UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO JEAN HOSANG Itajaí [SC], junho de 2008. UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO JEAN HOSANG Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Professor MSc. José Everton da Silva Itajaí [SC], junho de 2008. AGRADECIMENTO Primeiramente, agradeço aos meus pais John Rubens e Olibia, meu irmão John, por estarem presentes em todos os momentos da minha vida. Saibam que este trabalho é fruto de um esforço realizado com perseverança e suor na busca do saber, contudo, não seria possível sem a contribuição dessa maravilhosa família. Amo todos vocês. Aos meus tios e primos, pelo carinho e respeito que mantiveram por mim ao longo da minha vida. A todos meus amigos de profissão, pessoas de imenso valor, que não mediram esforços para a realização desse sonho, em especial a Sidney Willian dos Santos, Pedro Ademir da Rocha e Willian Paul Hosang, que além de primo, considero como amigo. Obrigado à vocês. Aos meus colegas de faculdade, em especial a Cláudia Graciola, por compartilhar todas as angústias e responsabilidade da vida acadêmica. Com certeza, não foi em vão, pois cada início de aula tornou-se uma luta, cada final de aula, alcançou-se a vitória. À minha namorada Débora Aparecida de Lima, pessoa brilhante, que além de amiga foi uma companheira de estudo, compartilhando comigo todas as expectativas desta jornada acadêmica. Ao meu orientador, José Everton, pelo estímulo e apoio durante toda a produção deste trabalho monográfico. DEDICATÓRIA A minha mãe, Olibia Hosang, pessoa de extrema sapiência e digna de todos os adjetivos. Exemplo de dedicação e esforço, que através da sua educação ensinou todas as virtudes necessárias para um homem trilhar o caminho da verdade. Seu incentivo e apoio constante possibilitaram transpor as dificuldades surgidas durante o estudo acadêmico. Obrigado, mãe, por acreditar em mim. iv TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí [SC], junho de 2008. Jean Hosang Graduando PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Jean Hosang, sob o título Imunidade Parlamentar no Ordenamento Jurídico Brasileiro, foi submetida em 09 de junho de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Rafael Padilha e Roberto Voight e aprovada com nota 9.8 (nove ponto oito). Itajaí [SC], junho de 2008. Professor MSc. José Everton da Silva Orientador e Presidente da Banca Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia vi ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS § Parágrafo ART Artigo ATUAL Atualizada CRFB/88 - CF Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 DF Distrito Federal EC Emenda Constitucional INC Inciso MSC. Mestre N. / Nº Número SEC Século STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça V. Volume vii ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Estado [...] cremos que o Estado é uma comunidade constituída por um povo que, a fim de realizar a democracia, através da busca incessante da justiça e do bem-estar, em dado território nele soberanamente delega aos mandatários o poder (lato sensu) de direção dos objetivos constitucionais, com vistas a organização social e política1. Soberania A soberania pode ser definida como poder de autodeterminação. É o poder que tem uma comunidade nacional alçada em Estado, de dizer aos demais Estados que é senhora do seu destino político, não admitindo qualquer interferência exterior nos assuntos de seu exclusivo interesse2. Democracia É a forma de governo pelo povo, para o povo e do povo, através de sua participação. Sem o binômio povo e poder não se articula a noção de democracia3. Democracia Indireta Chamada de democracia representativa é aquela na qual o povo, fonte primária do poder, não podendo dirigir os negócios do Estado diretamente, em face da extensão territorial, da densidade demográfica e da complexidade dos problemas 1 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 26. 2 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. 3 ed. rev. atual e ampliada. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 44. 3 CASTELLO BRANCO. Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 1988. p. 88. viii sociais, outorga as funções de governo aos seus representantes, que elege periodicamente4. Partido Político Segundo silva, partido político é uma forma de agremiação de um grupo social que se propõe organizar, coordenar e instrumentalizar a vontade popular, com o fim de assumir o poder, para realizar seu programa de governo5. Imunidade Parlamentar As imunidades parlamentares são imunidades do Poder Legislativo, do mandato parlamentar, antes de protegerem a pessoa do mandatário eleitoral, visam resguardar a Instituição Legislativa, um dos Poderes da República ou do Estado de Direito, com intuito de lhe assegurarem a autonomia e independência diante dos outros Poderes do Estado, o Executivo e o Judiciário6. 4 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 26 ed. revista e atualizada nos termos da Reforma Constitucional, até a Emenda Constitucional n. 48, de 10.8.2005. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 136. 5 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. Florianópolis, SC: Obra Jurídica, 2005. p. 301. 6 CIAVARELI, Miguel Ângelo Nogueira dos Santos. Imunidade Jurídica: penais, processuais, diplomáticas, parlamentares. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. p. 149. SUMÁRIO SUMÁRIO.......................................................................................... IX RESUMO ........................................................................................... XI INTRODUÇÃO ................................................................................... 1 CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4 DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO...................................... 4 1.1 HISTÓRICO ......................................................................................................4 1.1.1 FORMAÇÃO ORIGINÁRIA E FORMAÇÃO DERIVADA DO ESTADO ...............................4 1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ESTADO ...........................................................9 1.2.1 CARACTERÍSTICAS ..........................................................................................15 1.2.2 ELEMENTOS FORMADORES DO ESTADO ............................................................16 1.2.2.1 Território ..................................................................................................16 1.2.2.2 Povo. ........................................................................................................17 1.2.2.3 Soberania.................................................................................................19 1.3 ASPECTOS DESTACADOS ACERCA Da soberania...................................19 1.3.1 Conceito......................................................................................................19 1.3.2 Características ...........................................................................................22 1.3.3 Elementos de participação popular..........................................................23 CAPÍTULO 2 .................................................................................................... 26 DA DEMOCRACIA ......................................................................................... 26 2.1 HISTÓRICO ....................................................................................................26 2.1.1 Tipos de Democracia .................................................................................31 2.2 DEMOCRACIA DIRETA .................................................................................32 2.2.1 Histórico......................................................................................................32 2.2.2 Conceito de Democracia direta.................................................................34 2.3 DEMOCRACIA REPRESENTATIVA..............................................................35 2.3.1 Histórico......................................................................................................36 2.3.2 Conceito de Democracia Representativa.................................................39 2.4 . DEMOCRACIA SEMIDIRETA ......................................................................40 2.5 . A DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E UMA NOVA PROPOSTA: ORÇAMENTO PARTICIPATIVO ..........................................................................42 2.5.1 Conceito......................................................................................................42 2.6 PARTIDOS POLÍTICOS. ................................................................................44 2.6.1 Histórico......................................................................................................44 2.6.2 Conceito......................................................................................................47 2.6.3 Funções dos partidos políticos ................................................................49 2.6.4 Natureza jurídica dos partidos..................................................................49 x 2.6.5 Sistema partidário......................................................................................50 CAPÍTULO 3 .................................................................................................... 53 IMUNIDADE PARLAMENTAR .................................................................... 53 3.1 HISTORICO ....................................................................................................53 3.1.1 ORIGEM DA IMUNIDADE PARLAMENTAR .............................................................53 3.1.2 O HISTÓRICO DA IMUNIDADE PARLAMENTAR NAS CONSTITUIÇÕES DO BRASIL .....55 3.1.3 CONCEITO DE IMUNIDADE ................................................................................61 3.2 IMUNIDADE MATERIAL ................................................................................64 3.2.1 CONCEITO E FINALIDADE .................................................................................64 3.2.2 NATUREZA JURÍDICA DA INVIOLABILIDADE.........................................................65 3.2.3 EXTENSÃO DA IMUNIDADE PARLAMENTAR .........................................................67 3.2.4 PRESSUPOSTOS DA IMUNIDADE MATERIAL ........................................................69 3.3 IMUNIDADE FORMAL....................................................................................72 3.3.1 CONCEITO ......................................................................................................72 3.3.2 IMUNIDADE PRISIONAL .....................................................................................74 3.3.3 IMUNIDADE FORMAL PROCESSUAL ....................................................................75 3.4 IMUNIDADES PARLAMENTARES EM NÍVEL FEDERAL, ESTADUAL E MUNICIPAL ..........................................................................................................78 3.4.1 NÍVEL FEDERAL ..............................................................................................79 3.4.2 ESTADUAL .....................................................................................................79 3.4.3 NÍVEL MUNICIPAL ...........................................................................................80 3.5 CONSIDERAÇÃO SOBRE A EMENDA CONSTITUCIONAL N. 35/01 .........81 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 83 ANEXO ............................................................................................. 85 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 92 RESUMO Não é concebível figurar a Imunidade Parlamentar em um Estado que não seja democrático. Para tanto, dividiu-se a monografia em três capítulos. No primeiro capítulo, estudou-se o Estado Democrático de Direito, reportando-se a origem das primeiras sociedades políticas, com substrato em várias teorias. De outro lado, a evolução histórica do Estado estabeleceu em cada época, características próprias para formação dos tipos de Estados. Contemporaneamente, não existe Estado sem Povo, Território e Soberania, ou seja, sem os elementos formadores. Em destaque, tem-se a Soberania, poder absoluto do Estado, baseado na vontade popular. No segundo capítulo, examinou-se a Democracia e o Partido Político. Historicamente a Democracia nasceu na antiga Grécia, como governo do povo para o povo e manteve-se como um ideal democrático, ao longo dos tempos. Os filósofos expuseram mais claramente sua definição. Entretanto, no mundo moderno a Democracia apresentou-se como regime político de representação, adaptando a nova realidade política. Assim, como forma de alcançar a velha Democracia grega, criou-se a Democracia participativa, pelo mecanismo do orçamento participativo. É no regime democrático, que surgem os Partidos Políticos, representantes dos interesses do povo frente ao governo. No terceiro capítulo, apresentou-se a Imunidade Parlamentar. Este dispositivo constitucional fez-se presente em todas as Constituições Brasileiras. Sob sua tutela, assegura ao Parlamentar o exercício legislativo, a fim de preservar a Soberania, a representação política e o próprio regime democrático. Para tanto, confere-se aos Parlamentares, Imunidade material e formal, no livre desempenho de sua atividade funcional. Com a vigência da Emenda Constitucional nº 35 de 20 de Dezembro de 2001, a Imunidade processual sofreu alterações, figurando no instituto a sustação do processo em face da licença prévia, excluída da redação do texto da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. INTRODUÇÃO A presente Monografia tem como objeto a Imunidade Parlamentar no Ordenamento Jurídico Brasileiro. O seu objetivo específico é realizar um estudo jurídico acerca do Instituto da Imunidade Parlamentar no Direito Brasileiro. Para tanto, principia–se no Capítulo 1, o estudo do Estado Democrático de Direito, elemento primordial, e ponto de início de qualquer estudo sobre as relações sociais e políticas Fixa-se inicialmente, o histórico do Estado, desenvolvido em dois momentos. Preliminarmente, abordaremos as causas do aparecimento primário da sociedade política, pela formação originária e derivada. Em seguida, demonstra-se o seu aspecto histórico-evolutivo, a fim de apresentar os vários tipos de Estados existentes. Posteriormente, se direciona o estudo para características do Estado e seus elementos formadores. A seguir, elencaremos a Soberania popular com destaque para seu conceito e as características. Ao final, examinaremos os elementos de participação popular, com fulcro na CRFB/88. No Capítulo 2, trataremos da Democracia e do Partido Político. No primeiro momento, apresentaremos uma abordagem histórica da democracia. Para tanto, iniciaremos o estudo com base na evolução histórica do instituto para poder alcançar a moderna concepção conceitual de Democracia. Em seguida, observaremos os tipos de Democracias existentes, com destaque a Democracia direta, indireta e a modalidade de Democracia participativa, denominado de orçamento participativo. Para melhor compreensão, prescreve-se um estudo de cada instituto político, apresentando o histórico e o conceito. Encerraremos o capítulo pela exposição dos Partidos Políticos, acerca do histórico, das características, da natureza jurídica, finalidade e abordagem do sistema partidário. 2 No Capítulo 3, tratando da Imunidade Parlamentar, estudaremos a origem do instituto da Imunidade. Efetuaremos em um segundo momento, análise históricas de todas as Constituições Brasileiras, pretérita e vigente, com objetivo de verificar a prerrogativa no direito pátrio, já que o Brasil passou por alternâncias políticas no decorrer dos tempos, alterando as Constituições existentes no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Prossegue-se o estudo, prescrevendo as espécies de Imunidades previstas constitucionalmente na Carta Magna vigente, visto a discussão ser ampla e constante acerca das prerrogativas. Para tanto, o exame do instituto terá como fundamento, a EC nº 35/01, que alterou o texto original da CFRB/88. Todavia, não se deixará de expor o conteúdo previsto anteriormente à emenda, quando necessário. Por fim, apresentaremos as considerações sobre a EC nº 35/01, utilizando as informações contidas no presente trabalho monográfico. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre Imunidade Parlamentar no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Para a presente monografia foi levantado o seguinte questionamento: Qual a evolução constitucional do instituto da Imunidade Parlamentar no Direito Brasileiro? Para o presente questionamento foi levantada a seguinte hipótese: Nem todas as Constituições previam a imunidade parlamentar no ordenamento jurídico brasileiro. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método dedutivo, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. 3 Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica. CAPÍTULO 1 DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO Com o propósito de entender o que venha a ser o Estado, mister se faz demonstrar, preliminarmente, o aparecimento da sociedade política sob dois aspectos: a formação originária e a derivada. Na seqüência, será abordada a sua evolução histórica, com referência aos tipos de Estados existentes. Cuida-se adiante da sua característica, destacando os elementos formadores, concluindo com a exposição da Soberania e elementos da participação popular. 1.1 HISTÓRICO Perquire-se neste momento, a origem do Estado, apresentando as diversas teorias que tentam justificar o surgimento primitivo da sociedade política. Em princípio, será exposta a formação originária do Estado, em seguida, sua formação derivada. 1.1.1 Formação originária e formação derivada do Estado Atinente a formação originária do Estado, verifica-se que se baseia em agrupamentos humanos, com fixação em um espaço físico (território), sem qualquer vínculo a um Estado já existente, enquanto a derivada funda-se na origem do Estado pela preexistência de outro já estabelecido. Preconiza Dallari7: Ao se estudarem as causas do aparecimento dos Estados é preciso, antes de tudo lembrar que há duas questões diferentes a 7 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 53. 5 serem tratadas: de um lado, existe o problema da formação originária dos Estados, partindo de grupamentos humanos ainda não integrados em qualquer Estado; diferente dessa é a questão da formação de novos Estados a partir de outros preexistentes, podendo designar-se esta forma como derivada. A priori, analisa-se a formação originária, fornecendo teorias, que irá definir o modo pelo qual vai se estabelecer a união dos homens para a criação dos Estados. Dessa forma, vislumbram-se duas grandes correntes teóricas esclarecendo a origem da sociedade política: uma argumentando ser uma formação natural do Estado (teoria não contratualista), e a outra sustentando ser uma formação artificial (teoria contratual). Nesse sentido, explica Friede8: No que concerne exclusivamente a primeira hipótese (formação originária) é que, em ultima instância, é possível proceder-se a um estudo mais apropriado (e aprofundado) das mencionadas teorias, dividindo-a em dois grupos: as teorias que sustentam a formação natural (não contratual) do Estado (onde a naturalidade é a Tônica principal, existindo divergências apenas no que alude a origem), tais como as teorias familiar (matriarcal e patriarcal), de força (conquista), patrimonial, e da potencialidade (desenvolvimento interno) e as teorias que sustentam a formação forçada ou artificial (contratual) do Estado (onde a voluntariedade inicial e a compulsoriedade posterior são as tônicas principais, existindo, igualmente, divergências no que se refere à origem), tais como as do contrato social , organicista e do equilíbrio social. Imperioso abordar neste espaço, as teorias não- contratualistas, iniciando-se pela teoria da origem familiar. Segundo esta teoria, o Estado origina-se a partir da unificação de cada família primitiva, desenvolvendo e ampliando-se para formar uma organização política. 8 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Teoria constitucional e relações internacionais. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002. p. 40. 6 Na lição de Botelho9: Em relação à origem familial, merece destaque a idéia de que os Estados são frutos do desenvolvimento lento e gradual dos clãs familiares, compreendendo a organização política estatal como resultado das uniões de diversos grupos familiares até chegar a Sociedade política. A origem familiar baseia-se, segundo Maluf10 em duas correntes: “[...], a) teoria patriarcal (ou patriarcalística); e b) teoria matriarcal (ou matriarcalistica)”. O aparecimento do Estado, segundo a doutrina patriarcalista, funda-se na organização familiar, contudo, sob a autoridade de um varão. Assim pontifica Acquaviva11 que: “[...] a primeira organização social humana é, com efeito, a família, grupamento cujos componentes são aparentados pelo sangue e cuja autoridade máxima é confiada a um chefe varão”. Em contraposição a teoria patriarcalista, tem-se a teoria matriarcalistica. Para os adeptos desta corrente, o Estado origina-se na família matriarcal e funda-se na autoridade da mãe, decorrente da relação de vivência em promiscuidade. Esclarece Maluf12: A primeira organização familiar teria sido baseada na autoridade da mãe. De uma primitiva convivência em estado de completa promiscuidade, teria surgido a família matrilínea, naturalmente, por razões fisiológicas – mater semper certa. 