouras143.
Contudo, foi rompida a harmonia existencial com o Criador, a humanidade e
toda a criação, porque esquecemo-nos desse parentesco formado pelos laços de
amor e agimos como se fossemos proprietários e dominadores absolutos sobre as
criaturas, incluindo os humanos e não humanos. A violência, que esta no coração do
homem logo é visto nos sintomas de doença apresentados no solo, na água, no ar e
nos seres vivos. Sofremos de um agudo sintoma de descaso a exigências de
respeito à vida.
Nossa indiferença ao mesmo tempo alcança a segurança de disponibilidade
dos recursos naturais para a sobrevivência das gerações futuras.
Sem contar, que milhares de pessoas, em vários países e regiões da Terra,
provam dificuldades enormes e sobrevivem na mais absoluta miséria, resultado de
políticas pautadas unicamente no interesse econômico desajustado e na
prevaricação do interesse comum. A propósito “entre os pobres mais abandonados e
maltratados, conta-se a nossa terra oprimida e devastada, que geme e sofre as
dores do parto” 144.
143
SOUZA, Carlos Aurélio Mota de. Fundamentos humanistas do bem comum: família, sociedade,
Estado. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de; CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios
humanistas constitucionais: reflexões sobre o humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras
Jurídicas, 2010.p. 123.
144
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 2. São Paulo: Paulus, 2015.
66
Aceitarmos, como premissa, a pessoa humana “é espírito e vontade, mas é
também natureza”, nos permitira adotar a criação e o meio ambiente como parte do
nosso pensar e agir, como também nos imprime o fato que estes foram dados por
Deus a todos, “constituindo o seu uso uma responsabilidade que temos para com os
pobres, as gerações futuras e a humanidade inteira”145
A herança da criação pertence à humanidade inteira, como um bem comum
universal a ponto de que “o presente e o futuro do mundo dependem da salvaguarda
da criação, porque existe uma interação constante entre a pessoa humana e a
natureza” (Ponto 10)146. Cada comunidade pode tirar da Terra aquilo de que
necessita para a sua sobrevivência, mas tem também o dever de protegê-la e
garantir a continuidade da sua fertilidade para as gerações futuras.
O meio ambiental natural como um bem universal, por certo, é o
entendimento aderido por Maritain, conforme se pode considerar no pensamento
citado
Podemos imaginar, que os advogados de um tipo de sociedade liberalindividualista, de uma sociedade comunista ou de uma sociedade
personalista redijam listas similares, porventura idênticas, de direitos do
homem. Nenhum das três, entretanto, tocará o instrumento da mesma
maneira. Tudo dependerá do valor supremo, de acordo com o qual todos
esses direitos serão ordenados e se limitarão mutuamente. É em virtude da
hierarquia de valores à qual nos subordinamos que determinaremos o
caminho pelo qual os diretos do homem, econômico-sociais e individuais,
deveriam, a nossos olhos, passar para o plano da existência. Aqueles que
por falta de melhor nome, acabamos de caracterizar como advogados de
um tipo de sociedade liberal-individualista, vêem a marca da dignidade
humana, antes e acima de tudo, no poder que tem cada pessoa de
apropriar-se individualmente dos bens naturais para poder fazer livremente
o que quiserem. Os advogados de um tipo comunista de sociedade vêem a
marca da dignidade humana, antes e acima de tudo, no poder de submeter
esses mesmos bens ao comando coletivo do corpo social, de modo a
‘libertar’ o trabalho humano (submetendo-o à comunidade econômica), e
conquistar assim o comando da história. Os advogados de um tipo
personalista de sociedade vêem a marca da dignidade humana, antes e
acima de tudo, no poder de colocar esses mesmo bens naturais a serviço
da conquista comum de bens intrinsecamente humanos, morais e espirituais
145
BENTO XVI. Caritas in veritate. Sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na
verdade. 29 de junho de 2009. Ponto 48. 2. ed. São Paulo: Paulinas, 2009.
146
JOÃO PAULO II. Mensagem da paz, de 1999. No respeito dos Direitos Humanos, o segredo da
verdadeira paz. Ponto 10. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/messages/peace/documents/hf_jp-ii_mes_14121998_xxxiiworld-day-for-peace.html. Acesso em: 08 fev. 2016.
67
e da liberdade humana de autonomia. Esses três grupos, inevitavelmente,
acusarão uns aos outros de ignorarem certos direitos essenciais de ser
humano. Trata-se de saber qual deles traça uma imagem fiel e qual uma
imagem falsa do homem. Quanto a mim, bem sei em qual das três posições
me encontro: na terceira corrente que acabo de mencionar147.
O artigo 225, caput, da Constituição Federal de 1988, define o meio ambiente
como um bem comum.
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
148
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida ,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (nossos grifos)
O bem comum acomoda um dever na defesa e preservação de todo bem
que podemos usufruir e gozar, mesmo que não haja sua propriedade individual.
Coincidem tanto o direito de ordem pessoal (das partes), como o direito de ordem
social ou coletivo (do todo).
Do exposto, concluímos conforme Mota de Souza
Ser superior pela inteligência, o Homem domina a natureza, utiliza os bens
naturais como próprios, e esta apropriação é uma decisão ético-política,
decidida pelos próprios homens entre si (conquistadores), ou dirigida pelo
Poder Público mediante concessões ou políticas públicas. Em todas essas
relações e distribuições deveria presidir o sentido de construção do bem
comum149.
147
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 125-126.
148
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Instituições do direito ambiental. v.1. São Paulo: Max Limonad,
2002, p. 61. Para Rodrigues, a titularidade do direito ao meio ambiente, pela sua complexidade,
demanda uma análise mais profunda do que a simples avaliação do sentido da expressão todos
(humanos), porque é na caracterização do bem ambiental – grifado pela fórmula do equilíbrio
ecológico – que será extraído do caput do art. 225 do CF a opção do legislador quanto ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, o que parece bastante ampla com a possibilidade de se
defender todas as formas de vida como titulares.
149
SOUZA, Carlos Aurélio Mota de. Fundamentos humanistas do bem comum: família, sociedade,
Estado. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de; CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios
humanistas constitucionais: reflexões sobre o humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras
Jurídicas, 2010.p. 124.
68
1.4.4 A filosofia da natureza para Jacques Maritain
Nas palavras de Araujo Santos: “A significativa superioridade de Maritain
está no detalhe, na erudição e na ousadia com que enfrentou não só os filósofos
modernos, mas também as especulações feitas pelos próprios gênios da física
moderna”150.
Jacques Maritain nos propõe uma filosofia da natureza como o problema
central para o debate sobre uma necessária explicação ontológica ou filosófica da
natureza sensível distinta daquela das ciências experimentais, mas vindo
complementá-la, pois propõe
O realismo objetivo, como contato direto com as essências do mundo
material, legitimando o conhecimento em termos humanos, existenciais e
universais, em oposição ao restrito artificialismo da epistemologia
moderna151.
Assim, a base de todo o conhecimento é o nosso contato imediato com o
mundo que nos envolve, o que leva Maritain a defender
A análise de tipo ontológica, na visualização abstrativa da primeira ordem –
a análise de que se serve o saber próprio do filósofo da natureza, honra a
percepção dos sentidos mais do que o saber de tipo empiriológico, espera
mais dela. No saber ontológico no primeiro grau de abstração, a intuição
dos sentidos é assumida no movimento do espírito em direção ao inteligível,
seu valor de conhecimento, digo seu valor especulativo, atinge o seu grau
máximo152.
150
SANTOS, Francisco de Araujo. Humanismo de Maritain no Brasil de hoje. Ciência, arte e
sociedade. São Paulo: Loyola, 2000, p. 26
151
SANTOS, Francisco de Araujo. Humanismo de Maritain no Brasil de hoje. Ciência, arte e
sociedade. São Paulo: Loyola, 2000, p.26
152
MARITAIN, Jacques. A filosofia da natureza: ensaio crítico sobre suas fronteiras e seu objeto.
Tradução Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Edições Loyola, 2003, p. 76.
69
Segue Maritain
Pelo contrário, na análise empiriológica, e sobretudo físico-matemático, é
notável que os sentidos estão presentes apenas para recolher indicações
fornecidas por instrumentos de observação e de medição, e que lhes é
recusado tanto quanto possível um valor de conhecimento propriamente
dito, de obscura apreensão real. Como seria diferente no universo sem vida,
sem alma nem carne, sem profundidade qualitativa, da quantidade abstrata
pela natureza? Descartes tinha suas razões para reduzir a percepção dos
sentidos a uma mera advertência subjetiva exclusivamente pragmática153.
Ainda Maritain
A verdadeira filosofia da natureza honra o mistério da percepção sensorial,
ela sabe que esta só ocorre porque o imenso cosmos foi ativado pela causa
primeira, cuja moção passa por todas as atividades físicas para fazê-las
produzir, na extrema fronteira onde a matéria desperta para o ‘esse
spirituale’, um efeito de conhecimento sobre um órgão animado. A criança e
o poeta não estão errados em pensar que, na luz da estrela que nos chega
através dos tempos, a inteligência que vela sobre nós nos acena de longe,
de muito longe154.
Desde modo, o homem ao acolher a objetividade direta e imediata de seu
conhecimento, estará reconhecendo o primado de existir como núcleo essencial do
ser. Como Araujo Santos, aponta
O importante para Maritain é que esse existir já se revela ao pensante em
sua primeira e mais direta asserção. O ser ou é captado – pelo menos
implicitamente – na primeira asserção, ou sempre haveremos de viver sem
o atingirmos. Para Maritain, o grave erro do pensamento moderno, a partir
de Descartes, foi desligar o homem ontologicamente de seu contato ‘direito’
com o mundo objetivo do existir. Uma vez negada essa via direta, o homem
estará confinado a seu mundo interior, a seu próprio pensamento: ‘Já não
são filósofos; são ideósofos’155.
153
MARITAIN, Jacques. A filosofia da natureza: ensaio crítico sobre suas fronteiras e seu objeto.
Tradução Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Edições Loyola, 2003, p. 76
154
MARITAIN, Jacques. A filosofia da natureza: ensaio crítico sobre suas fronteiras e seu objeto.
Tradução Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Edições Loyola, 2003, p. 77.
155
SANTOS, Francisco de Araujo. Humanismo de Maritain no Brasil de hoje. Ciência, arte e
sociedade. São Paulo: Loyola, 2000, p. 29.
70
Chama, ainda, atenção Maritain de que a pessoa não é apenas uma
realidade orgânica, mas uma realidade organizada, que tem algo de angélico,
inseparável do que tem de animal.
Em sendo assim, Coimbra explica
A vida, como fato existencial, clama não apenas por algo, mas por muito
mais: clama pelo infinito. Não obstante, dentro da nossa própria realidade
biconstitucional, encaramos as funções vegetativas e sensitivas como
dotadas de intrínseca nobreza; além do que, elas, constituem suporte para
as funções intelectuais e racionais. Daí a grande importância que assume o
psicossomático em cada passo do cotidiano156.
O que os nossos sentidos apreenderam e transformaram numa espécie de
conhecimento, será convertido em sensação, emoção, ação e reação. Estas são
manifestações vitais de cada um. Todavia, em cada um o grau de consciência muda
muito.
Como a pessoa é um animal capaz de dirigir os meios para a obtenção dos
fins. Esta sua faculdade deve ser usada para efetivar seu desenvolvimento, e
igualmente saber dispor os recursos à sua volta a fim de bem educar-se, ele próprio,
e assegurar-se uma qualidade-de-vida em padrões satisfatórios.
Coimbra chega à conclusão de que
Os sentidos não são apenas órgão sensores dos elementos físicos com os
quais nossa esfera psicossomática interage. Não se limitam a aprovar ou
reprovar a qualidade desses elementos. Eles podem, mais do que isso,
fornecer-nos muitas outras dimensões do mundo exterior. Permitem-nos ver
o ‘outro lado’ das coisas, porquanto retransmitirão, para o recanto mais
íntimo das sensações e do conhecimento, realidades que não costumamos
ou não temos podido perceber. É impossível separar o conhecimento
sensorial, uma reminiscência, uma vaga aspiração do nosso ser, de alguma
simbologia157.
156
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente: uma incursão humanista na
questão ambiental. Campinas-SP: Millennium, 2002, p. 165.
157
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente: uma incursão humanista na
questão ambiental. Campinas-SP: Millennium, 2002, p. 166.
71
E continua
O imenso arquivo dos nossos conhecimentos foi elaborado, lentamente
construído, com a ajuda dos sentidos, desde as lembranças mais
arquetípicas até os cálculos e projeções mais avançadas da Ciência
moderna. Tudo quanto se observou, anotou e formatizou; tudo aquilo que se
experimentou, sentiu, manifestou e comunicou; enfim, o acervo total da
cultura humana passou pelos nossos sentidos, tanto no processo de
entrada (input) quanto no de saída (output). A percepção e o conhecimento
sensorial retroalimentaram, sem cessar, o fluxo das civilizações e a
construção continuada das culturas158.
Contudo a míngua das nossas percepções das coisas e do mundo estão
comprometendo a estrutura e as funções de nossa existência, e de modo
consequente nosso desenvolvimento e a sustentabilidade. Mas, há ainda outra
forma de comprometimento, está inevitável, segundo Coimbra
É o comprometimento da vida (fato biológico) com a existência (fato
existencial), pois é desse comprometimento que nasce o verdadeiro sentido
da passagem do Homem sobre a Terra. Em suma, daí nasce o
comprometimento da espécie humana com o ecossistema planetário.
Se nossos sentidos, como nossas ideias, estão massificados, não há outro
caminho senão o de retorno à percepção genuína da Natureza e do próprio
Homem como ser ambiental159.
1.5. Humanismo e desenvolvimento
Como ensina Balera, no capítulo “Humanismo e desenvolvimento” 160 na obra
“Princípios Humanistas Constitucionais”, o universo jurídico é composto de três tipos
de normas: os valores, os princípios e as regras. Os valores apreendem a realidade
158
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente: uma incursão humanista na
questão ambiental. Campinas-SP: Millennium, 2002, p. 166.
159
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente: uma incursão humanista na
questão ambiental. Campinas-SP: Millennium, 2002, p. 167.
160
BALERA, Wagner. Humanismo e desenvolvimento. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de;
CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o
humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 399.
72
como algo bom (esfera axiológica), enquanto os princípios e as regras estabelecem
a realidade como algo devido – dever ser (esfera deontológica).
O desenvolvimento como um dos valores reconhecido no Preâmbulo da
Constituição brasileira de 1988, nos interessa saber qual o seu papel de
transformação, em perspectiva humanista, das estruturas sociais combinada com o
meio ambiente e a natureza.
Deste modo, uma análise humanista do evento do desenvolvimento deve
acolher a concepção integral do ser humano, segundo a formulação de Jacques
Maritain.
Ao recordamos os ensinamentos de Maritain, podemos asseverar que “uma
pessoa é como tal um todo”161, e como “pessoa ela subsiste de maneira
independente”162 na medida de que “tem uma dignidade absoluta porquanto está em
uma relação direta com o absoluto”163. Todavia, ela “não pode estar só”164, o que lhe
exige “a vida política, a vida em sociedade, e não somente quanto à sociedade
familiar, mas também quanto à sociedade civil”165 , cujo fim é “o bem comum da
cidade é sua comunhão no bem-viver”166.
“A sociedade existe para cada pessoa e lhe é subordinada”
167
, e em virtude
disso aquela esboça quatro características: personalista, comunitária, pluralista e
teísta ou cristã. No movimento dinâmico entre pessoa e sociedade, diz Maritain
161
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 17.
162
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 17.
163
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 18.
164
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 19.
165
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 19.
166
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 21.
167
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 24.
a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
73
A evolução da humanidade deve ser encarada como a continuação da
evolução da vida inteira, em que progresso significa ascensão da
consciência e em que ascensão da consciência é ligada a um grau superior
de organização168.
Segue o filósofo
É na ‘atração comum’ exercida por um centro transcendente, que é Espírito
e Pessoa, e em que os homens podem realmente amarem-se uns aos
outros, que o desenvolvimento da humanidade, assim animado e elevado
na própria ordem da história temporal, encontra sua lei suprema169.
Com efeito, o conceito de desenvolvimento deverá absorver as categorias do
Humanismo Integral.
1.5.1 Desenvolvimento Integral
O desenvolvimento pode ser entendido como uma lei da vida. É fato de que
as coisas e a própria vida devem continuar e desenvolver-se. Para Bento VI “não é
uma poesia, mas uma acurada leitura da realidade”
170
.
O que nos leva a crer, em harmonia com Maradiaga que “viver não é apenas
existir, mas existir de um certo modo. É a oportunidade que nos é frequentemente
oferecida para vir a ser”171.
