A teoria da atividade modificada pela tecnologia da informação

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A teoria da atividade modificada pela tecnologia
da informação1
Oleg K. Tikhomirov2
Márcio Alexandre Siqueira3
Introdução
O progresso na área de informática e tecnologia da informação tem influenciado
fortemente a psicologia teórica, da mesma forma que o conhecimento psicológico é cada vez
mais utilizado para apoiar os processos de aplicação e desenvolvimento de tecnologia da
informação.
Neste artigo, discuto essas tendências mutuamente dependentes do ponto de vista da
teoria psicológica da atividade. Focarei em problemas e perspectivas da criatividade e
atividade criadora em condições de rápido desenvolvimento e implementação pervasiva4 da
tecnologia da informação nas diferentes esferas da atividade humana.
A delegação de funções humanas aos computadores apresenta à teoria da atividade
novos paradigmas: Qual é a natureza da atividade desenvolvida pelos seres humanos no
contexto da informatização avançada? Como muda a atividade humana quando os seres
humanos usam computadores?
A ciência da computação usa constantemente as noções de rotina e criação. Focar a
criatividade revela uma grande lacuna entre os estudos psicológicos de atividade e estudos
psicológicos de criatividade. As teorias da atividade e as teorias da criatividade foram
desenvolvidas como domínios separados de investigação. Nós testemunhamos tanto a
tendência de negação da teoria da atividade pela teoria da criatividade quando a tendência de
negação da teoria da criatividade pela teoria da atividade. Afirma-se que dentre as tendências
mais importantes no desenvolvimento da psicologia da criatividade na Rússia são a
1
Este artigo foi publicado em: ENGERSTRÖM, Y, Miettinen, R., Punamäki, R. (Eds.). Perspectives on Activity
Theory. Cambridge: Cambridge University Press. pp. 347 – 359, 1999.
2
Oleg Konstantinovich Tikhomirov (1933-2000). Psicólogo russo, professor, chefe do Departamento de
Psicologia Geral da Universidade Estatal de Moscovo (desde 1990). Área de interesse científico: problemas de
metodologia psicológica (sujeito e estrutura da ciência psicológica; principais conceitos psicológicos e
princípios; abordagem sistemática em Psicologia; conexões entre Psicologia, Informática e Filosofia, correlação
entre a inteligência humana ea artificial). Em particular, formulou a teoria semântica do pensamento, propôs a
teoria da atividade criativa humana, identificados e pesquisados específicos mecanismos humanos de resolução
de problemas de gestão e as formas de reflexão de situações problemáticas. Principais publicações: "Psicologia
do Pensamento", 1984, "Pesquisa Psicológica da atividade criativa" (em colab.), 1975, "Psicologia da
informatização", de 1988. [N. T.: Nota do Tradutor].
3
Tradutor do artigo e estudante do Programa de Pós Graduação em Ciências e Educação Matemática da
Universidade Federal do Paraná, é graduado em Matemática (Lic.) pela mesma universidade.
4
A computação pervasiva (pervasive computing) é uma área recente de pesquisa, considerada “o novo
paradigma do século XXI”. Visa fornecer uma computação onde se deseja, quando se deseja, do que se deseja e
como se deseja, através da virtualização de informações, serviços e aplicações. Este ambiente computacional
consiste de uma grande variedade de dispositivos de diversos tipos, móveis ou fixos, aplicações e serviços
interconectados.
([N.
T.]
Consultado
em
26/12/2012
em:
http://www.rnp.br/pd/gts20042005/grade_pervasiva.html).
"substituição progressiva do princípio da atividade pelo princípio da interação e a substituição
do conceito de atividade pelo conceito de sistemas" (LOMOV & ANZYFEROVA, 1989, p.
28).
Mas essas contraposições estão bem fundamentadas? Na minha opinião, não estão.
Tornar absoluta a noção geral do sistema científico para a psicologia teórica, normalmente
significa ignorar o estudo de características sistêmicas específicas e concretas do
funcionamento psicológico humano. L. S. Vygotsky já há muito tempo, introduziu a noção de
sistema psicológico (TIKHOMIROV, 1989), defendendo a necessidade de distinguir entre
sistemas qualitativamente diferentes.