9 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 145. 10 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 22 ed. rev. e atual pelo prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 54. 11 ACQUAVIVA, Marcos Claudio. Teoria geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 11. 12 MALUF, Sahid. Teoria geral do Estado. p. 55. 7 Outra tese para explicar a formação de um Estado natural, tem em sua gênese, a violência. O Estado surge pela dominação do mais forte em face do mais fraco. Nesse entendimento, segue Menezes13: São, em razão disso, também chamadas teorias da força, visto como esta é que assegura a exploração dos vencidos pelos vencedores. Entende-se o uso da violência, do grupo vencedor ao vencido, como marco inicial da origem do Estado. Profícuo ainda citar, na involuntariedade de criação do Estado, a tese da origem das causas econômicas ou patrimoniais. Seus defensores explicam o aparecimento do Estado por motivos econômicos, com base nas obras dos filósofos gregos. Nessa esteira, assinala Botelho14: Essa teoria tem suas raízes, segundo alguns autores, na filosofia de Platão, que admitiu, em sua A República, originar-se o Estado da união das profissões econômicas. Também Cícero explica o Estado como uma organização destinada a proteger a propriedade e regulamentar as relações de ordem patrimonial. Nessa oportunidade, verifica-se a teoria acerca da formação originária do Estado de forma não forçada ou artificial, conhecida como teoria contratualista. Para os seguidores dessa doutrina, a criação do Estado advém de uma relação contratual. É o que vislumbra Streck15, “Os homens para saírem de um Estado da natureza, inconveniente a eles, pactuam, através de um contrato social, ingressando em um Estado político”. Entre os principais teóricos do contrato social, encontram-se 16 Hobbes , John Locke17 e Rousseau18. 13 MENEZES, Anderson de, Teoria Geral do Estado. 8. ed. rev e atual por José Lindoso.Rio de Janeiro:Forense, 1996. p. 88. 14 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 147. 15 STRECK, Lenio Luiz; MORAES, José Luiz Bolzan de. Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p.36. 16 Thomas Hobbes, pensador inglês, (1588-1679) expoente da teoria contratual, por meio de sua obra, o leviatã (1651). 8 Portanto, a teoria contratual fundamenta-se na vontade dos homens, como fator primordial para justificação do Estado, mesmo gerando controvérsias entre os pensadores. Nesse raciocínio, apregoa Dallari19: [...] Teorias que sustentam a formação contratual dos Estados, apresentam em comum, apesar de divergirem entre si quanto as causas, a crença em que foi a vontade de alguns homens, ou então de todos os homens, que levou a criação do Estado. De maneira geral, os adeptos da formação contratual da sociedade é que defendem a tese da criação contratualista do Estado. Após analisar as teorias que procuram fundamentar a formação originária do Estado, torna-se cogente demonstrar a formação derivada. Fundamenta-se na criação de um Estado já existente. Ocorre por fracionamento ou união de Estados. Referente à formação derivada, expõe Dallari20: Há dois processos típicos opostos, ambos igualmente usados na atualidade, que dão origem a novos Estados: o fracionamento e a união de Estados. Tem-se o fracionamento quando uma parte do território de um estado se desmembra e passa a constituir um novo Estado. Pode-se citar como exemplo de fracionamento, segundo Friede21: “[...] o desmembramento da Coréia no final da segunda guerra mundial [...].” 17 John Locke, filósofo inglês, (1632-1704), doutrinador da teoria contratual, publicou em 1690, O Segundo Tratado do Governo Civil. 18 Jean-Jacques Rousseau, filósofo suíço (1712-1778), autor do Contrato Social. Expôs a idéia de um pacto de submissão entre os indivíduos. Seus princípios influenciaram a Revolução Francesa. 19 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p. 54. 20 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p. 56. 21 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Teoria constitucional e relações internacionais. p.41. 9 A união de Estados nasce a partir da constituição de dois ou mais Estados para ao final, compor uma nova unidade política. Nos dizeres de Dallari22: O outro processo típico de constituição de novos Estados por formação derivada é a união de Estados, quando esta implica a adoção de uma Constituição comum, desaparecendo os Estados preexistentes que aderiram à união. Posterior a exposição das teorias explicativas sobre a origem do Estado, cabe destacar a seguir o desenvolvimento da sociedade política, efetuado por fases, para melhor compreender a sua evolução histórica. 1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ESTADO A evolução do Estado divide-se em fases a fim de demonstrar o desenvolvimento linear do seu processo histórico. Aponta Dallari23: Com pequenas variações, os autores que tratam deste assunto adotaram uma seqüência cronológica, compreendendo as seguintes fases: Estado Antigo, Estado Grego, Estado Romano, Estado Medieval e Estado Moderno. Assim, o Estado Antigo conhecido por Estado Oriental ou Teocrático, já que este período inicia-se nas remotas civilizações orientais, caracteriza pela unicidade de território, com predominância religiosa. A religião determinou o poder político vigente da época. De acordo com Dallari24: “Há, entretanto, duas marcas fundamentais, características do Estado desse período: a natureza unitária e a religiosa. [...]”. 22 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p. 57. 23 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p.62. 24 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p.62. 10 O Estado Grego apresentava-se como Cidades-Estados ou 25 pólis . Sua organização política era restrita no âmbito de seu território, conforme salienta Maluf26: “O Estado grego antigo, monárquico ou republicano, foi sempre o Estado-Cidade, denominado Pólis, circunscrito aos limites da comunidade urbana ou cantonal”. Segundo Botelho27, no Estado Grego encontravam-se as seguintes características: “[...] a) igualdade perante a lei; b) ausência de títulos e funções hereditárias; c) livre acesso a todos os cidadãos as funções públicas; d) direito a liberdade de expressão”. O Estado Romano desenvolve-se aos moldes das CidadesEstados, entretanto, pondera Maluf28: “O Estado romano, muito semelhante ao Estado grego, tinha suas características peculiares [...]”. Referente às características do Estado Romano, cita 29 Botelho : “[...] a) vasta extensão territorial; b) culto aos antepassados; c) valorização da família; d) separação entre o poder público e privado.” O Estado Medieval projeta-se posteriormente a decadência do Império Romano. Nesse período, surge o sistema feudal30, como modelo político-social vigente na época. Acerca do tema, complementa Menezes31: “Com 25 26 “As pólis formavam todos econômicos, sociais e políticos com vidas próprias. Eram legitimas autarquias, isto é, auto-suficientes, já que deviam bastar-se a si mesmas”. MENEZES, Anderson de. Teoria Geral do Estado. 8. ed. rev e atual por José Lindoso.Rio de Janeiro:Forense, 1996, p. 110. MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p. 98. 27 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 212. 28 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p 103. 29 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 212. 30 Foi modelo de organização político–social dominante na Idade Média. Predominava na sociedade medieval a figura do senhor feudal. Em detalhes, Cita Maluf, “O senhor feudal era o proprietário exclusivo das terras, sendo todos os habitantes seus vassalos. Exercia o senhor feudal as atribuições de chefe de Estado, decretava e arrecada tributos, administrava a justiça, expedia regulamentos e promovia a guerra. Era uma espécie de rei nos seus domínios. Seu reinado, porem, repousava sobre um conceito de direito privado, não de direito público”. MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 24 ed. revista e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 109. 31 MENEZES, Anderson de. Teoria Geral do Estado. p. 115. 11 a queda de Roma, instaurou a Idade Média com novos elementos na vida política: o cristianismo, a invasão dos bárbaros e o regime feudal”. De acordo com Maluf32, as características do Estado Medieval se apresentavam como: [...] a) forma monárquica de governo; b) supremacia do direito natural; c) confusão entre o direito público e privado; d) descentralização feudal; e ) submissão do Estado ao poder espiritual representado pela Igreja romana.” No fim da Idade Média33, a Europa ocidental sofre um processo de transformação que levará a criação dos Estados Modernos34. Esta transição ocorreu principalmente, pelo enfraquecimento do sistema feudal, por surgimento das monarquias absolutas35 e pela centralização absoluta do poder. Na lição de Botelho36: A centralização do poder político e a formação das monarquias européias indicam a transição gradativa da Idade Média para a Idade Moderna. Mediante um processo lento, mas contínuo durante os séculos XIV e XV, ocorre a desagregação crescente do sistema feudal e a formação dos Estados Modernos. 32 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p 108. 33 Período que inicia-se no século V, (476 d.c) com o fim do Império Romano no ocidente, e estende-se até o século XV (1453), com a queda de Constantinopla. 34 “[...] começa a nascer na segunda metade do século XV na França, Inglaterra e Espanha, posteriormente alastra-se por outros países europeus, entre os quais, mais tarde, a Itália (Gruppi)” BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. Florianópolis, SC: Obra Jurídica, 2005. p. 165. 35 “A Monarquia absoluta assentava-se sobre o fundamento teórico do direito divino dos reis, com evidentes resquícios das concepções monárquicas assírias e hebraicas. A autoridade do soberano era considerada como de natureza divina e proveniente diretamente de Deus. O poder de imperium era exercido exclusivamente pelo Rei, cuja pessoa era sagrada e desligada de qualquer liame de sujeição pessoal [...]”. MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 24 ed. revista e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 119. 36 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 171. 12 Insta salientar, o absolutismo monárquico37, predominante na Europa contribuiu para o surgimento de nacionalidades, característica dos Estados Modernos, como explica Maluf38: O fortalecimento do poder central era o único meio de restabelecer a unidade territorial dos reinos. Sem a concentração de poderes, ou seja, fora a idéia do absolutismo monárquico, não havia possibilidade de se promover a unidade nacional dentro do Estado moderno. Como forma de opor-se ao absolutismo, surge o Estado de Direito. Nesse entendimento, segue Santos39: “Convém deixar marcado a guisa de finalização, que o Estado de Direito serviu nos primórdios ao combate efetivo ao Estado absoluto [...]”. O Estado de Direito fundamenta-se na criação de uma Constituição, no objetivo de regular o exercício do poder político e garantir os direitos individuais. Esclarece Botelho40 que: “[...] O Estado de Direito define e respeita, através de normas jurídicas, seja os limites de sua atividade, seja a esfera da liberdade dos indivíduos. [...]” Entretando, o processo de constitucionalização estatal foi lento e gradativo. Foram as revoluções Inglesa41, Americana42 e Francesa43, que estabeleceram as Constituições com a prescrição dos direitos individuais. 37 “[...] surgem as monarquias absolutistas em Espanha, França, Prússia, Áustria, etc.Mesmo nos países de mais firmes tradições católicas, ganha terreno o monarquismo absolutista”. MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 24 ed. revista e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 119 38 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p 119. 39 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 92. 40 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 169. 41 Fato ocorrido na Inglaterra, com a revolução de 1648. Nesse período, Olivier Cromwell decapita Carlos I, instaurando a República, e posteriormente, em 1689, decorre outra revolução, com a declaração dos direitos -Bill of Rights, 42 Declaração de independência das 13 colônias inglesas na America do Norte, em 4 de julho de 1776. A Inglaterra somente reconheceu a independência dos Estados Unidos em 1783. Consagraram-se os ideais liberais, tais como a declaração dos direitos, repartição dos poderes e a Soberania da nação. 13 Como aponta Menezes44: Então, além da Grã-Bretanha, em seu estilo consuetudinário, o novo Estado em processo formativo – Estados Unidos da América – e a França iam possuir suas Constituições escritas quase ao mesmo tempo, o primeiro em 17 de setembro de 1787 e a segunda em 3 de setembro de 1791, as duas elaboradas e promulgadas por assembléias e convenções populares. Vale ressaltar, o movimento revolucionário francês promoveu o resgate dos direitos universais, dando-lhe posição jurídica e servindo de modelo a outros países constitucionais. Segundo cita Botelho45: [...] A revolução francesa pretendeu estabelecer um valor político e jurídico mais abrangente, buscando o estabelecimento de direitos de caráter universal, resultando desta universalização dos direitos sua influência e inserção no âmbito mundial. Posterior às revoluções, surge o Estado de Direito sob um modelo estrutural de organização política peculiar, com as seguintes características, conforme ainda leciona Botelho46: “[...] a) Separação do poderes; b) conceito de lei; c) princípio da legalidade da administração; d) garantia dos direitos fundamentais; e) independência dos tribunais”. A exigência de participação popular no governo, influenciados pelos ideais revolucionários do sec. XVIII, como a garantia dos direitos individuais e o controle do governo pela supremacia da vontade popular, possibilitou a modificação na estrutura do Estado. 43 Ocorrido na França, em 05 de maio de 1789, sob influências do Iluminismo e a Revolução Americana, em face do absolutismo, fazendo-se aclamar os princípios universais de liberdade, igualdade e fraternidade. 44 MENEZES, Anderson de. Teoria Geral do Estado. p. 121. 45 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 166. 46 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 167. 14 Acentua Dallari47 Foram esses movimentos preponderantes na Europa do século XVIII, que determinaram as diretrizes na organização do Estado. Consolidou-se a idéia de Estado Democrático como o ideal supremo, chegando-se a um ponto em que nenhum sistema e nenhum governante, mesmo quando patentemente totalitários, admitem que não sejam democráticos. Assim, não bastava que o Estado estivesse sob a égide da lei. Era necessária a legitimação do poder e do exercício político pela vontade popular, para caracterizar o Estado Democrático de Direito. Nesse contexto, pondera Friede48: [...] o fato de o Estado passar a se submeter a lei lato sensu (que o mesmo edita, através de sua função legislativa)pareceu, em momento subseqüente, não ser suficiente para a plena caracterização do regime democrático, posto que não restaria perfeitamente assegurada a necessária submissão ao Estado (e, sobretudo, de seus governantes) a vontade popular e aos fins propostos pelos cidadãos, fazendo surgir em resposta, logo no início do século XX, a concepção primeira do denominado Estado Democrático de Direito, ainda que sob um prisma restritivamente formal. No Brasil, após a promulgação da Constituição Brasileira, aprofundou-se o instituto político da Democracia como regime político do Estado, conforme o texto expresso no artigo 1º49, da CRFB/88. Nos dizeres de Leal50 este acontecimento é relevante, pois “[...] um dos principais elementos de inovação preambular da Constituição 47 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p.150. 48 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Teoria constitucional e relações internacionais. p. 244. 49 Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: 50 LEAL, Rogério Gesta. Teoria do Estado. Cidadania e poder político na modernidade. Porto Alegre, RS: Livraria do Advogado, 2001. p. 189. 15 Brasileira de 1988 é o fato de ela prever em seu texto que a federação constitui em Estado Democrático de Direito”. Abaixo, apresenta-se uma tabela51, demonstrando se há ou não previsibilidade do regime democrático perante as Constituições Brasileiras pretéritas e vigentes: Previsão do regime democrático Constituições do Brasil 1891 1824 Sim 1930 1937 1946 X Não X X 67/69 X 1988 X X X Fonte: do autor/2008 1.2.1 Características As inúmeras posições doutrinárias acerca das características do Estado demonstram não ser pacífico o tema em comento. Alguns teóricos identificam as características como elementos essenciais do Estado. Dallari52 cita as principais divergências entre os doutrinadores da ciência política, como se pode notar: Quanto às notas características do Estado Moderno, que muitos autores preferem denominar elementos essenciais por serem todos indispensáveis para a existência do Estado, existe uma grande diversidade de opiniões, tanto a respeito da identificação quanto ao número. Assim é que SANTI ROMANO, entendendo que apenas a soberania e a territorialidade é que são peculiaridades do Estado, indica esses dois elementos. A maioria dos autores indica três elementos, embora divirjam quanto a eles. De maneira geral, costuma-se mencionar a existência de dois elementos materiais, o território e o povo, havendo grande 51 Segue-se em anexo, a pesquisa de todas as Constituições existentes no Brasil, como fundamento para a confecção da tabela, demonstrando a previsão do regime democrático no Brasil. 52 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p.71. 16 variedade de opiniões sobre o terceiro elemento, que muitos determinam de formal. O mais comum é a identificação desse ultimo elemento com o poder ou alguma de suas expressões, como autoridade, governo ou soberania. Urge salientar, que a discussão teórica restringe-se apenas ao terceiro elemento. Recai a divergência sobre o governo, a Soberania ou autoridade. Com efeito, verifica-se que o elemento divergente na doutrina, independente da expressão utilizada, possui intrinsecamente o sinônimo de poder. 1.2.2 Elementos formadores do Estado O Estado é formado por três elementos: Território, Povo e Soberania. É de suma importância o seu estudo, pois os elementos integram o próprio conceito de Estado, como se vislumbra perfeitamente na lição de Santos53. [...] cremos que o Estado é uma comunidade constituída por um povo que, a fim de realizar a democracia, através da busca incessante da justiça e do bem-estar, em dado território nele soberanamente delega aos mandatários o poder (lato sensu) de direção dos objetivos constitucionais, com vistas a organização social e política54. Nesse aspecto, prossegue-se adiante, o estudo de cada elemento formador. 1.2.2.1 Território O território é o espaço físico do Estado. É pressuposto de sua existência. Nesse aspecto, preconiza Santos55: “modernamente não se concebe a figura do Estado sem um território. O território é a base física do Estado, seu elemento constitutivo”. 53 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. p. 26. 54 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. p. 26. 55 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado, p. 36. 17 Deste modo, compreende um local de fixação estabelecido para amplitude de atuação dos elementos integrantes do Estado (povo e soberania). Descreve Friede56: “O território, em sua concepção elementar, pode ser definido como a base física do Estado, onde a soberania (qualidade intrínseca do Estado) é exercida em sua plenitude”. Entretanto, tem-se a posição que não se pode empreender um estudo sobre o território sem antes examinar o poder do Estado, pois segundo Santos57: Segundo cremos, o aspecto da autoridade estatal é o mais importante no estudo do território. Dentro dele se desdobra a noção de territorialidade. O poder do estado sobre seu território, segundo regras do direito constitucional de cada estado, bem como do direito internacional público, garante de um lado, que toda pessoa que se encontra no território do Estado fica sujeita a autoridade do Estado. De outra parte, no âmbito do Estado, não pode ser exercida autoridade que não derive dele próprio. Assim, define-se o território como um espaço territorial físico que possibilita a plena eficácia do Estado para o exercício das relações sociais, políticas e jurídicas, com o poder que lhe é atribuído. 1.2.2.2 Povo. É o elemento humano do Estado indispensável a sua formação. Corroborando nesse entendimento, assevera Dallari58: “É unânime a aceitação da necessidade do elemento pessoal para a constituição e a existência do Estado, uma vez que sem ele não é possível haver Estado e é para ele que o Estado se forma”. 56 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Teoria constitucional e relações internacionais. p. 56. 57 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. p. 36 58 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p. 95. 