168
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 24.
169
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1967, p. 24.
170
BENTO XVI. Caritas in veritate. Sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na
verdade. 29 de junho de 2009. Ponto 68. 2. ed. São Paulo: Paulinas, 2009.
171
MARADIAGA, Óscar. Sem ética não há desenvolvimento. Tradução Carlos Alberto Dastoli.
Petrópolis-RJ: Vozes, 2015, p. 22.
74
A palavra “desenvolvimento” é intrinsecamente dinâmica. Não indica um
ponto de chegada, mas um percurso que tem um sentido, que segue uma direção
precisa: um crescente, do “menos” para o “mais”172.
Deste modo, “realizar, conhecer e possuir mais, para ser mais”173, porque
“todo homem traz em si um vestígio de Deus, Verdade-Amor; todo homem sente,
fortíssima e contínua, a atração pela verdade e o desejo de amor” 174.
O desenvolvimento não é algo mecânico, que ocorre por programação ou
realização técnica, pelo contrário precisa de alguém que dele se encarregue
livremente. O desenvolvimento, de fato, é uma vocação, é um dever que nos
convém.
Maritain requer a construção da sociedade segundo liberdade e justiça,
numa concepção ideal e histórica de uma civilização pelo amor, com vista à
unificação da humanidade e o ideal profano cristão não sacral de uma única família
dos povos, solidária na fraternidade.
O humanismo integral propõe a igualdade através do desenvolvimento do
homem todo e de todos os homens. Maritain exige
O movimento progressivo da humanidade (...) reconhece a justiça e a
amizade cívica como os fundamentos essenciais dessa comunidade de
pessoas humanas que é a sociedade política; e em consequência insiste
também sobre o papel fundamental da igualdade, não somente da
igualdade de natureza, que está na raiz, mas da igualdade a conquistar
como um fruto da justiça e como um fruto do bem comum revertido sobre
todos175.
172
BERETTA, Simona. O desenvolvimento na caritas in veritate. In: SANTOS, Antonio Carlos Alves
dos. (et. al.) (orgs). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o humanismo do
Século XXI. São Paulo: Companhia Ilimitada, 2010, p. 37.
173
BENTO XVI. Caritas in veritate. Sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na
verdade. 29 de junho de 2009.Ponto 11. 2 ed. São Paulo: Paulinas, 2009.
174
BERETTA, Simona. O desenvolvimento na caritas in veritate. In SANTOS, Antonio Carlos Alves
dos. (et. al.) (orgs). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o humanismo do
Século XXI. São Paulo: Companhia Ilimitada, 2010, p. 37.
175
MARITAIN, Jacques. Os direitos do homem e a lei natural. Tradução: Afrânio Coutinho. 3. ed.
Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. 1967, p. 42 e 43.
75
O desenvolvimento será como que o âmago desta nova sociedade de raiz
sólida, convidando a todos a moverem-se segundo a cultura do amor de Cristo.
Neste sentido, compreende Paulo VI
É um humanismo pleno que urge promover. Que significa isso, senão o
desenvolvimento integral do homem todo e de todos os homens? Poderia
aparentemente triunfar um humanismo fechado, refratário aos valores do
espírito e a Deus, fonte desses mesmos valores. O homem pode,
seguramente, organizar a Terra sem Deus; mas sem Deus só pode
organizar contra o Homem. O humanismo exclusivo é um humanismo
desumano. Não há, portanto, verdadeiro humanismo, senão ao Absoluto, no
reconhecimento de uma vocação que dá da vida humana a noção
verdadeira (Ponto 42).176
Este modelo de desenvolvimento foi, portanto, acolhido por Paulo IV, na
Populorum progressio, para quem desenvolvimento é uma ideia, de que somente
haverá a paz se houver o desenvolvimento.
Desenvolvimento é o novo nome da paz (...). Combater a miséria e lutar
contra a injustiça é promover, com o bem-estar, o progresso humano e
espiritual de todos e, portanto, o bem-comum da humanidade. A paz não se
reduz a uma ausência de guerra, fruto do equilíbrio sempre precário das
forças. Edifica-se, dia a dia, mediante a busca de uma ordem desejada por
Deus, que implica mais perfeita justiça entre os homens (Ponto 76) 177.
Deste modo, conforme Maritain, o verdadeiro desenvolvimento do homem,
somente diz respeito unitariamente à totalidade da pessoa em todas as suas
dimensões. De fato, ele exige uma visão transcendente da pessoa, e acaba
requerendo a presença de Deus, o que torna a pessoa livre.
176
PAULO VI. Populorum progressio. 26 de março de 1967. Ponto 42. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/paul-vi/pt/encyclicals/documents/hf_p-vi_enc_26031967_populorum.html.
Acesso em: 19 de abr. 2016.
177
PAULO VI. Populorum progressio. 26 de março de 1967. Ponto 76. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/paul-vi/pt/encyclicals/documents/hf_p-vi_enc_26031967_populorum.html.
Acesso em: 19 de abr. 2016.
76
A realidade do desenvolvimento, ao levar em consideração a pessoa na sua
integralidade, está intimamente ligada a força com que as pessoas estão abertas ao
transcendente e respondem à atração do Criador, amor, que existe em cada pessoa.
De fato, “a abertura à vida está no centro do verdadeiro desenvolvimento”
178
.
A dimensão econômica do desenvolvimento deverá inserir-se nessa
integralidade
da
pessoa
humana,
partindo
da
consideração
de
que
o
desenvolvimento, não é somente material, mas “no centro da questão está a
liberdade humana, que age como conhecimento e ação”179.
Nesse contexto, o desenvolvimento integral é essencialmente uma vocação
e, logo exige uma livre e solidária responsabilidade por parte de todos. A questão foi
bastante delineada por Bento XVI
Dizer que o desenvolvimento é vocação equivale reconhecer, por um lado,
que o mesmo nasce de um apelo transcendente e, por outro, que é incapaz
por si mesmo de atribuir-se o próprio significado último. (Ponto 16) (...) A
vocação é um apelo que exige resposta livre e responsável. O
desenvolvimento humano integral supõe a liberdade responsável da pessoa
e dos povos: nenhuma estrutura pode garantir tal desenvolvimento,
prescindindo e sobrepondo-se à responsabilidade humana. (Ponto 17) (...)
Além de requerer a liberdade, o desenvolvimento humano integral enquanto
vocação exige também que se respeite a sua verdade. (...) A verdade do
desenvolvimento consiste na sua integralidade: se não é desenvolvimento
do homem todo e de todo o homem, não é verdadeiro desenvolvimento.
(Ponto 18) (...). Finalmente, a concepção do desenvolvimento como
vocação inclui nele a centralidade da caridade. (...) A razão, por si só, é
capaz de ver a igualdade entre os homens e estabelecer uma convivência
cívica entre eles, mas não consegue fundar a fraternidade. Esta tem origem
numa vocação transcendente de Deus Pai, que nos amou primeiro,
ensinando-nos por meio do Filho o que é a caridade fraterna (Ponto 19) 180.
Vale regatar o que foi explicado por Balera
178
BENTO XVI. Caritas in veritate. Sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na
verdade. 29 de junho de 2009. Ponto 28. 2 ed. São Paulo: Paulinas, 2009.
179
BERETTA, Simona. O desenvolvimento na caritas in veritate. In SANTOS, Antonio Carlos Alves
dos. (et. al.) (org.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o humanismo do Século
XXI. São Paulo: Companhia Ilimitada, 2010, p. 39.
180
BENTO XVI. Caritas in veritate. Sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na
verdade. 29 de junho de 2009. Pontos 16,17,18,19 . 2. ed. São Paulo: Paulinas, 2009.
77
Portanto, a solidariedade é a conditio sine qua non do desenvolvimento
integral. Esta solidariedade passa, assim, a integrar como componente
necessária a vida da humanidade reunida em torno das ideias do bem
comum. A vida social é um todo cujas partes integrantes são, em si mesmas
consideradas, outros todos. Há um todo de liberdades – que podem ser
cognominadas liberdades públicas. Há um todo de igualdades e, também
um todo de solidariedade181.
Através da atitude de solidariedade não podemos admitir que nenhum de
nossos irmãos e irmãs deixem de assumir o seu futuro, para ocupar o lugar que lhes
compete na sociedade. Conforme a indicação de Maradiaga
A participação de todos e o fim da desigualdade significam ter acesso às
oportunidades sociais, culturais, econômicas, e poder, por conseguinte,
decidir a própria vida. Daí decorre a responsabilidade de cada indivíduo de
ser solidário com os outros. De um ponto de vista cristão, a liberdade é um
direito que permite a cada ser humano dar uma forma à própria vida, de
modo responsável e solidário182.
Novamente Balera, indica ter a redação da Carta da Organização dos
Estados Americanos (OEA) dedicado todo o Capítulo VII, ao Tema do
Desenvolvimento Integral, afinada com a concepção humanista sustentada por
Maritain183. Assim se encontra escrito o documento
Capítulo VII
DESENVOLVIMENTO INTEGRAL
Artigo 30 - Os Estados membros, inspirados nos princípios de solidariedade
e cooperação interamericanas, comprometem-se a unir seus esforços no
sentido de que impere a justiça social internacional em suas relações e de
que seus povos alcancem um desenvolvimento integral, condições
indispensáveis para a paz e a segurança. O desenvolvimento integral
abrange os campos econômico, social, educacional, cultural, científico e
tecnológico, nos quais devem ser atingidas as metas que cada país definir
para alcançá-lo.
181
BALERA, Wagner. Direito ao desenvolvimento. Disponível em:
<http://www.cjlp.org/direito_ao_desenvolvimento.html>. Acesso: 10 abr. 2016.
182
MARADIAGA, Óscar. Sem ética não há desenvolvimento. Tradução Carlos Alberto Dastoli.
Petrópolis-RJ: Vozes, 2015, p.29.
183
BALERA, Wagner. Humanismo e desenvolvimento. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de;
CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o
humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 402.
78
Artigo 31 - A cooperação interamericana para o desenvolvimento integral é
responsabilidade comum e solidária dos Estados membros, no contexto dos
princípios democráticos e das instituições do Sistema Interamericano. Ela
deve compreender os campos econômico, social, educacional, cultural,
científico e tecnológico, apoiar a consecução dos objetivos nacionais dos
Estados membros e respeitar as prioridades que cada país fixar em seus
planos de desenvolvimento, sem vinculações nem condições de caráter
político.
Artigo 32 - A cooperação interamericana para o desenvolvimento integral
deve ser contínua e encaminhar-se, de preferência, por meio de organismos
multilaterais, sem prejuízo da cooperação bilateral acordada entre os
Estados membros.
Os Estados membros contribuirão para a cooperação interamericana para o
desenvolvimento integral, de acordo com seus recursos e possibilidades e
em conformidade com suas leis.
Artigo 33 - O desenvolvimento é responsabilidade primordial de cada país e
deve constituir um processo integral e continuado para a criação de uma
ordem econômica e social justa que permita a plena realização da pessoa
humana e para isso contribua.
Artigo 34 - Os Estados membros convêm em que a igualdade de
oportunidades, a eliminação da pobreza crítica e a distribuição eqüitativa da
riqueza e da renda, bem como a plena participação de seus povos nas
decisões relativas a seu próprio desenvolvimento, são, entre outros,
objetivos básicos do desenvolvimento integral184.
O documento sem dúvida alguma requer o abandono do caduco modelo
econômico do capitalismo fomentador da avareza, em detrimento dos mais pobres e
das gerações que nos sucederão. Esse antigo modelo de vida da humanidade nos
impõe a pergunta, anteriormente cantada por Renato Russo: “será que vamos ter
que responder pelos erros a mais eu e você?” 185.
A Carta da Organização dos Estados Americanos aponta para um novo
caminho para o desenvolvimento. Há a proposta de um modelo equitativo baseado
no dever livre e solidário em relação à coletividade, com vista a diminuir
desigualdade entre ricos e pobres. Existe a preocupação de construir um mundo
cooperativo e solidário no qual vivamos unidos na paz como irmãos e irmãs. Ao
ponto de que
184
CARTA DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS (OEA). Disponível em:
http://www.oas.org/dil/port/tratados_A41_Carta_da_Organiza%C3%A7%C3%A3o_dos_Estados_Ame
ricanos.htm#ch7. Acesso em: 12 jun. 2016.
185
VILLA-LOBOS, Dado; RUSSO, Renato; BONFÁ, Marcelo. Legião Urbana. Será. Disponível em:
https://www.vagalume.com.br/legiao-urbana/serasem-cifra.html.Acesso em: 12 jun. 2016.
79
A grandeza da humanidade é determinar-se essencialmente na relação com
o sofrimento e com quem sofre. Isso vale tanto para o indivíduo como para
a sociedade. Uma sociedade que não consegue aceitar os que sofrem e
não é capaz de contribuir, mediante a com-paixão, para fazer com que o
sofrimento seja compartilhado e assumido, mesmo interiormente, é uma
sociedade cruel e desumana (ponto 38) 186.
Esse discernimento ético do deve-se humanizante é assentado na Carta
magna dos Estados Americanos. In verbis
Artigo 40
Os Estados membros reafirmam o princípio de que os países de maior
desenvolvimento econômico, que em acordos internacionais de comércio
façam concessões em benefício dos países de menor desenvolvimento
econômico no tocante à redução e abolição de tarifas ou outras barreiras ao
comércio exterior, não devem solicitar a estes países concessões
recíprocas que sejam incompatíveis com seu desenvolvimento econômico e
187
com suas necessidades financeiras e comerciais .
Segundo Maradiaga
O campo da ética é a questão da percepção humana em todos os âmbitos
que têm um impacto sobre a pessoa e a sociedade. O humanizante ou
“desumanizante” representa os critérios éticos que sustentam toda ação que
realiza a dignidade e a solidariedade humana. Do mesmo modo, esses
critérios denunciam toda ação que lesa ou fere essa dignidade e essa
188
solidariedade .
Deste modo, ainda seguindo posição de Maradiaga, a visão ética do
desenvolvimento, introduz um componente de racionalidade que não permite
separar a questão do como fazer as coisas da questão do porque fazê-las. Deste
modo, o elemento ético está inserido nos problemas de ordem econômica, social,
186
BENTO XVI. Spe Salvi. 30 de novembro de 2007. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/encyclicals/documents/hf_ben-xvi_enc_20071130_spesalvi.html. Acesso em: 12 jun. 2016.
187
CARTA DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS (OEA). Disponível em:
http://www.oas.org/dil/port/tratados_A41_Carta_da_Organiza%C3%A7%C3%A3o_dos_Estados_Ame
ricanos.htm#ch7. Acesso em: 12 jun. 2016.
188
MARADIAGA, Óscar. Sem ética não há desenvolvimento. Tradução Carlos Alberto Dastoli.
Petrópolis-RJ: Vozes, 2015, p. 48.
80
política ou humana em geral. Trata-se de uma dimensão constitutiva de qualquer
problema humana, o que impõe aos planos, estratégias e políticas para atingir o
desenvolvimento a exigência de uma série de procedimentos racionais, que a
articulem com a análise cientifico-social, econômica e política em um processo de
participação capaz de fortalecer a democracia189.
Dentro das várias problemáticas que rodeiam a humanidade, o tema do
ambiente é um ponto muito importante, porque se pensarmos sobre o muro ainda
que invisível a olho nu e quase que intransponível entre ricos e pobres, em nível de
pessoas humanas e sociedade, e ainda também ao consideramos as necessidades
vitais das futuras gerações, podemos de fato nos dedicar com solidez e clareza à
transformação do mundo que temos para aqueles que desejamos.
A abertura à vida é essência do verdadeiro desenvolvimento, enquanto que
o desenvolvimento do homem, ligado ao ambiente, diz respeito ao próprio respeito
pela vida, como focaliza Bento XVI na Caritas in veritate
O tema do desenvolvimento aparece, hoje, estreitamente associado
também com os deveres que nascem do relacionamento do homem com o
ambiente natural. Este foi dado por Deus a todos, constituindo o seu uso
uma responsabilidade que temos para com os pobres, as gerações futuras
e a humanidade inteira. (...) A natureza é expressão de um desígnio de
amor e de verdade. Precede-nos, tendo-nos sido dada por Deus como
ambiente de vida. Fala-nos do Criador (cf. Rm 1, 20) e do seu amor pela
humanidade. Está destinada, no fim dos tempos, a ser ‘instaurada’ em
Cristo (cf. Ef1, 9-10; Col 1, 19-20). Por conseguinte, também ela é uma
‘vocação’. A natureza está à nossa disposição, não como ‘um monte de lixo
espalhado ao acaso’, mas como um dom do Criador que traçou os seus
ordenamentos intrínsecos dos quais o homem há-de tirar as devidas
orientações para a ‘guardar e cultivar’. (Gn 2, 15)190.