Falar hoje do conceito de sistemas sem diferenciar os sistemas de acordo com seus
tipos significa voltar ao período anterior aos estudos de Vygotsky. Infelizmente, às vezes
vemos isso acontecer na psicologia atual, incluindo a psicologia da criatividade. O conceito de
atividade na psicologia é um conceito sistêmico, tendo-se a atividade considerada como um
sistema (LEONTIEV, 1975). Podemos comparar (ou mesmo contrapor) diferentes tipos de
conceitos sistêmicos em psicologia, porém apresentar o conceito de sistemas e o conceito de
atividade como opostos é injustificável. Isto também se aplica a contraposição das categorias
de atividade e interação e de atividade e comunicação, pois é através da atividade que os seres
humanos interagem com o mundo circundante. A comunicação é um aspecto integral da
atividade em grupo; e sob certas condições, a comunicação torna-se atividade em si e por si
(necessidade de comunicação, objetivos de comunicação, etc.)
As categorias de atividade e processo são também utilizadas como substitutos para a
categoria de atividade. No entanto, não é difícil perceber que a atividade é um tipo específico
de atividade humana e que essa atividade tem as características de processo. Isto significa que
o conceito de processo é um aspecto da análise da atividade, em vez de uma alternativa para a
atividade.
Agora vejamos a tendência oposta - a de negar pela Teoria da atividade os problemas
de estudar a criatividade. Aqui devemos considerar a noção de conteúdo da teoria da
atividade. Esta noção inclui ideias sobre a estrutura da atividade, seus tipos, sua dinâmica e
desenvolvimento, suas funções e seus mecanismos de realização. A Teoria da atividade
contém afirmações sobre a relação entre a atividade e seu propósito e entre atividade e
consciência, incluindo também noções sobre as funções da teoria da atividade, as formas com
que se desenvolveu, e sua relação com outras teorias psicológicas. Noções gerais sobre a
atividade foram especificadas pela psicologia através da diferenciação dos seus tipos: prática
e teórica, externo e interno, orientativa e performática, individual e coletiva. A atividade
criativa5 como um tipo de atividade independente não é normalmente estudada.
Nas discussões sobre a estrutura geral da atividade, os componentes desta estrutura são
geralmente tratados como estabelecidos, não como gerados e produzidos. Segundo Leont'ev, a
atividade é "uma unidade de vida processada pela reflexão psíquica, cuja verdadeira função é
a de orientar o sujeito no mundo dos objetos" (LEONTIEV, 1975, p. 82). No entanto, ambas
reflexão e orientação podem existir sem a incidência de fenômenos distintos de criatividade.
As inconsistências no desenvolvimento do conceito de atividade, demonstrados como
uma redução da atividade a ações e pela negligência da complexidade da regulação
motivacional e emocional de atividade, da regulação de significados e objetivos, também
contribui para a negação dos problemas de criatividade. Esta situação não apenas limita (a
esfera da aplicabilidade da teoria da atividade em psicologia), mas também dificulta a solução
5
N. T. Tomaremos como sinônimos a Atividade criativa e a Atividade criadora.
de novos problemas - problemas que aparecem na teoria e na prática do uso de tecnologia da
informação.
Teoria da atividade criativa
Vejo a resolução do problema em uma diferenciação entre as atividades criadoras e de
rotina como tipos relativamente independentes de atividades. Ambas as atividades, prática e
teórica, podem ser de rotina ou criadora, no contexto do amplo uso da tecnologia da
informação, a atividade intelectual, a atividade com conhecimento, é de primordial
importância.
A teoria da função orientativa da psiquê, a compreensão da psiquê como atividade
orientadora e investigativa, avança a um novo patamar, incluindo ações com bases de
orientação completas e incompletas; no entanto, a supervalorização das orientações completas
dificultam o entendimento do caráter original da atividade criadora. Estudos teóricos e
experimentais indicam que na solução de problemas suficientemente complexos, a orientação
completa é impossível, ou seja, a única forma possível de resolver estes problemas é o de
atuar com orientações incompletas. O estudo psicológico de orientação deve incluir não
apenas a questão de sua completitude, mas também o caráter estereotipado ou nãoestereotipado da orientação (ver, por exemplo, KALOSHINA, 1985).