18 Maluf59 destaca a posição do elemento formador, mencionando que: “A população do Estado é o primeiro elemento formador do Estado, o que independe de justificação”. Nesse contexto, o povo vincula-se a organização política estatal como receptor das ordens emanadas pelo Estado. Em outros termos, observa-se que alguns doutrinadores utilizam a expressão população como elemento humano formador do Estado. Outros citam o povo. O vocábulo povo adquire conceito jurídico. Como elemento componente do Estado, vincula juridicamente a coletividade humana. Seguindo a mesma vertente, assinala Santos60: O conceito povo nos é fornecido pelo direito, significa o conjunto de pessoas que detém o poder político, a soberania. Pode ser designado como expressão de cidadania. Povo, portanto, tem significado preciso. Visa determinar em um Estado o conjunto de pessoas titulares de direito político [...]. A população, por sua vez, indica concepção numérica e demográfica. Compreende a quantidade de habitantes situados no Estado. Não se vislumbra, portanto, qualquer vínculo jurídico. Preconiza Menezes61: Quando usamos o vocábulo população queremos apontar o numero de habitantes do Estado, indicando por isso mesmo, um conjunto de homens em sentido quantitativo. É, portanto, um conceito aritmético, de caráter demográfico, de alcance estatístico, de expressão censitária. Quer dizer: massa de indivíduos que, em dado momento, vivem dentro da jurisdição de certo Estado. Não se leva em conta entre eles, conseqüentemente, íntimas e demoradas relações sociais, de base ético-histórica, ou mesmo nem rigorosas relações jurídicas, nem afins relações políticas. 59 MALUF, Sahid. Teoria geral do Estado. p.23. 60 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria geral do Estado. p. 38. 61 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. p.136. 19 Por conseguinte, nota-se nas expressões povo e população, conceitos diversos. O elemento diferenciador é a existência do vínculo jurídico, ausente no vocábulo população. Nesse sentido, conclui-se que a união de indivíduos estabelece a formação do Estado. Este conjunto humano visa compor um Estado politicamente organizado, unidos juridicamente, como povo. 1.2.2.3 Soberania A Soberania destaca-se como último elemento integrante na formação do Estado. Para Maluf62 é: “[...] uma autoridade superior que não pode ser limitada por nenhum outro poder”. Constitui-se elemento fundamental do Estado. Como ordem suprema, grosso modo, impõe efetiva autoridade sobre suas decisões, sem dependência de outro poder. Sob esse contexto, cita Silva63 A soberania pode ser definida como poder de autodeterminação. É o poder que tem uma comunidade nacional alçada em Estado, de dizer aos demais Estados que é senhora do seu destino político, não admitindo qualquer interferência exterior nos assuntos de seu exclusivo interesse. O tema em apreço será abordado de forma mais delineada, no subtítulo seguinte. 1.3 ASPECTOS DESTACADOS ACERCA DA SOBERANIA 1.3.1 Conceito Em princípio, destaca-se o desenvolvimento conceitual de Soberania, ao longo da história ocidental, para melhor compreender sua definição. 62 MALUF, Sahid. Teoria geral do Estado. p. 29. 63 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. p. 44. 20 Reporta-se o conceito primário de Soberania as monarquias da Idade Média. Inicialmente o conceito se reduz em duas formas: uma de senhorial, do feudalismo e outro real, do próprio rei. Decorrida essa fase, o rei torna-se proprietário exclusivo de todo o reino, adquirindo um poder soberano e conseqüentemente, supremo. Aprofundando sobre o tema, cita Dallari64: Até o século XII a situação continua mal definida, aparecendo referências a duas soberanias concomitantes, uma senhorial e outro real. Já no século XIII o monarca vai ampliando a esfera de sua competência exclusiva, afirmando-se soberano de todo o reino, acima de todos os barões, adquirindo o poder supremo de justiça e de polícia, acabando por conquistar o poder legislativo. Entretanto, é com Jean Bodin65, que se compreendeu melhor a Soberania. O pensador francês foi o primeiro a desenvolver teoricamente o conceito. Por meio de sua doutrina, denominou a Soberania como poder absoluto em que o rei tem poder supremo sobre todos. Segundo Botelho66 “Bodin vislumbra no poder monárquico uma faculdade incontestável de mando, sendo, pois, soberano, aquele poder que não encontra limite, quer na ordem interna do Estado, quer na ordem Externa”. Para Bodin, o soberano vinculava-se a uma ordem divina, devendo-o submeter à vontade de Deus. Porém, seu poder era absoluto perante seus súditos, como elucida ainda Botelho67: Bodin enfatiza que, se o soberano é absoluto em relação ao súdito, não o é em relação a Deus. O soberano não é ele próprio a 64 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p. 76. 65 “Foi o filósofo francês Jean Bodin (1530-1596), publicando em 1576 os Six livres de la République, que considerou a soberania como essencial a sua definição de Estado[...]”.MENEZES, Anderson. Teoria Geral do Estado. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 150. 66 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 128. 67 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 128. 21 lei, mas instrumento da vontade divina, a cujos princípios as leis do soberano devem se conformar. Esse conceito perdurou até o séc. XVIII. Coube a Rousseau68, modificar a idéia de Soberania. Recai o poder soberano sobre o povo e não mais na figura do rei. 69 Apregoa Dallari : Quase dois séculos mais tarde, no ano de 1762, Rousseau publicaria “O contrato social”, dando grande ênfase ao conceito de soberania e já transferindo sua titularidade da pessoa do governante para o povo. Contribuíram para afirmação desse pensamento, além de Rousseau, segundo Azambuja70, teóricos como “[...] Thomas Hobbes (15881679), autor de De cive e Levithan; John Locke (1632-1704), autor de Le gouvernement civil [...]” Diante disso, a idéia de Soberania popular foi substrato para a formulação da moderna concepção de Soberania. Depois de abordar a evolução conceitual de Soberania, busca-se sua definição perante a moderna ciência política. Portanto, a Soberania pode ser compreendida em termos políticos, jurídicos e culturais. Nesse sentido, assevera Friede71: [...] a soberania é também concebida, em termos políticos, como o poder incontrastável de querer coercitivamente e de fixar competências (soberania como elemento de expressão última da plena eficácia do poder), em termos jurídicos, como o poder de 68 “Segundo estas doutrinas, de Jean-Jacques Rousseau foi o mais famoso intérprete, a soberania reside no povo e é por sua natureza, inalienável, quer quanto a propriedade, quer quanto ao exercício”. AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 44 ed. São Paulo: Globo. 2005. p. 64 69 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p. 78. 70 AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. p. 58. 71 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Teoria constitucional e relações internacionais. p. 62. 22 decidir em última instância sobre a eficácia da normatividade jurídica, e, em termos culturais (que alguns autores, como Miguel Reale preferem denominar concepção política, mas que, em essência é uma tradução politico-juridíca), como o poder de organizar-se política e juridicamente e de fazer valer, no âmbito de seu território (principio da aderência territorial) a universalidade de suas decisões no limite dos fins éticos de convivência [...]. Sintetizando as concepções apresentadas, Reale72 com muita propriedade, define a Soberania como sócio-jurídico-política, como pode observar: Soberania é tanto a força ou o sistema de forças que decide do destino dos povos, que dá nascimento ao Estado Moderno e preside ao seu desenvolvimento, quanto a expressão jurídica dessa força no Estado constituído segundo os imperativos éticos, econômicos, religiosos etc., da comunidade nacional, mas não é nenhum desses elementos separadamente: a soberania é sempre sócio-jurídico-política, ou não é soberania. Exposto o aspecto conceitual da Soberania, passa-se a estudar as características pertinentes a este instituto. 1.3.2 Características É pela escola clássica francesa com Rousseau, seu maior precursor, que a Soberania adquire características fundamentais. Assim esclarece Menezes73 que: “A soberania tem características, que remontam a guisa de fundamentos do Estado moderno, as conquistas dos direitos do homem, de acordo com os postulados da tradicional escola francesa”. A Soberania é una, indivisível, inalienável e imprescritível. Nesse passo, Dallari74 expõe a posição majoritária da doutrina, afirmando que: 72 REALE, Miguel. Teoria do Direito e do Estado, 5.ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 140. 73 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. p. 156 74 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria do Estado. p. 81. 23 “Quanto as características da soberania, praticamente a totalidade dos estudiosos a reconhece como una, indivisível, inalienável e imprescritível [...].” É una, porque dentro de um território somente pode existir uma Soberania. É indivisível, pois não se admite a divisão da Soberania. É inalienável, posto que não se transfira e imprescritível, porque não há limite temporal para seu exercício. 1.3.3 Elementos de participação popular Preceitua-se no art. 1475 e incisos seguintes da CRFB/88, a Soberania popular. Será exercida por meio de referendo, plebiscito e iniciativa popular. Inicia-se o estudo pelo plebiscito. Através deste instituto, permite-se aos eleitores opinarem através de uma consulta prévia. O Legislativo é quem formula as questões a serem opinadas pelo povo. Cita Bulos76: Plebiscito é uma consulta popular a todos os eleitores sobre um ou mais assuntos que antecede o processo de elaboração de determinada lei. Através dele a pergunta a ser feita é direta, sem maiores digressões. O eleitor responde apenas sim ou não a quantas indagações forem necessárias. Quem decide quantas perguntas serão feitas no plebiscito é o Congresso Nacional. O referendo consiste em uma consulta popular. Recai a decisão do povo sobre matérias já aprovadas pelo legislativo. O objeto da aprovação popular são as leis já discutidas pelo legislativo. 75 Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo; III - iniciativa popular 76 BULOS, Uadi Lammêgo, Constituição Federal Anotada. 5. Ed. rev. e atual até a Emenda Constitucional n. 39/2002. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 481. 24 Sobre o tema, leciona Santos77: O referendum consiste em uma consulta ao povo a respeito de uma decisão sobre determinado conteúdo. As matérias objeto de referendum são variadas, sendo normalmente questões importantes. Pode ser obrigatório ou facultativo, de acordo com as prescrições constitucionais. Tem como principal característica e efeito conferir eficácia as leis ou normas após a aprovação dos cidadãos, convocados para tal fim. A iniciativa popular é uma forma de atuação da Soberania. Compreende a vontade do povo em apresentar projeto de lei ao Congresso Nacional, por certo números de cidadãos. Todavia, necessita de um número mínimo de participantes, para que seja instaurado um projeto de lei. Segundo Alexandre de Moraes78: A Constituição Federal consagrou como instrumento de exercício da soberania popular (C.F, art.14, III) a iniciativa popular de lei, que poderá ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um, conforme preceitua o § 2º, do art. 61, da Constituição Federal. A CFRB/88 consagra o exercício da Soberania popular mediante iniciativa popular, autorizando o cidadão a participar, desde que observado os requisitos exigidos para apresentação do projeto de lei. Verifica-se, portanto, à luz deste primeiro capítulo inúmeras teorias com objetivo de justificar o aparecimento do Estado. Esta organização política vai se desenvolvendo, conforme o anseio da sociedade política em cada momento evolutivo da história da humanidade. 77 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Direito. p. 86. 78 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 22. ed. Atualizada até a EC nº 53/06. São Paulo: Atlas, 2007. p.640. 25 Chega-se finalmente, pelas aspirações contemporâneas ao modelo de estrutura organizacional do Estado, dotado de uma Constituição, com separação de poderes, Soberania popular e representatividade, no intento de legalizar e democratizar o exercício político. Adiante, analisa-se a Democracia e os Partidos Políticos, como elemento integrante e indispensável do estudo sobre Imunidade Parlamentar no Ordenamento Jurídico brasileiro. 26 CAPÍTULO 2 DA DEMOCRACIA Em princípio, examina-se a Democracia por meio de uma abordagem histórico-evolutiva do instituto, demonstrando os tipos existentes, com enfoque no estudo da Democracia grega, Representativa e da Democracia participativa (orçamento participativo), descrevendo por último, os Partidos Políticos. 2.1 HISTÓRICO A conceituação de Democracia não é estática, evoluindo ao longo da história. Necessário se faz, portanto, uma abordagem histórico-evolutiva, iniciando-se na antiga Grécia, berço do significado de democracia, para se chegar a consolidação contemporânea de Democracia, como pode destacar-se a seguir: A rigor, a expressão Democracia surge no governo dos primitivos Estados gregos, na antiguidade clássica. Nesse passo acentua Maluf79: “As antigas repúblicas gregas e romanas de vinte séculos passados, foram às primeiras manifestações concretas de governo democrático”. Os cidadãos80 integrantes das pólis81, na antiga Grécia, reuniam-se em assembléias, com objetivo de participar diretamente das decisões 79 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p. 275. 80 Eram formados por gregos, que participavam do exercício político realizado na Eclésia ou assembléia. Entretanto, o exercício na esfera pública não se estendia a mulheres e escravos. 81 Cidades Estados existentes na antiga Grécia, em específico, Atenas e Esparta. Caracteriza-se pelo pequeno espaço demográfico, pela vida urbana, e pela pratica da Democracia direta. 27 políticas. Era a chamada Democracia direta. Tem-se então preliminarmente, a tradicional definição de Democracia, no sentido do povo governar por si mesmo. Assinala Bastos82: Na Grécia antiga conhecia-se a democracia sob a modalidade participativa. Em outras palavras, reunia-se o povo, na praça pública, para resolver as questões políticas relativas às cidadesestados. Todavia, é no campo da filosofia, mais precisamente na esfera política grega, com Platão83 e Aristóteles84, que fixou-se a Democracia como formas de governo, concebendo dessa maneira, o conceito clássico de Democracia. Nesse sentido, afirma Friede85: Conforme já consignamos, por muito tempo a democracia foi considerada uma genuína forma de governo. Para PLATÃO, em particular, a democracia (legal e arbitrária) representava o governo de todos em contraposição crítica ao governo de um só (monarquia (real e legal) e tirania) e ao governo de um grupo (aristocracia e oligarquia). Seu discípulo direto, ARISTÓTELES, por seu turno, afirmava a democracia como forma pura de governo (ao lado da monarquia e aristocracia) em oposição a demagogia, forma deturpada (impura) de governo. É com Aristóteles que a Democracia passou a ser mais compreendida. O grande filósofo, além de apresentar as formas de governo, 82 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. 4 ed. São Paulo: Saraiva. 1999. p.114. 83 Platão filósofo grego, (427-347 a.C.), nasceu em Atenas. Considerado um dos grandes pensadores gregos, era discípulo de Sócrates. Em sua obra A República, Platão expõe seis formas de governo, indicando o significado de democracia. 84 Filósofo grego, nasceu em Estagira, no ano de 348 a.c e morreu em 322 a.C. Em sua obra A Política, Aristóteles apresenta a tríplice classificação das formas de governo e “[...] distingue as formas de governo segundo critério numérico e finalistico” origem: Botelho, Alexandre. Curso de Ciência Política. Florianópolis. Obra Jurídica editoras. 2005. p.252. 85 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Teoria Constitucional e relações Internacionais. 2002. p. 204. 28 expõe a comparação entre o critério numérico das formas de governo e a sua finalidade. Como menciona Botelho86: A classificação do filósofo estagirita é a mais compreensiva e a mais usual. A sua forma é justa, pois não atende apenas ao seu critério numérico, conforme o governo esteja nas mãos de um só homem, de uma minoria (vários) ou de todo o povo, mas também aos seus objetivos e finalidades, conforme a autoridade seja exercida tendo em vista o bem geral ou somente o interesse dos governantes. Na tabela abaixo, Sell87 demonstra de forma mais precisa a classificação de Aristóteles, quanto às formas perfeitas e corrompidas de governo: Teoria das formas de governo de Aristóteles88 Formas perfeitas (politia)89 GOVERNO ETIMOLOGIA SIGNIFICADO Monarquia Mónos=um Governo de um só Arqué = governo Aristocracia Aristói = melhores Governo dos melhores Kratos = governo Democracia Démos = povo Governo do povo Kratos = governo Formas corrompidas GOVERNO ETIMOLOGIA SIGNIFICADO Tirania Oligarquia Democracia Mónos = um Arqué = governo Óligoi = poucos Arqué = governo Démos = povo Krátos = governo Governo mau de um só Governo de poucos Governo mau do povo Críticos, Platão e Aristóteles eram temerosos quanto ao exercício da Democracia não manifestando maiores simpatias, justamente pela 86 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 252. 87 SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: Política e Sociedade na modernidade tardia. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006. p.83. 88 Fonte: SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: Política e Sociedade na modernidade tardia. p. 83. 89 Alterado devido as considerações feitas pelo professor Roberto Voight. 29 possibilidade do governo ser exercido por pessoas totalmente despreparadas para o exercício democrático. De acordo com os ensinamentos de Kelsen90: Já na Grécia antiga, os adversários da democracia, como Platão e Aristóteles, chamaram a atenção para o fato de que um governo do povo enquanto governo exercido por homens inexperientes nas práticas governamentais e sem o necessário conhecimento dos fatos e problemas da vida política pode estar totalmente distanciados dos interesses do povo e, assim, revelar-se um governo contra o povo. Em epítome, a democracia tem seu substrato na participação do povo no poder, como se denota na lição de Castello Branco91: “é a forma de governo pelo povo, para o povo e do povo, através de sua participação”. Mesmo os filósofos reprovando o governo democrático, nota-se que a célebre classificação de Aristóteles permaneceu vigorante por tempos. Nos dizeres de Bonavides92: Esse entendimento milenar assim se conservou entre os publicistas romanos e os teóricos da Idade Média. Não discreparam também do juízo aristotélico pensadores políticos do tomo de Montesquieu e Rousseau, preso à herança clássica. Inicia-se na Idade Média, o processo de transição da representação do poder, caminhando para um sistema representativo. Ocorreu gradativamente na Inglaterra, como descreve Bastos93: Nesse processo desempenhou a Inglaterra um papel saliente, visto ter ela tido uma função eminentemente precursora na implantação do regime representativo, o que, de resto, como é 90 KELSEN, Hans. A Democracia. Tradução: Ivone Castilho Benedetti; et al. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 141. 91 CASTELLO BRANCO. Teoria Geral do Estado. p. 88. 92 BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 3 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1995. p.189. 93 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. p.292. 30 natural na evolução das instituições políticas, não se deu por mero acaso. A idéia de representação de governo formou a moderna concepção de Democracia, reelaborando seu conceito clássico. Com as aspirações democráticas e o surgimento dos Estados Constitucionais no fim da Idade Moderna94, incorpora-se em seus governos a Democracia com base na Soberania popular95. Leciona Menezes96: Surge então, a partir da segunda metade do século XVIII, o Estado Constitucional, nitidamente democrático, de que são paradigmas: a Grã-Bretanha, onde já processava, desde longa data, como se verá adiante, o desenvolvimento auspicioso, com repercussão mundial, do elevado papel exercido pela câmara popular; os Estados Unidos da America, a cuja Constituição federal de 17 de setembro de 1787, posteriormente usada como modelo, inclusive no Brasil ainda no século XIX, se incorpora a uma democracia real e eficiente; e a França, que, com a celebrada revolução de 1789, joga por terra os últimos bastiões da monarquia absolutista, entregando ao povo os destinos e os interesses nacionais. Contemporaneamente, textualmente nos moldes de um a regime Democracia político. Nas consolidou-se palavras de Friede97: Por efeito conseqüente, a democracia possui hoje inconteste natureza jurídica de regime político (o chamado regime político 94 Período que se inicia em 1453, com a queda de Constantinopla e estende ao ano de 1789, com a Revolução Francesa. 