Isso nos impõe a pensar que poucos dos cantos da Terra, incluindo o Brasil
têm ocorrido o verdadeiro desenvolvimento. Ele é confundido com o implemento
industrial e o avanço tecnológico sobre a matéria viva e sobre os seres animados
189
MARADIAGA, Óscar. Sem ética não há desenvolvimento. Tradução Carlos Alberto Dastoli.
Petrópolis-RJ: Vozes, 2015, p. 59-64.
190
BENTO XVI. Caritas in veritate. Sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na
verdade. Ponto 48. 2. ed. São Paulo: Paulinas, 2009.
81
que somos, com a acumulação de riquezas e a penúria alimentar, com os apelos
aos mecanismos da lei de mercado e do lucro ilimitado e o chamado progresso.
Ao inverso disso
O desenvolvimento humano integral está intimamente ligado com os
deveres que nascem da relação do homem com o ambiente natural,
considerado como uma dádiva de Deus para todos, cuja utilização comporta
uma responsabilidade comum para com a humanidade inteira,
especialmente os pobres e as gerações futuras (Ponto 2) 191.
Para Francisco, todo o anseio de responsabilizar-se pelo mundo requer
mudanças significativas nos estilos de vida, nos modelos de crescimento e de
consumo, nas estruturas de poder que governa as sociedades. O nascimento de
uma nova cadência que supera o dualismo que separou o tema da ética humana e
da ética ambiental para compor enfim uma ecologia humana, que nos implica
A ter consciência de que vivemos e agimos a partir de uma realidade que
nos foi previamente dada, que é anterior às nossas capacidades e à nossa
existência. Por isso, quando se fala de ‘uso sustentável’, é preciso incluir
sempre uma consideração sobre a capacidade regenerativa de cada
ecossistema nos seus diversos setores e aspectos (Ponto 140).192
O Pontífice mantém seu pensamento, ao relembrar João Paulo II na Carta
Encíclica Sollicitudo rei socialis, e ao mesmo tempo conclui que a Terra nos foi
confiada segundo uma ordem de cuidado. Como elo de relação de interdependência
dependemos de seus elementos para mantermos a vida com qualidade
191
BENTO XVI. Se quiseres cultivar a paz, preserva a criação. Mensagem da Paz, 2010. Ponto 2.
Disponível em: https://w2.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/messages/peace/documents/hf_benxvi_mes_20091208_xliii-world-day-peace.html. Acesso: 9 mai. 2016.
192
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 140. São Paulo: Paulus, 2015.
82
‘O progresso autêntico possui um caráter moral e pressupõe o pleno
respeito pela pessoa humana, mas deve prestar atenção também ao mundo
natural e ter em conta a natureza de cada ser e as ligações mútuas entre
todos, num sistema ordenado’. Assim, a capacidade de o ser humano
transformar a realidade deve desenvolver-se com base na doação originária
das coisas por parte de Deus (Ponto 5) 193.
Portanto,
como
se
vê
o
desenvolvimento
integral
somado
ao
desenvolvimento pleno das coisas que existem na Terra já era uma preocupação da
sociedade do final do século XX, devidamente representado por João Paulo II, na
Sollicitudo rei socialis, ao aferir
O caráter moral do desenvolvimento também não pode prescindir do
respeito pelos seres que formam a natureza visível, a que os Gregos,
aludindo precisamente à ordem que a distingue, chamavam o ‘cosmos’.
Também estas realidades exigem respeito, em virtude de três
considerações sobre as quais convém refletir atentamente.
A primeira refere-se às vantagens de tomar ainda mais consciência de que
não pode fazer-se impunemente uso das diversas categorias de seres,
vivos ou inanimados — animais, plantas e elementos naturais — como se
quiser, em função das próprias exigências econômicas. Pelo contrário, é
preciso ter em conta a natureza de cada ser e as ligações mútuas entre
todos, num sistema ordenado, qual é exatamente o cosmos.
A segunda consideração funda-se, por sua vez, na convicção, dir-se-ia mais
premente, da limitação dos recursos naturais, alguns dos quais não são
renováveis, como se diz. Usá-los como se fossem inexauríveis, com
absoluto domínio, põe em perigo seriamente a sua disponibilidade, não só
para a geração presente, mas sobretudo para as gerações futuras.
A terceira consideração relaciona-se diretamente com as consequências
que tem um certo tipo de desenvolvimento, quanto à qualidade da vida nas
zonas industrializadas. Todos sabemos que, como resultado direto ou
indireto da industrialização, se dá, cada vez com maior frequência, a
contaminação do ambiente, com graves consequências para a saúde da
população (Ponto 34) 194
.
O respeito das exigências morais é imprescindível para o desenvolvimento,
assim como o uso e a utilização dos recursos naturais.
193
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 5. São Paulo: Paulus, 2015.
194
JOÃO PAULO II. Sollicitudo rei solialis. 30 de dezembro de 1987. Ponto 34. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_30121987_sollicitudorei-socialis.html. Acesso em: 19 mai. 2016.
83
Não há uma liberdade de usar e abusar ou de dispor das coisas como
melhor agrade a pessoa. A limitação no domínio do planeta mostra-se com clareza
nas relações com a natureza visível, submetidas à mesma lei que nos reconhece
uma dignidade inata, e também moral, que não podem impunemente ser
transgredidas.
Portanto,
sustentável
195
o
fato
propulsor
do
desenvolvimento
integral,
e
ainda
é a solidariedade na fraternidade, no chamado a responder com amor
ao próprio irmão196, numa profunda comunicação entre os homens, capaz de gerar
O verdadeiro desenvolvimento exige, portanto, a mudança das estruturas
econômicas e sociais; o engajamento efetivo dos Estados, dos organismos
internacionais e das organizações não governamentais, sob a inspiração do
humanismo197.
O direito ao desenvolvimento é um direito humano, inalienável em virtude do
qual todas as pessoas e todos os povos estão habilitados a participarem do
desenvolvimento econômico, político, social e cultural. A ele contribuir e dele
desfrutar no qual todos os Direitos Humanos de liberdade fundamental possam ser
plenamente realizados. Isto é o que Maritain chama de desenvolvimento integral.
O desenvolvimento integral está expresso na Declaração do Direito ao
Desenvolvimento, de 1986198. Segundo Rister, “hoje, dentro do desenvolvimento
195
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond,
2009, p. 71-72. Segundo Sachs, sobre a sustentabilidade, por muitas vezes o termo é utilizado para
expressar a sustentabilidade ambiental. Mas, no entanto, o conceito tem diversas outras dimensões,
entre elas: a) a sustentabilidade social vem na frente, por se destacar como a própria finalidade do
desenvolvimento, b) um corolário: a sustentabilidade cultural, c) a sustentabilidade do meio ambiente
vem em decorrência, d) outro corolário: distribuição territorial equilibrada de assentamentos humanos
e atividades, e) a sustentabilidade econômica, f) sustentabilidade política. g) um corolário: a
sustentabilidade do sistema internacional para manter a paz.
196
PAULO VI. Populorum progressio. 26 de março de 1967. Ponto 3. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/paul-vi/pt/encyclicals/documents/hf_p-vi_enc_26031967_populorum.html.
Acesso em: 19 de abr. 2016.
197
BALERA, Wagner. Humanismo e desenvolvimento. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de,
CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o
humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 405.
198
Declaração do Direito ao Desenvolvimento. Assembleia Geral das Nações Unidas
(A/RES/41/128).
84
progressivo de uma ordem mundial, a expressão ‘direito ao desenvolvimento’
implicaria uma atividade” 199. Nesse sentido
A Assembléia Geral, por meio da Resolução 41/128, de 4 de dezembro de
1986, proclamou o direito ao desenvolvimento, pelo que é hoje considerado
um dos direitos humanos de terceira geração, também denominados
direitos de vocação comunitária, como o direito à autodeterminação dos
povos, direito ao meio ambiente e direito à paz. É reconhecido hoje o direito
ao desenvolvimento como inalienável e parte integrante dos direitos
fundamentais200.
Tal como indica Rister, essa Declaração teria feito com que a pessoa
humana deixasse de ser vista como mero fator de produção e passasse a ocupar
uma posição central no seu desenvolvimento, cabendo ser seu sujeito ativo e seu
credor201. Igualmente, o documento situaria como sujeito ativo ou beneficiário do
direito ao desenvolvimento os povos, razão pela qual este direito também seria
concebido como direito de titularidade coletiva 202.
Quanto aos Estados, segundo Rister, esse ocuparia uma titularidade
passiva, visto que em face de ser um direito humano incumbe-lhes sua participação
no que se refere à revisão das relações internacionais, ao passo que no artigo da
Declaração
199
RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao desenvolvimento: antecedentes, significados e
consequencias. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 61.
200
RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao desenvolvimento: antecedentes, significados e
consequencias. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 63.
201
Declaração do Direito ao Desenvolvimento. Assembleia Geral das Nações Unidas
(A/RES/41/128).
Art. 2. 1. A pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento e deve ser participante ativo e
beneficiário do direito ao desenvolvimento.
2. Todos os seres humanos têm, individual e coletivamente, a responsabilidade pelo
desenvolvimento, levando em consideração a necessidade do pleno respeito aos direitos humanos e
liberdades individuais, assim como seus deveres para com a comunidade, que por si só pode
assegurar a livre e plena realização do ser humano, e, por conseguinte devem promover e proteger a
ordem política, social e econômica apropriada para o desenvolvimento.
202
Declaração do Direito ao Desenvolvimento. Assembleia Geral das Nações Unidas
(A/RES/41/128).
Art. 1. 1. O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável em virtude do qual todo ser
humano e todos os povos têm direito de participar em, contribuir com e desfrutar de um
desenvolvimento econômico, social, cultural e político, no qual todos os direitos humanos e liberdades
fundamentais podem ser plenamente realizadas.
85
1. Os Estados têm o dever de adotar, individual e coletivamente, medidas
para a formulação de políticas internacionais de desenvolvimento,
destinadas a facilitar a plena realização do direito ao desenvolvimento.
2. É necessária a ação permanente para promover um desenvolvimento
mais rápido dos países em desenvolvimento. Como complemento dos
esforços destes países, é indispensável uma cooperação internacional
eficaz para proporcionar a tais países os meios e facilidades apropriadas
para incrementar seu desenvolvimento integral203.
Como pontua Balera
De fato, o desenvolvimento integral é o caminho real e o percurso
obrigatório para a construção de nova e melhor ordem econômica
internacional, da qual a sustentabilidade seja esteio natural.
(...)
O desenvolvimento deve constituir-se em movimento forte, que envolve a
todos, compreendido como algo absolutamente essencial para a
concretização do ideário dos direitos humanos.204
Confirma Rister ter a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento um
caráter global, assim como multidimensional, sendo os aspectos econômico, social,
civil, cultural e político indivisíveis, interdependentes e complementares. “Os direitos
civis, políticos, econômicos e culturais deveriam ser tratados sempre conjuntamente
e o direito ao direito ao desenvolvimento poderia ser considerado como um direito
que representa essa posição”205.
O direito ao desenvolvimento é consagrado como um direito fundamental, na
Conferência de Viena, das Nações Unidas (AS/CONF. 157/12, de 12 de julho de
1993). Nela ficou estipulada a obrigação de os Estados cooperarem um com os
outros para garantir o desenvolvimento e eliminar os obstáculos para alcançá-lo206.
203
Declaração do Direito ao Desenvolvimento. Assembleia Geral das Nações Unidas
(A/RES/41/128). Artigo 4.
204
BALERA, Wagner. Declaração sobre o direito ao desenvolvimento anotada. Curitiba: Juruá,
2015, p. 102.
205
RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao desenvolvimento: antecedentes, significados e
consequencias. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 65.
206
Declaração e programa de ação de Viena, Conferência Mundial sobre Direitos Humanos
(AS/CONF. 157/12, de 12 de julho de 1993)
Art. 10. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos reafirma o direito ao desenvolvimento,
previsto na Declaração sobre Direito ao Desenvolvimento, como um direito universal e inalienável e
parte integral dos direitos humanos fundamentais.
86
Por fim, fechando este primeiro capítulo, comungamos com a opinião de
Rister, para quem, para se garantir a realização desse direito, reconhecido nas
declarações é necessário ter uma visão humanista de desenvolvimento, com vista a
dignidade da pessoa humana207.
Como afirma a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, a pessoa humana é o sujeito central
do desenvolvimento.
Embora o desenvolvimento facilite a realização de todos os direitos humanos, a falta de
desenvolvimento não poderá ser invocada como justificativa para se limitar os direitos humanos
internacionalmente reconhecidos.
Os Estados devem cooperar uns com os outros para garantir o desenvolvimento e eliminar
obstáculos ao mesmo. A comunidade internacional deve promover uma cooperação internacional
eficaz visando à realização do direito ao desenvolvimento e à eliminação de obstáculos ao
desenvolvimento.
O progresso duradouro necessário à realização do direito ao desenvolvimento exige políticas eficazes
de desenvolvimento em nível nacional, bem como relações econômicas eqüitativas e um ambiente
econômico favorável em nível internacional.
207
RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao desenvolvimento: antecedentes, significados e
consequencias. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 67.
87
2 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:
CONCEITOS FILOSÓFICOS E NORMATIVOS
DESDOBRAMENTOS,
2.1 Crise ecológica e o ser humano como a raiz deste problema
Ao tratar sobre a ecologia integral, Francisco nos relembra que tudo está
unidamente relacionado e que os problemas ambientais e sociais demandam
reflexão sobre as dimensões humanas e sociais.
Insistir que tudo está interligado. (...). Assim como os vários componentes
do planeta – físicos, químicos e biológicos – estão relacionados entre si,
assim também as espécies vivas formam uma trama que nunca
acabaremos de individuar e compreender (Ponto 138). Quando falamos de
‘meio ambiente’, fazemos referencia também a uma particular relação: a
relação entre a natureza e a sociedade que a habita. Isto impede-nos de
considerar a natureza como algo separado de nós ou como uma mera
moldura da nossa vida. Estamos incluídos nela, somos parte dela e
compenetramo-nos. (...) Dada a amplitude das mudanças (...) É
fundamental buscar soluções integrais que considerem as interações dos
sistemas naturais entre si e com os sistemas sociais. Não há duas crises
separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise
socioambiental (Ponto 139)208.
A crise ecológica está intimamente ligada à realidade social. Neste contexto,
nos indaga Chiavenato sobre o porquê do homem não mudar essa situação. E, o
mesmo autor responde que o homem não acredita na verdade. Sendo que “a
dominação política e social abusa dos conceitos da religião judaico-cristã. Com esse
abuso, tenta-se justificar os sistemas sociais e que vivemos”
209
.
Em reforço a essa opinião, as palavras de Unger, “para quem o momento
atual se marca, sobretudo nos mais jovens, por uma crise de valores que questiona
o caminho apontado pela razão científica-positivista”
208
210
. Essa crise ecológica na
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. Pontos 138-139. 24
de maio de 2015. São Paulo: Paulus, 2015.
209
CHIAVENATO, Júlio José. O massacre da natureza. São Paulo: Moderna, 1989, p. 9.
210
UNGER, Nancy Mangabeira. O encantamento do humano: ecologia e espiritualidade. 2. ed. São
Paulo: Loyola, 2000, p. 26.
88
verdade é uma crise de ordem ética, pois é justamente o comportamento do homem
por meio de suas práticas exploratórias desmedidas e gananciosas que gera a
degradação de todos os seres que compõe o Planeta, especialmente acaba por se
voltar contra ele próprio e comprometer os seus direitos humanos, igualmente sua
dignidade e vida.
A ética, segundo Rister, “pode ser considerada como o sistema global de
normas objetivas, reguladoras do comportamento humano, as quais impõem a uma
coletividade de pessoas a preservação de valores nela vigentes”
211
.
Não nos custa recordar, que o valor a que estamos trabalhando nessa
dissertação é da dignidade da pessoa humana.
A dignidade é um valor fonte, isto é, todos os demais valores no âmbito
jurídico derivam desse valor. Assim sendo, ela é também uma constante,
uma invariante axiológica, para dela ser deduzida as demais
consequências. Deste modo, anima a interpretação e a integração de todos
os demais valores, porque quando se fala na indivisibilidade dos Direitos
Humanos (sendo este o discurso mais moderno) se deve supor que existe
um elemento que “cola” todos os direitos para que sejam indivisíveis. Essa
liga, essa cola é a dignidade humana que une o conjunto todo, por isso que
está referido no Preâmbulo da Constituição Federal de 1988 como uma
premissa e no direito positivo, do raciocínio positivista ela é prevalecente a
própria Constituição 212.