É necessário diferenciar os tipos de reflexão psíquica, entre os processos ligados ao
existente e aqueles ligados ao possível. Esse último processo que são específicos para atos
criadores. De acordo com Leontiev, a orientação ao objeto é uma característica constituinte da
atividade. O objeto da atividade aparece primariamente na sua existência independente, como
subjugador e transformador da atividade do sujeito, e secundariamente como imagem do
objeto ou de um produto da reflexão psíquica das propriedades do objeto, o que só pode ser
realizado como um resultado da atividade do sujeito. Na atividade criativa, o objeto aparece
em duas outras formas: como um novo produto da atividade, um produto que não existia
antes, e como uma imagem de um objeto ainda a ser criado. Considerando que na atividade
não-criativa as funções de comparação, reprodução, assimilação, e cópia são de primordial
importância, na atividade criadora as funções de construção, criação, e produção do novo são
as mais importantes. Dessa forma a subjetividade é transformada em objetividade. É
necessário então distinguir entre dois tipos de produtividade da atividade - a repetitiva criação
de produtos estereotipados e a criação de novos e originais.
A atividade criadora é caracterizada não apenas por motivos, metas e operações (que
também existem nas atividades de rotina), mas também por atos que geram novos motivos,
novas metas e novas operações. Esta atividade funcional sofre uma evolução no decurso da
sua realização, podendo ser definida como uma unidade de vida que inclui a geração de novas
formações psíquicas, oferecendo realmente aos seres humanos a oportunidade de gerar um
novo mundo de objetos. Essas novas formações psíquicas na atividade precedem e preparam a
produção de novos resultados tangíveis (produtos) de atividade.
Novas necessidades e novos motivos são fontes importantes de atividade criadora,
sendo que a motivação inicial pode mudar no decorrer da atividade, assim como as relações
hierárquicas entre os motivos também podem mudar. Os motivos não são apenas as condições
para o desenvolvimento de atividade intelectual real, mas também são os fatores que
influenciam a produtividade e estrutura. A motivação por sua vez, se caracteriza não só pelo
conteúdo, mas também pela dinâmica e nível de desenvolvimento.
O desenvolvimento funcional de necessidades cognitivas (estudado por E. E.
VASIUKOVA, [s.n.]) é caracterizado por alterações no conteúdo objetivo (tipo de
conhecimento), nas propriedades dinâmicas (estabilidade), nas relações com outras
necessidades e no nível de realização. Neste desenvolvimento podemos isolar diferentes
níveis específicos de micro e macrogênese, onde a geração e característica da necessidade
cognitiva, que aparece em uma situação concreta, e dela depende não apenas a exposição do
sujeito a não correspondência dos seus métodos conhecidos de ação para os requisitos do
problema, reside também o plano geral do desenvolvimento de necessidades do sujeito
cognitivo estável. O nível geral de desenvolvimento de uma necessidade cognitiva estável
define a correlação entre os componentes de reprodução e criatividade da atividade intelectual
- o nível de sua "criatividade" aumenta com o aumento deste nível. Estudos de atividade
criadora exigem uma análise das relações entre a atividade e personalidade em um ato criativo
específico. I. L. Zinovieva [s.n.], estudou essas relações, especialmente a dependência da
organização da atividade intelectual sobre o nível de confiança do sujeito. Ao que parece os
sujeitos confiantes tinham uma orientação ao resultado maior, o que leva a "eliminar" - por
meio de avaliações categóricas - as hipóteses de todas as informações que não conduzem à
meta, bem como maior autoconfiança nas conclusões existentes e maior integração entre as
generalizações. Os sujeitos sem autoconfiança demonstraram uma organização caótica e
desintegrada da pesquisa, como resultado de avaliações aproximadas do valor dos
componentes do campo de significados, o que gera numerosas direções da pesquisa tendo
igual nível de atratividade - e isso dificulta a realização efetiva da meta.
Um estudo realizado pela I. A. Vassiliev e N. N. Khussainova ([s.d.]) mostrou que a
personalidade determina o nível de organização da atividade criativa e do campo de
significado da atividade (conteúdo objetivo do problema, conteúdo subjetivo-objetivo do
problema, e o contexto mais amplo de vida). Os mecanismos psicológicos de "escapismo" da
atividade criadora dedicada para a solução de um problema específico, incluem o alargamento
de campo da atividade de significado além do conteúdo objetivo do problema, ou seja, a
inclusão do "Eu, experimentador” e de um mais amplo contexto de atividade na vida com
pontos de referência significativos. Essa tipologia das fugas da atividade intelectual criativa
foi estabelecido pela direção da fuga para um dos campos de significação.