95 “A conseqüência forçada desse princípio seria unicamente a nação, o povo, ou ao menos o corpo de cidadãos é que deveria exercer a soberania. Portanto, o regime representativo, adotado por todos os Estados Modernos estaria em contradição com a doutrina da soberania inalienável. Rousseau havia assim pensado e por isso, para ele, o governo direto é o ideal, sendo apenas um mal necessário”. AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. p. 65. 96 MENEZES, Anderson de. Teoria Geral do Estado. p. 281. 97 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria geral do Estado. Teoria constitucional e relações Internacionais. p. 230. 31 democrático), ainda que esta concepção provoque, em sua perfeita caracterização, inúmeras controvérsias doutrinárias. Entretanto, amplia-se o conceito de Democracia. A par disso aponta Maluf98: “[...] a idéia de democracia pode ser tomada em duplo sentido – formal e substancial. Ou seja, um sentido estrito e outro amplo”. Dessa forma, a Democracia em sentido estrito, apresenta-se como um regime político representativo, conforme indica Friede99: Sob a ótica restrita, a democracia apenas designa o regime político da representatividade lato senso, traduzindo, em ultima análise, os variáveis métodos formais de exercício da representatividade, associados aos seus diversos graus. Já em sentido substancial ou amplo, a Democracia com base no regime representativo, envolve os direitos fundamentais constitucionalmente asseguradas ao ser humano. Assevera Maluf100: Em sentido substancial, sobre ser um sistema de governo temporário e eletivo, democracia é um ambiente, uma ordem constitucional, que se baseia no reconhecimento e na garantia dos direitos fundamentais da pessoa humana. Tem-se, portanto, atualmente, a Democracia como um regime político representativo, contudo sem deixar de preservar as garantias fundamentais da pessoa humana. 2.1.1 Tipos de Democracia Como visto, a Democracia evoluiu de acordo com as condições históricas a que foi submetido o seu exercício. Tradicionalmente, pode- 98 MALUF, Sahid, Teoria Geral do Estado. 22 ed. São Paulo; Saraiva. 1993, p. 281. 99 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002. P 259. 100 MALUF, Sahid, Teoria Geral do Estado. 22 ed. São Paulo; Saraiva. 1993, p. 281 32 se dividir a democracia em três espécies: Democracia direta, Democracia semidireta e Democracia indireta ou representativa. Dessa forma, denota Menezes101: Quando se quer distinguir, com respeito a regras históricas, os vários tipos de democracia, já conhecidos e postos em prática, é conveniente seguir a discriminação tradicional, designando-os pelos termos consagrados de democracia direta ou pura, democracia representativa ou indireta e democracia semi-direta ou mista. Segue-se em idêntica classificação, com a exposição da tríplice variação democrática, Azambuja102 elencando a: “democracia direta, democracia representativa e democracia semi-direta”. Prescritos os tipos de Democracia, trata-se adiante, no estudo da Democracia direta, indireta e semi-direta. 2.2 DEMOCRACIA DIRETA Para entender a Democracia direta, retrocede-se aos tempos da civilização grega e romana, em seu período clássico. Procede-se a seguir, uma análise do exercício político entre os povos da antiguidade clássica. 2.2.1 Histórico Historicamente, a Democracia surgiu na Grécia antiga, segundo aponta Goulart103: A democracia direta teve sua origem nos estados da antiga Grécia, especialmente em Atenas, onde o povo, reunido em praça 101 MENEZES, Anderson de. Teoria Geral do Estado. p. 283. 102 AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. p. 222. 103 GOULART, Clovis de Souto. Formas e Sistemas de Governos, uma alternativa para a democracia brasileira. Porto Alegre: Sergio Antônio Frabis, 1999. p. 88. 33 pública – decidia sobre as magnas questões do poder, fossem de ordem legislativa, administrativa ou judicial. Verifica-se, outrossim, a prática do exercício político na antiga Roma, como descreve Menezes104: “[...] Roma, na sua evolução social, fornece os mesmos motivos, no concernente a participação do povo nas atividades estatais”. A participação dos cidadãos dava-se em assembléias, deliberando diretamente sobre as decisões que lhe interessavam, caracterizando um governo popular, ou seja, governando por si mesmo. As questões a serem decidas em prol da coletividade eram as mais diversas, conforme descreve Azambuja105: [...] os cidadãos reuniam-se freqüentemente em assembléias para resolver os assuntos mais importantes do governo da cidade, tais como declarar a guerra e fazer a paz, escolher magistrados e funcionários, julgar certos crimes, etc. Todavia, o direito de participar na Democracia grega era limitado. Os escravos que constituíam a grande massa de habitantes das pólis eram excluídos da prática política. Apenas os cidadãos livres participavam do exercício político direto, também reduzido a uma pequena classe aristocrata. Ensina Menezes106: É que, tanto entre as populações gregas como no seio da nação romana, a massa de escravos era enorme, enquanto apresentava reduzida expressão o número de pessoas livres, com direito de participar da vida política. Na realidade, verificava-se a intromissão, na esfera governamental, de uma diminuta elite, formada por cidadãos. 104 MENEZES, Anderson de. Teoria Geral do Estado. p. 278. 105 AZAMBUJA, Darci. Introdução a Ciência Política. 17 ed. São Paulo: Globo, 2005. p. 216. 106 MENEZES, Anderson de. Teoria Geral do Estado. p. 278. 34 Imperioso ressaltar, que a Democracia direta, nos dizeres de Maluf 107 : “[...] somente foi possível porque então o Estado-Cidade (Polis, na Grécia e Civitas, em Roma) era pequena, restringindo-se aos limites da comunidade urbana. A sua aplicabilidade demonstrou-se utópica e inviável no decorrer da evolução história, pela complexidade acometida aos tempos modernos, principalmente, pelo aumento geográfico e populacional dos Estados. Após exame do aspecto histórico da Democracia grega, destaca-se a seguir sua conceituação textual. 2.2.2 Conceito de Democracia direta A Democracia direta é um sistema político que permite aos cidadãos participarem diretamente da vida política, sem interferências. A forma de governo popular foi aplicada com maior intensidade nos governos das CidadesEstados gregas, entre elas, a de Atenas. Com acuidade, preconiza Dahl108: Entre as democracias gregas, a de Atenas era de longe a mais importante, a mais conhecida na época e, ainda hoje, de incomparável influência na filosofia política, muitas vezes considerada um exemplo primordial de participação dos cidadãos ou, como diriam alguns, era uma democracia participante. A idéia de um poder exercido diretamente pelo povo foi inovadora para a época. Os gregos formularam um método de organizar o poder baseado no governo popular. Esse pensamento perpetuou-se ao longo da história e contribuiu para o desenvolvimento da Democracia representativa. Nesse contexto, assevera Maluf109 que: “Foram àquelas experiências as sementes da democracia, que os filósofos antigos e medievais 107 108 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p. 279. DAHL, Robert A. Sobre a Democracia: tradução de Beatriz Sidou. Brasília, DF: Universidade de Brasília, 2001, p. 22. 35 conservaram vivas até que germinassem assinalando o advento dos tempos modernos”. Passa-se adiante, ao exame do instituto da Democracia representativa. 2.3 DEMOCRACIA REPRESENTATIVA Como já não era possível um governo democrático ser exercido por todos, diante de uma nova realidade política, caminhou-se para a representação. Foi o modelo democrático escolhido para expressar a Soberania popular no mundo moderno. Com propriedade, leciona Maluf110: A comunidade nacional é soberana, é a fonte do poder, e deve governar-se por si mesma. Nenhum poder pessoal pode sobreporse a vontade geral. Esta tese é o ponto de partida do ideal democrático. E assim, a democracia pura seria o governo direto, levado a efeito pelo próprio povo, em comícios periódicos e assembléias públicas. Entretanto, como a democracia direta não é praticável no mundo moderno, a população, soberana, nomeia seus representantes, por via de eleições, para o exercício das funções de governo. É a solução denominada democracia indireta, ou democracia representativa, ou ainda, sistema representativo de governo. Assim, representação, é para necessário melhor analisar a compreensão história da do instituto da representatividade, descrevendo o surgimento e seu processo evolutivo para ao final, abordar o conceito de Democracia representativa. 109 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. p.122. 110 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p. 225. 36 2.3.1 Histórico A idéia de representação iniciou-se na Idade Média pelo instrumento de um mandato imperativo, de natureza privada. Permitia-se aos delegados exercerem a representação em função de interesses particulares. Nesse sentido, cita Santos111: Durante muito tempo, da Antiguidade Média, tínhamos a concepção do mandato imperativo. Por ele, o mandatário estava plenamente vinculado as instruções prévias de seus eleitores, normalmente escritas. Havia o contrato entre representante e representado. Essa idéia inicial sofreu forte influência da concepção privatista de mandato. Tinha-se na figura do representante como um gestor de negócios, pessoa que deveria zelar pelos interesses dos eleitores ou de grupos ou instituições, cumprindo as instruções dos representados. Nesse modelo de representação política, a relação entre representantes e representados assume características contratuais, como bem assinala Dallari112: “[...] basta que se examine o chamado mandato imperativo, que foi, por assim dizer, o momento de transição, durante o qual se manteve o caráter nitidamente contratual”. Firmava-se desse modo, obediência dos Deputados às instruções contidas no contrato, segundo indica Menezes113: Entre aqueles que eram eleitos e aqueles que votavam, estabelecia-se, nos moldes do direito privado, um legítimo contrato fora de cujas cláusulas não podiam os deputados praticar nenhum ato. Dessa forma, as funções políticas dos representantes eram vinculadas às ordens de seus eleitores. Seu descumprimento acarretava o fim da representação, extinguindo o mandato. 111 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. p.125. 112 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. p. 157. 113 MENEZES, Anderson. Teoria Geral do Estado. p.346. 37 Versando sobre o tema, assinala Maluf114: “O representante era eleito sob determinadas condições, e deveria proceder nas assembléias, em estrita conformidade com as instruções dos seus eleitores, sob pena de revogação”. Insta salientar, essa concepção de representação vigorou em alguns Estados, mais precisamente, de acordo com Maluf115: “[...] nos primeiros Parlamentos ingleses e nas assembléias dos Estados Gerais franceses”. A representação pelo mandato imperativo, de caráter privado, e sem autonomia dos representantes, já não era o suficiente para atender as expectativas de uma nova realidade política. Era necessário dar liberdade ao representante, para assim, executar a vontade geral. Nessa vertente, opina Santos116: Tal concepção com o tempo mostrou-se inviável, dada as profundas dificuldades lógicas e naturais que a envolvem. As circunstâncias em matéria política são dinâmicas, portanto incabíveis; a consulta constante e reiterada aos eleitores é prática impossível; a vontade dos eleitores é igualmente mutante, tal como a realidade política. Verificou-se, assim, que melhor seria liberar o representante, ter uma representação livre. Dessa forma, os representantes poderiam agir, atuar de acordo com os interesses do Estado como um todo, opinando e deliberando de acordo com o” bem comum”. Foi a partir do surgimento dos Estados Modernos, em particular, após o advento da gloriosa Revolução Francesa, que se fixou o modelo moderno de representação, vinculando o exercício político do representante aos interesses gerais dos representados. 114 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p. 232 115 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 22 ed. São Paulo: Saraiva. 1993, p. 232. 116 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. p.125 38 Prescreve Botelho117: Os franceses revolucionários não concebiam um mecanismo prático e eficiente de todos os membros da população participar do processo político (democracia direta), mas não admitiam a manutenção de um sistema político em que o poder ficasse concentrado nas mãos de uma só pessoa de forma absoluta, como ocorreu no Ancien Régime, daí a escolha pelo mecanismo da representação, no qual o povo escolheria, dentre seus iguais, representantes para exercer, em seu nome, o poder político do Estado. É possível verificar, na própria Constituição francesa de 1791, a inserção do mecanismo de representação baseado no interesse geral, abolindo dessa forma a sua natureza contratual. Cita Dallari118: Esta prática foi expressamente repudiada pela Constituição francesa de 1791, que estabeleceu a seguinte norma: “os representantes eleitos nos departamentos não serão representantes de nenhum departamento em particular, mas de toda a nação, e não lhes poderá ser dado nenhum mandato”. Como pode-se notar, o mandato representativo é caracterizado por uma relação de confiança. Dessa maneira, o representante adquire maior autonomia na sua conduta política, mas sempre direcionado ao interesse geral. Esclarece Bastos119: Não foi essa a teoria a adotada pelo Estado liberal, que preferiu a do mandato representativo ou livre, em que há uma relação de confiança entre mandante e o mandatário. Esse recebe do eleitor poderes para decidir de forma autônoma. 117 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 299. 118 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. p.157. 119 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. p.119. 39 Convém ressaltar, que a moderna concepção de 120 representação fixou-se com Rousseau . Para o pensador, pela teoria da representação política, o representante age em nome da vontade do povo por intermédio de um mandato. Nos dizeres de Maluf121: Sob a liderança de Seyes e Rousseau formou-se a Teoria Clássica da representação Política Nacional: o titular do mandato político representa o povo na sua totalidade, não a grupos populacionais de regiões ou distritos, e assim, age livremente, como delegado da soberania nacional una e indivisível, sem necessidade de qualquer consulta. A eleição do candidato importa em aceitar o seu programa pessoal de ação. Os fundamentos da teoria da representação política foram primordiais para impulsionar a Democracia representativa no mundo moderno. Após prescrever o histórico da representação, compreende observar seu conceito, no objetivo de melhor alcançar o entendimento acerca do instituto em questão. 2.3.2 Conceito de Democracia Representativa Descrever o conceito de Democracia representativa ou regime representativo é inicialmente, estabelecer a correlação entre os governantes e governados. Na democracia indireta, a instituição representativa do poder é fundamental para caracterizar o regime político. Sendo assim, na acepção mais abrangente de Democracia representativa, ou regime representativo, tem-se um povo titular da Soberania, que delega o exercício do poder soberano aos seus representantes, eleitos para representarem a vontade geral. 120 “Rousseau inicialmente nega o regime representativo, mas após certa relutância o admite, por reconhecer a impossibilidade concreta de uma democracia direta, que os eleitos (mandantes) não são representantes do povo e sim seus mandatários, meros procuradores”. BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. Florianópolis, SC: Obra Jurídica, 2005. p.300. 121 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p. 232. 40 Preconiza Botelho122: Por regime representativo, deve-se compreender que o poder soberano pertence a nação (teoria da soberania nacional) ou ao povo (teoria da soberania popular) e é exercido por meio de representantes (vereadores, prefeitos, deputados, governadores, senadores e presidente). Em outras palavras, regimes representativos denotam um governo exercido por meio de representantes eleitos pelo povo. Contemporaneamente externa-se a Democracia representativa, através de decisões políticas realizadas pelo parlamento (Congresso Nacional), órgão onde estão locados os representantes do povo. Com propriedade, afirma Bastos123: Na democracia representativa, os Poderes Públicos são integrados por órgãos representantes do povo, como o Senado Federal e a Câmara de Deputados (Congresso Nacional). A força do Estado encontra-se aqui na vontade popular, uma vez que ela é quem escolhe tanto a representação parlamentar como o presidente ou o grupo colegial que forma o Executivo. Vislumbra-se nesse capítulo, que a Democracia representativa é o instituto político vigente nos Estados Democráticos, como forma de possibilitar a partição dos cidadãos, ainda que indiretamente, no exercício político do Estado, pelo instrumento político da representação. Apresenta-se a seguir, outro tipo de Democracia: a Democracia semidireta. 2.4 . DEMOCRACIA SEMIDIRETA O sistema representativo do poder político do Estado permite aos cidadãos participarem da vida política por meio de seus representantes, eleitos para este fim. 122 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 299. 123 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. p.124. 41 Entretanto, criou-se outros institutos, como forma de permitir a manifestação popular, aproximando-se de uma Democracia direta. É a modalidade denominada de democracia semidireta ou mista. Isto porque, segundo Azambuja124: É um sistema misto, que guarda as linhas gerais do regime representativo, porque o povo não se governa diretamente, mas tem o poder de intervir, as vezes, diretamente na elaboração das leis e em outros momentos decisivos do funcionamento dos órgãos estatais. Verifica-se que a atuação dos cidadãos se da no processo legislativo do Estado, intervindo na elaboração das leis. Não é, portanto, uma Democracia direta, mas sim um sistema misto de Democracia, com bem acentua Dallari125: Há vários outros institutos que, embora considerados por alguns autores como característicos da democracia direta, não dão ao povo a possibilidade de ampla discussão antes da deliberação, sendo por isso classificado pela maioria como representativos da democracia semidireta. São três modalidades de democracia semidireta, de acordo com Azambuja126: “[...] o referendum, o veto popular e a iniciativa popular”. Exposto a terceira classificação de Democracia, parte-se adiante, para o estudo da Democracia participativa, através do mecanismo do orçamento participativo. 124 AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. p. 224. 125 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. p.153. 126 AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. p. 224. 42 2.5 . A DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E UMA NOVA PROPOSTA: O ORÇAMENTO PARTICIPATIVO Após abordar a Democracia grega, a representativa e a semidireta, segue-se o estudo, examinando o mecanismo da Democracia participativa, denominado de orçamento participativo. 2.5.1 Conceito. É questionável a eficiência da Democracia direta em uma sociedade complexa, justamente por não possibilitar, devido à extensão territorial dos Estados e a grande densidade populacional, a participação direta do povo, em todas as decisões políticas de interesse da coletividade. Como forma de solucionar eventual problema político de participação, criou-se o modelo da Democracia representativa, através do mecanismo da representação. Porém, com objetivo de permitir a participação direta dos cidadãos na vida pública, reascendendo o velho conceito de Democracia Direta, instituiu-se no Brasil a Democracia participativa, pelo mecanismo do orçamento participativo, como indica Sell apud Fedozzi127: “Entretanto, a experiência mais inovadora em termos de democracia participativa no Brasil é o orçamento participativo”. Sobre a Democracia participativa, ensina Sell128: Por democracia participativa podemos entender um conjunto de experiências e mecanismos que tem como finalidade estimular a participação direta dos cidadãos na vida política através de canais de discussão e decisão. A democracia participativa preserva a realidade do Estado (e a democracia representativa)[...]. 127 SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: política e sociedade na modernidade tardia. p. 95. 128 SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: política e sociedade na modernidade tardia. p. 93. 43 É no âmbito da administração pública que se dá a inserção do orçamento participativo, servindo como instrumento de participação dos cidadãos nas questões que envolvem o gerenciamento dos recursos públicos. Desse modo, o orçamento participativo promovido pela administração pública, permite a participação direta da população no orçamento público, conforme preceitua Sell apud Fedozzi129: “Em linhas gerais, no orçamento participativo a população de uma cidade é chamada para discutir a aplicação dos recursos públicos destinada para investimento no município. A aplicação do orçamento participativo deu-se na cidade de Porto Alegre, RS, por 16 anos e foi objeto de estudo, cuja análise descreve Fedozzi130: O orçamento participativo promovido pela Prefeitura de Porto Alegre é uma modalidade de gestão pública baseada na participação direta da população nas diversas fases que compõe a elaboração e a execução do orçamento público municipal, especialmente na indicação das prioridades para a locação dos recursos de investimentos. O dinamismo do processo de participação comunitária no orçamento participativo é sistemático, formado por três etapas, como conclui ainda Fedozzi131: As três etapas em que se desenvolve o ciclo anual do Orçamento participativo são: (1) realização das Assembléias Regionais e Temáticas; (2) formação das instâncias institucionais de participação, tais como o Conselho do Orçamento e os Fóruns de Delegados; (3) discussão do orçamento do Município e aprovação do Plano de Investimento pelos representantes dos moradores no Conselho do Orçamento Participativo. 