A respeito do comportamento humano e de sua necessária observação a
dignidade, segundo o olhar de Unger
Se todas as coisas que têm sentimento, assim que os têm sentem o mal da
sujeição e procuram a liberdade (...) A liberdade se funda na amizade; a
tirania, no seu esquecimento (...) Ali onde esta amizade é ‘esquecida’, ali
onde o diálogo e a troca são substituídos pelo projeto de dominação e
controle, o homem se isola em face da natureza e dos outros homens. (...)
Ao recusarmos nossa condição de ‘sendos’, recusamos no mesmo
movimento nossa amizade com o real e nos tornamos, por assim dizer,
211
RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao desenvolvimento: antecedentes, significados e
consequencias. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 87.
212
BALERA, Wagner. A dignidade da pessoa humana. Aula ministrada na Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP), 16 de setembro de 2015, Pós Graduação de Direito, área de
Direitos Humanos.
89
existencialmente autistas. Entendida aqui como inserção do homem no
mundo, postura existencial, a amizade, fundamento da liberdade, passa por
uma abertura fundamental ao dinamismo do real. É co-hecimento como conascimento: nascer com o Outro nesta mutualidade do ‘nós’ que fundamos
em cada relação. (...) A amizade, por sua vez, se liga à gratuidade: ela se
dá quando assumimos que nossa vocação existencial não é de subjugar as
coisas, mas de deixá-las se manifestarem enquanto tais, e não enquanto
objetos cujo valor reside em como podem servir a algum objetivo humano.
Ser amigo é acolher o Mundo, o Outro, ‘na sua libérrima existência, na sua
total e gratuita inutilidade’. Sendo gratuidade, amizade é autonomia: não
serve para nada (pois amigo se é ‘de graça’); por isso, não serve a ninguém
(pois sua ação se realiza a partir de si mesma). Assim, a liberdade, só a
vivemos quando abrimos mão de nosso projeto de controle do processo de
realização do real: retornamo-nos os ‘sendos’ que já somos quando
deixamos ser. Liberdade e amizade falam do mesmo213.
Deste modo, podemos apontar que muitos dos progressos científicos e
tecnológicos de hoje são obras de sérios desajustes ambientais e sociais,
especialmente no campo industrial e agrícola, são realizados a mercê da vocação de
solidariedade fraternal do homem para participar de modo responsável na
construção de um mundo melhor e sustentável.
Apesar da introdução de técnicas cada vez mais sofisticadas, o aumento da
disponibilidade de recursos e a elevação dos padrões de vida, grande parcela da
humanidade sofre a urgência de não conseguir satisfazer suas necessidades. Aqui,
a ideia mesma de necessidade humana encontra-se relacionada ao essencial e
possibilidade de assegurar a todos as mesmas oportunidades.
Com Furtado, pode dizer-se que a
Ação produtiva do homem tem cada vez mais como contrapartida processos
naturais irreversíveis, tais como a degradação de energia, tendentes a
aumentar a entropia do universo. O estímulo às técnicas apoiadas na
utilização intensiva de energia, fruto da visão a curto prazo engendrada pela
apropriação privada dos recursos não-renováveis, agrava essa tendência,
214
fazendo do processo econômico uma ação crescentemente predatória .
213
UNGER, Nancy Mangabeira. O encantamento do humano: ecologia e espiritualidade. 2. ed. São
Paulo: Loyola, 2000, p. 48-49.
214
FURTADO, Celso. Introdução ao desenvolvimento: enfoque histórico-estrutural. 3. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2000, p. 22.
90
Esses desajustes tornaram-se um fator de preocupação mundial, devido sua
importância para a manutenção da qualidade de vida para a humanidade, o que
levou a Assembleia Geral das Nações Unidas, mediante pedido da Comissão
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, preparar uma “agenda global para
mudança”, ou seja, um apelo à ação política, o que viria ser chamado “Nosso futuro
comum”, de 1987 215.
O “Nosso futuro comum”, também conhecido como relatório Brundtland,
expõe de maneira clara as questões reais sobre o meio ambiente, a economia, o
social e o desenvolvimento
Meio ambiente e desenvolvimento não constituem desafios separados;
estão inevitavelmente interligados. O desenvolvimento não se mantém se a
base de recursos ambientais se deteriora; o meio ambiente não pode ser
protegido se o crescimento não leva em conta as consequencias da
destruição ambiental. Esses problemas não podem ser tratados
separadamente por instituições e políticas fragmentadas. Eles fazem parte
de um sistema complexo de causa e efeito216.
Segue o relatório
A economia e a ecologia devem integrar-se perfeitamente nos processos
decisórios e legislativos, não só para proteger o meio ambiente, mas
também para proteger e promover o desenvolvimento. A economia não é
apenas a produção de riqueza, e a ecologia não é apenas a proteção da
natureza; ambas são também muito importantes para que a humanidade
viva melhor217.
215
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1991, p. prefácio da presidente.
216
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1991, p. 40.
217
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1991, p. 41.
91
Pensa, do mesmo modo, Sachs
A economia e a ética estavam interligadas, desde Aristóteles, por duas
questões centrais de fundo:
- o problema da motivação humana (como deveríamos viver?);
- a avaliação das conquistas sociais218.
Igualmente, a mudança climática e o aquecimento do globo terrestre
provocada pela crescente difusão de indústrias unicamente comprometidas com
seus lucros, das grandes concentrações urbanas desenvolvidas de forma
desajustada com os aspectos da paisagem natural e necessidades humanas, e dos
consumos de energia poluentes, podem levar a alterações irreversíveis no Planeta.
O aquecimento da atmosfera decorre da emissão das escórias e gases
produzidos pela combustão de petróleo e gás natural, cuspidos pelas chaminés das
indústrias e dos motores dos veículos automotores, do uso de agrotóxicos nas
agriculturas, e da deflorestação e queimadas dos biomas naturais. Sustenta sobre
esse assunto Lovelock
Dessa vez, realmente precisamos levar a sério a possibilidade de que o
aquecimento global pode estar a ponto de eliminar as pessoas da Terra. (...)
Acima de tudo, estou pessimista porque as empresas e os governos
parecem estar aceitando cegamente uma crença de que a mudança
climática é fácil e lucrativamente reversível. (...). Não temos a menor noção
de quando nosso endividamento ambiental trará uma ruína ainda maior,
somente que é provável que aconteça. (...). Dizem que a verdade é a
primeira vitima da guerra, e parece que isso vale também para a mudança
climática219.
O que falar das perversas condições da produção que prevalece sobre a
dignidade do trabalhador e os interesses econômicos que são colocados acima do
bem de cada uma das pessoas, senão de sobre beneficio de populações inteiras. De
218
SACHS, Ignacy. Desenvolvimento: includente, sustentável, sustentado. Rio de Janeiro:
Garamond, 2008, p. 13.
219
LOVELOCK, James. Gaia: alerta final. Tradução Jesus de Paula Assis e Vera de Paula Assis. Rio
de Janeiro: Intrínseca, 2010, p. 15-24.
92
igual modo, a subjugação e destruição do ambiente são fruto de uma visão
interesseira e inatural, fruto de um genuíno desprezo ao homem.
Mas o sinal mais relevante e grave das implicações éticas, impresso na
problemática ecológica, é constituído pela falta de respeito pela vida, como se pode
verificar nos comportamentos humanos dirigidos para o seu progresso.
Não podemos nos esquecer de que a pessoa compõe um universo todo.
Assim, não se reduz ao ter, vez que jamais poderá ser reduzido unicamente aos
aspectos econômicos e técnicos.
Pode-se dizer, como se nota nas palavras de Penna
O egoísmo produzido pela cultura da sociedade atual faz com que as
pessoas valorizem muito mais o êxito pessoal – manifestado principalmente
na exibição de riqueza – do que a responsabilidade social e ambiental. O
comportamento econômico, a partir de uma certa fase do capitalismo,
separou-se da ética e dos valores humanos220.
Maritain ao propor um Humanismo Integral, já analisava a crise do mundo
moderno, e igualmente denunciava o desvio no processo cultural ao nos alertar que
“as essências querem ser respeitadas” 221.
Seguindo uma tendência anti-materialista, João Paulo identifica o problema
do consumismo ligado ao problema da questão da crise ecológica; ao se referir que
atualmente a humanidade dá mais atenção ao desejo do ter e do prazer, do que ao
desejo de ser e de crescer. Com isso, ele diz
220
PENNA, Carlos Gabaglia. O estado do planeta. Sociedade de consumo e degradação ambiental.
3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012, p. 45.
221
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 297.
93
Além da destruição irracional do ambiente natural, é de recordar aqui outra
ainda mais grave, qual é a do ambiente humano, a que se está ainda longe
de prestar a necessária atenção. Enquanto justamente nos preocupamos,
apesar de bem menos do que o necessário, em preservar o ‘habitat’ natural
das diversas espécies animais ameaçadas de extinção, porque nos damos
conta da particular contribuição que cada uma delas dá ao equilíbrio geral da
terra, empenhamo-nos demasiado pouco em salvaguardar as condições
morais de uma autêntica ‘ecologia humana’.Não só a terra foi dada por Deus
ao homem, que a deve usar respeitando a intenção originária de bem,
segundo a qual lhe foi entregue; mas o homem é doado a si mesmo por
Deus, devendo por isso respeitar a estrutura natural e moral, de que foi
dotado. Neste contexto, são de mencionar os graves problemas da moderna
urbanização, a necessidade de um urbanismo preocupado com a vida das
pessoas, bem como a devida atenção a uma ‘ecologia social’ do trabalho.
O homem recebe de Deus a sua dignidade essencial e com ela a capacidade
de transcender todo o regime da sociedade, rumo à verdade e ao bem.
Contudo está fortemente condicionado também pela estrutura social em que
vive, pela educação recebida e pelo ambiente. Estes elementos tanto podem
facilitar como dificultar o seu viver conforme à verdade. As decisões, graças
às quais se constitui um ambiente humano, podem criar estruturas
específicas de pecado, impedindo a plena realização daqueles que vivem de
diversos modos oprimidos por elas. Destruir tais estruturas, substituindo-as
por formas de convivência mais autênticas é uma tarefa que exige coragem e
paciência. (Ponto 38) 222.
Finalmente, concordamos com Brundtland de que há uma urgência de um
novo comportamento solidariedade e ação participativa das famílias e aos
administradores de hoje, pois
Se não conseguirmos traduzir nossas palavras numa linguagem capaz de
tocar os corações e as mentes de jovens e idosos, não seremos capazes de
empreender as amplas mudanças sociais necessárias à correção do curso
do desenvolvimento. (...). As mudanças de atitude, de valores sociais e de
aspirações que o relatório encarece dependerão de amplas campanhas
educacionais, de debates e da participação pública. (...). Sua participação
será vital para orientar o mundo no rumo do desenvolvimento sustentável,
para estabelecer os alicerces de Nosso Futuro Comum.
O processo de elaboração desse relatório prova que é possível unir
esforços, identificar objetivos comuns e estabelecer uma ação comum.
Cada membro da Comissão, se estivesse escrito o relatório sozinho, teria
escolhido palavras diferentes. Contudo, conseguimos chegar a acordo
sobre a análise, os remédios em geral e as recomendações para que o
curso do desenvolvimento não sofra interrupções.
Em última análise, o que importa é estimular a compreensão comum e o
espírito de responsabilidade comum, tão evidentemente necessários num
mundo dividido223.
222
JOÃO PAULO II. Centesimus annus. 1 de maio de 1991. Ponto 38. Disponível em:
http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_01051991_centesimusannus.html. Acesso: 19 de maio de 2016.
223
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1991, p. prefácio da presidente.
94
2.2 Historicidade e tendência
O humanismo de Maritain, concretizador da dignidade da pessoa humana
revela
O abandono da postura ancorada na antropologia unilateral em beneficio de
uma postura fundada numa espécie de antropologia baseada na
solidariedade decorre de um reposicionamento eminentemente ético,
trazendo à balia o debate acerca da efetiva contribuição das normas
jurídicas nesse sentido224.
Pois a resposta à efetivação e concretização dos Direitos Humanos em suas
múltiplas dimensões, dando satisfação à dignidade da pessoa assentada pelo
humanismo antropofilíaco solidário, Maritain exige que:
A cidade pluralista é uma cidade autoritativa; a lei, que tem por oficio
constranger os protervi, os insensatos, a um comportamento de que não
são capazes por si mesmos, e também fazer a educação dos homens para
que no fim cessem de estar sob à lei (porque fazem eles próprios, voluntaria
e livremente, o que prescreve a lei, - o que só acontece com os sábios),
encontraria nela a lei seu oficio moral, seu oficio de pedagoga da liberdade.
E, sem duvida, os supremos valores, em relação aos quais regula a escala
de suas prescrições e sanções, seriam (...) algo de verdadeiramente e já
naturalmente santo, a vocação da pessoa humana para uma realização
espiritual e para a conquista de uma verdadeira liberdade, e as reservas de
integridade moral requeridas para isto 225.
Completa Maritain
224
VENTURA, Victor Alencar Mayer Feitosa. Direito humano ao meio ambiente sadio. Afirmação
histórica e critica jurídica. In: FEITOSA, Maria Luiza Alencar Mayer; FRANCO, Fernanda Cristina
Oliveira; PETERKE, Sven; VENTURA, Victor Alencar Mayer Feitosa (orgs.). Direitos humanos de
solidariedade: avanços e impasses. Curitiba-PR: Appris, 2013, p. 106.
225
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 176.
95
Se é, porém, absurdo esperar da cidade que torne todos os homens,
tomados individualmente, bons e irmãos uns dos outros, pode-se e deve-se
exigir-lhes, o que é coisa muito diferente, que ela tenha estruturas sociais,
institucionais e leis boas e inspiradas do espírito de amizade fraterna, e que
oriente cada vez mais poderosamente as energias da vida social para uma
amizade tal que, embora fundamentada na natureza, é mais difícil aos filhos
de Adão226.
Não há duvidas, de que o homem se arrisca a perder o sentido do que é
realmente bom para ele no que se refere ao seu autêntico desenvolvimento em
conformidade com sua natureza terraquiana, diante da multissecular história de
depreciação do meio ambiente do planeta Terra, da depreciação de sua qualidade
de vida e o desperdício de tantos recursos naturais. Ainda mais, enquanto mantiver
seu espírito alucinado pela tecnologia e do comodismo egoísta, agravado pelos
velhos instintos indisciplinados. Por outro lado, não existe outra possibilidade a não
ser ele próprio, cuidar de si.
Todavia, já existe um despertar da sua consciência ecológica e da
necessidade de um autêntico desenvolvimento do homem e da natureza
A preservação ambiental – e assim dos recursos ambientais – esta na base
do próprio desenvolvimento. Este se inviabilizará caso seja reduzido o
estoque de matéria-prima (bens oferecidos pela natureza) ou, em algumas
hipóteses, até se esgote. Deve se considerar, ainda, que a alteração da
quantidade de alguns recursos ambientais pode influenciar no processo
produtivo e na qualidade de vida das pessoas, dificultando o
227
desenvolvimento sustentável, tal como ocorre com a poluição das águas .
Guerra chega à conclusão, de que
A emergência de múltiplos problemas ambientais propicia graves prejuízos
para o desenvolvimento do indivíduo, devendo ser coordenados esforços
em prol da criação de uma verdadeira cultura de preservação do ambiente.
Além disso, evidenciou-se a necessidade de se estabelecer um sistema
226
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 196.
227
MARQUES, José Roberto. O desenvolvimento sustentável e sua interpretação jurídica. São
Paulo: Editora Verbatim, 2011, p. 15.
96
protetivo internacional do ambiente pelo fato de este ter natureza
transnacional228.
Daqui, seguimos adiante, com as considerações de Sidney Guerra expostas
pelo autor no texto “Desenvolvimento sustentável à luz do direito internacional
ambiental: breves comentários sobre as grandes conferências da ONU sobre o meio
ambiente”229, como que um pano de fundo para apresentarmos esse ponto do
trabalho.
Diz o autor que no final da década de sessenta teve início a conscientização
por parte de Estados europeus em relação à crise ambiental, diante dos sinais de
esgotamento dos recursos planetários.
No ano de 1968, o Conselho Europeu consagrou duas Declarações, cuja
finalidade era a proteção do meio ambiente: Carta Europeia da Água230 e a
Declaração sobre princípios da luta contra a poluição do ar.
A Assembleia Geral das Nações Unidas, sensível as questões ambientais,
convocou no ano de 1968 aquela que constituiria uma nova etapa para a evolução
do tratamento das questões ligadas ao ambiente no plano internacional e também
no plano interno de grande parte de países: a Conferência de Estocolmo.