A meta-orientação (geração de novos objetivos na atividade do sujeito) é um dos atos
centrais na estrutura da atividade criadora. O termo “meta” define a imagem dos resultados
futuros desejáveis, indiretamente relacionados com a motivação. O resultado obtido pela ação
contém sempre algo de novo em relação ao objetivo: subprodutos de uma ação orientada ao
resultado, resultados de atuação efetiva involuntária do assunto. Além de necessidades e
motivos, os pré-requisitos da geração de novos objetivos na atividade criativa individual
incluem:
(1) a assimilação de novos conhecimentos sobre possíveis metas (resultados);
(2) a recepção de novas demandas de ação;
(3) o aparecimento de novos resultados de ações individuais;
(4) o caso de incumprimento dos resultados previstos, e
(5) o aparecimento de novas e irrealizadas antecipações dos resultados futuros da ação.
A transformação de reivindicações em metas individuais é uma das variantes mais comuns de
formação das metas. Na formação independente de metas (por exemplo: quando há falta de
uma demanda formulada diretamente), o processo pode se desenvolver voluntariamente ou
involuntariamente (TIKHOMIROV, 1988, p. 111-152).
Entre os mecanismos psicológicos da formação de metas estão
(1) a transformação de motivos em motivo-objetivos pela sua realização,
(2) a transformação de subprodutos de ação em metas, conectando-os com o objetivo e
realização do resultado,
(3) a transformação dos resultados não realizados em resultados realizados;
(4) o isolamento de metas intermediárias como função de um obstáculo;
(5) as atividades prático-comum;
(6) a correlação do objeto com diversas necessidades, e
(7) a satisfação parcial da necessidade pelo objeto desta necessidade (TIKHOMIROV, 1988,
pp 111-152).
Em 1975, Leontiev advogou que a meta-orientação é "um processo que quase não se
estudou, de verdade" (p. 106). Hoje a situação é diferente. Entre os objetos de pesquisa está o
papel de motivos e emoções nos atos de formação de meta, o papel das avaliações das
possibilidades da situação objeto e das perspectivas de sua transformação, o papel das
avaliações da acessibilidade do objetivo esperado, o papel da memória, e a dependência da
formação de metas na formação de significado (TIKHOMIROV, 1988).
Estudos do conteúdo operacional da atividade incluem a análise da geração de
operações de pesquisa não-verbal, fatores de sua organização, e interrelações com as
operações verbalizadas. A diferenciação entre a atividade criadora e a de rotina exige não só
uma nova abordagem para as unidades tradicionais de análise da atividade do ponto de vista
de sua geração no curso do auto-desenvolvimento da atividade, mas também o isolamento de
novos componentes. Apresento a seguir dois exemplos.
Os estudos da atividade intelectual criadora demonstraram que esta atividade inclui
ambos os processos submetidos a um objetivo consciente e antecipações não-verbalizadas de
resultados futuros. Os últimos processos podem ser mais intensos do que as ações orientadas
para objetivos próprios. Nos estudos experimentais, a geração de metas intermediárias
demonstraram que antecipações não-verbalizadas podem preceder a formação consciente de
uma nova meta, podem coexistir com esta mesma meta, e até mesmo estar por trás dele. Os
estudos de formação de metas mostraram também que na formação e funcionamento
consciente das metas, avaliações da acessibilidade do resultado, não realizados pelo sujeito,
juntam-se. Um ponto importante na análise da atividade criativa pertence aos estudos de sua
regulação emocional. Os seguintes parâmetros são centrais nessas análises:
(1) a saturação emocional da atividade,
(2) o conteúdo objetivo (direção) das emoções,
(3) as características de fixação emocional,
(4) a objetivação emocional e correção, e
(5) as emoções 'modalidade.
A atividade criativa é caracterizada por dinâmicas complexas de geração das
avaliações emocionais, que aparecem como uma novas formações, não menos significativas
do que motivos e objetivos (TIKHOMIROV, 1988, pp 91-110).