129 SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: política e sociedade na modernidade tardia. p. 95. 130 FEDOZZI, Luciano. Orçamento Participativo: reflexões sobre a experiência de Porto Alegre. 3 ed. Porto Alegre, RS: Tomo Editorial, 2001. p.93. 131 FEDOZZI, Luciano. Orçamento Participativo: reflexões sobre a experiência de Porto Alegre. p. 106-107. 44 Nota-se que a Democracia participativa por meio do orçamento participativo, inseriu no âmbito da administração pública, mais especificamente na prática administrativa, um mecanismo de participação popular por meio de debates, possibilitando aos cidadãos participarem efetivamente no gerenciamento dos recursos públicos. 2.6 PARTIDOS POLÍTICOS. A partir da instalação do regime democrático representativo, surgiram agrupamentos humanos organizados politicamente com objetivo de participarem da esfera política do governo. Primordial, portanto, elencar a teoria de Duverger, sobre as origens dos Partidos Políticos para compreender quais são estas agremiações partidárias e como surgiram. Posteriormente, será analisado seu conceito, as funções sua natureza jurídica e, ao final, a abordagem do sistema partidário. Para melhor assimilar este instituto, procederá ao estudo de seu histórico, como se observará adiante. 2.6.1 Histórico. Preliminarmente, realiza-se um breve exame acerca da localização histórica da origem dos Partidos, para em seguida expor a teoria de sua criação, do ponto de vista de Duverger. A origem e o processo evolutivo dos Partidos deu-se na Inglaterra, segundo cita Maluf132: No que tange a origem e evolução histórica dos partidos políticos, vistos na contextura como se apresentam no panorama do mundo moderno, é pacífico que tiveram eles o seu berço na Inglaterra, nação precursora do constitucionalismo. Na França, por sua vez, formaram-se diversos grupos durante a Revolução Francesa, marcando o início da origem dos Partidos 132 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p. 317. 45 Políticos franceses. Nesse aspecto, cita Botelho133 que: “Quando da reunião dos Estados Gerais, antes da constituinte francesa de 1789, surgem os primeiros agrupamentos políticos franceses (denominados de jacobinos e girondinos); [...]”. Entretanto, é na doutrina de Duverger onde encontra-se uma abordagem mais precisa sobre a criação dos Partidos, a partir da análise de sua estrutura. Esclarece Sell134 apud Duverger: “Do ponto de vista estrutural, Duverger argumenta que os partidos políticos podem ter origem externa e interna.” Assim, a criação do Partido Político estaria vinculada ao dos grupos parlamentares e comitês eleitorais. Seguindo esse entendimento, assinala Duverger135: “[...] O nascimento dos partidos encontra-se, portanto, ligado ao dos grupos parlamentares e comitês eleitorais”. De origem interna, tem-se inicialmente, a criação de grupos parlamentares, cuja manifestação se dava em todas as assembléias. Após, formavam-se os comitês eleitorais que surgiram necessariamente da busca de novos eleitores, pela adoção do sufrágio eleitoral. A associação entre estas duas organizações formou a origem interna dos Partidos Políticos. Com propriedade, expõe Sell136 : A origem dos partidos políticos seria fruto da articulação de duas organizações independentes. Por um lado, este tipo de organização surge primeiramente dentro do parlamento, como expressão das diferentes idéias, valores e interesses presentes entre os representantes eleitos. O seu embrião, portanto, são “grupos de parlamentares” organizados no interior do parlamento. A outra organização seria o comitê eleitoral. Com a progressiva eliminação das barreiras para o voto (renda, sexo, educação, 133 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 300. 134 SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: política e sociedade na modernidade tardia. p. 161. 135 DUVERGER, Maurice. Partidos Políticos. Tradução Cristiano Monteiro Oiticica. Revisão Técnica de Gilberto Velho. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1970. p. 20. 136 SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: política e sociedade na modernidade tardia. p. 161. 46 classe, etc.) ou a progressiva expansão do sufrágio eleitoral, os parlamentares buscavam organizar os “comitês eleitorais’ que tinham por objetivo buscar votos e colocar determinados representantes no poder. [..]. Duverger além de citar a criação interna dos Partidos, aponta para a sua origem externa. Denota-se, portanto, que a origem externa das agremiações decorre de grupos já existentes, provocando a criação de um Partido Político para que se possa, ao final, representar seus interesses. Na lição de Duverger137: Examinando a gênese dos partidos no quadro eleitoral e parlamentar, já se observou a intervenção de organismos externos nesse quadro: sociedades de pensamento, clubes populares, jornais por exemplo. A distinção entre os partidos de criação externa e os partidos de criação eleitoral e parlamentar não é rigorosa: ela caracteriza antes tendências gerais do que tipos definidos, de forma que sua aplicação pratica é as vezes difícil. Em um número bastante grande de casos, contudo, o conjunto de um partido é essencialmente estabelecido por uma instituição preexistente, cuja própria atividade se situa fora das eleições e do parlamento: pode-se, portanto, falar adequadamente de criação exterior As agremiações partidárias de origem externa derivam de vários grupos, não englobando apenas os citados por Duverger. De acordo com Sell138: “[...] Entre os grupos que podem subsidiar a origem de um partido político estão os sindicatos, sociedades de pensamento e agrupamento profissionais de camponeses, industriais, comerciantes, etc.” Vislumbra-se que os Partidos Políticos mesmo exercendo a prática partidária nos Estados, por tempos atuaram sem previsão legal. Atualmente, os Partidos Políticos estão previsto nas Constituições dos Estados, definindo sua criação, organização e prática política. 137 138 DUVERGER, Maurice. Partidos Políticos. p. 26. SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: política e sociedade na modernidade tardia. p. 161. 47 Salienta Azambuja139 que: Até bem recentemente, a constituição e legislação dos Estados modernos ignoravam os partidos políticos. Apesar de sua enorme influência, permaneciam à margem da lei, não eram por ela reconhecidos nem disciplinados. A situação hoje é diversa; a existência, organização e ação dos partidos é prevista na maioria das Constituições e legislações. No Brasil, a existência dos agrupamentos políticos remetese ao tempo do Império. Segundo Sell140: “De modo geral, os estudiosos da história e da política consideram que existem partidos políticos no Brasil desde a época do Império”. No entanto, verifica-se que alguns Partidos Políticos criados no Brasil, na metade do século passado, permanecem atuantes até hoje. Nessa concepção, assevera Botelho141: Na primeira metade do século XX, surgem os partidos políticos centrados em ideologias que permanecem até os dias atuais (Partido Social Democrático, PSD, Partido Trabalhista Brasileiro, PTB, e União Democrática Nacional, UND). Em 1965, com a publicação do Ato Institucional n.2, surge no Brasil o bipartidarismo artificial, representado pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro) e pela Arena (Aliança Renovadora Nacional), extintos em 1979, quando se reinicia a estruturação partidária: PDS (Partido Democrático Social), PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro), PT (Partido dos Trabalhadores); PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), PDT (Partido Democrático Trabalhista); PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), entre outros de menor expressão. 2.6.2 Conceito. O Partido Político é um instrumento efetivo da Democracia representativa. É por intermédio deles, que são eleitos os representantes e dessa 139 AZAMBUJA, Darci. Introdução a Ciência Política. p. 311. 140 SELL, Carlos Eduardo. Introdução a Sociologia Política: política e sociedade na modernidade tardia. p. 167. 141 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 302. 48 forma, faz-se a ligação entre a sociedade e o governo. Seu conceito situa-se na base do regime representativo, não gerando muitas controvérsias acerca da sua definição. Tradicionalmente, Max Weber142 traz a definição de Partido Político, como pode-se observar: Partidos são, em sua essência mais íntima - por mais numerosos que sejam os meios que empenhem para conseguir a associação permanente de sua clientela - organizações voluntariamente criadas e baseadas em livre recrutamento, necessariamente sempre renovado, em oposição a todas as corporações fixamente delimitadas pela lei ou por contrato. Seu objetivo é, hoje, sempre a obtenção de votos e eleições para cargos políticos ou em corporações com voto. Expandindo o conceito tradicional fixado por Weber, de um Partido pode-se dizer que é um agrupamento humano, organizado sob a mesma ideologia política, com a finalidade primordial de chegar ao poder, com objetivo de realizar o interesse geral. Nessa ambiência contextual, assinala Botelho apud Silva143: Segundo Silva, partido político é uma forma de agremiação de um grupo social que se propõe organizar, coordenar e instrumentalizar a vontade popular, com o fim de assumir o poder, para realizar seu programa de governo. Assim, é possível constatar a dupla finalidade dos Partidos Políticos. Ora, servindo de ponte entre a sociedade e o governo, ora priorizando o poder para a sua manutenção. De toda maneira, percebe-se na definição de Partido Político uma organização estável, cujo objetivo é representar os interesses da sociedade perante o governo. 142 WEBER, Max. Economia e Sociedade: Fundamentos da sociologia compreensiva. Tradução de Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa; Revisão técnica de Gabriel Cohn. Brasília, DF: UnB:São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 1999. v. 2. p. 544 143 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 301. 49 2.6.3 Funções dos partidos políticos É de suma importância o funcionamento das agremiações partidárias na estrutura do Estado, para a manutenção de um regime democrático, aos quais cabem inúmeras funções, como descreve Bastos144: Desempenham funções importantíssimas no campo da formação da opinião pública, na seleção de candidatos, no papel de crítica ao governo estabelecido ou na defesa de posições governamentais, na formação de lideranças, assumindo ao final, um papel de conduto de comunicação entre governo e povo, nos dois sentidos. A manifestação dos Partidos Políticos direciona-se a formulação e prática de seus programas de governo, pois segundo Azambuja145: “[...] Eles formulam programas, isto é, métodos para tratar e resolver os problemas da administração e de política, e apresentam candidatos que se propõem, uma vez eleitos, realizar estes programas”. Independentemente do modelo e método do programa de governo postos pelos Partidos Políticos, sua principal função perante o Estado é a preservação da Democracia, assegurando o regime democrático. Nesse diapasão, apregoa Filomeno146: “De toda maneira, qualquer que seja a coloração ideológica dos partidos políticos numa democracia, seu maior compromisso, por certo, é com a própria manutenção dela.” 2.6.4 Natureza jurídica dos partidos A questão da natureza jurídica dos Partidos é controvertida, e para muitos autores, não há uma unicidade referente a este tema. Tem-se identificado dois grupos principais, segundo prescreve Maluf147: 144 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. p. 229. 145 AZAMBUJA, Darcy. Introdução a Ciência Política. p. 314. 146 FILOMENO,José Geraldo Brito. Manual de Teoria Geral do Estado e Ciência Política. p. 107. 50 Discute-se no campo doutrinário a verdadeira natureza dos partidos políticos, dividindo-se as opiniões em dois grupos principais: a) dos que defendem a concepção puramente social; e b) dos que sustentam a natureza jurídica dos partidos políticos como instrumento de direito público interno. No Brasil, após a promulgação da CRFB/88, confere-se aos Partidos Políticos, personalidade jurídica de direito privado, conforme disposto no art. 17, §2º148, da Carta Magna, e nas palavras de Botelho149: Os partidos políticos brasileiros, de acordo o artigo 17º da Constituição de 1988, são pessoas jurídicas de direito privado, necessitando, após os atos definidos na lei civil para a formação das Sociedades, registrar seus estatutos no Superior Tribunal Eleitoral. No mesmo posicionamento, segue Santos150: “[...] Hoje são associações com personalidade jurídica de direito privado, com obrigatoriedade de registro de estatuto no Tribunal Superior Eleitoral”. 2.6.5 Sistema partidário Como instrumento da representação política desde a sua institucionalização, no decorrer dos tempos modernos, surgiu inúmeros Partidos, cada qual definindo o modo e a forma de sua atuação dentro dos Estados. Assim, entende-se por sistema partidário a coexistência de Partidos envolvidos no contexto político de cada Estado. Por meio de um critério numérico, tem-se o sistema partidário em unipartidários, do bipartidarismo e pluripartidarismo. 147 MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. p. 310. 148 É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos: 149 BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. p. 309. 150 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. p. 135. 51 Referente à classificação do sistema partidário, leciona 151 Friede : Embora subsistam algumas controvérsias, a maioria dos autores converge para o entendimento segundo o qual três diferentes sistemas partidários coexistem no mundo contemporâneo: o sistema de partido único (unipartidarismo), o sistema bipartidário (bipartidarismo) e o sistema de diversos partidos (pluripartidarismo). A priori, compreende-se por sistema unipartidário, um Partido único no Estado. Contudo, nesta unidade partidária, não se afasta do ideal democrático, segundo Dallari152: “[...] Em tais sistemas pretende-se que os debates políticos sejam travados dentro do partido, não havendo assim, um caráter necessariamente antidemocrático nos sistemas unipartidários”. Em contraposição, firma-se o entendimento que a existência de apenas um partido fere o regime democrático. Nessa seara, assinala Santos153: “O sistema unipartidário é sempre sinônimo de Estado totalitário, pois não deixa alternativa ao corpo eleitoral. A idéia de unidade é oposta ao ideal democrático contemporâneo”. Já o sistema do bipartidarismo, caracteriza-se pela existência de dois Partidos com ideologias opostas, alternando-se no poder. Assevera Bastos154: Os sistemas bipartidários, como o seu nome mesmo está a indicar, são aqueles que consagram dois partidos, que, por vezes, têm forças mais ou menos aproximadas, revezando-se no poder, constituindo um autêntico bipartidarismo, e que, por outras, ostentam um partido dominante, isto é, um partido quase permanentemente no poder e outro quase sempre na oposição. 151 FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Teoria constitucional e relações internacionais. p. 304. 152 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria Geral do Estado. p.165. 153 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria geral do Estado. p. 135. 154 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. p. 231. 52 Em relação aos Estados que fazem uso deste sistema, 155 apregoa Santos que: “[...] temos o exemplo inglês – Partido Trabalhista e Conservador; nos Estados Unidos, Partido Republicano e Democrata etc”. Por último, tem-se o sistema partidário do pluripartidarismo. Neste sistema, a representação política é múltipla com a coexistência de vários partidos, como bem indica Dallari156: “Sistemas pluripartidários, que são a maioria, caracterizando-se pela existência de vários partidos igualmente dotados da possibilidade de predominar sobre os demais”. A história das organizações políticas demonstra o quanto são necessários dentro de um contexto democrático de Estado. Como estrutura integrante do regime democrático, os Partidos Políticos são mecanismos da representação e não há como vedar a sua existência em um Estado Contemporâneo, sob pena de extinguir o governo representativo e conseqüentemente, a própria Democracia. Apresenta-se no capítulo subseqüente, a Imunidade Parlamentar no ordenamento jurídico brasileiro, analisando todos os aspectos deste instituto jurídico-positivo. 155 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. p. 138. 156 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. p.165. CAPÍTULO 3 IMUNIDADE PARLAMENTAR Neste capítulo, apresenta-se um estudo jurídico sobre a Imunidade Parlamentar no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Para a devida compreensão do instituto, será examinado o seu aspecto histórico-evolutivo, bem como seu conceito. Destaca-se, posteriormente, a Imunidade material e formal sob a vigência da EC nº 35, de 20 de dezembro de 2001, que alterou substancialmente a redação do texto original previsto na CRFB/88, contudo, sem deixar de mencionar o conteúdo previsto no texto anterior a emenda. A seguir, cuidará da Imunidade Parlamentar em nível Federal, Estadual e Municipal para, ao final, tecer breves considerações sobre a EC nº 35/2001. 3.1 HISTÓRICO No escopo de examinar o aspecto histórico da Imunidade Parlamentar, em específico o desenvolvimento do instituto nas Constituições do Brasil, insta abordar inicialmente a sua origem, tendo como referência a Inglaterra, os Estados Unidos e a França. 3.1.1 Origem da imunidade parlamentar A origem das Imunidades remonta a Constituição inglesa, no sec. XVII, a partir da Declaração de Direitos da Inglaterra. Proclamavam em seu texto Constitucional, no fito de garantir o livre exercício do mandato Parlamentar duas espécies de Imunidades: a liberdade de opinião, expressão, debates e, a imunidade de prisão arbitrária. Foram estas instituições constitucionais que estabeleceram as prerrogativas Parlamentares. 54 Cita Moraes157: A criação das imunidades parlamentares como corolário da defesa da livre existência e independência do Parlamento tem no sistema constitucional inglês sua origem, através da proclamação do duplo princípio da freedom of speach (liberdade de palavra) e da freedom from arrest (imunidade a prisão arbitrária), no Bill of Rights de 1688, os quais proclamaram que a liberdade de expressão e de debate ou de troca de opiniões no Parlamento não pode ser impedida ou posta em questão em qualquer corte ou lugar fora do Parlamento. Logo após, coube aos Estados Unidos recepcionar as Imunidades Parlamentares em seu texto constitucional158, segundo salienta Moraes159: “Posteriormente, as imunidades parlamentares foram inscritas constitucionalmente na Carta Magna dos Estados Unidos da América (17-091787) [...]”. Na França, o instituto da Imunidade deflagrou-se, inicialmente, na Assembléia Nacional, para em seguida, declarar na Constituição Francesa. Dessa forma, ensina Kuranaka160: De retorno ao continente europeu, essas imunidades parlamentares foram decretadas no dia 23 de junho de 1789, pela primeira Assembléia Nacional francesa, que se encontrava em luta aberta contra a Coroa, em favor de seus membros; igualmente foram contempladas na Constituição Federal Francesa, de 3 de setembro de 1791 [...]. 157 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 424. 158 A Imunidade Parlamentar encontra-se inserida no art. 1º, seção 6 da Carta Magna dos Estados Unidos, afirmando que “Em nenhum caso, exceto a traição, felonia e violação da paz, eles (senadores e representantes) poderão ser presos durante sua freqüência as sessões de suas respectivas Câmaras, nem a elas se dirigirem, ou delas retornarem; e não poderão ser incomodados ou interrogados, em qualquer outro lugar, por discurso ou opiniões emitidos em uma ou outra Câmara. 159 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 425. 160 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 97. 55 Vislumbra-se, portanto, a partir da proclamação do binômio freedom of speach (liberdade de palavra) e freedom from arrest (imunidade a prisão arbitrária), na Constituição inglesa, a criação do instituto da Imunidade Parlamentar, o qual se afirmou como prerrogativas necessárias aos congressistas, para o livre exercício legislativo, integrando posteriormente a outras Constituições democráticas de vários países. 