A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, foi
realizado em Estocolmo, na Suécia, no ano de 1972. Foi produzida a Declaração de
Estocolmo sobre o meio ambiente humano, de 1972231. O documento consagra um
228
GUERRA, Sidney. Desenvolvimento sustentável à luz do direito internacional ambiental: breves
comentários sobre as grandes conferências da ONU sobre o meio ambiente. In: CAÚLA, Bleine
Queiros; MARTINS, Dayse Braga; ALBUQUERQUE, Newton de M; CARMO, Valter M. do. Diálogo
ambiental, constitucional e internacional. Fortaleza: Premius, 2013, p. 373.
229
GUERRA, Sidney. Desenvolvimento sustentável à luz do direito internacional ambiental: breves
comentários sobre as grandes conferências da ONU sobre o meio ambiente. In: CAÚLA, Bleine
Queiros; MARTINS, Dayse Braga; ALBUQUERQUE, Newton de M; CARMO, Valter M. do. Diálogo
ambiental, constitucional e internacional. Fortaleza: Premius, 2013, p. 373-402.
230
Carta Européia da Água. Disponível em:
Disponível
http://www.pucsp.br/ecopolitica/documentos/seguranca/docs/carta_europeia_agua.pdf.
em: 3 ago. 2016.
231
Declaração de Estocolmo sobre o ambiente humano, de junho de 1972. Disponível em:
http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Meio-Ambiente/declaracao-de-estocolmo-sobre-oambiente-humano.html. Acesso em: 3 ago. 2016.
97
conjunto de valores, desenha novos rumos, estabelecendo um instrumento jurídico
de cunho moral (soft Law) a ser aceita e aplicada gradativamente pelos Estados,
porém sem efeito vinculatório.
Desta Conferência nasce o Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA).
Passados alguns anos e como desdobramento das Conferência de 1972, a
Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas aprovou, no ano de 1983, a
criação de uma Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, tendo à
frente da presidência do trabalho a ex-ministra da Noruega Gro Harlem Brundtland.
Essa Comissão publicou seu relatório, no ano de 1987, chamado “Nosso
futuro comum” (Relatório Brundtland). Cunhou-se a partir daí a tese do
desenvolvimento sustentável
O desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do
presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras
atenderem a suas próprias necessidades. Ele contém dois conceitos-chave:
- o conceito de necessidade, sobretudo as necessidades essenciais dos
pobres do mundo, que devem receber a máxima prioridade;
- a noção das limitações que o estágio da tecnologia e da organização
social impõe ao meio ambiente, impedindo-o de atender às necessidades
presentes e futuras232.
Portando, segundo o relatório, o conceito de desenvolvimento sustentável
fornece uma estrutura para a integração de políticas ambientais e estratégias de
desenvolvimento – sendo que o desenvolvimento supõe uma transformação
progressiva da economia e da sociedade. A busca do desenvolvimento sustentável
exige mudanças nas políticas internas e internacionais de todas as nações.
232
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1991, p. 46.
98
Da mesma forma, para que haja um desenvolvimento sustentável, é
necessário que todos tenham atendidas as suas necessidades básicas e lhes sejam
proporcionadas oportunidades de concretizar suas aspirações a uma vida melhor.
Em essência, o desenvolvimento sustentável é um processo de
transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos
investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança
institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim
de atender às necessidades e aspirações humanas233.
Ainda, nos propõe o relatório, que a persuasão ou motivação de fazer as
pessoas agirem no interesse comum de seu desenvolvimento sustentável poderá se
dar em parte pela educação, pelo desenvolvimento das instituições e pelo
fortalecimento legal, mas especialmente
Todos estariam em melhor condição se cada um considerasse os efeitos de
seus atos sobre os demais. Mas ninguém está disposto a crer que os outros
agirão desse modo, e assim todos continuam a buscar seus próprios
interesses. As comunidades ou os governos podem compensar essa
situação mediante leis, educação, impostos, subsídios e outros métodos234.
Contudo, segue o relatório
A imposição do interesse comum é muitas vezes prejudicada porque as
áreas de jurisdição política não coincidem com as áreas de impacto. (...).
Não existe uma autoridade supranacional que resolva tais questões, e só é
possível fazer valer o interesse comum por meio da cooperação
internacional235.
233
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1991, p. 49.
234
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1991, p. 50.
235
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getulio Vargas, 1991, p. 51.
99
O relatório sugeriu também à Assembleia Geral da ONU a necessidade para
a realização de uma nova Conferência Internacional, com vista a formatar os rumos
de uma concreta cooperação internacional.
Em 22 de dezembro de 1989, a Assembleia Geral das Nações Unidas
aprovou a Resolução nº 44/228, que convocou a Conferência do Rio de Janeiro.
O encontro ocorreu no Rio de Janeiro, no período de 3 a 14 de junho de
1992, e foi chamado Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e
Desenvolvimento. Ela também ficou conhecida como Cúpula da Terra, como
também Rio 92. Nela foram produzidos os seguintes documentos: a Declaração de
Princípios sobre Florestas236, a Convenção sobre Diversidade Biológica 237, a
Convenção sobre Mudanças Climáticas238, a Agenda 21239 e a Declaração do Rio
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento240.
A Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento contém vinte
e sete princípios, muito deles já reconhecidos na Declaração de Estocolmo, onde se
buscou
Estabelecer uma nova e equitativa parceria mundial através da criação de
novos níveis de cooperação entre os Estados, os setores-chave das
sociedades e os indivíduos, trabalhando com vistas á conclusão de acordos
internacionais que respeitem os interesses de todos e protejam a
241
integridade do sistema global de meio ambiente e desenvolvimento .
236
Declaração de princípios sobre florestas. A/CONF. 151/26 (vol. III). Rio de Janeiro, 3.14 junho
de 1992. Disponível em:
http://www.meioambiente.pr.gov.br/arquivos/File/agenda21/Declaracao_de_Principios_sobre_Floresta
s.pdf. Acesso em: 4 ago. 2016.
237
Decreto Legislativo nº 2, 1994. Convenção sobre diversidade biológica – CDB. Disponível em:
http://www.mma.gov.br/biodiversidade/convencao-da-diversidade-biologica/item/7513. Acesso em: 4
ag. 2016.
238
Decreto nº 2.652, de 1º de julho de 1998. Convenção-Quadro das nações Unidas sobre
Mudanças do Clima, assinada em Nova York, em 9 de maio de 1992. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2652.htm. Acesso em: 4 ago. 2016.
239
Agenda 21. Disponível em: http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/agenda21/agenda-21-global. Acesso em: 4 ago. 2016.
240
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Disponível em:
http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Direito-ao-Desenvolvimento/declaracao-sobre-meioambiente-e-desenvolvimento.html. Acesso em: 4 ago. 2016.
241
MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 1531.
100
Em relação à Agenda 21, segundo Milaré, este foi um documento formatado
como que uma “cartilha básica do desenvolvimento sustentável”242, com a finalidade
de concretizar um compromisso político de alto nível.
Na linguagem da Agenda 21, as considerações ambientais abrem caminho
para o tratamento de questões socioeconômicas estruturais, e vice-versa.
(...) A natureza mesma da Agenda 21, como documento programático e
consensual de ampla abrangência, deixa claro que ela não se imiscui em
questões jurídicas ou legais. Seu objetivo é subsidiar ações do Poder
Público e da sociedade em prol do desenvolvimento sustentável 243.
Quanto à Convenção sobre Mudanças Climáticas, deve-se salientar o
Protocolo de Quioto244, criado em 1997, como um documento composto por metas e
instrumentos destinado a propor uma mudança no sistema energético de países
desenvolvidos e aqueles em vias de desenvolvimento.
Conforme Guerra, esses documentos definiram o contorno das políticas
essenciais na tentativa de se alcançar um modelo de desenvolvimento sustentável
que atendesse às necessidades dos pobres, reconhecendo os limites impostos pelo
homem à natureza com a finalidade de satisfazer as necessidades das gerações
presentes e futuras.
Outro encontro de suma importância relativo ao tema do desenvolvimento
sustentável, na ordem internacional, ocorreu entre 8 de agosto e 4 de setembro de
2002: a Conferência de Joanesburgo, na África do Sul.
A Cúpula sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada em Joanesburgo,
em 2002 - o conceito de desenvolvimento sustentável foi refinado, levando a
importantes avanços epistemológicos. Para os propósitos deste texto, é
suficiente enfatizar que a sustentabilidade social é um componente
essencial deste conceito245.
242
MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 104.
MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 103-106.
244
Protocolo de Quioto. Disponível em:
http://mudancasclimaticas.cptec.inpe.br/~rmclima/pdfs/Protocolo_Quioto.pdf. Acesso em: 4 ago. 2016.
245
SACHS, Ignacy. Desenvolvimento: includente, sustentável, sustentado. Rio de Janeiro:
Garamond, 2008, p. 36.
243
101
Outro evento, com a chancela da Organização das Nações Unidas, a
Conferência Rio+20, ocorrido em maio de 2012, cujo resultado foi a aprovação do
documento intitulado “O futuro que queremos” 246.
O desabrochar do movimento ambiental também ocorreu no plano nacional.
O desenvolvimento sustentável na Constituição da República Federativa do
Brasil, de 1988, na abordagem de Machado
Preceitua o art. 225, caput, da CF: ‘Todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial á
sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações’.
A Constituição não utiliza a expressão ‘desenvolvimento sustentável’, mas a
inserção do dever de defender e preservar o meio ambiente para as
presentes e as futuras gerações representa a essência do princípio da
sustentabilidade. Trata-se de um princípio implícito247.
Vale, ainda, resgatar as palavras de Morato Leite
Com efeito, o texto constitucional assevera uma unidade de cooperação, da
mesma forma inovadora, que pede um comportamento social ativo do
cidadão em face da coletividade e da necessidade de proteção do
patrimônio ambiental. Com isso, exige ou pressiona o Estado na elaboração
de normas contemporâneas, voltadas a concretizar essa cooperação nas
decisões da esfera ambiental. Portanto, essa norma constitucional, em seu
conteúdo, obriga ao exercício de uma cidadania participativa e com
responsabilidade social ambiental. Tal responsabilidade é uma obrigação
com as gerações presentes e futuras, incluindo, obviamente, o uso racional
dos bens e a solidariedade248.
246
Declaração final da conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável.
(Rio +20). O futuro que queremos. 20 a 22 de junho de 2012. Disponível em:
http://www.mma.gov.br/port/conama/processos/61AA3835/O-Futuro-que-queremos1.pdf. Acesso em:
4 ago. 2016.
247
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros,
2015, p. 78-79.
248
LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de risco e estado. In: CANOTILHO, José Joaquim
Gomes, MORATO, José Rubens (orgs.). Direito constitucional ambiental brasileiro. 5. ed. São
Paulo: Saraiva, 2012, p, 190.
102
Apesar de todas as regulamentações legais sobre o meio ambiente e a
natureza para o pleno desenvolvimento sustentável da humanidade, será nas
palavras de Maritain:
Vã toda regulação externa se não tem por fim desenvolver na pessoa o
senso da responsabilidade criadora e o senso de comunhão. Sentir-se
responsável de seus irmãos não diminui a liberdade, ao contrário lhe dá um
peso muito maior249.
2.3 O humanismo moderno de Maritain contra a crise ecológica e a favor da
efetividade do desenvolvimento sustentável
O desenvolvimento humano integral e sustentável é uma vocação, é um
chamado. A melhor qualidade de vida para todos e o desenvolvimento mais humano
e sustentável é o caminho para se conquistar e usufruir a paz. Isto implica deixar de
lado a ganância do lucro e do poder, como ainda abandonar condutas opressivas
contra a pessoa, o povo ou a nação.
O planeta foi criado para abrigar e manter a vida da pessoa humana, o que
lhe impõe obrigações a favor de sua boa manutenção, como também estabelece
uma relação íntima entre os homens e a inteira criação, e ainda ao seu ambiente.
Assim, se dá devido um imbricamento da vida natural e da vida humana. E,
o homem ao negar essa conexão existencial renúncia a si mesmo, ao outro homem
e aos demais seres naturais.
Na lição de Balera e Sayeg, o universo está se expandindo. Ao expandir-se,
percorre um caminho e, se caminha, é certo entender que segue para a evolução.
Está é a missão do homem e do universo: trilhar o caminho. Deste modo, a
solidariedade na fraternidade abarca a totalidade das pessoas, dos demais seres
249
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradução Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 175.
103
vivos, e das coisas, convergindo para a explicação física da conexão universal em
eterna expansão250.
O Humanismo Integral não é outra coisa, senão essa ideia de que a pessoa
deverá trilhar seu desenvolvimento em parceira com todos e tudo que estão ao seu
redor. Logo
O humanismo integral presente nestas reflexões não é teocêntrico, nem
muito menos um retrocesso ao fundamentalismo cristão medieval.
Tampouco representa a aceitação do humanismo antropocêntrico individualburguês: é, sim, um humanismo antropofilíaco com uma proposta de
relacionamento universal, abrangente e includente entre os homens, entre
tudo e todos, que se concretiza pelo amor fraterno251.
Esse humanismo integral que vem sendo realizado na linha do tempo da
humanidade requer que a pessoa humana se desenvolva em todas as suas
dimensões, tendo o homem como um fim em si mesmo.
Nesse sentido, seguindo a lição de Maritain
Uma pessoa é um universo de natureza espiritual dotado da liberdade de
escolha e constituindo, portanto, um todo independente em face do mundo,
não podendo nem a natureza nem o Estado tocar neste universo sem a sua
permissão. E Deus mesmo, que está e age no seu intimo, age de um modo
particular e com uma delicadeza particularmente preciosa, que patenteia a
importância que lhe dá; respeita sua liberdade, no coração da qual habita,
entretanto; solicita-a, e jamais a obriga252.
Há, portanto, a necessidade de um novo caminho para o desenvolvimento,
no qual o valor da dignidade da pessoa individual e coletivamente, pregado pelo
Humanismo Integral seja levado a efeito concreto. Esse humanismo requer que o
250
SAYEG, Ricardo, BALERA, Wagner. O capitalismo humanista. Filosofia humanista de Direito
Econômico. Petrópolis – RJ: KBR, 2011, p. 96.
251
SAYEG, Ricardo, BALERA, Wagner. O capitalismo humanista. Filosofia humanista de Direito
Econômico. Petrópolis – RJ: KBR, 2011, p. 96-97.
252
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 10.
104
desenvolvimento esteja baseado na solidariedade, a partir das ideias do bem
comum.
A solidariedade cristã pressupõe que o próximo seja amado não só como
‘um ser humano com os seus direitos e a sua igualdade fundamental em
relação a todos os demais, mas (como) a imagem viva de Deus Pai,
resgatada pelo sangue de Jesus Cristo e tornada objeto da ação
permanente do Espírito Santo, como um irmão. ‘Então a consciência da
paternidade comum de Deus, da fraternidade de todos os homens em
Cristo, ‘filhos no Filho’, e da presença e da ação vivificante do Espírito Santo
conferirá – lembra João Paulo II – ao nosso olhar sobre o mundo como que
um novo critério para o interpretar, para o transformar253.
Assim, o desenvolvimento deve ser encarado como a liberdade de escolha
da pessoa – esse universo de natureza espiritual. Todavia, adverte Galvão de Souza
Não só de pão vive o homem, ensina-nos o Evangelho. De nada valeria aos
homens reunidos em sociedade alcançar uma cópia superabundante de
bens matérias, perfeitamente distribuídos entre todos, se lhes faltasse o
nutrimento do espírito, o bem da alma. Por sua vez, o progresso que fosse
apenas um progresso técnico seria ilusório, e aliás, em nossos dias,
estamos vendo como as conquistas da técnica mais aperfeiçoada muitas
vezes acarretam a destruição da própria sociedade (haja a ‘bomba
atômica)254.
As pessoas somente atingiram o desenvolvimento quando existir para todas
a justa partilha dos resultados do desenvolvimento, ou seja, que todas possam
desfrutar do processo econômico, social, político, cultural e espiritual, que visa ao
permanente crescimento de se viver bem, mediante uma participação ativa e livre.
253
FRANCISCO. Mensagem da paz, de 2014. Fraternidade, fundamento e caminho para a paz.
Disponível
em:
https://w2.vatican.va/content/francesco/pt/messages/peace/documents/papafrancesco_20131208_messaggio-xlvii-giornata-mondiale-pace-2014.html. Acesso em: 8 ago. 2016.
254
SOUZA, José Pedro Galvão de. Direito natural, direito positivo e estado de direito. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1977, p. 70.