A atividade humana concreta inclui uma "amálgama" de componentes criadores e nãocriadores. Dependendo de seu domínio, pode-se falar de uma atividade predominantemente
criativo ou não-criativos. As tentativas de proclamar toda atividade como criativa contradiz a
realidade da divisão do trabalho na sociedade.
Os efeitos psicológicos da informatização da atividade
A atividade criativa, enquanto mantida a prerrogativa de ser fruto de seres humanos, é
profundamente alterada no contexto do uso do computador, isso porque em meios
informatizados, um desenvolvimento real da atividade criativa pode ser verificado. Novas
formas de trabalho criativo, novas formas de educação e novas formas de jogar aparecem,
formas estas que são simplesmente impossíveis sem os computadores. Ao mesmo tempo, os
novos tipos estereotipados de atividade rotineira aparecem.
A informatização tipicamente implica em aumentos acentuados na motivação,
prestígio externo, bem como o desenvolvimento intensivo de necessidades cognitivas da
personalidade. Nós verificamos tanto um medo de usar computadores quanto um otimismo
desenfreado inerente ao seu uso. A transformação ocorre em todo o sistema de motivação,
formando significados estáveis de personalidade, e geração de metas pessoais em participar na
regulação da atividade criadora. Pode-se também observar uma dupla tendência para a
ampliação das possibilidades de criar e atingir objetivos, por um lado, e para estreitar estes
processos, de outro lado.
O caráter contraditório dos efeitos psicológicos da informatização torna necessário
analisar esses efeitos de forma concreta, para trabalhar propositadamente em direção a
resultados positivos e corrigir possíveis conseqüências negativas. Tudo isso exige uma análise
diferenciada em relação a diferentes grupos profissionais, diferenças étnicas e diferenças
etárias, bem como dos computadores de diferentes tipos e gerações, diferentes linguagens de
software e princípios de programação. O computador não é apenas um dispositivo de
processamento de dados universal, é também um meio universal de influenciar a atividade
humana e, consequentemente, a psiquê humana. Essa influência pode ser dada de forma
proposital e também espontânea. A especificidade de tal influência é definida, em primeiro
lugar, não pelo computador, mas pelas condições organizacionais e sociais envolvidas na sua
utilização e pelas características particulares da atividade.
Estudos psicológicos experimentais de formação de objetivos como uma manifestação
da criatividade no diálogo com os computadores mostraram o potencial de ampliação da
atividade criativa humana. Este potencial é expresso em um aumento no número de objetivos
formulados e na intensificação da sua originalidade. Foi também demonstrado que a utilização
de computadores conduz a uma transformação qualitativa de processos de formação de
objetivos, manifestados em novas propriedades da situação que são objeto inacessível sem o
uso de computadores. Essa mudança se manifesta também na ampliação da zona independente
de busca seletiva. Ao mesmo tempo, os estudos mostraram que o desenvolvimento da
atividade criativa, no contexto computadorizado pode ser consideravelmente aumentado com
a ajuda da manutenção psicológica da informatização. No caso contrário, existe o risco de
formação de um pensamento pré-concebido6 e elipsado, suportado pela autoridade do
computador (TIKHOMIROV, 1988, pp 180-190).
Na realização de qualquer uma das funções sociais ao participar de uma atividade
conjunta, pode-se isolar ambas componentes da atividade, as de rotina e as criativas. A
transferência de componentes de rotina para o computador significa a inclusão deste no
desempenho de um papel social - e, consequentemente, a transformação do conteúdo dos
papéis sociais, fazendo com que novos papéis tendam a aparecer.
Tikhomirov e Gurieva (1989) estudaram os efeitos psicológicos da informatização na
atividade de psicodiagnosticadores. O estudo incluiu uma análise da transformação dos
motivos da atividade computerizada7, as mudanças nos processos de formação de objetivos e
metas dessas atividades, e as mudanças em seu conteúdo operacional. O estudo utilizou três
escalas de avaliação: efeitos "positivos x negativos", efeitos "reais x potenciais" e efeitos "
regidos x desgovernados" .
As reais mudanças positivas na motivação dos psicodiagnosticadores foram expressas
na formação de motivos "conhecidos" ligados às vantagens do uso do computador, como por
6
N.T. Stereotyped usado com frequência por Thikomirov se refere ao que já está pré-concebido, que não tem
autenticidade, nem originalidade, que se baseia em falsas generalizações.