3.1.2 O histórico da imunidade parlamentar nas Constituições do Brasil No intento de demonstrar a inscrição da Imunidade nos textos constitucionais do Brasil, imperioso analisar cada Constituição Brasileira que vigorou em nosso direito pátrio, sem, para tanto, deixar de observar a CRFB/88. Assim, a partir da Carta Imperial de 1824, consagrou-se a regulamentação da Imunidade Parlamentar. Conforme o disposto no texto constitucional, conferia-se aos Parlamentares em seus artigos 26161, 27162 e 28163, Imunidade material e formal. Os Senadores e Deputados eram invioláveis pelas opiniões proferidas em sua atividade funcional, bem como, a não prisão senão por ordem da respectiva Câmara, salvo em flagrante delito de pena capital. Ao Parlamento cabia decidir o andamento do processo em face de algum Parlamentar e a suspensão do exercício representativo. 161 Conforme o art. 26, Os membros de cada uma das Câmaras são invioláveis pelas opiniões, que proferirem no exercício das suas funções. 162 Dizia o art. 27, Nenhum Senador, ou Deputado, durante a sua deputação, pode ser preso por autoridade alguma, salvo por ordem de sua respectiva Câmara, menos em flagrante delito de pena capital”. 163 Referia o art. 28, Se algum Senador ou Deputado for pronunciado, o juiz, suspendendo todo o ulterior procedimento, Dara conta a sua respectiva Câmara, a qual decidira, se o processo deva continuar, e o membro ser, ou não suspenso no exercício das suas funções. 56 Sobre as prerrogativas previstas na Carta Imperial de 1824, 164 menciona Bulos : [...] esse texto ampliou a imunidade parlamentar para os crimes comuns, não só aos delitos políticos ou de opinião, pois nessa época, o poder concentrava-se nas mãos do governo, que transferiu para o Parlamento a prerrogativa de conceder ou não a licença para se processar políticos. A Constituição Republicana de 1891 manteve a Imunidade material e formal. Prescrevia a Constituição a inviolabilidade por palavras, opiniões e votos, além de não ser presos e nem processados por crimes sem a devida autorização da respectiva Câmara, salvo em flagrância de crime inafiançável. Comentando a Constituição de 1891, expõe Krieger165: A primeira Constituição Republicana, de 1891, em seus artigos 19 e 20, previa também a material e formal. Os parlamentares continuavam invioláveis por suas opiniões, palavras e votos. Tinham também a garantia de que não poderiam ser presos nem processados criminalmente sem a devida e prévia licença dos seus pares, salvo em caso de flagrante de crime inafiançável. A Constituição de 1934 previa as Imunidades Parlamentares, conforme o que já se mencionava no texto constitucional anterior. Interessante ressaltar algumas modificações do instituto quanto ao sujeito ativo da Imunidade. Observa-se no art. 31166, que a prerrogativa aplicava-se apenas aos Deputados. Já o disposto no art. 32167, indicava que a prerrogativa era extensiva ao suplente imediato do Deputado em exercício. 164 BULOS, Uadi Lammêngo. Constituição Federal Anotada. p. 753-754. 165 KRIEGER, Jorge Roberto. Imunidade Parlamentar. Histórico e evolução do instituto no Brasil. Florianópolis: Obra Jurídica, 2004, v. 1 p. 33. 166 Os Deputados são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício das funções do mandato. 167 Os Deputados, desde que tiveram recebido diploma até a expedição dos diplomas para a legislatura subseqüente, não poderão ser processados criminalmente, nem presos, sem licença da Câmara, salvo caso de flagrância em crime inafiançável. Esta imunidade é extensiva ao suplente imediato do Deputado em exercício. 57 Somente no § 2º168 do art. 89 da Carta Magna de 1934, entendia-se que a Imunidade projetava-se aos Senadores. A vigência da Carta Magna de 1934 foi curta. Com o golpe de 1937, instalou-se a ditadura do Estado Novo. Assim, nota-se que a decretação da Constituição de 1937, alterou substancialmente o tratamento das Imunidades Parlamentares. Trazia no termo do art. 42169, da referida Lei Maior, a Imunidade formal. Contudo, o caput do art. 43170, alterou a Imunidade material, atribuindo responsabilidade civil e criminal a certos crimes praticados por Parlamentares. No intento de redemocratizar o Brasil, foi promulgada em 1946, a Constituição Federal. Acerca desse tema, descreve Kuranaka171: Esta constituição abrigou o ensejo de por fim ao autoritarismo imposto ao povo brasileiro desde 1930, instaurando-se ao mesmo tempo um Estado Democrático, voltado a proteger os direitos individuais Nesse prisma, o texto constitucional volta a consagrar a Imunidade material e formal, acrescentando alguma novidade. Abordavam-se as prerrogativas nos art. 44172, 45173 §§ 1º, 2º e art. 46174 do diploma legal. 168. Os Senadores têm imunidades, subsidio e ajuda de custo idêntico aos dos Deputados. 169 Durante o prazo em que estiver funcionando o Parlamento, nenhum dos seus membros poderá ser preso ou processado criminalmente, sem licença da respectiva Câmara, salvo em caso de flagrância em crime inafiançável. 170 Só perante a sua respectiva Câmara responderão os membros do Parlamento Nacional pelas opiniões e votos que emitirem no exercício de suas funções: não estarão porém, isentos de responsabilidade civil e criminal por difamação, calunia, injuria, ultraje a moral pública ou provocação publica ao crime. 171 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. p. 106. 172 Os Deputados e Senadores são invioláveis no exercício do mandato, por suas opiniões, palavras e votos. 173 Desde a expedição do diploma até a inauguração da legislatura seguinte, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável, nem processados criminalmente, sem a prévia licença de sua câmara. 58 A inovação trazida pela Carta de 1946 referia-se no que dispunha o art. 45, § 1º, estabelecendo um prazo de 48 horas em se tratando de flagrante de crime inafiançável, para que os autos fossem remetidos a respectiva Câmara, para assim, decidir sobre a prisão e autorizem ou não, a formação da culpa. Visualiza-se, na Lei Maior de 1967 promulgada após o golpe militar de 1964, que a Imunidade Parlamentar, tanto material quanto formal, reproduziu o texto constitucional de 1946. A exceção encontrava-se no § 2º175, do art. 34, estipulando um prazo para a Câmara resolver sobre o pedido de licença. Caso não ocorresse, deveria ser incluído na ordem do dia. Seguindo esse entendimento, preceitua Krieger, apud Moraes176: [...] esta constituição inovou ao permitir a concessão tácita de licença para o processo de parlamentar, ao prever que, se no prazo de noventa dias, a contar do recebimento a respectiva Câmara não deliberasse sobre o pedido de licença, o mesmo seria incluído na “Ordem do Dia”, permanecendo durante quinze sessões ordinárias e consecutivas, quando então, mantendo-o inerte, terse-ia como concedida a licença. Após a Constituição de 1967, sobreveio a EC nº 1 de 17 de outubro de 1969177 trazendo no art. 32178, limitações a extensão da Imunidade § 1º . No caso de flagrante de crime inafiançável, os autos serão remetidos, dentro de quarenta e oito horas, à câmara respectiva, para que resolva sobre a prisão e autorize, ou não, a formação da culpa. § 2º A Câmara interessada deliberará sempre pelo voto da maioria dos seus membros. 174 Os Deputados e Senadores, quer civis, quer militares, não poderão ser incorporados as forças armadas senão em tempo de guerra e mediante licença da sua Câmara, ficando então sujeitos a legislação militar. 175 Se no prazo de noventa dias, a contar do recebimento, a respectiva Câmara não deliberar sobre o pedido de licença, será este incluído automaticamente em Ordem do Dia e nesta permanecerá durante quinze sessões ordinárias consecutivas, tendo-se como concedida a licença se, nesse prazo, não ocorrer deliberação. 176 KRIEGER, Jorge Roberto. Imunidade Parlamentar. Histórico e evolução do instituto no Brasil. p 46. v.1. 59 Parlamentar. Nesse sentido preconiza Ciavareli179: “A Emenda Constitucional de n. 1, em pleno regime militar, restringiu o âmbito das imunidades, não abrangendo mais elas no caso de crime contra a segurança nacional”. A partir da redação da EC nº 11/78180 que alterou o teor da EC n.1/69, os Deputados e Senadores passaram a ser submetidos a julgamento perante o STF. Ulteriormente a edição da EC nº 22 de 29 de junho de 1982, modificou-se o art. 32181, excluindo a segurança nacional para incluir a não incidência da Imunidade material, nos casos de crime contra a honra. Observa-se, novamente, mudanças significativas no texto da EC nº 1/69182, desta vez trazida pela EC nº 22/82, que possibilitou a sustação do processo. Com a promulgação da CFRB/88, estabeleceu em seu art. 183 53 e §§ 1º, 2º, 3º, 4º e 5º, a Imunidade Parlamentar. Todavia, com a nova dicção da EC nº 35/01, o instituto sofreu alterações significativas. 177 “Embora formalmente se trate de emenda constitucional, José Afonso da Silva, dentre outros doutrinadores, consideram-na verdadeira Constituição Federal e, no caso, da modalidade de outorga” CIAVARELI, Miguel Ângelo Nogueira dos Santos. Imunidade Jurídica: penais, processuais, diplomáticas, parlamentares. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. p. 110. 178 Os deputados e senadores serão invioláveis no exercício do mandato, por suas opiniões, palavras e votos, salvo no caso de crime contra a segurança nacional. 179 CIAVARELI, Miguel Ângelo Nogueira dos Santos. Imunidade Jurídica: Penais, Processuais, Diplomáticas, Parlamentares. p. 160. 180 De acordo com o disposto no ar. 32 § 4º: Os Deputados e Senadores serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 11, de 1978). 181 Art. 32 - Os deputados e senadores são invioláveis no exercício do mandato, por suas opiniões, palavras e votos, salvo no caso de crime contra a honra (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 22, de 1982). 182 Art. 32 § 3º - Nos crimes comuns, imputáveis a deputados e senadores, a Câmara respectiva, por maioria absoluta, poderá a qualquer momento, por iniciativa da Mesa, sustar o processo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 22, de 1982). 183 Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001). § 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001) 60 Após analisar o aspecto histórico da Imunidade Parlamentar no Brasil, segue-se abaixo, uma síntese representativa de todas as Constituições Brasileiras expostas no presente trabalho monográfico, com objetivo de demonstrar a previsão da Imunidade em cada texto constitucional. Se caso houver, prescreve-se o fundamento legal. Constituições do Brasil Previsão da Imunidade Não Fundamento legal das Imunidades Parlamentares Sim 1824 X Art. 26, 27 e 28. 1891 X Art. 19 e 20. 1934 X Art. 31, 32 §1º e art. 89 § 2º. 1937 X Art. 42 e 43 § único. 1946 X Art. 44, 45 §1º, §2º e art. 46. 67/69 X Art. 32 §§1º, 2º, 3º e 4º de acordo com as alterações trazidas pela EC n. 11 de 1978 e E/C n. 22 de 1982. 1988 X Art. 53, §§1º, 2º, 3º, 4º e 5º, com redação dada pela EC n. 35 de 2001. Fonte: do autor/2008. § 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001). § 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001). § 4º O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de quarenta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001). § 5º A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001). 61 3.1.3 Conceito de Imunidade Antes de abordar o conceito de Imunidade Parlamentar, torna-se cogente, discorrer sobre o Poder Legislativo e a sua estrutura na organização dos poderes, para se chegar ao estudo conceitual da prerrogativa constitucional. A CRFB/88 dispõe em seu art. 44184, que o Legislativo nacional é exercido pelo Congresso Nacional. Tendo-se adotado a estrutura bicameral, ou seja, formado pela Câmara dos Deputados e o Senado Federal, onde se encontra o ambiente funcional dos Parlamentares, que representam o Poder Legislativo. Na lição de Temer185: O bicameralismo, no particular, atende a forma de Estado Federal positivada pelo constituinte. É que são duas Casas legislativas componentes do Congresso Nacional, órgão que desempenha a função legislativa: a Câmara dos Deputados o Senado Federal. Na primeira se encontram os representantes do povo brasileiro (art. 45); na segunda, os representantes dos Estados e do Distrito Federal (art. 46). Os Parlamentares representam politicamente os interesses da sociedade, por meio do sistema representativo. Exerce o mandato representativo na função legislativa, visto que a produção de leis é uma atividade típica do Poder Legislativo. Assim, para assegurar o exercício político sem óbice, a Constituição outorga aos Legisladores prerrogativas, denominada de Imunidade Parlamentar. 184 O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. 185 TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. p. 125. 62 Nos dizeres de Ciavareli186: [...] Portanto, a denominação que se lhes empresta é precisa, porque tais imunidades visam atender a necessidade da plenitude do Poder Legislativo, exercido através de seus representantes eleitos pelo povo, sem intromissão ou restrição dos outros Poderes da República, consistente na elaboração das leis e fiscalização do Estado – Administração. É no livre desempenho da atividade Parlamentar, resguardando o interesse público que se afigura a Imunidade, no qual é irrenunciável, como bem cita Ferreira Filho187: A necessidade de se assegurar ampla liberdade de ação ao parlamentar para o exercício do mandato inspira-lhe a outorga de certas prerrogativas. Estas são exceções ao regime comum, decorrentes não de seu interesse pessoal (pois se assim fosse seriam privilégios), mas do interesse público no bom exercício do mandato, do que resulta não serem renunciáveis por aqueles que são por elas escudados. A prerrogativa não se destina apenas, assegurar aos congressistas o livre exercício das suas atribuições funcionais, mas salvaguardar a própria independência da instituição legislativa. Esta é a posição de Temer188: Garante-se a atividade do parlamentar para garantir a instituição. Conferem-se a deputados e senadores prerrogativas com objetivo de lhes permitir desempenho livre, de molde a assegurar a independência do Poder que integram. Daí as garantias constitucionais de inviolabilidade no exercício do mandato e imunidade processual. 186 CIAVARELI, Miguel Ângelo Nogueira dos Santos. Imunidade Jurídica: Penais, Processuais, Diplomáticas, Parlamentares. p. 149. 187 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 30 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p 176. 188 TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. p. 129. 63 No mesmo timbre, porém, com enfoque na definição de Imunidade, enfatiza Ciavareli189: As imunidades parlamentares são imunidades do Poder Legislativo, do mandato parlamentar, antes de protegerem a pessoa do mandatário eleitoral, visam resguardar a Instituição Legislativa, um dos Poderes da República ou do Estado de Direito, com intuito de lhe assegurarem a autonomia e independência diante dos outros Poderes do Estado, o Executivo e o Judiciário. Após esclarecer acerca da definição textual do instituto da Imunidade, pode-se conceituá-lo como uma prerrogativa institucional, expresso constitucionalmente, outorgada aos Parlamentares em razão do mandato que exercem, a fim de assegurar o bom desempenho funcional e garantir a independência do Poder Legislativo. Nos termos da CRFB/88, a disciplina constitucional da Imunidade comportam duas espécies, conforme acentua Lenza190: Referidas prerrogativas, como veremos, dividem-se em dois tipos: a) imunidade material, real ou substantiva (também denominada inviolabilidade), implicando a exclusão da prática de crime, bem como a inviolabilidade civil, pelas opiniões, palavras e votos dos parlamentares (art. 53, caput) b) imunidade processual, formal ou adjetiva, trazendo regras sobre prisão e processo criminal dos parlamentares (art. 53, §1º ao 5º, da C.F/88). A Imunidade material e a Imunidade formal serão objeto de exame mais atento e detalhado. 189 CIAVARELI, Miguel Ângelo Nogueira dos Santos. Imunidade Jurídica: penais, processuais, diplomáticas, parlamentares. p. 149. 190 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 10 ed. ver e atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, 2006. p. 252. 64 3.2 IMUNIDADE MATERIAL Prossegue-se adiante, o estudo da primeira modalidade de Imunidade, sob a égide da Carta Magna vigente. 3.2.1 Conceito e finalidade O caput do art. 53, da CRFB/88, trata da Imunidade material, denominada de substancial ou de conteúdo. A prerrogativa protege o Parlamentar das palavras opiniões ou votos proferidos no exercício do seu mandato representativo. Sob o manto protetor da Imunidade material, encontram-se os membros do Congresso Nacional, os Deputados, tanto a nível Estadual quanto Distrital e os Vereadores. Com acuidade, preconiza Kuranaka191: Sob o lume da vigente Constituição Federal, poderíamos assim definir a imunidade material: prerrogativa concedida aos Deputados Federais, Senadores, Deputados Estaduais, Deputados Distritais e Vereadores Municipais, que lhes assegura a plena liberdade de manifestação de opiniões, palavras e votos, tornando-se invioláveis civil e penalmente, visando o pleno exercício e desempenho do mandato parlamentar. [..]. Entretanto, a doutrina comumente denomina a Imunidade material de inviolabilidade, por tratar-se de uma causa de excludente de ilicitude, como salienta Krieger192: Doutrinariamente, tem-se que a inviolabilidade caracteriza-se pela exclusão do cometimento do crime por parte de Deputados e Senadores por suas opiniões, palavras e votos, o que, como já se viu, é a conceituação de imunidade material. 191 192 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. p. 116. KRIEGER, Jorge Roberto. Imunidade Parlamentar. Histórico e evolução do Instituto no Brasil. p. 51. v.1. 65 Observa-se, que a prerrogativa material afasta o crime praticado pelo Parlamentar, tornando inconstitucional qualquer processamento em face de suas manifestações funcionais. Sobre a Imunidade material, discorre Bulos193: É que a imunidade material subtrai a responsabilidade do fato típico, descriminalizando o comportamento, a um primeiro momento, delituoso. Por isso obsta a propositura da ação cível ou penal contra o parlamentar, por motivo de sua atuação. Nesse aspecto, krieger194 justifica que: “[...] Não será aberto processo contra parlamentar porque o direito formal pressupõe expressa regra de direito material” De fato, a não incidência de crimes aos Parlamentares visa preservar justamente o desempenho da atividade Parlamentar, embora, sem direcioná-lo a um benefício próprio, como aponta Bulos195: “A finalidade, portanto, é garantir o pleno exercício da atividade política, mas sem propiciar um injustificável privilégio pessoal”. 3.2.2 Natureza jurídica da inviolabilidade Não é pacífica na doutrina pátria, a questão concernente a natureza jurídica da Imunidade material, gerando controvérsias acerca do tema. Moraes196 expõe amplamente as divergências entre os diversos autores, como se pode observar: Desta forma, Pontes de Miranda (Comentários a Constituição de 1967), Nelson Hungria (Comentários ao Código Penal), e José Afonso da Silva (Curso de Direito Constitucional Positivo) entendem-na como uma causa excludente de crime, Basileu 193 BULOS, Uadi Lammêngo. Constituição Federal Anotada. p. 757. 194 KRIEGER, Jorge Roberto. Imunidade Parlamentar. Histórico e evolução do instituto no Brasil. p. 57. v.1. 195 BULOS, Uadi Lammêngo. Constituição Federal Anotada. p. 756. 196 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 429. 66 Garcia (Instituições de Direito Penal), como causa que se opõe a formação do crime; Damásio de Jesus (Questões Criminais) causa funcional de exclusão ou isenção de pena; Aníbal Bruno (Direito Penal), causa pessoal e funcional de isenção de pena; Heleno Cláudio Fragoso (Lições de Direito Penal) considera-se causa pessoal de exclusão de pena; Magalhães Noronha (Direito Penal) causa de irresponsabilidade; José Frederico Marques (Tratado de Direito Penal), causa de incapacidade penal por razões políticas. De forma mais delineada, Capez197 apresenta a sua posição, perfilhando o ensinamento de Flávio Gomes: Quanto à natureza jurídica do instituto, entendemos, com Luis Flavio Gomes (artigo citado), que a imunidade material exclui a própria tipicidade na medida em que a Constituição não pode dizer ao parlamentar que exerça livremente seu mandato, expressando suas opiniões e votos, e ao mesmo tempo, considerar tais manifestações fatos definidos como crime. Do exposto, analisa-se que o entendimento sobre a natureza jurídica da inviolabilidade não é uníssona, entretanto, pode-se afirmar que, na impossibilidade de imputar condenação à conduta do Parlamentar, por palavras, opiniões e votos, de acordo com o preceito constitucional, é que surge a natureza jurídica da Imunidade material. No entendimento de Bulos198: Disso decorre a natureza jurídica da imunidade material, que assenta , a nosso sentir, sob tríplice aspecto: 1º) como causa excludente da ilicitude da conduta típica. 2º) como causa excludente da própria criminalidade 3º) como simples causa de isenção da pena Em síntese, os Parlamentares não respondem por delitos de palavras ou opiniões, porque assim consagra a Lex Mater. 197 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p 59-60. 198 BULOS, Uadi Lammêngo. Constituição Federal Anotada. p. 756. 67 Sobre abrangência da Imunidade material, apresenta-se o estudo abaixo. 3.2.3 Extensão da Imunidade parlamentar O instituto da Imunidade material recai sobre os atos funcionais dos Parlamentares, ou seja, as palavras, votos ou opiniões proferidas no exercício de suas funções. Como bem destaca Capez199: “Essa inviolabilidade abrange qualquer forma de manifestação, escrita ou falada [...]”