105
Contudo, os meios a serem escolhidos não pode ser condicionado pelos
programas
ditados
pelos
que
já
chegaram
a
superiores
estágios
de
desenvolvimento.
Como indica Sen
A expansão da liberdade humana é tanto o principal fim como o principal
meio do desenvolvimento. O objetivo do desenvolvimento relaciona-se à
avaliação das liberdades reais desfrutadas pelas pessoas. As capacidades
individuais dependem crucialmente, entre outras coisas, de disposições
econômicas, sociais e políticas. (...) Os fins e os meios do desenvolvimento
exigem que a perspectiva da liberdade seja colocada no centro do palco.
Nessa perspectiva, as pessoas têm de ser vistas como ativamente
envolvidas – dada a oportunidade – na conformação de seu próprio destino,
e não apenas como beneficiárias passivas dos frutos de engenhosos
programas de desenvolvimento. O Estado e a sociedade têm papéis amplos
no fortalecimento e na proteção das capacidades humanas. São papéis de
sustentação, e não de entrega sob encomenda. A perspectiva do
desenvolvimento merece toda a nossa atenção 255.
Numa franca solidariedade entre as nações exigi-se que os países de maior
desenvolvimento econômico hajam de modo a propiciar a redistribuição dos
benefícios de uma economia bem organizada, de modo a permitir que as demais
alcancem igual estágio de desenvolvimento. Esse será, conforme Balera
O verdadeiro desenvolvimento exige, portanto, a mudança das estruturas
econômicas e sociais; o engajamento efetivo dos Estados, dos organismos
internacionais e das organizações não governamentais, sob a inspiração do
humanismo256.
Esse enfoque, de uma proposta de equilíbrio entre o econômico e o social foi
adotada pela Assembleia Geral da ONU, de dezembro de 1986, ao editar a
Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento. Os esforços mais diligentes para
255
SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. Tradução Laura Teixeira Motta. São Paulo:
Companhia das Letras, 2010, p. 76-77.
256
BALERA, Wagner. Humanismo e desenvolvimento. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de;
CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o
humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 405.
106
compreensão desse tema foram empreendidos por Wagner Balera, chegando à
conclusão
Permanente deve ser a pauta do desenvolvimento.
Neste tempo em que muitas nações estão enfrentando os dissabores da
crise e muitas daquelas que nunca saíram da crise sofrem ainda mais,
devem reconhecer de boa vontade que tanto os mais poderosos quanto os
mais humildes terão que unir esforços para que, em caráter permanente,
cuidem do tema e do problema do desenvolvimento257.
O Direito ao Desenvolvimento deriva como um direito ao bem comum. O que
mobiliza o bem comum é solidariedade. Essa, por sua vez, acontece da
interdependência entre a pessoa e a sociedade. Esta relação, colocada em sentido
do Humanismo Integral, é de ser considerada como estabelecimento de laços
econômicos e sociais entre os diferentes Estados, como ainda da comunidade
internacional para com cada um dos seus partícipes.
A solidariedade internacional é consagrada na Declaração Universal dos
Direitos Humanos, cujo artigo XXVIII proclama: “Art. XXVIII. Todo o homem tem
direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades
estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados”.
O mesmo documento também já reconhecia uma solidariedade com vista ao
equilíbrio entre os Estados na fruição das novas tecnologias e o progresso científico,
numa perspectiva de cooperação social e ambiental: “Artigo. XXVII.1. Todo homem
tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as
artes e de participar do progresso científico e de fruir de seus benefícios”.
Para completar o arcabouço do documento de 1948, a Assembleia Geral
expediu a Resolução n. 2.200-A, em 16 de dezembro de 1966, editou o Pacto dos
Direitos Econômicos Sociais e Culturais258 e o Pacto dos Direitos Civis e Políticos259.
257
BALERA, Wagner. Declaração sobre o direito ao desenvolvimento anotada. Curitiba: Juruá,
2015, p. 123.
258
O Congresso Nacional ratificou esse Pacto por intermédio do Decreto Legislativo n. 226, de
dezembro de 1991, e o Poder Executivo o promulgou por meio do Decreto n. 591, de 1992.
107
Os três documentos compõem a Carta Internacional dos Direitos Humanos
(International Bill of Rights).
O dever de cooperação se expressa no parágrafo 1º do artigo 2º do Pacto
dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, cujo teor é o seguinte
Artigo 2º - 1. Cada Estado Parte do presente Pacto compromete-se a adotar
medidas, tanto por esforço próprio como pela assistência e cooperação
internacionais, principalmente nos planos econômico e técnico, até o
máximo de seus recursos disponíveis, que visem a assegurar,
progressivamente, por todos os meios apropriados, o pleno exercício dos
direitos reconhecidos no presente Pacto, incluindo, em particular, a adoção
de medidas legislativas.
Igualmente, a cooperação está disposta no Pacto dos Direitos Civis e
Políticos, no seu parágrafo 2º do artigo 1º
Artigo 1º - 2. Para a consecução de seus objetivos, todos os povos podem
dispor livremente se suas riquezas e de seus recursos naturais, sem
prejuízo das obrigações decorrentes da cooperação econômica
internacional, baseada no princípio do proveito mútuo, e do Direito
Internacional. Em caso algum, poderá um povo ser privado de seus meios
de subsistência.
Neste contexto, a democracia é um instrumento para o desenvolvimento, vez
que ela é um conjunto de oportunidades através da via política. A democracia é
apenas um dos aspectos do desenvolvimento, contudo sem ela os outros não se
concretizam.
E,
acrescentaríamos,
considerando
o
presente
estudo
sobre
desenvolvimento sustentável num olhar humanista, ter ocorrido nos documentos
internacionais sobre desenvolvimento e meio ambiente a mesma diligência com o
reconhecimento da necessária solidariedade e cooperação.
259
O Congresso Nacional ratificou esse Pacto por intermédio do Decreto Legislativo n. 226, de
dezembro de 1991, e o Poder Executivo o promulgou por meio do Decreto n. 592, de 1992.
108
A Declaração de Estocolmo sobre o meio ambiente humano, de 1972,
expressa com todas as letras a participação ativa e a cooperação como
fundamentais para se alcançar a paz e o desenvolvimento econômico e social em
todo o mundo, em conformidade com a realidade do meio ambiente. É teor do
parágrafo 7 do preâmbulo
7. Para se chegar a esta meta será necessário que cidadãos e
comunidades, empresas e instituições, em todos os planos, aceitem as
responsabilidades que possuem e que todos eles participem
eqüitativamente, nesse esforço comum. Homens de toda condição e
organizações de diferentes tipos plasmarão o meio ambiente do futuro,
integrando seus próprios valores e a soma de suas atividades. As
administrações locais e nacionais, e suas respectivas jurisdições, são as
responsáveis pela maior parte do estabelecimento de normas e aplicações
de medidas em grande escala sobre o meio ambiente. Também se requer a
cooperação internacional com o fim de conseguir recursos que ajudem aos
países em desenvolvimento a cumprir sua parte nesta esfera. Há um
número cada vez maior de problemas relativos ao meio ambiente que, por
ser de alcance regional ou mundial ou por repercutir no âmbito internacional
comum, exigem uma ampla colaboração entre as nações e a adoção de
medidas para as organizações internacionais, no interesse de todos. A
Conferência encarece aos governos e aos povos que unam esforços para
preservar e melhorar o meio ambiente humano em benefício do homem e
de sua posteridade.
A paz, o desenvolvimento e a proteção ambiental são interdependentes e
indivisíveis no chamado sólido de participação, consagrado na Declaração do Rio
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, ao dispor nos seus princípios,
elencados:
Princípio 4. Para alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção
ambiental deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento,
e não pode ser considerada isoladamente deste.
Princípio 5. Todos os Estados e todos os indivíduos, como requisito
indispensável para o desenvolvimento sustentável, devem cooperar na
tarefa essencial de erradicar a pobreza, de forma a reduzir as disparidades
nos padrões de vida e melhor atender as necessidades da maioria da
população do mundo.
Princípio 6. A situação e as necessidades especiais dos países em
desenvolvimento relativo e daqueles ambientalmente mais vulneráveis,
devem receber prioridade especial. Ações internacionais no campo do meio
ambiente e do desenvolvimento devem também atender aos interesses e às
necessidades de todos os países.
Princípio 7. Os Estados devem cooperar, em um espírito de parceria global,
para a conservação, proteção e restauração da saúde e da integridade do
109
ecossistema terrestre. Considerando as distintas contribuições para a
degradação ambiental global, os Estados têm responsabilidades comuns,
porém diferenciadas. Os países desenvolvidos reconhecem a
responsabilidade que têm na busca internacional do desenvolvimento
sustentável, em vista das pressões exercidas por suas sociedades sobre o
meio ambiente global e das tecnologias e recursos financeiros que
controlam.
Conforme consta, a solidariedade e a cooperação são exigidas nos
documentos internacionais de Direitos Humanos em consonância ao direito ao
desenvolvimento sustentável. Não há apenas uma exigência de ordem moral. Seu
fundamento jurídico encontra-se ancorado desde a composição da Carta das
Nações Unidas.
É impositivo o dever de solidariedade entre os povos, segundo as
responsabilidades internacionais, na esfera econômica, social e ambiental, que
obrigam cada qual na medida das respectivas posições políticas e estratégicas no
mundo.
Contudo, estamos vivenciando uma crise ecológica, cuja causa esta
intimamente relacionada ao próprio conceito de desenvolvimento e a visão do
homem e das suas relações com os seus semelhantes e com todos os demais seres
da Terra.
Nestas condições, o dever de solidariedade, ainda que precisamente
expresso nos documentos, que ecoaram em favor do direito humano ao
desenvolvimento sustentável a partir da Carta das Nações Unidas, não encontra seu
pleno cumprimento.
A crise moral que assola o homem, sem dúvida, desencadeia um
desenvolvimento predatório contra ele mesmo e todo o resto do universo, o que tem
como efeito direto a crise ecológica. Essa crise abrange todos os aspectos do bem
viver. Há situações de crise de caráter econômico, alimentar, ambiental, social e
cultural.
110
O desenvolvimento sustentável exige que as nações e povos acolham o
ideário do bem comum, colocados sob a perspectiva da pessoa humana individual e
na vida comunitária. Perfilar-se com os valores do Humanismo Integral, pregados
por Jacques Maritain, poderá, ao que nos parece, contribuir no papel histórico que
incumbe a todos os povos e homens do planeta no trato da pessoa humana e sua
imbricada relação com o ambiente e a criação.
Daqui, resgatamos nosso questionamento inicial: o Humanismo de Jacques
Maritain poderá ser o caminho efetivo para a conquista do desenvolvimento
sustentável.
Como é sabido, Maritain não escreveu um livro ou artigos específicos, mas
podemos encontrar alusões ao tema que deixam sua posição esclarecida. Há pistas
que estimulam a elaboração de caminhos novos, adaptados à característica do
problema do desenvolvimento sustentável.
Assim, este tema do desenvolvimento sustentável não passou despercebido
no Humanismo Integral de Jacques Maritain. Um novo regime de civilização que se
caracteriza por um antropocentrismo solidário com vista a uma renovação cultural
participativa e inclusiva de todas as formas de vida.
Enquanto manifestação dessa nova sociedade podemos trazer
Tomás de Aquino concentra na justiça toda a ética natural que emerge da
natureza do homem e do texto bíblico: ‘Todos os preceitos do decálogo
pertencem à justiça’. Segundo essa perspectiva, existem três atitudes justas
fundamentais: a possessão, o respeito e a adoração. Assim a justiça em
relação aos seres inferiores se exprime na atitude de possessão; justiça em
relação ao homem igual a todos os outros homens, consiste no respeito à
pessoa e, finalmente a justiça em relação ao ser Supremo se exprime pela
adoração. Explicitemos esta tese.
Primeiramente, o homem exerce um comportamento possessivo em relação
a todos os seres que se situam abaixo dele na escala rerum: ‘Dominai a
terra’ – ordena a Bíblia. Observemos, porém, que, nas épocas bíblicas e
grego-medieval, o poder de posse se limitava a forças naturais do homem.
O homem era considerado rei da natureza, mais ou menos como o leão é
considerado o rei da floresta e dos animais. Isto é, na Antiguidade, o
homem não desenvolveu forças especiais que pudessem destruir ou
esmagar a natureza. Muito pelo contrário, em muitos momentos, o homem
foi vítima de cataclismas e de pestes.
111
A segunda atitude ética é do respeito ao seu semelhante, é o
comportamento justo e conveniente dentre os seres que ocupam igual
posição na escala rerum. O mínimo que a justiça exige é o respeito pela
vida do outro: ‘Não matarás, não é lícito levantar falsas afirmações em
relação ao outro, nem roubá-lo nem violentá-lo etc. Enfim, a justiça em
relação ao outro abrange tudo que hoje entendemos por direitos humanos.
Finalmente, a terceira atitude é a adoração ao Ser Supremo, Criador da
natureza. É o comportamento justo face ao Ser que confere à natureza o
existir, o viver e o mover-se.
Sem dúvida, justiça assim entendida constitui o fundamento sólido para se
erguer uma ética cósmica que regula as atitudes devidas a todos os seres
materiais, vivos, humanos e divinos. O homem que é antes de tudo um ser
natural, não se pode arvorar-se em déspota da natureza. Isto é
inconcebível, uma ética da justiça260.
Este novo humanismo encarnar-se para o ideal de uma comunidade
solidária e justa, onde os homens “sacrificam-se” por uma vida melhor para os
seus irmãos e pelo bem concreto desse sujeito universal que é a humanidade
inteira, deslocada para o meio difuso de todas as coisas.
Pois, somente um humanismo baseado na verdade da amizade sólida, a
fazer passar na ordem do social e nas estruturas da vida comum, é capaz de
engrandecer os homens na comunhão consigo próprios e tudo o que há no
universo. Por isto que ele não poderia ser outro senão um humanismo heróico.
A solidariedade, diante da questão do meio ambiente e do desenvolvimento
sustentável irá requerer um laço desse todo universo que é o homem e desse todo
universo que é o ambiente.
Num encontro da visão contemplativa e da visão mística do mundo São
Francisco de Assis, no Cântico das Criaturas, nos dá o exemplo, de um
comportamento solidário em favor da vida. Através do ambiente a pessoa humana
trilhará o seu caminho em direção ao desenvolvimento, não somente numa esfera
social-temporal, mas também espiritual.
260
LANDIM, Maria Luiza P.F. A relação homem-natureza em Tomás de Aquino e na modernidade. In:
STEIN, Ernildo (org.) A cidade dos homens e a cidade de Deus. Porto Alegre: EST, 2007, p. 80.
112
São valores reconhecidos na Declaração de Estocolmo, no seu preâmbulo
1. O homem é ao mesmo tempo obra e construtor do meio ambiente que o
cerca, o qual lhe dá sustento material e lhe oferece oportunidade para
desenvolver-se intelectual, moral, social e espiritualmente. Em larga e
tortuosa evolução da raça humana neste planeta chegou-se a uma etapa
em que, graças à rápida aceleração da ciência e da tecnologia, o homem
adquiriu o poder de transformar, de inúmeras maneiras e em uma escala
sem precedentes, tudo que o cerca. Os dois aspectos do meio ambiente
humano, o natural e o artificial, são essenciais para o bem-estar do homem
e para o gozo dos direitos humanos fundamentais, inclusive o direito à vida
mesma261.
Numa ótica mística o mundo ou o cosmos é uma criação. Contudo, a
exaltação da grandeza do Universo revela-nos o sentimento de responsabilidade de
tudo que nos cerca, contudo isso não se confunde com uma imobilidade passiva
diante da natureza ou com uma sina do mundo criado.
As aspirações do homem com o Cosmos, na sua dimensão existencial e
história constata-se conforme Coimbra interpreta o Cântico das Criaturas de
Francisco de Assis, ao entender:
O Cântico das Criaturas é um código que compendia seu comportamento
diante da natureza criada. A atitude franciscana passa a ser um padrão
cada vez mais necessário de comportamento, o antídoto para o
racionalismo mecanicista que marca a tecnologia moderna e para o vazio
262
que se alarga no espírito humano .
Prega Maritain, da mesma forma, sobre a postura do ser humano em face da
natureza e a favor do desenvolvimento sustentável. Afirma ele
261
Declaração de Estocolmo sobre o ambiente humano, de junho 1972. Disponível em:
http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Meio-Ambiente/declaracao-de-estocolmo-sobre-oambiente-humano.html. Acesso em: 3 ago. 2016.
262
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente: uma incursão humanista na
questão ambiental. Campinas-SP: Millennium, 2002, p. 237.