7
Ver: Tikhomirov, O. As Consequências Psicológicas Da Computerização, [Man And Computer]. Moscow:
Moscow University Press, 1972.
exemplo na admissão do computador como um meio confiável bem como na confiança
seus dados. As reais mudanças negativas na motivação foram geradas pela percepção
habilidades limitadas dos computadores na solução de problemas e pela descoberta
defeitos técnicos nos computadores. Os fenômenos de "barreira psicológica"
"superconfiança" foram observados nesse caso.
de
de
de
e
As potenciais mudanças positivas na motivação consistem na afirmação do valor
profissional dos psicodiagnosticadores e na ênfase sobre a sua responsabilidade pelos
resultados dos psicodiagnósticos computadorizados. Variações negativas potenciais da
motivação se basearam em avaliações erradas sobre a importância do uso do computador em
estudos psicodiagnósticos, o que pode conduzir a uma ampla difusão de decisões
psicodiagnósticas incorretas.
As reais mudanças positivas na formação de metas foram atribuídas à redução de
determinadas metas pré-concebidas na interpretação dos resultados do teste e no
desenvolvimento de meios objetivos, tais como as análises informais de dados de teste, maior
quantidade de entrevistas qualitativas com a pessoa examinada, e um maior número de
entrevistas em um período de tempo específico. Também foi dada maior atenção para a
concretização e especificação dos objetivos inicialmente formulados de uma forma geral, e
desta forma o nível de alcance de metas e objetivos prognosticados foi aumentando.
Entre as reais mudanças negativas na formação de metas e objetivos estavam o
estabelecimento de metas ligadas à preparação, regulamentação e controle dos resultados do
computador no processo de resolução de um problema psicodiagnóstico (essas metas
específicas do computador, embora necessárias para atingir um resultado produtivo, têm um
caráter menos significativo e auxiliar, tornando a realização de um resultado produtivo mais
complexo). Os testes computadorizados das pessoas examinadas, sem preparação prévia, as
deixa constrangidas e produz nelas um medo do computador por ser um dispositivo técnico.
Isto leva a dados não-autênticos ou a uma recusa de trabalhar com o computador. Nesta fase,
uma combinação de tipos de atividades manual e computadorizada, torna possível otimizar o
processo, porém simultaneamente conduz a uma produtividade mais baixa.
As potenciais mudanças positivas na formação de metas e objetivos podem consistir
em uma prevalência ótima de componentes criadores de atividade psicodiagnóstica
informatizada sobre os componentes pré-concebidos. Já as potenciais mudanças negativas na
formação de metas e objetivos estão ligadas a fixação inadequada ou irrealista de objetivos
como, por exemplo, o objetivo de substituição total dos psicodiagnosticadores pelo
computador.
As reais mudanças positivas no conteúdo operacional da atividade consistem na
redução da carga operacional e na possibilidade de se utilizar os resultados de operações mais
perfeitos realizados pelo computador. As reais mudanças negativas no conteúdo operacional
da atividade incluem novos tipos de operações necessárias como trabalho auxiliar mas que
possuem relativamente baixo valor social, a ineficiência nas operações sensomotoras
realizadas produzidas pela apresentação inconveniente de dados no visor, a organização
irracional do teclado do computador, e ainda as instruções e manuais deficientes. O ritmo das
operações ditadas pelo computador também pode ser negativo.
As potenciais mudanças positivas no conteúdo operacional da atividade são vistas no
curso da aprendizagem, da racionalização da tela, e das rotinas de trabalho do usuário. As
potenciais mudanças negativas no conteúdo operacional consistem em uma avaliação
inadequada da importância das operações eficientes para a atividade psicodiagnóstica , o que
pode levar a uma falta de convergência entre os resultados reais e os esperados e para a
formação de superconfiança em dados informáticos.
Teoria da atividade e a teoria da inteligência artificial
As últimas décadas testemunharam uma intensa interação entre a psicologia e a teoria
da inteligência artificial. Ambos, psicólogos e cientistas cognitivos, têm feito muitas
tentativas para usar o aparato de inteligência artificial e os princípios operacionais dos
sistemas artificiais no estudo da cognição, criatividade e comportamento.