. No tocante aos crimes amparados pela inviolabilidade, apregoa Bulos200 que: “[...] um Deputado ou Senador jamais incidirá nos crimes de palavras, isto é, naqueles delitos que, por extensão, recaem nos crimes contra honra, incitamento ou apologia ao fato criminoso, vilipêndio oral, etc”. Com efeito, o Parlamentar fica a salvo dos chamados crimes de opinião, como injúria, difamação e calúnia, excluindo-lhe da incidência do ilícito. Ainda no campo da abrangência da Imunidade, segundo informa Ciavareli201: “Estarão imunes os parlamentares, portanto, em relação aos crimes contra a honra pela imprensa (Lei n. 5250, de 9.2.1967) [...]” Nesse sentido, traz-se à colação o julgado da Suprema Corte 202 : EMENTA: INQUÉRITO. AÇÃO PENAL PRIVADA. QUEIXACRIME OFERECIDA CONTRA DEPUTADO FEDERAL E JORNALISTA. PRETENSAS OFENSAS PRATICADAS PELO PRIMEIRO QUERELADO E PUBLICADAS PELA SEGUNDA QUERELADA EM MATÉRIA JORNALÍSTICA: CRIMES DE 199 CAPEZ. Curso de Direito Processual. p. 59. 200 BULOS, Uadi Lammêngo. Constituição Federal Anotada. p. 756. 201 CIAVARELI, Miguel Ângelo Nogueira dos Santos. Imunidade Jurídica: Penais, Processuais, Diplomáticas, Parlamentares. p.169. 202 BRASÍLIA. Supremo Tribunal Federal. Rejeição do inquérito policial n. 2297. José Aldo Rebelo Figueiredo. Relator: Cármem Lucia. 20 set. 2007. 30 abril 2007. Disponível em: http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=deputado%20federal%20i munidade&base=baseAcordaos. Acesso em 29/04/2008. 68 INJÚRIA E DIFAMAÇÃO (ARTS. 21 E 22 DA LEI DE IMPRENSA). 1. As afirmações tidas como ofensivas pelo Querelante foram feitas no exercício do mandato parlamentar, por ter o Querelado se manifestado na condição de Deputado Federal e de Presidente da Câmara, não sendo possível desvincular aquelas afirmações do exercício da ampla liberdade de expressão, típica da atividade parlamentar (art. 51 da Constituição da República). 2. O art. 53 da Constituição da República dispõe que os Deputados são isentos de enquadramento penal por suas opiniões, palavras e votos, ou seja, têm imunidade material no exercício da função parlamentar. 3. Ausência de indício de animus difamandi ou injuriandi, não sendo possível desvincular a citada publicação do exercício da liberdade de expressão, própria da atividade de comunicação (art. 5º, inc. IX, da Constituição da República). 4. Não-ocorrência dos crimes imputados pelo Querelante. Queixa-crime rejeitada. Insta salientar, o crime cometido por Parlamentar não afasta somente a responsabilidade civil e penal, como igualmente, a responsabilidade administrativa e política. Esta é a posição de Moraes203: [...] importa ressaltar que da conduta do parlamentar (opiniões, palavras e votos) não resultará responsabilidade criminal, quaisquer responsabilização por perdas e danos, nenhuma sanção disciplinar, ficando a atividade do congressista, inclusive resguardada da responsabilidade política, pois trata-se de cláusula de irresponsabilidade geral do Direito Constitucional material. Com a entrada em vigor da EC nº 35/01204, entre outras alterações, estendeu-se a Imunidade material à responsabilidade civil dos parlamentares. Salienta Capez205 que: A partir da emenda constitucional n. 35/2001, ampliou-se a imunidade para que, além de penal, se tornasse civil, o que significa que o parlamentar não pode mais ser processado por perdas e danos materiais e morais em virtude de opiniões, palavras e votos no exercício de suas funções. 203 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 429. 204 A EC nº 35/2001, incluiu na redação do art. 53 e seus parágrafos da CRFB, não só a inviolabilidade civil, como retirou a necessidade da licença prévia para processar o legislador. 205 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Processual. p 59. 69 Desse modo, a prerrogativa material isenta o representante legislativo de qualquer responsabilidade, por perdas e danos decorrentes da sua atuação Parlamentar. Em linhas gerais, implica dizer que as palavras pronunciadas pelos Parlamentares são livres de quaisquer responsabilidades, imunizadas constitucionalmente, no fito de resguardar e proteger o exercício do mandato representativo. Entretanto, para que ocorra aplicação da inviolabilidade, é necessária a presença de certos requisitos a conduta do Parlamentar. Passa-se adiante, uma análise dos pressupostos para aplicação da Imunidade material. 3.2.4 Pressupostos da Imunidade material Como visto, não há ilicitude nas manifestações proferidas por Parlamentares. Temer206 observa que: “Opiniões e palavras que ditas por qualquer pessoa, podem caracterizar atitude delituosa, mas que não se configuram quando pronunciados por parlamentar”. Nesse sentido, para que a conduta do legislador tenha o devido respaldo da Imunidade material, Bulos207 preleciona que: “[...] deve reportar-se aos atos funcionais, ou seja, aqueles praticados por parlamentares em decorrência de sua atividade congressual”. Convém ressaltar que a inviolabilidade material não fica adstrita somente ao ambiente Parlamentar, segundo descreve Lenza208: [...] Assim, mesmo que um parlamentar esteja fora do Congresso Nacional, mas exercendo sua função parlamentar federal, em qualquer lugar do território nacional estará resguardado, não praticando qualquer crime por sua opinião, palavra ou voto. 206 TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. p.129. 207 BULOS, Uadi Lammêngo. Constituição Federal Anotada. p. 758. 208 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. p. 252-253. 70 Assim sendo, para figurar-se a Imunidade material aos legisladores, as manifestações deverão ser pronunciadas no exercício do mandato representativo, e em razão dele, ainda que realizadas fora do âmbito Parlamentar. Em destaque é o julgado do Supremo Tribunal Federal acerca do tema, citado por Moraes209: O Pretório Excelso tem acentuado que a prerrogativa constitucional da imunidade parlamentar em sentido material protege o parlamentar em todas as manifestações que guardem relação com o exercício do mandato, ainda que produzidas fora do recinto da própria Casa Legislativa, ou, com maior razão, quando exteriorizadas no âmbito do Congresso Nacional. Do lado oposto, não é concebível ao legislador, pronunciar palavras ofensivas, que não tenha no mínimo, relação com o ofício congressual, sob pena de não lhe ser assegurado à prerrogativa material. A esse propósito, acentua a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça210: EMENTA - PROCESSO PENAL - CRIMES CONTRA A HONRA TRANCAMENTO DA QUEIXA-CRIME IMUNIDADE PARLAMENTAR - OFENSAS PROFERIDAS FORA DO ÂMBITO DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA - AUSÊNCIA DE RELAÇÃO COM A ATIVIDADE PARLAMENTAR.A imunidade, em sentido material, prevista no art. 53 da CF, não alcança manifestações proferidas com finalidade diversa da função parlamentar. Assim, as ofensas perpetradas fora do âmbito da Assembléia Legislativa e sem qualquer relação com o exercício do mandato, justificam o prosseguimento da ação penal. - Precedentes. Ordem negada. 209 210 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 431. BRASÍLIA. Superior Tribunal de Justiça. Habeas corpus denegado nº 2002/0061141-9. Relator: Jorge Scartezzini. 22 maio 2004. Disponível em http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=assembl%E9ia+legislativa+imunidade+p arlamentar&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=3. Acesso em 29/04/2008. 71 Outrossim, não se vislumbra nenhum resguardo as ofensas pronunciadas em propaganda eleitoral. Nesse aspecto Nucci211 elucida: A imunidade substantiva não abrange a propaganda eleitoral, embora a processual continue atuante. Assim, o parlamentarcandidato, que ofenda o outro, não tem imunidade substantiva, mas somente processual. Do mesmo modo, não se permite o abrigo da Imunidade Parlamentar, nos dizeres de Ciavareli212: [...] quando as ofensas forem dirigidas a própria Casa Parlamentar, juntamente com procedimento que for declarado incompatível com o decoro parlamentar (art. 55, II, da Constituição Federal de 1988), poderá ser punido com a perda do mandato. Vislumbra-se, portanto, perante a doutrina jurídica e de acordo com o posicionamento do STF, a exigência do nexo de causalidade entre as declarações tidas como ofensivas e a prática funcional do Parlamentar. Sem esse liame, não há que prosperar a incidência da Imunidade material. Nesse sentido Nucci213 justificativa que: “[...] a imunidade é um resguardo a democracia em última análise e não um manto protetor de ofensas. [...]”. Significa dizer que o dispositivo constitucional tutela o exercício da atividade legislativa, não os interesses pessoais. Diante do exame de todos os aspectos inerentes à inviolabilidade, prosseguirá o estudo prescrevendo a Imunidade formal. 211 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 7. Ed. rev. e atual. e ampl. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 82. 212 CIAVARELI, Miguel Ângelo Nogueira dos Santos. Imunidade Jurídica: Penais, Processuais, Diplomáticas, Parlamentares.p.167. 213 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. p. 81. 72 3.3 IMUNIDADE FORMAL Com objetivo de aprofundar o tema desejado neste tópico para alcançar a mais ampla compreensão, é relevante examinar a Imunidade formal sob os ditames da EC nº 35 que alterou significamente o art. 53 e parágrafos da Lex Mater, porém, sem deixar de registrar o que dispunha o texto original, como será observado no decorrer da apresentação. 3.3.1 Conceito Conforme o disposto no art. 53, §§1º, 2º, 3º, 4º e 5º da Carta Magna vigente, consagra-se a Imunidade formal. É espécie de prerrogativa constitucional referente ao processo, que estabelece a garantia de foro214 nas infrações penais, além da não prisão do Parlamentar, com a hipótese de sustar o andamento do processo, por delitos praticados depois da sua diplomação. Preconiza Kuranaka215: Diante do novo texto constitucional que recebe a vigente Constituição federal, possível definir a imunidade formal como sendo prerrogativa concedida aos deputados federais, senadores e Deputados Estaduais e Deputados Distritais, visando o pleno exercício e desempenho do mandato, consistente em não poderem ser presos, desde a expedição do diploma, salvo em flagrante inafiançável, bem como, em se tratando de crime ocorrido após a diplomação, na possibilidade de sustação do andamento da ação até a decisão final, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros. Denota-se que a prerrogativa formal confere ao Parlamentar duas Imunidades: uma relacionada à prisão, outra referente ao processo. A Imunidade formal processual sofreu alterações através da EC nº 35/01, modificando o texto original da Carta Magna atual. 214 Sem pretender esgotar o assunto, o §1º do art. 53 da CRFB, faz menção a prerrogativa de foro em razão da função, estabelecendo que os congressistas sejam processados e julgados pelo STF. 215 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. p .176. 73 Como bem cita Moraes216: “A EC nº 35/01, alterando a redação do art. 53 da Constituição Federal, manteve a imunidade formal em relação à prisão e alterou significativamente a imunidade formal processual”. Com a promulgação da EC nº 35/01, permite-se ao STF dar seguimento ao processo contra o Parlamentar, sem necessidade de licença prévia217 exigida no art.218 anterior a reforma. Entretanto, o Pretório Excelso deverá comunicar a respectiva Casa que, por iniciativa do partido nela representado e ao voto da maioria, poderá promover a sustação do processo em questão. Convém ressaltar, não era esse o procedimento previsto no texto original da CRFB/88, como se pode destacar na lição de Capez219: Anteriormente a Emenda Constitucional n. 35/2001, a imunidade processual consistia na exigência de prévia licença da Casa respectiva para processar o parlamentar, ou seja, depois de oferecida a denúncia, o STF encaminhava pedido de licença a Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, conforme o caso, pleiteando autorização para a instauração do processo. Após esclarecer, grosso modo, o tema da Imunidade formal sob o prisma da EC nº 35/2001, e sob a égide do texto constitucional anterior a reforma do art. 53 e seus parágrafos, cuidará a seguir do estudo mais detalhado da Imunidade formal no que tange a prisão e referente ao processo, denominada de relativa ou processual. 216 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 433. 217 “Em relação a licença prévia exigida para a instauração de processo criminal, há de se observar que se tratava de autorização da Casa Legislativa, pelo voto secreto da maioria de seus membros, tanto para que se iniciasse o processo criminal, como para que prosseguisse aquele que já estivesse em curso”. Kuranaka, Jorge. Imunidades Parlamentares. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 148. 218 “[...] extinto § 1º, que possuía o seguinte teor : Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável, nem processados criminalmente, sem licença previa”. BULLOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 5. ed. rev. e atual. até a Emenda Constitucional n. 39/2002. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 762. 219 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 60. 74 3.3.2 Imunidade prisional O § 2º do art. 53 da Constituição vigente refere-se à prisão civil e penal do Parlamentar. Assim, não poderá ser decretada a prisão e sua execução contra o Parlamentar, mesmo as prisões processuais, exceto em caso de flagrante por crime inafiançável. Assevera Capez,220 colacionando decisão do STF: Em crimes afiançáveis, jamais o parlamentar pode ser preso. No que concerne aos crimes inafiançáveis, somente é admissível a prisão em flagrante. Nenhuma outra modalidade de prisão cautelar (temporária, preventiva, decorrente de pronúncia, decorrente de sentença de primeiro grau ou mesmo decorrente de acórdão de segunda instância) ou mesmo de prisão civil (por alimentos) tem incidência (STF, Pleno, Inq. 510-DF, Celso de Mello, DJU de 19.04.91p. 481). Como dito, a prisão do Parlamentar ocorre somente nas hipóteses de prisão em flagrante por crime inafiançável221. Neste caso, será comunicada a Casa a que pertença o Parlamentar no prazo de 24h, que poderá decidir sua prisão pela maioria dos votos de seus membros. Em detalhes, ensina Moraes222: Excepcionalmente, porém, o congressista poderá ser preso, no caso de flagrante por crime inafiançável. Nesta hipótese, a manutenção da prisão dependerá de autorização da Casa respectiva para formação da culpa, pelo voto ostensivo e nominal da maioria de seus membros (art. 53, § 2º, CF). 220 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 62. 221 “São crimes inafiançáveis os previstos no art. 323 do Código de Processo Penal, além do racismo, tortura, trafico ilícito de entorpecentes, terrorismo, crimes hediondos e ações de grupos armados contra a ordem Constitucional e o Estado Democrático de Direito.” Nucci, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 7º ed. rev. e atual. ampl. 2 tir. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2007. p. 83. 222 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 434. 75 Urge ressaltar, a reforma trazida pela EC n º35/01 revogou a votação secreta, que decidia sobre a prisão do Parlamentar prevista na ordem constitucional pregressa. Nos dizeres de Kuranaka223: [...] através da Emenda Constitucional, deixa de ser secreto o voto através do qual a maioria dos membros da Casa haverá de resolver quanto à prisão do parlamentar, em caso de flagrante de crime inafiançável. Segundo o disposto no texto constitucional, a garantia contra a prisão passa a vigorar a partir da expedição do diploma e não da sua posse, como Esclarece Bulos224: “O termo inicial (a quo) da imunidade começa a contar da data da diplomação. Nada tem a ver com a posse. É que a diplomação pressupõe que o parlamentar encontra-se validamente eleito [...]”. Sobre o termo ad quem (termo final) atenta Kuranaka225: “O parlamentar está protegido de sofrer prisão, salvo em caso de flagrante de crime inafiançável, desde a expedição do diploma, até o inicio da próxima legislatura”. Após examinar a Imunidade formal prisional, a seguir serão destacados aspectos da Imunidade formal processual. 3.3.3 Imunidade formal processual As alterações mais significativas trazidas pela EC nº 35/01 ocorreram no comando da prerrogativa formal processual. Entre elas, encontra-se a revogação de licença prévia da Câmara ou do Senado para a instauração ou continuação de processos criminais contra Parlamentares. Outra alteração referese sobre a possibilidade da sustação do processo, como se pode notar no estudo a seguir: 223 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. p .183. 224 BULOS, Uadi Lammêngo. Constituição Federal Anotada. p. 763. 225 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. p .181. 76 A Imunidade processual propriamente dita encontra-se expressa no texto atual do § 3º, do art. 53, da CRFB/88. Segundo o disposto neste artigo, permite a Casa Legislativa a quem pertença o Parlamentar processado, sustar o devido processo por delitos cometidos após a sua diplomação. Nesse contexto, pontifica Moraes226: A imunidade processual parlamentar refere-se, a partir da EC nº 35/01, à possibilidade da Casa Legislativa respectiva sustar, a qualquer momento antes da decisão final do Poder Judiciário, o andamento da ação penal proposta contra parlamentar por crimes praticados após a diplomação. A Imunidade processual formal começa a operar a partir do recebimento da denúncia pelo STF, comunicando posteriormente a respectiva Casa, que assim sendo, determinará a sustação do processo. Ainda na lição de Moraes227: O procedimento para eventual aplicação da imunidade formal processual, todavia, iniciar-se-á com o recebimento da denuncia ou queixa crime pelo Supremo Tribunal Federal, que deverá dar ciência a Casa legislativa respectiva, para análise de eventual sustação do andamento da ação penal. Imperioso realçar a sustação do processo judicial, a qual alude a CRFB/88 nos processos criminais e não civis. Logo, para que ocorra a sustação do processo, são necessárias certas condicionantes, como aponta Kuranaka228: Para tanto, necessário que estejam presentes três condições essenciais: a ) trata-se de crime que tenha ocorrido após a diplomação; b) conte o procedimento sustatório com a iniciativa de 226 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 435. 227 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 437. 228 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. p. 185. 77 partido político nela representado e, c) tenha o voto da maioria dos membros da Casa a que pertença o parlamentar processado. Sobre o termo ad quem e o termo ad quo da Imunidade formal processual, afirma Nucci229: “[...] Inicia-se a imunidade a partir da expedição do diploma e segue até o termino do mandato. [...]”. Concernente ao pedido de sustação do processo crime, o § 4º, do art. 53, da Carta Política de 1988, contemplada na EC 35/01, prevê de que forma se dá o procedimento, conforme o entendimento de Pimentel230: O pedido de sustação, apresentado por partido político com bancada na Casa a que pertença o réu, deverá ser apreciado pelo Plenário, necessariamente, em quarenta e cinco dias contados do seu recebimento. A apresentação do pedido poderá ocorrer a qualquer tempo, enquanto o processo penal estiver em andamento no STF. Insta salientar, pelo exposto acima, que o prazo estipulado de quarenta e cinco dias para ser apreciado pelo Plenário é improrrogável. Por força do § 5º, do art. 53, da Lei Fundamental em vigor, opera-se a suspensão da prescrição quando sustar o andamento do processo em face do Parlamentar. Retoma-se a contagem da prescrição ao final do mandato. Apregoa Moraes231, comungando o entendimento da jurisprudência do STF acerca do tema: [...] havendo possibilidade de sustação da ação penal perante o Supremo Tribunal, o texto constitucional, com finalidade de evitar impunidade, determina que a prescrição ficará suspensa enquanto durar o mandato. É possível afirmar que tanto a sustação do processo, como a suspensão da prescrição, tem caráter temporário. Perdura-se a Imunidade formal 229 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. p. 82. 230 PIMENTEL, Ernani...[ET AL.]. Câmara dos Deputados: técnico legislativo: atribuição assistente administrativo. Brasília: Vestcon, 2007. p. 129. 231 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. p. 439-440. 78 processual até o fim do mandato. Após isso, dá-se andamento a ação penal e a prescrição volta a correr. Nesse sentido, assevera Pimentel232 que: “Findo o mandato, por fim do prazo, por renúncia ou por cassação, o processo volta a correr normalmente, perante o juiz ou tribunal competente, e igualmente o prazo prescricional [...]”. Nota-se, após exame das duas modalidades de prerrogativas formais, que a Imunidade processual é bem ampla, mesmo a EC nº 53/01 limitando a sua aplicabilidade. As alterações abordadas no presente trabalho, por força da EC foram significativas, em uma tentativa de o legislador evitar a impunidade por crimes praticados durante o exercício do mandato representativo, sob a guarida das prerrogativas processuais. Serão examinadas no próximo subtítulo, como se apresentam as prerrogativas em nível Federal, Estadual e Municipal, com ênfase nos dois últimos entes federativos. 