113
Uma comunhão, em uma mesma fé viva, da pessoa humana com as outras
pessoas reais e concretas, e com Deus que elas amavam, e com a criação
inteira, tornava, no meio de muitas misérias, o homem fecundo em
heroísmo assim como em atividade de conhecimento e em obras de beleza;
e nos corações mais puros um grande amor, exaltando no homem a
natureza acima dela própria, estendia às próprias coisas o senso da
piedade fraterna; então, um S. Francisco compreendia que antes de ser
explorada em nosso serviço por nossa indústria, a natureza material
reclama em qualquer sorte ser adestrada por nosso amor; quero dizer que
amando as coisas, e nelas o ser, o homem as atrai ao humano, em lugar de
fazer passar o humano sob a sua medida263.
Portanto, as coisas do mundo, celebradas por São Francisco e reivindicadas
a serem amadas por Maritain, constituem uma linguagem natural da pessoa humana
tomada de espírito de solidariedade.
Segundo Francisco264, cantava São Francisco de Assis Laudato Si’, mi’
Signore – Louvado seja, meu Senhor, celebrando as coisas que podem ser
imaginadas, valorizadas e ordenadas em nossa casa comum, que ora pode se
comparar a uma irmã, com quem compartilhamos nossa existência, ora a uma
generosa mãe que nos guarda e nos alimenta a nossas duas dimensões, a corporal
e a espiritual.
Essa comunhão solidária e responsável foi proposta por Francisco de Assis,
e exigida por Maritain
Francisco de Assis é visto como uma figura exemplar de grande irradiação.
Com fina percepção sentia o laço de fraternidade e de sororidade que nos
une a todos os seres. O coração de Francisco significa um estilo de vida, a
expressão genial do cuidado, uma prática de confraternização e um
renovado encantamento pelo mundo. Recriar esse coração nas pessoas e
resgatar a cordialidade nas relações poderá suscitar no mundo atual o
mesmo fascínio pela sinfonia do universo e o mesmo cuidado com irmã e
mãe Terra265.
263
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 5.
264
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
São Paulo: Paulus, 2015.
265
FRANCISCANOS. O cântico das criaturas. Disponível em:
http://www.franciscanos.org.br/?page_id=3124)%20%20See%20more%20at:%20http://www.francisca
nos.org.br/?page_id=3124. Acesso em: 10 ago. 2016.
114
O meio ambiente é um bem comum a que todos têm o direito de desfrutar e
o dever de cuidar, cujo dever de responsabilidade e cuidado cabe ao Estado e a
participação ativa de todas as pessoas. Ao mesmo tempo ele é um caminho de
liberdade responsável para o desenvolvimento integral e sustentável, cabendo ao
direto ser o instrumento capaz de estimular a compreensão comum e o espírito de
responsabilidade comum para que a pessoa humana consiga livremente e
ativamente a transformação do mundo com vista ao acolhimento dos pobres e das
presentes e futuras gerações.
Maritain já propugnava essa ordem das coisas
A mesma lei natural que determina os nossos deveres mais fundamentais, e
em virtude da qual toda lei obriga, é a mesma lei que nos concede os
nossos direitos fundamentais. O fato de estarmos integrados na ordem
universal, nas leis e nas normas do cosmos e da imensa família das
naturezas criadas (e, finalmente, na ordem da Sabedoria Criadora) e ainda
o fato de termos o privilégio de participar, ao mesmo tempo, da natureza
espiritual é que determinam os direitos que temos em relação a outras
pessoas e a todo o conjunto das criaturas. Em última análise, visto como
toda criatura atua em virtude do seu Princípio, que é o Ato Puro; visto como
toda autoridade digna desse nome (isto é, justa) obriga em consciência, em
virtude do Princípio dos seres, que é a pura Sabedoria, - assim, também
todo e qualquer direito possuído pelo homem é possuído em virtude do
direito de Deus, que é pura Justiça, de ver respeitada, obedecida e amada
por toda inteligência a ordem da sua Sabedoria em todas as coisas. É
essencial à lei ser uma ordem da ‘razão’. Ora, a lei natural, ou seja, a
normalidade do funcionamento da natureza humana que se nos revela
mediante um conhecimento por inclinação, só é lei, isto é, só obriga em
consciência, porque a natureza e as inclinações da natureza manifestam
uma ordem da razão, - isto é, da Razão Divina. A lei natural só é lei por ser
uma participação da Lei Eterna266.
A lei enquanto manifestação de uma ordem da razão elege o direito como
uma infraestrutura para o desenvolvimento sustentável, como seu fomentador.
266
MARITAIN, Jacques. O homem e o Estado. Tradução Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952, p. 112-113.
115
“O direito desperta o homem para a consciência de sua dignidade”
267
, ou
que equivale dizer, na lição de Galvão de Souza
O fundamento próximo da ordem natural e jurídica é a lei natural, ou seja, a
própria natureza humana, pois o homem traz em sim mesmo a sua lei, e os
preceitos da reta razão lhe indicam o modo de agir humanamente.
Por outras palavras, o exato conhecimento da natureza humana permite
conhecer as normas que o homem deve obedecer para viver como homem,
isto é, conforme à sua natureza268.
Por fim, concluímos com Maritain, segundo seu registro de uma civilização
solidária
A civilização moderna é uma vestimenta muita usada, não se pode colar
nela novos pedaços, é uma reconstrução total e como que substancial que
está em causa, uma subversão dos princípios da cultura, pois que se trata
de atingir a um primado vital da qualidade sobre a quantidade, do trabalho
sobre o dinheiro, do humano sobre a técnica, da sabedoria sobre a ciência,
do serviço comum das pessoas humanos sobre a ambição individual de
enriquecimento indefinido ou a vontade estática de poder ilimitado 269.
2.3.1 Linhas de orientação e ação
2.3.1.1 Laudato Si’
A Carta Encíclica “Laudato Si, louvado sejas”, sobre o cuidado da casa
comum, do Papa Francisco 270, não foi feita apenas para os católicos, mas para
toda a humanidade, de todas as religiões, crentes e não-crentes.
267
SOUZA, José Pedro Galvão de. Direito natural, direito positivo e estado de direito. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1977, p. 70.
268
SOUZA, José Pedro Galvão de. Direito natural, direito positivo e estado de direito. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1977, p. 55.
269
MARITAIN, Jacques. Humanismo integral. Uma visão nova da ordem cristã. Tradutor Afrânio
Coutinho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 199.
270
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
São Paulo: Paulus, 2015.
116
Este documento que integra a Doutrina Social da Igreja traz uma ligação
consistente entre a crise ecológica, a crise social e o modelo de desenvolvimento
globalizado, caracterizado pelo paradigma atual de coisificação do mundo, pela
atitude pragmática mercantilista e expansão descontrolada da tecnologia como
uma profunda crise de valores e do modo de vida.
Deve-se ter em vista que a religião constitui um considerável patrimônio
entre todos os povos e através de todos os tempos.
Segundo Coimbra, o fato religioso tem uma dimensão transcendental
histórica: “que não só exerce enorme influencia sobre a sociedade, como ainda,
chega até os escaninhos do coração humano, onde apenas o amor ou o ódio
encontra seu último reduto”271.
Na história do ocidente há uma fortíssima presença do Cristianismo. Como
um fato cultura o Cristianismo revela-se inspiração e fator do comportamento do ser
humano em face do meio ambiente e da natureza.
Na encíclica, Francisco nos convida, a todos, através do encontro com Deus,
a ver na natureza, revelada pela criação, o reconhecimento e a imagem divina,
chegando assim a descobrir e a aceitar, verdadeiramente, a criação como parte que
nos integra e vice-versa, e dessa maneira maturar um amor que se torna cuidado
dela e por ela.
Diante disso, Francisco nos apresenta na Laudato Si, no capítulo V algumas
linhas de orientação e ação, dividido em cinco subtítulos. São eles: 1. O diálogo
sobre o meio ambiente na política internacional, 2. O diálogo para novas políticas
nacionais e locais; 3. Diálogo e transparência nos processos decisórios; 4. Política e
economia em diálogo para a plenitude humana, e 5. As religiões no diálogo com as
ciências.
271
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente: uma incursão humanista na
questão ambiental. Campinas: Millennium, 2002, p. 232.
117
Francisco delineou “grandes percursos de diálogo que nos ajudem a sair da
espiral de autodestruição onde estamos afundando” 272. Assim, contribui com alguns
caminhos, cuja proposta é integral e capaz de considerar a interdependência dos
sistemas naturais entre si e com os sistemas sociais.
O pontífice, na proposta de um “diálogo sobre o meio ambiente na política
internacional”, ressalta ter o planeta Terra um caráter de casa comum da
humanidade. Assim, em um mundo interdependente as soluções devem ser
propostas segundo a perspectiva de alcançar o bem comum global e não apenas
para defesa dos interesses de alguns países. Portanto, devemos assumir nossas
responsabilidades e decidir quem deverá suportar os maiores custos no esforço para
a proteção ambiental e social.
Igualmente, a decisão política deve tomar a punho os acordos ambientais
globais, como por exemplo, a Declaração de Estocolmo de 1972, com adequados
mecanismos de controle, revisão periódica e sanção das violações.
Ao tratar sobre do tema “o diálogo para novas políticas nacionais e locais”
Francisco aponta que as questões relacionadas com o meio ambiente e com o
desenvolvimento econômico já não se podem ser acolhidas apenas a partir das
diferenças entre países, mas exigem que se preste atenção nas políticas nacionais e
locais.
Deste modo, deve o Estado planificar, coordenar, vigiar e sancionar dentro
do seu território. A política deve trabalhar com base em grandes princípios e
pensando no bem comum a longo prazo.
Neste contexto, cabe a sociedade, por meio de organismos não
governamentais e associações intermediárias, forçar os governos a desenvolver
normas, procedimentos e controles mais rigorosos. O cidadão, ao controlar o poder
político (nacional, regional e municipal), combate os danos ambientais.
272
FRANCISCO. Laudato Si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 163. São Paulo: Paulus, 2015.
118
Deste modo, nos interroga Francisco
Como pode a sociedade organizar e salvaguardar o seu futuro num
contexto de constantes inovações tecnológicas? Um fator que atua como
moderador efetivo é o direito, que estabelece as regras para as condutas
permitidas à luz do bem comum (Ponto 177) 273.
Mais uma sugestão dada por Francisco, diz respeito “ao diálogo e
transparência nos processos decisórios”. Ele sugere uma imperiosa necessidade de
processo políticos transparentes e sujeitos a diálogos, afastados do veneno da
corrupção. “É necessário haver sinceridade e verdade nas discussões científicas e
políticas, sem se limitar a considerar o que é permitido ou não pela legislação”
274
.
Na sequência, o Pontífice fala sobre “política e economia em diálogo para a
plenitude humana”. Ele deixa claro que
A política não deve submeter-se à economia, e esta não deve submeter-se
aos ditamos e ao paradigma eficientista da tecnocracia. Pensando no bem
comum, hoje precisamos imperiosamente que a política e a economia, em
diálogo, coloquem-se decididamente a serviço da vida, especialmente da
vida humana (Ponto 189)275.
É imperioso refletir responsavelmente sobre o sentido da economia e seus
objetivos, considerando que ético somente é um comportamento em que os custos
econômicos e sociais nascidos no uso dos recursos ambientais comuns sejam
reconhecidos de maneira transparente e totalmente suportados por quem deles
usufrui e não por outras populações nem pelas gerações futuras.
Igualmente reforça ter a produção uma ligação com as variáveis da
economia, e nos adverte de que se não tivermos vista curta, poderemos descobrir
273
FRANCISCO. Laudato si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 177. São Paulo: Paulus, 2015.
274
FRANCISCO. Laudato si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 183. São Paulo: Paulus, 2015.
275
FRANCISCO. Laudato si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 189. São Paulo: Paulus, 2015.
119
que pode ser muito rentável a variedade de uma produção mais inovadora e com
menor impacto ambiental. “Trata-se de abrir caminho a oportunidades diferentes que
não implicam frear a criatividade humana nem o seu sonho de progresso, mas
orientar essa energia por novos canais” 276.
Ainda, requer o desenvolvimento sustentável uma redução no consumo,
para que todas as pessoas do mundo possam viver de acordo com sua dignidade
humana.
E quanto a política devemos nos ater ao princípio da subsidiariedade, que dá
liberdade para o desenvolvimento das capacidades presentes a todos os níveis, mas
simultaneamente exige mais responsabilidade pelo bem comum de quem tem mais
poder.
A política deve gerar uma reformulação integral, através de mais estratégia
de mudança real que exige repensar a totalidade dos processos, pois não basta
incluir considerações ecológicas superficiais enquanto não se puser em discussão a
lógica subjacente à cultura atual.
Por fim ao se referir sobre “as religiões com as ciências” nos alerta que as
ciências empíricas são incapazes de acolher a sensibilidade estética, a poesia e
ainda a capacidade de a razão perceber o sentido e a finalidade das coisas.
Por outro lado, acredita que os princípios éticos podem aparecer através da
linguagem religiosa. E assim, convida “aos crentes para se abrirem a graça de Deus
e se nutrirem das próprias convicções sobre o amor, a justiça e a paz” 277.
Assim, é preciso o “regresso à respectivas fontes que permite às religiões
responder melhor às necessidades atuais”. Como também se torna imprescindível
estabelecer diálogos entre as várias religiões, do mesmo modo entre as próprias
ciências e também dos diferentes movimentos ecologistas.
276
FRANCISCO. Laudato si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 191. São Paulo: Paulus, 2015.
277
FRANCISCO. Laudato si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 200. São Paulo: Paulus, 2015
120
A gravidade da crise ecológica obriga-nos, a todos, a pensar no bem
comum e a prosseguir pelo caminho do dialogo que requer paciência,
ascese e generosidade, lembrando-nos sempre que ‘a realidade é superior
à ideia’ (Ponto 201) 278.
2.3.1.2 Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (dos ODM aos ODS)
Com apoio em Balera, vale dizer
O Direito ao Desenvolvimento objetiva outorgar a todo o homem os meios
necessários à respectiva qualificação como personalidade, é dizer, como
sujeito apto a realizar seus fins naturais e temporais neste mundo, sem
prejuízo de seu direito à objetiva conquista do destino sobrenatural a que se
acha vocacionado desde sempre279.
O humanismo requer que se integrem todas as diferentes vias do
desenvolvimento – econômica, política, social, cultural e ambiental. Igualmente
preconiza que é o homem, sempre o homem, o seu sujeito.
O Direito ao Desenvolvimento surge como o direito ao bem comum. O que
move o bem comum é a solidariedade. Essa decorre da interdependência existente
entre a pessoa e a sociedade.
A solidariedade, proposta numa
perspectiva humanista, é de ser
considerada um dever da comunidade internacional. Como reflexo do dever de
cooperação, e seguindo o conjunto de aspirações do bem comum, a Assembleia
Geral das Nações Unidas realizou a Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social,
na cidade de Copenhague, em 1995.
278
FRANCISCO. Laudato si’, louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015.
Ponto 201. São Paulo: Paulus, 2015.
279
BALERA, Wagner. Humanismo e desenvolvimento. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de;
CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o
humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 406.
121
Da Cúpula de Copenhague resultaram dois documentos: a Declaração sobre
o Desenvolvimento Social e o Programa de Ação da Cúpula de Copenhague280.
Conforme entende Balera, essa reunião imprimiu a fisionomia política
humanista ao desenvolvimento, visto que
A Declaração de Copenhague, associando-se a essa ideia considera a
erradicação da pobreza como ‘imperativo ético, social, político e econômico’
O desenvolvimento surge, destarte, como o termo perficiente da vida em
comunidade e como, em nossos dias, o princípio dos princípios do
humanismo integral281.
Dando sequência aos esforços de Copenhague, as Nações Unidas
realizaram a denominada Cúpula do Milênio, que reuniu, no ano de 2000,
representantes de 189 países que fixaram os Objetivos de Desenvolvimento Milênio
até 2015.
No documento intitulado “Nós, os Povos, o Papel das Nações Unidas no
Século XXI”282, do Secretário –Geral da ONU, Kofi Annan, fixou um roteiro para o
desenvolvimento.
Os Oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) são os seguintes
 Erradicar a extrema pobreza e a fome
 Atingir o ensino básico universal
 Promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres
 Reduzir a mortalidade infantil
 Melhorar a saúde materna
280
Declaração e programa de ação da cúpula mundial sobre desenvolvimento social –
Copenhague – 1995. 06 à 12 de março de 1995. Disponível em:
http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Confer%C3%AAncias-de-C%C3%BApula-dasNa%C3%A7%C3%B5es-Unidas-sobre-Direitos-Humanos/declaracao-e-programa-de-acao-da-cupulamundial-sobre-desenvolvimento-social.html. Acesso em: 4 ago. 2016.