Uma manifestação da influência da teoria da inteligência artificial é ampla
disseminação de ideias sobre criatividade e atividade como processos de realização do
algoritmo. Um algoritmo é uma instrução, o cumprimento do que garante a solução de uma
determinada classe de problemas. Este cumprimento de uma instrução é, por vezes, declarado
como sendo um ato de criatividade e um modelo de atividade humana.
Nosso conceito de atividade criativa pode ser interpretado como um modelo nãoalgorítmico de criatividade (PONOMAREV & SAARINEN, 1986, pp 1-8). A atividade
criativa é, em sentido contrário a um algoritmo, uma "antialgoritmo". A natureza nãoalgorítmica de regulamentação motivacional-emocional se expressa no fato de que a
necessidade adequada (como um objeto não especificado de querer) não tem "regras" para
transformar necessidades em motivação, mas aparece apenas como resultado de um encontro
entre uma necessidade e do objeto de sua satisfação. O alargamento das chamadas
necessidades insaciáveis - que incluem as necessidades cognitivas - também não é préprogramado para as propriedades de necessidades. As relações entre os motivos também não
são fixas, pois podem ser estabelecidas e modificadas no decurso da realização de atividade e
podem ser especialmente complexos em situações de motivos conflitantes. A geração e
transformação de avaliações emocionais em atividade também não são algoritmos, assim
como as relações entre motivos e objetivos também podem ser não-algorítmicos. A relação
entre os objetivos e motivos é especialmente ambígua em situações de formação de objetivos
e metas, pois o processo de satisfação da necessidade não inclui necessariamente o isolamento
dos objetivos conscientes e a transição do motivo para a meta e o processo adequado de
formação de objetivos não tem um caráter algorítmico.
A teoria da programação heurística como parte da teoria da inteligência artificial tem
atraído a atenção para a organização heurística da busca humana por soluções. Normalmente,
nenhuma consideração é dada à diferença entre princípios heurísticos formais e informais,
mecanismos seletivos que podem trabalhar em ambos os níveis verbais e não-verbais, e a
mudança desses mecanismos, a transição de uma zona de pesquisa para outra, é uma
característica importante da atividade criativa.
Vamos agora considerar alguns novos aspectos da análise de tradicionais componentes
estruturais da atividade. Estes novos aspectos se manifestam como resultado da interação
entre a teoria da atividade e a teoria da inteligência artificial.
As operações no funcionamento de um sistema de inteligência artificial são diferentes
das operações na estrutura da atividade humana, haja vista que nem todos estes podem ser
transferidos para os sistemas artificiais e as operações humanas não são apenas realizadas,
mas também geradas e transformadas.
O termo objetivo, que denota a característica diferenciadora de ação na teoria da
atividade, também é usado na teoria da inteligência artificial. No entanto, nela tem um
significado diferente: a situação finita, definido por uma descrição formal (por exemplo, sob a
forma de uma lista de indicações), sendo realizado durante o funcionamento de um
determinado sistema. Neste contexto, o objetivo perde a sua conexão com o motivo, o que é
fundamental na teoria da atividade.
A comparação da regulação motivacional-emocional da atividade criativa com as
funções de avaliação de sistemas de inteligência artificial mostra que os seres humanos usam
não apenas constantemente, mas também situacionalmente, ocorrendo e dinamicamente
alterando as avaliações. Há uma diferença considerável entre as avaliações verbal-lógico e
emocional. Conforme as necessidades e motivos, elas estão ausentes em sistemas artificiais que constituem a principal diferença entre o trabalho de um humano e de uma máquina, uma
diferença fundamental para a teoria da atividade.
Levando em consideração o desenvolvimento ativo de sistemas especialistas, é
necessário discutir a correlação entre as categorias de "conhecimento" e "atividade". O
conhecimento pode ser um produto específico inicialmente gerado pela atividade de
pensamento humano e um meio de realizar essa atividade. O conhecimento pode ser
reproduzido - como na reprodução adequada ou em recordação. Junto com o conhecimento
formalizado, facilmente descrito, existe o conhecimento não-formalizado (ou mal
formalizado). Ele inclui noções mundanas, generalizações empíricas, e complexas, que não
devem ser considerados como de segunda categoria.