3.4 IMUNIDADES PARLAMENTARES EM NÍVEL FEDERAL, ESTADUAL E MUNICIPAL O art. 2º233, da Carta Magna atual estabelece que os Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo são independentes entre si. Portanto, a CRFB/88 atribuiu aos Deputados e Senadores prerrogativas materiais e formais, como forma de garantir a independência do Legislativo frente aos outros poderes. 232 PIMENTEL, Ernani...[ET AL.]. Câmara dos Deputados: técnico legislativo: atribuição assistente administrativo. p. 129 233 São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. 79 O Poder Legislativo pelo principio federativo, é exercido por todos os entes federados, conforme ensinamento de Kuranaka234: Em decorrência do princípio federativo, atribui-se também aos Estados-Membros, ao Distrito Federal e ao Município, em razão da tríplice capacidade, competência legislativa também a esses níveis, a serem exercidos através de representantes para tanto eleitos. Tais representantes, Deputados Estaduais, Distritais e Vereadores, contam com a proteção do instituto da imunidade. [...]. Veja-se como se procede às Imunidades Parlamentares nos três níveis: 3.4.1 Nível Federal Como se pode concluir na abordagem das prerrogativas e nos termos da novel redação do art. 53 e parágrafos seguintes da Lei Fundamental, os Membros do Congresso Nacional (Deputados e Senadores) gozam tanto de Imunidade material como formal. 3.4.2 Estadual Por força do § 1º235, do art. 27, da CRFB/88, garante-se o dispositivo constitucional aos Deputados Estaduais, assegurando-lhes a Imunidade material e formal no exercício do mandato legislativo. Perfilhando o disposto no texto constitucional, preconiza Pimentel236: [...] A inviolabilidade protegerá contra processos baseados em suas opiniões, palavras e votos (art. 53 caput). A imunidade protegerá contra prisão criminal ou civil e processo criminal, na forma do art. 53, parágrafos, [...]. 234 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. p. 221. 235 Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando- sê-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas. 236 PIMENTEL, Ernani...[ET AL.]. Câmara dos Deputados: técnico legislativo: atribuição assistente administrativo. p. 82. 80 Verifica-se, portanto, que o texto constitucional de 1988, atribuiu aos Deputados Estaduais as mesmas Imunidades previstas aos congressistas. 3.4.3 Nível Municipal A CRFB/88 restringiu a aplicabilidade da Imunidade Parlamentar ao Legislativo Municipal. De forma expressa, o art. 29, inc. VIII237, da Carta Magna vigente, consagrou a inviolabilidade aos Vereadores, porém, segundo indica Nucci238 “[...] Eles não tem imunidade processual, nem foro privilegiado [...]”. Posteriormente, o texto constitucional reservou a prerrogativa material nos limites do território do Município. Com acuidade, Kuranaka239 apresenta o posicionamento da jurisprudência sobre o tema: Desde que no exercício do mandato e na circunscrição do seu município, pela nova Constituição, é o vereador totalmente inviolável por suas opiniões, palavras e votos, mesmo que de suas expressões se infira a prática de crime contra a honra. Trata-se de inovação da atual Carta Magna, cuja virtude e vigência prescindem de regulamentação local, sendo aplicável pela Justiça, de ofício, em qualquer instância, para, reconhecendo-se razão de extinção de punibilidade, trancar-se ação penal ou obstar-se sua eventual instauração. Convém demonstrar, que a Imunidade civil estende-se ao Vereador, demonstrado assim, pelos dizeres de Pimentel240: “Os vereadores são penal e civilmente imunes por suas opiniões, palavras e votos [...]”. 237 Inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município. 238 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. p. 82. 239 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares, p . 228. 240 PIMENTEL, Ernani...[ET AL.]. Câmara dos Deputados: técnico legislativo: atribuição assistente administrativo. p. 86. 81 Dessa forma, a CRFB/88 deu tratamento diferenciado ao Vereador, excluindo a Imunidade formal e limitando o alcance da inviolabilidade apenas a circunscrição do Município em que atua. Após o estudo sobre as prerrogativas constitucionais, abordando todos os seus aspectos, sem para tanto, esgotar o assunto em apreço, prescrevem-se a seguir comentários sobre a vigência da EC nº 35/01 que modificou os aspectos do instituto da Imunidade Parlamentar, com base nas informações contidas no presente trabalho monográfico. 3.5 CONSIDERAÇÃO SOBRE A EMENDA CONSTITUCIONAL N. 35/01 Em 20 de dezembro de 2001, entrou em vigor a EC nº 35, que alterou o texto original da CRFB/88 referente às Imunidades Parlamentares. Com intuito de limitar a incidência da garantia constitucional, a EC n. 35/01 inovou, no tocante a Imunidade processual, quando revogou a licença prévia antes prevista no texto constitucional anterior a emenda, permitindo ao STF dar prosseguimento à ação penal contra Parlamentar, independente da autorização da Casa Legislativa. Contudo, possibilitou ao Parlamento, posteriormente, por iniciativa do Partido Político, sustar o devido processo. Outra novidade na nova redação do texto constitucional de 1988 foi à estipulação de prazo improrrogável de quarenta e cinco dias, para que o pedido de sustação seja apreciado pela Câmara respectiva. Esse procedimento não era contemplado na redação original da CRFB/88. No regime anterior, para se processar criminalmente um Deputado ou Senador, pelo cometimento de uma infração penal, dependeria de prévia autorização da Casa Legislativa. Desse modo, não é difícil concluir, a rejeição das inúmeras licenças requeridas pelo STF, pelo corporativismo de outros Parlamentares, 82 descambando para a irresponsabilidade e conseqüentemente desprestigiando os próprios representantes do Poder Legislativo. Kuranaka241, citando artigo da folha de São Paulo, demonstra a extensão da impunidade: Segundo o levantamento apresentado em artigo de jornal, entre 1991 e 1999, a Câmara dos Deputados teria recebido 151 pedidos de licença prévia do Supremo Tribunal Federal, tendo, entretanto, concedido apenas duas autorizações: uma em 1991, quanto ao Deputado Jabes Rabelo, e outra em 1997, sobre o ex-Deputado Davi Alves da Silva. Dos restantes 149 pedidos, 62 casos tiveram a licença negada e 87 pedidos não foram analisados antes de os congressistas deixarem de exercer o mandato. Nota-se, que a prerrogativa processual criava um verdadeiro óbice à penalização do Parlamentar. Diante da realidade política, restaram evidenciado os abusos cometidos pelo uso irregular do instituto da Imunidade, gerando verdadeira impunidade. Assim, o Poder Constituinte Derivado Reformador, através do regime democrático vigorante no Brasil, optou em modificar o dispositivo constitucional para restringir à Imunidade Parlamentar, em particular, a Imunidade processual. Seguindo o disposto no texto da EC nº 35/01, vislumbra-se que o controle legislativo antes da reforma era anterior, com a exigência de licença prévia, passou a ser posterior, facultando sustar ou não o andamento da ação penal. Observa-se, portanto, com objetivo de dar credibilidade a instituições representativas e evitar o acobertamento da imunidade por atos infracionais praticados por Parlamentares após a diplomação, as alterações provenientes da EC nº 35/01 foram significativas, necessárias e inovadoras. 241 KURANAKA, Jorge. Imunidades Parlamentares. p. 166. 83 CONSIDERAÇÕES FINAIS Para a produção da pesquisa, necessário se fez estudar no primeiro capítulo, o Estado Democrático de Direito, observando várias hipóteses justificadoras do surgimento da sociedade política. Porém, melhor compreensão histórica da sociedade política encontra-se no seu aspecto evolutivo. Desde a antiguidade até os tempos atuais, os Estados adequaram a sua organização política a realidade vivenciada em cada época. Desse modo, contemporaneamente formou-se o Estado Democrático de Direito, sob os levantes da submissão do Estado a vontade popular, legitimando o poder por intermédio de um regime político de representação. No Brasil, excetuando a Constituição de 1824, as Constituições seguintes incluíram em seu texto o regime democrático, ainda que, sob um prisma eminentemente formal. No segundo capítulo, tem-se o estudo da Democracia. Sua expressão primitiva de governo do povo pelo próprio povo tornou-se impraticável nos tempos atuais, alternando para um regime representativo. Este modelo democrático permitiu ao povo, detentor do poder, escolher seus representantes, que exercem em seu nome o poder político. Como visto, a atualidade contemporânea soube adequar o exercício político perante a nova realidade política. Nesse contexto, surgiram os Partidos Políticos, representando interesses da sociedade frente ao governo. No terceiro capitulo, após estudo do Estado Democrático de Direito e das Democracias, apresentou-se a Imunidade Parlamentar. Como representantes do povo, por meio da representação política, observou-se que lhe são assegurado certas prerrogativas constitucionais no livre exercício da função legislativa, a fim de resguardar o regime democrático. Para tanto, a CRFB/88 deu aos legisladores, um rol de garantias institucionais. Segundo o texto constitucional, estão previstos a Imunidade material e formal, esta em relação a não prisão, tampouco no processamento de ação penal do parlamentar, por crimes praticados após a sua diplomação. 84 Após a pesquisa, demonstrou-se refutável a hipótese de incidência. É verdade que todas as Constituições Brasileiras previam o instituto da Imunidade Parlamentar. Nesse sentido, observou-se desde a Carta Imperial de 1824, passando pela primeira Constituição da República de 1891, e ulteriormente as de 1934, 1937, 1946, além da Constituição Federal de 1967, em plena vigência do regime militar, com a EC n. 1/69, e por último a CRFB/88, a contemplação constitucional das prerrogativas materiais e formais. Posterior à análise dos aspectos jurídicos positivos sobre a Imunidade, forçosa a conclusão de que torna-se imperioso inscrever o Parlamentar nas garantias constitucionais taxativas, para bem salvaguardar a representação política e garantir a independência do Poder Legislativo. Infelizmente, coube ao próprio legislador desvirtuar o instituto da Imunidade, conduzindo ao resultado oposto do pretendido pelo Ordenamento Jurídico Brasileiro. Evidenciou na prática legislativa, a falta de ética e compromisso na função pública, que culminou na impunidade. Foi justamente a Imunidade processual, o pivô das impunidades. No fito de restringir a prerrogativa formal e consequentemente evitar a impunidade, proclamou a EC nº 35/01. Com efeito, limitou a extensão do dispositivo constitucional, e permitiu ao STF dar andamento ao processo penal sem a necessidade do pedido de licença prévia a Casa respectiva. Em outras palavras, buscou-se efetivamente moralizar o Poder Legislativo, visando a recuperação do prestígio político, em resposta as críticas existentes acerca do instituto da Imunidade. Como já mencionado, a Imunidade Parlamentar é primordial em um ambiente democrático como o Brasil. De todo exposto, observou-se que efetivamente ocorreu a inscrição das prerrogativas em todas as Constituições Brasileiras, todavia, em relação à extensão do instituto da Imunidade, este permaneceu inconstante ao longo dos tempos. 85 ANEXO Abaixo, segue as Constituições existentes dentro do Ordenamento Jurídico Brasileiro que serviram como base de pesquisa, para demonstrar a previsão do regime democrático nos textos constitucionais. Imperioso ressaltar, excetuando a Carta Imperial de 1824, que todas as constituições seguintes descrevem o regime democrático já em seus primeiro artigos. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUICÃO POLITICA DO IMPERIO DO BRAZIL (DE 25 DE MARÇO DE 1824) EM NOME DA SANTISSIMA TRINDADE. TITULO 1º Do Império do Brazil, seu Território, Governo, Dynastia, e Religião. Art. 1. O IMPERIO do Brazil é a associação Politica de todos os Cidadãos Brazileiros. Elles formam uma Nação livre, e independente, que não admitte com qualquer outra laço algum de união, ou federação, que se opponha á sua Independencia. Art. 2. O seu territorio é dividido em Provincias na fórma em que actualmente se acha, as quaes poderão ser subdivididas, como pedir o bem do Estado. Art. 3. O seu Governo é Monarchico Hereditario, Constitucional, e Representativo. Art. 4. A Dynastia Imperante é a do Senhor Dom Pedro I actual Imperador, e Defensor Perpetuo do Brazil. Art. 5. A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo. 86 Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL ( DE 24 DE FEVEREIRO DE 1891) Nós, os representantes do povo brasileiro, reunidos em Congresso Constituinte, para organizar um regime livre e democrático, estabelecemos, decretamos e promulgamos a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPúBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL TíTULO I Da Organização Federal DISPOSIçõES PRELIMINARES Art 1º - A Nação brasileira adota como forma de Governo, sob o regime representativo, a República Federativa, proclamada a 15 de novembro de 1889, e constitui-se, por união perpétua e indissolúvel das suas antigas Províncias, em Estados Unidos do Brasil. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 16 DE JULHO DE 1934) Nós, os representantes do povo brasileiro, pondo a nossa confiança em Deus, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para organizar um regime democrático, que assegure à Nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bemestar social e econômico, decretamos e promulgamos a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPúBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL TÍTULO I Da Organização Federal CAPÍTULO I Disposições Preliminares 87 Art 1º - A Nação brasileira, constituída pela união perpétua e indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios em Estados Unidos do Brasil, mantém como forma de Governo, sob o regime representativo, a República federativa proclamada em 15 de novembro de 1889. Art 2º - Todos os poderes emanam do povo e em nome dele são exercidos. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 16 DE JULHO DE 1934) Nós, os representantes do povo brasileiro, pondo a nossa confiança em Deus, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para organizar um regime democrático, que assegure à Nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bem-estar social e econômico, decretamos e promulgamos a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPúBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL TÍTULO I Da Organização Federal CAPÍTULO I Disposições Preliminares Art 1º - A Nação brasileira, constituída pela união perpétua e indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios em Estados Unidos do Brasil, mantém como forma de Governo, sob o regime representativo, a República federativa proclamada em 15 de novembro de 1889. Art 2º - Todos os poderes emanam do povo e em nome dele são exercidos. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 10 DE NOVEMBRO DE 1937) O PRESIDENTE DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL , ATENDENDO às legitimas aspirações do povo brasileiro à paz política e social, profundamente perturbada por conhecidos fatores de desordem, resultantes da crescente a gravação dos dissídios partidários, que, uma, notória propaganda demagógica procura desnaturar em luta de classes, e da 88 extremação, de conflitos ideológicos, tendentes, pelo seu desenvolvimento natural, resolver-se em termos de violência, colocando a Nação sob a funesta iminência da guerra civil; ATENDENDO ao estado de apreensão criado no País pela infiltração comunista, que se torna dia a dia mais extensa e mais profunda, exigindo remédios, de caráter radical e permanente; ATENDENDO a que, sob as instituições anteriores, não dispunha, o Estado de meios normais de preservação e de defesa da paz, da segurança e do bemestar do povo; Sem o apoio das forças armadas e cedendo às inspirações da opinião nacional, umas e outras justificadamente apreensivas diante dos perigos que ameaçam a nossa unidade e da rapidez com que se vem processando a decomposição das nossas instituições civis e políticas; Resolve assegurar à Nação a sua unidade, o respeito à sua honra e à sua independência, e ao povo brasileiro, sob um regime de paz política e social, as condições necessárias à sua segurança, ao seu bem-estar e à sua prosperidade, decretando a seguinte Constituição, que se cumprirá desde hoje em todo o Pais: CONSTITUIÇãO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL DA ORGANIZAçãO NACIONAL Art 1º - O Brasil é uma República. O poder político emana do povo e é exercido em nome dele e no interesse do seu bem-estar, da sua honra, da sua independência e da sua prosperidade. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 18 DE SETEMBRO DE 1946) A Mesa da Assembléia Constituinte promulga a Constituição dos Estados Unidos do Brasil e o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, nos termos dos seus arts. 218 e 36, respectivamente, e manda a todas as autoridades, às quais couber o conhecimento e a execução desses atos, que os executem e façam executar e observar fiel e inteiramente como neles se contêm. Publique-se e cumpra-se em todo o território nacional. Rio de Janeiro, 18 de setembro de 1946; 125º da Independência e 58º da República. FERNANDO DE MELLO VIANNA Presidente 89 Georgino Avelino 1º Secretário Lauro Lopes 2º Secretário Lauro Montenegro 3º Secretário Ruy Almeida 4º Secretário. Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 19.9.1946 e Repúblicado no D.O.U. de 25.9.1946 Nós, os representantes do povo brasileiro, reunidos, sob a proteção de Deus, em Assembléia Constituinte para organizar um regime democrático, decretamos e promulgamos a seguinte CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL TÍTULO I Da Organização Federal CAPÍTULO I Disposições Preliminares Art 1º - Os Estados Unidos do Brasil mantêm, sob o regime representativo, a Federação e a República. Todo poder emana do povo e em seu nome será exercido. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1967 Atos Complementares Atos Institucionais Vide: ACP nº 38, de 1868 ACP nº 39, de 1868 AIT nº 8, de 1968 AIT nº 10, de 1968 AIT nº 11, de 1968 AIT nº 12, de 1968 AIT nº 13, de 1968 AIT nº 15, de 1968 AIT nº 16, de 1968 1968 EMC 1, de 1969 AIT nº 17, de 90 O Congresso Nacional, invocando a proteção de Deus, decreta e promulga a seguinte CONSTITUIÇÃO DO BRASIL TÍTULO I Da Organização Nacional CAPÍTULO I Disposições Preliminares Art 1º - O Brasil é uma República Federativa, constituída sob o regime representativo, pela união indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. § 1º - Todo poder emana do povo e em seu nome é exercido. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 1, DE 17 DE OUTUBRO DE 1969 Vide: EMC nº 2. de 1972 Vide EMC nº 12. de 1978 ACP nº 103 Vide ACP nº 102 Vide OS MINISTROS DA MARINHA DE GUERRA, DO EXÉRCITO E DA AERONÁUTICA MILITAR, usando das atribuições que lhes confere o artigo 3º do Ato Institucional nº 16, de 14 de outubro de 1969, combinado com o § 1º do artigo 2º do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, e CONSIDERANDO que, nos têrmos do Ato Complementar nº 38, de 13 de dezembro de 1968, foi decretado, a partir dessa data, o recesso do Congresso Nacional; CONSIDERANDO que, decretado o recesso parlamentar, o Poder Executivo Federal fica autorizado a legislar sôbre tôdas as matérias, conforme o disposto no § 1º do artigo 2º do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968; CONSIDERANDO que a elaboração de emendas a Constituição, compreendida no processo legislativo (artigo 49, I), está na atribuição do Poder Executivo Federal; PROMULGAM a seguinte Emenda à Constituição de 24 de janeiro de 1967: Art. 1º A Constituição de 24 de janeiro de 1967 passa a vigorar com a seguinte redação: "O Congresso Nacional, invocando a proteção de Deus, decreta e promulga a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL Atos Complementares Emendas Constitucionais 91 TÍTULO I DA ORGANIZAÇÃO NACIONAL CAPÍTULO I Disposições Preliminares Art. 1º O Brasil é uma República Federativa, constituída, sob o regime representativo, pela união indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. § 1º Todo o poder emana do povo e em seu nome é exercido. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 Emendas Constitucionais Emendas Constitucionais de Revisão Ato das Disposições Constitucionais Transitórias ÍNDICE TEMÁTICO Vide texto compilado PREÂMBULO Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. TÍTULO I Dos Princípios Fundamentais Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: 92 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Riddel, 2007. 1742 p. AZAMBUJA, Darcy. Introdução à Ciência Política. 17 ed. São Paulo: Globo, 2005. 345 p. AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. 44. ed. São Paulo: Globo, 2005. 397p. ACQUAVIVA, Marcos Claudio. Teoria geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 1994. 335 p. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. 4 ed. São Paulo: Saraiva. 1999. 280 p. BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 3 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1995. 379 p. BOTELHO, Alexandre. Curso de Ciência Política. Florianópolis, SC: Obra Jurídica, 2005. 336p. BULOS, Uadi Lammêgo, Constituição Federal Anotada. 5. 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