281
BALERA, Wagner. Humanismo e desenvolvimento. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de;
CAVALCANTI, Thais Novaes (coord.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o
humanismo do Século XXI. São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 411-412.
282
ANNAN, Kofi. Nós, os povos, o papel das Nações Unidas no século XXI. Disponível em:
https://www.unric.org/html/portuguese/uninfo/Nosospovos.pdf. Acesso: 29 jul. 2016.
122
 Combater o HIV/AIDS, a malária e outras doenças
 Garantir a sustentabilidade ambiental
 Estabelecer uma Parceria Mundial para o Desenvolvimento
Nesse documento Annan revela nítida preocupação com a questão social e
ambiental, e reforça que as medidas tomadas são muito aquém do que aquelas
necessárias para preservar a vida com qualidade no planeta Terra. Revela com
clareza que mesmo com criação na ONU em 1945, a humanidade não consegue
assumir a sua responsabilidade e a grave crise social e ambiental.
Em 1945, não podiam prever a necessidade urgente que enfrentamos hoje
de garantir uma terceira liberdade, a de as gerações futuras poderem
continuar a viver neste planeta. Não estamos a conseguir garantir essa
liberdade. Pelo contrário, temos dilapidado o patrimônio dos nossos filhos
por meio de práticas insustentáveis do ponto de vista ambiental. O meio
natural presta-nos, gratuitamente, serviços básicos, sem os quais a nossa
espécie não poderia sobreviver. A camada de ozônio filtra os raios
ultravioletas do sol que são nocivos para as pessoas, animais e plantas. Os
ecossistemas ajudam a purificar o ar que respiramos e a água que
bebemos. Convertem resíduos em recursos e reduzem os níveis de carbono
na atmosfera que, de outro modo, contribuiriam para o aquecimento do
planeta. A biodiversidade constitui uma fonte abundante de medicamentos e
produtos alimentares e mantém a variedade genética, que reduz a
vulnerabilidade a pragas e doenças. Mas estamos a degradar e, em alguns
casos, a destruir a capacidade de o ambiente continuar a fornecer-nos
esses serviços essenciais à vida283.
O
documento
final
da
Conferência
das
Nações
Unidas
sobre
Desenvolvimento Sustentável, Rio+20 dispôs que o desenvolvimento de objetivos e
metas, tal qual aplicado em relação aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio,
seria útil na busca do desenvolvimento sustentável, por meio de ações focadas e
coerentes.
Decidiu-se
estabelecer
um processo intergovernamental inclusivo e
transparente que fosse aberto a todos, com vistas a elaborar os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS).
283
Annan, Kofi. Nós, os povos, o papel das Nações Unidas no século XXI. Disponível em:
https://www.unric.org/html/portuguese/uninfo/Nosospovos.pdf. Acesso: 29 jul. 2016.
123
No ano de 2015, durante a Cúpula das Nações Unidas sobre o
Desenvolvimento Sustentável, em Nova York, foi discutida na Assembleia Geral das
Nações Unidas a agenda em favor de toda a humanidade e do planeta.
Nesta reunião, 193 Estados-membros adotaram um novo programa de
desenvolvimento sustentável, com o objetivo de acabar com a pobreza, lutar contra
a desigualdade e a injustiça e combater as mudanças climáticas.
Assim, num segundo momento dos Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio (ODM) foi adotada pela Assembleia Geral os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS)284. Esses vão além dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
(ODM). Busca melhorar a vida de todos, em todos os lugares e criar um mundo
melhor para as gerações futuras. São um convite para que a humanidade prevaleça
sobre a política.
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável é
uma agenda de
desenvolvimento sustentável pós-2015, a ser trabalhada pelas Nações Unidas junto
aos governos, sociedade civil e demais parceiros. Eles são um programa para
equilibrar a prosperidade humana com a proteção do planeta. Deste modo, compõe
uma programação universal importante para todas as nações, o que exige, com
maior razão, dos países mais desenvolvidos o comprometimento efetivo para tornar
os objetivos uma realidade.
A política, através de seus governantes, deve promover o bem comum para
que todos possam ter a mínima base material e espiritual para viver com dignidade e
para formar e manter uma família.
São Dezessete os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que
compõe um conjunto de ações a serem adotados para todas as pessoas e para o
planeta e o caminho para o sucesso.
284
NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. 17 objetivos para transformar nosso mundo. Disponível em:
https://nacoesunidas.org/pos2015/. Acesso em: 30 jul. 2016.
124
O Secretário Geral da ONU, Ban Ki-Moon, elege como os quatro pilares dos
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS): as pessoas, o planeta, a paz e a
prosperidade. Portanto, a sua roupagem é humanista.
O relatório “O caminho para a dignidade em 2030”, propõe a união da
solidariedade ao direito ao desenvolvimento sustentável. Diz Ki-Moon
159. Temos de tomar os primeiros passos determinados no sentido de um
futuro sustentável e com dignidade. A transformação é o nosso propósito.
Temos de transformar as nossas economias, o nosso ambiente e as nossas
sociedades. Temos de mudar as nossas mentalidades ultrapassadas,
comportamentos e padrões destrutivos. Temos de abraçar os elementos
essenciais integrados da Dignidade, Pessoas, Prosperidade, Planeta,
Justiça e Parceria. Temos de desenvolver sociedades coesas, procurando a
paz e a estabilidade internacional. E, temos de estabelecer prioridades para
as boas soluções internacionais através de uma perspectiva do interesse
nacional de todos os Estados-Membros.
160. Um futuro assim é possível se mobilizarmos de forma coletiva a
vontade política e os recursos necessários para fortalecer as nossas nações
e o sistema multilateral. Temos os meios e os métodos para satisfazer estes
desafios se decidirmos usá-los e se trabalharmos juntos. Se os EstadosMembros mobilizarem agora o mundo em torno do desenvolvimento
sustentável ̶ a nível nacional e internacional ̶ a Organização das Nações
Unidas comprovará o seu valor como o principal organismo universal que
cumpre os princípios e objetivos da Carta das Nações Unidas285.
Segue Ki-Moon
161. No geral, o nosso trabalho é agora um desafio sério e inspirador.
Estamos no limiar do ano mais importante do desenvolvimento desde a
fundação da Organização das Nações Unidas. Temos de dar significado à
promessa desta Organização de ‘reafirmar a nossa fé na dignidade e no
valor da pessoa humana’ e conduzir o mundo para um futuro sustentável.
Com este processo extraordinário e a liderança sem precedentes que
testemunhou, temos uma oportunidade história e o dever de agir de forma
corajosa, vigorosa e expedita, para tornar a realidade numa vida digna para
286
todos, não deixando ninguém para trás .
285
KI-MOON, Ban. O caminho para a dignidade até 2030: erradicar a pobreza, transformar todas as
vidas e proteger o planeta. Disponível em:
http://www.cases.pt/0_content/noticias/images/5527SR_advance%20unedited_final_PT.pdf. Acesso
em: 30 jul. 2016.
286
KI-MOON, Ban. O caminho para a dignidade até 2030: erradicar a pobreza, transformar todas as
vidas e proteger o planeta. Disponível em:
http://www.cases.pt/0_content/noticias/images/5527SR_advance%20unedited_final_PT.pdf. Acesso
em: 30 jul. 2016.
125
A mesma proposta foi anteriormente pregada pelo Humanismo Integral, de
Jacques Maritain.
A erradicação da pobreza, a proposta de fome zero e agricultura sustentável,
a busca da saúde e bem-estar, a promoção da educação de qualidade, a conquista
da igualdade de gênero, a garantia de água potável e saneamento, a geração de
energia limpa e acessível, o fomento do trabalho decente e crescimento econômico,
a criação de indústria, inovação e infraestrutura, a redução das desigualdades, a
construção de cidades e comunidades sustentáveis, o estimulo ao consumo e
produção responsáveis, a ação contra a mudança global do clima, a proteção da
vida na água, a proteção da vida terrestre, a construção da paz, justiça e instituições
eficazes e as parcerias e meios de implementação para cooperação entres os povos
compõe os Dezessete Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
126
3 CONCLUSÃO: DESENVOLVIMENTO INTEGRAL E SUSTENTÁVEL
Aprofundar as ideias seminais contidas no pensamento do Humanismo
Integral de Jacques Maritain e aplicá-las às novas facetas de nossa realidade, foi o
esforço construtivo dessa dissertação.
Jacques Maritain publicou o livro Humanismo Integral em 1936. Poucos anos
depois ele foi traduzido para o português por Afrânio Coutinho.
A conversão do filósofo ao cristianismo no ano de 1906 o fez procurar, no
chamado cultural do diálogo da solidariedade estampado no Coração de Jesus
Cristo, a base de sua filosofia a partir do valor da dignidade humana. A ideia de uma
sociedade humana solidária, um novo regime temporal de concepção profana
cristão, com notas características que se afasta de um liberalismo inumano e ao
mesmo tempo afasta a imposição de um Estado confessional compõe a ideia deste
humanismo.
Há, portanto, o compromisso com um Estado laico, no qual a dignidade da
pessoa humana como um “valor guia” dos direitos fundamentais, possibilitará aos
diversos direitos fundamentais uma coexistência harmônica no domínio da
hermenêutica
constitucional,
não
obstante
os
seus
diferentes
conteúdos
normativos287. Como aduz Casamasso
O reflexo do princípio da dignidade da pessoa humana sobre os princípios
da laicidade e da liberdade religiosa deve ser considerado a partir da
tendência de valorização da liberdade religiosa enquanto direito
fundamental, concebida como parte integrante da formação e do
desenvolvimento da personalidade da pessoa humana em sua
singularidade. Aqui, o princípio da dignidade da pessoa humana repercute
sobre o direito fundamental da liberdade religiosa pondo em evidencia a sua
função promocional 288.
287
CASAMASSO, Marco Aurélio Lagreca. Política e religião: o Estado laico e a liberdade religiosa à
luz do constitucionalismo brasileiro [Dissertação de Doutorado apresentada perante a Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo]. São Paulo: Biblioteca NGK – PUC/SP, 2006
288
CASAMASSO, Marco Aurélio Lagreca. Política e religião: o Estado laico e a liberdade religiosa à
luz do constitucionalismo brasileiro [Dissertação de Doutorado apresentada perante a Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo]. São Paulo: Biblioteca NGK – PUC/SP, 2006
127
Como também, na fonte do tomismo vivo revelado por Tomás de Aquino, do
ensinamento deixado por Aristóteles, o filósofo Maritain requer o realismo de
vivenciar o outro, na certeza de que o homem se realiza nessa apreensão. Portanto,
inteligência é vida.
Ao evitar a ditadura do relativismo e revelar a importância do real, Jacques
Maritain, através de seu conceito sobre a pessoa humana, nos revela ser esta um
valor absoluto na ordem axiológica. No ideal do Humanismo Integral, a dignidade da
pessoa lhe é um valor inato, fonte de todos os Direitos Humanos e de todos os
ordenamentos jurídicos.
A proposta desse humanismo foi bem exposta por Alceu Amoroso Lima, na
obra “Os direitos do homem e o homem sem direitos”, ao tratar sobre o Preâmbulo
da Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948. As ideias centrais do
Humanismo Integral são: reconhecer a inerente dignidade da pessoa humana, o
regime democrático como o necessário para a efetivação dos Direitos Humanos, o
direito como um instrumento de reação a arbitrariedade, a cooperação entre os
Estados, uma ordem política organizada com vista à realização do bem comum e à
universalidade e o reconhecimento de uma mesma família humana.
No humanismo de Maritain, o homem é uma pessoa humana composta, não
somente de uma dimensão corpórea, mas de um microcosmo, um todo na medida
em que tem uma dignidade absoluta porquanto está em relação direta com o
Absoluto, assim ele se conduz pela inteligência e pela vontade. Daí decorre que as
pessoas possuem uma natureza comum, por serem frutos de uma mesma origem, o
que as tornam mais do que iguais, mas são irmãs entre si.
A pessoa humana não se contenta tão somente com sua dignidade pessoal.
Essa pessoa requer uma transformação solidária das estruturas sociais, para que se
128
proporcione a plena dignificação do homem todo e de todos os homens. Este é um
traço vivo na proposta de Maritain, um humanismo antropofilíaco.
Para tanto, a filosofia Humanista Integral exige a aplicação da solidariedade
como o requisito para o bem comum, cujo princípio primeiro é de que todos
devemos fazer o bem e evitar mal.
A solidariedade é o que gera o progresso material e a plenitude espiritual
das vidas individuais e coletivas de todos os membros da sociedade humana, ou
seja, é o pressuposto que movimenta o bem comum, a boa vida humana na
multidão.
A sociedade é fruto do trabalho e da vontade humana, e o Estado pertence a
essa ordem.
Ao Estado incumbe a realização de uma finalidade, que se realiza em
condições exteriores para que as pessoas possam exercer seus direitos e
cumprirem seus deveres. Assim, o Estado tem como finalidade a realização do bem
comum.
O meio ambiente como um bem comum universal exige que a dignidade da
pessoa humana prevalecente e acima de tudo, coloque esses bens naturais a
serviço da conquista comum da nossa comunidade de pessoas e da liberdade
humana de autonomia, com vista ao desenvolvimento.
Dentro da filosofia prática de Maritain há uma leitura acurada da realidade
que nos faz vivenciar que o desenvolvimento deve ser tomado como uma lei natural
da vida. É uma verdade de que as coisas e a própria vida devem continuar e
caminhar em direção ao melhor.
O desenvolvimento como o novo nome da paz é a própria abertura à vida. O
verdadeiro desenvolvimento da pessoa deve englobar a sua totalidade, abranger
todas as suas dimensões, o que impõe de fato a sua relação de dependência e
129
interdependência do ambiente natural, que no contexto desse trabalho ganhou
mesmo o formato de criação.
Este desenvolvimento concebido na integralidade da pessoa, com vista a
sua promoção econômica, social, política, cultural e ambiental, requer uma liberdade
responsável, como ainda a igualdade das conquistas como fruto da justiça e do bem
comum e a centralidade da solidariedade.
O desenvolvimento da pessoa ligada ao ambiente, trata-se do próprio
respeito à vida. O tema do desenvolvimento está imbricado com os deveres que
nascem do relacionamento e ligação do homem com o ambiente natural,
constituindo o seu uso e apropriação uma responsabilidade para com os pobres, as
gerações futuras e a toda a humanidade.
Ademais, diante da crise ecológica que assola o planeta e toda a
humanidade, devemos nos atrair a aceitar esse convite de ação solidária, para
assim assumirmos as rédeas de nosso desenvolvimento com a finalidade de assumir
nossos deveres de compor um plano de viagem que contemple todos os homens e
as demais criaturas e coisas da Terra.
Essa crise de ordem ecológica (composta pela crise ambiental e crise social)
é na verdade uma crise de ordem ética, pois é precisamente o comportamento da
pessoa por meio de suas práticas destrutivas que gera a violação dos Direitos
Humanos de milhares de pessoas, e ainda compromete a manutenção da boa
qualidade de vida dos outros componentes do universo.
Diante desta situação planetária, já existe certa consciência ecológica e
social, que se propagou num sistema de proteção internacional e nacional sobre
desenvolvimento e ambiente, que resultou numa nova proposta de desenvolvimento
sustentável.
O desenvolvimento sustentável é um processo de transformação, a fim de
atender às necessidades e aspirações humanas. Maritain, ao recordar Francisco de
130
Assis, nos requisita um novo estilo de vida, uma verdadeira transformação, que nos
aproxime de nossa ecologia humana, e também da ecologia ambiental.
Requer-se uma responsabilidade sólida para com todos e tudo, através de
mudanças significativas nos estilos de vida, nos modelos de crescimento individual e
social, nas estruturas do poder político e na maneira de se fazer a economia.
Diante da urgente necessidade de uma nova solidariedade entre os homens,
os povos e os Estados o direito será um instrumento capaz de desperta na pessoa
sua dignidade inerente, fazendo-o participar de forma sólida no seu desenvolvimento
sustentável.
O Humanismo Integral de Jacques Maritain, como fundamento intelectual de
nossa proposta de investigar seu apoio na efetividade do desenvolvimento
sustentável, revela-se ao final do trabalho como positivo, no sentido que poderá ser
considerado uma contribuição valiosa para a realização desse direito humano.
No projeto do humanismo solidário de Maritain, se propõe a dignidade da
pessoa humana como um valor fonte do desenvolvimento sustentável, com a
finalidade de se operar a transição pacífica e democrática das fórmulas corruptas e
egoístas de desenvolvimento exclusivamente econômico e técnico para um estágio
superior de convivência social e ambiental, baseado nos Direitos Humanos.
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