Do ponto de vista da teoria da atividade criativa, mesmo nessas tecnologias complexas
de informação, como os sistemas especialistas, não se reproduzem atividades humanas,
embora transformem-na. Necessidades, formação de objetivos e metas, e a geração de
avaliações emocionais permanecem como características especificamente humanas. No
entanto, a teoria da atividade e a teoria da inteligência artificial estão unidas pela necessidade
de desenvolver uma teoria de atividades que usem sistemas de inteligência artificial.
O diálogo entre o ser humano e o computador é caracterizado pela personificação
emergente do computador, ou seja, a sua percepção de como uma entidade com certas
características pessoais e propriedades conscientes e seu tratamento correspondente. A
interação entre o operador humano e o computador assumem traços mais e mais de atividade
conjunta (cooperação ou rivalidade). A necessidade de comunicação interativa com o
computador é atual, e um motivo de competição com o computador aparece, manifestado na
formação de metas, tais como “conquistar a máquina", "vingar-se da máquina", e assim por
diante.
A noção de artificial está ligada com mais do que a discussão das possibilidades dos
computadores. Geralmente, este termo designa tudo o que for criado por humanos (Simon,
1969). A correlação do artificial e não-artificial na atividade intelectual humana constitui um
importante problema científico, que pode ser reformulado como o problema de correlação
entre os processos de rotina e os processos de criação. O primeiro pode ser artificial, por ser
produzido por outras pessoas e adotado pelo indivíduo. O não-artificial na atividade
intelectual não se limita, na nossa opinião, aos pré-requisitos naturais desta atividade (Simon,
1969), que também se relaciona com as novas formações que aparecem no curso da atividade.
Ignorar esse tipo de não-artificialidade é ignorar a natureza criativa da atividade intelectual
humana.
Neste contexto, é necessário especificar o papel da instrução no desenvolvimento
intelectual, a tese sobre o desenvolvimento social e histórico da mente, com a qual a teoria da
atividade é tradicionalmente associada. O conteúdo da experiência humana individual inclui
não apenas a experiência social dominada, mas também a experiência pessoal, a experiência
de realização de uma atividade, que determina a prontidão e seletividade de aquisição.
A experiência social é transferida não apenas para os outros, mas também à tecnologia
de informação - por exemplo, sob a forma de programas de computador. A este respeito, é
necessário diferenciar entre os processos de “apropriação” da experiência social por um ser
humano e por um computador. Essa diferenciação é decisiva para a avaliação do conceito da
psicologia como "ciência do artificial", que leva a noções mais amplas sobre as funções da
atividade humana.
Nas experiências sociais específicas bem sucedidas de aquisição e domínio, um ser
humano também acumula certas experiências pessoais - por exemplo, sob a forma de
vestígios de experiências emocionais geradas pelo primeiro contato com o material, por
familiaridade mais profunda com o material, e assim por diante. Uma das regularidades do
desenvolvimento psicológico individual é que na apropriação da experiência histórico-social,
também se adquire uma experiência individual. Isso anula tanto a contraposição e
identificação da experiência social e individual, quanto a diferenciação entre os processos de
apropriação da experiência social por seres humanos e por computadores.
A atividade intelectual consciente do ser humano é regida por circunstâncias objetivas,
isto é, aquelas que não dependem da vontade das pessoas que vivem na sociedade, vendendo
certas metas e alcançando esses objetivos, nunca capazes de prever todas as conseqüências de
suas ações. Esta tese continua válida no que diz respeito à atividade de instrução e de ensino,
e não nos permite adotar a opinião de que a atividade de uma única pessoa e psique, nada
mais são do que o produto das pessoas ao redor, que são artificiais. Portanto, do ponto de vista
da teoria da atividade criativa, a psicologia não pode ser considerada como uma ciência do
artificial.
Conclusão
O desenvolvimento da informática e tecnologia da informação não só produz
mudanças consideráveis na atividade humana, ele requer o desenvolvimento da teoria da
atividade. Esta teoria tem uma nova função: interpretar a natureza psicológica da atividade
humana na sociedade da informação e os desafios que se apresentam para o desenvolvimento
da ciência psicológica.
Referências
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presented at the Third International Conference, "Children in the Information Age," Sofia, May 19-23.
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